Revista Entrementes Edição de Outono

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Ano 3 - Edição 5 - Outono de 2016 www.entrementes.com.br

CONECTANDO IDEIAS ARTE - CIÊNCIA - ESOTERISMO - FILOSOFIA

EDIÇÃO DE OUTONO NOITE OFICIAL DOS OVNIS NO BRASIL

Um evento extraordinário que aconteceu na cidade de São José dos Campos.

ENTREVISTA COM JOÃO TIMANE

Escobar Franelas entrevista o artista plástico de Moçambique

POESIA X POETAS

Uma linda coletânea de Poemas e Poetas, em comemoração ao mês da Poesia.

OSCAR 2016

As Daltopiniões do nosso crítico de cinema sobre o Big five do oscar.

NAS LEITURAS DE “CORAÇÃO A BOMBORDO” Joka Faria e suas impressões do novo livro de Domingos dos Santos.

ILHA DO MEL - PARANAGUÁ - PARANÁ A guia Ana Maria Alcides mostra os detalhes e imagens de um dos lugares mais lindos do Paraná.

CANTO DA CULTURA

Irael Luziano - Um cometa que passou brilhante pelo Canto da Cultura.


Editorial Apresento-lhes a nova edição da Revista Entrementes. Essa bela Estação de Outono nos sugere acolhimento e reflexão, buscando a introspecção através da leitura de textos suaves e profundos. Como diz o Poeta “São as águas de março fechando o verão/é promessa de vida no meu coração”. Março, o início do outono e o mês da Poesia. Essa donzela que nos carrega para além do mundo tridimensional de Euclides. Essa edição, em estado de profunda interiorização oferece um maior número de poesias aos nossos queridos leitores. São obras dos poetas que colaboram com o Portal Entrementes e com a Revista. Além da poesia, textos que levam a uma maior reflexão diante do mundo que vivemos, claro que de um ponto de vista mais holístico. O mundo do jeito que está, precisa urgentemente de seres mais elevados para vencer a lei da entropia. Conectando ideias, conectando Revista Entrementes - Edição de Outono. Boa leitura a todos e um Outono de muita conexão! Elizabeth de Souza

Sumário ENTRE VERSOS E PROSAS 22 - Obra quase primas - Por Marcelo Pirajá Sguassabia 08 - Maurice, o pianista - Por Germano Xavier

POESIAS X POETAS 13 - Dailor Varela - Dalto Fidencio - Domingos dos Santos Elizabeth de Souza - Joana D’Arc - Joka Faria - Jorge Xerxes Luisa Fresta - Mari Osses - Nunes Rios - Paulo Vinheiro Ricola de Paula - Sanjo Muchanga - Suzete Piovezan Teresa Bendini - Tonho França - Wilson Gorj

ENTRE CINE 04 - Oscar 2016 - Por Dalto Fidencio

ENTRE CLÁSSICOS 23 - Cidadão Kane - Por Germano Xavier

ENTRE CULTURA 03 - HQ: Uma arte que precisa ser redescoberta - Por Wagner Ribeiro

ENTRE METAFÍSICA 24 - Evangelhos Apócrifos - Por Joka Faria

ENTREVISTA 25 - Entrevista com João Timane - Por Escobar Franelas 09 - Entrevista com Joana D’Arc - Por Isis de Anils

ENTRE SONS 12 - O Saudosismo Musical - Por Paola Domingues

ENTRE FILSOFIA 21 - De homens e dúvidas - Por Ronie Von R. Martins

ENTRE TESES E ANTÍTESES 06 - Mente escura - Por Rafael Arrais

ENTRE AUTORES

Expediente Ano 3 - Edição 5 - Outono de 2016 Editor e Jornalista responsável: Elizabeth de Souza MTB 0079356/SP Diagramação: Filipe Oliveira Arte da Capa: “Auto-retrato” do artista João Timane

11 - Nas leituras de “Coração a Bombordo” - Por Joka Faria

ENTRE OVINIS 10 - Noite Oficial dos OVNIS no Brasil - Por Renato Mota

ENTRE TRILHAS E VIAGENS 28 - Ilha do Mel - Paranaguá - Paraná - Por Ana Maria Alcides

CANTO DA CULTURA 30 - Irael Luziano - Por Elizabeth de Souza


ENTRE CULTURA

HISTÓRIA EM QUADRINHOS: Uma arte que precisa ser redescoberta Por Wagner Ribeiro

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omo sou envolvido com este universo dos quadrinhos por vários anos quero dar algumas informações sobre tal arte. Das pinturas rupestres em cavernas a Rudolf Töpffer (artista e escritor suiço) por exemplo, temos milhares de anos que os separam, ou de Angelo Agostini à Fábio Moon e Gabriel Bá temos quase 150 anos, porém uma mesma motivação, informação descritiva. Podemos chamar de literatura em estampas, arte sequencial, banda desenhada e o mais popular, história em quadrinhos. Talvez o diminutivo “quadrinhos” remeta a uma ideia de algo ligado diretamente ao público infantil, porém diz respeito ao formato da página dividida em pequenos quadros. Possuímos trabalhos excepcionais na história da humanidade como Ao Coração da Tempestade e O Edifício de Will Eisner, por exemplo, que possuem narrativa e arte que se distanciam e muito de histórias de super-heróis, tratando tão bem do quotidiano e abordando o preconceito. Temos Flavio Colin e seu traço inconfundível navegando pelo misticismo e história brasileira, o surrealismo da parceria Neil Gaiman e Dave McKean, a escatalogia urbana de Marcatti e Angeli, Revistas como Heavy Metal, que por definição eram chamados de quadrinhos adultos, pelas abordagens mais substanciais da ficção, erotismo e fantasia que os diversos artistas participantes nos ofereciam, a sátira de MAD. O estrondoso sucesso do Elseworld de Frank Miller, Cavaleiro das Trevas, e que tal citarmos Moon Shadow, A Garagem Hermética, Dylan Dog, lembrar de Alan Moore, Robert Crumb, A minissérie Bruxaria, ou mesmo Watchmen, que não permite em definitivo sua compreensão em uma primeira leitura, muitas vezes sendo abordada apenas como uma revista sobre super-heróis, como bem exemplificado no fisco cinematográfico. No mundo da arte, possuímos o teatro, escultura, literatura, cinema, TV dentre outras manifestações assim como os quadrinhos, em que se abordam os temas tanto infantis quanto o adulto, sendo assim, dentro das histórias em quadrinhos possuímos as diferentes formas de se explorar essa forma de comunicação. Hoje inclusive, para promover a produção nacional e apoiar o vasto material produzido no Brasil e o potencial de seus criadores, temos o projeto de lei n.º 60602009 para a produção de HQs, que é a proposta da lei

de incentivo para a produção, publicação e distribuição de revistas em quadrinhos nacionais, gerando alguma polêmica, mas que irá favorecer a prata da casa com 20% de espaço do que se comercializa, levando em consideração a campanha massiva internacional, onde se vende em grande quantidade dentro do país material de qualidade questionável em excesso, devido a grande campanha de marketing. É meus amigos, esse universo ainda precisa ser descoberto por muitos, já se falou que quadrinho é uma opção preguiçosa à leitura de um livro, ledo engano, mas meu bla bla bla em prol não seria muito interessante para mudar tal ponto de vista, mas vale as recomendações citadas acima para tirarem suas próprias conclusões, e saber que existe um universo encantador que sobrevive pacificamente com as outras formas de arte, e tem tanto a dizer quanto. Wagner Ribeiro é escultor que navega pela ficção científica, ocultismo, horror e surrealismo. Desenvolve também audiovisual como videoclipes e documentários, música/ambiências obscuras, e também em apoio ao quadrinho nacional.

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ENTRE CINE

OSCAR 2016 Por Dalto Fidencio

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BEST PICTURE - Melhor Filme Vencedor: Sotlight (Spotlight – Segredos Revelados) Daltopinião: o melhor filme que vi em 2015 foi “Mad Max: Estrada da Fúria”, mas é óbvio que uma produção neste estilo jamais venceria na principal categoria do Oscar, então a briga aqui estava entre dois outros ótimos filmes: “Spotlight – Segredos Revelados” e “O Regresso”. O favoritismo aqui se deu de forma curiosa Spotlight largou na frente quando os filmes foram indicados mas com o passar do tempo, O Regresso atropelou, ganhou enorme notoriedade entre crítica e público, além de ter levado o Globo de Ouro como “Melhor Filme de Drama”, batendo inclusive seu principal rival na corrida pelo Oscar. Por tudo isso, O Regresso era o principal favorito aqui, mas Spotlight correu por fora e acabou sendo eleito o Melhor Filme pela Academia. A película dá uma aula de como se fazer um grande filme sem necessariamente ter uma produção milionária. Baseado numa história real, que deu origem a um livro vencedor do Pulitzer, Spotlight é o nome da equipe editorial do jornal Boston Globe, um time brilhante de jornalistas que investiga uma série de relatos de pedofilia praticados por membros da Igreja Católica em Boston, absurdamente acobertados pela Igreja. O roteiro dá uma aula de como o Jornalismo deve ser feito, e o elenco é brilhante, com grandes atuações de Mark Ruffalo e Rachel McAdams, além da competência de Brian d’Arcy James e Michael Keaton. Os produtores vitoriosos foram: Michael Sugar, Nicole Rocklin e Blye Pagon Faust, que concorriam pela primeira vez, além de Steve Golin, que concorria este ano também por O Regresso (o único nessa categoria que já sabia que sairia vencedor), além de já ter sido indicado em 2006 por “Babel”.

DIRECTING - Melhor Diretor

Vencedor: Alejandro G. Iñarritu, por The Revenant (O Regresso) Daltopinião: seria incrível se o Oscar nessa categoria fosse para o veterano George Miller mas desejos postos de lado, aqui o favorito era mesmo Alejandro G. Iñarritu, já vencedor do Globo de Ouro, que tinha contra si apenas o fato de já ter vencido no ano passado, e se já é raro vencer como Melhor Diretor por duas vezes, fazê-lo por dois anos seguidos é muito mais mas o cineasta mexicano conquistou o bi com todos os méritos, pelo seu fantástico e irretocável trabalho em “O Regresso”. Vitória merecidíssima por um trabalho de Direção grandioso e dificílimo, realizado em locações desafiadoras no Canadá. Incluindo a nomeação deste ano também como produtor para Melhor Filme, esta foi a sétima indicação de Iñarritu, que já havia vencido ano passado por “Birdman ou a Inesperada Virtude da Ignorância” em Melhor Filme, Direção e Roteiro Original, além de ter concorrido em 2006 para Melhor Filme e Direção, por “Babel”.

ACTOR IN A LEADING ROLE - Melhor Ator


Vencedor: Leonardo DiCaprio, por The Revenant (O Regresso) Daltopinião: uma das maiores barbadas da noite era a (justíssima) vitória de Leonardo DiCaprio para Melhor Ator. Ele já havia vencido o Globo de Ouro para Melhor Ator de Drama deste ano e todos esperavam que finalmente conseguisse levar o Oscar para casa, nesta quinta vez em que concorria. Sua atuação em “O Regresso” foi visceral, um show de interpretação num papel em que ele mal tinha diálogos, o que o fez “atuar com os olhos”. Suas impactantes respirações que embaçavam a câmera faziam o cinéfilo estremecer na cadeira do cinema. E tudo isso em locações ao mesmo tempo paradisíacas (pelo visual) e infernais (pela dificuldade em se filmar) no Canadá e na Patagônia, que levaram os atores à se dedicar de corpo e alma ao filme. Minha torcida, apesar de saber que ele jamais venceria, era por Bryan Cranston, pois seria fantástico ver o eterno Walter White ter seu talento reconhecido também na Tela Grande, mas sem dúvida nenhuma o Oscar foi para as mãos corretas. Eu falei no início que esta era sua quinta indicação, mas isso levando-se em conta apenas as atuações, mas ele teve mais uma como produtor de Melhor Filme em 2013, por “O Lobo de Wall Street”, Suas outras indicações anteriores haviam sido: Melhor Ator também “O Lobo de Wall Street”, Melhor Ator por “Diamante de Sangue” (2006), Melhor Ator por “O Aviador” (4004), e Melhor Ator Coadjuvante por “Gilbert Grape – Aprendiz de Sonhador” (1993).

de Hollywood, Jennifer Lawrence, que parece será indicada mesmo se fizer um comercial de cerveja que passe nos cinemas. A atuação de Brie é tocante e espetacular, de uma sensibilidade ímpar, em um roteiro mais do que emocionante. Uma aula de atuação (dela e também de seu parceiro mirim, Jacob Tremblay) em um filme que merece ser visto por todo aquele que ama a Sétima Arte. Vitória merecidíssima, logo na primeira indicação da jovem californiana.

ACTRESS IN A LEADING ROLE - Melhor Atriz

WRITING (ADAPTED SCREENPLAY) - Melhor Roteiro Adaptado Vencedor: The Big Short (A Grande Aposta), por Charles Randolph e Adam McKay Daltopinião: com o perdão do trocadilho infame, a grande aposta da noite nesta categoria era… “A Grande Aposta”! Baseado no livro de Michael Lewis, o roteiro fala da história real sobre a complexa crise imobiliária dos Estados Unidos, ocorrida em 2008. Estupendamente escrito, o roteiro transforma um assunto à princípio maçante numa tempestade de críticas e referências ao modo de vida americano, de forma impactante. Não se pode afirmar que não tenha sido uma vitória justa. Incluindo sua indicação este ano para Melhor Diretor também com “A Grande Aposta”, esta foi a segunda nomeação de Adam McKay. Já Charles Randolph concorria pela primeira vez.

Vencedor: Brie Larson, por Room (O Quarto de Jack) Daltopinião: Brie Larson era a grande favorita, depois de já ter vencido o Globo de Ouro deste ano por seu brilhante trabalho em “O Quarto de Jack”, e acabou dando a lógica, apesar de termos a espetacular Cate Blanchett no páreo, isso sem falar da queridinha

WRITING (ORIGINAL SCREENPLAY) - Melhor Roteiro Original Vencedor: Spotlight (Spotlight – Segredos Revelados), por Josh Singer e Tom McCarthy Daltopinião: não se tinha um favorito destacado nesta categoria, mas “Spotlight – Segredos Revelados” estava um passo a frente dos demais, e o vencedor acabou mesmo sendo o roteiro da dupla Josh Singer e Tom McCarthy, que é sim original mas que se baseou na história real que deu origem a um livro escrito pelo time que participou da apuração do caso. Vale citar também a indicação do longa de animação da Pixar nesta categoria, um fato que não é nada corriqueiro (bem, a não ser quando Pete Docter escreve um roteiro). Esta havia sido a primeira indicação do co-vencedor Josh Singer, já Tom McCarthy, incluindo sua indicação para Melhor Diretor este ano por este mesmo filme, concorria pela terceira vez, já tendo sido indicado pelo Roteiro Original de “Up – Altas Aventuras”, em 2009.

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ENTRE TESES E ANTÍTESES

MENTE ESCURA Por Rafael Arrais

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á tempos que a ciência tem postulado o estudo da consciência humana com um dos maiores desafios do conhecimento humano, talvez mesmo além de uma compreensão elaborada – como, por exemplo, a compreensão que temos do eletromagnetismo ou do nascimento de estrelas –, pois se trata essencialmente de utilizar o próprio objeto em estudo para realizar o estudo em si. O psiquiatra alemão Hans Berger ajudou a iluminar a questão com a criação do eletroencefalograma (EEG), que grava a atividade elétrica no cérebro por meio de um conjunto de linhas ondulatórias sobre um gráfico. Com essa ferramenta, os neurologistas passaram a mapear a atividade elétrica do cérebro, e fazer diversas associações entre impulsos de coordenação motora, estados mentais e de foco de atenção dos inúmeros colaboradores e pacientes estudados nas últimas décadas. Hoje se sabe que a consciência é mais como um processo que coordena decisões de acordo com o fluxo de informação sensorial recebido, ela é como o regente de uma “orquestra mental”. Porém, a análise qualitativa dos fenômenos conscientes complexos, como o amor e as decisões morais, ainda passam ao largo da explicação científica. Este é o famoso “problema difícil”: identificar o que exatamente interpreta informações e elabora respostas morais, em oposto a mera computação das informações. Richard Feynman gostava de comparar a forma como os físicos modernos trabalham com a detecção das ondas de uma piscina: acaso não fosse possível ver quem mergulhou na piscina a pouco tempo, podemos ter uma boa noção de onde e

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quando ocorreu o mergulho, assim como o peso de quem mergulhou, apenas analisando a freqüência e a amplitude das ondas na superfície da água. A ciência lida somente com o que pode detectar – se ela não detecta o amor ou a moral, ao menos pode detectar o efeito elétrico no cérebro que ocasiona as demonstrações de sentimentos complexos. O que a ciência não pode pretender, entretanto, é que tais sentimentos se resumam ao efeito, ignorando a causa... Ou postulando que a causa está além de nosso controle, que é fruto do mero agitar químico do cérebro, como afirma o filósofo Daniel Dennet, o que em todo caso é basicamente o mesmo que ignorar a causa. Carl Sagan já chegou a afirmar que prefere seguir os impulsos de seu inconsciente, que este na maior parte das vezes lhe “guia” para caminhos mais produtivos e sensatos do que sua racionalidade consciente [1]. Ora, mas se a ciência se preocupa em detectar a atividade elétrica do cérebro quando este está em plena atividade consciente, o que dizer de quando estamos sem fazer nada, teoricamente “sem pensar em nada, absolutamente nada”? Em ensaios seminais sobre suas descobertas com as primeiras pesquisas utilizando o EEG em 1929, Berger deduziu, a partir das incessantes oscilações elétricas detectadas pelo aparelho, que “temos de supor que o sistema nervoso central está sempre – e não só durante o estado de vigília – num estado de considerável atividade.” Mas suas idéias foram amplamente ignoradas, até tempos recentes, bem recentes... A tecnologia para se examinar o cérebro se aprimorou: em 1970, veio à tomografia por emissão de pósitrons

(PET, Positron-Emission-Tomography), que mede o metabolismo da glicose, fluxo sanguíneo e absorção de oxigênio para a extensão da atividade neuronal; já em 1992 veio à captação de imagem por ressonância magnética funcional (fMRI, functional Magnetic Ressonance Imaging), que mede a oxigenação do cérebro com o mesmo propósito. Essas tecnologias são mais do que capazes de analisar a atividade cerebral, focada ou não, mas a maioria dos estudos iniciais levou a impressão errônea de que, na maior parte,


as áreas do cérebro permanecem tranqüilas até que sejam requisitadas a desempenhar alguma tarefa específica. Ao longo dos anos, no entanto, alguns pesquisadores [2] começaram a estudar a atividade cerebral de colaboradores simplesmente em estado de descanso, deixando a mente livre para divagar. Eles descobriram que a energia gasta pelo cérebro não varia mais do que 5% entre o estado de vigília e/ ou atividade consciente e o estado de relaxamento completo, quando supostamente não fazemos absolutamente nada a não ser pensar, divagar... A conclusão surpreendente a que chegaram é a de que boa parte da atividade geral – de 60% a 80% de toda a energia gasta pelo cérebro – ocorre em circuitos não relacio-

nados a nenhuma evento externo. Com a devida licença dos colegas astrônomos, os pesquisadores deram a essa atividade intrínseca o nome de “energia escura do cérebro” – referência à energia não visível (não interage com fótons), mas que representa a maior parte da massa do universo. Ficou claro, a partir desse trabalho, que o processo consciente é responsável por apenas uma parte, ainda que crítica, da atividade total de todos os sistemas do cérebro. Como Berger mostrou em primeiro lugar, e muitos outros confirmaram desde então, a sinalização cerebral consiste em um amplo espectro de freqüências, que vão dos potenciais corticais lentos (SCPs, Slow Cortical Potentials) de baixa freqüência até a atividade acima de 100 ciclos por segundo. Um dos grandes desafios da ciência é entender como os sinais de diferentes freqüências interagem. A orquestra sinfônica proporciona uma metáfora adequada, com sua integrada “tapeçaria” de sons provenientes de múltiplos instrumentos que tocam no mesmo ritmo. Os SCPs equivalem à batuta do regente. Só que, em vez de manter o tempo para um conjunto de instrumentos musicais, esses sinais coordenam o acesso que cada sistema cerebral exige para o vasto depósito de memórias e outras informações necessárias para se sobreviver num mundo complexo e em permanente mudança. Os SCPs garantem que as computações corretas ocorram de maneira coordenada, exatamente no momento adequado. Mas o cérebro é muito mais complexo que uma orquestra sinfônica. Ele oscila continuamente entre a necessidade de equilibrar respostas planejadas com demandas imediatas. Os grandes expoentes da psicologia, como William James, Sigmund Freud e Carl Jung, sempre compreenderam o enorme e misterioso papel do inconsciente sobre o consciente. Que o cérebro pode até

ser uma máquina de envio e reenvio de informações, um computador molecular de vasta complexidade, mas ainda assim há que se pensar no que quer que – esteja onde estiver no cérebro – interpreta as informações recebidas e elabora respostas morais e sentimentais... Eis a mente escura, aquela que ainda escapa da lente agitada da ciência, assim como a grande parte da matéria e da energia do universo. Do que é formada? Onde está exatamente no cérebro? Seria ela limitada pelo corpo, ou apenas uma energia que toca as teclas do cérebro enquanto este permanece como um instrumento apto para ser tocado? São ainda muitos mistérios, muitos paradoxos e enigmas, muitos “problemas difíceis” no caminho da ciência... Mas ela não descansará; nós não descansaremos, pois a natureza não nos deixará relaxar. *** [1] Livre interpretação de um breve comentário de Sagan num especial da TV americana, onde ele, Stephen Hawking e Arthur C. Clarke discutiram sobre Deus, o universo e as leis da natureza. [2] Boa parte das informações científicas deste artigo foram retiradas do artigo “A energia escura do cérebro”, capa da Scientific American de Abril de 2010 (ano 8, #95), escrito por Marcus E. Raichle – professor de radiologia e neurologia –, que é um dos principais pesquisadores no assunto aqui abordado. *** Crédito da imagem: Anônimo (representa a disparidade entre a energia gasta no processo consciente, acima da superfície, e a energia gasta pelo inconsciente a todo momento – este tipo de imagem é a metáfora mais utilizada para ilustrar a questão)

Rafael Arrais é webdesigner, desenhista e escritor. Seus livros, artigos, contos e poesias podem ser acessados em http://www. raph.com.br/tpr

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ENTRE VERSOS E PROSA

MAURICE, O PIANISTA Por Germano Xavier

“O silêncio é uma confissão”. Camilo Castelo Branco

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ia nublado. Vento frio varava varandas e pessoas. A noite era perto. Algumas coisas para os distantes desatinos das vistas humanas eram levadas. Uma cidade à espera, esparsas ruas. Um concerto de cordas e Maurice, pianista e compositor, atração maior. Fama de criar curiosas peças para piano. Maurice, antes do dia de hoje, resolvera que iria parar com sua arte. Longos anos. Já era a hora, dissera ao ser entrevistado por uma jornalista da tevê local. Maurice iria se exibir para o público pela derradeira vez. Prometera ao vivo um espetáculo singelo. Uma pequena multidão tomou conta da praça. O pianista tocaria. Palco montado. Maurice faria tudo

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aquilo que um pianista sabe fazer. Maurice entrou no palco, caminhou na direção de seu piano, sentou, ajustou a distância do banco, envergou-se diante das teclas, parou. Maurice respirou profundamente. A plateia observava-o. Eram crianças, jovens, adultos, idosos. Havia um clima de despedida no ambiente. Maurice, neste momento, olhou para cima. Enxergou o firmamento. Céu negro, brilhoso, bonito. Por um momento, as memórias de Maurice pareceram atravessar um túnel do tempo. Havia refluxos, regressões. Não havia o futuro. Maurice, depois de se atravessar com a mente, era somente o agora. Concentrou-se com uma lentidão de moveres. O apresentador do evento, com sua voz radiofônica, incitou a plateia. O início estava perto. Tudo agora estava nas mãos de Maurice, literalmente. Corpo, coração, olhos, mãos, tudo estava em seu devido lugar. Todavia, para espanto coletivo da massa ali presente, Maurice não mexeu um só dedo por longos minutos. 58 minutos, precisamente. Maurice não tocou, não fizera o que haveria de ser feito. Fez o que qualquer pianista em igual situação não faria. Ele não tocou! Não, não! Ele não tocou! O pianista não tocou. Ao piano, Maurice executou o silêncio. O pianista bramiu, em seu ato final, a grande pausa. Fez o piano tocar silêncio para que todos ouvissem os mais rarefeitos sons do mundo, que porventura jamais poderiam ser ouvidos se ele tocasse o teclado preto e branco de seu piano: os tambores dos corações sem pressa, as tonalidades das respirações fogosas, os sussurros das mentes operantes, os chiados nas pregas do couro das poltronas, sorrisos cantantes de crianças felizes, os pigarros carentes, as lamúrias de amor... E todos escutaram pela primeira vez sons inaugurais. Foi como promover nascimenos ali, para muitos que se encontravam no local. Não tocando, Maurice tocou. Era sua última peça. Maurice, diante do negro piano, esperava algo. Era o ápice. O desfecho triunfal. Maurice meditou. O piano, imaculado, tocara naquela noite as melodias mais incríveis. Rapidamente, quase de esguelha, Maurice olhou para as gentes. Levantou delicadamente. Visitou com os olhos o pulso que sustentava o relógio. Achou por bem descer os lances da escada que dava para o fundo do palco. Depois, seguiu a lua.


ENTREVISTA

ENTREVISTA COM JOANA D’ARC (AUTORA) Por Isis de Anils

Isis de Anils entrevista a autora Joana D’arc A. da Silva, que já tem publicado 10 livros, onde trata de assuntos polêmicos. 1- Sites na internet têm favorecido muito a vida de escritores desconhecidos. Você faz parte dessa nova rede de escritores que publicam online. É mesmo fácil publicar pela internet? Que desafios você tem enfrentado? Sites como Clube de Autores e AGBOOK, são de grande ajuda pra novos escritores como eu, que não tenho condições financeiras para publicar seus livros. E é muito fácil publicar um livro, é só se cadastrar e começar a publicar seus livros. O único desafio, é que tenho que divulgar sozinha meu trabalho. Seria de grande ajuda, se esses sites, também ajudassem na divulgação de nossos trabalhos. 2- Em suas obras você aborda temas delicados, tais como, violência contra mulher, suicídio, drogas e AIDS. Esses problemas não são novos e continuam aumentando no Brasil. Existe uma solução para acabar com eles ou pelo menos amenizá-los? Se nossos governantes investissem em educação, o povo teria informação e com certeza não teríamos tantos problemas. Mas, é muito melhor para o governo, manter o povo ignorante, pois assim é mais fácil manipular. Quem sabe mais, tem que respeitar quem sabe menos. E como fazer isso? Transmita o que você sabe, para quem sabe menos, já um bom começo. 3- Para você, o Brasil é um país de poucos leitores , ou essa realidade está mudando com a terceira revolução, a chamada revolução informacional? Hoje em dia, com a internet tudo ficou mais fácil, se você quer um livro ou ouvir uma musica, é só fazer um download. Por isso, as pessoas começaram a ler mais, pois o acesso a literatura ou cultura ficou mais fácil.

com a seguinte frase: “Sou o que ninguém vê”. Você acha que a humanidade está cega em algum sentido? Sim, a humanidade está individualista. Isso não é certo, temos que pensar no bem de todos, não só no nosso. Temos que mostrar nossa indignação com as injustiças, que acontecem no mundo e não tapar os olhos. Mas, infelizmente é isso que muitas pessoas fazem. 5- Joana D´Arc foi uma importante personagem da história francesa durante a Guerra dos Cem Anos. Ela é considerada uma das mulheres mais fortes e guerreiras que o mundo já conheceu. A Joana D´Arc do século XXI, autora de livros e poesias, teria algo em comum com essa ilustre personagem? Além do nome, também me considero uma mulher forte e guerreira, pois luto por meus objetivos e meus ideais. Não mudo de opinião para agradar ninguém. 6- Você costuma falar muito sobre a morte em seus escritos. Você a teme? Não! Na vida só temos certeza de que um dia todos iremos morrer, então não devemos ter medo. A morte faz parte da vida. 7- Uma palavra que resuma seus escritos? Verdade, pois odeio mentira. E em meus escritos, sempre digo a verdade sobre o que estou sentindo e tento sempre passar essa verdade para meus leitores.

4- No seu perfil do twitter você nos surpreende

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ENTRE OVNIS

NOITE OFICIAL DOS OVNIS NO BRASIL Por Renato Mota

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esse texto quero conversar com vocês a respeito de um dia muito especial para a ufologia que aconteceu aqui mesmo na região do Vale do Paraíba, mais especificamente na cidade de São José dos Campos. No dia 19 de maio de 1986, onde 21 OVNIS sobrevoaram a região. Na época o Sr. Osíris Silva, deixava a presidência da Embraer para assumir a da Petrobrás. Ele foi uma testemunha ocular desses OVNIS, sendo que ele mesmo assumiu o comando da aeronave em que estava e perseguiu um desses objetos. As luzes emitidas eram muito fortes não sendo possível ver a sua forma, nem quem os pilotavam. Esses objetos voavam a milhares de KM por hora. Quando conseguiam se aproximar os mesmos aceleravam e se distanciavam com muita facilidade. O Comando Aéreo CINDACTA de Brasília foram os primeiros a perceberem em seu radar a presença desses objetos, avisando quase que imediatamente Brasília, Rio de Janeiro e São José dos Campos, os quais também confirmaram em seus radares a presença deles. Caças Mirrage foram enviados para tentar fazer uma identificação, pois era assunto de segurança nacional, ninguém sabia do que se tratava exatamente. Um dos caças chegou a ser acompanhado por 7 OVNIS, 3 de um lado e 4 do outro lado da aeronave. Repórteres ao questionarem os pilotos, quanto ao medo, responderam não ter sentido, pois na verdade viam apenas luzes e não viam formas nem seres. O Brigadeiro Octávio Moreira Lima, que era Minis-

tro da Aeronáutica na época, chegou a assumir publicamente tudo que relatei até aqui: da aparição até a perseguição desses objetos, mas não assumiu se tratar de aeronaves extraterrestres, mas que na verdade não poderia dar explicação, pois não tinham explicações para dar ao povo. Ficou de apresentar um laudo de todo o acontecido, mas até hoje isso não aconteceu. A aeronáutica possui um documento chamado “TRAFEGO HOTEL”, onde cada piloto que tenha um avistamento de OVNIS tem que preencher esse relatório que possui perguntas como: – Como era esse Objeto? Emitia algum ruído ou alguma luz? voava em zig zag? Qual era a cor? Forma? Após preencher, esse documento é arquivado e fica a disposição dos militares. Os pilotos evitam preencher esse relatório, porque depois tem que ficar dando explicações, passar por uma entrevista, e é muito constrangedor. Podemos notar que os militares tem plena ciência do fenômeno OVNI que tem crescido em todo o mundo. Países como França, Uruguai, Paraguai entre outros já admitem a existência publicamente dos discos voadores para a população. No Brasil, após o grande esforço da REVISTA UFO, na figura de Ademar Gevaerd, Marcos Petitti e outros grandes nomes da ufologia e colaboradores, na CAMPANHA: UFO! LIBERDADE DE INFORMAÇÃO JÁ. CHEGA DE SIGILO AOS UFOS, PRESIDENTE!(Ainda vou falar melhor sobre essa campanha para vocês), conseguiram a liberação de uma parte desses documentos. Os discos voadores tem aparecido no mundo todo. Governos do mundo todo tem ciência de que algo está acontecendo. Estudam essas naves, capturam destroços das quedas de alguns desses objetos, já capturaram corpos desses seres e até mesmo vivos. Mas pra onde levaram? Por que escondem da população? As pessoas não estão preparadas, na minha opinião, para tal notícia. Se matam por nada, não se preocupam com os seres vivos daqui, nem mesmo com o planeta em si, que é um organismo vivo. A violência está destruindo a todos nós. Se não amamos o próximo como a nós mesmo, como Jesus Cristo disse a mais de 2000 anos atrás, vocês acham que vamos respeitar nossos irmãos cósmicos caso seja comprovado que eles existem? Pensem nisso! Saudações Ufológicas.


ENTRE AUTORES

NAS LEITURAS DE “CORAÇÃO A BOMBORDO” Por Joka Faria

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estes dias de imensas tempestades, a poesia nos salva. Na função de professor reserva, nova condição de um simples trabalhador. Não estudamos para colecionar títulos. Não atendo com tranquilidade os telefones de amigos à espera da chamada para o trabalho. E neste momento a releitura de “Coração a Bombordo” de Domingos dos Santos. E me bate a saudade de minha Caraguatatuba que adotei em meu coração. Um caiçara achou estranho eu chamar Caraguá, de minha. Mas como não sentir saudade da Praia da Cocanha, daquela gente que circula a Rua Vinte de Abril, aquele túnel sempre pichado. Já não me sinto tão turista, sinto-me parte daquela gente. E ler Domingos me aproxima do ruído do mar. Sentir a maresia e a poesia. Acordar e ver a Serra diante de meus olhos. E aquele gente que aos poucos, torna-se minha como

os da Vila Industrial ou do centro de São José dos Campos. As cidades conquistam nosso coração. Canoas, barcos, caldo de cana em frente ao mar. Comércios lotados, trânsito impossível. Gostaria de andar de barco e ir a Bela Ilha (Ilhabela). Conhecer suas ilhas - eu ainda turista? Buscar a água na fonte. Descobrir cachoeiras. Brincar de caiçara. No mercado lotado alguém me fala de uma avó que faz rapadura. Quem sabe uma hora destas os Deuses me permitem morar lá e estar entre sua gente. Enquanto isto a poesia de Domingos Santos me consola. A Rio Santos nos leva a Ubatuba, Paraty, São Sebastião. Quero consertar minha bicicleta neste inverno. E andar por toda a região. Aquelas canoas na praia de Cocanha! A velha Igreja na praça o novo calçadão da Massaguaçu. Aquela gente de todos os lugares faz de lá nosso canto. “Coração a Bombordo” - É o novo livro de Domingos dos Santos. E como ele mesmo se define: Nasci na Maranduba, no aniversário de Ubatuba, fui batizado nas águas do mar e tinha caldo de garoupa na minha mamadeira. Já marisquei na Fortaleza, pesquei na Anchieta, mergulhei no Cedro espero um dia pescar com São Pedro. Sei o gosto do cambucá do bacupari catado no pé as surpresas da goiaba e todos os sabores da jabuticaba. Semeei amizades e colhi amigos foram cheios os meu dias e meu sonho é tocar o cavaquinho igual ao mestre Elias. Quem quiser entrar em contato com o autor o email é: barbatuba@gmail.com

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ENTRE SONS

O SAUDOSISMO MUSICAL Por Paola Domingues

Ah, naquele tempo que se fazia música boa...

para estes – infelizmente -, mas o garimpo vale a pena, pois vale a pena impulsionar um bom trabalho.

E aqueles que obtém espaço, não se deve tirar o mérito

E

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ssa frase está sentenciada como determinante entre o passado e o presente na história da música. Alguns concordarão comigo que já ouviram de alguém – se não os próprios mesmos já confirmaram – que não se fazem mais “Elises”, “Chicos”, “Beatles” e “Pink Floyds” como antigamente. O Cenário musical deixou de ser um espaço de expressão para habitar-se em títulos de barganhas e moedas de troca. Que as mídias investem no lixo musical e que já não há mais a mínima preocupação em produzir algo de qualidade. Se você concorda plenamente com isso, devo lhe dizer que eu também, apesar de não plenamente. O que acontece é que há muita coisa boa e o garimpo deve-se começar por aqui mesmo, pelo nosso Vale do Paraíba e Litoral Norte. Estilos para todos, de variedade musical incrível, composições e letras espetaculares, músicos maravilhosos. Já postei anteriormente alguns deles, como os arranjados do Homens de Melo, Gilson Bambuíra e Ellê e suas composições cheias de regionalismo, o trabalho enlevado no Blues da Amplitude Valvulada, entre tantos que ainda não citei como o Coletivo Estoril, Edson do Revolução Psicológica, Oniricus e os paraibunenses com o Cérebro Enlatado. Um trabalho puramente autoral, “encarapaçado” sim, das tendências mais diversas e das misturas mais honestas que se pode obter no hall da história. É exatamente assim que as coisas se moldam. Não é mais do mesmo, mas um novo trabalho calcado que surge. Sou eu, alguém que era extremamente descrente da cultura popular brasileira na atualidade e que passou a enxergar esse mundo de opções musicais. É preciso sair para conhecer e, sim, ainda não há tanto espaço

Eis que me apresentam – amiga Priscila Martins – a banda Os Suricatos, que participa da competição no programa global SuperStar. Confesso que entre uma composição ou outra fiquei um pouco quando receosa com relação ao que eu ouvia, por algumas vezes não compreender a mensagem daquela composição. O ritmo era bom, os músicos são bons e resolvi insistir. Resultado: virei fã! Me deparei com algumas críticas sobre Suricatos serem “cartas marcadas”, “seguem o movimento indie da moda”, enfim... Somando algumas barreiras para não admitir que o trabalho tem qualidade e não dando-se conta que há originalidade no estilo, são multi instrumentistas, aliás com instrumentos bastante inusitados como a famosa mala bumbo e o weissenborn, provindo da Austrália, presentes em praticamente todas as suas apresentações. Possuem proposta, que é o mais importante. “Ao meu ver, para avaliar um bom trabalho musical, é importante percebermos a proposta do grupo, a dosagem das misturas rítmicas, o sentido e o sentimento de cada letra. Independente do gosto musical, se estes três pilares forem concretos, com certeza o resultado do trabalho é de qualidade”. Resumindo, é importante abrirmos nossas mente. Nem tudo que está na mídia é ruim, nem tudo que é novo não presta. Tem muita coisa boa, aqui e lá fora do Brasil merecendo nossa atenção. Pense Nisso!!!


Quando, Lídia, vier o nosso outono Com o inverno que há nele, reservemos Um pensamento, não para a futura Primavera, que é de outrem, Nem para o estio, de quem somos mortos, Senão para o que fica do que passa O amarelo atual que as folhas vivem E as torna diferentes. Ricardo Reis, in “Odes” Heterónimo de Fernando Pessoa

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8 de Março

Elizabeth, o meu nome Provisório.

Sangra a carvoeira ao ver a terra devastada. a catadora de papelão. Não está a venda quem se vende em madrugadas. Não está a venda a “marca” em peles, hematomas não dizem nada. Pinga o sangue, a dor, o grito na fogueira pós moderna. A inquisição no quarto úmido do apartamento. Quatro paredes entre as pernas. Suspensa a fala, suspenso o grito, suspenso o fluxo. As “patricinhas” também são estupradas. ... Mulheres em coágulos de sangue.

Não estou pronta Deixaram-me pela metade E aqueles 3 anjos Ficam aqui do meu lado Espiando meu inacabamento Vistoriando meu aniquilamento. Até quando Vou ficar assim? Sem asas Sem voo Sem consciência? Olho a sua espada A balança no seu plexo E o dragão sob seus pés Fico entro o mundo dos vivos e dos mortos E não sei quem sou Onde está escrito meu nome? Onde está a pedra? Onde estão minhas vestes brilhantes? Onde foi que perdi O fio de ouro? Onde esconderam meu tesouro? E agora aqui Sem eira nem beira Esperando Uma ponte invisível Sob os meus pés E um mapa De onde possa encontrar O meu verdadeiro e real ser. Até quando?

Por Teresa Bendini

Caiam Muros Canta teu lamento único o violino E as lembranças de teus lábios me elevam, Oh! É doce o sussurrar do hino Seus olhos, num sorriso, me enlevam. Amores impossíveis? Esperançosas juras Distâncias traiçoeiras, ai de nós! Muros a nos separar de forma atroz Se evolam nuvens negras; impuras. Amores possíveis, ribomba minha voz! Empunha a Katana, destroça a muralha! Pois há de chegar, nosso reino de Oz, Prepara porém, teu coração para a batalha. O que é a falta de ouro ou mesmo infinitas léguas? Se nos amamos de alma e corpo e de corpo e alma, O amor, nossa arma suprema. Venceremos sem tréguas, Esta guerra, que nos impôs o destino num momento hirto, Juntos em vida ficaremos, traçado na esquerda palma Pois nada pode tolher um amor que já estava escrito. Por Dalto Fidencio

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Por Elizabeth de Souza

A mais longa noite A mais longa noite ainda espera celebrando uma e outra vez o nascimento e o frio errante que se abraça ao vento esvoaça livremente nas asas da quimera A mais longa treva ainda assiste à fé no sublime encantamento de acreditar na magia de um Menino de crer que o amor e só o amor existe Mas quando o dia rouba a cor à escuridão e a aurora de rosa se reveste sobe aos céus angustiante solidão E a promessa vã e a rotineira prece se desvanecem na rotina da manhã quando em nossos corações Ele adormece. Por Luisa Fresta


Palavras disparadas As onças são uns bichos ignorantes que não sabem que nós somos os reis da criação e andam por aí fazendo má-criação, soltando urros adoidados, que devem significar vou pegar e vou comer e, só com os grito danados, bota muita gente pra correr. Mas eu não corro não, se Rui Barbosa não corre, eu também fico no chão, que tenho uma viola e uma reputação pra zelar, se o pedaço de pinho quebrar quem haverá de me sustentar? Prefiro pegar da prosopopeia, carrego na espingarda, ponho uma bucha atochada que tirei da página de um dicionário, taco fogo na pederneira, que faz um escarcéu, e depois é só fazer o inventário: o chumbo assombrou o mundo e maior espanto se fez quando as palavras da bucha, a famosa bucha do dicionário, se encarreiram direitinho, formaram um poema que leio pra quem acredita, o resto não é meu problema. Por Domingos dos Santos

Todas as coisas que tenho, ou acho Mão cheia, mãos leves Tudo que se sonhava Nada e tudo num bolso Estrada, terra, poeira E neste segundo, luz Viver e morrer poesia Distraidamente só Meus pés vagalumeam Iluminando meu caminho Já vou tarde trançando Alguns versos, palavras Desconhecidas palavras Por Paulo Vinheiro

0573n74c40 espero que os rabos longos, esbeltos nos gatos, perdoem-lhes a malemolência o Sol transfigura os seus olhos em pura ostentação de cores você beija a flauta doce sem dó menor melodia preliminar ritmada chega aos teus ouvidos e também aos meus numa invasão dos sentidos gar gan ta ou o céu da sua boca mo vi men ta se pulsante e quente para explodir cremoso de lei te i ma gi na ção que é amanhecer em sonho Por Jorge Xerxes

Seda Um trago na seda Opaca fumaça Girassóis hortelãs Dançam no ar e tudo enfim se mostra no seu olhar a flor da montanha a neve da encosta alma da alma da alma exposta assim, quase rosa, quase prosa nua melodia azul fim do dia azul finda o dia e tudo no fim desagua no seu olhar o cio da espera o ciclo da esfera e tudo no fim é seu olhar enfim seu olhar... Por Tonho França

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E então o Outono está entre nós Outono Cantam os pássaros. Começa a cair as folhas. E um canário solitário termina de mudar as penas para cantar! Outono Cachoeiras com águas mais frias a ressaca no mar. Algumas frentes frias nos acaricia a alma. Outono Uma goiabada sendo feita em um canto da Serra do Mar. E olho a Serra da Mantiqueira e uma goiaba no chão, sacia a fome! Outono A procissão de ramos passa em frente a minha casa! Jesus, o Cristo nos traz a esperança, e a vida se faz semente. Outono O sol nos ameniza, a criança passeia no domingo. E nos parques todos cantam e dançam uma ciranda. Por Joka Faria

Capiturado Capitu, me queres? Eu te quero. És o mundo para mim: Capitudo. Capitu, me amas? Eu te amo. E hei de amá-la até o fim: Capitúmulo.

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Por Wilson Gorj

Quando escrevo sou Outro Se o amor é ferida que dói e não se sente Então é um absurdo para quem o tem Se o amor é fogo que arde sem se ver Lógico é um derrame psicológico solitário De que imagina coisas em nome de amor. Creio que o Luís Vaz de Camões era louco Talvez tenha sido atingido por canhão No cérebro, quando sentia o tal amor Ao ponto de ver todas as coisas inversas. Pois quando analiso não vejo. E nem sinto nada Ao menos penso que analiso para nada Tantos nadas reflexo na consciência do Pessoa Quando escrevo e reescrevo a Autopsicografia De um poeta que finge ser poeta enquanto é. Acho que também estou a ficar louco Ao ponto de escrever absurdo sem nada haver Com a consciência de mim como ninguém Nas corrente lógicas de querer ser quem eu sou. Por Sanjo Muchanga

Por que existimos? Os Homo sapiens sapiens, assim como a maioria dos mamíferos, fomos feitos em complexos sistemas pra comer, digerir, expelir e semear sementes já devidamente adubadas, para assegurar a expansão e domínio das plantas sobre o mundo (afinal elas surgiram um bilhão de anos antes de nós). Por isso que ao longo das estradas há tanto pés de goiabeiras, araçás, maracujás, jabuticabeiras Já aqueles que moram na cidade perderam a finalidade da existência, pois cresceram muito em ciência, só usam vasos sanitários, esterilizam seus dejetos, deixaram de ser semeadores. e caminham para a extinção. Então, diante desses fatos, viver e cagar no mato é a solução. Por Domingos dos Santos


Noite adentro Óh! Grito oculto e inútil no silencio da longa noite que expande as horas nas paredes Seus minutos são vestes transparentes de minha frágil nudez em que me escondo das fúrias e insensatez Óh, noite! No teu silencio cheio de ruídos antigos a ensurdecer o coração minha alma anda de um lado para o outro no cansaço da busca por tréguas para o conflito do espírito que, assombrado por lembranças em trapos, quer a janela sem as grades dos arrependimentos de uma história distante, nos primórdios de um amor que morreu sem dar o último suspiro.

A Poesia Liberta! A poesia nos arranca do torpor da fúria nossa de cada dia do cotidiano que nos lança ao pó da terra. Queremos subir até os céus não por degraus de longas escadas nem por íngremes montanhas empinadas mas por voos livres e emocionantes Dizem que as emoções arrasta-nos para o abismo e nivela por baixo o nosso ser Então como entrar na amplidão? E nesse paradoxo, bailamos na existência. Existir é apenas momentâneo somos o que somos e sempre seremos para todo o sempre.

E sem que viva, ainda lateja, para que eu não esqueça que ainda vivo!

Por Elizabeth de Souza

Por Suzete Piovesan

Coração Indômito

Incerteza Busco um sentido para viver, e sempre acabo me perdendo em palavras, no medo. Vivo em uma tempestade, e me lanço ao mar de incertezas. Por Joana D’Arc

Caminhos antigos No tempo do meu bisavô As estradas eram caminhos pisados Pelas rodas dos carros de bois Pelas tropas de mulas E pelos pés dos tropeiros que a tudo isso conduzia Com cargas de mercadorias vindas do Sul de Minas, Do Vale do Paraíba, do reino da fantasia. Por Domingos dos Santos

“O mundo pode estar contra mim O universo bradar do infinito: não! Mas sou poeta, hei de perseverar Pois indômito é meu coração A vida pode me gritar: desista! Mas jamais lhe darei atenção Pois sou poeta de alma ígnea E indômito é meu coração! Recuso-me então a me curvar Ante todo e qualquer “não” Pois sou poeta de perenes versos E indômito é meu coração! Por Dalto Fidencio

Poema à esmo Pensemos (em pássaros) Respiremos estrelas Falemos a língua dos grilos e deixemos as bobagens para os URUBUS. Por Teresa Bendini

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Soneto de Outono Lentamente, aquelas folhas vão ao chão Bailando no ar, até beijar o solo Sem nenhuma culpa e sem nenhum dolo É o Outono que chega ao coração Estação que encanta de tão sublime Que aguardo insone, impaciente Que declamo contando a toda a gente Tão forte sentimento, não se reprime Que fosse eterno enquanto durasse Querido e solene Anjo Outonal Quiçá o Inverno não te apagasse

Vou Vou E levo meu abraço mais apertado Meu beijo mais carinhoso O meu amor mais cheio de tesão Vou E levo comigo muita vontade de viver Entre quatro paredes na nossa cama colorida Ou ao ar livre, no caminho que existir Vou E levo as batidas do meu coração Num ritmo acelerado, contente Doida para te fazer sorrir Por Mari Osses

Estação equipolente não há igual Ah! Se o deus Chronos o tempo parasse E nunca nascesse o Anjo Invernal! Por Dalto Fidencio

Labirinto Começamos observando o espaço, sondando as estrelas, olhando para o céu, as nuvens, o sol, buscávamos fora de nós as fronteiras do universo até onde a vista alcança. Forma de traçarmos um mapa, um plano de fuga, do conhecido e do que nos atormenta. É passada a hora de voltarmo-nos (in)(e)ternamente a essência. A luz interior é reflexo que faz morada no peito. Por Jorge Xerxes

Sonho e realidade Escrevo na folha algumas bobagens, sonhos pintados na memória, onde sonho e realidade se misturam. E no fim, o que temos são versos.

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Por Joana D’Arc

Militante da Liberdade Militante da Liberdade Não quero o meu pensamento cerceado Não quero patrulha em meus sorrisos Não quero ser o que não sou Não me interessa amizades paraguaias Não luto por aquilo que não entendo A poesia é sonhadora e ingênua O sonho é lindo como o amor é lindo A abstração causa interesse sem causa A inteligência tem que ser fundamentada As pessoas precisam ser amadas O dinheiro e o sucesso pessoal Cegam as pessoas de verem os excluídos Nesse processo Não existe espaço para todos dentro desse modelo mercadológico e materialista Resistência popular Não é terrorismo. Por Nunes Rios

Classificados O problema é que falta uma palavra pra terminar o poema. Quem tem uma palavra bonita para emprestar? Por Domingos dos Santos


Bulas pra ninar monstros

Encontrei alguém que em seus escritos mudou a fábula, mudou o mito. Com um novo sentido amoroso tão próximo que contou um novo conto. Longe dos aflitos e mais perto do terrível e das mórbidas sensações. posso ver lagoinhas dentro das bromélias. É seu também esse pedaço de riacho. Brilham, cintilam às folhas de mica. Brilham, cintilam a capa verde dos besouros malabaristas. O orvalho, e a água em noite de lua Jorra sonora, cristalina na fonte.

Onde começa o fraterno ser. Acho que o conteúdo seria Impróprio às 18hs. As 19hs chove e poderemos felizmente gritar. Palavras de amor na chuva. Incitar o dom amoroso. Que premia a todos Que salva a todos Que lava a alma A mesma que Nietzsche No pó enxerga. Amor/tecido nos abraços

As escamas dos peixes no lago Peixes que alhures poderiam ter sido o Leviatã Ou mesmo o dragão monstruoso (Qualquer bico falso da maldade) Comedor de enxofre Hoje, não engolem, nem assombram Águas marinhas e cavalos marinhos Peixes e borboletas coloridas. O canto restaurador das ondinas Juntos no ventre cavernoso betume. O melhor de cada um (Mesmo que não veja) se esconde No ventre da bondade

cresce como canto coral. Do qual, eu fugi na quarta. Ainda que possa haver perigo algo finda mesmo assim tão próximo. Com solavancos na canoa ao longe da margem. Tão cedo não volto Pra esse lado frágil, Que afoga até o rio. Ali esta você. No circulo, no risco dos amores imperfeitos. Nos aspectos mundanos que exsudam os sentimentos.

Dessa orquídea que bate na minha porta Sutilmente todos os dias. Profissão Educador de olhos Profusão das formas na mais profunda Quase que perspi/ cássia É ler o outro mundo das entrelinhas Não sei se só eu vejo A cegueira safada que quase me convence Que amanhã todos seremos melhores. Não reconheço esse novo mundo. Soterrado de falsas imagens ainda que enganado amiúde é o único mundo que conheço. Como no Brasil até que processo Seja interpelado pelo recesso Que engambela o bolso, raspa o osso E deixa seqüela, mesmo que imposto A navegar sem animo dom tanto desmando. O resto é o escorregão na lama Que vinha de Brasília, depois Esparramou-se por Minas inda ontem chegou no mar. Tragédia, destruição e lama. Por Ricola de Paula

Ciscos…abismos…triscos Longe de desistir

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Estou cansado de poetas e de mim mesmo

Tenho pouco tempo de vida. Nos últimos 50 anos tenho me dedicado a fazer poemas, estudar a poesia. “a poesia é uma maldição” disse o grande poeta francês Jean Cocteau. Concordo com ele. É uma maldição e ópio. Uma droga pesada. Muitas vezes já pensei em largar este vicio da poesia. Mas não consegui. Não se consegue anular o que cada um de nós carrega com o mais essencial nos nossos fantasmas e inquietações. A poesia, neste tempo todo, me trouxe desamor, solidão e depressão. Porque meu olhar o mundo, o cotidiano como poeta me tornou cético, sem nenhuma esperança. A vida é feia. Daí a necessidade do ópio da poesia. Vivo drogado de poesia e outras drogas tarjas pretas receitadas pelos médicos. É claro que nem tudo são nuvens negras. Há beleza nas canções, no meu jardim nos meus filhos. Mas as vezes eu pergunto: continuo a fazer poesia para que? Para quem? Talvez para eu mesmo suportar a vida. Estou cansado de falsos poetas e de mim mesmo; insisto em cometer versos para aliviar “as dores do mundo”. Por Dailor Varela


ENTRE FILOSOFIA

DE HOMENS E DÚVIDAS Por Ronie Von Rosa Martins

U

m homem. Sempre é uma prisão dele mesmo. Acredita ser um, uno; e é tantos e vários. E não entende. E se molda ao que não é. Para ser... Custamos a entender que tudo isso nada mais é que formatação. Somos formatados e nos condicionamos em determinado grupo, neste ou naquele lugar. Mas precisamos disso. O que é pior. O ser humano tem a necessidade terrível de fazer parte. E somos trabalhados desde pequenos a nos posicionarmos para este ou aquele lado. Todos os discursos que nos constituem são produtos de condições circunstanciais. Família, escola, amigos, região, partido político, mídia... somos uma constituição de vontades outras. Discursos outros. E isso tudo é tão bem amalgamado em nossa carne e espírito, que acreditamos na singularidade de nossas vozes, de nossa forma de pensar. Quando não passamos de meros ecos dentre os discursos. Antonin Artaud em sua sábia loucura falava em “explodir” esse corpo organizado previamente afim de conseguirmos ver e sentir quem realmente somos. O que somos? Ele estava certo. Gostaria de me “descascar” infinitamente, como uma cebola e ver no que dava. Como um texto já lido por tantas vezes cheio de jargões que é definitivamente apagado. Uma borracha apagando palavra por palavra daquilo que nos “disseram” que éramos. Afogar este “eu” cartesiano num balde de água fria e fazer com que liberte os tantos outros “eus” que habitam nossa existência. Quantos somos? Protegemo-nos tanto em paredes que já não distinguimos nossa carne. Somos sempre paredes. E nos escondemos das possibilidades outras e várias que surgem. Ao abrirmos a boca. A tecla play de nosso gravador é acionada, e nos entediamos a ouvir as mesmas coisas que sempre dizemos. Achando que aquela “palavra” é singular e única. Minha palavra. E o pior. Acreditamos sem questionar. Sem enfrentar. É assim. Ponto. Aceitação. Docilidade. Uma das palavras de Foucault. Docilizaram nossa alma, nosso corpo, e acreditamos que isso

era bom. Inventaram o pecado e nos disseram que éramos todos culpados e que deveríamos sofrer. E ficamos felizes em sofrer. Nossa cara é a mesma cara. A mesma cara de todos. Todos com a mesma cara, o mesmo rosto. Nos olhamos nos outros sem nos vermos... Nem ao outro. Máscaras. Eterno carnaval. Pior. Pois não há a espontaneidade nem a embriagues que de certa forma libera o corpo e a alma. E nos abraçamos em nossos muros, em nossas paredes. Um eterno afastar-se. Um eterno proteger-se. Todos escondidos na pele, na carne, no mesmo rosto que não vê. Como os detritos dos esgotos, flutuamos (a maioria) nas águas lamacentas do senso comum, da doxa. E acreditamos piamente estarmos certos. É assim. E assim será. Será? Deleuze já falava em pensar o pensamento, questionar o que se pensa, a forma que se pensa... E duvidar. Não duvidar para negar. Mas para “talvez” acreditar? Não falo em niilismo, negação... falo simplesmente em pensar o que se pensa e porque se pensa dessa forma e não da outra. O que nos faz acreditar nisso e não naquilo. E entender que o pensar é livre, não deve se agrilhoar à religião, política, cultura ou grupos, pensar está além da região ou dos espaços que resumem e determinam o pensamento. O pensamento não é escravo de doutrinas ou moral alguma. E não devemos (creio eu) usa-lo para confirmar conceitos pré-definidos e ideologias estabelecidas, pois dessa forma o usamos “como escravo” para defender e “justificar” o que deve ser questionado. Se penso para receber uma resposta que me agrada, não estou pensando, estou meramente elencando argumentos para comprovar a “opinião”. Minha opinião. E a opinião é fruto de vozes ambíguas, seqüestradas por sentimentos de raça, religião, território, poder, vontade e prazer. O pensamento não é “opinião”. Definitivamente. A opinião é meramente a máscara, decorada com os vários textos e discursos que nos compõem. Eco.

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ENTRE VERSOS E PROSA

OBRAS QUASE PRIMAS Por Marcelo Pirajá Sguassábia

JESUS, ALEGRIA DOS HOMENS

Sr. Johann, Eu tentei falar ontem, antes de ir embora pra casa, mas quando eu terminei meu serviço o senhor já tinha saído pra tocar órgão na missa das cinco. É que pela manhã, arrumando sua mesa, esbarrei no tinteiro aberto, que estava em cima da partitura que o senhor vinha escrevendo. Desculpa, mas não sobrou uma semicolcheia pra contar a história. Sei que o transtorno não vai ser grande, pois o senhor compõe muito o dia todo e é capaz de ainda estar com a melodia na cabeça. Agora, se me permite o palpite, eu penso que Jesus não é a alegria dos homens coisa nenhuma. Achei esse título muito desrespeitoso, com todo respeito. Jesus é a salvação, o redentor, o refúgio, o escudo, a fortaleza. Mas alegria soa estranho, parece meio caricato, não acha? Sacrilégio. Mas também é só um palpite, o compositor é o senhor, longe de mim me meter onde não sou chamada... Desculpa qualquer coisa. Ingrid

DOM QUIXOTE

Foi um vento noroeste que chegou de repente, muito forte, abrindo com violência a porta da oficina onde o livro iria começar a ser impresso. Voaram todas as folhas manuscritas do original, sobraram só duas que se enroscaram na roda de uma carroça. Era como se os moinhos de vento do livro se pusessem todos a ventar ao mesmo tempo. E com aquelas milhares de folhas perdidas lá se foram também Sancho Pança, Dulcineia del Toboso e tantos outros personagens que, junto com o próprio Dom Quixote, provavelmente fariam do livro um fracasso retumbante, que a muito custo chegaria a 100 exemplares vendidos. E para os parentes do Cervantes, com toda certeza. Novelas de cavalaria não

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despertam interesse, é um gênero a que ninguém mais pode acrescentar algo de original.

MONA LISA

– Vicenzo, pra quando que é pra fazer a moldura desse aqui? – Joguei pra terça à tarde, tem mais uns doze quadros na frente. Semana tá puxada. – De quem que é? – Um barbudão que mora aqui perto. Tal de Da Vinci. Você já deve ter visto, vive trazendo quadros pra gente emoldurar. – Humm, sabe que essa mulher aqui do quadro não me é estranha... não lembra a esposa do mercador? – Mas será? Enquanto o marido tá mercadando por aí, ela ataca de modelo pro barbudo? Esquisito, heim. – Não sei, pode ser que eu esteja enganado, mas eu acho que é ela, sim. – Pintura esquisita, o sujeito quis dar um efeito esfumado nos olhos e na boca, só que acabou virando defeito. Não está nem séria, nem sorrindo. Ficou no meio do caminho, né? Coisa de mirim, essa pintura deve ser de algum aluno do velho. – Então, e encomendaram a moldura mais cara. Desperdício. – Ai, olha aí o que aconteceu... A gente se distrai na conversa, ô meu Deus do céu... – O que é que foi? – Derrubei café aqui, bem no nariz da mulher. E a tinta ainda estava fresca, vê só o borrão que ficou! – Perdeu grande coisa, não. Quando o cliente vier aí você explica a história, pede desculpa e dá duas telas novas pra ele, como forma de ressarcimento. Fazer o quê, acontece. E como deve ser mesmo trabalho de aprendiz, o barbudo vai ficar no lucro. A primeira tela vai servir para esse aluno ruinzinho ter a chance de fazer algo melhor. A segunda, ele usa pra treinar outro molecote. – Boa. Acho que ele vai entender.


ENTRE CLÁSSICOS DO CINEMA

CIDADÃO KANE (uma impressão) Por Germano Xavier

Cidadão Kane - Drama - Ano 1971 - 119 min. Tílulo Original: Citizen Kane - Direção: Orson Welles Roteiro: Orson Welles/ Herman J. Mankiewicz/ John Houseman (colaboração) Elenco: Orson Welles, Joseph Cotten, Dorothy Comingore, Agnes Moorehead, Ruth Warrick, Ray Collins, Erskine Sanford, Everett Sloane, William Alland, Paul Stewart, George Coulouris, Fortunio Bonanova, Gus Schilling, Philip Van Zandt, Kathryn Trosper. 

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vida de William Randolph Hearst, tido como o criador do “jornalismo amarelo” ou sensacionalista, transformou-se no pano de fundo ideal para a montagem do filme “Cidadão Kane”, dirigido por Orson Welles, que também exerceu o papel do protagonista (Kane). O filme não chega a ser considerado uma biografia cinematográfica do empreendedor e milionário norte-americano William R. Hearst, pois deixa transparecer enormes discrepâncias entre a vida de Hearst e a que é mostrada na película, principalmente quando se trata da sua infância. Todavia, “Cidadão Kane” é uma produção que escancara alusões fortíssimas

ao magnata da comunicação. Numa trama que revolucionou a maneira de se produzir cinema em todo o mundo, Welles, utilizando-se de inovadores elementos e de novos métodos, como o uso de “flashbacks”, acabou por fomentar também um novo cinema, mais dinâmico e ousado. O longa tem cenas duradouras e sem corte, sombras, tomadas de baixo para cima, distorção de imagens com a finalidade de aumentar a carga dramática, e muitas outras novidades que fizeram de “Cidadão Kane” um dos filmes mais bem elaborados da história da cinematografia de todos os tempos. Bastante elogiado e dono de inúmeras críticas positivas, o trabalho conta a trajetória do empresário da imprensa Kane, que é reconstituído através de uma minuciosa investigação feita pelo repórter Thompson. Esse, durante todo o transcorrer da encenação, tenta desvendar o possível significado da derradeira palavra pronunciada por Kane: “Rosebud”. O repórter consegue entrevistas marcantes e fundamentais com pessoas que fizeram parte do círculo pessoal do empresário. Através dessas entrevistas, Thompson foi capaz de traçar um perfil detalhado de Charles Foster Kane. O “Cidadão” teve uma infância pobre (enquanto que a infância de William fora recheada de regalias), mas torna-se herdeiro de uma verdadeira fortuna. Depois de ter experimentado investir o seu dinheiro em diversos segmentos do mercado, Kane resolve dedicar-se a um dos negócios menos rentáveis e seguros da época: um jornal impresso convencional e de pouco prestígio. Dono de uma ambição de proporções colossais, mascarada, de certa forma, por uma perturbação interna, Kane realiza uma de suas primeiras ações tendo em vista o progresso de suas aplicações: contrata “estrelas” dos jornais concorrentes, trazendo para o seu domínio a maior “artilharia” jornalística daquele momento. Está germinado aí um campo propício para o desenvolvimento e atuação de um jornalismo mais agressivo e com fundamentos sensacionalistas, que acabou por provocar uma onda de discussões e de questionamentos condizentes à sua valia para a sociedade. Com o passar do tempo, Kane perde suas maiores virtudes e passa a transparecer mais defeitos que qualidades. Com a sua morte, renasce o sentimento de poder, de construção de sentido da imagem, uma vez que a nação entra em colapso, e morre também uma grande parcela daquele sentimento que nele era tão aflorado. A nação se comove, a nação pára. Num esforço metalinguístico, “Cidadão Kane” esclarece um pouco do idealismo norte-americano, retirado de uma vida bastante atribulada, de conquistas e de fracassos, guardando o ilustre título de ser uma das obras primeiras do cinema mundial.

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ENTRE METAFISICA

EVANGELHOS APÓCRIFOS Por Joka Faria

E por acaso vamos esquecer os Evangelhos Apócrifos Encontrados num deserto?

L

er Walt Whitman é de uma infinita possibilidade – Há momentos que as palavras nos arrebatam. Será a escrita a religação do homem com sua divindade? Ontem numa praça com velhos militantes da luta política, começamos a falar dos grandes escritores que o Brasil já produziu, como Machado de Assis e Guimarães Rosa. Falei de meu encanto pela escrita de Guimarães e outro falava do mesmo encanto por Machado e com isso esquecemos os males de fazer politica. E a literatura chega à praça viva e pulsante e assim a escrita e a literatura transformam as pessoas nesta era tecnológica. E hoje li um poema dedicado a Steve Jobs, sim ele mesmo, um dos construtores desta imensa aldeia global. Não achei a assinatura do autor, por isto não republiquei. E o que é a escrita, poesia e arte? Quantos mistérios leva uma pessoa sozinha a se desligar do mundo e simplesmente ler e escrever. Eu escrevo na companhia de Janis Joplin com sua música, mas poderia estar em silêncio. Num programa sobre a Guerra Civil Americana me veio à cabeça o velho Walt Whitman, que cuidava das pessoas doentes no acampamento. E agora leio e releio suas frases, poemas e sua vida diante de meus olhos. Ele que cantava o homem do

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futuro, chega num rápido clicar de uma página, além da velocidade do pensamento. E num escrito o torno personagem numa visita na cidade em que moro. E quem disse que a metafisica não pode trazê-lo até aqui neste exato momento? Seus pensamentos chegaram a mim, a você. Quem disse que não caminhamos na velha Atenas? Não estivemos nas Caravelas de Pedro Alvares Cabral? Ou simplesmente não aprendemos a arte de viver ou morrer em Esparta? Quem nos diz que daqui a séculos, milênios, não estaremos aqui? Quem sabe indo além do bem e do mal! E a vida pulsa em nossa alma, coração e fé em nós mesmos. Walt Whitman diz para amarmos a nós mesmos. Descobrindo a amor em nós, podemos nos ver no próximo como Jesus, O Cristo nos ensinou. Eles, os grandes e pequenos escritores fazem parte de nossa vida... a partir do momento que nossa retina chegue até suas palavras escritas e muitas vezes encenadas num palco de teatro, numa novela, num filme. Palavras escritas nunca se acabam e por acaso vamos esquecer os Evangelhos Apócrifos encontrados num deserto? Quem sabe muitos dos livros da grande biblioteca de Alexandria não estejam por ai, esperando serem novamente descobertos. Ou no fundo de algum oceano esteja a biblioteca de uma civilização perdida esperando para ser encontrada? A vida é vida e vai além da vida. A literatura nos abre portais e infinitas chances de encontrar o caminho da alma. Dizem os velhos sábios que ainda não a possuímos, mas devemos lutar para achar o fio de Ariadne que nos leva a alma.


JOÃO TIMANE Por Elizabeth de Souza

Um artista plástico, dono de uma técnica inconfundível. Ele nasceu na cidade de Maputo em 1991 e afirma que recebeu logo cedo, influências do mestre Malangatana. O jovem artista João Timane é um grande aventureiro da Arte, pois investiga várias técnicas, mesmo tendo frequentado a Escola Nacional de Artes Visuais na cidade onde nasceu. Foi João Timane, que gentilmente nos cedeu uma de suas obras para a capa da Revista Entrementes, edição de outono de 2015 - há exatamente um ano. Foi uma das capas mais emblemáticas e sugestivas, com uma obra cheia de cores e enigmas que serviu de inspiração para o nosso colunista Escobar Franelas buscar mais sobre o artista e sua obra de além mar. Por isso Escobar entrevistou João Timane, entrevista essa, que vem a seguir. Além da capa da revista, outros escritores, poetas e editores se valem da sua obra para ilustrar seus poemas, capas de livros e revistas impressas, tamanha é a admiração por suas obras. Uma obra contemporânea e de profunda sensibilidade, pois através dos seus traços viajamos para além das terras e dos mares e encontramos o ser em sua plenitude. Realiza exposições, participa de workshops no seu país como em outros e também leciona a disciplina de desenho para crianças em seu bairro.

Uma bela relação entre poesia e pintura! João Timane, faz exposições individuais em seu país, mas agora viaja para além das suas terras de Moçambique para expor o seu trabalho em outros países. Recentemente ele expos suas obras em Portugal, além de participar do lançamento do livro de Fátima Negrão (“A Pele Do Capim”), livro ilustrado por ele. Belas ilustrações Timaneanas. O artista João Timane mora num bairro de artistas e poetas em Maputo, mas já está alcançando o mundo com seu talento. “Em todos os lugares onde pude falar da arte, nâo me faltou coragem e ousadía em falar que o meu Moçambique nunca ignorou a arte”. João Timane.

Acima à esquerda: Nelson Mandela em Pintura Timaneana. Primeira pintura do ano 16. Terceira homenagem. Acima à direita: Essa pintura que ilustrou o livro de Fátima Negrão. Abaixo: O pintor moçambicano João Timane, junto das suas pinturas na exposição em Portugal.

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ENTREVISTA

ENTREVISTA COM JOÃO TIMANE (ARTISTA VISUAL) Por Escobar Franelas

(Foi aqui, na revista Entrementes, na edição Outono de 2015, que vi pela primeira vez o trabalho de João Timane. A capa, com sua “Hirondina Joshua” – um acrílico sobre tela – é uma ilustração solar, um rosto de tristeza enigmática sentenciado por um olhar de monalisa desdenhosa, cujos lábios tanto podem estar rindo vingativamente quanto podem estar contraídos numa dor extrema, oferecendo um painel pan-étnico, que nos permite pensar inúmeras variações para este concerto de cor e traço. O bom da internet é que fui pesquisar João Timane e em poucos dias descobri um jovem e árduo trabalhador das artes visuais em Moçambique. Nada mais natural, então, compartilhá-lo novamente aqui, com todos. Desfrutem-no! Degustem-no!)

1- Quem é João Timane? João Timane é artista plástico moçambicano, formado pela escola Nacional de Artes Visuais em Maputo. Actualmente frequenta o curso de Engenharia Geológica e de Minas na Universidade Universidade Wutive. Nasceu, cresceu e vive no bairro do Aeroporto, conhecido internacionalmente como sendo o bairro dos artistas. 2- Quando foi que você sentiu as primeiras manifestações da arte em sua vida? JT: Desde infância já fazia arte sem noção. Fazia desenhos infantis de bonecos que via pela televisão. Em 2009 concorri a Escola Nacional de Artes Visuais por conselho do meu primo Timóteo Bila que na altura era o meu encarregado de Educação. Longe de pensar que fosse ser artista e que existiam escolas que formam técnicos de artes visuais. Quando entrei por acaso com a melhor nota, dediquei-me duma forma extremamente intensiva que cheguei a perder amigos por esta paixão, isto porque não dava mais atenção a eles Desenhava dia e noite.

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Certo dia com alguns colegas de nomes Patrício Simbine (artista) e Santos Pitelek visitamos o Museu Nacional de Arte. Foi ali que a verdadeira paixão fluiu no meu interior, quando logo na entrada deparei-me com as belas e magníficas pinturas do artista moçambicano radicalizado em Portugal, Roberto Chichorro. A maravilhosa combinação cromática e a alegria deste povo moçambicano ali representado cativou-me profundamente, foi quando depois fui apreciando muitos outros artistas, identifiquei-me também nas pinturas do Naguib, pertencentes à sua primeira exposição intitulada “O grito da paz”. Desde lá até hoje esta paixão não hospedou mas sim encontrou o seu verdadeiro lar no meu interior, um lugar onde os poetas tem mencionado bastante, esse lugar chama-se coração.

3- Já participou de alguma exposição, individual ou coletiva? Quando? Aonde? JT: Claro que sim. Estou nas artes plásticas profissionalmente há 6 anos e desde lá fiz duas exposições individuais na Mediateca do BCI em Maputo, sendo que a primeira intitulada “Cartas dum grau de mostarda”


e a segunda “Retratos de mil gotas de sonho” e sempre participei em inúmeras exposições coletivas dentro e fora do país.

4- Como é o seu processo de produção? Tem um dia ou horário certo para produzir? Divide a tarefa com outros afazeres? Consegue ficar muito tempo sem produzir? JT: Confesso ser um artista sem processo definitivo de produção, isto porque tudo depende da inspiração do artista que está em mim. Sou um artista movido pelo espírito espontâneo, ou seja, produzo o que vem em mente nesse exato momento. Para além de artista plástico, sou estudante de engenharia geológica e de minas em Maputo e para além dessas duas áreas, tenho feito exercícios físicos pois sou apaixonado pelo fitness. Não consigo de jeito nenhum ficar sem produzir mesmo sem material, trabalho com o que existir nesse momento, por exemplo, na falta de tintas, faço desenhos artísticos, na falta da tela, pinto em cartolinas... 5- Por que a falta de tintas e telas? JT: As tintas no pais em que encontro-me infelizmente existem em pouca quantidade, sendo este rico em diversidade plástica. Neste exato momento estou a pintar quadros e os mesmos não estão à venda, logo, este é um dos motivos pelos quais o artista acaba tendo dificuldade em aquisição do material. 6- Como você entende que este problema pode ser resolvido? Trabalhar na importação? Incentivo à indústria química para que produza os materiais que os artistas necessitam? Criação de cooperativas? JT: No meu ponto de vista, as instituições comercias deviam importar mais os materiais de pintura, ou seja, das artes plásticas no geral, apesar de que o artista não se limite no que é novo mas sim recicla o que lhe rodeia e para o restante da população não tem beneficio com a finalidade de produzir um utensílio utilitário. Enquanto não serem importadas as tintas pelas instituições comerciais locais, continuaremos saindo do país em busca principalmente na vizinha África do Sul, sendo assim as telas ficam ainda mais caras e esta acaba sendo uma dificuldade para aquisição das mesmas pelo povo moçambicano. 7- Você considera que os artistas estejam procurando caminhos para uma produção menos individual e voltada mais para o coletivo? Ou há

uma exacerbação do individualismo tipicamente ocidental? Há uma década atrás era abusivamente notável a presença do individualismo nas artes plásticas africanas, especificamente nesta região que pertenço mas, nestes últimos tempos graças a alguns artistas estudados além continente africano, as coisas mudaram devido a essas influências que visavam a unir os artistas em movimentos fortes para a elevação das artes plásticas moçambicanas em particular. Contando também que perdemos grandes fazedores das artes plásticas moçambicanas, estes que elevaram o nome de Moçambique além fronteiras. Daí que surge um grupo extremamente forte designado Muvart (Movimento de Arte Contemporânea de Moçambique ) liderado pelos artistas e professores de arte Jorge Dias e Pumpílio Hilário, artisticamente conhecido como Gemuce, grupo este que trouxe um questionamento na arte actual devido a forma de expressão diferente do habitual e principalmente por trabalharem com a reciclagem num país com muita diversidade de objectos recicláveis. Desde já parabenizo a este grupo constituidos pelos artistas Gemuce, Jorge Dias, Mudaulane, Carmen Muiengua, Titos Mabota… 8- Como você vê a produção visual na arte que se pratica no momento? Baseando-me no princípio de que no mundo quase tudo já se fez, actualmente a nossa geração vive refazendo, ou seja, reconstruindo o que já se fez pelos grandes artistas da antiguidade, modernizando e contextualizando com o momento contemporâneo. Penso que é um momento em que as coisas tornaram-se fáceis principalmente com a implementação da tecnologia nas artes plásticas. 9- Tem predileção por algum artista, ou grupo, ou coletivo, na arte moçambicana e/ou brasileira e/ou mundial atual? Desde o princípio da carreira artística sempre inspirei-me pelos artistas moçambicanos: Chichorro (actualmente radicalizado em Portugal), Naguib, João Paulo Quehá, Gemuce e Silvério Sitoe. Estas grandes referências das artes plásticas moçambicanas tem influenciado grande número de jovens aqui. Além fronteiras tenho visto e acompanhado o que se está a fazer mas não tanto para que não haja muita influência extra europeia nos meus trabalhos artísticos, porque isso dificulta a identidade do artista, embora alguns conseguem estar no seu devido lugar. Mas a maioria está fazer arte extra europeia, ou seja, já não tem raízes.

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ENTRE TRILHAS E VIAGENS

ILHA DO MEL – PARANAGUÁ – PARANÁ Por Ana Maria Alcides

Praia de Encantadas

Não muito longe da capital do Paraná Curitiba, na cidade mais antiga do estado; Paranaguá, está o paraíso chamado Ilha do Mel. Pela Rodovia Estadual PR 277 você levará cerca de duas horas para chegar ao trapiche que é onde começará sua viagem inesquecível, utilizando o barco que faz a travessia para a Ilha em cerca de trinta minutos. Apenas 200 ha dos seus 2700 ha tem permissão de acesso, o restante é reserva ecológica tombada pelo Patrimônio Histórico em 1975. De norte à sul da Ilha você encontrará encantos que não verá em outro lugar. Por exemplo, você tem duas opções de desembarque na ilha: Praia de Nova Brasilia e Encantadas. Começando por Encantadas, encontrará diversas opções de pousadas e campings restaurantes e lanchonetes que o atenderão em suas necessidades, além de um comércio com lembrancinhas e artesanato. Mas principalmente poderá conhecer a Gruta das Encantadas. Muitas lendas envolvem esse lugar, entre elas a de que aqui existiam lindas mulheres (sereias) que com seu belo canto atraiam pescadores e que acabavam naufragando por esse encanto. Depois de caminhar por uma pequena trilha entre campings e pousadas, você chegará nesta passarela que é o acesso à Gruta das Encantadas. No final do dia, nada como observar um belo por do sol

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do trapiche enquanto os barquinhos chegam e partem... Se você chegar na Ilha por Nova Brasilia já nas trilhas até o Farol da Ilha o encanto de estar num ecossistema de restinga e Floresta Atlântica, o que a elevou à categoria de Estação Ecológica em 1982. O Farol da Ilha é um atrativo encantador. Depois de subir os quase 150 degraus de acesso poderá ter uma vista ampla de quase toda a ilha. Belas praias em ambos os lados do Farol e o istmo próximo ao trapiche poderão ser avistados do Farol. Para completar sua visita à Ilha do Mel, não pode faltar uma boa caminhada até a Fortaleza Nossa Senhora dos Prazeres Paranaguá. Mas, você poderá também ir de barco ou até mesmo alugar uma bicicleta para chegar até esse local cheio de história e mistério. A Fortaleza está localizada na praia da Fortaleza, na encosta do Morro da Baleia. Fica na parte norte da Ilha, na entrada da Baía de Paranaguá. É hoje o único exemplar da arquitetura militar do século XVIII no Paraná No local existe um centro de atendimento ao visitante com um pequeno museu e tem ascesso sanitários. Respire fundo e não deixe de subir os muitos degraus até o mirante onde encontrará um Labirinto de Pedras com canhões. Mas agora o passeio acabou e próxima parada será a observação de golfinhos!! Mas isso fica para a próxima viagem.


Acesso Ă Gruta ĂŠ feito numa passarela de madeira construĂ­da sobre as pedras.

Gruta das Encantadas vista de dentro

Escadaria para o Farol

Farol construido em 1872

Labirinto no Mirante da Fortaleza Nossa Senhora dos Prazeres

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CANTO DA CULTURA

Era uma vez em São José dos Campos Por Elizabeth de Souza

Irael Luziano Uma das figuras mais controvertidas do Canto da Cultura: Irael Luziano!

Imagens do meu acervo pessoal Poeta, ator, escritor, apresentava-se todo sábado no Canto da Cultura na Praça Afonso Pena de São José dos Campos. Declamador nato, fazia suas performances e atuava com outros atores como Marcos Planta, Sara, Cesar Pope e outros. Ele conseguia juntar um número expressivo de pessoas a sua volta, com seu talento peculiar e seus temas polêmicos e controversos. De uma inteligência fora do comum assemelhava-se a um camaleão, mudando o jeito de ser a cada momento. Poderia citar Heidegger, Sartre e Nietzsche com a mesma elegância e maestria que surgia na praça impregnado de alfinetes e correntes pelo corpo, como Sid Vicious. Ele encarnava a contracultura e a poesia marginal

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com a mesma beleza que cultivava os clássicos. E de uma forma visceral e profunda. Carismático, atraía uma multidão que o admirava, mas também atraia alguns investigadores que nessa época, patrulhavam pela força da ditadura militar, onde ficavam de olho em cada palavra dita, em cada poema declamado, em cada “gesto” suspeito. Certa vez, Irael chegou a ser levado até a delegacia, por estar se expressando em local público e pendurando “indecências” nos varais poéticos, juntamente com outro poeta, o Edu Planchêz. Depois de algumas horas eles foram liberados com a advertência de que Irael não poderia proferir mais nenhuma palavra em público, pois estariam de olho nele. No sábado seguinte, lá estava o nosso poeta filósofo. E para surpresa de todos, fez uma performance extraordinária, sem proferir uma palavra. Expressava-se por mímica, gestos ininteligíveis para os investigadores, mas reunindo uma multidão que apreciava o trabalho dele. Isso é apenas uma pequena citação do que o Irael fazia na cidade de São José dos Campos. Um verdadeiro artista de vanguarda. Iniciou a grafitagem na cidade, numa época que realmente era bem perigoso fazer isso. Ele “bagunçava” a arte e a cultura desse polo tecnológico. Ele deslizava entre os comportamentos com alma Zen e o corpo revolucionário e era amado e odiado ao mesmo tempo. Uma atitude paradoxal, típico dos que ainda não compreendem os espíritos livres. Irael Luziano - um espírito livre e polêmico que virava o sistema pelo avesso, mostrando toda a vulnerabilidade desse mesmo sistema. Uma época em que a ditadura militar estava em vias de encerramento. Depois, Irael foi para o Rio de Janeiro, São Paulo onde fez escola de teatro com Antunes Filho e participou de Macunaína. Fez a ECA na USP, depois graduou-se em História. Hoje, Irael, professor de História, continua caminhando com a Arte, como escultor de palavras e barro. Ele vive isolado do Centro Urbano, mas continua interagindo com a arte, a cultura e os humanos.


Matéria realizada pelo Jornal Valeparaibano nos anos 80 em SJC (Retirado do site http://www.loz2962.com/)

Irael na peça Macunaína - em primeiro plano (Img retirada do site http://www.loz2962.com/)

Uma entrevista de 2013 realizada por um jornal de Embu das Artes em 2013 (Retirado do site http:// www.loz2962.com/)

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ANUNCIE NA REVISTA ENTREMENTES O Portal Entrementes é uma revista digital de conteúdo essencialmente cultural, conta com a colaboração de mais de 20 colunistas, escritores, poetas, críticos, músicos, artistas plásticos, ufólogos, etc que estão espalhados por várias partes do Brasil, assim como em Portugal e Moçambique. Além das postagens dos colunistas há uma agenda, onde são postados releases de eventos e também são feitas matérias especiais sobre variados temas na região e em outras cidades ou estados, que são registrados através de vídeos, entrevistas e imagens. Agora no formato de revista impressa que é publicada trimestralmente (Março, Junho, Setembro, Dezembro). O conteúdo da revista

impressa é contribuição dos próprios colunistas junto com outras matérias interessantes feitas pela equipe do Entrementes. Para que o projeto continue levando conhecimento e cultura até as pessoas, precisamos da sua contribuição. Colaborando conosco, além de nos ajudar a divulgar conhecimentos, estará também divulgando sua empresa. Adote essa ideia e junte-se a nós... Agradeço a colaboração e a parceria! Elizabeth de Souza - Editora do Portal www.entrementes.com.br contato@entrementes.com.br (12) 98134-9857


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