Breves apontamentos sobre as memórias do P. João Rosa, relativas ao encanamento do rio Este

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Breves apontamentos as memórias

do

sobre

P.º João

relativas ao encanamento

Rosa,

do rio Este —M. A. MARTINS DE ARAÚJO (*)

1 — INTRODUÇÃO Num pequeno estudo sobre a rede hidrográfica da bacia do rio Este, tive a possibilidade de verificar que este, desde a sua nascente (S. Pedro de Este — Braga) até à foz, apresenta-se com um traçado bastante sinuoso, pondo em evidência, nomeadamente na região de Braga, fenómenos de captura de antigos afluentes do Cávado. O rio corre apertado em vales relativamente estreitos, à excepção do troço entre Nine e Cavalões, onde passa um dilatado vale. A medida que caminha para jusante, as vertentes vão-se suavizando. É no seu tramo, entre Nine e Cavalões, que o rio apresenta um percurso perfeitamente rectilíneo, levantando a hipótese de uma acção humana que lhe alterasse o seu antigo leito. Fazendo uma visita à área em questão, ainda aparecem testemunhos do percurso antigo. Pequenos tufos de vegetação ribeirinha, isolados a uma distância razoável do leito actual, juntamente com uma série de topónimos locais (Amiais, Lamela, Lameiro, Boiais, etc.) são casos que nos evidenciam um antigo percurso, desviado por obras de encanamento.

2— AS da

MEMÓRIAS

DO

PADRE

JOÃO

ROSA

Na Fundação Cupertino de Miranda, foi-me dado conhecimento existência de umas memórias da freguesia do Louro, compiladas (*)

Estudante

de Geografia.

87


pelo Padre João finais do século vários,

Pereira Gomes Rosa, Pároco XIX. Reunidas em 6 tomos

relacionados

com

a vida

local,

estas

nesta freguesia nos e abordando temas

memórias

são

documen-

tos preciosos (à espera que alguém se debruce sobre elas) de carácter sócio-económico da região. É no 6.º tomo que nos aparecem uma série de documentos sobre o encanamento do Rio Este, desde a ponte de Coura (Nine) até à ponte de S. Veríssimo, na freguesia de Cavalões, Num documento datado de 1770, vê-se o estado péssimo das terras da Veiga do Louro. Um outro documento afirma que o rio, desde Nine a Cavalões, dava prejuízos gravíssimos à agricultura com as grandes inundações, devido às «desordenadas voltas, ângulos e rodeyos». O rio estava povoado por inúmeras azenhas, moinhos e açudes que em conjunto com as grandes e desenvolvidas sinuosidades faziam com que «as areias parassem». Verificavam-se mudanças de leito em sucessivas subidas dando origem, principalmente no Inverno, a uma grande e extensa lagoa. No Verão prevaleciam uma série de lagoas pequenas em todo o Vale, assumindo o terreno características de um pântano. Sobre as águas encharcadas com folhas, ervas e arbustos em decomposição, formavam-se nuvens de insectos, que de algum modo eram veículo de certas enfermidades. Tendo em conta a situação lastimosa que se encontravam os terrenos e as graves consequências para a agricultura, os moradores da freguesia do Louro e freguesias circunvizinhas entram em deligências com as autoridades competentes para que se procedessem a obras de encanamento do rio. As suas justas aspirações foram coroadas de êxito em 1787, ano em que D. Maria IT (através do Provedor da Comarca de Viana) aceita o pedido dos moradores e manda encanar o rio desde a ponte de Coura até Cavalões. Após ser feito um orçamento das obras, com um custo de aproximadamente 6 5004000, foi decretado um imposto real pelas freguesias do Julgado de Vermoim para o pagamento das mesmas (um real em cada

quartilho

de

vinho

e

arratel

de

carne

que

se

vendesse

nas

ditas freguesias). Nos trabalhos efectuados procedeu-se a um aprofundamento do leito em direcção rectilínea, para que fosse facilitado o escoamento das águas, tendo em conta o fraco declive do leito. É curioso registar

e paredes

divi-

sórias de propriedades sugere-nos um grande

que

5 e mais palmos debaixo da terra. trabalho de deposição e acumulação

Isto dos

materiais

pelo

88 —

durante

as

obras

transportados

foram

encontrados

caudal

do

rio.

marcos


3— OS

CANAIS

DE

IRRIGAÇÃO

NA

FREGUESIA

DE

NINE

O encanamento do rio, que na generalidade correspondeu a um enxugo dos campos, não foi, de certo modo, solução para fim desejado, pois a grande sangria de humidade que a terra sofreu, ameacava esterilizá-la. Tornou-se então necessário encarar uma irrigação, pois se o anterior excesso de humidade era prejudicial, também o era a excessiva secura, Ássim, requereram os moradores da freguesia de Nine a construção de um açude (no lugar de Romão) para facilitar a condução de água em dois canais de irrigação. A 26 de Janeiro de 1797, a Rainha D. Maria I defere o requerido, encarregando de estudo e construção dos canais o Eng.º Custódio José Gomes de Vilasboas, tenente do Corpo Real de Engenharia. É este estudo digno de grande elogio devido ao seu ponto de vista técnico e aspecto social sob o qual foi considerado. Os terrenos beneficiados pela irrigação tinham uma área de 60 a 70 ha. O autor do projecto acaba afirmando que «tudo isto me lisonjeia de que verei pela primeira vez canais de rega na província do Minho, e que da sua introdução colherá o Estado acumuladas vantagens».

* Aqui fica uma pequena informação, fruto da curiosidade, das grandes obras que nos finais do séc. XVIII, deram um cunho diferente à paisagem do vale do rio Este.

— 89


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