Revista Café e Justiça 07

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REVISTA CAFÉ & JUSTIÇA Publicação trimestral voltada para o meio jurídico PRESIDENTE EXECUTIVA Isabel de Andrade Ribeiro Oliveira isabel@oliveiraadvocacia.com CONSELHEIROS Anna Regina Almeida Magalhães annaregina.adv@gmail.com Abdias Junio Cavalcante Oliveira abdias@oliveiraadvocacia.com Olivia Pinto oliviapinto.adv@gmail.com COLABORES EFETIVOS Rodrigo da Cunha Pereira Rolf Madaleno Rodrigo Toscano de Brito Wotton Ricardo da Silva Yuri Magalhães Cid Neto CONSULTORA Ângela Maria Sobreira Dantas Tavares PRODUÇÃO EDITORIAL 7CN Comunicação Criativa (85) 3088.1288 comercial@7cn.com.br Textos: Responsabilidade de cada editor Direção de arte: Edmar Júnior edjr10@gmail.com Diagramação: Edmar Júnior Fotos: Divulgação e banco de imagens Tratamento de imagens: Sevenpress Impressão Gráfica: Halley Gráfica e Editora Distribuição: Gratuita e dirigida

CONTATOS Rua Dr. Marlio Fernandes , 180, sala 02, térreo - Edson Queiroz CEP 60180-025 - Fortaleza – Ceará – Brasil Telefones: (85) 3241.4055 / 3241.3663 contato@cafeejustica.com.br - www.cafeejustica.com.br


Editorial

Olá, Nesta edição comemoramos mais um aniversario da Revista Café & Justiça! O momento é propício para reflexões e balanços... Como sabemos a Café & Justiça é fruto do esforço conjunto de três mulheres idealistas e empreendedoras que, mesmo sem experiência editorial, ousaram sonhar e apostar na criação de um espaço cultural diferenciado, voltado para a troca de experiências e a divulgação do conhecimento jurídico. Nestes dois anos de existência, nós que fazemos a Revista vivenciamos muitas emoções. Cada número surge como um novo desafio. Dúvidas, medos e inseguranças fazem parte da jornada, mas, aos poucos, esses sentimentos vão sendo substituídos pela imensa alegria de ver o sonho materializado e pela sensação inigualável de dever cumprido que nos invade após o fechamento de cada edição. Entramos em 2013 renovadas, cheias de expectativas, dispostos a refletir, sonhar e traçar novos objetivos. Nesta sétima edição, Café & Justiça trás como matéria de capa a tormentosa discussão sobre os limites da maioridade penal no Brasil, através de uma ampla visão psico-jurídico-social oferecida por Juízes, Promotores, Procuradores, Defensores Públicos, advogados e educadores, que, ao exporem seus entendimentos, lançam luzes mais consistentes sobre a possibilidade ou não da redução da maioridade penal no país. Sempre aberta ao enfrentamento de questões sociais, Café & Justiça, através de manifestações de médicos, professores universitários e advogados, oferece aos seus leitores um amplo debate sobre a viabilidade/necessidade de importação de médicos estrangeiros para o Brasil, E, dentre as diversas matérias apresentadas, Café & Justiça traz ainda o ponto de vista de importantes membros da sociedade cearense sobre o polêmico projeto intitulado “Cura Gay”. A edição oferecida nesta oportunidade, considerando-se a rica diversidade dos temas abordados e o peso dos nomes daqueles que os assinam, apresenta-se, sem dúvida alguma, um material de aprendizagem a ser arquivado e pesquisado. Sendo assim, sopre conosco a velinha de aniversário, sente-se confortavelmente com um cafezinho à mão e delicie-se com mais este saboroso número da nossa Revista... Uma boa leitura.


sumário ARTIGO - ÂNGELA MARIA SOBREIRA DANTAS TAVARES

ARTIGO - VÁLDSEN DA SILVA ALVES PEREIRA

ARTIGO - RODRIGO DA CUNHA PEREIRA

ARTIGO - FRANCISCO RAIMUNDO DE ARAÚJO

A BALANÇA DE MÚLTIPLOS BRAÇOS

MOMENTO DE ADMISSIBILIDADE DO LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO

NOVA REVOLUÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIAS

IMPUNIDADE NÃO!

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ARTIGO - ROLF MADALENO

ARTIGO - SARAH CARNEIRO ARAÚJO

LAÇOS QUE FICAM E PATERNIDADE ALIMENTAR

MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO

ARTIGO - JOSÉ EDMÍLSON DE OLIVEIRA

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WOTTON RICARDO PINHEIRO DA SILVA

ARTIGO - ANTÔNIO ALVES DE ARAÚJO

ARTIGO - ANA VLÁDIA GADELHA MOTA

MATÉRIA - REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A MEDIAÇÃO NOS CONFLITOS DE FAMÍLIA

REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

UM OLHAR SOB VÁRIAS PERSPECTIVAS

DEMOCRATIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

EXECUÇÃO DAS ASTREINTES

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ARTIGO - LUCIANA SOUSA

ARTIGO - ANTÔNIA NEUMA MOTA MOREIRA DIAS

CAFEZINHO - ANTONIO PINTO

ARTIGO - ALEXANDER SOLON MOTA

LINHA DE PARTIDA

INEXIGIBILIDADE DE ALIMENTOS EM FACE DA ATIVIDADE LABORAL

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REALIZANDO SONHOS...

PROCEDIMENTOS SUCESSÓRIOS

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PONTO DE VISTA - CID PEIXOTO DO AMARAL NETTO

ARTIGO - PRISCILLA PEIXOTO DO AMARAL

ARTIGO - FRANCISCA FRANCY MARIA DA COSTA FARIAS

AUDIÊNCIA DE PROVIDÊNCIAS

CUIDADOS NA ELABORAÇÃO DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS

A DIFÍCIL MISSÃO DE JULGAR

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ARTIGO - YURI CAVALCANTE MAGALHÃES

PERFIL LISETE DE SOUSA GADELHA

MATÉRIA - AGU - ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

ARTIGO - JOSÉ FELICIANO DE CARVALHO

20 ANOS DE CRIAÇÃO DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO - AGU

DO PÃO-E-CIRCO À BOLSA-FAMÍLIA E FUTEBOL

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HOMENAGEM

POR FRANCISCO DE SALES ALCÂNTARA PASSOS

MATÉRIA - CURA GAY

UMA REFLEXÃO: MAIS COMUNICAÇÃO NO RELACIONAMENTO A DOIS!

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CURIOSIDADES

ACONTECIMENTOS • LANÇAMENTO DE LIVRO • SOLENIDADE • MÉDICO AMIGO – PACIENTE FELIZ

ISTO SIM É COINCIDÊNCIA. PRIMEIRA UNIVERSIDADE. ENTRE OUTROS

DEMOCRATIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

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MATÉRIA - IMPORTAÇÃO DE MÉDICOS

ARTIGO - BRUNA BRASILEIRO

CONFRATERNIZAÇÃO

O BRASIL PRECISA IMPORTAR MÉDICOS?

O NOVO INIMIGO DA CORRUPÇÃO NO SETOR PÚBLICO

COFFE BREAK JURÍDICO

ARTIGO - GISELE GONÇALVES DE ALBUQUERQUE

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REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DESAFIO PARA O REGISTRO DE IMÓVEIS

CURA GAY A DISCUSSÃO CONTINUA

PROTEÇÃO À GRAVIDEZ E À MATERNIDADE:

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ARTIGO - Ângela Maria Sobreira Dantas Tavares

A BALANÇA DE

MÚLTIPLOS BRAÇOS Questões submetidas a análise dos Juízes de família são sempre tormentosas

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Ângela Maria Sobreira Dantas Tavares

Juíza Auxiliar da Comarca de Fortaleza Consultora da Revista Café & Justiça

“...na família coexistem vários laços e uma enorme gama de afetos nem sempre harmônicos”

Ao analisar a proteção da infância a partir da perspectiva da Justiça temos, obrigatoriamente, que buscar socorro em outros campos da ciência, notadamente na psicologia e serviço social afinal de contas o subjetivismo e as questões da alma são sempre matérias distanciadas do nosso universo de estudos. Essa é uma matéria que refoge do alcance dos juristas e, quando necessária, é sempre confiada a experts. E assim o é exatamente porque nestas áreas do Direito nós Juízes lidamos com um universo de íntimas relações e múltiplas emoções. As causas que envolvem infância e juventude e as questões de família, justamente pela natureza dos direitos postos em julgamento, quase sempre indisponíveis, avocam obrigatoriamente uma abordagem mais ampla a ser produzida por quem efetivamente detém condições de ver, identificar, catalogar, qualificar e enumerar os diversos conflitos humanos que envolvem esses litígios. Em se tendo conhecimento de que na família coexistem vários laços e uma enorme gama de afetos nem sempre harmônicos, apresenta-se, o psicólogo, nestas áreas, como figura indispensável para a compreensão dos dilemas a serem analisados e considerados pelo Magistrado e para a prolação de Decisões efetivamente justas e pacificadoras dos conflitos familiares. Mesmo respeitando o manto do segredo de justiça que alberga as ações que envolvem conflitos familiares, posso lembrar que, quando estive à frente da 17ª Vara de Família de Fortaleza, após iniciar uma Audiência numa Ação de Alimentos, deparei-me com a seguinte situação: - Pais não casados. Casal vivera em união estável durante algum tempo. Filho de 04 anos de idade

absolutamente inquieto, hiper-ativo, por vezes violento; sem qualquer noção de limites ou respeito. Pai desempregado, em nova união estável, vivendo de “bicos” e contribuindo com quantia mínima para o sustento do filho. Mãe desempregada, recebendo auxílio de irmãs para manter a si e ao filho e ostentando indisfarçáveis problemas neurológicos como ansiedade, descontrole emocional, verborragia, desconexão na fala... isso tudo associado a um quadro de quase desnutrição da mulher, tendo ela informado que não tinha tempo para comer porque o filho de 4 anos não parava e costumava bater-lhe quando estava sentada comendo. - Demonstraram, ambos os pais, interesse pela criança. A mãe, no seu descontrole, cobrava a presença do pai, mas não confiava o filho nem ao genitor, nem à avó paterna, nem às tias, nem a ninguém. - Seria muito fácil ultimar aquele processo simplesmente estabelecendo uma pensão a ser cumprida pelo pai, dentro dos patamares da possibilidade deste e em benefício do menor, mandar todos para casa e esquecer o problemas ou - pior! – simplesmente admitir a argüição de possível insanidade da mãe, encaminhar o caso às vias competentes e, se fosse a hipótese, o infante ao abrigamento... - Mas a coisa toda me incomodou. - Mãe e filho estavam perante o Judiciário pedindo socorro. E não era apenas um socorro financeiro... - Alegando necessidade de um novo encontro com a presença dos familiares, remarquei a Audiência, convoquei todas as irmãs da mulher, a avó paterna do menor e solicitei ajuda especializada. PesCAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Ângela Maria Sobreira Dantas Tavares

soalmente e não por intermédio de frios e impessoais Ofícios, fui ao núcleo psicossocial do Fórum Clóvis Beviláqua, narrei os fatos às profissionais que integram o setor e, na próxima Audiência, estabelecida a responsabilidade alimentar em benefício da criança, entreguei a condução do ato às especialistas que, brilhantemente, alcançaram a integral pacificação no seio daquela família tão destroçada, viabilizando condições de reeducação do menor e, de igual modo, de proteção e cuidados para a mulher que, sem condições sequer de cuidar de si própria, detinha a guarda e estava se tornado responsável pelo irreversível descontrole do filho. Vê-se, pois que, considerando os elementos simbólicos, fica cada vez mais evidente o papel que a Justiça pode desempenhar no desenrolar da trama familiar. No caso narrado, o desamor e a desunião familiar geraram o descontrole emocional que, ignorado, tinha assumido o significado de algo natural e inevitável, com o qual os integrantes daquele núcleo familiar simplesmente aprenderam a conviver. A identificação do problema, a possibilidade de redirecionamento dos afetos e responsabilidades favoreceu e confirmou o rompimento de seu ciclo. Se, naquele momento, a Justiça não tivesse assumido este papel, é provável que a situação de penúria daquela família e, principalmente, daquela criança, não apenas continuasse, mas também se intensificasse cada dia mais. Eduardo Alves da Costa, no seu poema “No caminho com Maiakovski”, escreve:

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Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada Fatos como o narrado dão-me a certeza de que a Justiça pode pura e simplesmente exercerse sobre a vida das pessoas ou pode, com muito mais eficiência, devolver-lhes a autonomia para verdadeiramente assumirem, nas suas histórias, os papéis de autores, e não apenas atores. Basta que os pratos da balança passem a agasalhar não apenas frios textos de leis, teorias, tratados... e passem a receber, com a mesma proporção, lições de amor, de humanismo, de cuidadosas investigações psicossociais advindas de ramos outros do conhecimento humano, permitindo uma abordagem mais ampla dos conflitos trazidos à Justiça

mento ou não, pois agora não mais existem filhos legítimos, ilegítimos, legitimados, naturais, adulterinos ou incestuosos. Só existem filhos, iguais em tudo e por tudo. Também não há poder dos pais sobre os filhos. Este Pátrio Poder foi transmudado em “Poder Familiar” sendo, à criança e ao adolescente assegurado o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Por força de disposição constitucional (CF/88, art. 227, caput), a criança e o adolescente foram postos a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Em países como os Estados Unidos, Espanha e Canadá, a Justiça sempre conta com o trabalho do psicólogo judiciário para auxiliar os magistrados em processos das Varas Criminais e, principalmente, em questões das Varas de Família.

Os conflitos que envolvem a infância têm se tornado cada vez mais complexos, notadamente porque intensas modificações têm ocorrido nas últimas décadas no âmbito do Direito de Família.

Aqui no Brasil, mais especificadamente em Brasília, o Serviço Psicossocial Forense está diretamente subordinado à Corregedoria da Justiça do Distrito Federal e, durante os seus anos de atuação, tem desenvolvido trabalhos junto às diversas Varas de Família, Criminais e Cíveis da Justiça de 1° Grau do Distrito Federal, por meio da Seção Psicossocial Forense (SEPAF), Seção essa que atende as pessoas envolvidas em processos que tramitam em qualquer uma das Varas mencionadas acima e que tenham sido encaminhadas, pelos Magistrados, para estudo de caso.

Os pais passaram a ter o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, frutos do casa-

A exemplo do procedimento ainda adotado pela grande maioria dos Tribunais brasileiros, os


profissionais do SEPAF também eram, conforme previsão contida no art. 420 do CPC, convocados para assessorar o Magistrado realizando perícias tendentes a esclarecer algum ponto específico objetivado ou identificado pelo Juiz, mas que escapava do alcance técnico deste. Os psicólogos e Assistentes Sociais atuavam de forma distanciada, com a pretensão de não intervir na situação estudada e, no final, ofereciam um parecer técnico confeccionado conjuntamente por Psicólogo(s) e Assistente(s) Social(is). Assim como até hoje ocorre entre nós, o SEPAF assessorava o Magistrado no processo de decisão, mas não interferia diretamente sobre o conflito. As famílias ocupavam apenas uma posição passiva. Seus membros eram diagnosticados e suas qualidades e defeitos apontados pelos estudos, Relatórios, Pareceres e Laudos dos profissionais, trabalho esse que, nessas condições, falhava em promover uma situação que possibilitasse que as famílias atendidas encontrassem uma solução para seus conflitos. Essa situação sempre inquietou os profissionais da SEPAF e moveu-os na busca de uma abordagem que permitisse intervenções de mudança, mesmo no contexto judicial, permitindo-os alcançar dois objetivos: 1º) aumento da qualidade e eficiência das atividades desempenhadas para o assessoramento aos magistrados no julgamento de ações judiciais e 2º) promoção de um espaço para resolução de conflitos. E, ao alcançar essas metas traçadas, o SEPAF passou de uma atuação de diagnóstico para uma abordagem relacional, privilegiando a intervenção junto com o sistema familiar, abrangendo todos os envolvidos no estudo psicossocial assim como quaisquer outras pessoas que possam interferir na dinâmica psicoafetiva dos menores envolvidos nos processos, na busca de acordos, do bem -estar familiar e, principalmente, daqueles que, ainda em fase de desenvolvimento físico-psiquico, vêm-se envolvidos nesses conflitos. (...) Seria extremamente proveitoso se os Juízes das Varas de Família e Infância se mobilizasse e engrossassem a corrente daqueles que defendem um conhecimento interdisciplinar, uma visão global das questões que lhes são postas para análise, pois não são poucos os processos que tramitam nessas diversas varas e cuja problemática envolve aspectos que transcendem os limites da área jurídica. Em geral, as demandas judiciais envolvendo membros de uma mesma família são permeadas por questões psicossociais que reclamam a obtenção de dados a respeito da família envolvida e sua dinâmica, do ponto de vista da Psicologia e do Serviço Social e, bem assim, a intervenção terapêutica que promova uma reflexão sobre as dificuldades

vividas pelas famílias, possibilitando aos seus membros a descoberta de novos padrões interacionais que favoreçam a construção de alternativas de resolução de conflito e superação do impasse judicial. Na condição de profundamente apaixonada pelo Direito de Família espero ainda poder contar, no deslinde das Demandas que me forem submetidas, com a efetiva assessoria de uma equipe interprofissional composta de Psicólogos, Educadores, Assistentes Sociais e, se possível, Médicos, que: 1.possam fornecer estudos psicossociais referentes aos processos encaminhados e, de igual modo, dados psicossociais que subsidiem a decisão judicial e 2.possam apoiar as famílias em seu potencial de resolução de conflitos, buscando superar o impasse judicial e alcançar consenso em sua decisão a respeito da problemática que deu origem ao processo judicial. - E sonhar ainda é um artigo não tributado neste nosso País... Agora, na adolescência da minha velhice, guardo a certeza de que a Justiça não exterioriza a sua majestade apenas pelos fatos que por ela são apreciados e decididos: - materializa a sua grandiosidade predominantemente em razão da imparcialidade, da independência, do equilíbrio e da sensatez daqueles que a compõem.

“Os conflitos que envolvem a infância têm se tornado cada vez mais complexos, notadamente porque intensas modificações têm ocorrido nas últimas décadas no âmbito do Direito de Família.”

Acredito piamente que ainda verei a Justiça com a justeza e certeza que idealizo. Para isso tenho plantado minhas sementinhas... E, para encerrar, utilizo por empréstimo as palavras de Almir Sater e Renato Teixeira: Ando devagar porque já tive pressa E levo esse sorriso porque já chorei demais, Hoje me sinto mais forte, mais feliz, quem sabe Eu só levo a certeza de que muito pouco eu sei Eu nada sei (...) Penso que cumprir a vida seja simplesmente compreender a marcha E ir tocando em frente Como um velho boiadeiro levando a boiada Eu vou tocando os dias pela longa estrada eu vou Estrada eu sou... CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Váldsen da Silva Alves Pereira

MOMENTO DE ADMISSIBILIDADE DO LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO Impende-me dizer, de começo, que as opiniões doutrinárias e julgados anteriores, relacionados a períodos ou lapso de tempo antecedente à vigência da nova Lei Mandamental, não têm qualquer serventia aos casos de litisconsórcio tratados pela Lei nº 12.016/2009, uma vez que esta admite o litisconsórcio após a distribuição. A sobredita lei, atenta às discussões então existentes, a de dirimir os conflitos jurispruden-

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ciais e doutrinários então reinantes, enuncia expressamente, no seu artigo 10, § 2º, o seguinte: “O ingresso do litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da inicial”. Ora, a contrário senso, pertinente o ingresso do litisconsorte antes do despacho da inicial, sendo inadequada a interpretação de que tal dispositivo deve ser interpretado à luz da CF e que

seu teor não implica na admissibilidade do litisconsórcio em fase posterior à distribuição. Com a devida vênia aos que assim interpretam o supracitado artigo da vigente lei mandamental, jamais haverá litisconsórcio nos mandados de segurança ou em outras ações, mormente quando diferentes as partes e advogados, uma vez que todas as petições, posteriores à inicial, devem ser dirigidas a um magistrado e com o número do processo.


Váldsen da Silva Alves Pereira

Desembargador do TJ-Ce; Presidente da 8° Câmara Cível; Professor Titular da UECE; Presidente do Instituto dos Magistrados do Ceará; Editor da Revista semestral do IMC; Autor de livros jurídicos e de inúmeros artigos publicados em diversas revistas jurídicas nacionais.

E como será possível o pleito litisconsorcial antes da distribuição para deferir ou não o litisconsórcio se ainda, antes da distribuição, não se tem o número do processo e nem a vara para qual a ação foi distribuída? De assim, a perdurar o entendimento de alguns (poucos) doutrinadores, encerrados em seus gabinetes e ignorantes da práxis forense, jamais haverá o instituto do litisconsórcio chamado ativo, suscitado antes da distribuição, dado que uma petição, com o número do processo, deve ser dirigida a uma vara ou câmara, do que nenhum servidor do Poder Judiciário receberá uma petição avulsa, posterior a inicial, sem a menção da vara ou relator do feito, concebendo um litisconsórcio anterior a distribuição. E mais: somente a inicial é distribuída. E como saberão os litisconsortes que uma ação idêntica as suas pretensões foi ajuizada por outro impetrante senão quando aquela é distribuída tornando-se do conhecimento de todos?

“De assim, a perdurar o entendimento de alguns (poucos) doutrinadores, encerrados em seus gabinetes e ignorantes da práxis forense, jamais haverá o instituto do litisconsórcio chamado ativo”

Indaga-se: ha publicação dos protocolos? A prevalecer tal entendimento, os litisconsortes e os advogados devem ficar de prontidão no Fórum para identificar as ações símiles para o ingresso do litisconsórcio antes da distribuição. E no caso dc distribuição rápida, ou se a, distribuída de imediato, logo após o protocolo? Nesta hipótese, entendo só ser possível tal conhecimento de casos semelhantes nas comarcas de vara única. Para suprimir taIs controvérsias e dúvidas é que sobreveio o artigo 10, § 2º, da Lei nº 12.016/2009, permitindo o ingresso do litisconsorte antes do despacho inicial sem qualquer

alusão á distribuição do mandamus, quer se antes ou depois desta ocorrer. Segundo Francisco Cavalcante in O Novo Regime Jurídico do Mandado de Segurança, edição 2009, págs. 29/130, a focada lei coíbe, expressamente, a prática abusiva, representada por litisconsórcios ativos facultativos posteriores ao despacho inicial proferido nos mandados de segurança, com repercussão, por analogia, nas demais ações judiciais. E conclui, portanto, admitindo o avanço da nova lei que admite o litisconsórcio antes do primeiro despacho. Portanto, não constitui prática abusiva o pleito e a admissão de litisconsortes antes do despacho inicial, reconhecendo o ínclito jurista em relação à jurisprudência anterior, a admissibilidade do litisconsórcio antes do despacho ou decisão inicial. Decerto que o seu posicionamento pessoal é no sentido de que depois da distribuição descabe a admissão do litisconsórcio, mas admitiu que a lei nova avançou ao estabelecer que o litisconsórcio não será admitido após o despacho inicial, podendo ser admitido em fase ou fases anteriores, mas não estabelecendo a nova lei qual o momento da admissão do litisconsórcio, seja antes da distribuição ou durante a distribuição. Neste pouco, silente a nova lei, mas reafirmando que o litisconsórcio só não poderá ser admitido depois do despacho inicial. Bem por isso, o eminente Ministro Gilmar Mendes, do STF, em obra conjunta com os não menos doutos constitucionalistas Hely Lopes CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Váldsen da Silva Alves Pereira

Meirelles e Arnoldo Wald, assinalou o seguinte: “Na prática vinha sendo admitida a intervenção de litisconsorte ativo ulterior, isto é, depois de estabelecida a relação processual, com a prestação das informações pelo coator. Tal proceder foi devidamente rechaçado pela Lei no. 12.016/2009, em seu artigo 10, § 2°, que exige o ingresso do litisconsorte antes de despachada a inicial.” (Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. de Hely Lopes Meireles, Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes. 34° Edição. p. 80). Os ilustres constitucionalistas, por assim, não aludem à admissão do litisconsórcio somente na fase anterior a distribuição ou durante ela, sobretudo porque a lei mandamental é especial, só se aplicando a CPC de forma subsidiária, nos casos omissos ou lacunas da lei especial. E como a nova lei do mandado de segurança, a contrario senso, é expressa na admissão do litisconsórcio ativo antes do despacho inicial, não há como interpretar tal dispositivo legal como duvidoso, a permitir uma interpretação conforme a CF, como pretendem alguns processualistas. E a inconstitucionalidade desse dispositivo legal jamais foi arguida perante a STF e nada assinalaram, no convergente, os renomados constitucionalistas na obra, supramencionada. Por assim, enquanto não revogado o questionado dispositivo legal ou declarada a sua inconstitucionalidade, deve ser ele aplicado, à vista de que a lei mandamental, de natureza especial, não expressa que o litisconsórcio só pode ser admitido antes da distribuição, calhando bem a ponto os brocados “ubi lex non distinguit nec nos distinguera debemus” e “interpretatio cessat in claris”. Descabe a transcrição de decisões à luz da lei mandamental revogada e à Iuz do CPC, quando a nova lei do mandado de segurança é lei especial,

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pois no caso da lei especial, só se aplica o CPC de forma subsidiária, não cabendo ao CPC estabelecer o momento próprio de admissão dos litisconsortes, previsão já contida na focada lei especial, no seu artigo 10, § 2°. Incabível, também, estabelecer qual a fase processual adequada para o ingresso de litisconsorte com base na lei de ação popular, lei de natureza especial tanto quanto à lei mandamental, razão pela qual um dispositivo de uma lei especial não se aplica a outra da mesma natureza jurídica. Decerto que alguns doutrinadores criticam o ingresso do litisconsorte após a distribuição do feito, mas admitem que, em relação a nova lei mandamental, houve um avanço em relação à lei revogada, mas sem qualquer precipitação de admitir a inconstitucionalidade do citado dispositivo legal. Doutra face, não compete ao judicante, à vista dos termos expressos e claros da multicitada lei, suscitar, de ofício, inconstitucionalidades insuscitadas pelos litigantes. Ao demais, sequer compete ao judicante, ao que penso interpretar, de ofício, dispositivo legal de lei especial numa interpretação conforme a CF, de competência do STF em Ação Direta de Constitucionalidade ou Inconstitucionalidade. Em suma, o mencionado preceito legal está em vigor e deve ser aplicado, não padecendo dúvida, no respeitante, entre os doutrinadores já citados. Assim, dizer que é vedada a formação de litisconsórcio facultativo após a distribuição da demanda, sob pena de se permitir aos litigantes a escolha do órgão judicante competente para analisar o processo, é invocar fundamentação jurídica desarmada de fomento jurídico, a despeito de entendimentos doutrinários isolados.


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ARTIGO - Rodrigo da Cunha Pereira

NOVA REVOLUÇÃO NA

CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIAS

O casamento por amor fez uma grande revolução nas relações de família. A partir daí deixaram de ser preponderantemente núcleos econômicos e reprodutivos. Já que o amor às vezes acaba, surge o divórcio. O afeto tornou-se um valor jurídico e em consequência surgiram diversas configurações de famílias conjugais e parentais, para além do casamento: uniões estáveis hétero e homoafetivas, multiparentalidade, famílias monoparentais, simultâneas, mosaico etc. Outra grande revolução, que em breve se tornará comum, está na constituição de novos modelos de famílias parentais, isto é, filhos de pais que não são fruto de uma relação conjugal ou sexual. Isto só tornou-se possível porque passou-

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se a distinguir, no campo jurídico, parentalidade de conjugalidade. Até pouco tempo atrás, uma mulher que tivesse uma relação extra-conjugal, além de ser considerada culpada pelo fim do casamento, perdia a guarda de seu filho. Já não é mais assim. O Direito já entendeu que não há culpados, mas sim responsáveis pelo fim da conjugalidade. A mulher, embora não tenha sido uma boa esposa, pode ser uma ótima mãe, e vice versa. Foi na esteira desse raciocínio jurídico que as funções conjugais começaram a ficar separadas e diferenciadas das funções parentais. Instalandose, uma nova lógica jurídica. Com a distinção entre essas duas funções na constituição de famílias, é que se tem feito hoje


Rodrigo da Cunha Pereira

Advogado, Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família IBDFAM, Doutor (UFPR) e Mestre (UFMG) em Direito Civil e autor de vários artigos e livros em Direito de Família e Psicanálise.

contrato de geração de filhos, assim como já se fazia antes contratos de união estável e pactos antenupciais para regulamentar aspectos patrimoniais dos casamentos. O primeiro sinal dessas novas gerações de famílias parentais foram as conhecidas “produções independentes”. Com a liberação dos costumes sexuais a partir da década de sessenta, mulheres que queriam ter filhos, independentemente de terem um parceiro fixo, assumiam a maternidade, até mesmo sem que seu parceiro soubesse. São as denominadas hoje famílias monoparentais, reconhecidas pelo Estado a partir da Constituição da República de 1988. A partir da década de oitenta, com o desenvolvimento da engenharia genética, quem não pudesse ter filhos, e não quisesse adotar, já poderia recorrer às técnicas de inseminações artificiais, útero de substituição, busca de material genético em bancos de sêmen e óvulos, independentemente de ter parceiro ou não. Ficou mais fácil ter filhos, e cada vez mais desatrelado de uma relação conjugal ou sexual.

“Outra grande revolução, que em breve se tornará comum, está na constituição de novos modelos de famílias parentais, isto é, filhos de pais que não são fruto de uma relação conjugal ou sexual”

Uma nova categoria de famílias está surgindo, facilitada pela internet. Tais pessoas não estão interessadas em um novo amor ou em constituir uma família conjugal, mas apenas uma parceria de paternidade. Se isto era feito nas décadas anteriores, com dificuldades e limitações da criança não conhecer o doador do material genético, agora fez-se um upgrade nestas famílias parentais. Pelas redes sociais e sites de “paternidade compartilhada”, já tem sido comum homens e mulheres encontrarem alguém para compartilhar a paternidade/maternidade, sem estabelecerem uma relação amorosa ou sexual. Este novo modelo de filiação se apresenta como uma alternativa à adoção, inseminações artificiais nas quais não se sabe quem é o doador do material

genético e barriga de aluguel em que se terceiriza a gravidez. A internet, na verdade, apenas ampliou essas facilidades de parcerias de paternidade. No Brasil já se materializava essa idéia, em pequena escala é claro, através de contratos de geração de filhos. A diferença das famílias comuns, é que ao invés de se escolher um parceiro para estabelecer uma relação amorosa ou conjugal, escolhe-se um parceiro apenas para compartilhar a paternidade/ maternidade através da combinação de um ato reprodutivo. Isto dá um nó na teoria psicanalítica, que tem como uma de suas bases de sustentação o Complexo de Édipo e o interdito proibitório do incesto, pois fica uma pergunta no ar: como será essa paternidade e maternidade, cujos pais não ocupam lugar de desejo no outro genitor? Estas novas configurações familiares podem causar uma grande estranheza. Não faltará quem pense que isto é o fim da família, como se falou em 1977, com a introdução do divórcio no Brasil, e que nossa sociedade está sendo invadida por pais errantes e mães desvairadas. No início deste século, quando os tribunais começaram a reconhecer e legitimar as famílias entre pessoas do mesmo sexo, não faltou também quem falasse na desordem da família. Nesta nova modalidade de paternidades compartilhadas, certamente, os filhos terão pais muito mais responsáveis e comprometidos com a sua criação e educação do que os muitos filhos de famílias constituídas nos moldes tradicionais, que muitas vezes os abandonam, ou não se responsabilizam por eles. Enfim, estamos diante de um novo marco revolucionário na história da família. [Assim como foi revolucionário o casamento por amor, que destituiu a lógica essencialmente patrimonialista nas relações de família]. CAFÉ & JUSTIÇA

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A BOA APARÊNCIA NÃO É MAIS TÃO COMPLICADA Na edição passada falamos da importância da boa aparência para profissionais liberais, em especial os advogados. É fato que um indivíduo não consegue ficar indiferente a algo que se apresente muito belo ou muito feio e isso influencia de modo mais ou menos importante a contratação de um serviço. Por outro lado, a agenda atribulada e o acúmulo de funções dificulta o cuidado com vários aspectos da vida pessoal, entre eles o “estético”. A medicina, então, tratou de buscar soluções para esses indivíduos que precisam de cuidados mas não podem se afastar das atividades diarias. Os procedimentos estéticos pouco invasivos vêm, de fato, crescendo em importância e competência, assumindo números muito mais expressivos do que as próprias cirurgias plásticas.

veram-se em um ritmo acelerado. A ideia é simples e brilhante: pequenas intervenções, para corrigir pequenos defeitos.

O ramo do Direito apresenta entre suas peculiaridades uma enorme importância das relações interpessoais. Em uma análise fria, o advogado muitas vezes é o produto que o cliente “compra” e essa decisão envolve aspectos nem sempre relacionados à real capacidade laboral do profissional. Mesmo na carreira dentro de uma empresa ou órgão público o networking é imprescindível. Nessas relações, uma boa aparência facilita a interação ou, na pior das hipóteses, não a prejudica.

As possibilidades são infinitas. O apelo é grande. A recompensa também. Entretanto, não podemos tomar isso como uma panaceia, vale sempre lembrar. Os procedimentos estéticos ambulatoriais são atribuições restritas a médicos, treinados especificamente para tal. Também não substituem as cirurgias plásticas tradicionais em alguns casos e isso deve ser bem avaliado. A dica é sempre a mesma: procure um médico de confiança e invista em você. Nem que seja no intervalo entre as reuniões.

O leque de opções cresce a cada ano e as intervenções são cada vez mais eficazes e confiáveis. A correção de rugas e sulcos, por exemplo, pode ser feita com visitas de 30 minutos ao consultório médico. A ablação de cicatrizes de acne, que antes demandava recuperação de quase um mês, hoje pode devolver o profissional ao escritório até mesmo antes de 48 horas. Pequenas imperfeições no nariz ou nos lábios são corrigidas em minutos. Dispondo de alguns dias, é possível até ocultar o processo de recuperação. “Sempre fui assim, meu amigo”!

Não acredito que “ser bonito”, per se, seja essencial. Parece ter importância, entretanto, estar “bem cuidado”. A ideia primeira, algumas vezes, é que um profissional relaxado consigo mesmo, também o será com suas atribuições. As boas maneiras, o controle do peso, a escolha das roupas, o cuidado com a pele e o cabelo são o básico. A correção de pequenas imperfeições, como rugas muito profundas, cicatrizes de acne, manchas e outros inesteticismos completam o leque de cuidados. Acompanhando o aumento da concorrência no mercado de trabalho e a cobrança cada vez maior de “boa aparência”, em um ambiente onde não podemos nos afastar das atividades diárias, os procedimentos estéticos pouco invasivos (também chamados “ambulatoriais”, uma vez que fogem dos centros cirúrgicos) desenvol-

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Dr. Fabiano Magacho

Dr. Fabiano Magacho – CRM 9845-CE Médico, Pós-graduado em Medicina Estética, Presidente da Regional Ceará da Associação Brasileira de Medicina Estética.


CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Francisco Raimundo de Araújo

IMPUNIDADE

NÃO! Quando Montesquieu, escritor e filósofo iluminista francês , apresentou ao mundo sua extraordinária obra de ciência política , a Teoria da Separação dos Poderes (ou da Tripartição dos Poderes do Estado), há mais de dois séculos e meio, jamais imaginou que seu extraordinário trabalho viria a ser utilizado como pano de fundo a democracias mambembes que se espalham pelo mundo, sob o comando de pseudos-democratas que, na verdade, agem como ditadores excêntricos, porquanto amparados por casas legislativas que lhes são fiéis, para não se acoimar-lhes de subservientes. Nos estudos e pesquisas do extraordinário filósofo, condensados no livro “O Espírito das Leis” (1748), foram utilizadas idéias lançadas cem (100) anos antes por John Loocke, vulto proeminente do liberalismo inglês. Bem antes, Aristóteles, na sua obra “Política”, já previra essa tripartição. Aprofundando-se na matéria, Montesquieu analisou as relações das Leis com a natureza e os princípios de cada governo, desenvolvendo a teoria do constitucionalismo, que busca a distribuição da autoridade por meios legais, evitando o arbítrio e a violência. Essas idéias que dividiam os poderes em Executivo, Judiciário e Legislativo, e que viriam a

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se tornar em base do exercício da democracia, influenciaram sobremaneira a elaboração da Constituição dos Estados Unidos, a conhecida Constituição da Filadélfia (1787), estabeleciam como Poder Legislativo o Poder, ao qual se atribuía a função independente de elaborar as leis reguladoras do Estado, tendo ainda, como funções elementares, a fiscalização do Estado, votação do orçamento e, em situações específicas, julgamento de determinadas pessoas, como o Presidente da República, ou os próprios integrantes do Poder, e o Poder Executivo como executor das leis. O termo Poder Judiciário não é mencionado especificamente por Montesquieu que o prevê como uma terceira função destinada a dirimir, em

casos concretos, divergências surgidas durante a aplicação das leis. Como executores das leis, diferenciava o Executivo do Judiciário, porque àquele se atribuía a aplicação da norma aos casos em que existisse litigiosidade, enquanto a este, o cumprimento das leis independentemente da ocorrência de oposição ou controvérsia. Condição inarredável dessa tripartição, na visão de Montesquieu, seria a autonomia de cada Poder a ser exercido por pessoas e grupos diferenciados, daí sua conclusão de que “só o poder refreia o poder”.


Francisco Raimundo de Araújo

Promotor de Justiça titular da 7ª Promotoria de Família de Fortaleza-Ce

“Construções de obras públicas intermináveis e sempre com orçamentos reajustados a cada ano sob denúncias de fraudes e desvios de verbas; saúde e educação ao desamparo e funcionalismo público com vencimentos defasados são apenas alguns exemplos desse quadro de mazelas que vivenciamos diuturnamente.”

Sem adentrarmos em comentários sobre regimes democráticos melhor ou pior desenvolvidos do que o nosso e espalhados pelo mundo, notadamente no continente americano, observamos que não é necessário estudo mais aprofundado sobre o afastamento da nossa democracia dessa visão montesquiana, para constatarmos que a tripartição dos poderes no Brasil serve, exclusivamente, de cenário para o exercício de um poder contaminado por costumes ditatoriais, onde o Executivo e o Legislativos se irmanam em conluios para impor a vontade daqueles que se apoderam do comando da Nação. No âmbito dessa democracia surreal vangloriam-se Prefeitos, Governadores e Presidente (a) da República de possuírem maiorias imbatíveis nas Câmaras Municipais, nas Assembléias Legislativas e no Congresso Nacional, a dar-lhes amparo suficiente à aprovação de Leis, sejam ou não do interesse da sociedade. Ao povo é negado o acesso à administração pública porque o Legislativo, caminho constitucional do exercício desse direito, lhes fecha as portas. Podemos avaliar, mas jamais quantificar o custo dessa relação porque suas fontes e seus meios de sustentação são bastante diversificados, indo da oferta de vagas nas administrações (municipais, estaduais e federais), à liberação de verbas orçamentárias suficientes à manutenção de feudos eleitorais, além do enriquecimento individual de parlamentares e lobistas. Construções de obras públicas intermináveis e sempre com orçamentos reajustados a cada ano sob denúncias de fraudes e desvios de verbas; saúde e educação ao desamparo e funcionalismo público com vencimentos defasados são apenas alguns exemplos desse quadro de mazelas que vivenciamos diuturnamente.

Ainda por conta desses desvios de Poder é que surgem os “Cachoeiras” da vida, alguns responsabilizados por seus atos, outros acobertados pela impunidade, por conta da destreza e inteligência que utilizam para fugir das investigações policiais e da ação da Justiça, esta atada por Leis, inclusive pela Lei Maior, que permitem o uso de recursos e mais recursos por quem delinqüe. E quando o Poder Judiciário e o Ministério Público dão mostras de que estão alertas na repulsa a esses desmandos, o primeiro, através de sua mais alta Corte, proferindo decisões históricas e justas, e o segundo investigando as fontes e os responsáveis pelas sangrias dos cofres do erário, tudo sob os aplausos da população, surjem as retaliações, e o pior, sob o comando, exatamente, daqueles que cometeram as mais escabrosas infrações contra o patrimônio público. O Brasil inteiro, por conta de sempre vigilante ala da imprensa nacional, tomou conhecimento das mal soantes vem PEC’s 33 e 37, destinadas a lançar o manto da impunidade sobre aqueles que surrupiam incessantemente as verbas públicas da nação. O espectro criado sobre possível aprovação dessas PEC’s, intranquilizou a Nação brasileira porque, aos seus olhos, a relação nefasta entre Executivo e Legislativo, neste país, está eivada por interesses escusos de ambas as partes. Felizmente, o primeiro espectro, a PEC 37 já recebeu o destino merecido: foi definitivamente expurgada do cenário jurídico nacional. Cabe aqui um breve destaque à doutrina de Montesquieu: “Quando na mesma pessoa ou corporação o poder legislativo se confunde com o executivo, não há mais liberdade”. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Nádia Maria Frota Pereira

INGRESSO NA MAGISTRATURA – SISTEMAS CONSTITUCIONAIS

BRASILEIRO E NORTE AMERICANO

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Nádia Maria Frota Pereira

Juíza Titular da 12ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza/CE

A Universidade da Geórgia – Dean Rusk Center for International and Comparative Law ofereceu, para diversos Magistrados brasileiros – inclusive para a subscritora deste artigo, o Curso de Administração Judiciária, Administração Pública e Sistema Judiciário Americano, proporcionando a participação em atividades teóricas e práticas e abordando vários temas, dentre os quais, a forma de acesso aos cargos da Magistratura no Sistema Judiciário americano, notadamente no Estado da Geórgia, o que permitiu um cotejo fático entre o sistema americano e o brasileiro, estudos esses que, de maneira didática e em modesta síntese, oferecemos aos leitores da Revista Café & Justiça. Antes de adentrarmos no exame das formas de ingresso na Magistratura brasileira e americanas, cumpre salientar que nos Estados Unidos da América, em razão da adoção do Sistema Federativo em sua modalidade mais tradicional, o sistema judiciário é bastante complexo, uma vez que os cinquenta Estados da Federação possuem sistemas próprios, atuando de modo independente, muito diferente do que ocorre no Brasil, onde existe uma Corte nacional de uniformização da interpretação jurisprudencial. Interessante é notar que o Brasil, na gênese de seu sistema judiciário, alinhou-se à tradição jurídica Romana e da Europa Continental, adotando o conhecido sistema do civil Law, herdado das instituições portuguesas, no qual predomina a utilização de normas gerais e abstratas a serem aplicadas aos casos concretos através de diversos mecanismos de ordem técnica. Assim, tendo em vista que os sistemas identificados com a tradição romano-germânica adotam uma visão mais técnica do fenômeno jurídico, surge a necessidade de que os aplica-

dores sejam pessoas especializadas, dotadas de conhecimentos técnico-jurídicos aprimorados, de forma a permitir a efetivação da vontade estatal. Dessa necessidade surge como resposta a profissionalização da magistratura, ou seja, do agente aplicador do Direito. Nesse diapasão, a tradição jurídica brasileira adota duas formas distintas de ingresso na magistratura: - uma por meio de aprovação em certame público de provas e títulos e outra através da nomeação por parte do Chefe do Poder Executivo do ente federativo ao qual pertence o órgão judiciário. A Justiça brasileira é estruturada de forma piramidal, na qual existe um órgão de cúpula, o Supremo Tribunal Federal, com jurisdição em todo o território nacional, ao qual é assegurada a prolação de decisões terminativas em sede de análise da constitucionalidade de leis e atos normativos e, em uma posição abaixo, encontram-se os Tribunais Superiores (o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral, o Tribunal Superior do Trabalho e o Superior Tribunal Militar), também com jurisdição sobre todo o território nacional, tendo suas decisões o caráter de definitividade em matérias infra-constitucionais, cada um dentro de seu âmbito de competência delineada pela Constituição Federal de 1988. O Poder Judiciário brasileiro divide-se ainda em Justiça Federal e Justiça Estadual. A primeira é composta pela Justiça Federal comum (formada pelos juízes federais submetem-se aos Tribunais Regionais Federais, presentes em cinco regiões do País), da Justiça Eleitoral (formada pelos juízes estaduais investidos de funções eleitorais, submete-se aos Tribunais especializados, ou seja, aos Tribunais Regionais Eleitorais, presentes nas

26 unidades federativas estaduais e no Distrito Federal), da Justiça do Trabalho (formada pelos juízes do trabalho submetem-se aos Tribunais Regionais do Trabalho, presentes em 24 unidades federativas) e da Justiça Militar Federal. Já a Justiça Estadual é formada pelos juízes de Direito e submetem-se aos Tribunais de Justiça estaduais presentes nas 26 unidades federativas estaduais e no Distrito Federal. Desse universo, as magistraturas de primeira instância, quais sejam, o juízes estaduais, os juízes federais e os juízes do trabalho, ingressam na magistratura através de concurso público de provas e títulos, de ampla concorrência, sendo essa a regra para ingresso na magistratura brasileira. O ingresso nos Tribunais brasileiros se faz pela fórmula trazida pelo art. 94, da Constituição Federal, no qual é aplicada a fórmula do quinto constitucional, que determina que um quinto das vagas dos Tribunais deva ser preenchido por membros do Ministério Público e da Advocacia. A promoção do magistrado de carreira é efetivada por meio de votação aberta dos membros do Tribunal ao qual está vinculado o Juiz, alternandose, no processo de promoção, os critérios de merecimento e antiguidade. Já os magistrados que ascenderem pelas regras do quinto constitucional serão nomeados pelo Chefe do Poder Executivo do ente político ao qual se vincula o órgão judiciário, através de lista tríplice de candidatos enviada pelo próprio Tribunal. O ingresso dos Ministros nos Tribunais Superiores e no Supremo Tribunal Federal ocorre pela nomeação do Presidente da República, através de listas tríplices enviadas pelos Tribunais, devendo os candidatos ser sabatinados e aprovados pelo plenário do Senado Federal. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Nádia Maria Frota Pereira

Desta forma, vislumbra-se que no sistema judiciário brasileiro, os cargos na magistratura são providos ora através do critério técnico, para ingresso na magistratura de plano, e o critério político, através da nomeação por parte dos Chefes do Poder Executivo, critério este que se justifica teoricamente pela necessidade de equilíbrio entre os Poderes constituintes da República, sendo medida adotada no âmbito do Princípio de Freios e Contrapesos. Em todos os casos a magistratura é vitalícia. Antes de analisar as formas de acesso à magistratura americana, interessante é notar que os Estados Unidos, na gênese de seu sistema judiciário, alinhou-se à tradição jurídica AngloSaxã, adotando o conhecido sistema do Common Law, herdado das instituições inglesas, no qual predomina a utilização de precedentes judiciais a serem aplicadas aos casos concretos através de mecanismos onde preponderam critérios de ordem mais política do que técnica. Assim, tendo em vista que os sistemas identificados com a tradição anglo-saxã adotam uma visão mais política do fenômeno jurídico, não existe a necessidade de que os aplicadores sejam pessoas especializadas, dotadas de conhecimentos técnico-jurídicos específicos, mas sim que seja alguém que represente os anseios daquela sociedade em termos de justiça e equidade. O modelo judiciário americano é estruturado com um Poder Judiciário Federal e cinqüenta sistemas judiciais estaduais que atuam quase que de modo independente. A estrutura é piramidal, estando no ápice a Suprema Corte dos Estados Unidos, composta por nove juízes que são escolhidos pelo Presidente da República, aprovados pelo Senado, com investidura vitalícia, estando sujeitos ao processo de impeachment. Logo abaixo existem 12 Corte Regionais de Apelação e uma Corte de Apelação para o Circuito Federal. Abaixo das 12 Cortes Regionais, existem 94 Distritos Judiciais, com jurisdição para a resolução de questões em primeira instância. Os Estados possuem sistemas paralelos de jurisdição em Cortes de Primeira Instância de Apelação e Supremas Cortes Estaduais. Os juízes são eleitos. O Estado da Geórgia, que mais especialmente abordamos, possui 159 Comarcas e sua estrutura judiciária assim funciona:

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Nas Cortes de 1ª Instância (todas de competência limitada): a) Municipal Court - São 370 Cortes Municipais formadas por 350 juízes, possuindo jurisdição nos limites geográficos da cidade. O mandato dos juízes das Cortes Municipais são fixados pela legislação local b) Magistrate Court - São 159, com 159 Chief Magistrate e 354 magistrados. Os magistrados são eleitos para mandatos de quatro anos; c) Probate Court - O Estado da Geórgia possui 159 Cortes Probatórias e 159 juízes. Os juízes da Corte Probatória são eleitos para um mandato de quatro anos, devendo ter pelo menos 25 anos, serem graduados em escola secundária, comprovar residência na comarca durante pelo menos dois anos que precedem a eleição. d) Juvenile Court - Tem como objetivo cuidar do bem estar das crianças. Os juízes dessas cortes não são eleitos e sim nomeados em comissão pelos juízes dos tribunais de circunscrição, com mandato de quatro anos. Esses juízes devem ter pelos menos trinta anos de idade, devem residir no estado da Geórgia por três anos e terem prática de advocacia por cinco anos. e) State Court - São eleitos para mandatos de quatro anos, cujo o pleito e realizado na comarca, entre cidadãos sem vinculação partidária. O Poder Legislativo pode criar Cortes Estaduais, estabelecendo números de juízes de cada Corte, jornada de trabalho dos mesmos e se devem servir em horário integral ou meio período. Aos juízes que trabalham meio período e permitida a pratica da advocacia desde que não a exerça na corte na qual atua como juiz. * Na Forma Intermediária: a) Superior Court - A corte superior e formada por quarenta e nove circuitos e duzentos e cinco juízes. São eleitos para um mandato de quatro anos entre cidadãos sem vinculação partidária. b) Court of Appeals - O tribunal de apelação é composto por 12 juízes, os quais exercem jurisdição sobre as apelações proposta contra as decisões das Cortes (State Court, Juvenile Court e

Probate Court). Os juízes do tribunal de apelação são eleitos para um mandato de seis anos, entre cidadãos sem vinculação partidária, cujo pleito e realizado em todo o estado. Os candidatos devem ter pratica advocatícia de sete anos para habilitarem-se. No caso de vacância do cargo o preenchimento se dará por nomeação do governador, para completar o tempo de quem se afastou. Cúpula Estadual a) Supreme Court - A Suprema Corte da Geórgia e formada por sete juízes. Os setes juízes que compõem a Suprema Corte são eleitos em pleito estadual para um mandato de seis anos, entres cidadãos sem vinculação partidária e devem ter prática advocatícia de sete anos para habilitarem-se ao cargo. Os membros da corte elegem entre eles mesmos um Chief Justice, que preside o corpo de juízes do Tribunal e outro que cuida dos assuntos administrativos, com mandatos de quatro anos. Verifica-se através da análise minuciosa da estrutura organizacional do Judiciário do Estado da Geórgia, que a maioria dos magistrados são eleitos pelo voto popular e para exercer seu mister por tempo determinado. Como dito alhures, para entender todo e qualquer sistema judicial, seja ele de que Nação for, faz-se imprescindível conhecer sua história, os processos sociais existentes no País, bem como os vigentes na época da consolidação das instituições analisadas. Da análise comparativa entre os dois sistemas judiciais, brasileiro e americano, focando nas duas principais diferenças de ingresso na magistratura, quais sejam o concurso público e a eleição, bem como a vitaliciedade num e os mandatos no outro, interrogar-se-ia sobre a lisura e imparcialidade do processo de escolha e exercício da magistratura americana. Entretanto, verifica-se que cada sistema possui as regras tidas pelo povo como as mais adequadas para o funcionamento de suas instituições, considerando seus antecedentes históricos e culturais - o que não impede que sejam buscados aperfeiçoamento em ambos.


IX CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA

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ARTIGO - Rolf Madaleno

LAÇOS QUE FICAM E

PATERNIDADE ALIMENTAR No conflito de outrora entre a filiação biológica e a socioafetiva vencia o vínculo genético que sempre permitiu presumir como absoluto o estado paterno de filiação e assim foi até o advento da Carta Federal de 1988, que deu prevalência ao direito da personalidade e ao respeito singular à dignidade da pessoa, sem mais discriminar a origem da filiação, quer sua origem derive da biologia, de vínculos socioafetivos ou dos laços de adoção. Evidenciam as afirmações até agora expendidas, existir uma clara linha divisória entre o direi-

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to de personalidade de que cada pessoa é titular e o seu estado de filiação, que não pode ser afetado quando já existe precedente atribuição de paternidade ou maternidade biológica ou socioafetiva, pois a verdade genética é apenas um dos elos que prendem todo o complexo estado de filiação. Por essa reviravolta constitucional que agora brinda a personalidade da pessoa, o vínculo socioafetivo merece inteira proteção como outro gênero de filiação, sendo vedada a sua desconstituição para contrapor o estado de filiação já

constituído pelo registro do descendente como filho do coração. De sua parte, os alimentos carregavam em sua gênese uma função indenizatória, servindo ainda hoje a pensão alimentícia para manter a estratificação de quem se vê drasticamente frustrado de seus projetos de vida familiar. Os alimentos são estabelecidos em favor do credor que deles precisa para assegurar a sua sagrada e fundamental subsistência, diante da evidência de não ter como arcar com a sua sobre-


Rolf Madaleno

Advogado, especialista em Direito de Família, professor em diversas Universidades do país e autor de livros de referência nacional

“Se o pai socioafetivo não tem condições de arcar sozinho com a manutenção do alimentando, deve o filho biológico poder buscar o complemento dos seus alimentos, em paridade com a privilegiada capacidade econômica do genético genitor.”

vivência pessoal, firmando-se destarte, como dependente de seu provedor, ou até mesmo porque necessite de uma alimentação complementar, já que os seus ingressos não comportam patrocinar toda a extensão de suas necessidades e do seu status social. Neste contexto, exonerar o genitor biológico do auxílio alimentar de seu filho genético apenas porque está vinculado a um parentesco socioafetivo seria permitir o duplo empobrecimento, moral e material do descendente genético, que deve usufruir de uma melhor condição socioeconômica em conformidade com aquela desfrutada por seu procriador. Cumpre ao pai socioafetivo, do jeito que pode e nos limites de suas condições financeiras, o arcar com o que dispõe para a formação, alimentação e educação do rebento que assumiu por amor. A paternidade está cada vez mais longe de ser sustentada exclusivamente na sua derivação genética, antes, firma-se na segurança das relações afetivas e bem assim, difere o crédito de alimentos pela responsabilidade social e pela responsabilidade de pai, pois não há como forçar a ser pai quem não quer assumir uma paternidade que rejeita e que o faz se sentir clara e profundamente desconfortável, mas este genitor do ocaso e da falta de afeto pode não ser compelido a conviver e gostar de seu filho que abandona pelo descaso e pela frieza de sua desumana rejeição, mas também não pode, em contrapartida, ser igualmente compensado com a dispensa da sua responsabilidade pelo vínculo de sua procriação, apenas porque outro assume por afeto a sua primitiva função parental.

Pode e deve ser perfeitamente levada em consideração a condição social do responsável alimentar, pois não pode ser dissociado que os alimentos são apreciados em função da fortuna, da situação social, da padronagem e dos ingressos financeiros do devedor, já que a pensão deve ser compatível com a estratificação social da pessoa obrigada pelos laços de afeto ou pelos laços biológicos. Daí, ser de todo defensável a possibilidade de serem reivindicados alimentos do progenitor biológico, diante da impossibilidade econômicofinanceira, ou seja, diante da menor capacidade alimentar do genitor socioafetivo, que não está em condições de cumprir satisfatoriamente com a real necessidade alimentar do filho que acolheu por afeição, onde o pai socioafetivo tem amor, mas não tem dinheiro. Se o pai socioafetivo não tem condições de arcar sozinho com a manutenção do alimentando, deve o filho biológico poder buscar o complemento dos seus alimentos, em paridade com a privilegiada capacidade econômica do genético genitor. Tem o filho genético, por direito à vida digna e em consonância com a natureza indenizatória dos alimentos, o direito de reivindicar o crédito alimentar necessário e suficiente para cobrir os reais custos de sua manutenção, em valores proporcionais à estratificação social de seu procriador e que não conseguem ser atendidos pela inferior condição financeira do pai socioafetivo, que o compensa com muito amor.

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ARTIGO - Sarah Carneiro Araújo

MEIO AMBIENTE

ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO 28

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Sarah Carneiro Araújo

Professora e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental, da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará e autora do livro intitulado “Licenciamento Ambiental no Brasil: uma análise jurídica e jurisprudencial”

Em nome da evolução econômica, científica, tecnológica e social, e em decorrência do próprio crescimento demográfico, o homem explorou o seu meio em desarmonia com os ecossistemas e as demais espécies, acabando por gerar um quase esgotamento dos recursos naturais e causando desequilíbrios ambientais e sociais catastróficos, como a extinção de diversas espécies animais e vegetais (comprometendo a biodiversidade), o efeito estufa e seu consequente aquecimento global (provocando inundações, chuvas ácidas e proliferação de insetos, pragas e doenças), o escasseamento da água doce, a desertificação, a submissão e o quase extermínio de certos grupos étnico-raciais minoritários (índios, negros, judeus), as guerras, os desastres químicos e nucleares, a disseminação da pobreza, a exploração de povos mais vulneráveis, dentre outros graves problemas evidenciadores de uma crise ambiental que assola o Planeta Terra. Não é à toa que a disputa pelo controle dos bens naturais essenciais é, até os dias de hoje, causa de conflitos entre países e nações, retratando a ganância humana pela exploração dos recursos ambientais.

“Como o meio ambiente sadio é um direito fundamental de todos, e a livre iniciativa e a ordem econômica são norteadas pela defesa do meio ambiente, não há direito adquirido à utilização inadequada de seus componentes”

A produção em grande escala e a Sociedade de Risco acarretaram, portanto, consequências gravíssimas à qualidade ambiental, deixando marcas irreversíveis de agressões sem precedentes ao meio ambiente, trazendo prejuízos de nível global, os quais impuseram um despertar mundial para a crise ambiental, eis que já não seria possível ignorar a necessidade de uma mudança de paradigma e comportamento sobre a relação do homem com o meio ambiente, sob pena de pôr em risco o futuro da humanidade. Assim, a preocupação com a preservação ambiental tem se tornado um dos temas de maior destaque global nas últimas décadas, devido, inicialmente, ao alerta que alguns cientistas e

pesquisadores atentos fizeram , emitindo pareceres bastante pessimistas sobre a questão, e, de consequência, às diversas discussões de âmbito internacional (como, inicialmente, as Conferências das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, ocorridas em 1972, em Estocolmo, e 1992, no Rio de Janeiro) a fim de buscar soluções à grave crise ambiental já instaurada. A necessidade do uso racional dos recursos naturais, através da adoção de um desenvolvimento sustentável, foi sendo trabalhada e incutida, aos poucos, na mentalidade de toda a sociedade, incluindo-se o Poder Público e a iniciativa privada. A mudança de paradigma, neste setor, tem sido um instrumento na busca de soluções aos danos dantes ocorridos, assim como de prevenção de novos desequilíbrios ambientais gerados em virtude das ações antrópicas. A Constituição Brasileira de 1988 tem um papel de grande importância na luta pela sustentabilidade, pois consolidou, em seu art. 225, o Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado como um direito fundamental de natureza difusa, pertencente a todos. Impôs, ainda, ao Poder Público e à coletividade o dever de preservar e defender o equilíbrio ambiental, tanto para as presentes como para as futuras gerações. Criou, ademais, instrumentos de gestão pública do meio ambiente sadio, como a definição de espaços a serem especialmente protegidos, a proteção da fauna e da flora, a preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético brasileiro e a promoção da educação ambiental. Dentre os deveres do Estado, impôs o controle da produção, da comercialização e do emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente e a exigência do Estudo Prévio

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ARTIGO - Sarah Carneiro Araújo

de Impacto ao Meio Ambiente para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, dando, assim, fundamento constitucional ao licenciamento ambiental, que fora pioneiramente previsto no ordenamento jurídico pátrio pela Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981. O licenciamento ambiental é um dos mais importantes instrumentos de gestão do meio ambiente, posto que, através dele, a Administração Pública efetivará o controle prévio das atividades econômicas utilizadoras de recursos ambientais e potencialmente degradadoras, impondo condições e medidas de controle ambiental ao empreendedor, a fim de que este ajuste sua atividade, obra, empreendimento ou serviço às normas de tutela ambiental, evitando, minimizando ou compensando danos ao meio ambiente e à sadia qualidade de vida e saúde da coletividade. O Poder Público exercerá seu poder de polícia ambiental por meio da análise técnica do planejamento, da instalação e do funcionamento de todos os empreendimentos e as atividades que possam, potencial ou efetivamente, causar danos ao equilíbrio ambiental, assegurando, em todas as etapas do licenciamento ambiental, o respeito ao meio ambiente e ao bem-estar social, concretizando, assim, os princípios da precaução, da prevenção e do desenvolvimento sustentável. O Brasil foi o único país no mundo a adotar o licenciamento tríplice, permitindo aos órgãos de fiscalização ambiental efetivar o controle dessas atividades a cada passo de sua implementação, desde o projeto, passando pelo momento da construção/instalação da obra, até seu funcionamento, e enquanto este perdurar. Os estudos ambientais, que proporcionam uma análise aprofundada do empreendimento, são ferramentas essenciais ao licenciador, que usará de sua discricionariedade sui generis, eis que adstrita às normas de preservação ambiental, para averiguar, com o zelo que a questão requer (diante da fragilidade do meio ambiente - que tantas vezes impossibilita sua reparação na totalidade), se o empreendimento ou a atividade analisados atendem à legislação ambiental e aos princípios de tutela do meio ambiente. Dentre eles temos o importante Estudo Prévio de Impacto ao Meio Ambiente (EIA), que deverá ser exigido, con-

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forme a disposição constitucional, quando houver risco de significativa degradação ambiental. Ademais, todas as licenças ambientais concedidas estão sujeitas à reavaliação por parte dos órgãos ambientais, seja ao longo de sua constância, ou no momento do requerimento da renovação, posto que tanto a Licença Prévia, como a Licença de Instalação e a Licença de Operação, têm prazos de validade previamente estabelecidos pelo órgão que a concede, assim como podem ser suspensas ou canceladas, em virtude de violação ou inadequação de quaisquer condicionantes ou normas legais, omissão ou falsa descrição de informações relevantes que subsidiaram a expedição da licença, ou superveniência de graves riscos ambientais e de saúde. Este diferencial facilita a fiscalização, podendo o órgão competente exigir, caso necessário, novos estudos ou modificar as medidas de controle e adequação impostas, e, ainda, paralisar as atividades e empreendimentos que estejam causando poluição ambiental ou em desacordo com as normas pertinentes, sem prejuízo da responsabilidade civil objetiva do empreendedor e demais sanções administrativas e penais porventura cabíveis. A relevância deste instrumento de gestão ambiental se evidencia no mundo econômico e jurídico, devendo todas as atividades e empreendimentos potencialmente poluidores, ou utilizadores de recursos ambientais, submeter-se ao crivo Estatal, inclusive aqueles que foram instalados antes da previsão legal desta ferramenta da Política Nacional do Meio Ambiente, assim como os empreendimentos que, de alguma forma, burlaram o procedimento administrativo obrigatório e estão em atividade sem a respectiva licença ambiental, configurando, esta última hipótese, também como crime ambiental. Como o meio ambiente sadio é um direito fundamental de todos, e a livre iniciativa e a ordem econômica são norteadas pela defesa do meio ambiente, não há direito adquirido à utilização inadequada de seus componentes, não restando outra solução ao empreendedor senão a de adequar sua atividade às normas de tutela do meio ambiente equilibrado, mediante ato indelegável do Poder Público, guardião do bem ambiental.



ARTIGO - José Edmílson de Oliveira

EXECUÇÃO DAS ASTREINTES É cediço que a realização do direito material se concretiza por intermédio da instrumentalidade do processo e que o escopo da jurisdição é princípio da segurança jurídica. Por vezes, ocorre resistência, procrastinação, descaso e desrespeito às decisões judiciais por parte de devedores executados judicialmente, havendo a necessidade de um instrumento eficaz,

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apto a coibir o recorrente adiamento indiscriminado do cumprimento de obrigação emanada do Poder Judiciário. Sua aplicabilidade se reveste de uma questão complexa, que envolve a consideração de inúmeros aspectos e circunstâncias, como a condição econômica e o comportamento resistente do devedor, vantagens que este obterá com a pro-

crastinação, portanto, sua eficácia e efetividade reclamam a correta ponderação dos princípios da razoabilidade e proporcionabilidade. Desta forma, assume relevância proeminente o debate sobre o papel da astreinte como instrumento jurídico da efetividade das decisões judiciais, uma vez que não se pode correr o risco de promover o enriquecimento ilícito, bem como


José Edmílson de Oliveira

Juiz de Direito da 5ª Vara Cível de Fortaleza Especialista em Direito Processual Civil Professor de Graduação e pós-graduação

não é apropriado ocorrer o desvio de sua finalidade para uma errônea conotação indenizatória ou ressarcitória, diante da realidade fática de ser o autor da demanda o destinatário da astreinte. A processualística vigente contempla o instituto no artigo 461 e ss do Código de Processo Civil - in verbis: “Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela especifica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem oi resultado prático equivalente ao do adimplemento. §1º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção pra´tico correspondente.

“assume relevância proeminente o debate sobre o papel da astreinte como instrumento jurídico da efetividade das decisões judiciais”

§ 2º - A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (Art. 287). § 3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada. (acrescentado pela L-008.952-1994) § 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5º - Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. § 6º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.” De igual sorte, no Código de Defesa do Consumidor, o legislador previu a aplicação da astreinte, com vista a tutela de interesses e direitos básicos dos consumidores, nos termos do art. 84, §4º, litteris: “Art. 84. omissis … (…) §4º. O juiz poderá, na hipótese do §3º ou a sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando o prazo razoável para o cumprimento do preceito”. (gn). Com efeito, o legislador pátrio previu, no ordenamento jurídico brasileiro, meio jurídico de compelir, pressionar e coagir o devedor de obrigação de fazer, não fazer e entregar coisa certa - a astreinte – que consiste numa multa diária ou cominatória, de natureza pecuniária, fixada em sentença ou por ocasião de concessão de tutela antecipatória, enquanto durar a inadimplência, com a finalidade especial de forçar o devedor da obrigação a cumprir efetivamente uma decisão judicial. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - José Edmílson de Oliveira

“não se pode olvidar que a astreinte é uma ferramenta de coação, de advertência, cujo nodal escopo é forçar o devedor a satisfazer uma decisão judicial” Afigura-se questão assaz tormentosa quando se vai estabelecer o quantum do valor da multa diária. Doutrinadores do quilate de Carreira Alvim tem entendimento de que a fixação deve atender o principio da razoabilidade, “consoante as condições econômico-financeiras do devedor, sob pena de tornar-se ineficaz quanto à condenação principal” (Ação Monitória e Temas Polêmicos da Reforma Processual, Del Rey, 2001, P. 235) A seu turno, Amílcar de Castro, em nota aos arts. 644 e 645, compreende que o valor da astreinte não supere o valor da obrigação (In Comentários ao CPC, vol. III, Revista dos Tribunais, 1974, p. 189). Em todo o caso, não se pode olvidar que a astreinte é uma ferramenta de coação, de advertência, cujo nodal escopo é forçar o devedor a satisfazer uma decisão judicial, em virtude do incumprimento da prestação obrigacional. Impende ainda lembrar que a multa diária não estampa a mesma natureza que a obrigação a ser cumprida nem se confunde com as perdas e danos, que contém valor exato, tanto é verdade que o julgador tem a faculdade de, ex officio, proceder à alteração de seu valor caso surja alguma situação em que se verifique que ela poderá se tornar ínfima ou descomedida. Agora, pergunta-se: qual o momento em que a astreinte deverá incidir? Existe orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de que a multa deverá incidir no momento do descumprimento da ordem judicial, sendo valioso ressaltar que, em sendo lançada na sentença, começa a partir do trânsito em julgado. Por outro lado, sendo estabelecida em sede de provimento judicial antecipativo, a execução da astreinte inicializa-se (dies a quo) após o decurso do lapso consignado para a satisfação da medida judicial. Outro assunto não menos intrigante versa sobre o momento da execução da astreinte, é dizer,

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quando passa a ser realmente exigida, uma vez que a processualística a esse respeito nada dispõe. Há entendimento na doutrina segundo o qual quando a multa diária for fixada na sentença, inocorrem maiores problemas. Dinamarco pontifica que “o valor das multas periódicas acumuladas ao longo do tempo só é exigível a partir do transito em julgado do preceito mandamental” (Cândido Rangel Dinamarco. A Reforma da Reforma. Malheiros, 2002, p. 239)

Nesse quadrante, colacionam-se à baila os precedentes tribunalícios a frente vazados – verbatim:

O grande debate, portanto, reside no fato de saber-se se é possível executar provisoriamente as astreintes estabelecidas em decisão interlocutória. Bem, em se tratando de multa aplicada em sede de decisão interlocutória, afirma o processualista Cândido Dinamarco que “enquanto houver incertezas quanto à palavra final do Poder Judiciário sobre a obrigação principal, a própria antecipação poderá ser revogada e, com ela, as astreintes.” (gn).

“Consoante jurisprudência sedimentada no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, para que se dê a execução da multa por descumprimento de ordem judicial, não é necessário o trânsito em julgado da sentença proferida no processo em que estabelecidas as astreintes (Apelação Cível Nº 70050590744, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Egrégio Roque Menine, Julgado em 23/05/2013).”

Observe-se que o parágrafo 4º do art. 461 da Lei Instrumental estabelece que o juiz consigne prazo razoável para o cumprimento da obrigação de fazer, não fazer ou entregar a coisa, conforme o caso. Nesse sentido, tem-se que a astreinte é exigida desde o primeiro momento em que se houver findado o prazo estabelecido pelo magistrado. Deduz-se, por conseguinte, que, numa ação de obrigação de fazer, enquanto o prazo judicial assinalado não transcorrer, por corolário, não existirá descumprimento para fins de aplicação da multa diária. A propósito da execução provisória de astreintes, a posição da jurisprudência está dividida em três vertentes: 1ª) não é possível, porquanto é mister o transito em julgado da sentença para sua exigibilidade; 2ª) é viável, sim, a execução provisória sem quaisquer condicionalidades; 3ª) é possível a execução provisória desde que: I) o pedido a que se vincula a multa seja julgado procedente na sentença ou acórdão; II) o recurso aviado contra essa sentença ou acórdão tenha sido recepcionado somente no efeito devolutivo.

“Nos termos da reiterada jurisprudência do STJ, a multa diária somente é exigível com o trânsito em julgado da decisão que, confirmando a tutela antecipada no âmbito da qual foi aplicada, julgar procedente a demanda” (AgRg no AREsp 50.196SP, 1ª Turma, DJE de 27/08/2012).

“A multa fixada em antecipação de tutela - astreinte - somente se torna exigível após o trânsito em julgado da sentença na ação declaratória...” (Agravo de Instrumento Nº 70052203007, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em 03/04/2013). “As astreintes serão exigíveis e, portanto, passiveis de execução provisória, quando a liminar que as fixou for confirmada em sentença ou acórdão de natureza definitiva (art. 269 do CPC), desde que o respectivo recurso deduzido contra a decisão não seja recebido no efeito suspensivo. A pena incidirá, não obstante, desde a data da fixação em decisão interlocutória” (RESp 134772/RS, 4ª Turma, DJE, de 04/02/2013). Ao que se pode perceber da doutrina e jurisprudência em órbita da questão posta, pode-se concluir que as astreintes, em que pese ser questão bastante controvertida, não deixa de ostentar sua relevância como instrumento para a efetividade das decisões emanadas do Poder Judiciário, sendo um assunto que despertará ainda mais embate entre os juristas e aplicadores do direito.


PONTO DE VISTA

Juiz Titular da 32ª Vara Cível de Fortaleza e Conselheiro da ANAMAGES no Estado do Ceará

Wotton Ricardo Pinheiro da Silva

UM OLHAR SOB VÁRIAS

PERSPECTIVAS Ainda hoje muitos não entendem os argumentos ou “critérios” utilizados por juízes quando de suas decisões interlocutórias ou definitivas em processo judicial. Nada mais normal, notadamente para os que não militam diretamente na seara do Direito. Aliás, na atualidade até para estes últimos tem se tornado difícil uma compreensão mais acurada das decisões de nossos tribunais.

para inicio dos procedimentos que irão desaguar no judiciário, o juiz não pode ter os Advogados (defensores) e membros do parquet como inimigos ou partes adversas em potencial. Na verdade cabe ao juiz a condução e presidência do processo e para tanto não pode tergiversar, nem mesmo diante dos órgãos superiores, mas sempre tendo o cuidado de tentar entender e fazer valer o Direito das partes em conflito.

Com efeito, costumo dizer que para os que exercem as funções de Juiz de Direito, torna-se necessária uma visão ampla, completa, de 360° da situação que se lhe apresenta. Com isso, quero dizer que ao se sentar em sua poltrona o juiz é obrigado a ter uma visão ampla de toda a situação que se lhe é posta, fazendo esforço para tentar entender os argumentos que lhes são trazidos pelo autor, pelo réu e pela Promotoria.

Por tal motivo, notadamente por ter exercido a advocacia por quase oito anos, que sempre tive como pertinente a necessidade de implemento de uma idade mínima para o ingresso na magistratura, como por exemplo, 25 anos de idade e 3 anos de prática forense, já que para julgar deve o Magistrado conhecer o mínimo possível da vida, ter acumulado experiências que o tornem mais seguro na árdua missão de julgar e decidir destinos - coisa que só a pratica lhe dará por mais que tenha títulos e mais títulos acadêmicos. A teorização não pode subjugar a prática.

Por mais estapafúrdia que possam parecer as tese trazidas aos autos, compete ao juiz o mínimo de paciência, prudência e bom sendo para aprecia-las. Claro que essa apreciação não enseja, obrigatoriamente, o acatamento das pretensões deduzidas, mas é um direito das partes expô-las desde que em harmonia com os preceitos legais. De nada adiantaria toda a sabedoria e inteligência do mundo, se o Magistrado não tiver a sensibilidade para agir e entender que os demais operadores do Direito e as teses por eles defendidas são essenciais e indispensáveis ao alcance da verdade real efetivação da verdadeira Justiça a ser entregue a uma sociedade plena e democrática. Assim como o transgressor é a matéria prima do policial, em particular do delegado de polícia, que primeiro tem contato com o mesmo

Pelas razões ora expostas é que entendo que a justiça de primeiro grau deva ser reavaliada e reconhecida sua importância na estrutura do Direito moderno. Não que os tribunais não sejam importantes, pelo contrário, além de importantes são também essenciais ao arcabouço de formação do Poder Judiciário. No entanto, o que desejo ressaltar nesta modesta manifestação é a importância do trabalho conjunto realizado pelo juizinho” lá do interior (para onde muitos agradecem por não terem ido), dos Advogados, tantas vezes incompreendidos na defesa de seus constituintes e, do ativo e independente (como deve ser) representante do Ministério Público Estadual na efetivação da verdadeira Justiça. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Antônio Alves de Araújo

DEMOCRATIZAÇÃO DO

PODER JUDICIÁRIO

Tramitam no Congresso Nacional, as propostas de emenda constitucional de ns.15/2012 – no Senado Federal e 187/2012 - na Câmara dos Deputados, as quais visam dar nova redação ao artigo 96 da Constituição Federal, para adotar o sistema de eleições diretas para os cargos de Presidente e Vice-Presidente dos Tribunais estaduais e regionais federais, permitindo que os Juízes de primeiro grau votem para escolha dos respectivos dirigentes. Como sabido, no sistema atual, o poder judiciário, guardião do Estado Democrático de Direito, que promove e fiscaliza todo o sistema eleitoral brasileiro, por via de consequência, pilastra central da Democracia, não e exerce internamente, haja vista que, somente os componentes do se-

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gundo grau de jurisdição, menos de 15%(quinze por cento) do total da magistratura brasileira, exerce o direito do voto. Várias e sérias consequências decorrem desta falta de participação política dos membros do poder, a começar pelo distanciamento entre o primeiro e segundo graus, pois não tendo qualquer participação no processo de escolha dos dirigentes, não são os juízes do primeiro grau ouvidos sobre o planejamento, aplicação de recursos, prioridades administrativa, enfim, sobre os destinos do poder, restando à grande maioria dos componentes do judiciário, acatar e dar seguimento àquilo que lhes é outorgado, mesmo que tais medidas não atendam aos anseios da sociedade, destinatária final da atividade judicante.


Antônio Alves de Araújo

Juiz de Direito

“Não há razão para a permanência do sistema censitário de eleição no poder judiciário, onde apenas minoria qualificada participa do processo eleitoral”

Outro aspecto importante, versa sobre a legitimidade dos passos que tomam o poder judiciário, pois, sendo as diretrizes conduzidas por um universo de 15% da totalidade dos ocupantes do poder, padece de legitimidade material, até mesmo porque são os juízes do primeiro grau que se encontram mais próximos da sociedade, melhor conhecendo as suas aspirações. O que se observa nos dias atuais, mesmo quando o país vive plena democracia, é um judiciário aristocrático, aonde uma pequena minoria decide seus destinos, exatamente a minoria que mais distante do povo fica, cujas decisões político-administrativas nem sempre visam o aprimoramento da instituição, posto que não havendo participação da grande maioria dos seus componentes, muitas das vezes não encontram sintonia com a realidade social. Outro aspecto a ser observado com a democratização interna do Poder Judiciário, diz respeito a aplicação dos recursos que muitas vezes têm destinação preponderante para os Tribunais, enquanto que o primeiro grau, cuja área de abrangência é bem maior, recebe o remanescente das dotações. Não há razão para a permanência do sistema censitário de eleição no poder judiciário, onde apenas minoria qualificada participa do

processo eleitoral, uma vez que nos demais poderes e órgãos da República seus dirigente são eleitos de forma universal pelos componentes da instituição. É de se esperar que a comunidade jurídica, a sociedade de um modo geral se mobilizem, e que sensibilizem os nossos representantes no Congresso Nacional; que as PEC’s, antes citadas, sejam aprovadas e que o poder Judiciário possa viver internamente um poder Democrático e Republicano, da mesma forma que propicia aos cidadãos, de um modo geral, ampla, completa e irrestrita democracia. Seria, como já tive oportunidade de me manifestar em artigo publicado em jornal de grande circulação no Estado, uma incoerência desmedida, o poder que garante e assegura a democracia aos cidadãos, permanecer sem garantir aos seus membros o direito de votar para os órgãos diretivos, mantendo o sistema autocrático de gestão. Com a aprovação das propostas apresentadas, ganhará o Poder Judiciário, posto que seus dirigentes democraticamente eleitos, melhor atenderão os anseios da instituição e ganhará a sociedade, pois terá um dos poderes da República mais arejado e mais próximo das aspirações do povo, verdadeiro patrão e destinatário da atividade jurisdicional. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Ana Vládia Gadelha Mota

A MEDIAÇÃO NOS

CONFLITOS DE FAMÍLIA

Vivemos atualmente numa sociedade permeada de conflitos. A CF/88, no seu art. 5º, inciso XXXV, garantiu ao cidadão brasileiro o acesso ao Poder Judiciário, único legitimado para dirimir os conflitos na sociedade, tornando crescente à busca, na justiça, pelo remédio ou a cura para os males da vida. O Estado Democrático de Direito, garantiu ao cidadão brasileiro o acesso à Justiça, mas não garantiu sua saída. O que se vê, é um Poder Judiciário arcaico, deficiente de mão-de-obra, abarrotado de processos e travado por uma burocracia excessiva, vícios que comprometem a prestação jurisdicional e a promoção do bem estar social, objetivo maior do Estado Moderno. Essa triste face da Justiça Brasileira e suas consequências nefastas são claramente percebi-

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das nos conflitos envolvendo o Direito de Família, ramo primordial do Direito, que tem como objeto a pessoa humana, pois acolhe o indivíduo, como sujeito de direito desde antes do seu nascimento, regulando sua vida e sua morte. Diante do dinamismo e da complexidade do ser humano e suas relações sociais, atualmente o conceito de família não mais se restringe ao casamento, ela abandonou a forma singular, e agora é plural, como expressou o art. 226 da CF/88. Em meio a esse pluralismo de constituição de famílias, monoparentais, recompostas, binucleares, casais com filhos de casamentos anteriores e seus novos filhos, casais sem filhos, casais homosexuais, enfim, é grande a gama dos diversos arranjos familiares, ainda em movimen-

to, gerando conflitos cada vez mais complexos e de difícil solução. Diante dessa nova realidade, o Poder Judiciário, preso a regras legais e conceitos ultrapassados, tem se mostrado ineficiente na solução desses conflitos, frustrando o fim social de pacificação dos litígios e promoção do afeto entre os integrantes da sociedade. A sentença judicial soluciona o conflito, mas não pacífica o litígio, ao contrário, alimenta a cultura do vencido/vencedor, fortalecendo a superioridade de uma das partes em detrimento da igualdade entre as mesmas, verticalizando as relações sociais. Nesse contexto, é necessária a adoção de práticas alternativas para a solução, pacificação e prevenção dos conflitos que batem as portas do Poder Judiciário.


Ana Vládia Gadelha Mota

Promotora de Justiça titular da 6ª Promotoria de Família de Fortaleza-Ce

“é necessária a adoção de práticas alternativas para a solução, pacificação e prevenção dos conflitos que batem as portas do Poder Judiciário” O conflito é um fenômeno natural na vida em sociedade e deve ser encarado de forma positiva, pois os indivíduos estão em busca de seus interesses. Em meio a cada conflito existe uma tensão, definida como “estado de inquietação ou distúrbio, desassossego interior e desequilíbrio, que só irá estagnar quando o dissenso for plenamente resolvido” (SERPA, 1999, p. 18). O conflito está intimamente ligado à comunicação, muitas vezes, por existir uma estrutura de litígio, decorrente da má comunicação entre as pessoas envolvidas, tem-se a eclosão da disputa.

afetivos estremecidas, restaurar a comunicação perdida, de modo a estabelecer, para o futuro, uma convivência pacífica e harmoniosa, indispensáveis à manutenção do vínculo nas relações de família, evitando-se práticas hodiernas como a violência doméstica e a alienação parental, que causam danos irreparáveis principalmente àqueles que a Constituição/88 garantiu proteção integral: a criança e o adolescente.

O conflito faz parte da dinâmica familiar e seu emaranhado complexo de relações entre pessoas diferentes, unidas pelo afeto. Desavenças fazem parte do cotidiano familiar e se bem depuradas contribuem para o crescimento dos integrantes da família, fortalecendo os laços de solidariedade, igualdade e respeito mútuo.

Assim, a mediação é a superação do Direito como instrumento de poder do Estado, pela possibilidade dos próprios litigantes depurarem o conflito buscando uma solução consensual. O mediador favorece o diálogo, através de alternativas satisfatórias, menos traumáticas para as partes em litígio e seus filhos. A mediação exerce função pedagógica e prepara as pessoas para novos relacionamentos, livres do estigma do casamento fracassado.

Nesse contexto, a mediação, que dentre outros significados indica intervenção, intermediação ou divisão ao meio, é o mecanismo que tem como objetivo buscar acordos entre pessoas em litígio por meio da transformação da dinâmica adversarial em uma dinâmica pactual, importando de outras ciências como a psicanálise, a sociologia, o serviço social e o direito, o suporte necessário para a compreensão da subjetividade dos indivíduos e da dinâmica das relações sociais.

Apesar de ser muito antiga, tanto quanto a própria humanidade, segundo os antropólogos, só agora o Sistema Judiciário Brasileiro, timidamente, vem reconhecendo a mediação como alternativa para a solução e pacificação de conflitos. Muitos operadores do Direto ainda resistem à idéia, creditando a solução da lide somente a uma sentença judicial, com a presença de um magistrado para impor e determinar os interesses dos ligantes.

Na mediação familiar, o objetivo direto é a solução pacífica dos conflitos de interesses, mas indiretamente objetiva-se também resgatar laços

Na contra-mão desse entendimento, o Conselho Nacional de Justiça/CNJ, editou a Res. Nº 125, de 29 de novembro de 2010, que prevê:

Art. 1º. Fica instituída a Política Judiciária dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade. Parágrafo único. Aos órgãos judiciários incumbe, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão. Tais práticas representam um avanço do Estado Democrático Brasileiro, na busca da cidadania plena. Entretanto, o processo de mediação não pode ser visto apenas como uma forma de reduzir as demandas judiciais que permeiam o Poder Judiciário, ao contrário, é preciso voltar-se para a satisfação dos conflitantes, a realização da cidadania, só assim estaremos evitando novas demandas oriundas do descumprimento do acordo judicial firmado sem a conscientização e a responsabilidade das partes, a exemplo do que se vê cotidianamente nas Varas de Família. Finalmente, deve-se ressaltar que a mediação é um instrumento utilizado em prol da Democracia participativa, que deve caminhar juntamente com o Poder Judiciário, fortalecendo uma cultura de paz e promovendo uma sociedade mais livre, justa e solidária, dever do Estado e direito do cidadão. CAFÉ & JUSTIÇA

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MATÉRIA - REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

DIFERENCIADA

A FAVOR

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REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL O Brasil tem enfrentado acirradas discussões envolvendo os limites da maioridade penal perante a legislação pátria. Sempre que a imprensa divulga atos infracionais de grande repercussão, aumentam as pressões para que a lei brasileira passe a aplicar penas mais severas aos adolescentes infratores e, principalmente, para que seja promovida a redução da maioridade e permissão para que os menores de 18 anos e maiores de 16 ou de 12 anos (para os mais radicais), sejam punidos com os mesmos rigores aplicáveis aos delinquentes maiores de idade. Em consequência, sempre que essas discussões são levantadas, as organizações de defesa dos direitos humanos e alguns organismos internacionais de proteção às crianças, se posicionam contrariamente a essa pretensão, por entendem e defenderem, dentre outras coisas, que a diminuição da maioridade penal não resolve o problema da delinquência juvenil. A MATÉRIA É TORMENTOSA! Para um perfeito alcance da amplitude do tema posto, a CAFÉ & JUSTIÇA trás, nesta edição, uma ampla visão psico-jurídico-social oferecida por Juízes, Promotores, Procuradores, Defensores Públicos, advogados e educadores, que, ao exporem as suas posições e entendimentos, conseguem lançar luzes mais consistentes sobre a possibilidade e/ou viabilidade da redução da maioridade penal no Brasil.

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MATÉRIA - REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A FAVOR

A FAVOR DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Autor: DELANO CÂNCIO BRANDÃO, Defensor Público Estadual com atuação na 2ª e 3ª Varas de Execução Penal da Comarca de Fortaleza. São constantes os noticiários policias apontando delitos praticados por menores de 18 (dezoito) anos. A onda de violência que assola o nosso país impulsiona a discussão sobre o tema da redução da maioridade penal. Podemos dizer que este é o assunto do momento nos anais do Congresso Nacional. Registre-se que existem 03 (três) PEC’s prontas para serem votadas no Senado: duas flexibilizam a maioridade de acordo com a gravidade do delito, e uma terceira que impõe a idade limite de até 16 anos para que alguém seja considerado inimputável. As PECs 33/2012, 74/2011 e 83/2011 tramitam em conjunto e têm como relator o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). A nossa Lei Substantiva Penal entrou em vigor em 1940 e estabelece, em seu art. 27, que “os menores de 18 (dezoito) são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. Assim, o legislador pretérito, adotou unicamente um critério biológico, ao entender que os menores de dezoito anos não são portadores da capacidade geral e abstrata para entender (o caráter ilícito do fato) ou querer. Não podemos mais admitir essa presunção absoluta de inimputabilidade em favor de menores de dezoito anos. Temos que reconhecer que o

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PENAS MAIS DURAS PARA MENORES INFRATORES O QUE VIGORA HOJE • Internação de até três anos para menores infratores. • Todos os menores infratores ficam reclusos em um mesmo lugar. •Na idade máxima para um interno em reclusão é de 21 anos. • O adulto que comete o crime de corrupção de menor é julgado pelo Código Penal e tem pena que varia de 1 a 4 anos de reclusão.

Na semana passada, a Câmara dos Deputados criou uma comissão especial para propor mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente e estabelecer maior punição para adolescentes criminosos. Confira a proposta que servirá de base para as discussões.

mundo mudou, que os menores e os adolescentes de antes não existem mais. Vivemos em um mundo globalizado, onde os meios de comunicação fácil e rápida dão ensejo a uma precoce maturidade em favor de nossos jovens. O Direito Penal deve avançar nessa mesma velocidade, sob pena de se tornar ultrapassado, ineficaz, inoperante. Como dito alhures, o tema da redução da maioridade penal é bastante delicado e controverso. Vozes contrárias à redução defendem que a mesma não ocasionará a redução da criminalidade. Essa foi, inclusive, a posição adotada pelo presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, por ocasião da audiência pública realizada na CCJ do Senado. O representante da OAB foi mais além e disse que o ideal seria adotar políticas públicas de proteção à infância e adolescência com investimento permanente de recursos financeiros focados na educação, lazer e desporto, atividades culturais e na inserção dos adolescentes no meio social e no mercado de trabalho. Não temos dúvidas de que o Estado é omisso e que a redução da maioridade penal não implicará em diminuição da criminalidade. Contudo, não podemos aceitar que um problema sócio-político se sobreponha a uma questão unicamente jurídica. Não se trata de diminuir a criminalidade através da redução da maioridade. Não é essa a questão. O que discutimos e rechaçamos é o arcabouço jurídico ultrapassado que fundamentou a introdução do art. 27 em nossa legislação penal, qual seja, a presunção absoluta de inimputabilidade decorrente da ausência de consciência da

ilicitude do fato delitivo em favor do menor de dezoito anos. Não podemos tratar menores que possuem maturidade delitiva como indivíduos em formação, aplicando-lhes normas processuais mais brandas como decorrência de uma presunção de inimputabilidade refutável e da inoperância do Estado na aplicação de políticas públicas. Ainda há muito que discutir e muitas objeções movidas por interesses políticos travam a votação das referidas PECs, mas temos que ter a esperança de que o Brasil avançará em prol dos reclamos sociais e do fortalecimento de nosso Direito Penal.

A FAVOR DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Paulo Henrique Leite Gonçalves Procurador Federal Na sociedade brasileira contemporânea é extremamente visível o crescente índice de violência. Diante de tal fato se discute a questão da redução da maioridade penal, o que vem dividindo opiniões. Observa-se, todavia, nas pesquisas realizadas, que a maioria da população brasileira

O QUE O PROJETO PROPÕE • Internação de até oito anos para menores de 12 anos que cometerem crimes hediondos ou forem reincidentes em infrações. • A partir dos 18 anos, os internos seriam direcionados a um novo internato ou colocados em uma área separada dos mais novos. • A idade máxima para o interno será de 26 anos. A partir dessa idade, será feita uma avaliação para verificar a condição para o reingresso ao convívio social. • Penas mais duras para o adulto que cometer o crime de corrupção de menor. • A internação compulsória no caso de doença mental será por prazo indeterminado e passará por reavaliação a cada seis meses.

posiciona-se a favor dessa medida, pois é grave o número de atos infracionais cometidos diariamente por menores, sem que ocorra a punição de maneira proporcional ao delito cometido. Como há uma legislação especial aplicável ao menor infrator ou menor em conflito com a lei, onde o mesmo recebe tratamento diferenciado, sem previsão de aplicabilidade de pena por prática delituosa (vez que por disposição constitucional, são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos - art. 228 CF/88), tem-se, por consequência, o sentimento de impunidade que leva a população à crença de que a redução da maioridade penal iria diminuir o índice de violência no Brasil. Como estudos jurídicos mostram que não há qualquer impedimento de ordem constitucional ou legal a que se modifique a regra da inimputabilidade do menor de dezoito anos, através de emenda à Constituição, deve o Brasil reduzir a idade mínima para a responsabilidade criminal, como muitos países já o fizeram. Sem no entanto ser alcançado o extremo como Austrália, Suíça, Kuwait, Bangladesh, Índia, África do Sul, Paquistão, Tailândia, Nigéria, Sudão e Tanzânia que adotam a idade de sete anos para responsabilização criminal. Traçando um histórico da maioridade penal no Brasil, esclarecemos que o primeiro Código Penal brasileiro que data de 1830, fixava a imputabilidade plena aos maiores 14 anos. Já o Código Penal de 1890, considerava irresponsável penalmente o CAFÉ & JUSTIÇA

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menor com idade de até nove anos. Assim, não seria novidade a redução da maioridade no Brasil e, sim, um retorno ao que outrora existia no nosso ordenamento jurídico, o fazendo em atendimento aos anseios da sociedade atual. Embora o legislador de 1940 (código penal vigente) tenha presumido que o menor de 18 anos tem um desenvolvimento mental incompleto, esse argumento não é comprovado pela ciência médica psiquiátrica. Também não prosperam as alegações de que sistema prisional brasileiro não é adequado para acolher menores. O que se sabe é que população paga tributos para que o governo ofereça um sistema prisional adequado e uma legislação que proteja a sociedade. As discussões sobre o tema evoluíram, mas ainda se movimentam lentamente no sentido da fixação de uma idade adequada para a inimputabilidade. Enquanto isso sofre a sociedade, pois todos os dias pessoas estão sendo assaltadas ou mortas pelos adolescentes em conflito com a lei.

A FAVOR DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Edinilo Soares – educador, Diretor do Colégio 7 de Setembro (verificar dados) Embora não tenha formação acadêmica na área jurídica, ao ser convidado para expressar a minha opinião sobre a maioridade penal, não me omiti, pois embasarei o meu pensamento sobre a matéria como um estudioso das relações humanas, como educador e escritor. Quando a humanidade emergiu da “Idade das Trevas”, a Idade Média, havia uma visão otimista de sua evolução lastreada em três vetores: • O homem dominaria a natureza; • A sua área de conhecimento seria muito ampliada pela liberdade de pensamento, pelo incentivo às pesquisas científicas e pelo intercâmbio de ideias; • Os governos, em função do segundo item, seriam mais honestos e eficientes. E o que aconteceu ?

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Efetivamente, o homem dominou a natureza, porém de uma forma predatória, colocando mesmo em risco a sobrevivência do planeta. Os conhecimentos se expandiram de forma exponencial; no entanto, se algumas descobertas e invenções como o avião, os antibióticos, o DNA e o computador - contribuíram para melhorar a qualidade de vida, infelizmente houve uma outra vertente preocupante - como a descoberta do átomo para fins bélicos. O atual arsenal atômico é suficiente para destruir a Terra 13 vezes, e a fabricação de novas e mais potentes armas, inclusive químicas, continua a proliferar.

riam o outro em uma distância abissal. Além disso, os bandidos, maldosamente, utilizam jovens entre 16 e 18 anos em suas atividades criminosas, cientes de sua impunidade penal. Pelos motivos expostos, somos favoráveis que a maioridade penal seja decretada a partir de 16 anos.

CONTRA

Finalmente, os governos, por mais que se esforcem, movidos pela incrível atração dos políticos pelo Poder, não conseguem satisfazer os anseios de suas respectivas populações. Apenas por hipótese, para efeito de raciocínio, se um alienígena assistisse a um noticiário, teria a nítida impressão de estarmos envolvidos em uma Guerra Mundial, tal o volume de guerrilhas, de lutas fratricidas, de ações terroristas etc. O homem, embora tenha conseguido a incrível façanha de ir à lua, de descobrir corpos celestiais a distâncias nunca imaginadas, infelizmente não aprendeu a conviver de forma harmônica e pacífica com seus semelhantes. Numa tentativa superficial de tentarmos avaliar em poucas palavras os valores da modernidade, poderíamos elencar suas principais características: insatisfação generalizada; consumo desenfreado de supérfluos; violência em todos os níveis; valores tradicionais de honestidade, lealdade e respeito desprezados; banalização do sexo; simultaneidade da informação; a crescente importância das redes sociais e o florescente e onipotente mercado das drogas. Todos esses fatores influenciam diretamente a formação de nossos adolescentes. O nosso atual Código Penal data de 1940. Paremos um pouco e vejamos as mutações surgidas desde então: A televisão, o computador, os aparelhos digitais, os sons sofisticados, a pílula anticoncepcional e a Internet. Tudo isso nos mostra que vivemos atualmente em um mundo totalmente diverso daquele. Imaginemos a disparidade em um diálogo de um adolescente de 16 anos em 1940, com outro também com 16 anos, em 2013. O nível de informações deste e o seu amadurecimento supera-

CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Alda Maria Holanda Leite Juíza de Direito titular da 3ª Vara da Infância e Juventude de Fortaleza/CE Vivo num país onde todos os serviços públicos disponíveis, sobretudo saúde, educação, segurança, emprego e moradia, funcionam com excelência, num padrão irrepreensível. Diante de tal qualidade de vida, a criminalidade tanto de adultos quanto de adolescentes mostra-se quase inexistente, e não há impunidade. A Justiça célere e eficiente não tarda julgamentos. As pessoas éticas e cientes dos seus direitos e deveres cedo aprendem sobre eles na escola. O respeito é inerente ao caráter dos cidadãos. A lei é rigidamente cumprida por todos. Qualquer um que cometa um crime e seja condenado, cumprirá integralmente a pena imposta. A maioridade penal é fixada em 14 anos e ninguém reclama, pois o governo propicia bons serviços, e com total lisura são geridos os recursos públicos. A população satisfeita colabora para a paz

social... País maravilhoso esse do meu sonho! Realmente, somos um país injusto e nenhum serviço público é de qualidade. Nada funciona direito: saúde, educação, segurança. A medíocre distribuição de renda gera uma população carente com jovens analfabetos e despreparados, sem noção de valor sobre cidadania, respeito, direito e deveres. Evoluindo em todos os aspectos poderíamos fixar, com justiça, a maioridade penal aos 16 anos. Tal mudança não reduziria a criminalidade na atual conjuntura social, se é o que almejamos. Pois estabelecendo-se em 16 anos a imputabilidade penal, apenas superlotaríamos os presídios, reunindo no mesmo ambiente de degradação, adultos e adolescentes, que teriam piorados seus desvios de conduta, e seriam expostos a graves riscos de sofrerem tortura, estupro e todo tipo de sevícias por parte dos adultos e, frize-se: a pena visa recuperar e ressocializar o ser humano, não a sua completa degradação! Urgente a necessidade de reduzir-se a violência que permeia a vida dos cidadãos, de norte a sul do país. Contudo, enquanto o estado não tratar a família, as crianças e adolescentes como prioridade constitucional que são, enquanto não formar brasileiros com educação de qualidade e não houver investimento real nesta área, enquanto não ‘erradicar’ o tráfico de drogas e extirpar o consumo de ‘crack’, a realidade de violência e morte não mudará. Entendo o clamor das vítimas de seqüestros e assaltos e das famílias que tiveram entes queridos assassinados. Entendo sua ânsia pelo fim da violência. Já fui assaltada. Ainda assim, não mudei de ideia quanto à redução da maioridade penal para 16 anos. Aqueles meninos, tenho certeza, são iguais a outros milhares, que todos os dias repetem seu gesto, porque não tem quem cuide deles, quem lhes mande estudar, tomar banho, desligar a TV, dormir. São órfãos de pais vivos, filhos de famílias sem a mínima estrutura, deixados sozinhos por sua conta e risco, ainda pequeninos, quando seus pais saem para trabalhar, pois não dispõem de um lugar seguro onde possam ficar. Aqueles meninos, tenho certeza, são iguais a outros milhares: logo coletados pelo tráfico de CAFÉ & JUSTIÇA

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drogas. Inicialmente como avião. Depois, como assaltantes, matadores e é o fim! Muito cedo morrem! Vidas ceifadas no frescor da existência, sem chance! Tão vítimas quanto suas próprias vítimas...! Veja-se a fala de um adolescente que cumpria medida socioeducativa de internação, em entrevista para o livro “Vozes”, da Fundação Terre des Hommes: “Se você estudasse numa escola toda quebrada, seu pai vivesse preso e sua mãe fosse alcoólatra, na esquina de sua casa tivesse um traficante, você ia ser o que?” Enquanto não houver uma verdadeira revolução em nossa sociedade, da qual resulte educação pública de qualidade em todos os níveis e as pessoas não sejam obrigadas a viver na miséria e abandono, não teremos respeito à Lei e, bem assim, seus frutos: Justiça e Paz Social. Quando este dia chegar, feliz, mudarei de opinião, e serei favorável à fixação de maioridade penal, não aos 16, mas aos 14 anos, pois será justo cobrar-se de um adolescente de 14 anos, que rouba e mata, o mesmo que se exige de um jovem de 18 anos, uma vez que a todos foram dadas iguais condições de educação, saúde, moradia, segurança. Até lá, permaneço contra a redução da maioridade penal para 16 anos, simplesmente porque não é justo.

CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Anna Regina Almeida Magalhães – Advogada e presidente da Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescentes Recentemente a redução da maioridade penal voltou a ser discutida pela sociedade, depois que dois crimes cometidos por adolescentes chocaram a sociedade. Um deles foi o assassinato da dentista Cythia Magaly, queimada viva em seu consultório, e o outro do universitário Victor Hugo, assassinado em frente ao prédio onde morava. Os dois crimes ocorreram em abril do corrente ano, no estado de SP. Sempre que um menor se envolve em um crime bárbaro, o fato é amplamente divulgado e explorado pela mídia nacional fazendo com que uma

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parcela da população levante a voz para exigir a redução da maioridade penal. Ocorre que tal medida não resolve e nem ameniza o grave problema da violência que assola nossas cidades. Segundo o “Instituto Não Violência”, organização não governamental que atua com a missão de desenvolver uma cultura de paz por intermédio das escolas, pesquisas realizadas nas áreas social e educacional apontam que no Brasil a violência urbana está profundamente relacionada à desigualdade social, à impunidade pelo não cumprimento das leis que já existem e graves falhas no sistema educacional escolar. Segundo pesquisas, a grande maioria das infrações cometidas por menores, registradas na Fundação CASA (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente) é composta por infrações contra o patrimônio. Atos equiparados a homicídios, latrocínios ou delitos outros de natureza grave não são a regra, no entanto essa exceção, se verifica, por exemplo, quando os adolescentes se veem endividados com traficantes e/ou ameaçados de morte. Falar em reduzir a maioridade penal como forma de diminuir a violência praticada por menores infratores significaria reduzir a discussão apenas os efeitos dessa violência sem o necessário enfrentamento das suas causas, o realmente importa. Mais eficiente seria exigir do Estado o cumprimento de políticas públicas efetivas destinadas à proteção da infância e adolescência, com investimentos permanentes em educação, lazer e saúde. Um ponto importante que merece ser ponderado, é que a redução da maioridade penal traria consigo efeitos colaterais graves como, por exemplo, adultos fazendo uso de pessoas cada vez mais jovens para praticarem delitos. Reduza para 16 anos a maioridade penal e teremos pessoas de 14 e 13 anos, ou até menos, sendo usados por adultos para cometer delitos. Ademais, colocar menores infratores na prisão tornaria ainda mais caótico o já problemático sistema carcerário brasileiro, e a consequência imediata seria o aumento no número de criminosos reincidentes, com prejuízo direto para toda sociedade. Outro fato que merece atenção é que maioridade penal e responsabilidade penal são matérias completamente diferentes. No Brasil a responsabilidade penal começa aos 12 anos de idade,


momento em que o adolescente já não mais está imune à intervenção estatal e passa a responder por seus atos perante o ECA. Acontece que o adolescente está sujeito a um processo de responsabilização diferenciada da do processo penal, definido no Estatuto da Criança e do adolescente, e com objetivos distintos. As medidas ali estabelecidas serão bem efetivas se foram devidamente aplicadas. Ainda, se analisarmos a questão sob o aspecto da constitucionalidade, esbarramos em outro ponto que, por si só, encerra todas as discussões: a inconstitucionalidade de qualquer medida que vise reduzir a maioridade penal. Sobre o tema, o presidente da OAB nacional, Marcus Vinicius Furtado, destacou que “o artigo 228 da Carta Magna prevê que a maioridade penal se dá aos 18 anos, é, portanto, cláusula pétrea que não pode ser alterada”. Marcos Vinicius chamou a atenção ainda para o artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV, da CF/88, que prevê a impossibilidade de PEC tendente a reduzir ou limitar direito individual e que “a maioridade penal aos 18 anos é direito individual, logo, não pode ser removido. Eventual mudança mediante emenda não supera a análise da constitucionalidade”. Embora todos anseiem por um país mais justo, com menos criminalidade e mais segurança; um país onde as leis já existentes sejam efetivamente aplicadas e cumpram seus propósitos, não se pode descuidar da certeza de que a pretendida redução da maioridade penal não irá trazer os benefícios esperados pela sociedade. Tal medida se mostraria apenas paliativa e populista, destinada a acalmar os ânimos da sociedade sem o efetivo enfrentamento e solução do problema da violência no país.

CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Alexandra Veras Sobreira Psicóloga A redução da maioridade penal no Brasil é palco de discussões frente a uma problemática de violência que assola o país. Mas o CFP (Conselho Federal de

Psicologia) se posicional desfavorável à medida. O nível de complexidade acerca do tema é elevado, pois envolve questões delicadas. Levando isso em consideração, há alguns fatores que não devem ser ignorados: o sistema prisional brasileiro não é educativo, ou seja, ele não transforma o encarcerado educacionalmente, o que pode resultar na sua reincidência ao mundo do crime; o desenvolvimento do adolescente deve ser considerado, visto que ele, naturalmente, passa por conflitos e adaptações relativos à sua idade, o que não seria beneficiado com sua prisão; os investimentos na estrutura das cadeias teriam que ser aumentados, pois se já se encontra deficiente, com o ingresso de mais pessoas ao encarceramento tornaria mais crítica a situação, devido às más condições estruturais a que estariam submetidas. A política de encarceramento representa como a sociedade lida com os conflitos existentes e aponta as suas falhas e as do Estado, quando se faz alusão à raiz do problema. O adolescente, que é um ser em desenvolvimento e que está inserido em um meio em que ele transforma e é transformado, utiliza suas vivências e experiências, assim como as suas relações, na construção de uma identidade. Adentrar em uma realidade carcerária, em que é necessário dividir uma cela superlotada, chegando a dispor de somente setenta centímetros quadrados, é dar margem para um sentimento de revolta. Além disso, a taxa de reincidência do sistema penitenciário é de 70%, contra 20% de reincidência em medidas socioeducativas, que é a alternativa que o ECA propõe. O atual modelo de cárcere utilizado é o mesmo desde o século XVIII, tendo como base a punição e não a recuperação e a ressocialização do sujeito. Não é necessário dizer que esse sistema não produz bons resultados. O estado de cárcere pode produzir na pessoa em desenvolvimento (menores de idade) sofrimento existencial e desestabilizar ainda mais os já fragilizados vínculos familiares, gerando, muitas vezes, angústia e raiva que podem ser direcionados a própria sociedade. É importante lembrar que esses adolescentes não ficarão presos eternamente e, quando postos em liberdade, ao invés de estarem prontos para uma convivência e para uma estabilidade com o sistema, provavelmente se sentirão mais revoltados com a falta de oportunidades. Fica então a reflexão: a redução da maioridade penal seria então o caminho certo a seguir? CAFÉ & JUSTIÇA

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maioridade penal, voz essa a que não nos filiamos.

CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Felipe Vasconcelos - Graduando em Direito e representante estadual do Conselho Consultivo de Adolescentes e Jovens da Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e Juventude no Ceará. Eu vejo protestantes e seus coros de amor à pátria; eu vejo uma minoria de vândalos destruindo o patrimônio público e também o privado; eu vejo policiais nas ruas, armados como se estivéssemos em guerra... Vivenciamos na atualidade uma inegável revolução que terei orgulho de repassar aos meus filhos, revolução essa que trás a tona problemas que, embora antigos, apresentam-se como atuais, tais como a polêmica posta nas PEC’ 33 e 37 e a cobrança por melhores condições de vida.

Uma boa educação pode mudar vidas. Essa mesma educação pode traçar o futuro do garoto pobre, que nasceu e cresceu em uma favela, mas que tem dentro de si a chama acesa para mudar o seu destino, não ter sua juventude roubada e violentada dentro de uma cela por ter cometido ato infracional, ou ver-se morto por servir de avião ao traficante que tomou conta da favela onde vive. Educar bem sempre traça novos rumos. Reduzir a maioridade penal é mais uma vez omitir-se em oportunizar educação, saúde, segurança pública, formação para o trabalho, participação ativa em movimentos políticos e sociais. É um retrocesso que promete, em suas entrelinhas, condenar milhares de jovens. A hora é agora. Não há mais motivos de espera. Todos nós já estamos com cartazes e indumentárias, protestando pacificamente. A certeza de que tudo não será mais como antes existe. Só nos resta negar definitivamente a redução da idade penal e, de maneira como nunca vista desde vinte anos atrás, entrar para a história do Brasil, a nossa pátria amada, onde seus filhos não fogem à luta.

Vejo também vejo os milhares de cartazes clamando por uma educação pública de qualidade; pela segurança digna que nos faça querer a nossa rua ladrilhada como a canção popular já diz; por políticas públicas de inclusão, que sejam realmente bem planejadas e bem postas em execução; pela não aprovação da PEC 33 a exemplo do que aconteceu com a PEC 37. Eu vejo toda a população unida por demandas que obrigatoriamente já deveriam estar em plano primário desde que o Brasil é Brasil.

CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL Epaminondas Carvalho Feitosa, Defensor Público titular da Primeira Defensoria da Infância e Juventude de Fortaleza/Ce.

Eu vejo também um clamor pela redução da

No Brasil se governa através de pesquisa de

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opinião. Quanto à redução da maioridade penal, pesquisa do Datafolha, de abril deste ano, indica que 93% da população de São Paulo é favorável à medida, enquanto apenas 6% seria contra. O paradoxo é que 42% dos 600 entrevistados acreditam que para a diminuição da criminalidade, devem ser adotadas políticas públicas eficazes. O tema é apaixonante. Quando defendemos e nos posicionamos contra a redução da maioridade, em várias ocasiões, e sobretudo em redes sociais, recebemos várias críticas de amigos e parentes inconsoláveis, mesmo apresentando dados científicos da ineficácia da medida para o objetivo que se destina. Preliminarmente, compreendemos nos termos da mais abalizada doutrina, que seria inconstitucional qualquer alteração da maioridade penal. Compreendemos também que o mais eficaz seria a implementação de políticas públicas, previstas no Estatuto da Criança e Adolescente, que após mais de vinte e dois anos não passam de uma quimera. Não obstante, mesmo que fosse possível a redução, verifica-se sua inaptidão para a redução da criminalidade. Os argumentos de quem deseja a diminuição da maioridade penal são geralmente defendidos por quem não conhece a problemática e acredita que a solução seja a simples mudança legislativa. Eis a razão dos altos índices favoráveis à medida. Desconhecem a realidade de nossos jovens infratores, subjugados ao sistema normativo das ruas. Este executa sem pestanejar, sem direito de defesa, muitas vezes por simples dívida de drogas, bem mais rígido do que o olho por olho, dente por dente. Conhecem desde novos a realidade dos grupos de extermínio. Vivenciam, quando apreendidos, a lei interna dos Centros Educacionais, de


respeito recíproco. Conhecem a lei das gangues, que basta ser de outro bairro para ser odiado e receber a pena capital: morto pelo rival que, muitas vezes, sequer conhece. Nesta realidade, questiona-se se o jovem vai se acautelar com a simples diminuição da maioridade, quando sua realidade é um sistema normativo paralelo injusto, pernicioso e muito mais rígido do que qualquer modelo penal aplicado pelo Estado.

DIFERENCIADA

Obviamente, torna-se extremamente injusto um adolescente com família desestruturada, sem amor na primeira infância, em ambiente violento, sem apoio da sociedade, nem do Estado, ser cobrado na mesma proporção de um jovem do primeiro mundo, com todos os direitos preservados. Ensina o festejado professor Eugenio Raúl Zaffaroni que o popularismo penal é uma demagogia que explora o sentimento de vin¬gança das pessoas, mas, politicamente falando, é uma nova forma de autoritarismo. A violência aumenta porque au¬mentou a miséria. Os anos 1990 foram os anos do festival do mercado: os pobres ficaram mais pobres e alguns ricos, nem todos, mais ricos. Os mesmos autores dessa política de polarização da sociedade são os que hoje pedem mais repres¬são sobre os setores vulneráveis da população. Querem mais mortos e, entre os infratores e policiais, mais “guerra”. No final, eles são invulneráveis a essa violência. A “guerra” que pedem é a “guerra” entre pobres e/ou contra os pobres. Os males do popularismo penal são devastadores na vida social. O renomado professor Celso Fernandes Campilongo chama atenção para estes malefícios: “o popularismo penal aumenta o descrédito da população nas instituições e na possibilidade de mudança em curto prazo, fomentando a criação de ‘Estados Paralelos’, aumentando e fortalecendo organizações criminosas, multiplicando a justiça ‘pelas próprias mãos’, desfazendo a mobilização dos movimentos sociais e desarticulando os mecanismos de resistência a miséria, entre outros. O que, também acarreta na utilização do Direito Penal por políticos que hipertrofiam o sistema penal com soluções aparentemente eficazes em curto prazo, como forma mais econômica e demagógica de dar uma resposta estatal ilusória ao problema da delinquência”. Eis os principais argumentos pelos quais discordamos da diminuição da maioridade penal.

POSIÇÃO DIFERENCIADA Dairton Costa de Oliveira – Promotor, titular da 2ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Capital e Secretario Executivo das Promotorias da Infância e Juventude da Comarca de Fortaleza/CE Vivemos hoje um momento de debates políticos e sociais, gerado pelo flagrante crescimento da criminalidade adulta e juvenil (infracionalidade) a todo momento evidencializada por reportagens e produções policiais, amplamente difundidas pela mídia em suas diversas formas de comunicação de massa, bem como nas redes sociais, onde se clama a todo momento por tomadas de medidas por parte dos governantes para solução do problema da violência e principalmente do clima de impunidade que hoje predomina na mente das pessoas. Como solução ao problema da impunidade juvenil, muitos políticos e alguns leigos formadores de opinião, clamam pela imediata diminuição da maioridade penal, sem atentar para o fato de que a responsabilização sócio-educativa é tanto quanto ou bem mais severa que a responsabilização penal, não sendo a lei culpada pelo clima de impunidade juvenil hoje existente, mas sim o Estado que se omite ao não aplicar de forma efetiva as diretrizes do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

O ECA de hoje não permite que uma única criança ou adolescente, certificada como “perigosa” para si ou para a sociedade, ande livremente pelas ruas da cidade, sem que um agente da família ou do Estado esteja a acompanhá-la. De fato, o Estatuto determina que o simples faltar a uma aula ou desobedecer aos pais ou professores por parte de uma criança ou adolescente, deve gerar uma demanda social, com efetiva participação do Conselho Tutelar, que tem poderes para aplicar de forma “compulsória” medidas de proteção à criança ou adolescente e aos pais. Não atendidas as determinações do Conselho Tutelar, a demanda de uma simples insubordinação de um adolescente ao dever legal de ir a aula, deve ser levada à autoridade Ministerial que, dependendo das circunstâncias objetivas do caso e subjetivas do adolescente, pode representá-lo ao juízo da infância, para que seja aplicada ao mesmo uma medida sócio-educativa em meio aberto com ou sem julgamento da insubordinação. O fato é que, vindo o adolescente a recalcitrar na insubordinação prevê o Estatuto a possibilidade de sua internação compulsória pelo simples fato de o mesmo se negar ao dever de frequentar efetivamente uma escola ou obedecer aos pais. Conclui-se, portanto, que não é por falta de previsão legal que os jovens do Brasil não são punidos. O clima de impunidade é gerado por falta de ação, por omissão certa do Estado, em devidamente aplicar as diretrizes do Estatuto, no sentido de responsabilizar, no tempo e na forma devida, os atos infracionais que nossos adolescentes cometem. Pelo que está previsto no ECA, não é necessário que o adolescente roube ou mate ninguém para que venha a ter todos os passos de sua vida fiscalizados, bem como sua liberdade de ir e vir limitada ou suprimida. Basta que se mostre rebelde ao comando de seus pais e demais autoridades comunitárias para que o Estado tenha o dever de agir sobre sua conduta, colocando-a devidamente dentro dos parâmetros sociais desejados pelo Estado/Sociedade que o cerca. Não significa que o ECA seja perfeito e mudanças relativas à evolução das formas de interação e das demandas originadas pela sociedade que nos cerca não possam ser bem vindas ao seio do Estatuto. CAFÉ & JUSTIÇA

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RESPONSABILIDADE AOS 16 ANOS O que a legislação brasileira deixa (ou não) um adolescente dessa idade fazer.

BEBER Menores de 18 anos VOTAR Desde a Constituição de não podem consumir bebida alcoólica. 1988, o voto se tornou facultativo a partir dessa Desde 2011, no Estado de São idade. O jovem cidadão consegue tirar o título de Paulo, até a venda eleitor, mas ainda não é ficou proibida – os comércios devem obrigado à exercer seu checar um documento dever. de identidade do comprador.

ASSISTIR FILMES ADULTOS A classificação DIRIGIR recomendada que aos 16 Os cursos para obter a anos, o adolescente não carteira de motorista são consuma conteúdo de sexo permitidos apenas aos explícito. Mas valem cenas maiores de 18 anos. Ao de nudez completa, caricias contrário dos EUA, que intimas, violência, drogas e fornecem licença provisória conflitos psicológicos. dois anos mais cedo.

Assim sendo, como operador habitual do Direito, labutando diuturnamente em processos ligados ao juízo da infância e juventude, defendo a adoção de pelo menos três reformas procedimentais no Estatuto, que não necessitam obviamente de Emenda Constitucional para se verem concretizadas: - a primeira delas é a possibilidade de que, nos casos de atos infracionais que envolvam violência ou grave ameaça real contra pessoa, nos quais se revela a necessidade de uma melhor análise e maior cautela do Estado para com o julgamento do fato e seu autor, seja possível a prorrogação do prazo de internação provisória dos adolescentes infratores por mais 45 dias, possibilitando assim a efetiva localização de testemunhas, reconstituição de fatos, produção de laudos periciais, produção de laudos e visitas psicossociais e demais provas que se fizerem necessárias à elucidação dos fatos.

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FUMAR Em tese, o acesso ao cigarro também é vetado – assim como outros produtos cujos componentes podem causar dependência física ou psíquica. Fonte: Estatuto da criança e Adolescente, Código Civil, Departamento de Justiça, Legislação Federal sobre Tabaco, Tribunal Superior Eleitoral, Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) e Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. (SEBRASH)

CASAR Os cartório exigem uma autorização formal dos pais para que qualquer noivo menor de 18 anos possa assinar a papelada civil do casamento.

EMANCIPAR Basta que os pais estejam de acordo ou que o jovem tenha negocio próprio ou carteira assinada. A emancipação é civil e não transmite a responsabilidade penal ao menor.

- o segundo e terceiro obstáculos vislumbrados ao devido e efetivo trabalho do Estado, no sentido de melhor ressocializar os adolescentes e acautelar a sociedade da “falha”, que é de toda a sociedade em não fazer de nossas crianças e adolescente cidadãos de bem, estão as normas que preveem o limite máximo de internação para 3 anos e a liberação compulsória dos agentes aos 21 anos. Ambos estes limites, obrigam o Estado a cessar a aplicação de medidas sócio-educativas, que na verdade muito mais se assemelham a medidas de segurança do que a penas. É obvio que o princípio da brevidade que norteia a responsabilização socioeducativa não permite que adolescentes infratores permaneçam por período de 30 anos submetidos às referidas medidas. Contudo certificado por equipe interdisciplinar a necessidade de prorrogação de referidas medidas pela efetiva constatação de periculosi-

SER PRESO Segundo o ECA, crimes e contravenções cometidos por menores de 18 anos são considerados “atos infracionais”. Os adolescentes podem ser punidos com medidas socioeducativas, inclusive com a privação de liberdade por, no máximo, três anos.

dade na pessoa do ex adolescente, impõe-se a prorrogação das medidas até que ele deixe de ser, biologicamente, um jovem-adulto e alcance a maturidade físico-biológica o que hoje acontece por volta dos 27 ou 28 anos, coincidindo assim a ampliação do limite de aplicação das referidas medidas com o prazo de 10 anos (dos 18 aos 28 anos), que é o limite máximo da prescrição de delitos cometidos por jovens delinquentes. O mais interessante é que as alterações ora propostas, por não envolverem mudança na idade colocada como limite da responsabilização penal, deixando os jovens menores de 18 anos que cometam atos infracionais graves ainda submetidos a medidas socioeducativas pelo tempo máximo de 10 anos, não necessitam de Emenda Constitucional para serem aprovadas, gerando, de imediato, como efeito prático uma responsabilização socioeducativa que agradará a “gregos” e “troianos”.



ARTIGO - Luciana Sousa

REALIZANDO SONHOS... Nos dias que antecederam a solenidade de inauguração da casa destinada à instalação e funcionamento do “Projeto Fábrica Escola”, apeguei-me a conjecturas sobre a arte de sonhar e a ciência de realizar os sonhos.

A história mostra que nem sempre são pelas armas que se processam as mudanças na sociedade. Antes delas e muitas vezes sem elas, as ideias e as necessidades semeiam os campos e abrem os caminhos da esperança e da libertação.

Embalada pelas expectativas que geralmente nos possuem às vésperas de um grande acontecimento, procurei me amparar no pensamento dos poetas e neles buscar o otimismo e a esperança, sentimentos indispensáveis para os que caminham em busca de horizontes sociais.

Essa casa e esse momento foram amorosamente construídos por um grupo de sonhadores que, tomados pela crença na reedificação do ser humano, estão apostando todas as cartas num projeto de vertical e grandiosa sublimidade.

Vi em Fernando Pessoa uma afirmação soberana: “Tenho em mim todos os sonhos do mundo”. E em Emily Dickinson a consciência de que “A esperança tem asas e faz a alma voar”.

Éramos 12, o número apostólico, rico de simbolismo, porque foi com aquele pequeno grupo de 12 seguidores que Jesus promoveu a grande reforma moral, mística e filosófica do mundo. Fez uma revolução.

Dizem que as verdadeiras revoluções começam no coração dos poetas, porque eles são generosos e puros e, por isso, transportam na alma os grandes sonhos da humanidade. A experiência do “Projeto Fábrica Escola”, por seu caráter inovador e pelas transformações que pode provocar, tem, sim, um caráter de revolução.

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- CAFÉ & JUSTIÇA

Quando vemos transformado em espaço sólido, em paredes e teto, um sonho que a tantos parecia abstrato, irreal e impossível, aflora a emoção. Naquela casa, hoje em pleno funcionamento vêm-se as mãos, as mentes e os corações de um afoito grupo de idealistas


Luciana Teixeira de Sousa Juíza Titular da 2ª Vara de Execuções Penais de Fortaleza/CE

“Que desça sobre o Ceará e o país a consciência da necessidade de combater a violência por outros caminhos e com novas ideias, pois talvez os nossos métodos de combater o crime não estejam mais respondendo às expectativas”

que, alimentados pela fé e buscando o apoio de outras almas generosas, desafiou o medo, enfrentou a descrença e ganhou a confiança da sociedade, conseguindo provar que quando se tem a verdade dentro de nós, conseguimos pintar a mais escura noite com as mais luminosas cores do amanhecer. Todos os dias aprendemos lições com a humanidade. Os bons são maioria e estão aí, no mundo, em disponibilidade, ao alcance de nossas mãos. Quando temos um objetivo de benefício social, não devemos hesitar em convocá-los para formar ao nosso lado. Os agradecimentos são indispensáveis: primeiramente, aos apenados - destino de nossas esperanças com quem firmamos um pacto de confiança e credibilidade; aos voluntários - que cedem fatias preciosas de seu tempo para exercer solidariedade e praticar o amor ao próximo; ao apoio das empresas e das instituições públicas parceiras que entenderam o propósito desta iniciativa destacando, no topo dessa pirâmide, a Fundação Deusmar Queiroz que, pela lucidez de seu Presidente, vem trilhando um caminho de consciência que se constitui um nobre exemplo de cidadania a ser seguido pelo empresariado de nosso Estado e, pó derradeiro, mas como agradecimento maior, a Deus que com a vastidão de sua generosidade, nos permitiu a realização deste grande sonho. Estamos agora propiciando um novo destino para algumas pessoas a quem a vida está oferecendo a oportunidade de se reconstruírem. Que desça sobre o Ceará e o país a consciência da necessidade de combater a violência por outros caminhos e com

novas ideias, pois talvez os nossos métodos de combater o crime não estejam mais respondendo às expectativas por algumas falhas de visão e de interpretação. É possível que a segurança social esteja a reclamar por novas atitudes. Uma delas, com certeza, é a ressocialização dos presos, tema que está sendo discutido em todo o mundo. A condenação eterna para quem errou é uma usina criminal. Que uma nova visão nos encaminhe para as descobertas da razão. É preciso andar pelo lado claro da estrada e não pelos desvios cinzentos da intolerância; É preciso oferecer a mão aos que tropeçam e não a frieza da desconfiança; É preciso dizer SIM aos que querem se reafirmar e recebê-los sem ódio e sem medo; É preciso aclamar a vida, estimular as promessas de vida e jamais se aliar aos descrentes e pessimistas; E, para os que marcham na frente, que se vistam com a couraça da resistência, porque não é fácil convencer os incrédulos nem encorajar os desconfiados. Entretanto, se a nossa causa é justa e nela acreditamos, dela não poderemos recuar. Concluo com estes versos de Cora Coralina, poeta de Goiás, que só passou a ser ouvida aos 70 anos, quando publicou o seu primeiro livro: “Desistir... eu já pensei seriamente nisso, mas nunca me levei realmente a sério; é que tem mais chão nos meus olhos do que o cansaço nas minhas pernas, mais esperança nos meus passos, do que tristeza nos meus ombros, mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça.” CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Antônia Neuma Mota Moreira Dias

PROCEDIMENTOS

SUCESSÓRIOS

Eis uma questão a merecer uma boa reflexão: se o legislador preferiu retirar do âmbito dos procedimentos sucessórios as questões de “alta indagação”, com o escopo evidente de dar maior celeridade à ação de inventário, por que, então, parece haver um consenso de que tais ações são complexas, demoradas, se arrastam

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por anos a fio, sem definição, sem efetividade, enfim, sem que os herdeiros possam dispor de seus quinhões? De fato. Não é raro, ao contrário, são até frequentes, muitas ações perduram por décadas no Poder Judiciário sem uma definição.


Antônia Neuma Mota Moreira Dias Juíza de direito

Costuma-se dizer que basta existir um herdeiro dissidente para que o processo vire uma “confusão” se arrastando por anos. Mas é bom que se diga que basta um herdeiro “querer” para que o processo alcance seu desiderato. E é assim porque os procedimentos sucessórios são simples, objetivos, se resumem apenas a três e quando bem manejados, alcançam seus objetivos, sem maiores problemas. São assim definidos: arrolamento sumário, arrolamento comum e inventário propriamente dito, dos quais se falará adiante. Primeiramente é relevante destacar o que significa questão de alta indagação. A lei não definiu. Na forma do que prescreve o artigo nº 984 do Código de Processo Civil, o Juiz decidirá todas as questões de direito e também as questões de fato, quando este se achar provado por documento, só remetendo para os meios ordinários as que demandarem alta indagação ou dependerem de outras provas.

“porque os procedimentos sucessórios são simples, objetivos, se resumem apenas a três e quando bem manejados, alcançam seus objetivos, sem maiores problemas”

Ficou para a doutrina e a jurisprudência esclarecer que, por alta indagação deve-se compreender a necessidade de ampla produção probatória para a comprovação de fatos, como acontece, por exemplo, nas ações de investigação de paternidade e no reconhecimento da união estável. Portanto, questões de alta complexidade, mas que possam ser elucidadas por provas documentais e periciais, não determinam necessariamente a remessa do processo às vias ordinárias. A esse propósito, convém transcrever decisão proferida pela 1ª Câmara Cível do TJSP no Agr. Instr. Nº 119.438-1, mencionada por ARNALDO RIZAARDO em seu DIREITO DAS SUCESSÕES, Ed. Forense, 2011, p. 577, verbis: “As questões de fato fundadas em trabalhos técnicos, como, por

exemplo, as suscitadas por impugnação de laudo pericial, não podem ser consideradas questões de alta indagação e deve, em regra, ser apreciadas no próprio inventário. Daí que: ‘Todas as questões de direito, por mais complexas que sejam, devem ser decididas no inventário. E as de fato, quando fundadas em trabalhos técnicos, apresentados por perito e assistente técnico, como regra, não podem ser qualificadas de alta indagação, desde que não dependam de prova a ser colhida em outro processo. São questões (de fato) de alta indagação as que exigem outras averiguações e coleta de provas. Mas tal não se pode falar em apuração de haveres, para a qual o Código de Processo prevê prova pericial, no próprio processo de inventário”. Então, quando falece alguém que deixa patrimônio, seus bens e direitos só podem ser transmitidos a seus herdeiros através da ação de inventário, que se movimenta através de um dos três procedimentos mencionados, dos quais falaremos resumidamente. Arrolamento comum: está previsto nos artigos 1.031 a 1.035 do CPC e se utiliza quando todos os herdeiros são maiores e capazes e há consenso na partilha dos bens, bastando para tanto que se instrua o pedido com o Plano de Partilha amigável; com a documentação respectiva que comprove a relação do parentesco e a titularidade dos bens, e o pagamento dos impostos. Essa modalidade é cabível para qualquer que seja o valor do espólio, mas exige a concordância de todos os herdeiros quanto à partilha. É para esse tipo de inventário que a Lei nº 11.441 de 04 de janeiro de 2007 possibilitou a realização através de escritura pública, perante o Tabelionado CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Antônia Neuma Mota Moreira Dias

que as partes envolvidas elegerem, desde que assistidas por advogado ou Defensor Público. Arrolamento Comum: este é o procedimento adequado para quando a herança não ultrapassa o valor de 2.000 (duas mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN) que em valores atualizados representa R$ 90.000,00 (noventa mil reais) aproximadamente. O fator determinante para esta modalidade de inventário é o valor dos bens, não sendo impeditivo a presença de menor ou incapaz, ou até mesmo herdeiro ausente, não sendo exigido também que haja acordo entre os herdeiros. Inventário propriamente dito se aplica aos casos não contemplados nas duas hipóteses anteriores.

Cumprindo-se a lei, simplesmente, muitas ações deixariam de adentrar diariamente no Poder Judiciário, resultando em economia de tempo e trabalho de todos os envolvidos,

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Na década de 80, por ocasião do movimento da desburocratização do país, foi editada a Lei 6858 com o propósito de facilitar às pessoas de pouco patrimônio uma forma simples e direta de seus eleitos serem contemplados, sem os ônus do processo. Assim, de acordo com a Lei 6858/80, algumas exceções foram feitas para que determinadas importâncias pudessem ser postas imediatamente à disposição dos herdeiros sem a necessidade de se instaurar um processo de inventário. Logo depois, o Decreto n° 85.845, de forma didática, clara e minuciosa, esclareceu o texto da Lei 6858 deixando certo que: I - quantias devidas a qualquer título pelos empregadores a seus empregados, em decorrência de relação de emprego; II - quaisquer valores devidos, em razão de cargo ou emprego, pela União, Estado, Distrito Federal, Territórios, Municípios e suas autarquias, aos respectivos servidores; III - saldos das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS/PASEP; IV - restituições relativas ao imposto de renda e demais tributos recolhidos por pessoas físicas; V - saldos de contas bancárias, saldos de cadernetas de poupança e saldos de contas de fundos de investimento, desde que não ultrapassem o valor de 500 (quinhentas) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional e não existam, na sucessão,

outros bens sujeitos a inventário; todas essas importâncias devem ser pagas aos dependentes habilitados do falecido perante a Previdência ou órgão encarregado, na forma da legislação própria, do processamento do benefício por morte. O STJ, seguindo a mesma orientação, já decidiu; “Os montantes das contas individuais do FGTS e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, devem ser liberados aos descendentes habilitados, independentemente de inventário e arrolamento; o levantamento só depende de autorização judicial se não houver dependentes habilitados, hipótese em que serão recebidos pelos sucessores previstos na lei civil, mediante alvará a ser requerido ao juízo competente para o inventário ou arrolamento” (conflito de competência nº 15.367SC. 1ª seção DJU 04.12.95) Mesmo assim, quase três décadas depois, ainda se constata resistência a seu cumprimento por algumas entidades, o que favorece o manejo de muitas ações na Justiça com o objetivo de se obter um Alvará judicial que possibilite ao interessado sacar tais valores. Ora, se a lei diz de forma clara e objetiva que o beneficiário de tais valores é o dependente habilitado pelo falecido junto ao órgão competente, não implicará em carência de ação o interessado já habilitado perante o órgão que busca a tutela jurisdicional? A resposta positiva se impõe. Em outras palavras, sempre que houver dependente habilitado perante a previdência, ou órgão empregador, indicado pelo falecido, a ele devem ser destinados os valores de que trata a Lei 6858, sendo inteiramente dispensável a apresentação de Alvará Judicial. Cumprindo-se a lei, simplesmente, muitas ações deixariam de adentrar diariamente no Poder Judiciário, resultando em economia de tempo e trabalho de todos os envolvidos, sejam advogados, defensores, promotores, juízes e servidores e, principalmente do interessado, a quem se destina o maior propósito da lei.


CAFEZINHO

Antonio Pinto Advogado

LINHA DE PARTIDA Sem guerras, o povo brasileiro vive em média setenta e dois anos, o americano, setenta e sete, o francês, oitenta e o japonês, oitenta e dois. Parece que cada vivente, dependendo do local de nascimento, tem o destino que lhe é traçado. O herói da Ilíada também nos deu um recado de que os deuses invejavam os homens porque estes são mortais, seus atos não mais se repetirão. É um alento. O contista argentino, Borges, falando sobre os imortais, provoca nova discussão. Dá conta da mais completa falta de motivação daqueles que viverão a eternidade. Tenho quase certeza que falava do céu dos católicos. Vinícius de Moraes, num de seus belos poemas, nos abriu a mente. Apesar de a vida ter sempre razão, afirmou que, tão logo nascemos, começamos também a morrer. O menestrel faleceu em 09 de junho de 1980, com sessenta e seis anos, deixando prematuramente uma grande lacuna na música e no belo esporte escocês do consumo dos maltes puros. Em 2005, o executivo da Apple Corporation, discursando na Universidade de Stanford para uma turma de formandos, participou a todos de suas de angústias existenciais, tal qual o menestrel diplomata, dizendo que todos devem seguir o próprio coração, proclamando a nudez da humanidade e que não há nada para esconder, se vamos todos morrer. Steve Jobs, naquela homenagem, já se encontrava doente, sofrendo de câncer de pâncreas, vindo a falecer em 05 de outubro de 2011, então com cinquenta e seis anos de idade.

Tem que ser isso. O ser humano nasceu para morrer. Não importa se menestrel ou milionário, executivo ou poeta, não se pode prolongar a vida quando a hora chega. Mas o que dizer de viver menos do que a média de seus contemporâneos, apesar de possuir meios de adquirir longevidade? Outros talentos também tiveram suas médias negadas. George Harrison, Roy Orbinson, Bruce Lee, Elvis Presley e, pelo que se sabe, nenhum deles sucumbiu por fatos extraordinários. Tratou-se da partida por morte natural. Não seria dessa maneira mais importante pensarmos nas médias de vida do que na vida eterna, já que nascemos para morrer? Se os nossos condutores religiosos não resolvem seus próprios problemas existenciais e os milionários são incapazes de prolongar suas vidas, nos parece tolice ouvirmos a pregação de ambos. No Ceará, os sobreviventes que estão acima das médias históricas parece ser a população feminina que trabalha com rendas, bilros e crochet. Não é difícil encontrar pessoas em plena atividade com mais de noventa anos. Será que se Jobs, Vinicius e Harrison, além de suas atividades profissionais, fizessem um pouco de renda acrescentariam mais tempo as suas vidas? É tudo um mistério. Na dúvida, talvez seja bom comprar linha e agulha para, nas horas vagas, exercitar as mãos e esvaziar a mente, enquanto os pregadores da eternidade, incluindo médiuns, gurus e os cientistas, patrocinados por milionários, não resolvem esses intrincados questionamentos.

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ARTIGO - Alexander Solon Mota

INEXIGIBILIDADE DE ALIMENTOS

EM FACE DA ATIVIDADE LABORAL 58

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Alexander Solon Mota Advogado

“o fato de o alimentando estar exercendo uma atividade profissional economicamente viável obsta a pretensão alimentícia e somente momentos ou situações especialíssimas poderiam afastar a vedação legal”

É induvidoso que, ante as conjunturas atuais, o mercado de trabalho fica cada vez mais concorrido e exigente. É imprescindível uma boa formação educacional para que o jovem civilmente maior exerça uma atividade laborativa capaz de lhe promover a autossubsistência. Boa parte dos jovens que atinge a maioridade almeja construir sua individualidade através do estudo e do trabalho, mas nem sempre é possível realizar esse desiderato, porquanto insuperáveis são os problemas de ordem socioeconômicos.

mínimo uma exigência insensata, a despeito da solidariedade retro citada.

Apesar de todas as dificuldades, o jovem da moderna sociedade, por vezes, não desanima e, ao contrário, tem se mostrado perseverante e habilidoso ao perseguir o conhecimento intelectual necessário, que lhe permita suprir as suas necessidades vitais.

Por seu turno, se mostra cristalina a situação de injustiça que seria obrigar o pai a continuar prestando alimentos a um filho improdutivo e comodista, simplesmente pelo fato daquele ser detentor de grandes posses, por exemplo. Essa obrigação já não mais lhe compete; contraria valores éticos e morais, tão essenciais no seio familiar. Além do mais, o Código Civil de 2002, nos termos do art. 1.695, proíbe a prestação de alimentos a quem detém posses ou que, laborando, possa manter-se por si próprio. Vê-se, pois, que o fato de o alimentando estar exercendo uma atividade profissional economicamente viável obsta a pretensão alimentícia e somente momentos ou situações especialíssimas poderiam afastar a vedação legal.

Por outro lado, não é incomum o filho chegar à maioridade necessitando do apoio dos pais, a fim de dar sequência aos seus projetos educacionais e profissionais. Quando isso acontece é sinal de que o beneficiário passa a ter direito de exigir dos devedores de alimentos a continuidade da prestação, haja vista não ter alcançado o resultado esperado, ou seja, o término do curso universitário ou profissionalizante, incidindo, na hipótese, o instituto da solidariedade familiar, princípio basilar do Direito de Família. Insta pontificar, no entanto, que bem diferente é a situação de um filho maior de idade, possuidor de atividade laborativa economicamente viável e que venha a pleitear recursos financeiros dos pais, alegando motivos dos mais inconsistentes. Ora, atribuir uma obrigação alimentar aos pais em favor de um filho que já exerce um trabalho garantidor das suas necessidades, é no

Forçoso reconhecer, no entanto, a real possibilidade de existirem situações em que os filhos, independentemente da idade, venham a necessitar do apoio financeiro dos pais, mesmo que estejam habilitados profissionalmente. Neste caso, o encargo deixa de ser obrigacional, e passa a ser espontâneo, com fundamento em valores de índole constitucional.

A despeito de existirem posicionamentos jurisprudenciais no sentido de permitir a continuidade alimentar mesmo na hipótese de o alimentando estar efetivamente laborando, tal permissividade não tem o condão de estimular a ociosidade, nem tampouco incentivar a malandragem. Na verdade, são casos especiais e que merecem a atenção do aplicador do direito a fim de que não venham a ocorrer determinadas injustiças. Não se desconhece que a lei por mais inovadora que seja não acompanha os fatos sociais CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Alexander Solon Mota

com a mesma efemeridade, notadamente na seara do Direito de Família. Na prática, constata-se que o julgador, sensível às mudanças, age muitas vezes desprendido do formalismo e se vincula aos princípios que norteiam o Direito, entre os quais, o da proporcionalidade. Exemplo típico é o da inexigibilidade de alimentos em face de atividade laborativa. Na espécie, as regras estampadas na legislação orientam o magistrado no sentido de não se desvincular totalmente do texto normativo, porém não o impede de agir com discricionariedade, que lhe é inerente, especialmente quando sentencia com eficiência e responsabilidade. Não por acaso que a inexigibilidade da prestação alimentícia em face de uma atividade profissional do filho que atingiu a maioridade, tem se revelado como algo irrefutável na opinião da melhor doutrina. Acerca disso, me valho dos ensinamentos de Cahali: “A maioridade civil, atingida aos 18 anos de idade, só será causa excludente do dever ali-

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mentar quando ficar comprovado que o filho tem meios próprios de subsistência” (CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.465). Não raro, o beneficiário demanda alimentos no intuito de se locupletar as expensas do devedor abastado, com o propósito único de obter uma renda “extra” e infindável, configurando, na hipótese, uma aposentadoria precoce. Infelizmente, comportamentos desta natureza existem, constituindo-se como verdadeira “indústria da obrigação alimentar”, devendo, pois, sofrer as reprimendas do julgador, a fim de que possam prevalecer valores cujos alicerces se lastreiem na moralidade e na ética. Assim, condutas que maculam e deslustram a instituição família devem ser rechaçadas não somente pelos prejudicados, mas sobretudo pelo Poder Judiciário, sob pena de a exceção virar a regra. Ademais, a obrigação alimentar quando demandada em Juízo nos casos em comento, é requerida de forma onerosa, prejudicando sobremaneira o alimentante que, pode-se asseverar, passa

a ser a parte hipossuficiente, uma vez comprovada a desnecessidade do alimentando em face da sua plena atividade laborativa. Por fim, insiste-se na ideia de que o instituto dos alimentos tem natureza assistencialista, isto é, destina-se a prover as necessidades dos menores de idade ou daquele que efetivamente está inapto ao trabalho, sendo, portanto, injusto e imoral demandar familiares sob o pífio argumento de que a obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos maiores persiste com base na relação de parentesco. Ora, uma coisa é o alimentante prestar assistência a quem comprova necessidade, independentemente da modalidade da obrigação; outra bem diferente é o alimentando comportar-se de forma execrável, ou seja, aproveitando-se do vínculo – ascendente e descendente – para tentar “subtrair” recursos que não mais lhes são mais devidos e nem indispensáveis para atendimento das suas necessidades básicas.


PONTO DE VISTA

Juiz de Direito, Titular da 3ª Vara Cível de Fortaleza-Ce

Cid Peixoto do Amaral Netto

AUDIÊNCIA DE

PROVIDÊNCIAS

Com o objetivo primeiro de detectar processos que, diferentemente dos demais feitos judiciais da mesma natureza, demoram-se demasiadamente na sua tramitação ou eternizam-se nos escaninhos da Justiça e objetivando ainda facilitar, agilizar e impulsionar o trâmite processual, sugerimos, nesta oportunidade que nos é conferida pela Café e Justiça, a adoção, pelos Magistrados, de uma providência inovadora por mim nominada de “Audiência de Providências”. O citado ato processual poderá ser realizado em data previamente aprazada, após notificação das partes e Advogados regularmente constituídos e, naquela oportunidade, deverá o Julgador, mesmo oralmente, relatar o feito, identificar possíveis irregularidades ou omissões e, nesse ponto, analisar especialmente as causas que inviabilizaram a efetiva realização das providências necessárias à prestação jurisdicional,

inclusive atribuindo às partes – se for a hipótese – a culpa pelo não impulsionamento da demanda. Esse contato direto com o Magistrado (registrado em termo de audiência) e essa integral análise prévia da questão submetida ao Judiciário, além de oferecer segurança às partes, oferecerá oportunidade adequada para as postulações urgentes e evitará a extinção de processos em decorrência de injustificadas omissões dos litigantes, a exemplo da não apresentação, tempestivamente, de endereços, documentos indispensáveis à propositura da ação, indicação de bens para penhora etc. Esse inovador procedimento foi por mim registrado/inscrito na décima edição do “Prêmio Innovare”, que seleciona novas práticas para a modernização da Justiça brasileira. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Priscilla Peixoto do Amaral

CUIDADOS NA ELABORAÇÃO

DOS CONTRATOS INTERNACIONAIS

Com o desenvolvimento da economia mundial, o Brasil já conquistou um lugar de extremo destaque neste cenário. Nos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, no primeiro semestre de 2012, as negociações internacionais brasileiras registraram recorde de US$ 227,4 bilhões, com ampliação de 1,7% sobre o mesmo período de 2011, quando atingiu US$ 223,6 bilhões, ficando entre os países que mais realizam complexas operações comerciais, como importações e exportações, compras de linhas de produtos estrangeiros, abertura de empresas no exterior, investimentos, entre outros. Assim, um grande número de empresas e seus advogados,

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- CAFÉ & JUSTIÇA

necessitam ter maior entendimento das negociações “overseas” e formalização das mesmas, através dos contratos internacionais. A economia dinamizou-se e alcançou um grau de organização, ou seja, as pessoas que praticam e estão interligadas ao comércio, necessitam, primeiramente, buscar um bom entendimento entre as partes negociantes, levando-se em consideração a variação de idiomas, legislações, acordos, condições, regras, e conhecimento do cenário internacional. Os contratos têm papel relevante nesta organização do comércio, pois estes funcionam como lei entre as partes. Portanto, as


Priscilla Peixoto do Amaral

Advogada e consultora jurídica empresarial

“As cláusulas e características peculiares da essência do contrato devem ser observadas e redigidas com especial atenção” negócio jurídico, ponto fulcral, uma vez que, em eventual julgamento que envolve contratos internacionais, os julgadores buscam entender a real intenção das partes contratantes. Se isto for bem entendido pelo advogado, e posteriormente bem redigido nas considerações preliminares, tendem a auxiliar o juiz na tomada de decisão. Ou seja, neste momento, o advogado terá que pensar inteiramente como empresa e absorver a ideia do seu cliente, anotando, estudando e pesquisando cada aspecto para ele repassado.

elaborações destes, requerem a máxima atenção e cuidado por parte do advogado, diante das diversidades encontradas nesta área.

As cláusulas e características peculiares da essência do contrato devem ser observadas e redigidas com especial atenção, pois são importantes os pontos como o preâmbulo, a cláusula de eleição do foro, a escolha do idioma e a ‘hardship clause’, esta última, utilizada em virtude de possíveis fatos imprevistos e excepcionais que tornem o contrato excessivamente oneroso para uma das partes. Os contratos internacionais, em sua maioria de longa duração, devem procurar prever tais possibilidades e, na sua eventual utilização, demandar uma reorganização do contrato, buscando um novo equilíbrio.

As negociações preliminares da relação comercial começam com discussões e tratativas, onde é avaliada a viabilidade do negócio jurídico antes da elaboração do contrato. O advogado tem que entender o negócio que será pactuado, estudando o objeto, com suas propriedades intrínsecas, reflexos de sua utilização e mercado consumidor, por exemplo. Posteriormente, deverá compreender as necessidades principais de cada parte, ou seja, o que as levaram a fazer aquele

As expressões contratuais, usualmente utilizadas para definir direitos e deveres das partes contratantes, deverão seguir uma padronização internacional. Em uma visão globalizada, isto facilita o bom entendimento para ambas as partes, refletindo em segurança jurídica. Para isto, deverão ser utilizados os termos internacionais padrões (INCOTERMS) da International Rules for Interpretation of Trade (Commercial) Terms, contribuição da International Chamber of Commerce.

Necessária também a verificação da viabilidade legal da execução deste contrato, ou seja, se a legislação pertinente autoriza este tipo de produto ou serviço, os quais não poderão ofender a ordem pública. Outro cuidado que o advogado deverá ter é com a conferência da documentação pertinente ao negócio e às situação das partes contratantes, inclusive com relação à capacidade jurídica, levando em consideração que todos os documentos oficiais devem estar devidamente registrados e consularizados, e posteriormente traduzidos por um tradutor juramentado do idioma do contrato e da jurisdição escolhida. A Jurisdição, através da cláusula de eleição de foro, vem a ser objeto de crescente e polêmico debate. Este é o meio pelo qual as partes podem eleger o foro que melhor acharem convenientes. A liberdade da lei aplicável está, em grande parte dos contratos internacionais, sendo mantida e aplicada em outros países. Porém, ao analisarmos a jurisprudência majoritária brasileira, esta segue tão somente a norma descrita nos termos do parágrafo primeiro do artigo 9º da LINDB, segundo a qual se aplicará a lei do país em que o contrato for constituído. E, destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Francisca Francy Maria da Costa Farias

A DIFÍCIL MISSÃO

DE JULGAR À frente da 13ª Vara Cível de Fortaleza recebi, para processar e julgar, uma “Ação de Anulação de Escritura Pública de Compra e Venda cumulada com Reintegração de Posse” e, neste pedido, os Suplicantes alegavam haver comprado, dos Promovidos, em 2008, um determinado imóvel; que escrituraram o imóvel, mas que, ao tentarem promover a matrícula do referido bem, foram informados, pelo Cartório de Registro Imobiliário, que o mesmo, por força de transação comercial havida em 2010, já estava matriculado em nome de uma terceira pessoa a quem iremos, fictamente, nomear como “Jocasta”.

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Ao argumento de que os Demandados teriam agido de má-fé vendendo o mesmo bem imóvel duas vezes, em flagrante cometimento de dolo e fraude em negócio jurídico, pleitearam a anulação da Escritura Pública de Compra e Venda em relação à transação com Isadora. Instaurado o contraditório, vieram aos autos as alegações dos Requerido e esses, nas suas argumentações, aduziram que os Autores apenas haviam emprestado o nome para que um filho (que nomearemos como “Édipo”) adquirisse um imóvel sem transtornos na composição da sua


Francisca Francy Maria da Costa Farias

Juíza Titular da 13ª Vara de Família de Fortaleza

“Julgar é sempre um ato e um dever de consciência e de sentimentos apoiados na lei, na razão e no equilíbrio.”

renda anual; que “Édipo” veio a falecer e que a pessoa em nome de quem se encontra matriculado o imóvel, “Jocasta”, era nora dos Demandantes, vez que casada com “Édipo”, e era mãe de uma filha deste.

Informaram ainda os Contestantes que ao registrar o imóvel “Jocasta” promoveu a doação de 50% do bem para a filha menor “Nikita”, através de Escritura Pública de Doação, devidamente registrada no Ofício Imobiliário.

Informaram ainda que, após a compra, ainda em 2007, “Édipo” e “Jocasta” tomaram posse do imóvel adquirido; alugaram-no posteriormente e, após o encerramento do contrato de locação, demoliram o prédio ali encravado e deram início à construção de um novo empreendimento, oportunidade em que procuraram regularizar a transação comercial; que, por questões de composição de renda, “Édipo” solicitou que a escritura fosse lavrada no nome de seus pais, os Autores, mas que essa Escritura jamais foi registrada, porque os Requerentes sempre souberam que o imóvel não lhes pertencia.

E, por derradeiro, os Demandados argüiram que os Autores sonegaram várias informações, tais como: ser “Jocasta” nora dos promoventes, viúva de “Édipo”, o falecido filho dos autores, e mãe da menor “Nikita”, neta dos suplicantes; ser “Nikita” donatária de 50% do imóvel em questão; que a obra iniciada no imóvel em litígio pelo de cujus foi concluída a duras penas pela viúva de “Édipo”, real adquirente do imóvel em litígio. Promovida a indispensável instrução do Feito, exurgiu a certeza de que o pedido anulatório não poderia, sob nenhum aspecto, prosperar.

Relatam os Réus que “Édipo” faleceu no ano de 2009, deixando a esposa “Jocasta” e uma filha menor, ora nomeada como “Nikita”; que por ocasião do inventário do de cujus a inventariante “Jocasta” tomou ciência dos bens deixados pelo marido e solicitou aos promovidos que fizessem uma escritura do imóvel litigioso em seu nome, o que foi feito, para evitar que o bem não tivesse que sofrer regularização judicial e fosse constar do inventário, evitando assim diversos custos.

O acervo probatório produzido pelas partes em consonância com a prova testemunhal produzida em Audiência conseguiu, à saciedade, lançar luzes sobre a quaestio posta valendo destacar que, ao hostilizarem os argumentos apresentados com a Contestação, os próprios Demandantes confessaram, em sua Réplica que o aludido imóvel fora adquirido pelos Contestantes com o dinheiro do seu filho “Édipo”. Dessa forma os próprios promoventes corroboraram as alegações dos Réus de que “Édipo”

foi quem adquiriu o imóvel e teria solicitado que a escritura fosse lavrada no nome de seus pais, os Promoventes. Quando do seu depoimento pessoal, o Autor “Caio”, em Audiência, reiterou que a negociação de compra do imóvel foi realizada por seu filho “Édipo”, que à época já era casado com “Jocasta”, e que o imóvel fora adquirido por R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), tendo participado com R$ 5.000,00 (cinco mil reais). A alegada participação, contudo, não encontrou sustentáculo comprobatório. Da prova produzida exsurgiu evidente o fato deque a viúva e a filha menor do de cujus são as legítimas herdeiras do bem, que por sinal já se encontra devidamente dividido em partes iguais entre ambas. Consequentemente, forçoso seria concluir que a Escritura Pública de Compra e Venda que os Autores pretendiam registrar é que fora fruto de simulação entre os promoventes e o falecido “Édipo”, como relatado. Do quanto trazido à apreciação não se verificou nada que pudesse sequer insinuar que os Réus tenham auferido alguma vantagem com a feitura da escritura questionada no nome de “Jocasta”. Ao contrário, ao assim procederem asseCAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - Francisca Francy Maria da Costa Farias

guraram os direitos das herdeiras do de cujus. Os promoventes não lograram êxito em comprovar suas alegações.

perda da posse, na forma do art. 927 do Código de Ritos, verbis: Art. 927. Incumbe ao autor provar:

Como é sabido, em processo, alegar e não provar é o mesmo que nada falar. É a consequência lógica da regra insculpida no art. 333, I e II, do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 333. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Os réus, por outro lado, comprovaram quantum satis suas alegações com a vasta documentação carreada aos autos. O pedido de reintegração de posse deduzido na Inicial também não encontrou qualquer aporte fático ou legal. Os Suplicantes simplesmente não comprovaram os requisitos exigidos na espécie, quais sejam a posse sobre o bem, o esbulho praticado pela Ré, a data do esbulho e a

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I - a sua posse; Il - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração. (GN) A alegação dos autores se resumiu tão somente ao fato de terem adquirido o imóvel, que como acima visto, consistiu de simulação, tendo os promoventes confessado que o dinheiro para a compra do imóvel pertencia a “Édipo”, o falecido filho dos mesmos. Não se encontra na narrativa autoral sequer menção de terem os demandantes algum dia estado na posse do imóvel disputado, não podendo portanto serem reintegrados. Ao contrário, a documentação constante dos autos é contrária às alegações da parte promo-

vente. O contrato de locação comercial do imóvel litigioso comprova que “Édipo” era quem exercia a posse do bem disputado e fora o autor das obras iniciadas no objetivado imóvel. O pedido autoral, à evidência, foi julgado IMPROCEDENTE (com aplicação dos ônus sucumbenciais). Julgar é sempre um ato e um dever de consciência e de sentimentos apoiados na lei, na razão e no equilíbrio. A situação ora exposta não se propõe a traduzir lições e nem ensinamentos. Representa uma modesta intenção de destacar a importância da prova e correta análise das mesmas na aplicação da verdadeira Justiça. Se me faltam méritos técnicos, sobram-me sentimentos de retidão e de Justiça que, sob a vigilância de Deus, me são inspirados pela profunda vontade de acertar ou de errar menos.


ACONTECIMENTOS

LANÇAMENTO DE LIVRO O Ideal Clube foi palco, no ultimo mês de junho, do lançamento do livro Licenciamento Ambiental: Uma Análise Jurídica e Jurisprudencial da advogada Sarah Carneiro Araújo. O livro propõe-se a estimular o procedimento de Licenciamento Ambiental, analisando os fundamentos normativos, teóricos e jurisprudenciais que alicerçam uma adequada gestão ambiental, para averiguar a efetividade desta ferramenta na concretização da defesa e proteção do meio ambiente.

SOLENIDADE Os advogados Anna de Almeida Magalhães e Nilton Medeiros tomaram posse na presidência e vice-presidência, respectivamente, da Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, em solenidade realizada no dia 25 de Abril na sede da OAB-Ceará.

No dia 04 de abril de 2013, a Dra. Olivia Pinto tomou posse da presidência da Comissão de Combate à Homofobia e à Proteção a Diversidade Sexual da OAB/ CE, da qual também são membros as advogadas Ana Vládia Feitosa, Ana Paula Martins e Roberta Vasques.

MÉDICO AMIGO – PACIENTE FELIZ Em uma atitude inovadora, a Juíza Titular da 10ª Vara de Família de Fortaleza-Ce, Dra. Valeska Rolim, em parceria com o corpo clínico do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (antigo Hospital de Saúde Mental de Messejana) realizou, no período de 06 a 09 de maio do corrente ano, o Mutirão Semana da Boa Prática – Médico Amigo, Paciente Feliz. Essa brilhante iniciativa impulsionou todos os processos de interdição daquela vara que encontravam-se pendentes de perícia médica, tendo alcançado o índice de 85% de processos sentenciados.

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ARTIGO - Yuri Cavalcante Magalhães

UMA REFLEXÃO: MAIS COMUNICAÇÃO NO

RELACIONAMENTO A DOIS!

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Yuri Cavalcante Magalhães

Professor de Direito de Família, Juiz de Direito, Mediador, Coach, Hipnoterapeuta

O casamento e a união estável são relacionamentos que necessitam de estabilidade. Para que haja esta tão querida situação, necessário se faz dentre outros fatores que haja um bom entendimento entre o casal. Nesse sentido, o Código Civil Brasileiro prevê em seu art. 1.566, inciso V que é dever do casal o respeito e a consideração entre os dois de forma recíproca. Assim, pergunta-se: Como você vem tratando seu cônjuge ou companheiro(a)? Julgando-o(a)? É importante entender que as pessoas não são diferentes somente fisicamente. Se dois amigos, às vezes, não se entendem; se duas amigas discutem; imaginem um homem e uma mulher enquanto casal. A mulher costuma dedicar-se para o aspecto relacional e emocional, enquanto o homem é mais racional e atenta-se para seus objetivos. Muitos homens e mulheres ficam tristes porque se doam e não recebem algo em troca, dão e esperam a devolução criando expectativas em relação à atitude do outro. É verdade que cada um possui suas limitações. No entanto, o equilíbrio entre o dar e o receber é uma condição indispensável para um relacionamento de sucesso, e deve ocorrer naturalmente. Quando um casal inicia um relacionamento, ambos transpõem uma etapa da vida, uma ova fase de sua própria individualidade, o que também ocorrerá com a vinda da paternidade e maternidade. Saber perdoar é um exercício e uma decisão. Sem perdão não há continuidade, mas sim limitação. Exemplificando, seria como o se uma peça do dominó estivesse fora de ordem e, após você tocar na primeira que toca na segunda e assim por diante, chega ao final e não encontra mais a pedra

seguinte, porque está fora de ordem e do prumo, deixando-se de dar continuidade à relação, ao amor. O ato de dar sem desejar algo em troca é grandioso. Criticar ou validar? Há quem diga que melhor seria criticar o ato a criticar a pessoa. O ideal, contudo, é validar, focar no que é bom, no que se tem de bom, porque isso proporciona o crescimento do que é positivo. Ser feliz no amor é algo acessível a todos. E o mais adequado é quando o outro faz despertar a amizade, o amor e o interesse sexual, os quais se sobrepõem ao medo de amar. Você conhece alguém com medo de amar? O que dizer a essa pessoa sobro o amor? As vivências acontecem a cada dia. Quando se ama, torna-se vulnerável e, por isso, mais respeito e consideração faz-se cada vez mais necessário. É por ter sensibilidade diferente um do outro, que o casal precisa entender: o pensamento individual não externado ao companheiro pode ocasionar eventual conflito de comunicação. O respeito e a consideração mútuos relacionam-se todo o tempo: a sua atitude está relacionada não com a realidade, mas com o que você interpreta da realidade. Talvez as palavras a seguir funcionem para aqueles que têm medo de amar: “Se você está com pressa, eu não estou, leve o tempo que precisar, pois eu entendo o seu tempo das coisas”, “Você é muito elegante!”, “Eu vejo, eu sinto como você tem um bom coração!”, “Quando você fala, eu fico de queixo caído, adoro o som da sua voz!”, “Eu sempre me sinto feliz quando estou com você!”. Assim, fica a reflexão: exerça um espírito criativo! Você consegue! Cultive seu corpo e suas emoções de maneira saudável. Respeito e consideração a si e ao outro são fatores importantes no relacionamento. CAFÉ & JUSTIÇA

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PERFIL

LISETE DE SOUSA GADELHA No dia 28 de junho do ano em curso, durante sessão plenária conduzida pelo Presidente do TJCE, Desembargador Luiz Gerardo de Pontes Brígido, a Juíza Lisete de Sousa Gadelha, por aclamação pelo critério de antiguidade, foi eleita para o cargo de Desembargadora após 27 anos de atuação na prestação jurisdicional. Na mesma oportunidade e pelo critério de merecimento, foi eleito o magistrado Raimundo Nonato Santos. Aos 23.07.2013, durante almoço oferecido pelos Magistrados, muitas homenagens foram prestadas à nova Desembargadora que, nos corredores forenses, é inconfundivelmente reconhecida não apenas pelo seu compromisso com a Magistratura, mas também pelo seu sorriso farto, pela sua gostosa gargalhada e pela eterna disponibilidade para ajudar aos que dela se socorrem. Naquela oportunidade festiva foi lembrado que a Dra. Lisete é natural de Fortaleza; ingressou na magistratura em 01.09.1986, como Juíza substituta da Comarca de Solonópole; trabalhou nas comarcas de São Benedito e Itapajé, sendo promovida para Fortaleza em 1993; na Capital, iniciou na 29ª Vara Cível, tendo desempenhado funções em diversas outras varas; atuou também como Juíza Eleitoral e foi Presidente da 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais. Traçando o PERFIL da homenageada a Juíza Ana Cleyde Viana de Souza, com muita propriedade, escreveu: “Amiga, Eu podia falar sobre sua trajetória na carreira e narrar seu sucesso nas comarcas onde exerceu a judicatura, suas respondências, auxílios, seu bom desempenho na função

eleitoral, na turma recursal e até quando foi convocada para o Tribunal de Justiça, mas escolho falar da pessoa humana que você é! Você vive a vida de um modo especial, parece saber que ela deve ser intensamente vivida. Vive sem subterfúgios ou disfarces. Momentos felizes, tristes, difíceis, momentos de gargalhar, até de dar vexames, dar bronca, elogiar quando necessário, ter confiança nas pessoas, momentos de afeto, de seriedade, de indignação, todos esses sentimentos fazem de você um ser humano de verdade, que aprende e ensina, sabe ser solidária, não passa impunemente na vida das pessoas. Desejo muito que tenha felicidade bastante para fazer sua vida doce, dificuldades para fazê-la forte, tristeza para fazê-la humana e esperança suficiente para fazê-la feliz. As pessoas mais felizes não são as que têm as melhores coisas, mas aquelas que sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos. A felicidade aparece para aqueles que choram. Para aqueles que se machucam. Para aqueles que buscam e tentam sempre e para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas. O futuro mais brilhante é baseado num passado intensamente vivido. A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar na vida das pessoas duram uma eternidade. Você tem minha amiga, a sabedoria para viver intensamente todos esses momentos! Seja feliz nesse novo desafio que se apresenta na sua vida! Parabéns!”

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MATÉRIA - AGU - Advocacia-Geral da União

20 ANOS DE CRIAÇÃO DA

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO - AGU

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“Essencial à Justiça, indispensável à nação”. O slogan de comemoração dos 20 anos de criação da Advocacia-Geral da União (AGU) reflete o importante papel do órgão na representação judicial e extrajudicial da União, e nas atividades de consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Executivo Federal. Criada em 1993 pela Lei Complementar n° 73, de 10 de fevereiro, a idealização da AGU já estava prevista na Constituição Federal de 1988, quando o texto constitucional previu a inclusão da Advocacia Pública dentre as Funções Essenciais à Justiça. Como a orientação jurídica e a defesa da União em juízo são atividades complexas, a AGU foi concebida como um sofisticado sistema de representações judicial e extrajudicial, com sede em Brasília, e representações em cada estado da federação. No Ceará, o “sistema AGU” é composto pela Procuradoria da União (PU/CE), Procuradoria Federal (PF/CE), Consultoria Jurídica da União (CJU/CE), Procuradoria da Fazenda Nacional (PFN/CE) e Procuradoria do Banco Central (PBC/CE); cada qual com grandes responsabilidades e um rol de atribuições específico. A PU/CE atua exclusivamente na representação judicial direta da União, ou seja, nas causas de interesse dos Ministérios (Educação, Saúde, Comunicações, Transportes, Justiça, Defesa, etc.), das Forças Armadas, da Polícia Federal, enfim dos órgãos despersonalizados federais em geral, incluindo órgãos do Poder Judiciário e Legislativo. À CJU/CE compete atividades de consultoria e assessoramento jurídico dos órgãos do Poder Executivo com atuação no Estado do Ceará. Atuam na CJU/CE e PU/ CE os membros da carreira de Advogado da União. A PF/CE, por seu turno, representa as 155 autarquias e fundações públicas federais no contencioso. As Procuradorias Federais Especializadas (PFE/FUNASA, PFE/DNOCS, etc) fazem o assessoramento jurídico das Autarquias e fundações federais. Atuam nesses órgãos os membros da carreira de Procurador Federal. A PFN/CE é órgão cujas atribuições residem, principalmente, na representação da União em causas fiscais,

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MATÉRIA - AGU - Advocacia-Geral da União

DADOS AGU/PU/CE NO COMBATE À CORRUPÇÃO (ATUAÇÃO EM 2012) AÇÕES JUDICIAIS EM DEFESA DO PATRIMÔNIO E COMBATE À CORRUPÇÃO 58 ações na Justiça Federal no Ceará

na cobrança judicial e administrativa dos créditos tributários, cuja atuação compete aos membros da carreira de Procurador da Fazenda Nacional. A PBC/CE atua na defesa do Banco Central, por meio dos membros da carreira de Procurador do Banco Central. Os cargos mencionados, ou seja, Advogado da União, Procurador Federal, Procurador da Fazenda Nacional e Procurador do Banco Central, que compõem o “sistema AGU”, cada qual no seu rol de atribuições, são acessíveis por meio de concursos públicos de provas e títulos e têm idêntica remuneração. Falemos especificamente da Procuradoria da União no Estado do Ceará - PU/CE, que, como dito, defende em juízo os órgãos da administração direta federal. A PU/CE conta, atualmente, com 24 Advogados da União e 37 servidores administrativos para atuar em todas as causas que envolvam interesses dos órgãos públicos federais com atuação no estado, em, aproximadamente, 80.000 processos ativos. As causas versam sobre os mais variados assuntos, passando pelo direito administrativo em geral, econômico, financeiro, internacional, da saúde, ambiental, trabalhista, dentre outros, onde há uma atuação em juízo marcada pela ética e lealdade processual, além, por óbvio, dos inafastáveis princípios da administração pública que impõe ao Advogado da União, dentro e fora do processo, uma postura à altura da relevância do seu cargo. Importantes demandas judiciais passam pela AGU, Procuradoria da União no Estado do Ceará. São ações que tratam da implementação de políticas públicas, dos grandes projetos do Estado brasileiro, responsabilidade civil do Estado, direitos humanos, combate à corrupção, dentre outras que, somadas, representam mais de 2 bilhões de reais só no Ceará.

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TOTAL DE VALORES ENVOLVIDOS R$ 14.335.205,99 TOTAL DE VALORES BLOQUEADOS, PENHORADOS E RECUPERADOS R$ 1.992.407,95 TOTAL DE VALORES RECUPERADOS VIA ACORDOS DE PARCELAMENTO R$ 653.535,35

De fevereiro de 2012 a janeiro de 2013 a AGU -PU/CE foi intimada de 10.234 sentenças, sendo 6.234 favoráveis à União, o que representa uma taxa de êxito de 62%. De setembro de 2012 a abril de 2013 a atuação exitosa da AGU, considerando as sentenças favoráveis na qual a PU/ foi intimada, representou uma economia estimada de R$ 288.295.971,30. A defesa do patrimônio público, mormente das áreas de praia, e o combate à corrupção são temas de grande relevância para a AGU-PU/CE. Só em 2012 foram propostas 58 ações com finalidade de defesa e recomposição do patrimônio público federal, totalizando R$14.335.205,99. A redução de litigiosidade é uma necessidade premente, e a AGU firmou compromisso com o CNJ nesse sentido. No Ceará, a PU/CE, com apoio da Justiça Federal, pôs fim a centenas de processos nos Juizados Especiais Federais por meio de conciliações em matérias de interesse de servidores públicos federais. Em 2012 e 2013 foram três mutirões de conciliação que, somados, reuniram 455 propostas de acordo por parte da União, que extinguiram, por mútuo acordo, cerca de 300 processos. Em abril de 2013, o foco do mais recente mutirão de conciliação foi ações de interesse de servidores inativos e pensionistas, público de idade bastante avançada. No mutirão houve um per-

centual de 80,65% de comparecimento e 89,28% de acordos, o que permitirá que as partes, pessoas idosas, em sessenta dias já possam gozar de seus direitos, o que, em regra, só ocorreria muitos anos depois. Eis, portanto, um breve apanhado da Advocacia-Geral da União, e, em especial, da Procuradoria da União no Estado do Ceará. Aos 20 anos, madura e sólida, a AGU caminha firmemente para sua consolidação como um dos baluartes do estado democrático de direito, figurando o estado do Ceará, e as unidades aqui sediadas, como uma das mais importantes arenas de atuação da instituição. Todavia, há muito a fazer nos próximos 20 anos. Crescer de modo sustentável ecológica e economicamente, atingir bons índices de desenvolvimento humano, combater a corrupção, etc.. Os desejos da sociedade brasileira nada mais seriam que aspirações se não fossem instituições sólidas como AGU, que, a partir da dedicação de seus membros e servidores, trabalham no dia a dia para transformar os sonhos nacionais em realidades concretas, paupáveis. Por fim, fica o convite para que visitem a AGU-Procuradoria da União no Estado do Ceará, e conheçam de perto o modelo de advocacia pública aqui vigente.



ARTIGO - José Feliciano de Carvalho

DO PÃO-E-CIRCO À

BOLSA-FAMÍLIA E FUTEBOL As ocorrências populares acontecidas na concomitância da Copa das Confederações não são causas, mas conseqüências sociais da conduta dos governantes. Não se tome como motivo o aumento de 20 centavos, apenas, no preço das passagens dos transportes públicos. O estopim da indignação, do grito do povo, foi o momento escolhido para se impor essa majoração à aceitação tácita do consumidor. O País estava a viver a empolgação

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de uma copa de futebol, o delírio do brasileiro, em vários e suntuosos estádios, em várias Capitais da Nação. A enganação não passou despercebida da crítica da massa social, que ousou ir às ruas, em multidões, pacificamente, levando até filhos menores, para mostrar, com a sua revolta, que a paciência do cidadão tem limite e sabe cobrar dos governantes decência de conduta e respeito para com a dignidade de cada um que trabalha e paga


José Feliciano de Carvalho

Advogado

tributos altíssimos, mas nunca é ouvido quanto aos gastos dos dinheiros públicos. A presença nefasta de baderneiros, ladrões, destruidores do patrimônio público e do particular, não serviu para denegrir a grandeza dos reclamos que advêm do fundo da revolta dos insatisfeitos. Esses indivíduos perversos não apareceram de graça, porque delinqüente não se arrisca sem vantagem em nenhuma empreitada de suas posturas criminosas. Esse ponto negativo há de ser apurado para se saber se não existe um mentor que haja articulado manchar a grandeza de um direito que é cobrar a devolução da confiança que o voto levou aos que se encontram à frente dos destinos da coisa pública. A demonstração disso mais se acentuou nos reclamos apostos nos “cartazes” exibidos pelos jovens que compunham o conglomerado dos reclamadores. Eles pediam explicação para os altos gastos na reforma dos estádios de futebol, diante da miséria oficial que se instalou em todos os hospitais públicos, em cujos corredores pessoas do povo, miseráveis, morrem à míngua de assistência profissional e de medicamentos próprios porque o serviço público é deficitário e omisso. A saúde pública do Brasil não prestará enquanto o brasileiro precisar pagar plano particular de saúde.

“A saúde pública do Brasil não prestará enquanto o brasileiro precisar pagar plano particular de saúde”

A reclamação também vinha do alto custo de vida e da especulação que se alastra no país, sem que haja governo que domine. Os impostos variados e caros também foram apontados como motivo da insatisfação. E com razão, porque não existe nada mais cruel do que a malvadez da inserção desses tributos em todos os objetos e bens que são adquiridos pelo homem comum em sua vida diária. Ressalte-se que a reclamação também dizia respeito à educação pífia que o brasileiro

recebe, desde os primórdios da escola pública ao nível universitário, como se neste país não houvesse governo. As altíssimas rendas públicas não se apresentam com sua transparência no que diz respeito aos investimentos sociais que beneficiem a comunidade dos contribuintes. O que se sabe são as custosas despesas gastas com a propaganda dos governantes para gáudio de si mesmos, como se com isso conseguissem eles blefar a inteligência social do operário brasileiro. O transporte público, que devia ser público mesmo, mas não o é, porque só é público para permitir as licitações de empresas que precisam justificar seus lucros exacerbados sob o manto de que essa sua conduta seria lícita pela bênção do poder público. A prestação desse serviço é de baixa qualidade, de puro desrespeito ao usuário, que a tudo suporta, sufocado em ônibus ou vagões superlotados, na angústia de chegar ao trabalho na hora certa, ou na extrema fadiga de poder voltar às suas moradias longínquas e desconfortáveis no fim de um dia estressante. Em derredor de todas essas angústias, esse mesmo povo, de qualquer nível, de qualquer posição social, ainda está sujeito à intranqüilidade de uma convivência sem a mais mínima segurança pública. Nessa parte a posição do brasileiro se apresenta de uma forma crítica tão descomunal, que se tem a impressão de que o país está vivendo à mercê da anarquia pública. Até hoje não se viu um só movimento no que tange à iniciativa de uma “PEC” contra a comercialização de armas letais dentro do país em período de paz, como não se tem notícia de nenhuma outra, ou ato do Governo Federal, tanto no campo interno como em relação a outros governos, com a finalidade de exterminar o fabricante das drogas perversas que alimentam os traficantes e matam os usuários. CAFÉ & JUSTIÇA

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ARTIGO - José Feliciano de Carvalho

“O grito do povo não acatou fosse tolhido o Ministério Público da sua missão de investigar infratores”

O sistema penitenciário brasileiro é a escola superior da prática de todos os crimes e à custa do dinheiro público. Ninguém conhece uma providência sequer na defesa da inserção do trabalho como parte da pena imposta aos condenados. Não se tem notícia de lei cuidando de ministrar aos encarcerados educação dentro dos presídios. Mas se sabe que sem trabalho, sem intelecto iluminado e sem conduta moral condigna, ninguém poderá se considerar um cidadão de bem.

Cabo Anselmo no Rio de Janeiro. Uma coisa é certa, porém, é que todo movimento popular resulta da insatisfação do povo na conduta dos administradores da coisa pública. Os inábeis e os inescrupulosos são ávidos pelo poder e pelo tesouro públicos, manchando o propósito daqueles competentes e bem intencionados que, muitas vezes são vencidos pelos que chegam ao comando do poder político do país para a implantação da anarquia e da afronta ao direito do cidadão comum.

O excesso de população carcerária é fruto material do trabalho da polícia e da justiça criminal. O fracasso do sistema penitenciário está jungido a uma política social falida, tema nunca enfrentado, com seriedade, por nenhum dos donos do poder, porque não traz dividendos eleitorais de imediato. A cobrança das ruas está nas mãos daqueles que fazem as leis e nas daqueles que têm o controle dos gastos dos dinheiros públicos. Esses têm que responder por seus atos e dar satisfação social à comunidade que os pôs no exercício de suas funções.

O mundo está vivendo uma tremenda inquietação social por cobrança de emprego, de estabilidade monetária, de tranqüilidade política, envolvendo Nações de todos os níveis de civilização e de poder econômico - da Espanha às do Mundo Árabe - tudo envolto numa insatisfação geral de suas comunidades sociais, o que deixa inquieta uma Nação como o Brasil, de tamanho continental, com uma só língua e um direito todo sacramentado em texto de lei. E nessa parte, o de que se precisa não é muito, em face do que se vê nos demais rincões dos povos do mundo.

O grito do povo não acatou fosse tolhido o Ministério Público da sua missão de investigar infratores que poderiam se pôr a salvo da mão da lei penal por um órgão incumbido, ele mesmo, de levá-los às barras da justiça criminal com absoluta segurança de sua autoria. Essa fenomenal resistência popular frustrou, de vez, a idéia da maléfica PEC-37. Essas manifestações de rua são sintomas muito graves para a estabilidade dos governos. Tais movimentos não podem se desdobrar como aqueles que outrora irromperam no país e que deram motivo ao golpe de 1964, de trágica memória. Ainda é remanescente na nossa lembrança o episódio da movimentação popular liderada pelo

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A história tem revelado que os governantes nunca souberam aferir o verdadeiro sentimento do povo. A civilização dos Romanos deixou marcada na sátira de Juvenal – panem et circenses – ou seja, que se pode enganar a população com pão e diversões enquanto os governantes fazem e desfazem dos seus arbítrios e das coisas públicas. Haverá um momento em que tudo é cobrado e o cobrador é exatamente aquele que até então, foi desrespeitado em seus direitos. É preciso que se volte ao tempo em que se ensinava aos jovens a história política de seu povo, para formar em cada um o caráter de cidadão que se dá ao respeito e que respeita o direito alheio.


CURIOSIDADES

DE ONDE SURGIU O TERMO “VARA” EMPREGADO NO PODER JUDICIÁRIO? ISTO SIM É COINCIDÊNCIA Quando a gente fala de história, será que dá para acreditar em coincidências? Alguns acreditam, outros não, mas é verdade que algumas são assombrosas, como estas que envolvem dois dos maiores presidentes dos Estados Unidos. Conheça 10 coincidências entre Abraham Lincoln e John Kennedy. Abraham Lincoln foi eleito para o Congresso em 1846. John F. Kennedy foi eleito para o Congresso em 1946. Linconl foi eleito presidente em 1860. Kennedy foi eleito para presidente em 1960. - Ambos estavam comprometidos com os direitos civis. As esposas de ambos perderam filhos enquanto estavam na Casa Branca. - A secretária de Lincoln chamava-se Kennedy. A secretária de Kennedy chamavase Lincoln. - Os nomes Lincoln e Kennedy tem 7 letras cada um. Ambos os presidentes foram baleados na cabeça. - Lincoln foi morto na sala Ford, do te-

atro Kennedy. Kennedy foi morto num carro Ford, modelo Lincoln. Ambos os presidentes foram assassinados por sulistas. Ambos os presidentes foram sucedidos por sulistas. Ambos os sucessores se chamavam Johnson. - Andrew Johnson, que sucedeu Lincoln, nasceu em 1808. Lyndon Johnson, que sucedeu Kennedy, nasceu em 1908. - John Wilkes Booth, que assassinou Lincoln, nasceu em 1839. Lee Harvey Oswald, que assassinou Kennedy, nasceu em 1939. Os nomes de ambos tem 15 letras. - Booth saiu correndo de um teatro e foi apanhado em um depósito. Oswald saiu correndo de um depósito e foi apanhado em um teatro. Ambos foram assassinados antes de seu julgamento. - Antes de ser morto, Lincoln esteve em Monroe, Maryland. Antes de ser morto, Kennedy esteve com Marylin Monroe. http://www.historiadigital.org/curiosidades/10-coincidencias-entre-lincoln-e-kennedy/

PRIMEIRA UNIVERSIDADE A primeira Universidade do mundo que ministrou um curso de Direito foi a de Bolonha, na Itália fundada em 1150. A primeira Faculdade de Direito do Brasil foi fundada em Olinda em 11 de agosto de 1827. http://dizerdireito.blogspot.com.br/p/curiosidades-juridicas-voce-sabia-que-o.html

O termo “Vara” atualmente é uma divisão na estrutura judiciária que corresponde à lotação de um juiz. No Brasil, durante o período Colonial, Portugal adotou uma unidade político-administrativa baseada no modelo da República Romana, com a criação da Câmara Colonial. Havia dois juízes ordinários, eleitos anualmente, que alternavam-se no cargo de presidente da Câmara. Suas atribuições consistiam em distribuir justiça aos povos, sendo definidos como juiz mais velho e juiz mais moço. Os juízes ordinários praticavam uma modalidade de justiça baseada no Direito Consuetudinário ou de Costumes, nem sempre do agrado do poder real, razão pela qual foram instituídos os Juízes de Fora. Os juízes de fora, instruídos no Direito Romano, favoreciam em muito os reis e eram por eles preferidos, por isso acabaram por serem impostos a todas as Vilas, restringindo paulatinamente a jurisdição dos juízes da Câmara. O símbolo da autoridade dos juízes ordinários e magistrados era a vara que deviam portar obrigatoriamente: “Os juízes ordinários trarão varas vermelhas e os juízes de fora brancas continuadamente, quando pella Villa andarem, sob pena de quinhentos réis, por cada vez, que sem ella forem achados”. (Ordenações Filipinas, Liv. 1, p. 135). A função da insígnia era tornar visível a autoridade de seu portador e assegurar a imediata obediência a suas ordens. Esta simbologia permanece nos dias de hoje na designação das divisões do poder judiciário, denominadas “varas”. Fonte: Memorial Colonial - http://cmop.mg.gov.br/

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HOMENAGEM

ADEMAR MENDES BEZERRA Por Ricardo de Araújo Barreto - Juiz de Direito e Presidente da ACM – Associação Cearense de Magistrados

É consenso que a definição de um bom magistrado encerra valores como conhecimento do direito, correção moral e disposição para o trabalho. A essas qualidades, particularmente, adiciono outra, tão ou mais importante quanto as primeiras, uma grande dose de humanidade. Neste espaço, destacarei um exemplo legítimo de quem as possui em abundância e as distribui sem parcimônia. Falo de Ademar Mendes Bezerra que, no último dia 25 de abril, aposentouse de suas atividades como desembargador. No final da década de oitenta, fui seu aluno na Faculdade de Direito, da Universidade Federal do Ceará. Chamava-me a atenção o brilhantismo de suas exposições, sua oratória privilegiada, mas, sobretudo, seu semblante acolhedor e sua cortesia ao tratar conosco, jovens recém-apresentados ao mundo jurídico. Interessante lembrar que a atitude humilde e descontraída na sala de aula contrariava a impressão geral que se tinha da figura dos magistrados, sempre associada ao aspecto sisudo da profissão. Decerto, fruto de uma época em que a boa comunicação com a sociedade não era priorizada pelo Judiciário. Anos depois, em janeiro de 1998, recém-ingresso na magistratura estadual, cruzei novamente meu caminho com o do dileto professor, à época, ainda juiz de direito e assessorando o então presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, Desembargador José Maria Melo.

Aquela administração é lembrada como uma das mais profícuas que a Corte cearense já vivenciou, com a construção de fóruns e residências oficiais por todo o território Alencarino. Em 2003, quando alçado ao cargo de Desembargador, tive a oportunidade de lhe cumprimentar dizendo, na ocasião: “a magistratura de segundo grau ganha hoje um autêntico representante do primeiro grau junto às suas fileiras”. E assim o foi durante todo o tempo em que exerceu a desembargadoria. Espalhando sua benéfica influência no colegiado, em que repercutia uma voz ponderada em defesa da magistratura cearense. Por isso mesmo, tantas vezes teve sua liderança reconhecida, quer à frente da Associação Cearense de Magistrados, quer na Associação de Magistrados Brasileiros, onde exerceu a vice-presidência administrativa no período de 2008 a 2010. Ressalto, por fim, que os exemplos falam mais alto do que as palavras. E é de líderes assim que precisamos nesse delicado momento de transição pelo qual passa a magistratura brasileira, tendo que adotar uma postura cada vez mais acessível e eficiente diante da crescente demanda por justiça social. Honrou-me, profundamente, a oportunidade de registrar essa minha admiração e agradecimento, o que faço em nome de todos os que integram o Poder Judiciário Cearense.

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REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DESAFIO PARA O REGISTRO DE IMÓVEIS Por Francisco de Sales Alcântara Passos – Oficial do 6ª Serventia de Imóveis de Fortaleza

A Constituição da República garante ao cidadão moradia digna, no entanto a urbanização desigual das grandes cidades iniciada na década de 60, persiste e os problemas se agravam continuamente;, entretanto recentes medidas do poder público buscam soluções para o problema. A Lei nº 11.977/2009, que trata do Programa Minha Casa Minha Vida, dispõe sobre a regularização fundiária no Brasil. Pode-se assegurar que trouxe perspectivas alvissareiras para as populações ocupantes de áreas irregulares ou que não tenham seu imóvel regularizado. Pela primeira vez, é dado um destaque ao instituto, normatizando-o em lei federal, que estabelece, de forma clara e didática, procedimentos, competências, e cria importantes mecanismos para a sua concretização. A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. (Lei 11.977/2009, art. 46) Cabe ao Registro de Imóveis, nesse conjunto, adotar várias medidas visando à regularização jurídica do imóvel. O capítulo III da Lei Federal 11.977/2009, é o primeiro marco jurídico de caráter nacional a dispor sobre a regularização fundiária em áreas urbanas de maneira abrangente. Além de conceituar, a lei cria novos instrumentos e procedimentos, define competências e responsabilidades, com o objetivo de tornar efetivos os processos de regularização, especialmente nos casos em que esteja configurado o interesse social. A irregularidade fundiária não se limita aos assentamentos populares, existindo também bairros e loteamentos formados por famílias de média e alta renda que se encontram infringindo as leis. No caso dos

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assentamentos populares, os moradores foram obrigados a viver num bairro irregular por falta de alternativa legal de moradia. Nos demais, houve a opção por construir suas casas nos loteamentos e condomínios irregulares, apesar de possuírem condições econômico-financeiras de adquirir uma residência legalizada. A regularização fundiária de interesse social aplica-se aos assentamentos ocupados predominantemente por população de baixa renda, nas situações em que exista o reconhecimento legal ou administrativo do direito à moradia. Assim, as ocupações devem atender a, pelo menos, uma das seguintes condições: preencher os requisitos para usucapião ou concessão de uso especial para fins de moradia; situar-se em Zonas Especiais de Interesse Social - ZEIS; ou ser declarada de interesse para a implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social, nos casos de áreas da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios. A Lei nº 11.977/2009 criou instrumentos e mecanismos específicos para a regularização fundiária de interesse social, com o objetivo de facilitar a concretização do direito à moradia. São eles: demarcação urbanística, legitimação de posse e a regularização fundiária em Áreas de Preservação Permanente – APP’s Para que essa Lei se concretize é imprescindível a participação de todos agentes nela especificados, sobretudo os municípios, por intermédio das prefeituras municipais que, com a Lei, passam a ter maior autonomia e novos mecanismos para enfrentar o crítico quadro da irregularidade em áreas de sua circunscrição. É importante destacar que a promoção de ações de regularização fundiária, entendida de forma ampla, tem por objetivos modificar de forma gradativa e contínua a realidade desigual de nossas cidades. Para vencer essa luta são necessários esforços articulados de todos os agentes elencados na mencionada lei e também de todos os Estados da Federação. Depende ainda da compreensão do conjunto da sociedade civil, visando à construção de cidades mais justas e mais humanas.


Os assentamentos apresentam normalmente dois tipos de irregularidade fundiária: irregularidade dominial, quando o possuidor ocupa uma terra pública ou privada, sem qualquer título que lhe dê garantia jurídica sobre essa posse; e, urbanística e ambiental, quando o parcelamento não atende à legislação urbanística e ambiental e não fora devidamente licenciado. A efetiva integração à cidade requer o enfrentamento de todas essas questões, por isso a regularização envolve um conjunto de medidas. Além disso, quando se trata de assentamentos de população de baixa renda, são necessárias também medidas sociais, de forma a buscar a inserção plena das pessoas na urbe. A regularização fundiária é também um instrumento para promoção da cidadania, devendo ser articulada com outras políticas públicas.

Nessa perspectiva, para orientar a utilização desse instrumento, a Lei nº 11.977/2009 estabeleceu importantes princípios em seu artigo 48. A moradia digna e o titulo de posse traduzem além de garantia constitucional, outros benefícios, mormente para as pessoas de baixa renda, que podem dar seus imóveis, devidamente registrados, como garantia, fomentando dessa forma, a circulação da riqueza. Diante destas modestas notas podemos concluir que o Ofício de Imóveis é um importante agente para a concretização do instituto ora discutido, juntamente com os poderes públicos e a sociedade. Vale mencionar que a contribuição social do registrador no processo de regularização fundiária é bastante valiosa, uma vez que não há a cobrança de emolumentos no primeiro registro.

“Só é dono quem registra”. Oficial Registrador: FRANCISCO DE SALES ALCÂNTARA PASSOS, aprovado no último Concurso Público de Provas e Títulos realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. Bacharel em Direito, com Especialização em Direito Público, possui também experiência em Cartório de Notas e Registros, desempenhando a função de notário e registrador por 14 anos.

O 6º. Ofício de Registro de Imóveis encontra-se funcionando em novo endereço: Avenida Santos Dumont, 3060 – loja 01- Aldeota Fortaleza-CE - Tel: (85) 3244.2604 - 3244.7686

Para sua segurança, sempre que realizar qualquer transação envolvendo imóveis, procure o cartório imobiliário.

6° Ofício de Registro de Imóveis Av. Santos Dumont, 3060 - Lj. 01 - Aldeota - Fortaleza-CE - CEP. 60150-161

Tel: (85) 3244.2604 - 3244.7686


MATÉRIA - CURA GAY

CURA GAY A DISCUSSÃO CONTINUA No dia 06 de junho de 2011, o Deputado João Campos (PSDB/GO), Líder da Frente Parlamentar Evangélica, apresentou Projeto de Decreto Legislativo (PDC 234/2011) ao Plenário da Câmara dos Deputados em Brasília, que vulgarmente popularizou-se com o nome “Cura Gay”. O PDC 234/2011 objetivava sustar a aplicação do parágrafo único do art. 3º e o art. 4º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 01/1999, que estabelece normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual. Tais dispositivos apresentam o seguinte teor:

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Art. 3° Os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades. Art. 4° Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica.

Depois de muita polêmica e discussões acirradas, em 02/07/2013, mesmo após a sua aprovação junto à Comissão de Direitos Humanos e Minorias – CDHM foi requerida a sua retirada de tramitação do PDC 234/2011 na Câmara dos Deputados. Contudo o Deputado Pastor Marco Feliciano declarou publicamente em seu twitter que “o PDC não foi ARQUIVADO, mas RETIRADO. E voltará na próxima legislatura, quando teremos um número maior de deputados evangélicos”. Como se vê, a polêmica não acaba por aqui. O ponto final foi colocado em apenas mais um capítulo. Espera-se, contudo, que os debates se-


jam travados democraticamente em respeito ao Estado laico. Diante da mobilização da sociedade em torno dessa questão, a Revista CAFÉ & JUSTIÇA traz aos seus leitores o posicionamento de importantes membros da sociedade cearense sobre o tema. A Comissão de Combate à Homofobia e Proteção da Diversidade Sexual da OAB/CE, instada a manifestar-se pelo Vice-Presidente daquela Seccional, Ricardo Bacelar, proferiu parecer junto ao Pleno em 25/06/2013, mediante sustentação oral por sua Presidenta, Olívia Pinto, que opinou pelo arquivamento do Projeto, esclarecendo que: “Buscou-se expressamente afastar a cura e tratamento para o que não é doença, mas tão somente um modo de ser. O fato do psicólogo ser impedido de oferecer “cura” ou “tratamento” para a homossexualidade, não o impede, outrossim, de verificar a melhor abordagem a ser utilizada com o objetivo de que o paciente alcance sua felicidade e livre-se de eventual orientação egodistônica (atração sexual fora de sintonia com o “eu”), sem, contudo, “curar” ou “tratar” a sua orientação sexual – seja heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade ou outra –, mas colaborar para que o paciente viva em paz consigo próprio. Ainda, a Resolução 01/1999 não “impede psicólogos de ir e vir”, tampouco os “amordaça” (...). No exercício da profissão, o indivíduo deve ser responsável pelo que faz e diz, mantendo conduta ética conforme o preceituado em seu respectivo Código de Ética Profissional, sem afrontar o previsto na Constituição Federal, tampouco direitos e garantias fundamentais. A Resolução 01/1999 apenas explicitou conduta que implicitamente já se opunha ao Código de Ética do Psicólogo, bem como à Constituição. Afinal, “colaborar com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades” e “pronunciar-se ou participar de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação em massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem” afronta terminantemente os arts. 1º, III; 3º, IV; 5º da CF/88, bem como ao previsto no Código de Ética Profissional do Psicólogo. Na realidade, é imprescindível questionar-se sobre “o que esta por trás” de tal proposta de decreto legislativo. Concluindo-se pela manifesta tentativa

OPINIÃO Por Manoela Queiroz Bacelar

Vandalismo de um pastor Debalde tempos entorpecidos pelo histórico ópio esportivo, eclodem mobilizações populares a cada dia no Brasil. Embora, ainda, sem contornos precisos, o movimento parece revelar uma dualidade. Uma dialética traduzida na tensão entre a grande massa pacífica contraposta a pontuais episódios de vandalismo. Um diálogo que alterna vozes contra a corrupção e em favor de educação de qualidade; contra os gastos com a Copa do Mundo e em favor da eficácia no sistema de saúde; contra a massacrante carga tributária e em favor de mais segurança pública, contra o transporte público deficitário e em favor de políticas urbanas eficientes. Um diálogo ecoado, até o momento, entre muitas flores e poucas balas. Contudo, enquanto gritavam as ruas, um silêncio ruidoso imperava na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM/CD). Com contornos precisos e sem diálogo, o silêncio foi orquestrado pelo homem errado no lugar errado. Um homem inapto para pensar políticas públicas, distribuir direitos e compreender a expressão “direitos humanos e minorias”. Um homem chamado Marco, auxiliado por outro chamado João, representantes legítimos do preconceito forjado em ideologias partidárias inconfessáveis. Em sessão de quórum duvidoso e intenções antijurídicas, o Poder Público desautorizado a aliarse a doutrinas religiosas no Estado laico aprovou o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 234/2011, visando (des)orientar o exercício profissional dos psicólogos nas questões de orientação sexual. O malsinado projeto susta a aplicabilidade dos arts. 3º e 4º da Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia, regra respaldada pela Organização Mundial da Saúde, que reforça a não patologização da homossexualidade. A equivocada justificativa do projeto da CDHM/CD seria o transbordamento do poder regulamentar do Conselho Federal de Psicologia. No rol de males passíveis de tratamento psicológico estão distúrbios, transtornos, perturbações e disfunções, como neuroses, paranóias, fobias, inclusive homofobias (que ironia!). A homoafetividade, a homossexualidade ou as práticas homoeróticas não figuram em qualquer lista de doenças porque não constituem doenças, distúrbios, transtornos, perturbações, disfunções, nem perversões, na letra da Resolução do 01/99. A atribuição de identificar desequilíbrios mentais ou emocionais pertence à comunidade científica e não a pastores ou deputados. O exercício profissional dos psicólogos regula-se pelo Conselho Federal de Psicologia. A Resolução 01/99 tem linha ética humanista, valorizando o bem-estar do indivíduo, bem jurídico protegido constitucionalmente, traduzido na dignidade da pessoa humana. Não há sinal de exorbitância do poder regulamentar no texto da Resolução 01/99. Aconteceu o que se temia quando da nomeação do presidente da CDHM/CD: o seqüestro de direitos humanos de minorias por quem tem o dever funcional de salvaguardá-los. E mais, utilizando a longa manus do poder estatal para manipular psicólogos, que certamente não se farão instrumento de Marco, nem de João. O não à discriminação, o não aos estigmas e o não às falsas terapêuticas são pilares louváveis a disciplinar a conduta profissional dos psicólogos. O Supremo Tribunal Federal, como Hermes a decifrar a mensagem sagrada, acolhe a condição homoafetiva como legítima e provida de direitos. O Estado não deve retroceder. Que o preconceito do PDC 234/2011 não prospere. Que Marco, João e demais integrantes da CDHM/CD repensem seu papel na democracia brasileira. Em nome do direito de ser e de amar. CAFÉ & JUSTIÇA

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MATÉRIA - CURA GAY

POR QUE “CURA GAY”? Conhecido vulgarmente por “cura gay”, a nomenclatura fantasiosa do PDC 234/2011 justifica-se pela possibilidade de, ao serem sustados dispositivos da Resolução 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia, os quais proíbem, em especial, a colaboração de psicólogos em eventos e serviços que proponham tratamento e cura da homossexualidade, os psicólogos possam passar a “curar e tratar” pacientes homossexuais em razão de sua orientação sexual.

de afronta ao Estado laico brasileiro e ao respeito à diversidade e orientação sexuais, razão pela qual tal Projeto não deve prosperar.” A Chefe da Coordenadoria de Direitos Humanos do Estado do Ceará, Michele Camelo, entende que “o sofrimento de muitos homossexuais vem justamente da falta de compreensão de sua condição humana e qualquer atitude que venha a aproximá-la de qualquer distúrbio, sé é capaz de potencializar o preconceito, a sofrimento humano e a discriminação. É evidente que é possível procurar psicólogo para lidar com a sexualidade, seja ela homo ou heterossexual. Entender e lidar (ou mesmo descobrir) é completamente diferente de cura ou tratamento. A igualdade de gênero, mostra a dor e o equívoco de atitudes dessa natureza. É preciso repetir os erros? Ademais, o que justificaria a construção, por leigos, de matéria técnica, interferindo em decisões técnicas de conselho profissional? Estamos em tempo de dissipar e não de alimentar preconceitos ou discriminações. Amor e dignidade estão - ou devem estar - presentes em cada ser humano e independe completamente de sua orientação sexual”. Na qualidade de psicólogo, bem como de Conselheiro e Coordenador da Comissão de Sáude do Conselho Regional de Psicologia da 11ª Região (CRP11), Theófilo Gravinis, reafirma o posicionamento do CRP11 contra o PDC nº 234/2011, uma vez que pugnam pela defesa dos direitos da População LGBT e condução de ações que garantam a laicidade do Estado brasileiro, opondo-se a qualquer documento ou ação que reforce preconceitos sociais em relação a homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica. O Psicólogo e Padre Joaquim Colaço Dourado também entende não haver que se falar em cura, uma vez que a homossexualidade não é doença, mas sim uma condição de determinadas pessoas, que não devem ser excluídas em razão de sua orientação sexual. Procurado pela Café & Justiça por reconhecidamente lutar pela causa LGBT, o Vereador Guilherme Sampaio (PT/CE), pronunciou-se: Você já imaginou o que pensaria se um profissional, um plano de saúde ou um governo disponibilizasse entre o leque de serviços prestados ao seu público um tratamento voltado à cura de homens que apresentassem o sintoma de sentir afeto e desejo por mulheres ou de mulheres que se queixassem de sentir atraídas por homens?

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Provavelmente, você, como eu, consideraria isso um absurdo, passível de punição por órgãos como conselhos de ética ou outros do gênero. Uso esse exemplo extremo para colocar luz sobre o sentido da atual discussão sobre a “cura gay”, em andamento no Congresso Nacional. Já há varias décadas, a Organização Mundial de Saúde, fundamentada no conhecimento científico e nas concepções mundialmente consagradas sobre o que se constituiu como direito humano, definiu claramente que a homossexualidade não constitui uma doença, logo não requer tratamento.Essa compreensão, consolidada pela ciência e pelos princípios éticos universais, enxerga a orientação sexual como um aspecto da subjetividade humana que compõe a personalidade do sujeito. Se há um sintoma universal de saúde mental de alguém, esse deve ser a sua capacidade de amar e expressar afeto, construída a partir dessa subjetividade. Retirar essa perspectiva das Resoluções que orientam a conduta profissional dos psicólogos, como propôs o projeto de lei 234/11, ou qualquer outra legislação que vise rotular como doença essa saudável e livre manifestação de saúde pelo simples fato de ser expressa em relação a pessoas do mesmo sexo deve ser vista como retrocesso científico e grave ofensa aos direitos humanos. Por sua vez, a Deputada Estadual Silvana Oliveira (PMDB/CE) posicionou-se publicamente no Canal 30 – TV Assembléia contra o PDC nº 234/2011. Instada a manifestar-se, a mesma

esclareceu que “ao posicionar-me acerca de determinados assuntos estou exercendo meu direito constitucional de liberdade de pensamento e expressão. O que me é vedado, por uma questão de consciência, é atacar e denegrir a dignidade das pessoas. Sendo assim, quando me refiro que ser homossexual é uma questão de comportamento e escolha do ser humano, está implícita a possibilidade de arrependimento, e, neste caso, todos têm liberdade de reestruturar seu caminho de acordo com suas escolhas. Nessa perspectiva, não há um profissional mais adequado para auxiliar alguém nessa situação do que o psicólogo, já que este trata de fenômenos comportamentais. Em face do que exponho, é que me posiciono a favor da aprovação do PDC 234/11, que foi falsamente apelidado de ‘cura gay’. No texto do referido projeto não há esta expressão e nem deixa transparecer tal ideia. O PDC mantém a primeira parte do art. 3º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia, determinando que os psicólogos não exerçam qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homossexuais. A proposta é sustar o parágrafo único do art. 3º que afirma que os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham o tratamento e cura, por não se tratar de doença, como também o art. 4º que proíbe a liberdade de expressão dos psicólogos. O que está sendo sustada é a tentativa de amordaçar a liberdade de expressão e pensamento desses profissionais. Chamar essa iniciativa de ‘cura gay’ é um delírio autoritário”.

HOMOSSEXUALISMO versus HOMOSSEXUALIDADE A Resolução 01/1999 foi editada pelo Conselho Federal de Psicologia, buscando adequar-se ao decidido na Assembleia Mundial de Saúde, que em 1990 afastou da Classificação Internacional de Doenças o homossexualismo como doença mental, previsto no código 302 do CID-09. Nesse sentido, o Conselho Federal de Psicologia, disciplinou a atuação dos psicólogos em manifesta preocupação daquele Conselho em evitar que profissionais psicólogos atuem em prejuízo do respeito à diversidade sexual. Com a publicação do CID-10 pela Organização Mundial de Saúde – OMS, passa-se a utilizar nomenclatura adequada, qual seja, homossexualidade, indicando, portanto, um “modo de ser” e afastando qualquer enquadramento de tal comportamento em face da orientação sexual como doença. O Conselho Federal de Medicina, por sua vez, tornou sem efeito, ainda no ano de 1985, o código 302 do CID-09, afastando a homossexualidade como transtorno ou desvio sexual.

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MATÉRIA - IMPORTAÇÃO DE MÉDICOS

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O BRASIL PRECISA IMPORTAR MÉDICOS? Após o pronunciamento do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o governo Federal vem defendendo a vinda de 6.000 (seis mil) médicos estrangeiros, notadamente cubanos, para trabalhar no interior do Brasil, onde hoje não há atendimento médico e onde, segundo argumentos governamentais “os médicos do país não querem trabalhar”. Em oposição à medida pretendida pelo Governo federal, insurgiram-se o Conselho Federal de Medicina – CFM, a Federação Nacional dos Médicos – FENAM, a Associação Médica Brasileira – AMB e a Associação Nacional dos Médicos Residentes – ANMR, tendo o CFM classificado a proposta como “eleitoreira, irresponsável e despeitosa” . Em defesa desse recebimento no Brasil de 6.000 médicos estrangeiros aduzem, os articuladores do convênio, que essa seria uma atitude muito mais do que corporativista e que estaria sendo hostilizada apenas pala elite da classe médica, temerosa de ser comparada aos êxitos do modelo adotado em Cuba, que prioriza a prevenção e a educação para a saúde. Considerando o fato de que os argumentos governamentais são diariamente veiculados na imprensa nacional, a CAFÉ & JUSTIÇA, sempre aberta ao enfrentamento de questões polêmicas no Brasil, oferece aos seus leitores posicionamentos médicos e legais oferecidos pelos doutores: Ricardo César Vieira Madeiro (Presidente da Comissão de Saúde da OAB-CE), Ricardo Madeiro (Presidente da Comissão de Saúde da OAB-Ce), José Carlos Pompeu (médico e professor da Uni-

versidade de Fortaleza) e Pedro José Negreiros de Andrade (médico e professor da Universidade Federal do ceará), objetivando dota-los de elementos que possam efetivamente ajudá-los na formação de um convencimento próprio. COMISSÃO DE SAUDE DA OAB-CE Ricardo C. V. Madeiro Médico, Advogado e Presidente da Comissão de Saúde da OAB-CE. O Governo brasileiro, ao longo do tempo, tem assistido na mais completa inércia, a decadência da saúde pública em todos os Estados Brasileiros. A comissão de Saúde da OAB-CE tem feito visitações aos hospitais de atenção secundária e terciária do estado do Ceará, em sua capital e nas três macrorregiões. Fora realizada análise da assistência, na atenção primária de saúde, através de visitação a 33% das unidades básicas de saúde no município de Fortaleza. Na apreciação da situação da saúde pública no estado do Ceará, foi levada em consideração a estrutura física, o material/equipamento, medicamentos e recursos humanos. Constatou-se em resumo que a demanda de pacientes é muito maior

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MATÉRIA - IMPORTAÇÃO DE MÉDICOS

do que a oferta de leitos, materiais hospitalares e equipamentos, o que implica urgência de políticas públicas voltadas para a saúde. A realidade da saúde no estado do Ceará, nada mais é do que um espelho da situação do país. A Presidente Dilma Rousseff, em pronunciamento oficial, defendeu a contratação de 6.000 (seis mil) médicos estrangeiros para atuarem em locais onde não há disponibilidade de médicos brasileiros. Manifestamos nosso entendimento, em consonância com o juízo defendido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), esposando a opinião de que tais contratações devam ser vistas com cautela. A uma porque nossa Constituição Federal, embora afirme no capítulo que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, faz restrição quando se trata do exercício profissional. Estabelece no artigo 5º XIII que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Isso significa que algumas profissões podem ser exercidas sem dificuldades quanto às

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questões formais, não exigindo qualquer documentação ou diploma oficial, são as chamadas profissões livres, cujo exercício não depende de autorização legal, bastando o suficiente conhecimento técnico respectivo. Já para outras profissões, a exemplos do contador, advogado, médico e engenheiro, todas criadas e regulamentadas por legislação federal, a situação é diferente. Esta liberdade, para ser exercida, carece de alguns pré-requisitos, especialmente por se tratarem de profissões legalmente regulamentadas. Para estes profissionais, não basta aprender ou ter habilidade de fato para desempenhar um determinado trabalho. É imprescindível que se conquiste o direito de exercer tais atividades através da formação acadêmica e do registro do diploma no respectivo Conselho ou Órgão Fiscalizador da Profissão; em outras palavras, temos que atender às qualificações profissionais que a lei específica estabelecer. Assim leciona, com propriedade, Genival Veloso de França, em Comentários ao Código de Ética Médica, 6º edição, onde afirma que “Para se exercer a profissão médica no Brasil, exige-se uma dupla forma de habilitação: a profissional e a legal. A habilitação profissional adquire-se nas escolas médicas autorizadas ou reconhecidas pelo Ministério da Educação, após a conclusão de uma carga horária estabelecida em um currículo mínimo. A habilitação legal conclui-se pelo registro de médico nos Conselhos Regionais de

Medicina, sob cuja jurisdição se achar o local de sua atividade, como recomendam o artigo 17 da Lei nº 3268/57, e o artigo 1º do Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958. Assim, a licença para o exercício da Medicina é uma ato exclusivo da autoridade do Estado.” O Ministério da Educação dispõe acerca das exigências e grades curriculares a serem cumpridas pelos graduandos nas Universidades Brasileiras. Entretanto, os diplomas obtidos em universidades estrangeiras deverão ser revalidados nos termos da Lei nº 9.394/96 (Lei de diretrizes e bases da educação nacional). Reza o art. 48, §2º da referida Lei que “Os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação.” A portaria interministerial nº 278, expedida em 2007, dispõe sobre o exame de revalidação dos diplomas concedidos por universidades estrangeiras, a fim de autorizar o exercício da medicina, dentro do território nacional, por profissionais graduados no exterior, dispondo em seu art. 2º que “O Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos expedidos por universidades estrangeiras, de que trata esta Portaria Interministerial, tem por objetivo verificar a aquisição de conhecimentos, habilidades e competências requeridas para o exercício profissional adequado aos princípios e necessidades do Sistema Único


de Saúde (SUS), em nível equivalente ao exigido dos médicos formados no Brasil.” A lei nº 3.268/57, em seu art. 2º, reza que “O conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina são os órgãos supervisores da ética profissional em toda a República e ao mesmo tempo, julgadores e disciplinadores da classe médica, cabendo-lhes zelar e trabalhar por todos os meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético da medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos que a exerçam legalmente” restando claro que cabe ao Conselho Federal de Medicina a regulamentação da profissão médica. Em respeito à Lei, O Conselho Federal de Medicina em sessão plenária de 17 de setembro de 2009, aprovou o Código de Ética Médica através da Resolução CFM 1931/2009 (revogando a Resolução 1246/88). O Código de Ética Médica estabelece em seu Preâmbulo que as normas nele contidas devam ser seguidas pelos médicos no exercício de sua profissão, inclusive no exercício de atividades relativas ao ensino, à pesquisa e à administração de serviços de saúde, bem como no exercício de quaisquer outras atividades em que se utilize o conhecimento advindo do estudo da Medicina. Estabelece no inciso III que: Para o exercício da Medicina impõe-se a inscrição no Conselho Regional do respectivo Estado, Território ou Distrito Federal. Compreendemos que as dificuldades no setor de saúde no Brasil envolvem questões bastante

complexas, igualmente relevantes, que estão além da necessidade de contratação de novos profissionais para atuarem em áreas onde existe déficit. Ademais, verifica-se, em verdade que há um gritante sucateamento da estrutura física dos equipamentos de saúde pública, que carecem de políticas mais eficazes que reflitam no fornecimento de mais leitos hospitalares, na disponibilização de materiais e equipamentos e em uma fiscalização mais rigorosa do dinheiro público

investido nessa área. Porque é óbvio que saúde não se faz apenas com profissionais. Entretanto, apesar de não estarmos muito aquém no que se refere ao número de médicos no Estado Brasileiro, conforme dados divulgados pelo CFM e pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo, que mostram que no fim do ano passado, em termos absolutos, o Brasil é o quinto país do mundo com o maior número de médicos, há uma desproporcionalidade no que se refere à distribuição entre as regiões Brasileiras. CAFÉ & JUSTIÇA

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MATÉRIA - IMPORTAÇÃO DE MÉDICOS

Nesse aspecto, mesmo discordando da política, que nitidamente busca mão de obra barata à custa da desvalorização do profissional nacional, trazer estrangeiros poderia minorar essa diferença entre as regiões, o que não resolveria o problema estrutural da saúde pública. Contudo, estes médicos deverão se submeter obrigatoriamente ao exame de revalidação do diploma, em observância aos ditames legais. No entanto, outro entrave, tão importante quanto, diz respeito às normas de direito administrativo. Porque uma coisa é revalidar diplomas de profissionais estrangeiros, a fim de que estes exerçam particularmente, dentro do território nacional a medicina. Outra bem diferente é possibilitar que estes profissionais exercem cargos públicos ao arrepio das disposições constitucionais acerca do funcionalismo público. Nossa Constituição Federal, no Capítulo concernente à Administração Pública estabelece em seu art. 37, inciso II, que “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação pré-

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via em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.” Os princípios dispostos no artigo 37 da CF/88 são os postulados fundamentais que inspiram todo o modo de agir da administração pública, e devem nortear a conduta do Estado. Para que o ingresso dos médicos estrangeiros (neste caso, cubanos) não fira os preceitos de legalidade e moralidade expressos na Constituição Federal, é preciso que, primeiramente, o governo brasileiro ofereça as vagas existentes para os médicos que já atuam no Brasil, através de concurso público. Se, com tais medidas, o País ainda continuar com os vazios assistenciais, comprovando o desinteresse pelo preenchimento desses postos de trabalho, aí sim surgiria a possibilidade de contratações temporárias, em virtude da necessidade do serviço.

Compartilhamos da opinião expressada pelo CFM ao se manifestar a favor da convocação de médicos brasileiros, por meio de concurso público, com oferta de condições de trabalho e com “remuneração compatível com a responsabilidade assumida”. No entanto, para a entidade, simultaneamente deverá ser construída uma carreira de Estado no Sistema Único de Saúde para médicos e outros profissionais da saúde. Por todo o exposto, entendemos que é a contratação de médicos estrangeiros sem a revalidação de seus diplomas não encontra amparo na legislação brasileira vigente. Além disso, seria uma afronta a nossa constituição importar médicos para ocuparem vagas de empregos públicos que deveriam ser preenchidos por profissionais nacionais mediante concurso público e remuneração condizente com a importância do serviço prestado, sem jamais olvidar que se trata de profissional que cuida do bem mais precioso da vida, que é a própria vida.


OPINIÃO Pedro José Negreiros de Andrade, Médico do Hospital de Messejana Professor da Universidade Federal do Ceará. São quatro os argumentos do Ministro Alexandre Padilha ( saúde) para justificar a necessidade de importação de médicos estrangeiros: a) faltam médicos no Brasil b) as prefeituras do interior tem dificuldade de contratar médicos, mesmo pagando bem; c) muitos países do mundo importam médicos, como é o caso dos EEUU, da Inglaterra, do Canadá; d) não haveria problemas no que toca à capacitação, pois a atuação desses médicos seria restrita à rede básica. Vamos responder a esses argumentos, um a um: a) Não há falta de médicos no Brasil. Temos atualmente 360000 médicos em atividade, em torno de um para 500 habitantes ( a OMS defenede um médico para cada 1000 habitantes). Além disso, 16000 médicos se formam anualmente no Brasil, um numero que dobrou em 10 anos . b) Calote, ausência de proteções trabalhistas e de carreira , condições de trabalho são a explicação para a falta de médicos no interior. O Sindicato dos médicos do Ceará tem 137 ações na justiça contra prefeituras que deram calote em médicos. Essas ações envolvem mais de mil profissionais. c) Em todos os países do mundo médicos estrangeiros são submetidos a algum tipo de revalidação, que envolve, basicamente, currículo similar, domínio da língua e conhecimento médico. No caso do Brasil as regras foram estabelecidas pelo próprio governo e envolvem um processo chamado REVALIDA d) Atender na área básica, ser um bom generalista é algo tão ou mais difícil do que ser um bom especialista. Não pode haver dois tipos de medicina: uma urbana, para a classe média e outra rural ou em periferias, para os pobres. Ainda que haja graves distorções sob este aspecto a culpa é do governo, não dos médicos. O Brasil tem assistido nos últimos anos um grande aumento do numero de médicos aliado a uma redução dos investimentos governamentais e de leitos do SUS, o que contribui para o atual caos nos hospitais públicos, com doentes sendo atendidos em macas, ou mesmo no chão. O pro-

blema não é pois de falta de médicos, mas sim de recursos. Não faltam médicos, faltam leitos (nas nossas emergências os doentes estão sneod atnedidos em macas ou mesmo no chão), faltam exames, faltam medicamentos, e falta, principalmente, resolutividade e organização da nossa saúde publica. Mas independente de todos esses argumentos alguns questionamentos jurídicos necessitam ser levantados: a) Existe uma instituição no Brasil que regula o exercício da medicina: o Conselho Federal de Medicina. Não se trata de um sindicato, mas sim de uma autarquia que regula e fiscaliza o exercício legal da medicina, defendendo sobretudo o interesse da população. O exercício da Medicina no Brasil requer, basicamente, que o profissional esteja registrado no CFM. E isso exige que tenha diploma de Médico por Instituição Brasileira, e que, caso formado em instituição estrangeira, seu diploma tenha sido revalidado pelo Ministério da Educação. Passar por cima dessa instituição é passar por cima da lei. b) No que toca especificamente a médicos cubanos (apenas pelo fato da polêmica ter sido deflagrada por declarações do Ministro Antonio Patriota, em maio deste ano, referentes a um um acordo entre os dois governos) cabe lembrar que em países como a Venezuela, Nicarágua e Bolívia, os médicos cubanos trabalham recebendo um valor mínimo, sendo o grosso do seu salário enviado a Havana, que tem no seu trabalho “abnegado” uma das principal fontes de divisas. Não consta que suas esposas e filhos venham com eles, nem muito menos que recebam diretamente dos governos bolivarianos. Do ponto de vista humanitário isso nos parece inaceitável, por ter características que lembram o trabalho escravo. Já ponto de vista jurídico advogados seriam as pessoas mais adequadas a opinar. OPINIÃO Jose Carlos Pompeu, Professor da Universidade de Fortaleza, Médico do Hospital de Messsejana O Ministro Alexandre Padilha, da Saúde, defendeu a decisão do governo de atrair médicos estrangeiros para suprir a demanda pública em algumas regiões brasileiras. Essa é uma daquelas histórias que quanto mais se remexe mais cheira mal. Cada emenda do governo sai pior que o soneto. Quanto mais o Governo explica, fica pior. Senão vejamos:

Segundo o Ministro, “esses profissionais só poderão atuar na atenção básica, ou seja, não poderão realizar procedimentos mais complexos, como cirurgias.” E por acaso, seria a atenção básica questão de somenos importância, menos complexa que os procedimentos cirúrgicos? Vejam que absurdo, o mais estratégico dos níveis de atendimento, a atenção básica, é vista como algo banal pelo ministro. Quem entende um mínimo de planejamento em Saúde Pública, sabe que é justamente a atenção básica, o nível mais vital para que um Sistema de Saúde funcione a contento. É justamente na atenção básica que deveriam estar os melhores profissionais, os mais capacitados, os mais especializados, pois dela dependem os resultados a serem alcançados em todos os níveis de atenção à Saúde. Outra pérola do Ministro: “Além disso, ele (médico estrangeiro) não pode exercer medicina em clínica privada ou em outra região”. Aí eu pergunto, por que mesmo? Como Nação, admitirmos isto, seria a oficialização para a população brasileira de que há 02 tipos de cidadão: o rico, urbano, frequentador de bairros nobres e clínicas particulares, que deve ser atendido por um médico preparado; e o pobre, dos rincões, que será atendido por médicos “meia boca” que deverão realizar atendimentos restritos à mais “banal” das especialidades médicas: isso mesmo, pasmem, a Clínica Médica! E mais... com a ressalva de que estes médicos não poderão, sob hipótese alguma, ousar cuidar dos mais aquinhoados, sob pena de serem punidos nos termos da lei. Tais médicos são destinados apenas aos segregados do semi-árido e das porções remotas da floresta que sequer necessitam da Língua Portuguesa para se expressar, compreender e se fazer entender. Afinal, segundo a experiência do ministro como coordenador de um grupo de medicina tropical no interior do Pará: “Às vezes era mais difícil para um médico brasileiro entender a linguagem do caboclo do que para o estrangeiro”. Como médicos, aceitarmos esta possibilidade seria a explicitação de que queremos praticar a reserva de mercado, quando definitivamente este não é o caso. Nossa luta é por uma saúde universal e de qualidade! Se colegas vêm para cá, ótimo. Defendemos que podem e devem desempenhar a Medicina de forma plena e indistinta em todos os locais, inclusive em hospitais como os conceituados Albert Einstein e Sírio Libanês. Afinal, o que é bom, deve ser compartilhado por TODOS!

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ARTIGO - Bruna Brasileiro

O NOVO INIMIGO DA CORRUPÇÃO

NO SETOR PÚBLICO

“E, mais uma vez, a história se repete...” é provavelmente o sentimento mais comum entre os cidadãos brasileiros ao se depararem com as (sempre tão presentes) notícias sobre corrupção, improbidade e suborno que assolam os entes governamentais do País. Entretanto, duas indagações bem menos frequentes, mas igualmente relevantes, são colocadas em questão: afinal, quem financia a corrupção e quais as medidas efetivas contra tais financiadores?

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Decerto não são os US$ 3,5 bi correspondentes à perda da produtividade provocada por fraudes públicas no Brasil , tampouco os milhões de dólares que deixam de ser investidos na economia brasileira em virtude da latente situação de incertezas financeiras e políticas. O custeio da maior porção que sustenta o calamitoso status de país corrupto advém de bolsos bem mais próximos do cidadão comum. Usualmente, a imprensa veicula escândalos envolvendo órgãos políticos, repartições públicas,


Bruna Brasileiro Advogada

empresários e pessoas jurídicas dos mais diversos setores, sempre associando-os aos mesmos denominadores comuns: venalidade, imoralidade e favorecimento. E é no âmbito das contratações públicas que tais adjetivos se fazem ainda mais notórios.

provação de intenção dos dirigentes ou donos de empresas em causar lesões ao erário, assim como dispensa o concreto auferimento de vantagens e benefícios gerados pelo ato ilícito, cominando a aplicação de multas que podem variar de 0,1% até 20% do faturamento bruto da empresa.

A Lei n.º 8.666, de 1993, mais conhecida como Lei de Licitações e Contratos Públicos, foi editada com o escopo de regulamentar os procedimentos licitatórios e a gestão da contratação pública, afastando as malsinadas práticas de burla ao caráter competitivo do certame e enriquecimento indevido, quer fossem da Administração ou do particular contratado.

No âmbito civil, o Projeto de Lei em tramitação prevê, ainda, a possibilidade de perdimento dos bens, dissolução compulsória da pessoa jurídica, suspensão de suas atividades, além da vedação de recebimento de quaisquer vantagens atribuídas pelo governo, tais como subvenções, incentivos ou subsídios, devendo haver, em todos os casos, a absoluta reparação às lesões geradas.

Referida legislação de regência trouxe, ainda, previsões de cunho penal para os crimes de fraude, desvio de finalidade, aferimento de vantagens indevidas e danos aos cofres públicos, contemplando penas que podem variar de multa a até 5 anos de detenção, para os agentes públicos e privados envolvidos.

“o Projeto de Lei em tramitação prevê, ainda, a possibilidade de perdimento dos bens, dissolução compulsória da pessoa jurídica, suspensão de suas atividades, além da vedação de recebimento de quaisquer vantagens atribuídas pelo governo”

Contudo, isoladamente, tal normativo não contém instrumentos suficientes e aptos a promover a responsabilização administrativa, civil e econômica das pessoas jurídicas envolvidas em atos contra a Administração Pública. Nesse cenário, nasceu o Projeto de Lei n.º 6.826/2010, aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, no último dia 11 de julho, o qual prevê a responsabilização de empresas por crimes praticados em face do setor público. A nova lei, que aguarda a sanção da Presidente Dilma Rousseff, torna prescindível a com-

Não obstante tais imposições rechaçarem ao máximo a prática de atos de corrupção e suborno, a nova lei garantirá tratamento diferenciado, em relação às sanções que serão aplicadas àquelas empresas que se esforçam para, igualmente, combater as malfadadas práticas, distinguindo-as daquelas que, por ação positiva ou negligência, concorreram para tais fatos. Por fim, importa consignar que a nova lei contempla, ainda, a celebração de “acordos de leniência”, oportunidade em que as empresas que colaborarem substancialmente nas investigações das irregularidades poderão ser isentadas de algumas penas e ter as respectivas multas reduzidas. Assim é que a expectativa lógica a que se chega, se é que cabe alguma logicidade na esperança, é que o Brasil caminha no sentido de que, talvez, nem tudo “acabe em pizza”. CAFÉ & JUSTIÇA

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CONFRATERNIZAÇÃO

COFFE BREAK JURÍDICO Em encontro festivo Café & Justiça recebeu colaboradores e amigos para evento gastronômico no restaurante Cantinho do Portuga, conhecido recanto da boa culinária lusitana no nosso estado. 01-Dra. Angela Sobreira e Dra. Isabel Oliveira • 02-Dr. Solom e o Dr. Augustino Chaves • 03-Dra. Gisele Albuquerque • 04-Dr. Abdias Junio Oliveira, Des. Dr. Carlos Fortes e a Dra. Isabel Oliveira • 05-Dr. Diego da Ponte Cunha • 06-Dr. Cid Peixoto Netto • 07-Dr. Jorge Di Ciero e o Dr. Abdias Junio Oliveira • 08-Dr. Flávio Luiz Peixoto e sua esposa Joselúcia • 09-Dra. Liliane Feitosa e o Dr. Paulo de Tarso Pires Nogueira • 10-Dr. Yuri Magalhães e sua esposa Ana • 11-Dra. Edna Noronha e a Dra. Fátima Loureiro • 12-Dra. Valdenisa Bernardo e seu marido Dr. Maciel • 13-Dra. Olivia Pinto, Dra. Valeska Rolim, Dra. Luciana Souza e a Dra. Anna Regina Magalhães • 14-Dr. Augustino Lima Chaves e sua esposa Odízia Chaves.

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ARTIGO - Gisele Gonçalves de Albuquerque

É também um desafio às relações patriarcais, no que tange ao poder dominante do homem e a manutenção dos seus privilégios de gênero, é uma mudança na dominação tradicional dos homens sobre as mulheres, garantindo a estas autonomia no que se refere ao controle dos seus corpos, da sua sexualidade, do seu direito de ir e vir, da liberdade de decidir e controlar seu próprio destino, com responsabilidade e respeito a si e ao outro. Não é novidade que a mulher contemporânea, cada vez mais, assume responsabilidades diversas. Essa mulher almeja cumprir as suas diversas funções na sociedade, contribuindo para o desenvolvimento social, sendo objeto do bem comum, exercendo cada vez mais o poder e desafiando as convenções em uma sociedade ainda predominantemente masculina.

PROTEÇÃO À GRAVIDEZ E À MATERNIDADE:

O EMPODERAMENTO FEMININO E A TUTELA JURÍDICA Empoderamento consiste na ação coletiva desenvolvida pelos indivíduos quando participam de espaços privilegiados de decisões, de consciência dos direitos sociais.

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O empoderamento feminino traz uma nova concepção de poder, assumindo formas democráticas, construindo novos mecanismos de responsabilidades coletivas e de tomada de decisões.

Considerando essa visível mudança social decorrente do empoderamento feminino, o direito não pôde ignorar que o novo papel da mulher na sociedade poderia conflitar com o fato de que esta está atrelada a uma função biológica vital: a reprodução, a concepção de uma nova vida. Por tais motivos, a legislação nacional, acertadamente, tutela a proteção à gravidez e à maternidade. Atualmente os três principais direitos garantidos à empregada gestante são: a garantia de emprego, a contar da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (estabilidade provisória da gestante); a licença maternidade de 120 dias, sem prejuízo do salário (art. 392 da CLT) e, por fim, a dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares. A estabilidade provisória da gestante consiste na vedação expressa da dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez, até cinco meses após o parto. O TST entende que a confirmação da gravidez refere-se à confirmação biológica da gestação e não a confirmação pelo empregador, ou seja, o desconhecimento pelo empregador do estado gravídico da empregada gestante não retira desta o direito à garantia de emprego, conforme entendimento jurisprudencial firmado na súmula Nº. 244 do Tribunal Superior do Trabalho - TST.


Entretanto, o ideal é que a empregada comunique, de forma documentada, ao empregador, seu estado gravídico a fim de evitar a ocorrência de dispensa imotivada fundamentada no eventual desconhecimento da gravidez. Em decorrência de recente alteração no entendimento do TST, ocorrida em setembro de 2012, observamos que atualmente o Tribunal Superior do Trabalho reconhece a estabilidade da gestante até mesmo durante o período de experiência, por se tratar de uma modalidade de contrato por prazo determinado, nos termos da nova redação da Súmula nº. 244 do TST. A redação anterior do item III, da Súmula nº. 244 do TST, previa expressamente que a empregada gestante não tinha direito à estabilidade provisória, nos casos de admissão mediante contrato de experiência. Dispunha o item supra mencionado: “III – Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa. (ex-OJ nº. 196 da SBDI-1 – inserida em 08.11.2000)” O cancelamento do item acima transcrito, deu-se em razão do entendimento de que as garantias à empregada gestante não devem ser limitadas em razão da natureza da modalidade contratual, bem como com fundamento na proteção ao nascituro, prevista na Constituição Federal. Após a alteração mencionada, assim passou a vigorar a nova redação da Súmula nº. 244 do TST: “GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 88 e 196 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 I – O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, “b” do ADCT). (ex-OJ nº 88 da SBDI-1 – DJ 16.04.2004 e republicada DJ 04.05.04) II – A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se

Gisele Gonçalves de Albuquerque

Advogada

aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. (ex-Súmula nº 244 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003) III – A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art.10, inciso II, alínea b, do ADCT, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.” Esta nova redação foi fundamentada, ainda, nos princípios da isonomia, da função social da empresa, da dignidade da pessoa humana e da proteção à maternidade. Já a licença maternidade consiste no período de afastamento da gestante do trabalho de, no mínimo, 120 dias, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e a ocorrência deste. Durante este período (120 dias) de afastamento, a mulher ficará recebendo o salário-maternidade, que é direito devido não apenas ás empregadas, mas a toda trabalhadora segurada junto à Previdência Social, e consiste na remuneração devida à gestante durante o período de afastamento, sendo pago e calculado da seguinte forma: - Para a empregada comum é pago diretamente pelo empregador e calculado no valor da sua remuneração mensal, sendo que o empregador procede à compensação contábil junto ao INSS. - Já para as empregadas com renda variável, o salário-maternidade será calculado pela média da remuneração dos últimos seis meses. - Para a contribuinte individual, profissional autônoma, o salário-maternidade será calculado com base em um 1/12 (doze avos) da soma dos doze

últimos salários-de-contribuição e será pago diretamente pelo INSS. Em qualquer hipótese, o benefício não pode ser inferior a um salário mínimo vigente. Se faz relevante observar que, nos casos em que existam vínculo empregatício, durante a licença maternidade, será contabilizado plenamente o tempo de serviço para efeito de férias, 13° salário e FGTS. A legislação prevê ainda a possibilidade de ampliação do período destinado à licença maternidade. Conforme disposto na Lei nº. 11770/08, as empresas privadas poderão, a seu critério, aderir ao programa “Empresa Cidadã”. Nesses casos, as empregadas terão direito de receber 60 dias de prorrogação da licença maternidade e, em contrapartida, a empresa poderá deduzir integralmente no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, a remuneração da empregada nos 60 dias da citada prorrogação. E, por fim, a última garantia que aqui mencionamos é o direito da gestante à dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares, assegurados no §4º, inciso II do art. 39 da CLT. Os direitos acima mencionados possibilitam à participação e contribuição da mulher perante a sociedade duplamente, pois ao mesmo tempo que cumpre com a sua relevante função biológica, de concepção de uma nova vida e participação efetiva na educação e criação dos filhos, ainda consegue contribuir relevantemente com a sociedade, atuando em diversas áreas profissionais, em diversos níveis hierárquicos. Tal possibilidade é um beneficio para todos, pois a inteligência feminina gera grandes benefícios à humanidade. CAFÉ & JUSTIÇA

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