Capítulo 32 | Arsenal Subaquático

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Secretaria Municipal da Cultura de Novo Hamburgo, apresenta:

Pela Voz de um Gato Pardo de Maurício Fülber

Parte III O Arsenal Mágico de Rubicântigo Capítulo 32

Arsenal Subaquático

Capítulos completos disponíveis em: linktr.ee/estudiofulber


Capítulo 32

Arsenal Subaquático Quando saltaram no mar, muito certas e conscientes de suas funções na inserção que fariam na Prisão Pendular, não esperavam certos contratempos em seus planos. O frio da água não chegou a ser um grande problema, pois estavam protegidas por roupas subaquáticas térmicas que conseguiram segurar um pouco o frio que lhes assolaria. Cada uma delas tinha consigo, também, um respirador muito útil, visto que nenhuma delas respirava embaixo d'água, o que se tornou uma parte imprescindível desse primeiro momento do resgate. Seguiram nadando, em diferentes qualidade de movimento mas razoavelmente treinadas, até alcançar uma grade que seria a entrada inferior da prisão e sua única forma de acesso real. Protegendo a entrada, haviam dois peixes guardas que teriam, com certeza, muita agilidade nesse ambiente. Kyrily sacou sua espingarda de bolhas, um item que haviam desenvolvido especialmente para esse momento e se escondeu atrás de um grande recife de corais que estavam mais abaixo da posição dos guardas e se preparou para atirar. Lundra, Menphis e a Coruja aguardaram um pouco mais afastadas, escondidas em outra parte dos corais, aguardando o sinal dela. - Alvo avistado, amor - disse Kyrily no rádio para Hermessim, que acompanhava a inserção em seu laboratório em Rubicântigo juntamente do Grande -2-


Livro de Lendas através de câmeras acopladas aos respiradores que as quatro estavam usando. - Alou, alou, alou minhas queridas invasoras! respondeu o Grande Livro, . - Não fique interrompendo nossa comunicação, Livro! Cada instante é muito importante neste momento, não podemos nos distrair falando mais do que o necessário e sendo divertidinhas, precisamos de total objetividade e muito foco e concentração e não de palestrinhas aleatórias que eu sei que vocês costuma fazer, eu vou ficar de olho, veja bem, mas sim, pode ficar junto aqui vendo a invasão delas porque vai ser muito divertido e vamos por em teste os nossos novos equipamentos e eu estou muito empolgada! - apontou Hermessim, nitidamente divagando excessivamente após ter apontado a necessidade da objetividade do momento. - “Por em teste os equipamentos” você disse? perguntou Menphis pelo rádio. - Detalhe, detalhe, tá tudo funcionando muito bem, na teoria tá tudo seguindo como o esperado respondeu Hermessim. - Quando algo sair segundo o que não for esperado lembre de nos avisar com alguma antecedência então. - Claro, pode ter certeza, estou monitorando tudo aqui, desde o nível de oxigênio, presenças nos arredores, carga dos equipamentos, tudo sob controle! Kyrily aguardou pacientemente até que todas fizessem seus apontamentos e retomou: - Alvo desavistado, amor. Mas avistei um novo, caso esse interesse um pouco mais a atenção de vocês. -3-


E oi, Livro! Que bom que você está nos acompanhando, lembre de escrever muito bem o que acontecer aqui pra termos essa história pra posteridade. - Sem dúvida nenhuma! Pode contar comigo, estou duzentos por cento atento, será uma obra magnífica, monumental, colossal, histórica e muito gostosa de se ler! Uma pena tinteira mágica surgiu de entre as páginas do Grande Livro de Lendas de Rubicântigo e começou a anotar de maneira flutuante tudo que acontecia, com alguns floreios e liberdades poéticas, diga-se de passagem, mas muito bem escritas. Com certeza, entre os diversos Grandes Livros, este era um dos que se permitia uma maior liberdade estilística em seus relatos, mas sem perder a veracidade dos fatos. - Pode disparar - autorizou, finalmente, Hermessim a Kyrily. A arma utilizada por ela era extremamente específica para utilização debaixo d'água pois disparava bolhas, ou seja, em terra firme sua atividade principal seria, no máximo, servir como ventilador para dias de calor intenso que precisassem de uma corrente contínua de ar para diminuir a sensação térmica de se estar próxima a um vulcão. Porém, em uma situação como a que se apresentava no momento, ela era extremamente útil, com uma tecnologia surpreendente. Ao apertar o gatilho, a arma produziu uma bolha do tamanho de uma bola de basquete que disparou em direção a um dos peixes-guarda e o atingiu na cabeça, fazendo com que ele levitasse através do mar em direção à superfície. Importante apontar que as -4-


criaturas marítimas deste mundo também possuem a habilidade de respirar ar, podendo viver tanto na sociedade em terra quanto no mar, de forma que esse processo causou apenas um desconforto no guarda quando este pensou “lá se vai meu prêmio de funcionário do mês depois dessa, aiai”. - Boa, garota! Um disparo excelente! - Bradou o Grande Livro efusivamente. - Nada menos do que o esperado de nossa grande Kyrily, que será eternamente lembrada como nosso ás da distância, a pontaria certeira, a grande mestra da arma de bolhas! Kyrily, a Embolhadora! - Eu espero que você tenha outras opções além de “a Embolhadora” - apontou Kyrily pelo rádio enquanto disparava contra outro peixe-guarda. - Posso pensar em outras opções, mas acredito que logo mais você vai começar a gostar desse título. - Talvez possa me acostumar - e disparou contra o terceiro peixe-guarda, encerrando as atividades de segurança externa do local em uma fração de segundo. Com a ameaça de serem descobertas anulada, avançaram em direção a grade de proteção que era a entrada e iniciaram um extremamente complicado sistema de desabilitação de trancas. O equipamento que seria prontamente utilizado era carregado pela Coruja, como uma mochila, pois era o mais pesado e suas asas conseguiam criar uma boa força de impulsão debaixo d’água, compensando o peso e mantendo a unidade de velocidade e furtividade da equipe. Ao ser conectado a grade, a mochila de metal cheia de engrenagens começou a se transformar e abrir diversos compartimentos por onde saíram pequenos -5-


braços mecânicos que iniciaram um processo paralelo de tentar destrancar os inúmeros cadeados, trancas e fechaduras, enquanto tentava encontrar a melhor forma de romper as grades com serras e lasers. O que acontecesse primeiro já estava valendo, sem muito critério, o importante era mesmo o tempo ganho, então podemos dizer que iniciou uma corrida entre a parte da mochila que tentava resolver a tranca e a parte dela que tentava cortar as grades e, claro, o Grande Livro não deixou essa oportunidade passar: - O embate do século começou! De um lado da mochila mecatrônica temos os Destrancadores e do outro os Cortadores! Quem sairá vitorioso desse embate? Façam suas apostas enquanto ainda há tempo! Ambas as funções estão gastando um bom momento analisando suas opções, calculando a melhor rota de inserção para começar seu embate! A Coruja parece um pouco incomodada com a minha narração então vou ficar em silêncio - conclui sabiamente. - Na verdade não é um embate, Livro, elas estão trabalhando em conjunto para definir o melhor plano de ação e não gastar tempo e recursos sem necessidade - apontou a Coruja. - Exatamente, por favor, não nos coloque como rivais, nós somos parceiras - respondeu a Mochila Mecatrônica, com uma mensagem coletiva de todas as suas inteligências artificiais internas. - Oh, claro, desculpem, vou refrasear, fui levado pela empolgação e tensão do momento, mas agora entendi o que está acontecendo - compreendeu o Livro.

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- Nós somos uma equipe, precisamos atuar como um organismo só nesse momento, lembre disso, querido amigo - concluiu a Coruja. O Grande Livro percebeu, nesse momento, que a história tem sido carregada sempre pelos conflitos, pela narrativa das guerras e dos grandes desbravadores e conquistadores. Por aqueles que lutam e são agraciados com a glória histórica por terem sido vencedores. Normalmente de batalhas que não precisavam ter acontecido. Essa percepção fez o Grande Livro perceber que ele era grande apenas no nome, pois estava retratando a história da mesma forma que sempre se fizera antes, através do conflito, do drama, do ponto de vista que mostrasse a luta. Mas nem tudo é luta, percebeu. Muito se alcança pelo amor e pelo trabalho em conjunto, pela tentativa de se fazer algo pensando não na glória pessoal, mas no coletivo e na comunidade. Ele percebeu que deveria narrar não só os conflitos e dramas, mas também aquilo que era calmo, coerente, tranquilo e pacificador. Mostrar em suas páginas não só a tristeza e tragédia do mundo que cria heróis que foram monstros, mas também a sutileza daquilo que mudou o mundo em sua sutileza e tranquilidade. Ele percebeu que poderia sim, escrever páginas onde ações não violentas inspirassem uma mudança de pensamento e não o ímpeto de conquista e glória. O Grande Livro, neste momento, retirou de si a alcunha de Grande, pois era prepotente se proclamar assim, e passou a ser apenas o Livro de Lendas de Rubicântigo, ainda refletindo sobre o conceito de Lendas, pois nele também percebeu que Lendas são criadas como algo fora da realidade. -7-


Enquanto o Livro se degladiava internamente em uma crise existencial e de identidade, a Mochila Mecatrônica havia concluído sua análise e decidiu que utilizaria seus mega processadores para simplesmente destrancar a grade, pois percebeu que apenas uma das trancas era real, enquanto as outras eram armadilhas que ativariam alarmes e possivelmente bombas. Ao descobrir a tranca real, iniciou um processo intrincado de entender o complexo sistema de segurança interna e código de acesso. Depois de um minuto de calculados movimentos com seus diversos bracinhos mecânicos, a entrada estava aberta, a mochila voltou para as costas da Coruja e elas seguiram adiante em sua missão de resgate.

...continua… -8-


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