Decisão STJ Mouhamad

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Superior Tribunal de Justiça SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Nº 2.944 - AM (2018/0044282-6) RELATORA REQUERENTE REQUERIDO INTERES.

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MINISTRA PRESIDENTE DO STJ MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO MOUHAMAD MOUSTAFA DECISÃO

Vistos, etc. Trata-se de pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para sobrestar decisão monocrática proferida pela Relatora no Tribunal Regional Federal da 1.ª Região do Mandado de Segurança Criminal n.º 0031155-60.2017.4.01.0000/AM, a qual deferiu liminar para suspender determinação do Juiz da 4.ª Vara Federal da Seção Judiciária do

Amazonas,

proferida

nos

autos

da

Alienação

de

Bens

do

Acusado

n.º

0015777-04.2016.4.01.3200. Conforme relata o próprio Requerente, "a Polícia Federal representou pela alienação antecipada e uso imediato de diversos automóveis e uma embarcação, apreendidos durante as investigações da Operação Maus Caminhos, IPL n.º 1199/2015 " (fl. 3). O Juiz Federal de primeiro grau deferiu a pretensão, em ato em que foram consignadas disposições assim redigidas (fls. 4-5): "[A]nte o exposto, DEFIRO o pedido de utilização do bem apreendido formulado pelo DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL DO AMAZONAS, representado na pessoa do Superintendente Regional, DPF MARCELO SÁLVIO REZENDE VIEIRA, a fim de que o referido órgão público obtenha a guarda provisória, mediante depósito, da embarcação tipo Lancha, do veiculo Honda Civic LXS Placa LUT 1450 (fls. 26/27) e dos veículos elencados no ANEXO II […] Desta forma, defiro o pedido do Departamento de Polícia Federal quanto à alienação antecipada dos bens descritos no ANEXO I […]" Contra essa decisão, Mouhamad Moustafa interpôs no Tribunal Regional Federal da 1.ª Região a Apelação n.º 15777-04.2016.4.01.3200. Para conferir efeito suspensivo ao referido recurso, o Interessado impetrou na mesma Corte o Mandado de Segurança n.º 0031155-60.2017.4.01.0000/AM, cujo pedido liminar foi parcialmente deferido, nos seguintes termos (fl. 5): "[D]iante desse contexto, tendo em vista que a legislação em que estariam enquadradas as condutas delituosas que deram ensejo à apreensão Documento: 81578689 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 02/04/2018

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Superior Tribunal de Justiça dos bens de que se cuida, nada dispõe acerca de sua utilização ou alienação antecipada, identifico, em exame provisório, “a probabilidade do direito vindicado e o perigo de dano irreparável ou o risco ao resultado útil do processo”. Isso posto, DEFIRO, em parte, o pedido de liminar, para conferir efeito suspensivo ao recurso de apelação interposto nos autos do procedimento de Alienação de Bens do Acusado n. 0015777-04.2016.4.01.3200. " Daí o presente pedido, em que o Requente alega, em suma, que a) "a deterioração dos automóveis pertencentes ao impetrante MOUHAMAD MOUSTAFA, apreendidos há mais de um ano e quatro meses, é preocupante, pois permanecem em local aberto, sem proteção contra intempéries " (fl. 8); b) "automóveis de luxo (Porsche, BMW, Mercedes e outros) estão se deteriorando ao relento, em razão da falta de estrutura físico-administrativa para adequada conservação e segurança dos mesmos " (ibidem ); c) "em condições de guarda e manutenção adequadas, o bem chega a depreciar-se quase 10% (dez por cento) pelo mero decurso de um ano, certamente essa desvalorização será ainda maior com a deterioração do bem pelo desuso e falta de proteção contra o clima (sol e chuva) " (fl. 9); d) "segundo a denúncia contra o acusado MOUHAMAD MOUSTAFA, a organização criminosa por ele liderada apropriou-se de R$ 43.548,507,62 (quarenta e três milhões, quinhentos e quarenta e oito mil, quinhentos e sete reais e sessenta e dois centavos), valores ainda sujeitos a correção e a eventual majoração, a depender do que for apurado no curso da instrução criminal, [...] sendo que o dever de indenizar o dano causado pela prática de crime e de ressarcir o Estado são fundamentos que autorizam o arresto e sequestro de bens" (ibidem ); e) "os bens em litígio estão em processos de deterioração e de depreciação, gerando ônus adicional e excessivo com sua guarda e conservação, o que se traduz em prejuízo ao erário " (ibidem ); f) ocorre violação da "ordem pública – na qual se insere conceito de ordem administrativa –, pois impõe ao Estado-administração despesas referentes às providências que terão de ser adotadas para a guarda e conservação dos bens, os quais eventualmente serão utilizados para ressarcir o erário pela prática de crimes que resultaram na apropriação de recursos públicos " (fl. 11); e g) há ofensa à "economia pública – na qual se insere o conceito de erário –, porquanto, dependendo do grau de deterioração, os bens fatalmente resultarão em sucata, e não serão suficientes para ressarcir os danos já causados ao patrimônio público, titularizado ao fim e ao cabo por toda a coletividade " (ibidem ). Ao final, formula o seguinte pedido (fl. 13): Documento: 81578689 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 02/04/2018

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Superior Tribunal de Justiça "Ante todo o exposto, postula o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pela suspensão da liminar proferida pela Desembargadora Federal Rogéria Maria Castro Debelli, em 30.8.2017, nos autos do Mandado de Segurança Criminal nº 0031155-60.2017.4.01.0000/AM, para que sejam restabelecidos os efeitos da decisão que deferiu o uso e a alienação de determinados bens sequestrados na Operação “Maus Caminhos”, nos autos do procedimento nº 15777- 04.2016.4.01.3200. " É o relatório. Decido. O manejo de pedido suspensivo não é possível na hipótese. Conforme o regime legal de contracautela – Leis n.os 7.347/1985 (art. 12, § 1.º), 8.038/90 (art. 25, caput e parágrafos), 8.437/92 (art. 4.º, caput e parágrafos), 9.494/97 (art. 1.º), 9.507/97 (art. 16) e 12.016/09 (art. 15, caput e parágrafos) –, em controvérsias infraconstitucionais, compete à Presidência do STJ suspender os efeitos de decisões que concedem ordem mandamental ou que deferem liminar ou tutela de urgência proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes. A propósito, dispõe o art. 4.º da Lei n.º 8.437/92 o que se segue: "Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender , em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes , a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. " (grifei) Ou seja, é pressuposto para que o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso possa suspender a execução de medidas cautelares a tramitação de ação cognitiva originariamente proposta contra a Fazenda Pública, com a finalidade de impugnar seus atos. Isso porque a mens legis do instituto da suspensão de segurança é a de reparar situação inesperada que promova alteração no status quo ante em prejuízo do Poder Público. Nesse sentido, cite-se o escólio de Marcelo Abelha Rodrigues: "Tal instituto foi criado como meio processual para que o Poder Público, na condição de réu, possa dele valer-se para impedir que uma decisão judicial, provisoriamente executada , tenha eficácia que cause risco Documento: 81578689 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 02/04/2018

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Superior Tribunal de Justiça de lesão a determinado interesse público . Por isso, a finalidade do instituto é amordaçar a eficácia executiva de uma decisão proferida contra o Poder Público, para que se mantenha de pé e intacta uma situação jurídica anterior ao processo. " (Suspensão de Segurança - Sustação da eficácia de decisão judicial proferida contra o Poder Público. 3.ª ed., revista, atualizada e ampliada. São Paulo: RT, 2010, p. 146 – grifei.) No caso, a pretensão da parte Requerente é a de ver reformada a decisão monocrática proferida em segundo grau de jurisdição que suspendeu a tutela deferida pelo Juiz singular nos autos da Alienação de Bens do Acusado n.º 0015777-04.2016.4.01.3200 – ajuizada pela Polícia Federal. Portanto, a decisão impugnada não foi proferida em ação manejada inicialmente em desfavor de pessoa jurídica de direito público. Tal fato foi ressaltado pelo próprio Ministério Público na inicial do presente feito, ao destacar que, originariamente, a Polícia Federal representou "pela alienação antecipada e uso imediato de diversos automóveis e uma embarcação, apreendidos durante as investigações da Operação Maus Caminhos " (fl. 3). Ou seja, esclareceu o próprio Requerente que a Fazenda Pública não é ré na ação principal Dessa forma, reitere-se, o manejo de requerimento suspensivo não é possível na hipótese. No ponto, cito julgados: "AGRAVO INTERNO NA SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA. AÇÃO MOVIDA PELO PRÓPRIO PODER PÚBLICO . AUSÊNCIA DE EXECUÇÃO DE DECISÃO PROVISÓRIA EM DESFAVOR DO ESTADO. IMPOSSIBILIDADE DE PROVOCAR GRAVE LESÃO AOS BENS TUTELADOS NA LEI N.º 8.437/1992. NÃO CABIMENTO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO. INDEVIDA UTILIZAÇÃO DO INCIDENTE COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. PEDIDO DE SUSPENSÃO NÃO CONHECIDO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. O pedido de suspensão de liminar tem como pressuposto a execução provisória de decisão judicial proferida contra o Poder Público e visa o sobrestamento da respectiva eficácia, porque presente o potencial lesivo ao interesse público tutelado pelo art. 4.º da Lei n.º 8.437/1992. Assim, o manejo do incidente suspensivo, via excepcional de defesa do interesse público, depende da existência de ação cognitiva em curso proposta contra o Poder Público requerente, como dispõem os §§ 1.º e 9.º do art. 4.º da referida lei. 2. A exigência legal de que a ação tenha sido ajuizada em desfavor do Poder Público tem sua razão de ser, na medida em que objetiva a proteção contra situação de surpresa a que o ente público poderia ser submetido, resguardando a coletividade de potencial risco de lesão aos bens legalmente tutelados. Se assim não fosse, o excepcional instituto da suspensão de liminar Documento: 81578689 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 02/04/2018

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Superior Tribunal de Justiça serviria como um mero sucedâneo recursal, a ser utilizado quando prolatada decisão desfavorável ao Poder Público em demanda por ele mesmo proposta. 3. No caso, não há decisão judicial provisória sendo executada em desfavor do Estado do Maranhão. A real pretensão veiculada no presente pedido suspensivo é a obtenção de reforma da decisão liminar que suspendeu o provimento favorável ao estado obtido na origem. Assim, a toda evidência, tem-se a utilização do instituto como sucedâneo recursal. 4. Agravo interno desprovido. " (STJ, AgInt na SLS n.º 2.272/MA, Rel. Min. LAURITA VAZ – Presidente –, Corte Especial, julgado em 6/9/2017, DJe 14/9/2017 – grifei) "MAJORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO ESPECIAL. PROCURADORES ESTADUAIS APOSENTADOS. DECISÃO DETERMINANDO O BENEFÍCIO. PEDIDO SUSPENSIVO DEFERIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. NOVOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS. APRESENTAÇÃO DE ARGUMENTAÇÃO NOVA. INOVAÇÃO NÃO PERMITIDA. I - [...]. II - In obter dictum, de acordo com os preceitos do art. 271 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, a decisão proferida em suspensão de segurança vigora até o trânsito em julgado da ação movida contra o estado , não sendo essa a situação apresentada . Embargos de declaração não conhecidos. " (STJ, EDcl nos EDcl no AgRg na SS n.º 2.753/BA, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO – Presidente –, Corte Especial, julgado em 2/3/2016, DJe 14/4/2016 – grifei.) Além do mais, a suspensão, por sua estreiteza, não visa a substituir as vias de impugnação processuais adequadas, sob pena de ser indevidamente utilizada como atalho para a jurisdição de instância superior ou como mero substituto recursal – o que não é o propósito do instituto. Na espécie, observa-se que o Requerente, na verdade, formulou pedido em que pretende a reforma de decisão contrária ao provimento que obteve em primeiro grau de jurisdição. Evidente, portanto, que manejou indevidamente a via da suspensão como sucedâneo recursal, o que também não é possível. A propósito, cito precedentes, mutatis mutandis : "AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE LIMINAR. CONTRATO ADMINISTRATIVO. TERCEIRIZAÇÃO DE MÃO DE OBRA. AUSÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM E À ECONOMIA PÚBLICAS. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU A SUSPENSÃO DE LIMINAR. CONTROLE DE LEGALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PELO PODER JUDICIÁRIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES AGRAVO. REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. Documento: 81578689 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 02/04/2018

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Superior Tribunal de Justiça I – Decisão agravada que indeferiu o pedido de contracautela diante da ausência de comprovação da alegada lesão à ordem e à economia públicas. II – O Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de que não viola o princípio da separação dos poderes o exame, pelo Poder Judiciário, do ato administrativo tido por ilegal ou abusivo. Precedentes. III – A contratação administrativa para a mera alocação de mão de obra, inclusive para o desempenho de atividades finalísticas da administração pública, pode ser danosa ao interesse público, ferindo os comandos constitucionais inseridos no caput e no inciso II do art. 37. Risco de dano inverso. Precedente. IV – Alegações suscitadas na peça recursal que ultrapassam os estreitos limites da presente via processual e concernem somente ao mérito, cuja análise deve ser realizada na origem, não se relacionando com os pressupostos da suspensão de liminar . V – Agravo regimental ao qual se nega provimento. " (STF, SL n.º 885 AgR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – Presidente –, Tribunal Pleno, julgado em 25/11/2015, DJe 2/12/2015 – grifei.) "1. SUSPENSÃO DE LIMINAR. Lesão à economia pública. Não ocorrência. Pedido indeferido. Jurisprudência assentada. Ausência de razões consistentes. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a impugnar, sem razões consistentes, decisão fundada em jurisprudência assente na Corte. 2. RECURSO. Agravo Regimental em Suspensão de Liminar. Argumentos que guardam pertinência com a causa principal. Inadmissibilidade. Agravo regimental improvido. Precedentes. A jurisprudência desta Corte veda o uso dos pedidos de contracautela como sucedâneo recursal ." (STF, SL n.º 391 AgR, Rel. Min. CEZAR PELUSO – Presidente –, Tribunal Pleno, julgado em 18/5/2011, DJ 1/6/2011 – grifei.) Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do pedido. Publique-se. Intimem-se. Brasília – DF, 26 de março de 2018.

MINISTRA LAURITA VAZ Presidente

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