Político, eu!?! | Programa de Educação Político-Cidadã #01

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Rubéns Lopes, 36, professor de dança, acessou a política de cotas pela primeira vez em 2004 e viu sua trajetória ser impulsionada pelas políticas afirmativas

QUAL SEU LUGAR DE

CIDADÃO NESSE PAÍS?

Pensar a cidadania e as estruturas de estado brasileiro é entender que cada pessoa tem seus direitos. Nesse sistema democrático emergem as políticas afirmativas para reduzir a desigualdade, os déficits de acesso à saúde, educação, emprego...

22 DE AGOSTO DE 2023 FORTALEZA - CEARÁ
FERNANDA BARROS

POLÍTICO, EU?!

Programa de Educação Político-Cidadã

EXPEDIENTE

FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA

Presidência: Luciana Dummar | Direção

Administrativo-Financeira: André Avelino de Azevedo

| Gerência-Geral: Marcos Tardin | Gerência de Criação de Projetos: Raymundo Netto | Gerência de Audiovisual: Chico Marinho | Gerência Editorial: Lia

Leite | Gerência de Marketing & Design: Andrea Araújo

| Análise de Projetos: Aurelino Freitas e Fabrícia Góis

UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE (UANE)

Gerente Educacional: Prof. Dr. Deglaucy Jorge

Teixeira | Coordenadora Pedagógica: Profa.

Ms. Jôsy Cavalcante | Coordenadora de Cursos

e Secretária Escolar: Esp. Marisa Ferreira |

Desenvolvedora Front-End: Isabela Marques

| Estagiárias em Mídias e Tecnologias para Educação: Germana Cristina e Rebeca Azevedo | Estagiária em Pedagogia: Arielly Ribeiro

POLÍTICO, EU!?

Concepção e coordenaria geral: Valéria Xavier | Projeto Gráfico e Editora de Design: Andrea

Araújo | Designers: Kamilla Damasceno e Welton

Travassos | Ilustração: Carlus Campos | Analista de Marketing Digital: Henri Dias | Social Media: Letícia

Frota | Analista de Projetos: Daniele de Andrade

LAB

Coordenador Editorial: Paula Lima | Editoraadjunta: Ana Beatriz Caldas | Designer: Natasha

Lima | Textos: Ana Beatriz Caldas Carol Kossling, Letícia do Vale, Paula Lima e Paloma Vargas

Entenda o projeto!

Nos últimos anos, as produções teóricas têm chamado atenção para a intensificação de sentimentos de desconfiança nas instituições democráticas, de rejeição aos partidos políticos e de desinteresse pela política.

No entanto, nesse contexto, tem crescido no debate público a demanda pela construção de espaços para o diálogo sobre política, cultivando a compreensão sobre a democracia, suas instituições e valores. Compreendendo a relevância dessas reflexões para o exercício efetivo da cidadania na vida cotidiana, a Fundação Demócrito Rocha apresenta o Projeto “Político, eu?!”, iniciativa que propõe despertar a cidadania de toda a população, além de promover a formação através de um curso de extensão na modalidade de ensino à distância (EaD), com seis módulos contemplando videoaulas, fascículos digitais e radioaulas.

Este caderno é o primeiro de uma série de quatro que faz um convite para entrar nesse universo que nos rodeia e, em essência, deve garantir direitos, dignidade e espaços para todos.

INSCRIÇÕES PARA O EaD

O curso “Educação Política para Cidadania” propõe a formação de docentes, jovens e cidadãos em geral, para a compreensão da relevância da educação política para o exercício pleno da cidadania.

As inscrições são gratuitas. Confira o conteúdo programático do curso e inscreva-se em: fdr.org.br/politicoeu.

participação e cidadania

O parlamento está na base da democracia representativa porque é nele onde a grande representação da sociedade se reúne para debater as ações que impactam na vida dos cidadãos. Por isso, eles precisam estar conectados com toda a sociedade e estabelecer mecanismos de escuta ativa e incentivo à participação social na política institucional. Não há parlamento sem democracia e não há democracia sem cidadania.

Na Câmara Municipal de Fortaleza, temos criado mais alternativas de participação popular nas discussões legislativas no intuito de qualificar os debates e os projetos de lei apresentados na Casa a partir da contribuição dos cidadãos. Entendemos que, assim, aperfeiçoamos nossa representação política e fortalecemos as bases democráticas.

A construção de uma verdadeira democracia parte da nossa responsabilidade de ampliar as vozes da sociedade e estabelecer um diálogo amplo, igualitário e inclusivo. Precisamos perseguir alternativas de governança que prezem pela participação popular nas instâncias de decisão, além de garantir que todos que compõem a sociedade estejam representados nos parlamentos.

Diferentes perspectivas e visões de mundo diversas enriquecem as discussões políticas e favorecem a criação de ações mais eficazes e assertivas. Quanto mais incentivarmos o debate plural e diverso, com a inclusão das mais diversas esferas sociais, mais estaremos contribuindo para a construção de uma sociedade justa. A política se faz no cotidiano, permanentemente, e com a participação de todos.

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PARCERIA APOIO REALIZAÇÃO
Democracia,

IGUALDADE RACIAL:

EXISTE UMA

A jornalista Luizete Vicente, doutora em Comunicação e pesquisadora de raça, gênero e políticas públicas, destaca ainda a importância da Lei nº 10.639, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro -brasileira e africana nas escolas do País. Criada em 2003, ela foi alterada em 2008, com a inclusão de estudos sobre história e cultura indígena. Segundo Luizete, ainda que precise ser melhor implementada, a lei tem tido grande impacto na formação e compreensão da identidade negra no Brasil.

Estudiosos e ativistas apontam o fortalecimento de políticas transversais para a população negra no Brasil a partir de medidas institucionais, como a recriação do Ministério da Igualdade Racial, extinto em 2016 e recriado no início deste ano. No Ceará, a criação da Secretaria da Igualdade Racial (Seir), também no início deste ano, é colocada pelos especialistas ouvidos por O POVO como uma das maiores conquistas do Estado neste sentido.

A política é, sobretudo, um meio de garantir direitos para os cidadãos. Especialmente para grupos minorizados – que, mesmo quando maioria, sofrem preconceito e são subrepresentados em diversas esferas sociais –, a legislação é essencial para a superação de desafios individuais e redução das desigualdades coletivas. Desigualdades essas que, muitas vezes, têm como base uma estrutura histórica que torna o caminho mais árduo para alguns.

No Brasil, assim como em outros países com herança escravocrata, essa é a realidade das pessoas negras, que apesar de representarem mais da metade da população ainda encontram grandes dificuldades para ascender a posições de poder e bem-estar social em virtude

do racismo. Por conta disso, a advogada Isabel Mota, membro da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB-CE e do grupo Black Sisters in Law considera que uma das principais conquistas legais da população negra é a política afirmativa com recorte racial, que garante o acesso a universidades e concursos públicos, entre outros espaços.

“Pensar em políticas afirmativas é pensar em reduzir a desigualdade, os déficits de acesso à saúde, educação, emprego. Como isso não cessava naturalmente, precisamos criar formas artificiais de diminuir o processo de desigualdade da sociedade brasileira”, destaca Isabel.

A Lei nº 12.711 (Lei de Cotas) – que completou uma década em 2022 e visa garantir uma reserva de vagas em instituições federais não só para pessoas negras, mas também para pessoas de baixa renda, alunos de

Rubéns Lopes é professor de dança e amplia a questão das políticas afirmativas: “É preciso também ocupar posições de poder”

escolas públicas, indígenas e pessoas com deficiência – é o exemplo mais bem sucedido nesse sentido. Segundo Isabel, a mudança provocada por ela inspirou o surgimento de políticas afirmativas em outros âmbitos, como universidades estaduais, concursos públicos e até empresas privadas.

No Ceará, se destacam, nesse sentido, a Lei nº 17.432 e a Lei nº 11.111, vigente em Fortaleza. Ambas reservam 20% das vagas nos concursos públicos da esfera estadual e municipal, respectivamente, para candidatos negros. Isabel Mota aponta a legislação de cotas como ponto fundamental para a promoção da igualdade racial. “Não dá para esperar que primeiro se democratize o ensino para depois as pessoas chegarem a um patamar maior social, a cargos de maior envergadura, porque aí já se foi mais uma geração. Essa é uma forma de trabalhar nas duas pontas”, explica.

“No Censo 2010, houve um salto na autoafirmação da população negra, uma onda de pessoas se afirmando pretas e pardas. Essa autoafirmação traz cidadania. As leis não servem apenas para criminalizar; é preciso construir sua identidade, e essa lei permite que as crianças possam acessar, ainda na escola, uma história que não é contada, ou que é contada através de outro olhar”, ressalta.

Para além das vagas na universidade, completa a pesquisadora, é preciso que haja, no ambiente acadêmico, outras produções de saberes. No Ceará, ela destaca a chegada da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro -Brasileira (Unilab) como um ponto de virada na educação do Estado. “Quando se fala da população negra e indígena, falam muito que aqui ‘não tem disso não’. A partir da Unilab, a gente vê que existe uma população negra e indígena forte no Ceará, com cultura e história, em cursos de graduação e pós-graduação que falam sobre isso”, completa.

Antes funcionando como coordenadoria, a secretaria hoje é comandada por Zelma Madeira, doutora em Sociologia e professora do curso de Serviço Social da Universidade Estadual do Ceará (Uece), e tem como objetivo inicial qualificar os dados sobre a população negra do Estado. “A gente parte do pressuposto de que qualquer política tem que ter registro de dados, tem que ter informação. Isso é iniciar a conversa”, declara Zelma.

Muitas atividades da Seir, explica a secretária, estão relacionadas a eventos de formação com representantes de outras secretarias, já que é necessário que todas as pastas estejam em consonância em relação a medidas de promoção de igualdade racial e combate ao racismo.

Além disso, segundo Zelma, o Governo do Estado tem fomentado iniciativas de apoio a empreendedores negros, como a Feira Negra, e se aproximado dos movimentos sociais negros e quilombolas através da escuta qualificada. “Realizamos ações no campo repressivo, que evidenciam que racismo é crime; valorativo, no campo educacional, e afirmativo, para que a gente possa seguir na luta de formular, monitorar e avaliar políticas de equidade social no nosso Estado”, conclui.

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como a garantia de direitos potencializa trajetórias
Políticas afirmativas se destacam na luta pela representatividade negra em todos os espaços
TEXTO: Ana Beatriz Caldas EMAIL: beatriz.caldas@opovo.com.br
FORTALEZA - CE, 22 DE AGOSTO DE 2023 5 POLÍTICO, EU?! Programa de Educação Político-Cidadã
A luta antirracista como estratégia governamental
CEARÁ,
CULTURA
POPULAÇÃO NEGRA E INDÍGENA FORTE NO
COM
E HISTÓRIA
FOTO FERNANDA BARROS

Letramento

A defesa dos direitos da população negra cearense passa pela necessidade de formação contínua dos profissionais do Direito. Na Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Ceará (OAB-CE), segundo Isabel Mota, a Comissão de Igualdade Racial tem feito um trabalho interno de letramento racial, além da fiscalização da implementação das leis. Ainda este ano, segundo Mota, a OAB-CE irá realizar uma pesquisa para entender a realidade de estudantes de direito, estagiários e advogados pretos e pardos nas faculdades e nos escritórios de advocacia do Ceará, com o intuito de propor melhores condições de carreira jurídica para este público.

Além do acesso, é preciso garantir permanência

PLURALISMO POLÍTICO:

jovens que acessam espaços de for-

As leis têm mudado o perfil dos jovens que acessam espaços de formação e trabalho. “A juventude negra tem se organizado a partir de um outro olhar. Hoje, na universidade, há um olhar a partir dela, o que não era tão comum. A partir das mulheres, dos LGBTQIAP+. Há também outra lógica nas redes sociais, na militância”, destaca Luizete Vicente.

É a partir dessa nova ótica que o artista Rubéns Lopes, 36, trabalha e pesquisa. O professor de dança, que viu sua trajetória ser impulsionada pelas políticas afirmativas, acessou a política de cotas pela primeira vez em 2004, quando começou a cursar Publicidade em uma instituição privada com bolsa de 100% pelo Programa Universidade para Todos (Prouni).

Quando decidiu cursar uma segunda graduação, desta vez na licenciatura em Dança da Universidade Federal do Ceará (UFC), conseguiu garantir sua vaga através das cotas raciais. Ali, além de seguir seu sonho, alcançou também um nível de pertencimento que ainda não tinha experimentado em outras experiências formativas.

“Na UFC, consegui ver mais pessoas negras, mais pessoas indígenas – se não na qualidade de professores, que na época não tinha, mas na qualidade de alunos. Minha turma tinha uma diversidade étnica grande. O fato de as políticas de cotas raciais e sociais estarem garantidas de forma federal fez com que muitas pessoas que provavelmente não teriam acesso àquele curso estivessem e permanecessem lá”, comenta.

Rubéns destaca a importância das políticas de permanência,

como bolsas de pesquisa, residência estudantil e isenção no restaurante universitário, dentre outras. Afinal, lembra, “a gente sabe que não é só entrar”. Ele destaca que, para muitas pessoas, não é possível estudar e trabalhar ao mesmo tempo, devido ao cronograma dos cursos, o que torna a evasão muito maior para populações vulneráveis.

Atualmente, além de cursar o mestrado em Artes no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Rubéns é professor do curso técnico em Dança da Secretaria da Cultura do Ceará (Secult-CE) e atua em bancas de heteroidentificação na Capital. O procedimento é uma das formas de garantir que as políticas afirmativas com recorte racial beneficiem, de fato, as pessoas a quem elas se destinam.

Mas, ainda que as leis garantam o acesso e a permanência nos espaços, há muito mais a ser feito para que pessoas negras tenham seus direitos garantidos em plenitude. “Não basta apenas que nós acessemos os cursos da universidade ou qualquer outro concurso público. É preciso também que outras pessoas, as pessoas brancas, se abram, assim como a gestão pública, para nos receber”, lembra Rubéns, que recentemente também foi selecionado, por meio de política afirmativa com recorte racial, no Edital de Incentivo às Artes de 2022.

“Além disso, é importante que as pessoas negras, indígenas, queers habitem todas as esferas, todos os campos. Não só a graduação e a pós-graduação, mas concursos para gestores, – que também haja espaço para que esses corpos estejam em posições de poder”, conclui.

O Brasil é um país multicultural e por isso feito de diferenças. Mas as diferenças são igualmente vistas e têm acesso aos mesmos direitos? No Brasil, quem garante essa democratização da diferença é o pluralismo político, que se apresenta como fundamento do Estado Democrático de Direito. O termo ganhou legalidade na Constituição de 88, no Título I, ele é uma das bases de manutenção da democracia em nosso País. “Temos a ideia da democracia sendo regime de poder do povo, mas esse povo é diverso, não é uniforme. Ele é diferente em diversos aspectos, culturais, de crenças, gêneros, de valores e, portanto, de ideologia. A democracia é um regime que é governado por sujeitos que são eleitos pela maioria, mas essa escolha não produz um governo que seja voltado apenas para essa maioria. Nos aspectos das ideologias, nas maiorias e minorias, um regime é mais democrático quando abre mais espaço para mais sujeitos”, explica Emanuel Freitas Silva, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e autor do Fascículo 1 do curso Educação Política para Cidadania, parte do projeto “Político, eu?!”, da Fundação Demócrito Rocha (FDR).

Em uma democracia saudável, existe respeito e o reconhecimento de que os diferentes grupos e suas ideias são legítimos, mesmo que

UM REGIME É MAIS DEMOCRÁTICO QUANDO ABRE MAIS ESPAÇO PARA MAIS SUJEITOS

analisa Leandro de Paula, professor do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, do Programa de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

cada um acredite no que lhe desperta maior interesse. “É importante dizer que o pluralismo é um valor a ser permanentemente cultivado: o espaço respeitoso à diferença pode ser sempre perdido. Com o crescimento de plataformas políticas reacionárias ao redor do mundo, diversos países têm testemunhado retrocessos nos direitos que regulam diferentes campos da experiência social, como a sexualidade ou a imigração, por exemplo. O pacto em torno do pluralismo deve assim ser sempre renovado entre os cidadãos e as instituições que formam a vida pública, incluindo o Estado e a imprensa”,

No Brasil foram quase quatro séculos de exclusão, os analfabetos, por exemplo, só são considerados cidadãos, a partir da Constituição de 88 quando conquistaram o direito ao voto, lembra Emanuel Silva. Ele explica que à medida em que os grupos – sobretudos os que foram alijados – tomam conta dessa exclusão, passam a demandar do estado, de políticos, que contemplem mecanismos que os assumam em cidadania. Se constituem nesses cenários as lutas identitárias, ou “políticas de reconhecimento” como referência às diversas lutas desenvolvidas por movimentos negros, indígenas, de mulheres, de pessoas LGBTQIAPN+, dentre outros. “Esses coletivos têm indicado, com seu ativismo político e intelectual, que a sociedade brasileira foi forjada por um ideal de cidadania branco, masculino, heterossexual, cisgênero etc., que não representa a pluralidade da nação. As conquistas históricas e recentes que essas lutas têm alcançado dão exemplo de como vem operando o pluralismo no contexto brasileiro”, conclui Leandro de Paula. (Paula Lima)

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POLÍTICO, EU?! Programa de Educação Político-Cidadã
a boa convivência com as diferenças
Uma democracia saudável é feita de respeito e reconhecimento de que os diferentes grupos e suas ideias são legítimos

A CIDADANIA

REPRESENTA A CAPACIDADE DE MUDAR O DESTINO DE UMA NAÇÃO

DEMOCRACIA E CIDADANIA:

Desigualdades sociais impedem que todos possam se beneficiar desse modelo no Brasil

TEXTO: Letícia do Vale

EMAIL: leticiadovale@opovodigital.com

Tipos de democracia Entendendo na prática

DEMOCRACIA DIRETA: a forma clássica que era exercida na Grécia Antiga. Havia um corpo de cidadãos que legislava. Não eram eleitos representantes. Os cidadãos reuniam-se para criar e debater as leis. O modelo era viável devido ao pequeno número de cidadãos.

DEMOCRACIA REPRESENTATIVA: exercida no Brasil. Cidadãos elegem representantes que legislam e governam em nome do povo.

Apesar de fundamental, o funcionamento assertivo da democracia e da cidadania ainda enfrenta dificuldades no Brasil. “Hoje, no Brasil, talvez o grande dilema seja que, para muitas pessoas, é mais importante criticar as decisões tomadas pelas instituições do que propriamente exercer plenamente a sua cidadania”, acredita André. Ele ainda destaca a carência de conhecimento sobre o assunto na matriz curricular das escolas, defendendo um ensino mais crítico.

impacto desse papel social. “Por mais desencorajador que seja o cenário político, é importantíssimo que os jovens se animem para a política, porque só assim vamos conseguir avançar. Ter jovens na política é garantir a diversidade nos parlamentos e uma democracia ativa. A juventude traz uma criatividade, uma potência e uma coragem únicas”, aponta.

mobilizou milhões de pessoas pelo País, exerceu forte influência.

DEMOCRACIA PARTICIPATIVA: mesmo nomeando representantes, a população ainda participa da tomada de decisões políticas por meio de assembleias e plebiscitos, dentre outras iniciativas.

Esse raciocínio é seguido, também, por Emanuel, que garante que, à medida que os cidadãos tenham consciência sobre quais são seus direitos e o que é um regime democrático, a cidadania vai se exercendo.

Professor de teoria política da Universidade do Estado do Ceará (Uece), Emanuel Freitas explica a democracia a partir de um conjunto de avanços na legislação. Já a cidadania é definida pelo pesquisador como “uma qualidade portada por indivíduos dentro de uma determinada nação, que gozam de direitos civis, políticos, econômicos e sociais e são regidos por uma constituição que foi democraticamente constituída”.

povo de influenciar nas decisões toma-

A natureza democrática do modelo político brasileiro é declarada logo no artigo 1º da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. Em algumas palavras, o texto resume o funcionamento político do País por meio da ligação direta de dois conceitos: a democracia e a cidadania. Afinal, se a democracia assegura o direito do povo de influenciar nas decisões tomadas pelos governantes, é esse exercício de contribuir na vida pública por meio da cidadania que sustenta a democracia.

A democracia é um sistema que permite que os cidadãos exerçam poder político. No Brasil, o estabelecimento desse modelo foi conturbado e permeado por intermitências ao longo da história do País desde o início da República. O cenário atual só foi possível após o fim da Ditadura Militar, em 1985, e a volta das eleições diretas para a Presidência da República, em 1989. Nesse resultado, o movimento popular “Diretas Já!”, que

Nesse sentido, a vereadora de Fortaleza pelo mandato coletivo Nossa Cara (Psol) e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) da Câmara Municipal, Adriana Gerônimo, aponta que o exercício pleno da cidadania se dá quando o indivíduo tem total acesso aos próprios direitos e consegue cumprir os deveres de viver em sociedade.

“A democracia funda a cidadania e o acesso aos direitos para toda a população. Elas devem caminhar no sentido de horizontalizar nossa sociedade. Manter a cidadania e a democracia é estar atento às dores do povo”, explica.

Para o advogado André Menescal, um sistema democrático em funcionamento pleno depende de uma cidadania presente. De acordo com o profissional, é importante que o povo estude e entenda o papel da cidadania, pois “ela realmente representa a capacidade de mudar o destino de uma nação”. Segundo ele, o conceito tem uma via de mão dupla: não só o cidadão tem direito de ser escutado pelas instituições, mas ele também precisa desejar fazer isso.

“Não se trata apenas de um esforço das instituições de fazer chegar ao cidadão a informação sobre os direitos que eles têm, mas também um esforço de cada cidadão de buscar ter essas informações e exercer essa cidadania ativamente”, declara.

Na opinião de Adriana, a democracia brasileira é jovem e ainda não chegou plenamente em todos os territórios. Além disso, ainda existem questões estruturais que impedem o conceito de cidadania de ser colocado em prática.

“Se analisarmos as periferias do Brasil, por exemplo, a democracia ainda não se dá lá. Se analisarmos a realidade da população trans no nosso País, vemos que o acesso pleno à cidadania é negado quando essas pessoas são impedidas, por exemplo, de atualizarem os documentos, um direito básico. Isso resulta em uma cadeia de direitos que é violada”, explica.

Apesar da necessidade de fortalecimento desse regime no Brasil, Adriana reitera que a democracia é a base do País e representa a liberdade do povo. Ela relembra que o modelo político possibilita a escolha de representantes dos mais diversos segmentos sociais, colocando em espaços de poder quem precisa ser visto.

Por isso, a vereadora não deixa de incentivar a participação política e explica o

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conceitos se completam e compõem a base política brasileira
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Cidadania além do voto:

SAIBA COM PÔR EM PRÁTICA

Exercer a cidadania é gozar de direitos civis, políticos e sociais, além de arcar com deveres.

Em uma democracia, o conceito inclui a participação do indivíduo na sociedade e nas decisões políticas. Essa participação, em uma cidadania plena, deve ser consciente e responsável, com base em informação, reflexão e pensamento crítico.

Saiba como ir além do voto e se tornar um agente ativo de transformação política na sua comunidade. (Letícia do Vale)

Ler jornais, revistas, livros e blogs confiáveis, além de assistir a programas de notícias e participar de debates construtivos. Saber o que verdadeiramente está acontecendo no campo político, social e econômico da sua região é o primeiro passo para reivindicar melhorias e combater notícias falsas.

Usar a liberdade de expressão para debater ideias em fóruns, assembleias e eventos, ou, ainda, como forma de protesto em manifestações, boicotes e abaixoassinados.

Estudar sobre política e cidadania por meio de cursos especializados e plataformas de educação.

Algumas ferramentas para o exercício da cidadania

PORTAL DA TRANSPARÊNCIA

Além da versão nacional do Portal da Transparência, é possível acessar a plataforma a nível estadual e municipal. A ferramenta dá acesso a informações da gestão pública, como receitas, despesas e outros dados orçamentários. Assim, o cidadão pode se tornar um fiscal das ações públicas, garantir a aplicação correta dos recursos e combater a corrupção. Confira as plataformas:

Acompanhar seus representantes e entrar em contato quando necessário para expressar opiniões sobre projetos de lei e outras questões.

Cobrar os responsáveis por demandas da sua região, como manutenção de asfalto, esgoto, iluminação...

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Sempre verificar a fonte da notícia, observar a data de publicação, ler o texto completo e não confiar em qualquer conteúdo encaminhado por aplicativos de mensagem.

Juntar-se a grupos que lutam por determinada causa em campanhas, protestos, reuniões e ações voluntárias.

Saber o que acontece ao seu redor, conhecer os moradores da sua região, entender as demandas e procurar participar de reuniões comunitárias e assembleias na comunidade.

- Portal da Transparência de Fortaleza

- Ceará Transparente

- Portal da Transparência da União

OUVIDORIA

A Ouvidoria de um Governo procura mediar a relação entre cidadão e Gestão Pública. Por meio dessa ferramenta é possível tecer elogios, dar sugestões, registrar reclamações, prestar denúncias ou solicitar serviços. Conheça algumas opções:

- Ouvidoria digital de Fortaleza

- Central de Atendimento Telefônico do Ceará: número 155 (ligação gratuita)

- Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à Informação da Controladoria-Geral da União

CONSELHOS

Órgãos colegiados criados por lei, formados por representantes do Poder Público e da sociedade. Envolvem o planejamento e o acompanhamento de ações, existindo a nível nacional, estadual e municipal. São exemplos de temas de conselhos: cidades, alimentação escolar, saúde, educação, juventude, assistência social, população idosa, direitos da criança e do adolescente e mulheres.

CONFERÊNCIAS

Reuniões de debate coletivo, com a participação do Governo e da sociedade. O objetivo é estabelecer prioridades políticas para determinado período de gestão. Uma conferência municipal leva propostas à conferência estadual correspondente, que, por sua vez, envia as medidas debatidas para a etapa nacional, momento em que são escolhidas as propostas finais da conferência.

SERVIÇO DE INFORMAÇÃO AO CIDADÃO (SIC)

Responsável por atender pedidos de acesso à informação feitos ao Ministério da Economia, com base na Lei de Acesso à Informação (nº 12.527). As demandas de informação podem ser registradas pela internet ou pelo protocolo do Ministério da Economia. Tanto pessoas físicas quanto jurídicas podem fazer a solicitação, não sendo necessário justificar.

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Cidadãos têm o direito de expressar opiniões sobre projetos de lei e outros tipos de decisões políticas, por meio de debates, assembleias ou protestos
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