Contos e Crônicas (e outros) - Volume 4

Poemas à Flor da Pele

Vol.

4

(e outros)

Copyright © Contos e Crônicas (e outros) Poemas à Flor da Pele, volume 4, 2020.

Copyright © Editora Somar, 2020.

Todos os direitos reservados.

Produção editorial Soninha Porto | Editora Somar Coordenação Associação Cultural Poemas à Flor da Pele Revisão Márcia Fernanda Peçanha Martins Projeto gráfico e diagramação Juarez Rodolpho dos Santos juarezrodolpho@gmail.com Este livro foi composto em fontes: Impressão Gráfica RJR Ltda contato@graficarjr.com.br | graficarjr.com.br Esta obra não poderá ser reproduzida sem a expressa autorização dos autores desta obra, conforme determina a lei do Direitos Autorais: Lei nº 9.610/98.

APRESENTAÇÃO  CONTOS

Anna Maria Petrone Pinho....................... 8 Evanir Plaszewski................................... 11 Everton Nobre........................................ 14 Gislaine B Camarata e Vilson Santanense.............................. 18 Gladis Deble........................................... 22 Irislene Castelo Branco Morato............. 25 Ivanilde Morais de Gusmão................... 29 Jania Souza............................................ 33 Jorge Du Barbosa.................................. 36 Neila Santos.......................................... 42 Regina Guimmaraes............................... 45 Sigrid Spolzino....................................... 48 Sonia Mi................................................. 50  MINICONTOS

Sigrid Spolzino Porto Pontes.................. 54 Zaira Cantarelli...................................... 55  CRÔNICAS

Álvaro Luiz Cardoso............................... 58 Ana luiza Conceição............................... 60 Arahilda Gomes Alves........................... 62 Astrid Kampf Beutler............................. 64 Claudete Silveira.................................... 65 Dariely de Barros Gonçalves.................. 68 Elizabeth Remor Krowczuk..................... 70 João Riél................................................ 72 Leila Silveira.......................................... 77 Lilian Rocha............................................ 81 Lourdes Morales Dallacosta.................. 83

Maria Alice Ferreira da Rosa................. 86 Marinês Bonacina.................................. 89 Oneida Maria Di Domenico................... 91 Orlando Sampaio Silva.......................... 93 Roberto Ferrari Plá................................. 95 Rosangela Godolphim ........................... 97 Soninha Athayde.................................... 99 Soninha Porto....................................... 102 Teresinha Couto................................... 104 Waninha Monteiro............................... 107  POEMAS E PROSAS

Adélia Einsfeldt.................................... 112 Ceres Scheffer..................................... 115 Eliana Sebben...................................... 117 Goreti Ávila.......................................... 119 Iara Pacini............................................ 123 João A.L. Afonso.................................. 125 Jussara Lucena.................................... 127 Lin Quintino.......................................... 130 Luciana Pessanha Pires....................... 132 Magalhe Oliveira................................. 134 Márcia Gonçalves................................ 136 Marcinha.............................................. 138 Margarete Soares da Silva.................. 140 Marilene Huff....................................... 142 Neuza Pinto Nissen.............................. 144 Paulo Vargas........................................ 146 Rosângela de Souza Goldoni............... 149 Rozelia Scheifler Rasia........................ 152 Soninha Porto....................................... 154 Viviane Schiller Balau.......................... 156 Zaira Cantarelli.................................... 158 Poemas à Flor da Pele • Volume 14 | 3

APRESENTAÇÃO

Q

uem se lembra do Orkut? Quem diria, ali tudo começaria, há exatos 14 anos.

Foram 46 escritores poetas dos quatro cantos do Brasil, que envolvidos e encantados, começaram a fazer parte da Poemas à Flor da Pele, era abril de 2006 quando nasceu a primeira Antologia poética, sob a batuta da poeta gaúcha queridíssima, Soninha Porto.

De lá pra cá, incontáveis versos perfumaram as redes sociais e as páginas de inúmeras edições, lançadas pela Poemas à Flor da Pele.

Ora no Sul, ora no Nordeste, passeamos pelo Sudeste até chegarmos ao Centro-oeste. Conseguimos reunir renomados escritores poetas nesses 14 anos, embalados por sonhos e muita imaginação.

A cada dia mais e mais escritores poetas se juntam a nós, nessas nossas páginas em branco cheias de vida e poemas à flor da pele para o deleite dos leitores. Caríssimos leitores, façam uma leitura atenta, nessa edição são

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43 escritores poetas, demore-se nas palavras, saboreie lentamente cada estória dessa publicação. Na procura em saber o que está por trás de cada linha, basta saber que aquilo que está nela, faz dela o que é, pura magia.

Então, permita-se, despertar seu lado leitor e quando perceber, uma essência lírica já terá tomado conta do seu Ser!

SIGRID SPOLZINO Uma pequena parte desse todo maravilhoso.

Pioneira e Conselheira Poemas à Flor da Pele

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Contos 6 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Poemas à Flor da Pele • Volume 14 | 7

Anna Maria Petrone Pinho

Sem causa e sem motivo – Confesso, delegado, eu bati nela. Bati, sim. Bati com toda a força da minha raiva.

– Eu sei, delegado, ela é uma boa companheira. Trabalhadora, amiga, boa mãe.

– Não, não delegado. Não foi sem causa e sem motivo.

– Eu sei, delegado, que ela sai toda a manhã, bem cedo, para o trabalho. Leva o filho para a escola e a menorzinha para a creche.

Sai com vento, frio ou chuva sempre com um sorriso alegre ou conformado, sem uma queixa ou um maldizer.

– Deixa nossa filha para as “tias” da creche cuidar e vai cuidar dos filhos da patroa. Eu sei que ela trabalha muito. Cozinha, faz faxina, faz todo o serviço da casa dos patrões.

– Eu? Eu saio pelas nove da manhã. Vou atrás de algum biscate. Quando não está muito calor nem chovendo eu pergunto 8 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

nalguma obra se precisam de ajudante. Quando não encontro serviço em obras eu cato latinhas, papelão, jornais.

– Não, emprego com carteira não quero. Patrão mandando em mim? Nunca! Prefiro ir ralando, buscando um troco aqui e ali.

– Às vezes é verdade, eu saio à procura do que fazer e passo pelo bar. Vejo os amigos conversando e entro para um papinho.

O tempo vai passando, a conversa vai rolando, a força de vontade vai sumindo e eu fico vendo o tempo ir embora.

– Não, não delegado. Não foi sem causa e sem motivo que eu bati nela.

– É, segunda-feira é o pior dia. No domingo eu vejo o futebol na TV, e me indigno com os erros do juiz. Aí tenho que desabafar.

Comento com os amigos o pênalti mal marcado, o gol em impedimento. Não confio neste tal de VAR, isso é invenção dos gringos para enganar idiotas. Eu tenho os meus brios e não suporto injustiça.

– Quando está anoitecendo ela chega com as crianças. Faz a nossa janta e o almoço do dia seguinte, dá um jeito na casa, toma banho e vai deitar.

– Fica toda cheirosinha, parecendo aquela flor que me encantou quando nos conhecemos. Eu vou me chegando, me encostando, afinal sou um homem com muita vida e saúde. Às vezes até falo “eu gosto de ti”. Ela sabe que não é muito verdade, mas não diz nada. Às vezes ela quer, outras não. Mas sabe como é, delegado, o corpo vai ardendo, vai queimando e aí eu exijo meus direitos de marido.

Encerrado o assunto, cada um vira para um lado e vai dormir, que no outro dia ela tem que sair para o trabalho.

– Não, delegado, veja bem, não foi sem causa e sem motivo.

– Toda a semana eu trago os boletos da Mega Sena pra ela marcar. Não falta uma semana. A Mega Sena estava acumulada, Contos | 9

era uma enormidade de dinheiro. Os números da sorte e do dinheiro estavam ali. Era só marcar os números certos. Mas ela tem a mania de marcar o dia do aniversário da mãe dela, do aniversário do pai, o dia do nosso casamento, coisas bobas. Eu digo para mudar os números, ela teima.

– Os números da sorte estão ali. Impressos no boleto. Era só marcar os números da sorte, mas não. Fica marcando aniversários bobos. Aí eu me indignei e bati. Bati, mesmo.

– Vê, delegado, não foi sem causa e sem motivo.

Anna Maria Petrone Pinho Advogada, parecerista, professora de Psicologia, Orientadora Educacional, ex-assessora jurídica do Município de Porto Alegre, cronista. Nasceu na cidade do Rio Grande, mudando-se para Porto Alegre, com a família aos quatro anos de idade. Lançou os livros solos Crenças e Descrenças, Verdades e Mentiras e Caminho das Descobertas e está grávida de um terceiro livro. Participa de várias coletâneas e tem prêmios literários. Palestrante em seminários e workshops. Sempre mostrou seu deslumbramento pela vida. Considera o hobby de escrever a bendita loucura de tornar-se múltipla, enganar a finitude e ser eterna.

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Evanir Plaszewski

Visita inesperada Em uma manhã invernal, o telefone toca invadindo o silêncio da casa.

Um calafrio percorre a espinha. O sol timidamente invade as persianas do quarto. Ainda sonolenta, Irene atende a insistente ligação – do outro lado da linha uma voz sinaliza, que... o pedido foi deferido e que providenciasse o restante dos documentos e comparecesse até às dez horas da manhã, daquele dia.

Pega de surpresa, levanta-se disposta a cumprir com as exigências estabelecidas pelo funcionário da instituição.

Porém, impactada com o telefonema e, como se quisesse esquecê-lo, freneticamente começa a arrumar a casa e a preparar saborosas iguarias que lembravam sua infância.

Totalmente absorvida com as lembranças, a saudade e os fazeres da casa perdeu o horário combinado naquele telefonema.

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Mesmo assim, entendendo que devia uma explicação pelo atraso, resolve ir para resolver a questão.

Absorve lentamente um relaxante muscular, pois sabe que o restante do dia e da noite serão longos e doloridos, Irene dirige-se ao cemitério mais antigo da cidade com os documentos e formalidades prescritas, apesar das desculpas, leva uma leve reprimenda pelo atraso, e assim terá que esperar para ser atendida. Finalmente, sua vez chegou e as formalidades foram cumpridas para o traslado definitivo dos restos mortais de seus pais.

De posse desses, dirige-se para outro lado da cidade onde está o mausoléu da família. O mausoléu por muito anos foi interditado por problemas de alagamento na quadra. Com o sol já anunciando o entardecer, lá chegando foi informada pelo plantonista que o horário de expediente já havia encerrado e que lamentavelmente naquele horário não havia funcionários para esse tipo de atendimento, e que retornasse pela manhã.

••• Por segundos, foi tomada de surpresa e pânico com o inusitado, sem saber o que fazer com os restos mortais de seus Pais dentro do carro...

O plantonista alheio deu de ombros. Irene, sorriu-lhe e agradeceu a informação, respondendo-lhe que, então passaria a noite rodando com seus Pais pela cidade, mostrando-lhes os avanços e retrocessos e que, pela manhã retornaria com eles para sua morada definitiva. E, deu de ombros, também, deixando o plantonista sem reação...

Voltou para o carro e mostrou a cidade, como se as avenidas e ruas fossem feitas somente para eles. De repente, Irene lembra-se que faltava levá-los até sua casa, pois estavam por perto...

E assim o fez.

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Quando se preparava para tomar café, com as iguarias preparadas pela manhã, pois tinha visitas e estas eram muito especiais, o telefone insistentemente toca, toca e toca, era o diretor da instituição, desesperado pedia que retornasse imediatamente e com todo o cuidado, pedindo escusas, pelo grave equívoco do plantonista...

Para Irene, a visita foi um presente inesquecível. Não raras vezes aguarda-se com carinho e ansiedade visitas de parentes, amigos, colegas com festas e honrarias, meramente agradecem e, ou ignoram.

Em outros o inusitado acontece sem anunciar, sem convites e, ou pompas. Apenas uma visita inesperada.

Evanir Plaszewski De Porto Alegre (RS). Graduada em Direito, pós-graduada Licenciatura em Artes Visuais. Agraciada com medalhas e troféus: Destaque Especial, Menção Honrosa, Hours Concours, Excelência Cultural, Imprensa Sem Fronteiras. Medalha Alusiva 190º de Nascimento de S.M., o Imperador Dom Pedro II do Instituto Histórico e Geográfico de Niterói. Medalha de Prata 50º Salão da Sociedade Brasileira de Belas Artes. 1º Salão Nacional de Artes Plásticas. Comendadora Evanir PlaszewskiUnião Nacional dos Artistas Plásticos (São Paulo). Presidente da Associação de Amigos do Centro de Desenvolvimento da Expressão. Conselheira (Suplente) do Conselho Municipal de Cultura de Porto Alegre (RS). Secretária da Associação de Amigos das Pinacotecas de Porto Alegre. Presidente da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil AJEB/RS. Conselheira da Associação Cultural Poemas à Flor da Pele, Integrante do RS pelo Conselho Nacional de Política Cultural Ministério da Cultura. Membro integrante de várias Academias Literárias e de Arte.  plasevanir@gmail.com | evanirpla.wordpress.com

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Everton Nobre

Tudo é relativo A caverna das estátuas era um lugar de bastante visitação pelos turistas estrangeiros. Mesmo com técnicas avançadas de aferição, os cientistas e arqueólogos não tinham conseguido precisar há quanto tempo tinham sido feitas. Eram três, ou quase isso.

Uma delas era quase um montículo desgastado e que só sugeria que, há algum tempo, havia uma figura humana ali esculpida, a segunda era a de um homem curvado, quase como se estivesse caindo, com sua cabeça decepada aos pés e a terceira era a figura de uma mulher jovem, bela e de olhar triste.

As três estavam assentadas sobre um mesmo bloco de rocha e que as integrava como se fossem uma única obra.

O jovem Heras as visitava desde garoto, pois a caverna ficava há pouca distância do vilarejo onde nascera e desde muito cedo, fora acometido por uma espécie de maldição secreta em função de uma delas.

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Desde a primeira vez que lá entrara, a visão da beleza da jovem o havia encantado de forma absoluta e arrebatada. Aquela mulher de pedra fora desde sempre e para sempre, a expressão mais pura do que ele conceberia como amor.

Sempre que podia, ia até lá para contemplar a beleza da moça.

Decorou cada detalhe, o cabelo, as feições, a posição de cada minúscula parte do seu corpo, incluindo coisas ínfimas como o ângulo dos dedos que se apoiavam no bloco de pedra onde ela aparecia sentada.

O dedo indicador fazia um leve arco na borda reta do bloco de pedra de onde ela parecia querer se levantar e esse detalhe mínimo faria toda a diferença para a vida de Heras.

••• Depois que sua família se mudou para uma cidade maior, quando ele ainda tinha doze anos, passaram-se mais doze até que ele retornasse, homem feito, até seu vilarejo natal.

Estudara, vivera, e já tinha uma carreira quando retornou àquela caverna.

Como já disse, a única mulher que verdadeiramente amara não era uma mulher, mas uma estátua.

Não era preciso dizer que uma situação como essa o deixava angustiado. Sabia não ser normal aquele tipo de fixação em um objeto que nem ao menos humano era. Mas ali dentro da caverna, onde o tempo parecia nunca ter passado, aquilo não importava.

Olhou cada detalhe, cada centímetro da escultura, quase a perguntar se ela estava bem e, finalmente, notou algo que o intrigou. O dedo indicador parecia estar menos arqueado do que antes, como se a estátua tivesse se movido e o espaço entre o bloco e ele tivesse diminuído.

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E foi então que Heras enlouqueceu, não de forma explosiva, mas num crescente constante.

Tinha convicção de que a estátua estava se mexendo, porém em uma velocidade infinitamente mais lenta do que a percebida pelos seres humanos menos atentos. Foi até o povoado e conseguiu um clipe de papel, cortou-o de maneira que ficasse perfeitamente encaixado e escondido sob aquele dedo que agora parecia mais próximo do bloco e foi embora.

Mais doze anos se passaram e durante todo esse tempo, Heras trabalhou como nunca, estudou arqueologia e física, acumulou muitos recursos enquanto se tornava um misantropo sem parentes, amigos ou amores.

Aos trinte e seis, voltou novamente à caverna para constatar se tudo que fizera teria valido a pena.

••• Chorou copiosamente quando percebeu que sim, o clipe continuava lá, porém esmagado sob a pressão de um dedo de pedra quase inteiramente reto. Sim, do seu jeito de pedra, a estátua estava viva. A mulher que amara durante toda a sua vida estava ali, viva, e nunca ficaria sabendo de sua existência porque em sua medida de tempo, a existência de Heras seria equivalente a uma batida de asas de um beija-flor.

Foi aí que sua loucura tomou uma forma mais definitiva e clara para todos. Pagou pelas terras ao redor da caverna, subornou autoridades, criou um projeto de preservação que impediria o acesso dos turistas durante anos, sujou com detritos tóxicos e lixo radioativo toda a encosta de maneira que ninguém mais quisesse chegar perto do local e instalou dentro da caverna um holofote voltado para o rosto da estátua que ficaria aceso 16 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

permanentemente. Ela tomaria conhecimento de sua existência, custe o que custasse.

Não é preciso dizer que, alguns anos depois, quando seus recursos acabaram, quando os crimes apareceram, a comunidade se revoltou. As manifestações se seguiram e o povo queria mais que a caverna, a punição daquele monstro que havia prejudicado a vida de tantos.

A loucura de Heras, no entanto, tinha método.

Quando as autoridades se preparavam para invadir o local, uma sucessão de explosões destruiu boa parte da encosta. O único que ficara na caverna, além das estátuas era ele.

Dentro da caverna, agora, só havia ele com uma marreta na mão, olhando com dor e raiva para aquela mulher que somente saberia de sua existência por um flash, que para ele teria durado anos.

Depois de esmigalhar a cabeça da estátua com a marreta, Heras sentou-se ao lado dela naquele lugar onde a escuridão era absoluta e o tempo não fazia o menor sentido, suspirou.

Não demorou muito, ele viu uma inundação de luz, uma dor aguda na cabeça e nada mais.

Everton Nobre De Cachoeira do Sul (RS), morador em Porto Alegre. É contista e administra com sua esposa, Léia Ortiz, o projeto Florada Artística, que reúne artistas, músicos e escritores há mais de cinco anos na cidade.

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Gislaine B Camarata e Vilson Santanense

“O senhor come letras” Não sei até que ponto é verdade...

Mas lendas são assim mesmo, não é?

Um acréscimo de verdade e um acrescentar de dúvida...

O fato é que, na bucólica cidadezinha, alguém sempre comenta sobre “O Senhor Come Letras”. Principalmente, em eventos literários devido à quantidade de livros nesses momentos culturais.

Acontece que, após uma noite inquietante e trépida a biblioteca municipal amanhecerá com vários livros com páginas completamente em branco. Onde antes, haviam infinitas letras, ago18 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

ra páginas brancas exibiam-se como se esperassem uma nova história com lindas letras.

Aquele dia transformou-se em um burburinho geral naquela localidade tão pacata: a escola fechou, o hospital passou a operar em situação de emergência, na delegacia, o delegado anunciou severa investigação, os repórteres da cidade grande chegaram atônitos pela notícia (pois como se diz lá na capital: – Queriam todos um furo de reportagem), o prefeito decretou calamidade pública.

Mas, no coreto da praça municipal o padre sentenciou a todo o povo: – Isso é castigo!...

E continuou o padre: – Ninguém mais cuida dos livros. Eles estão lá... de qualquer jeito, em qualquer lugar!...

– Blasfêmia!... Repetiram em coro as beatas.

– Isso é CASTIGO!... Definitivamente, sentenciou o padre com o dedo em riste para toda a população local, que atordoada observava tudo em penitente silêncio.

O prefeito, em reunião extraordinária, reuniu-se com as autoridades locais, para traçar uma estratégia emergencial, urgentíssima.

Ficou ordenado então, que toda a população reservaria um momento de sua rotina para ler. Um mutirão imenso foi organizado e o que se sabe é que, nenhum livro sequer em nenhum lugar, foi esquecido. Em todos os locais com livros, agora estavam caprichosamente limpos e organizados.

A Hora do Conto voltou à escola, a interpretação de textos voltou às cartilhas, o clube municipal organizou Rodas de Leitura e professores voluntários organizaram turmas de alfabetização.

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Finalmente então, eis que todos aprenderiam a LER e ESCREVER...

A biblioteca pública da cidade reabriu as portas e o público chegou em caravanas. A bibliotecária até emocionou-se, pois fazia muito tempo que não havia um movimento como aquele na biblioteca.

Mas, para oficializar “A Grande Mudança pelos Livros” o prefeito determinou que na praça principal da cidade, uma grande feira do livro fosse organizada para sacramentar A Revolução pelos Livros.

E o grande dia chegou e a praça encheu-se de livros e de gente também. Os contadores de histórias voltaram e adultos e crianças sorriram felizes.

Mas, de repente, um grito assustadoramente assustador percorreu a praça e o público também.

SIM, O SENHOR COME LETRAS estava ali e envolto em um enorme redemoinho de letras, páginas brancas e poeira foi arrebatando vários livros que agora caíam pálidos, tristes e vazios ao chão.

Correria geral, casas fecharam portas e janelas, cães e gatos procuraram abrigo, pássaros voaram em debandada.

E, então, parecia mesmo o derradeiro fim dos livros todos naquela Região. Mas, como toda boa história tem sempre um ato heroico, eis que surge Ele, o Super Herói local e uma perseguição implacável pelo bem da literatura teve início.

Nosso Super Herói é destemido e não mediu esforços para capturar esse terrível inimigo literário, que foi finalmente capturado em seu esconderijo: um local abarrotado, cinzento, mofado e triste de livros em branco, carentes por de mais de uma história, que lhes restituísse a alegria de existir novamente.

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O SENHOR COME LETRAS foi detido pelo Capitão Mortadela.

Oh, sim, esqueci de citar: – Nosso bom super herói adora Sanduíche de Mortadela.

Mas, há quem diga que de tempos em tempos ouvem-se gritos que repetem: – Eu voltarei, eu voltarei, seguidos de uma sinistra risada ecoando pelas livrarias da cidade.

E confesso: – Acabei de ouvir esses gritos e a risada sinistra agora mesmo enquanto lia sobre essa lenda.

– Você também ouviu?

– Preste atenção...

– Você também ouviu?

Na certeza ou na dúvida, #ficaadica “Cuide Bem Dos Seus Livros!...” ****Verão de uma Noite Literária 2020

Gislaine B Camarata Natural e residente em Porto Alegre/RS. Pedagoga, atriz e roteirista de filmes de curta metragens, membro do Partenon Literário. Atual Presidente AGEI.

Vilson Santanense É cineasta com diversos filmes de curta-metragem premiados. Escritor, musico e poeta, presidiu a AGEI/RS, até2015; Coordenador da Banca da AGEI na Feira do Livro de Porto Alegre.

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Gladis Deble

Barco, Barco Na nuvem alva do sonho Faço meu ninho de letras Modelo nuvens com as mãos Procuro linhas azuis, como fitas de cetim Desenredo todo o novelo Embora os recursos parcos Sobre as águas da memória Vou construindo meu barco.

Nos verdes claros da margem Balançam ramos de plantas Tanta vida nesse charco,(2 páginas) Não preciso de mais nada Minha vida é esse barco.

Se viajares comigo, Manterei pra sempre acesa 22 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

A lanterna, nosso marco E o sol no seu fulgor Vai coroar romance De nós dois nesse remanso Em cantos de azul e verde Só os peixes é que sabem Da fluidez dessas águas Onde confundem-se os corpos.

Despidos memória e limo Ao cruzarmos os limites Braços em arco e libertos Somos o corpo do rio Amando junto do barco.

Eremita A cidade silenciosa Por ruas vazias Só o medo desfila.

A vida é aqui dentro.

Cartas na mesa...

O Louco diz sandices no planalto E espalha vírus.

O Enforcado contempla a vida por outro prisma O Diabo coça o olho no pampa E estimula a carreata.

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O Papa ora na chuva Por Roma enferma.

A Lua recomenda Prudência na próxima fase Enquanto isso, o hospital De campanha ficou pronto.

Para alguns Enamorados Isolamento social é o fim O Ouro, fugiu da bolsa Sonhei que eu era Imperatriz De luva e máscara Em conexões simbólicas Para lidar melhor Com o momento atual.

Gladis Veloso Deble É formada em Educação Artística e Artes Plásticas e tem pós-graduação em Arte-educação. Reside em Bagé, RS é professora do estado. Membro da oficina de Poetas do Cultura Sul e coordenadora do setorial de literatura do Conselho Municipal de Cultura de Bagé. Participa ativamente das atividades culturais, concursos e publicações da Poemas à Flor da Pele desde 2008. Obteve o primeiro lugar no concurso da Academia Rio-Grandina de Letras em 2011 – Prêmio Castro Alves – Primeiro lugar no concurso do Universo dos Poetas em Maceió-AL em 2012. Prêmio Jorge Amado no Centro Cultural SP, Menção honrosa no Prêmio Varal do Brasil, na Feira do Livro em Genebra – Suiça em 2014, ganhadora do Concurso Orelha do Livro do Varal Antológico organizado por Jacqueline Aisenman em Genebra – 2014. Segundo lugar no Concurso Sua Poesia vai à Feira- Rio Grande. 2º Lugar Prêmio 100 anos Vinícius de Moraes – 2013. Premiada com a medalha Maturidade em Belos Versos do CPERS Sindicato – 2015. Patrona da Feira do Livro em Bagé – 2015. Menção honrosa no prêmio Ferreira Gullar da Poemas à Flor da Pele em 2018. 2º Lugar no Prêmio ALMuB da Academia de Letras e Música do Brasil em Brasilia-2018. Ministrou a oficina Poesia e Processo criativo na Feira do Livro de Dom Pedrito e no Erico Verissimo, na Feira do Livro de Porto Alegre, para o grupo Poemas à Flor da Pele, em 2019.Cronista do Jornal Folha do Sul de Bagé.

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Irislene Castelo Branco Morato

Reminiscências Viver é ter e fazer história. Pensando nisso, lembro-me de uma trova premiada, feita pelo meu querido pai, escritor e poeta: “Lembrando a infância querida Como quem sorrindo chora Meu crepúsculo de vida Se transforma numa aurora “...

Sempre me marcou essa trova e outras mais que ele sempre fazia, brincando com a língua portuguesa, que tanto amava e dominava.

A menina, que observava e assimilava tudo à sua volta, se encantava e procurava aprender e a entender o significado das belas palavras.

No seu jardim encantado, fazia seu grande laboratório de descobertas da vida, animal e vegetal. O jardim da casa em que nasceu parecia um bosque cheio de mistérios a serem desvendados. Em proporção a seu conhecimento e tamanho, era enorme a seus olhos.

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Passava horas observando os bichinhos, brincando com os tatus bola que, ao serem tocados, viravam uma bolinha e rolavam pelo chão.

As flores a seduziam, na textura, forma e cores. Aí veio à ideia fazer um laboratório de sucos dessas flores e plantas, para ver se cheiravam e se aqueles tons conseguiam passar para a água.

Pedi a minha mãe um lugar, onde pudesse construir um local de trabalho. Ela me deu uma cadeira velha sem assento e um espaço no quintal. Coloquei uma tábua de caixote em cima, no assento, e entre as pernas da cadeira abaixo. Peguei um pedaço de plástico de cortina do Box e, com tachinhas, prendi a cortina improvisada no meu gabinete de trabalho.

Meu pai tinha muitos vidros médios vazios, de loção pós-barba, de remédios. Tinham que ser transparentes, de preferência. Pedi a ele os vidros e coletei outros que seriam jogados fora.

Aos poucos, fui juntando e comecei a investigar mais, meu grande laboratório, meu jardim...

Rosas vermelhas, cor de rosas, hibiscos laranja, vermelhos, spatifilus brancos, antúrios rosa, vermelhos e brancos, crisântemos, beijinhos...

Plantas verdes, como um pinheiro imenso, cujas folhas tinham penachos grossos, que pareciam taturanas; tinha medo. Às vezes, assustava minhas amiguinhas com elas.

Minha mãe temia que o pinheiro caísse sobre a casa, pois era bem mais alto que a casa e envergava sobre o telhado. Tinha também uma colmeia de abelhas miudinhas no seu tronco. Não mordiam; soltavam uma seiva que cristalizava e eu arrancava e ficava olhando contra a luz do sol. Era de cor âmbar. Dava para ver o sol com arco-íris de cores por dentro. Era bem legal.

Um dia, meus pais decidiram cortar o pinheiro na altura de um metro. Chamaram a Prefeitura. Eles avaliaram e mandaram cortar.

Senti muito na época, mas era pequena demais para dar palpite.

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Da colmeia, de dentro do tronco, tiramos favos de mel, bem doces e gostosos. Não esperava isso daquelas abelhas tão miúdas.

Pareciam mosquitos.

O toco de pinheiro virou suporte de uma samambaia muito bonita, renda portuguesa, pela semelhança de suas folhas com uma renda. Até hoje, tenho uma muda dessa samambaia comigo, que minha mãe me deu.

O gosto pelas plantas vem de geração em geração da minha família. Minha avó, Verônica, tinha, na casa dela, no interior, um jardim, em que eu me perdia, misterioso... Uma tia, Zizinha, irmã da minha mãe, tinha até uma estufa em sua casa, com espécies que não se viam fácil; os antúrios de lá eram gigantescos, as flores eram maiores que as folhas! Eu ficava maravilhada...

Mas, voltando ao meu laboratório, o jardim da minha casa, os Agaves-Azuis, eram enormes. Como sempre gostei de montar a cavalo, montava nos agaves e brincava de cavalinho. Nossa! Que viagem! Que sensação deliciosa!

E o Chorão, Salgueiro-Chorão, era uma árvore com tronco de casca grossa, mas as folhas finas caíam em ramos, como uma cascata verde, até o chão. Daí o nome chorão, como se derramasse “lágrimas”, de ramos verdes finos, compridos e fortes, com folhas finas, delicadas e compridas...

Minha mãe cortava as folhas, por baixo do Salgueiro-Chorão, fazendo um caminho, como se fosse um túnel, para que pudéssemos passar. Eu achava aquilo incrível e passava com o meu velocípede ali, dentre os vários caminhos que tinha o meu jardim encantado...

O jardim tinha um muro de pedra Lagoa Santa e, por cima, uma cerâmica vermelha. Ele era baixo. Subia no muro, me agarrava no Chorão, num monte de ramos e voava, voava igual ao Tarzan... Nossa, era demais! Às vezes, meu irmão, três anos mais velho do que eu, saltava do outro lado do canteiro e me acompanhava na ousada brincadeira.

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Abaixo do Chorão, tinha uma planta mal cheirosa; minha mãe a chamava de Guiné. Eu perguntava o porquê dela ali e ela me explicava que a mãe do meu pai havia lhe dado para espantar os maus espíritos. O cheiro grudava na mão; evitava mexer nela.

Havia também Espadas de São Jorge e bonitas forrações nos canteiros.

Eu brincava de pique-esconde nesses caminhos tortuosos e cheios de cores e mistérios a serem descobertos...

Para o meu laboratório, colhia, do jardim, hibiscos e rosas, amarelos, vermelhos, esmagava-os até sair deles o sumo colorido, misturava com água e coava na peneira.

Percebi que davam tons lindos, onde minha imaginação viajava em um turbilhão de cores. Passava horas sem ver o tempo, que parecia parado ao meu redor...

A minha viagem foi maior, quando pedi a minha mãe um pouco da purpurina dourada, que ela guardava com carinho, em um vidro branco. Ela me deu. Que alegria eu fiquei, nossa! Agora poderia fazer o que imaginava... Colocar um pouco de purpurina dentro de cada vidro colorido. Os tons de verde, azul, amarelo, vermelho, laranja, ao balançar os vidros, brilhavam, com intensidade indescritível...

Que lindo! Meus olhos brilharam como eles, nessa viagem no Tempo... *

*Menção Honrosa na Categoria Prosa, no Concurso do Projeto Editorial Internacional de Língua Lusófona Sem Fronteiras pelo Mundo, Coletânea de Vol. 2, lançada em Lisboa, Portugal, 2017.

Irislene Castelo Branco Morato É Cirurgiã Dentista pela PUC MG, Mestrado em Odontologia, UFMG. Membro Efetivo de várias academias de letras, nacionais e internacionais. Presidente Coordenadora da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil de MG, AJEB - MG. Quatro livros solos publicados, 2018 à 2020.

Coautora em mais de 35 Coletâneas literárias. Organizadora da Coletânea da AJEB - MG, “O Nu da Palavra Prosa e Verso”, 2020.

28 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Ivanilde Morais de Gusmão

A descoberta das letras...

Sua mãe ensinava os filhos das classes “remediadas”, como também, aos filhos das famílias que moravam em engenhos e fazendas próximas do Vilarejo e que não tinha interesse em mandar seus filhos à escola, preferiam que fossem alfabetizados em casa sob a supervisão dos pais; sobretudo quando era menina.

Assim, ela foi contratada por uma dessas famílias que morava em um engenho, mais ou menos próximo, para preparar os dois meninos para a prova de admissão. Naquela época se fazia uma prova para poder cursar o ginasial; acredito que corresponde hoje à quinta série do ensino fundamental. Ela, então, a levava junto porque não tinha com quem deixar. Era órfã de pai e mãe. Tinha sido criada na casa de parentes. Casara-se muito cedo para ter o seu lugar, mesmo que fosse simples, já que o rapaz era pobre e viva de “biscate”; ou seja vendedor. Tivera aquela filha, mas o marido tinha morrido de uma febre e ficara viúva. Como não sabia nada de comércio não tiContos | 29

nha como continuar fazendo o trabalho do marido, para sobreviver, começou a dar aulas. Esta era o grande legado que tinha recebido pelo tempo que viveu com os parentes.

Nessa época ainda não tinha seis anos, era uma criança muito “levada da breca”, muito teimosa e como não tinha com quem deixá-la sua mãe a levava junto. Era mais seguro! Por isso levou-a a esse engenho onde devia permanecer um semestre preparando as crianças!

Qual não foi o seu espanto quando chegou no engenho e entrou na casa grande! Tudo era muito grande: o terraço, a sala... Tudo cheio de móveis de quadros. Na casa dela só tinha o essencial! Lá chegando, sua mãe se apresentou aos donos da casa e explicou que, conforme tinha ficado acertado, tinha trazido a filha, mas não se preocupassem que ela ficaria junto dela quando estivesse ensinando.

Os dois meninos foram imediatamente chamados para conhecerem a professora. E nem sequer olharam para ela. Observou que eles eram bem maiores do que ela e deviam ter entre nove e dez anos. Depois de instaladas junto aos quartos dos empregados foram conduzidas a uma sala enorme, onde tinha livros por toda parede e no centro uma imensa mesa com globo terrestre, caixa contendo lápis de todas as corres, uma coisa maravilhosa. Fui acometida de um verdadeiro espanto, nunca tinha visto algo semelhante. Pareceu-me um mundo encantado...!

Começada a aula, a mãe explicando as coisas para os meninos e ela ia ficando cada vez mais inquieta.., não parava de se mexer. Foi então que a mãe teve a ideia, apanhou um livro da estante e disse: vá olhando as letras, mesmo sem saber ler...; mas vá olhando... depois aprende..., eu lhe ensino!

No começo, pareceu-lhe estranho.., o livro não tinha desenho, era apenas letras e mais letras formando palavras, palavras... que não entendia, nada! Mas, mesmo assim, começou a observar que as letras eram diferentes e começou a identificar as letras iguais 30 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

nas palavras diferentes. De início a mãe ficou satisfeita só pelo fato dela ter ficado quieta, mas com o passar dos dias percebeu que ela estava tão concentrada, então, perguntou: tá gostando? Respondeu: sim! Mas gostaria de saber ler para entender o que está escrito!

Foi então que ela providenciou um caderno e um lápis e começou a ensinar-lhe as letras e o som que elas tinham. Foi mostrando como as letras se juntavam e formavam as palavras. Em poucos dias ela já conseguia soletrar algumas palavras. Espantada com o seu interesse e a capacidade de aprender ela procurou na biblioteca algum livro para criança o que, aliás, tinha e muito...! Tinha vários livros de um tal de Monteiro Lobato que contava histórias interessantes, cujos personagens eram possíveis identificar nos arredores da casa grande do engenho...!

E foi assim que em seis meses já lia corretamente e assim passou a ler todos os livros que podia, não queria mais sair da biblioteca..., mas como tudo de bom acaba logo, de repente, o programa de estudo dos meninos já estava concluído e, assim, concluída também estava a tarefa dela no engenho!

Com uma imensa tristeza ela ficou o último dia naquela casa.

Foi preparado como que uma despedida para a professora, mas ela, naturalmente, estava lá participando, mas não sentia nenhuma alegria. Pensava: e agora que vou fazer...? Como continuar a ter acesso àqueles livros...? Sabia que era impossível, afinal eu era só uma criança deixada de lado quietinha para não perturbar...!!!

Assim, depois de muito caminhar pela vida e pela história... quando já tinha quase quarenta anos foi que começou a formar sua pequena biblioteca, mas como fez isso com tanto prazer...!!! Hoje, com quase 70 anos tem praticamente todos os livros que gostaria de ter...! Mas, os seus preferidos são de Filosofia e História! Ah, ah.... como gosta... de Eric Hobsbasw, e os pré-socráticos..., como se deleita com Nietzsche e literatura gosta mesmo é dos clássicos...! Passa horas.., horas intermináveis junto com seus livros...!!! Sente-se Contos | 31

feliz e realizada, não é uma velha qualquer e sozinha... tem seus livros cujos autores lhe fazem companhia.... Ai meu Deus como adora todos...!!! E, Deus do céu, como adora Cecília Meireles, não cansa de ler, reler, ler. Reler... seu Flor de Poemas..., e Fernando Pessoa.... “Se te disserem que morri, não penses que morri por ti...., morri porque meu corpo estava farto de si...!!! Nossa, simplesmente belo. Este é um dos mais belos poemas de Pessoa que trata do suicídio...! Aliás, tema que me atrai e me apaixona..., afinal já tenho quase 70 anos..., apesar de lúcida e, por isso mesmo, já tomei uma decisão.... já permitirei que me torne uma velha insuportável e rabugenta...!!! Mas antes, escreverei meu testamento e lucidez para isso com certeza... tenho!!! Entretanto, espero que antes disso o coração, que é o único a me preocupar, resolva a questão... solucione o problema...

Enquanto isso, vivo a vida cada momento cada instante... O que é a vida senão apenas instantes!!!! E... espero!!!!!

Recife, 31 de dezembro de 2019

Ivanilde Morais de Gusmão Professora, advogada, escritora. Estudiosa de Karl Marx e da Literatura. Membro de várias Academias. Livros de ensaios: Sobre o Programa de Gotha, Karl Marx (2005); Dignidade na Morte (2009); Um Caminho para Marx (2011); Para Compreender o Método Dialético (2013). Poesias: No Redemoinho da Vida (2015) (port./francês); Entre o Silêncio e a Solidão (2016) (port./inglês); No Cotidiano da Vida a Poesia vai Construindo o Humano(2016) (port./francês); Nas Veredas da Vida com Ternura vai Resgatando o Humano(2017)(port./inglês). Participação nas Coletâneas: Sete Pecados Capitais-Preguiça); Sem Fronteiras pelo Mundo... I,II e III.; Madalena’s; Integração Cultural Interestadual; II Seminário Internacional Encontro das Américas em Terras Potiguares; A Arte de Ser Mulher – poesia feminina; A Vida em Poesia I e II; Faz de Conto I e II; Alquimia Literária; O Bichonário Brasileiro e O Dom de Ser Mãe - Editora Helvetia (2016-2017); Olhar Bilateral(2017) e VIDA&VITA (2018) – A.C.I.M.A. (Associazione Culturale Internacionale Mundiale) (2017); I e II - Antologia CULTIVE (2017-2018), Poemas à Flor da Pele (2017), Antologias. Prêmios Talentos Helvéticos Brasileiros- Categoria Poesia-Janeiro/2017: 2018: DA ANIMALIDADE AO SER SOCIAL: a Fantástica Caminhada do Homem; DA ESPECULAÇÃO A RAZÃO: Um Olhar Poético na Ideologia Alemã – Coleção MarxIando1; Da Natureza ao Mundo Globalizado: A grande caminhada do homem, humanizando-se - Coleção Proseando – vol.1 – 2018 e vol. 2 -2019.

32 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Jania Souza

A Viagem de Dona Flor Em um sobrado velho na Rua 24, Dona Flor via os minutos arrastarem-se. Já desenganada com os seres humanos, não mais acreditava em amor e solidariedade. Dera seu quinhão à humanidade, seus anos de vitalidade. Agora amargava o esquecimento dos solitários.

Seus entes, todos sepultados, vagueavam entre as quatro paredes desbotadas do arruinado quarto. Um espelho quebrado servia para melancólicos retoques na imagem carcomida pelo tempo implacável.

Fora professora de Língua Portuguesa em seus áureos dias.

Respeitada e de muito prestígio na comunidade acadêmica e entre seus alunos. Hoje, a memória gasta e a solidão dos anos, relegava-a a mais um indigente ancião aposentado aguardando a chegada da morte, para liberar os cofres da seguridade social.

Pequenos instantes de lucidez como nesse momento a reportava às reminiscências da própria infância e da juventude.

Contos | 33

Livros gastos sem cor eram sua companhia. Encontravam-se espalhados desordenadamente na estante de laca branca já bastante danificada pelo cupim, sobre o roto sofá de dois lugares e, também, no tapete com rasgos e empoeirado na sala fria.

Há algum tempo sentia uma pontada no peito, logo esquecida com o lapso da mente.

Locomovia-se com dificuldade. Seus pés pareciam grudados ao chão. Porém não deixava de sorrir com o canto dos passarinhos e a suavidade das belas xananas amarelas, trazidas para o jardim descuidado pelo bico das aves e incansáveis insetos, depositários das sementes ao voejarem pelas frestas da janela emperrada e entreaberta.

Cantarolava cantigas de roda e solfejava versos de poemas fragmentados.

Não havia ninguém por ela. Filhos, não tivera. Seu irmão mais velho, da Força Expedicionária Brasileira, faleceu de forma prematura nos campos de batalha na Itália durante a Segunda Guerra Mundial.

Um desperdício. Tão jovem. Tão garboso. Tragado pela violência dos homens. Podia ter tido mais tempo para a felicidade.

Dona Flor não conheceu seu genitor, pois esse morreu quando ainda engatinhava.

Dona Isaura, sua mãe, grande amiga e companheira, foi sempre seu esteio. Partiu sob a tortura de um câncer de estômago.

Corajosa nos últimos momentos como fora durante toda a vida.

Jamais reclamou da sorte. Levou consigo o cheiro da Flor.

Dona Flor sorria por entre as gengivas desdentadas. Não mais enxergava. A catarata roubara-lhe o brilho do olhar. Mesmo assim, fitava da poltrona, onde se encontrava sentada, a janela entreaberta. Deliciava-se com a sinfonia dos passarinhos e os fios de vida.

Contudo, nesse instante de leve prazer, sentiu outra forte pontada no peito. Sufocou com a intensidade da dor. Percebeu por entre a 34 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

dor e os finos raios de luz a atravessar a janela, sua mãe em seu lindo vestido de voile rosa. Com reconfortante sorriso, caminhava em seu sentido com as mãos estendidas para aninhá-la em seu farto colo de amor. Sem relutar nem proferir qualquer palavra, apenas com enorme alegria, levantou-se e correu para seus braços.

Seus pés estavam leves como plumas. Riu feliz e juntas saíram para o passeio vespertino em busca do vento.

Jania Souza Nasceu na cidade brasileira de Natal no Rio Grande do Norte; é escritora, poeta, artista plástica e articuladora cultural; tem 16 livros publicados até 2019, para o leitor infantil e para o adulto, além de outros no prelo com obras traduzidas em outros países. Bacharela em C. Econômicas e, também, C. Contábeis pela UFRN. Sócia em entidades literárias nacionais e internacionais: SPVA/ RN, AJEB/RN, APPERJ, Poetas del Mundo, Associação Poemas à Flor da Pele, Movimento Elos Escritores, ALAMP, Literarte, Académie Luminiscence França Brasil, Correspondente da UBERJ, dentre outras. Vice-presidente da UBERN na gestão 2019/2021. Laureada com reconhecimento literário no Brasil e exterior, entre os quais, destaca o Prêmio World Art Friends 2010 para seu livro “Entre Quatro Paredes” concedido pela Corpos Editora, Porto/Portugal; Prêmio Talento Helvetia 2019 e Melhor Livro de Contos e Crônicas 2018 ZL Books para “Em horas vagas”; Melhor Livro Educacional 2019 para seu livro “O Jovem Lenhador e o Violão” pela ZL Books; Prêmio Vany Campos, a Cora Coralina dos Pampas – 2º. Lugar – Concurso de Contos e Crônicas 2018 promovido pela Associação Poemas à Flor da Pele. | www.janiasouzaspvarncultural.blogspot.com

Contos | 35

Jorge Du Barbosa

Nota Introdutória Estes contos amargos como a realidade em que se situam, é o mais puro retrato dos dias atuais em que vivemos isolados por compulsão. O meu receio é que nos acostumemos a isso porque, como já foi dito, “tudo passa sobre a Terra”*. Não sendo biográficos os contos poderiam ser a biografia de qualquer um de nós. Quero dizer que esta febre que nos atinge poderá postergar-se em futuros comportamentos ou num jogo de verbetes como já acontece com os jovens isolados com seus telefones e redes sociais. O mar é constantemente invocado pelo autor, como saída para os problemas que nós mesmos geramos. A força do mar, do rio é avassaladora, destrutiva, e um meio de os personagens seguirem seus rumos, buscar suas soluções sem a vergonha de mostrar aos outros as características, às vezes cruéis, para justificar seus meios. Sem falar do desprezo, da indiferença e da falta do Olhar sobre quem está ao nosso lado ou nos tira do conforto de nossas vidinhas. No fundo, todos solitários em busca de um porto-seguro do qual ninguém mais tem certeza. *Última frase do romance Iracema, de José de Alencar.

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Um Lugar para Chegar O rio desce alucinado com força e sem piedade carregando tudo o que encontrava na natureza na correnteza que leva junto rente juncos pedaços de árvores animais restos de roupas e plantas. Em declive o rio parece ter pressa de chegar até o mar: sabe que há um lugar para desaguar sua fúria, um destino previsível enquanto pessoas, muitas das quais, não sabem onde irão parar, não tem uma foz ou desaguadouro. Este é o drama do homem: ele não tem aonde chegar só sabe que caminha com raiva e deixa a ira da destruição.

O homem magro e alquebrado pelo tempo e costumes sofre sabendo que destrói tudo e, no final, não haverá alguém a lhe esperar como o rio que irá encontrar-se com o mar. O homem tem consciência de que a maioria das pessoas não tem aonde chegar terão de prosseguir até alcançar algum prado ou vale distante que lhe receba. Este senhor velho sabe que assim será: sem futuro, à deriva.

Contos | 37

Uma Sombra O homem resolveu fazer um balanço do que lhe vinha acontecendo. Eram noites, doenças, dores que lhe acudiam sendo que o que esperava era o amor; fez do amor uma saudade da mulher e em nome desse bem nunca mais amou. Disse adeus ao bem maior, agora era o tédio de seus dias amargos - não chegava a entender o que lhe vinha, o que o fazia virar a cabeça. Seus caminhos eram as pedras e flores que levava adiante pisando com força no que encontrava: gravetos, seixos, ervas, pedras. As pedras eram o pranto que chorava. Caminhava já por fora da água parecendo aquilo uma dor profunda que apressava seu passo em direção à saída do povoado.

Ali entregou-se, ninguém mais o viu – alguns dizem que há um mendigo dormindo ao relento. Como usual, as pessoas evitam o próximo como se evita uma sombra.

38 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Sem Porto para Chegar Kaleb nosso personagem queira o mar para si, fonte de vida.

Descuidado, falou alto demais e o cristal de sua voz se quebrou.

Relembrava o olhar com a luz turva da dor e esta frase ficou no peito de Kaleb sei que trazes o mar contigo e esta frase gravou-se - ele disse sim ele disse não, seu nome era José, talvez outro qualquer em um sonho irreal que passou. Não meu grande amigo na tua imensidão segue em teu barco aventureiro meu destino preso a ti a minha grande solidão. Não me resta nada sem amor, quando chegar ao porto, um dia, não encontrará ou pode não haver porto. Tudo partido para Kaleb.

Contos | 39

Caminho Perdido Meu caminho perdido e que junto nos via passar entre rosas e coroas. Este caminho apagou-se e não mais nos verá passar, preocupados que estamos com nossos novos passos. Era uma tarde longa e fria, cada um a seu passo na despedida. Gelo e lágrimas estavam agora em nossos corações e num branco lenço de percal chorei esta traição que esfriava nosso subúrbio inteiro. Tua resolução de partir era uma necessidade, tua vontade de saber que teu caminho seria de surpresas e menos risos. Quando esfriamos nossos corações, esfriamos os sentimentos que até poderemos vir a sentir – se ela não voltar, restará apenas a vontade de haver um dia, um reencontro. Única esperança já morta. Guardo o lenço no bolso e prossigo.

40 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Uma Mulher que Fuma O ato de fumar pode ser a busca de um gesto que traduza segredo ou imaginação daquilo que esteja no mais profundo da alma, embora sua vida esteja completa: marido, casa, emprego, cachorro, tudo. Fuma para esperar alguém que poderá vir a lhe aquietar o anseio escondido, o sonho mais remoto. Parece que se algo não aconteça rapidamente a vida poderá parar. Então, inebriada em gases, fumos e aromas poderá trazer-lhe a presença de Morfeu que a levará a mundos que ela deseja descobrir, enlouquecer de prazer que vem da chama ardente deste amor que imagina. Toda esta interpretação e imaginação são suposições do imaginário do que podemos guardar dentro de nós ou, se, simplesmente, um gesto como sentir a última brasa para adormecer ou preencher um vazio existencial momentâneo.

Jorge Du Barbosa Porto Alegre, RS. Escritor e Professor. Formado em Línguas Português / Inglês. Tradutor de Inglês.

Sócio de honra de Poemas à Flor da Pele

Contos | 41

Neila Santos

O encontro Quando ele chegou, o frio era intenso!

Um vento forte vergava as árvores que rodeavam a cabana.

Ela estava aquecida pelo fogo que dançava vibrante na lareira rústica, única peça imponente naquele lugar. As chamas quase lambiam seus pés, calçados apenas por meias de lã, brancas e grossas, que combinavam com o cachecol envolto em seu pescoço delicado.

Os cabelos presos no alto da cabeça por uma presilha prateada, eram como uma coroa de ônix, emoldurando o rosto bonito, de olhos escuros, brilhantes e boca carnuda.

Por baixo do suéter tricotado à mão, que lembrava o céu levemente nublado e do jeans escuro e folgado, ela vestia apenas uma calcinha minúscula e rendada, azul-marinho, contrastando com a alvura de sua pele.

Ela estava esperando por ele já há três dias! De companhia, somente a lareira acesa, vinho tinto e Átila, um Pinscher, que 42 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

de tão pequeno, ela perdia de vista nos dois únicos cômodos da cabana!

Durante o tempo que esperava, ela tivera tempo para pensar e ter certeza que, ficar com ele, era o que mais queria na vida.

Ao chegar, ele a vislumbrou deitada, sobre o tapete desbotado. Parecia uma boneca valiosa, esquecida ali por alguma criança apressada.

O vento que entrou no recinto, quando ele abriu a porta, apagou as velas que quase findas, equilibravam-se no castiçal de bronze.

Então, ele despiu o pesado sobretudo que usava e jogou-o sobre a cadeira (cúmplice inerte) que guardava a bolsa dela.

Deitou ao seu lado, enfiou as mãos geladas sob o suéter de céu e ouviu o suspiro junto ao meu peito. Era de puro prazer!

Uma intensa onda de paixão fez o fogo crepitar mais forte na lareira! O vinho tinto escorreu de seus beijos, desceu pelos seus corpos nus e brindou o êxtase!

A lagoa e eu A Lagoa guarda muitos segredos!

Quem olha mais atentamente para suas águas, pode sentir a energia pulsante de histórias de amor, bêbados e pescadores.

Mas, ela é discreta. Jamais revela o que guarda em suas profundezas, por isso, os bêbados, os pescadores e os amantes, confiam a ela seus mais íntimos anseios e vivências!

Costumo ficar longo tempo sentada na areia, à sua margem, com os olhos fixos no vai e vem das águas, num duelo mudo.

Ela querendo descobrir mais de mim, eu querendo decifrar seus enigmas.

Contos | 43

Nossa convivência é sempre assim, uma dependendo da outra.

Eu usufruindo de sua beleza e majestade, ela, explorando minha poesia! Às vezes, eu a desafio. Entro água adentro, mergulho, canto alto!

Ela, mais sábia, fica serena, tépida e suave, tentando penetrar em minha alma, invadir meus pensamentos e criar comigo, um vínculo de cumplicidade!

Neila Santos Roth Mãe, avó, esposa, poetisa, jornalista, radialista, cerimonialista, colunista literária e completamente agradecida a Deus! De Cachoeira do Sul, residindo em Tapes há 18 anos. Gratidão à amiga Zaira Cantarelli.

44 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Regina Guimmaraes

Doralice mandou avisar Doralice está cada vez mais torta. Agora aconchegada em um colar cervical. Mancando por causa da lombar fora de prumo. Com aquela enorme caixa nas costas, logo, logo a dorsal dará sinais de sobrecarga.

Muito simpática, abre largo sorriso ao primeiro cumprimento.

Prepara o cardápio e faz as compras no dia anterior. Acorda cedo e vai para o fogão preparar a comida mais gostosa das redondezas.

A filha anota os pedidos recebidos no WhatsApp. Quentinhas prontas.

O rapaz contratado para o serviço de entregas não apareceu.

Sobra para Doralice fazê-las.

Não se aguenta mais em pé. Porém, não pode deixar a freguesia em falta. E a credibilidade? Qualquer falha, fica com o nome sujo.

Contos | 45

Consegue levar o almoço e algumas palavras gentis para a vizinha idosa e solitária do andar de cima.

Grávida de sete meses, a filha fica em casa cuidando da pequena Lara, de um ano e meio.

Com o ganha-pão, sustenta o genro e o marido que vivem de biscates, a filha desempregada e a neta. Tem que relacionar as dívidas da casa, intercalando os meses para pagá-las. As únicas contas em dia são a da luz e a do gás, pois sem esses não tem como trabalhar.

Hoje Doralice não foi às compras. Mandou avisar que amanhã não haverá comida.

Pausa para refazimento.

Momento para cuidar do corpo cansado.

E zelar por seu maior tesouro: a vida.

O último dia Você aqui de novo?

Fora!

Todas as vezes que você aparece causa-me náuseas. Provoca tumultos intermináveis. Corre-corres desesperados. Todos os alertas vermelhos são acionados.

Afaste-se de mim!

Cem passos pra longe.

Vade retro!

O escudo de São Jorge há de me proteger.

Noutros momentos me agarraste pelo braço, me arrastaste quase inconsciente sei lá pra onde.

46 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Não haverá guerra, gritarias. Tampouco arruaças.

Não deixarei que me dês uma joelhada entre pernas até que eu perca as forças.

Estou firme te mirando olho no olho. Não vai ter queda de braço, não.

O meu momento é outro. Me sinto livre.

Sinto que meu Anjo da Guarda me ergue e dá a leveza de que necessito.

Por outro ângulo, me vejo ali deitada. Quantos aparelhos plugados.

Assisto a correria dos médicos e enfermeiros no processo de ressuscitação.

Freirinhas me trazem água e dizem para eu beber bem devagar.

Envolto a uma bruma tudo desaparece lentamente.

Regina Guimmaraes É do Rio de Janeiro, artista plástica, escritora e poeta.

Contos | 47

Sigrid Spolzino

Acordados Lá fora aurora fria, vem vindo mais um dia.

Enquanto dentro daquele quarto, uno desejo, venham mais instantes de edredom. Nesse retângulo aconchegante passou-se uma noite e uma madrugada inebriante... ritmadas por um sax, a embalar dois corpos, ora relaxados ainda adormecidos pelo cansaço. No chão, taças e, a última garrafa de tinto misturam-se à lingerie dispensável a certa hora...

Horas que partilhadas preencheram senhores momentos. Claro, o entendimento; corpos e vozes implícitaram risos, faíscas ao se tocarem, repetidos toques e quando se dão conta, as pernas dela já estavam a desenhar o espaço que acabou sumindo entre eles.

Como descobridor de mares, por toda parte, leves e agitadas ondas proporcionadas pelas sólidas mãos dele. Deliberadamente cercando-a ainda mais é quase possível ver-se apenas um. Um refém do 48 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

outro. A palavra ideal seria “atol”, entre coxas e desejos desses dois, aquele que procurasse certamente se acharia nessa ilha! ... não escaparam arrepios, lambidas vezes doces, ora salgado, equilíbrio a subir e descer pelo dorso, tudo visível mesmo com olhos fechados.

Quem quer que comandasse deixava escapar dos lábios, sussurros que nem precisaria de permissão, ambos reféns de suas vontades, desejos e volúpia.

Olhos ainda fechados instintivamente permitiam dedos acariciarem corpos, da boca dela chegava ao ouvido dele o que há certo tempo está implícito nesse relacionamento.

Seja real ou ilusão, esses corpos somam dois corações sintonizados.

Bem vindos ao dia seguinte...

Ele fala ao ouvido dela... Desperta, amor!

Sigrid Spolzino Porto Pontes É de Brasília, mora no Maranhão e é Professora na empresa Universidade Corporativa da APAE Uniapae e Secretária de Estado na empresa Secretaria da Pessoa com Deficiência do Maranhão - Solidariedade. Escritora e Poeta!

Contos | 49

Sonia Mi

Uma madrugada feliz Uma longa espera...

Por duas noites e dois dias esperei e ele não chegou.

Prometia, eu o aguardava...

Na noite passada resolvi apelar. Me banhei com muita calma.

Deixei a água quente deslizar demoradamente por meu corpo. Passei óleo perfumado, penteei meus cabelos com esmero. Abrindo a gaveta da cômoda, vi uma camisola de seda branca com estampas floridas, guardada para momentos especiais como este. A vesti com cuidado. Inspecionei a cama, os lençóis, o travesseiro exalando um suave perfume que tanto me dá prazer sentir.

Na penumbra, começou a minha espera. Estava tensa por mais que tentasse relaxar. E se ele não viesse mais uma vez...

50 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Que maravilha, senti a sua aproximação, com alegria fui me entregando. Que madrugada feliz em sua companhia. O dia já estava pleno quando ele partiu. Não antes do meu pedido: Volte, mesmo que de vez enquanto, não me abandone querido Sono.

Sonia Medeiros Imamura Poeta, Carioca, Cidadã buziana, Paraibana parte do pai, Mineira parte de mãe. Idealizadora e fundadora do Projeto Grupo Cultural Fazendo Artes em Búzios. Organizou as I - II e a III Antologia Poetas Fazendo Arte em Búzios e a I Antologia Poetas Fazendo Arte “nas Gerais”. Participou de inúmeras Antologias, recebeu vários prêmios culturais. Faz parte: Grupo Cultural Fazendo Arte em Búzios; Cercle Universel Des Ambassadeurs De La Paix - Suisse/France; Divine Academie des Arts Lettres et Culture - France; Academia de Letras e Artes Buziana, RJ; Academia de Letras do Brasil-RMBH-MG; Academia de Pan-Americana de Letras e Artes, RJ; Artilheira da Cultura do Centro Literário do Forte de Copacabana, RJ; Academia Internacional da União Cultural, SP; Associação Internacional de Poetas, MS; GREBAL, Grêmio Barramansense de Letras,

Contos | 51

JARDIM ENCANTADO Artista Plástico: João A. Afonso Técnica Acrílico sob tela Impásto (tinta em particular a de óleo) é espalhada numa área da tela, ou mesmo em toda a tela, de forma tão espessa que as marcas dos objetos utilizados para pintar (p.ex. pincel, espátula) são visíveis na pintura).

Minicontos 52 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Poemas à Flor da Pele • Volume 14 | 53

Sigrid Spolzino Porto Pontes

O passarinho A manhã segue com uma brisa fria, as folhas das árvores embaladas em seu alongamento matinal.

Uma poetisa sai p’ra sua caminhada diária, tão logo, observa do outro lado da calçada, um passarinho acompanhando-a com seus passos rapidinhos, parece querer ir até a esquina.

Onde será que ele pensa ir, que caminhando chegará mais rápido que voando?

Sigrid Spolzino Porto Pontes É de Brasília, mora no Maranhão e é Professora na empresa Universidade Corporativa da APAE Uniapae e Secretária de Estado na empresa Secretaria da Pessoa com Deficiência do Maranhão - Solidariedade. Escritora e Poeta!

54 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Zaira Cantarelli

Lembranças Naquela manhã fria o cheiro de café passado na hora desandava pela casa e ela aquecia o coração com boas lembranças; Pensava: Também éramos seis...

Sorvia com saudade a saída os filhos para a escola, para o trabalho, para a vida no calor de um abraço e de um beijo melado.

– Vai com Deus!

Hoje ao sabor da solidão, só a quentura do café!

Zaira Cantarelli É de Cachoeira do Sul, mora em Porto Alegre/Tapes. Com formação em Letras, escritora e poeta, Coordenadora do grupo VIVAPALAVRA.

Mini Contos | 55

Imagem: Pinterest

Crônicas 56 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Poemas à Flor da Pele • Volume 14 | 57

Álvaro Luiz Cardoso

Utópicos desejos Quando chega o Natal e o Ano Novo vem, os bons sentimentos e os efusivos desejos utópicos afloram e predominam nas mais variadas reflexões e mensagens.

“Feliz” é o adjetivo mais falado, escrito e desejado. O “estado de felicidade” parece baixar, como um e decreto viral, à revelia de todas as mazelas e imponderáveis desatinos humanos. A crônica conjuntura sociocultural e econômica humana de carência, dor e falta de empatia, construída e sedimentada em dois milênios de cabresto filosófico e religioso, à revelia do revolucionário Jesus que pregava: “Amai ao próximo como a ti mesmo”. E ainda mais conspurcando seu santo nome em vão, em guerras de genocídio praticadas em seu santo nome! Isto nos permite fazer esta crônica da falta de gentileza humana para com a natureza ao redor e para com o seu próximo.

Não posso deixar passar a violenta destruição ambiental pela qual o nosso planeta, outrora azul verdejante, está sendo submetido 58 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

em função de ganhos capitalistas espúrios e desnecessários. Pois se o planeta acabar também acabará a espécie que o está destruindo.

Ou alguém acredita que possa se alimentar de moedas de ouro, euro e dólar?

Seria muito bom se quem tem o poder de fazer “muitos” serem felizes ao mesmo tempo fizesse a sua parte. Mas para os “pobres mortais”, estes, se fizerem UM ser humano feliz, já está bom demais!

A noção de felicidade para cada um tem notáveis semelhanças e diferenças. Às vezes um simples copo d’água pode ser a motivação para quem não tem água potável. Para outros uma taça de champanhe é a marca imprescindível desta noção tão variável! A felicidade sofre de nuances extremas de pessoa para pessoa, de país para país, de crença para crença. Para bilhões um charmait nunca conseguirá matar a sede! O olho d’água é bem mais embaixo!

No final o melhor é que a felicidade vença! Mas felicidade geral e irrestrita mesmo, só quando a hipocrisia for banida dos códigos de comportamento socioculturais. E mesmo com tudo isso, os utópicos poéticos e sensitivos acreditam na mudança que há de vir!

O Bem que advir no vento do grandioso advento da Paz e da Felicidade! Isto que só a pessoa humana pode e precisa conseguir. ©️ Álvaro Luiz Cardoso 22/12/2019

Álvaro Luiz Cardoso Escritor/compositor/cantor/produtor cultural, bacharel em Teatro/USP. Reside em Amparo (SP).

Poeta independente/performático da geração 70, em SP, com cinco obras publicadas/esgotadas.

Realizou as Passeatas Poéticas de 1979/80/81 em SP e interior. Correspondente do Núcleo Acadêmico de Letras e Artes de Buenos Aires, da ALAB, Búzios-RJ e da UBE-RJ. *1º Lugar Concurso “Celebração 10 Anos Poemas à Flor da Pele”, Porto Alegre - RS, out/16; *2º Lugar Nacional 7º Prêmio Buriti Cronicontos/2016, Conto; *1º Lugar Concurso Internacional Coletânea Sem Fronteiras pelo Mundo v.2, Prosa. Lisboa, Portugal, 16/03/2017 e RJ 15/6/2017. Premiado em: *3º Lugar no Concurso Internacional Coletânea Sem Fronteiras pelo Mundo v.4, Prosa. Cartagena das Índias, 28/03/2019. *3º Lugar no Concurso Internacional de Literatura da UBE-RJ, Prêmio Maria Clara Machado, Categoria Dramaturgia, peça “A Secretária Prestimosa”, 30/10/2019. *2º Lugar no Concurso Internacional de Literatura Paulo Leminski, categoria Poesia, de “Poemas a Flor da Pele”, 9/11/2019, Porto Alegre, RS. É coautor em dezenas de antologias. Último lançamento: “Poêntico”, Editora Somar, 7/11/2019, Porto Alegre, RS.  cardosanto2010@gmail.com

Crônicas | 59

Ana Luiza Conceição

Qualquer Coisa No portão a menina bate palmas.

A princípio não entendo o que ela quer, já que a vejo de longe.

Ela quer qualquer coisa.

E lá vou eu tentando lembrar que qualquer coisa posso alcançar, assim, no meio de uma tarde, onde a refeição já foi consumida.

Passo à mão duas maçãs e, mais o que? Nada mais. Está bom para não chegar de mãos vazias, penso.

Ela sorri. Pergunta o meu nome.

Fernanda e sua pueril beleza cativam o meu tempo.

Treze anos. E a escola? Vai quando pode. Gosta de ler. Qualquer coisa.

– Espera um pouquinho, vou buscar algo pra te dar, digo.

São tantos! Escolho o de capa mais colorida.

– Olha só Fernanda, é um livro de poesias e aqui, (apresso as páginas) estou eu!

Ela olha a foto como num ping pong visual.

60 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Tímida diz: tá mais bonita aqui, tia! Reflito velozmente, verdade. Na fotografia a alma sempre deixa escapar algumas particularidades.

Não consigo adivinhar, no entanto, o que passa por sua cabeça.

– Legal, diz ela. Tem muita gente aí.

– Sim, muita gente e muitas poesias.

– Legal, repete. Qualquer dia apareço, tchau, valeu tia!

E sai mordendo a maçã como se devorasse uma macieira.

Acabou aí? Não, era o começo.

Algumas horas depois na padaria do bairro, na fila, surpreendo-me.

Sobre o balcão interior a Antologia, a de capa mais colorida, espia o meu espanto.

Será? Pergunto então, dissimuladamente, sobre o livro. Elogio a capa.

A moça diz sorrindo: a gente trocou por pão com uma garota de rua, de tanto que insistiu. – Ah, falei, legal! Calei o resto.

O resto era tudo naquele momento. Finalidade.

Pode parecer bobagem, mas me senti grande, mais do que versos e palavras. Vi a poesia em ação. Fez toda a diferença.

Feliz é aquele que pode matar a fome. De qualquer jeito. Com qualquer coisa.

A vida escreve sobre nossos dias, deixa recados. É preciso , mais do que estar alerta, querer lê-la.

Eu li Fernanda.

Ana Luiza Conceição Gaúcha, terapeuta Holística em Sincronicidade, terapeuta de Práticas Integrativas e Complementares, bem como Conselheira Social. Há 10 anos participa das Antologias do grupo que se tornou Associação Cultural Poemas à Flor da Pele, onde exerceu a função de Diretora Nacional. Autora também em outras tantas antologias, como Poeta Mostra Tua Cara (vários volumes), Fazendo Arte em Búzios, Versos e Universos dos Poetas e Sem Fronteiras pelo Mundo. Livros Reiki para Reikianos, Crianças Indigo, Educando Crianças Indigo, também contaram com a sua coautoria, junto ao Dr. PHD Egídio Vecchio.  ana-gaia@hotmail.com

Crônicas | 61

Arahilda Gomes Alves

Natal sem medo Nunca chegou tão rápido: já é pré-natal! Não sei se é a terra com seus movimentos de rotação e translação ultrapassando quilometragem permitida, sem que o radar escondido entre as nuvens os perceba ou se é o bom velhinho Noel, que ansiosamente, quer esvaziar o saco cheio de atribulações congestionado pelas intempéries catastróficas da natureza e da humanidade. Suas renas já não suportam toda a carga. Pedidos de paz, saúde e felicidade soam ocas saturadas de um repetir da boca para fora.

Pessoas correm às lojas sobraçando embrulhos e os entregam, antecipada e impacientemente. Festas de confraternização “pipocam” por todos os lugares. Sinos tangem canções natalinas, ansiosos na conquista de corações empedernidos.

Noel anda incrédulo com os adultos. Mas, com as crianças redobra-se de carinho. Pelos anos afora, épocas natalinas, demonstra ao adulto, que é através do bom exemplo que a criança crescerá sadia e sem medo. Puxa as orelhas dos grandes alertando que não é só nesse período, que se deva praticar a terapia do “mea culpa”.

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Que sarcasmo e orgulho de muitos, jamais se ocultarão sob a carcaça da hipocrisia, que sempre condena. Sofrido, Noel vê mãos, que se levantam, punitivas, aos gestos complacentes. Os ressentimentos, aos gestos de perdão. Os sarcásticos sorrisos, ao riso franco e leal. Assiste, reiteradas vezes, às perversidades sem que a justiça humana as condene. Desolado, ouve pregões de paz em aumentativos do perdão, da auto - absolvição, mas pratica-se a guerra.

Nem bem descansa no macio tapete de nuvens azuis e brancas para o sono reparador, ouve o ribombar de canhões e armas deflagradas exterminando seres inocentes.

Pálpebras cansadas e nariz, antes acostumados ao perfume da natureza, à brisa delicada do ruflar de asas angelicais, a contaminarem-se nos pós de inúmeras drogas absorvidas por crianças e adultos, assassinos de si próprios e de irmãos.

Pobre velhinho Noel, sempre confiante na humanidade, cada vez mais perversa desafiando leis divinas e humanas!

Desgastado Noel gozando de invejável reputação perante Deus, mas reconhece que seu empenho o deixa frustrado e impaciente. Refaz novos e incessantes pactos com Deus: pede mais um ano de moratória.

E acrescenta em seu enorme saco de brinquedos, o penhor das muitas joias da bondade, da sabedoria, da sensatez e do amor...

Peça à mamãe Noel que o ajude orando: Que seja cesariana/ A mensagem da canção/Agora tudo emociona/Serve de motivação. /Fazê-los chorar, jamais/ Nem tão pouco resistir/Que venham outros Natais/Pro coração se abrir!

Arahilda Gomes Alves De Uberaba, MG. Formada em Artes, Pedagogia, Orientação e Supervisão e pós-graduada em Expressão e Comunicação. Participante de várias Antologias bilingues. Membro de várias Associações literárias no Brasil e no exterior. Poeta, compositora, conferencista cronista e escritora com 4 livros –solo e uma Trilogia a ser lançado ano em curso, mais um Ensaio sobre Hinos que Uberaba canta, nos seus 200 anos de cidade. Escreve semanalmente há37 anos nos jornais locais. Dois primeiros lugares em 2018 em Porto Alegre em Concurso à Flor da Pele (contos) e FLI Guadalajara (México) (crônica) Vice-presidente em segunda gestão Academia de Letras do Triângulo Mineiro. Vários diplomas, certificados, medalhas e troféus. Encenou projeto diferenciado (resumido e falado em português com alunos de canto locais) aprovado Lei Rouanet: Pelos caminhos da ópera-As bodas de Fígaro (Mozart).

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Astrid Kampf Beutler

Retratos da sociedade: a minha, a tua, a nossa...

Entrei na fila do supermercado com o carrinho cheio... A fila estava grande e... o inevitável para a minha pessoa: comecei a conversar com a senhora a minha frente... Ela tinha quatro artigos no carrinho e contou que ontem foi à casa de uma comadre: encontrou-a neste verão de “assar” embaixo das cobertas, na cama, às 10 horas da manhã. É claro que perguntei; – Mas ela está doente?

– Depressão...

Admirada eu: – Noooossa!

Ela continuou: – Eu disse para ela: “Sai da cama que vou te levar a um lugar que você vai gostar. Toma um banho e aguarda que já volto”. Quando voltei ela tinha levantado, mas não tinha tomado banho. Insisti e ela foi para o chuveiro. Estava toda acabada. Mas consegui levá-la 64 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

para o salão de beleza e mandei fazer uma reforma geral ao que ela respondeu: Mas eu não tenho dinheiro... Mas eu disse: Eu te trouxe, vai por minha conta... Façam nela todas as renovações possíveis...

Depilaram, pintaram, fizeram escova progressiva, maquiaram, fizeram unhas e ela saiu outra, dando risada... Hoje eu fui lá e entrei na cozinha onde a encontrei sorrindo como há muito não a via fazer...

A isto eu perguntei: – Mas qual o porquê da depressão? Ela não tem família?

– Tem sim. Três filhos drogados.

Chegou a vez dela no caixa. Dos quatro artigos passou três e disse: – Vou ver se o meu dinheiro dá para o quarto. Era um pacote de algodão.

O dinheiro não deu. Ela não o levou. Mas o dinheiro dela deu para a reforma geral da amiga no dia anterior...

Desta gente o mundo precisa.

E mais ainda daquelas que saberão de um caminho para acabar com as drogas que estão acabando com nossos valores.

Astrid Kampf Beutler Nasceu em Ijuí. Cresceu em Cachoeira do Sul. Formou-se em matemática na UFRGS. Trabalhou em escolas bilíngues em São Paulo e dedicou-se ao estudo de Francês, Inglês e Alemão, foi bolsista do Pädagogische Austausch Dienst na Alemanha. É Primeira Vice-Presidente da AJEB São Paulo

Crônicas | 65

Claudete Silveira

Covid-19 Em toda minha existência não havia me deparado com situação sequer parecida.

E de repente tudo muda, parece que o mundo ruiu, algo mais forte, invisível a olho nu, passa a fazer parte do dia a dia e atinge diretamente os nossos medos, tira o sossego, muda o sono, se faz presente como se tivesse vindo para ficar. Medo, pânico, angústia, sensação de impotência. Um inimigo que chega de supetão e nos coloca a nocaute. E, vem o distanciamento social, o confinamento, o afastamento do trabalho e de todos aqueles que amamos e que não moram conosco. E o abraço faz falta, o almoço em família, o encontro com os amigos, as saídas no final de semana, zanzar rua afora sem nenhum compromisso, sem destino definido. Viver, apenas viver, sentir o sol na pele, o vento batendo no rosto, respirar o ar da rua, mesmo sendo ele poluído tantas e tantas vezes. Sentar à toa na praça e observar as brincadeiras das crianças, rir sozinha.

Triste olhar a vida lá fora apenas pela ótica da minha janela. Tudo parado, lojas fechadas, pouquíssimas pessoas na rua. A rua que até então era agitada, barulhenta, silenciou.

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Notícias e mais notícias, televisão, internet, jornais, atualizar dados, procurar por soluções, quanto tempo irá durar tudo isto? Ninguém sabe. Fake News rolam internet afora, apavoram muita gente.

Afinal, em quem acreditar? Difícil compreender uma situação nunca vivida desta forma, não neste século ao menos. O mundo parou, foi preciso parar. Não importa ter dinheiro, situação social e financeira estruturada, o vírus é tão potente que atinge todos a quem consegue chegar. E é letal, muita gente morta, de todas as idades, raças, credos, como se estivesse sendo feita uma varredura no Planeta Terra.

Profissionais da saúde e dos serviços essenciais diretamente envolvidos correm riscos absurdos. Muitos já vieram à óbito na tentativa de salvar outras vidas. Hospitais lotados, falta de leitos, respiradores insuficientes, roupas de proteção inadequadas à situação. E ainda assim, é preciso estar ali, fora o juramento feito, salvar vidas.

Caos instalado mundialmente. Muitos desempregados, sem dinheiro, sem ter de onde tirar e a solidariedade mais uma vez se faz presente e a ajuda chega dos mais diversos lugares. Alimentos, material de higiene, máscaras de proteção. O empenho é geral, da pessoa simples que oferece o que pode, ao empresário bem sucedido.

O governo oferece ajuda financeira por 3 meses a quem vive da informalidade, vira um caos, o sistema não funciona direito, lotam os bancos e a Receita Federal e o desespero toma conta de quem depende desse pouco e que no momento é com o que podem contar.

Quanto tempo viveremos essa pandemia ninguém sabe ao certo. O que sabemos é que muitos de nós usamos esse tempo para refletir e valorizar a vida. Com certeza seremos bem melhores depois de tudo isto.

Claudete Silveira Abril/2020 Claudete Silveira Reside em Porto Alegre. Participante ativa da Associação Cultural Poemas à Flor da Pele desde a sua criação e atual Presidente da mesma (gestão 2017/2021).  clauzinhaadm50@gmail.com

Crônicas | 67

Dariely de Barros Gonçalves

Fadas Existem!

Fadas existem! Eu conheço algumas, várias até! A começar pela minha mãe, que me gerou, amou, depois, me ensinou, encaminhou, conduziu e, até hoje, continua a ralhar e a lamber as suas crias, mais que amadurecidas, porém, aos seus olhos, crianças que ainda não cresceram. Além dela, também, minhas avós, bisavós, minhas tias, que tive o prazer de conhecer, conviver e ensinaram-me o quanto é bom ser neta, bisneta, sobrinha e, consequentemente, mimada, acarinhada, protegida sem limites ou restrições. Dentre minhas fadas, destaco, ainda, minhas primas, colegas e amigas, misto de cumplicidade e parceria nas aventuras, nas agruras, nas transgressões, diversão.

Mas, hoje falarei de uma fada em especial, minha madrinha na Academia de Letras, Zaira Cantarelli, que não possui vara de condão, todavia, possui pelerines, medalhas, inúmeras publicações, muitos prêmios e uma bondade infinita em seu coração.

Zaira é escritora e poetisa cachoeirense, radicada há muito em Porto Alegre, mas que, seguidamente, volta a sua terra natal para 68 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

ter com seus conterrâneos e levar um pouco das artes literárias, seu dom e seu legado para aqueles que quiserem e tiverem a sensibilidade para percebê-la.

Zaira é inspiradora, é alma pura, sentimentos à flor da pele, que transbordam em forma de poesia, pois “quem escreve estende olhares”, disse-me ela, uma vez. “Num pranto oceânico com o peito alagado de tristeza afoguei sorrisos”, poetiza ela, contudo, muitos sorrisos se fazem transbordar, através da sua grandeza, talento e generosidade, pois não os guarda apenas para si, ao contrário, os distribui a quem deles precisar e quiser, em forma de poesia e de verso em suas andanças pelo estado e pelo país, levando cultura.

Zaira é mais um dos expoentes cachoeirenses que se espalharam por outras paragens, estendendo aquilo que de melhor temos aqui, gente boa, talentosa e de valor.

Mesmo assim, ainda há quem duvide que fadas existam, eu, porém, jamais! Conheço várias, todas elas me tocaram com seus corações, seu amor, sua benignidade, humanidade. Com elas, por elas e através delas, cresci, aprendi, transcendi. A elas e para elas, todo o meu amor, admiração, gratidão, devoção!

Sim, fadas existem! É só olharmos ao nosso redor para sabê-las!

Dariely Maria Cabral de Barros Gonçalves Tem 54 anos, casada, advogada, natural de Porto Alegre, RS, residente em Cachoeira do Sul e nesta cidade graduou-se em: Ciências Jurídicas e Sociais pela UNIVALI, 1987 e Pós-graduada em Direito Processual Civil pela ULBRA, 2006; é Acadêmica de Bacharelado em Filosofia – UNINTER. Fez, ainda, parte da Diretoria da Subseção da OAB pelo período de vinte anos, onde foi uma das fundadoras e coordenadoras dos projetos JUS Mulher e OAB vai à escola; cronista, com mais de cem crônicas publicadas: nos jornais “O Correio” e Jornal do Povo, este jornal que a laureou como Destaque expressão cultural, Jornal do Povo, em 2019. É membro do conselho consultivo da AMICUS – Amigos da Cultura de Cachoeira do Sul. Foi Oficineira, no projeto Sepé Tiaraju, “Educação contra a violência”, do MP/RS. Atuou, e ainda tua, como palestrante junto à escolas públicas e particulares sobre cidadania, a importância da leitura/direitos da mulher, violência...

Participou de duas coletâneas internacionais: Diálogos, pela Editora Gaya e Antologia Poética, pela CAPOLAT; é membro correspondente da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves, de Porto Alegre, RS, ocupando a cadeira 13; artista plástica; recebeu, também os prêmios: Voto de Louvor – Conselho Federal OAB e o Prêmio Mulher 2009, Saul Júnior, em Porto Alegre, RS.

Crônicas | 69

Elizabeth Remor Krowczuk

O conflito de viver na pós-modernidade Nós vivemos em uma sociedade contraditória a chamada pós modernidade, onde os indivíduos carentes de pautas tradicionais de comportamento e com um futuro incerto, devem decidir o rumo de suas vidas e eleger constantemente entre múltiplas opções e ofertas que lhes apresentam e que nem sempre podem controlar.

Ao nascer perdemos o aconchego, a segurança e a proteção do útero. Estamos a partir de então solitários, começamos a vida em perdas e nela continuamos paradoxalmente no momento em que perdemos algo, outras possibilidades surgem. Ao perdermos o aconchego do útero ganhamos os braços do mundo. Ele nos acolhe, nos encanta e nos assusta, nos eleva e nos destrói! Continuamos a perder, e também seguimos a ganhar. Perdemos primeiro a inocência da infância, a confiança absoluta na mão que nos assegura, a coragem de subir uma escada, andar de bicicleta sem rodinhas. Porque alguém ao nosso lado nos assegura que não nos deixará cair... E ao perdê-la, adquirimos a capacidade 70 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

de questionar. Por que? Perguntamos a todos e a tudo... Abrimos portas para um novo mundo e fechamos janelas, irremediavelmente deixadas para trás... Estamos crescendo, vivendo os ciclos da vida: nascer, crescer, adolescer, amadurecer, envelhecer, morrer e renascer? Com o passar dos anos vamos perdendo aos poucos alguns direitos e conquistamos outros.

Perdemos o direito de poder levantar a voz, cobrar bem alto aos gritos, quando algo nos é tomado, o direito de dizer absolutamente tudo que nos passa pela cabeça sem medo de censura e causar melindres. Assim se pessoas tão próximas nos parece feias, obesas e desleixadas tememos manifestar nossa percepção. Receamos dar risadas da roupa ridícula da vizinha, ou puxar as pelancudinhas do braço da avó com a maior naturalidade do mundo e ainda falar em tom alto sobre nossa percepção. Estamos crescidos e nos ensinam que não devemos ser tão sinceros, e aprendemos a ter um comportamento não verdadeiro. Assim vamos adolescendo...

A puberdade e a Adolescência é uma época da vida com grandes modificações ela é caracterizada por uma crise narcísica e de identidade com angustias intensas quanto à autenticidade e à integridade do self, do corpo e do sexo. Ganhamos peso, seios, pelos, altura e conquistamos o mundo. Nesta etapa vivemos um grande conflito. O mundo todo nos parece inadequado aos nossos sonhos.

Ah... e os sonhos! Ganhamos muitos sonhos. Sonhamos dormindo, e acordados. Sonhamos o tempo todo, mas de repente caímos na real.

Estamos amadurecendo e todos nos admiram por demonstrar-nos equilibrados, contidos, ponderados. Com o passar do tempo perdemos a espontaneidade e passamos a utilizar mecanismos de defesa, o raciocínio, a razão acima de tudo. Mas, não é justamente essa condição que nos coloca acima dos demais? E dos outros animais?

A racionalidade, a capacidade de organizar nossas ações de modo lógico e racionalmente planejado?

Vencendo etapas, continuamos amadurecendo, ganhamos um novo carro, um companheiro, um diploma. Infelizmente perdemos o direito de dar gargalhadas, de falar alto, de andar descalço, Crônicas | 71

de tomar banho de chuva, e lamber os dedos após comer doce ou fruta gostosa! Mas apertamos a mão de todos, ganhamos novos amigos, um bom salário. Ganhamos reconhecimentos, honrarias, títulos honorários e a chave da cidade. E assim vamos ganhando tempo... Enquanto envelhecemos com lucidez.

De repente ao defrontarmos diante do espelho percebemos que ganhamos algumas rugas na face, ganhamos celulite, estrias, aumento de peso, sentimos dores nas costas, coluna e /ou nas pernas. Mudamos o visual, perdemos cabelos. Nos damos conta, que perdemos o brilho nos olhos, esquecemos nossos sonhos, deixamos de sorrir... Perdemos a esperança e sentimos o peso da idade, e estamos envelhecendo. Não podemos deixar de fazer algo quando estivermos morrendo.

Afinal quem nos garante que haverá mesmo um renascer? Exceto aquele que se faz em vida, pelo perdão a si próprio ao compreender que as perdas fazem parte da vida. Mas, que apesar delas, o sol continuará brilhando. E chove felizmente de vez em quando e as nuvens são passageiras. Que a primavera sempre chega após o inverno, e necessita do outono que o antecede. Que a gente cresça e não envelheça simplesmente, que tenhamos dores nas costas e alguém que as massageie. Que tenhamos rugas na face e boas lembranças dos anos vividos. Que tenhamos juízo, mas mantenhamos o bom humor e um pouco de ousadia. Que sejamos racionais! Mas lutemos por nossos sonhos... E, principalmente que não digamos apenas eu te amo. Mas, apenas de modo que aqueles a quem amamos, sintam-se amados mais do que saibam-se amados. Afinal, o que é o tempo? Aprendi que o meu dia só será melhor se eu mesma for capaz de transformá-lo em um jardim florido. Que felicidade não é o que elege, mas sim o que são os valores de meu ser!

Elizabeth Remor Krowczuk Natural de Joaçaba (SC), radicada em Porto Alegre (RS). É Médica, Psicanalista Clinica, Neuropsiquiatra, Psiquiatra, Sanitarista, Pesquisadora. Professora Adj. UFRGS e Universidades Espanha e UE. Escritora, Poeta, Artista Plástica, Crítica de Arte, Literatura e Cinema. Doutora em Filosofia y Ciências da Educacion/ Universidad Santiago de Compostela, España; Doutora em Toxicologie/ Universite René Descartes Paris V, France. Comendadora e Chanceler Membro do

72 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Inst. Cultural Giuseppe e Anita Garibaldi, Brasil. Embajadora Euro Americana Prêmios Destaque VICTORIA Internacional, Uruguay. Embaixadora do FAC Infância; AAAmor às Crianças; ABPHepatite ; e Inst. Câncer Infantil-RS. Escritora e Poeta, Acadêmica Imortal Efetiva da Academia de Letras do Brasil–ALB/RS, Cadeira 35; Acadêmica Imortal Efetiva da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências /ALPAS 21/RS, Cadeira 99; da Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG. Member Effective IWA/ International Writers And Artists Association-USA.Miembro Inst. Ibero-Americano IDPH; e Inst. Avanzado de Creatividad Aplic (ES), e do Grupo EduCreArt, Ciudades Europeias Criativas y Calidad de Vida Gr. Compostela, España e Européenne Union/EU; Inst.Cultural Português-Membro Honorário da Comunidade Luso-brasileira RS-Brasil; Casa do Poeta Latino-Americano/CAPOLAT. Movimento Nacional Elos-Literários. Delegada Internacional CAPOLAT; Membro da Diretoria AJEB/Nacional e RS; e Conselheira Assoc. Cultural Poemas à Flor da Pele/RS; e AGEI Publicações: no Brasil, Uruguay, União Europeia e USA. É Autora: 40 Livros; 30 Revistas Internacionais: artigos e pesquisas científicas, Literatura e Poesia; Coautora mais de 115 Antologias e Coletâneas Internacionais: c/poesias, crônicas, ensaios literários; Participa há décadas em Feiras de Livros no Brasil, Uruguay e Europa. Livros mais destacados: Autora “Drogadicción en la Adolescencia, Políticas de Acción, Modelos Educativos de Prevención”,USC/ España;” Creatividad en la Adolescencia”, IACAT/Espanha; “La Psicoanálise y Homossexualidad en la Adolescencia”,España, Brasil,2011; “Medicina Psicossomática e a Psicossomática Psicanalítica” Brasil, 2012; “La Vida y Obras Dr. David de Prado Díez”,España,2017;”A VIDA em Poesia IV,V”, Helvetia, Portugal, 2019,2020 Coautora del Libro Coleción Poetas Del Mundo;”Siete Poetas Del Brasil”,Uruguay,2018;”Autores Luso-Brasileiros”, Portugal, Brasil, 2019. Desde 2004 publicações Revistas Internacionais (20): Rev. RecreArt, Rev CrearMundos, Rev.EduCreArt, Ciudades Europeas Criativas y Calidad de Vida (Espanha, França, EU); Revistas no Brasil (10). Rev.SBP, Rev.ABENEPI; Rev.IGAG; Rev.EduArt; Rev.ADVERSO-UFRGS; Rev.CAOSótica, ICP. Publicou poemas e crônicas em Jornais (10): Jornal SBP; Jornal Enc Esp IGAG, Jornal. Eco do Vale,BG /RS; Jorn. ADVERSO-UFRGS; Jorn. UFRGS; Jorn. Caravela-RSletras-RS. Publicações no Brasil Antologias e Coletâneas Internacionais: desde 2009 participa Coautora nas Antologias da “AGEI”; “Palavras AJEB/ RS”; “Poemas à Flor da Pele: Contos, Crônicas e Poemas Vols. 2,9,10,11,12,13,14”,2020; “ Contos & Crônicas Poemas à Flor da Pele Vol.4”, 2020, Ed.Somar;”Antologia Literária Casa do Poeta Latino-Americano-40ª. “CAPOLAT, 2019.Coletâneas “Literatura: Sentimentos & Razões Vols. I, II, III,IV”,2020 ;”Col. Imortais Vols. I, II, III, IV”,2020, Ed. Alternativa/ ALB-RS, 2020; “Coletâneas Movimento Nacional. Elos & Literários Vols.2,3”,Ed.Alternativa,2020”:Col.Exclusivos II”,Ed. Alternativa, 2020.Col.”Primavera”,2016,Ed. Oikos/Gaya; Coletâneas Intern: ”Entreolhares”; “Travessia”,2017;”Inspiração”,“Gaya”,2018;Col .Int. “Malabarista do Tempo”; “Paraty”; “Diálogos”, 2019 ,Col .Int.”Vozes do tempo”, 2020, Ed. Gaya / ALPAS 21/RS, c/autógrafos nas últimas doze Edições da Feira do Livro de Porto Alegre/ RS; Paraty/RJ. Premiações: Distinções Internacionais e Nacionais p/ obras científicas e literárias. É detentora mais 55 láureas representadas por: diplomas, medalhas, troféus, comendas, espadas e outros. Prêmios vencedora de concursos Literatura e Poesia do FECI e CAPOLAT. Premiações mais destacadas: “Grau/Titulo Comendadora e Chanceler” p/Instituto Cultural Giuseppe e Anita Garibaldi/IGAG, Brasil/Itália. “Embajadora Euro Americana Prêmios Victoria”, Uruguay. Prêmios Internacional mais destacados: “Troféu Master Internacional e Creatividad Aplic.1997e 2005”, España; “Troféu Victoria Prêmio destaque Internacional Ciencias ,Cultura,Al Art y Quehacer Social 2017,2019”,Uruguay; No Brasil: “Troféu Obirici 2014”, RS; “Troféu Anita Garibaldi 2015”; “Título Comendadora IGAG 2015 “,e “Colar Comenda Anita Garibaldi 2015”;o “Espadim Duque de Caxias 2017” e “Espadim da Paz IGAG 2017”; distinções: “Grau de Chanceler IGAG 2018”, condecorada ”Espada Bento Gonçalves da Silva IGAG 2018”; Comendadora e Chanceler distinção “Troféu Loba Capitolina IGAG 2019”, Brasil / Itália; “Troféu Dama Poemas à Flor da Pele 2016”; “Selo Excelência Cultural 12 a.

Poemas à Flor da Pele 2018”;” Medalha Personalidade Poemas 2018”, destaque “Excelência Cultural 12 a. Poemas à Flor da Pele 2018”;”Moção de Aplauso participação como Jurada do Concurso de Imagens VII Poemas à Flor da Pele 2019”;”Moção de Aplauso! Á Mulher Notável Poemas à Flor da Pele 2020”;” Troféu Homenagem e Gratidão AJEB 2015”; “Medalha Mérito Cultural AJEB 2017”, RS/ Brasil: Premiada “Medalha Mérito Cultural Poético 2018 c/a Poesia “Vida Passageira” XI Concurso do FECI e CAPOLAT 2018. Distinções;” Medalha destaque Membro Efetivo Movimento Nacional Elos-Literários,2020”; “Medalha Senhora da Literatura MNEL 2020” Distinção “Prêmio Autor Leitor Luso Brasileiro 2018-RS”, Brasil. Em Itabira/ MG; Destaque do Ano “Troféu Carlos Drummond de Andrade 2017”; dest. Literatura “Troféu Mario Quintana 2018”, dest. Mulheres Notáveis Literatura “Troféu Cecília Meireles 2019”, Profissionais da Saúde “Troféu Carlos Chagas 2019”; Melhores do Ano “Troféu Clarice Lispector 2019”;” Troféu Rui Barbosa 2020”, MG. Embaixadora c/ distinção “Diploma Honra e Mérito combate Câncer Infantil 2015-2018”, FAC/SP; e Ass.Assist.AMOR /RJ; e Inst.Câncer Infantil RGSul; “Diploma Honra e Mérito Atuação voluntaria Portadores de Hepatite e Transplantes 2015-2018”, da ABPH/SP, Brasil.  eremor@terra.com.br

Crônicas | 73

João Riél

O engano dos ipês O mês de agosto que legalmente era conhecido como muito frio e cinza, laureado com grandes geadas e até mesmo neve, vem sendo deturpado pelo calor fora de época, sinais de novos tempos, uma consequência das desmedidas e imprudentes atitudes dos humanos que habitam a terra. Mas algo que chama atenção, quando lançamos um atento olhar sobre as matas que compõem o cenário ondulado da nossa região e Estado, são as várias flores dos enormes ipês, que ludibriados pelo clima, sobressaem e antecipam sua floração, poucos sabem que o ipê também é conhecido por tabebuia, pau-d’arco, peúva, entre outros contidos no glossário.

O ipê que legou no passado ao Brasil, quando ainda em formação, valiosas e requintadas mobílias, por ser uma madeira muito resistente, hoje ornamenta praças e alamedas de cidades, desde as mais pacatas até as maiores selvas urbanas, sua casca tem poder medicinal, inclusive para gripe e tosse, eis que com tantos desequilíbrios climáticos, a saúde de muitos indivíduos padece, 74 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

até a flor do mesmo pode ser salutar e usada na alimentação humana, porém é algo pouco notório aos cidadãos, da nossa “Pátria amada Brasil”.

Entre tantos devaneios presenciados nos últimos tempos, se forem aqui citados faltaria até espaço (desemprego, violência, corrupção, mazelas políticas, etc..) fatos que deixam os brasileiros maculados e atônitos, podemos assimilar que não só os ipês são enganados pelos nocivos efeitos climáticos, a metáfora pode ser usada, por nós mesmos, que a todo dia somos enganados e manipulados não só pelo clima, quem dera fosse, nosso engano advém dos líderes e governantes superiores, de todos os Três Poderes da sociedade em que estamos (IN)felizmente inseridos, quando ligamos a televisão ou ouvimos o noticiário, somos metralhados por tanta negatividade, num liame lúgubre, onde dificilmente conseguimos ficar imunes ou a tanto pavor.

Um Brasil onde há tudo e ao mesmo tempo falta tudo, aqui diferente de muitos países, tudo que se planta produz, existe tanta inversão de valores, tanto poder concentrado em mãos de poucos, uma casta privilegiada, que acaba sempre por usurpar direitos dos menos favorecidos e descamisados, ao passo que grandes fortunas são aumentadas por criaturas que não se preocupam com a vida da grande massa brasileira de vulneráveis, não só na seara de direitos fundamentais, carece uma orientação valorativa, cultural, voltada à educação, até o lado espiritual das pessoas está perecendo, para poder assim ser tecida e permeada uma voraz mudança, na conjuntura parca em que o país se encontra.

Claro, não devemos generalizar, dentro desse tabuleiro hediondo e sombrio, há sempre uma minoria de noticias boas e alegres, de pessoas que motivadas por dias melhores, semeiam e edificam ideias construtivas em todos os hemisférios desse mundo de Deus e ainda bem que elas existem, caso contrário, nossos dias seriam ainda mais incertos e enigmáticos.

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Enquanto isso, sigamos como os ipês de agosto, que mesmo enganados pelos efeitos globais do mundo contemporâneo, florescem prematuramente, espalham energias positivas aos olhos de quem ainda os vê, murcham e rapidamente se vão, acabando o suntuoso ciclo. Que o nosso otimismo por dias melhores, não seja efêmero como a floração dos ipês de agosto, que emolduram por curto tempo, o cenário de nossos dias. O Brasil precisa de mudanças.

P.S: A lei 6.507 oficializou a flor do ipê como a flor nacional do Brasil.

João Riél Manuel Hübner Nunes Vieira Telles de Oliveira Brito Pós-Doutorado em Direito pela Universidade de Messina-Itália. Mestrado e Doutorado em Direito pela Universidade de Lisboa-Portugal. Pós-Graduado em Direito Civil. Graduado em Direito aos 21 anos. Atua junto ao Tribunal de Justiça do RS e na Justiça Federal-RS. Autor de mais de 18 obras próprias e coautor em mais de 130 antologias, distribuídos em mais de 20 mil exemplares ao público leitor. Membro de várias Academias de Letras, Institutos e Associações afins. Possui uma biblioteca com mais de 3.600 livros disponibilizada aos interessados. Acredita que na longa vida do aprendizado somos todos peregrinos, o caminhante de hoje, poderá ser o guia de amanhã, os que ensinam aprendem e os que aprendem de alguma forma sempre ensinam. Recebeu recentemente o Título Honoris Causa em Letras no Estado do Rio de Janeiro.

76 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Leila Silveira

Teorias de areia Todas minhas impressões da viagem vão sendo guardadas nos bolsos, nos olhos e na língua.

Demoro para começar a registrar, gosto de saborear antes de descrever.

Cada quilômetro corrido é um sem fim de anotações mentais, amontoadas, velozes, como a paisagem que me acena na janela.

A partida é sempre ansiosa, não importa para onde se vá.

Neste momento lamento a volta ser tão rápida, diante de tantos dias em contato com flores, areia, pés descalços, pouca roupa e muita inspiração. Se possível fosse voltar e visitar nosso eu no passado, não deveria ser tão rápido, gostaria de me demorar algumas tardes preguiçosas, observando a menina que fui. Descobriria mais de mim hoje, me vendo no ontem.

Segue a viagem, um senhor tosse, outro resmunga, o ar condicionado marca 23 graus, acho uma delícia, pelo menos fecho os olhos e finjo que trouxe a brisa comigo, quase ouço a passarinhada se ajeitando para dormir.

Crônicas | 77

Ao me despedir da zeladora da casa, ela disse: que pena que a senhora ficou tanto tempo sozinha, mas gosta, não é?

Logo eu que adoro gente, ainda mais bem diferentes de mim, interessante esta conclusão da zeladora, sentiu pena de me ver sem companhia? Pensando bem, o que deve ter chocado a ela, foi não ter televisão na casa. Viver sem companhias até passa, mas sem televisão é um absurdo.

Rio sozinha, vou virar assunto na praia. Eu volto, pra reforçar a imagem, vou sair no bloco de rua da praia, vestida de antena parabólica.

Quase chegando no destino, como é rápido entrar no caos, já estamos num congestionamento, saudades do balanço da rede.

(LS 2015).

Teorias do fim do dia Venta forte e as borboletas voam contra a maré dos ares. É um sabiá da praia, formoso, cheio de si, sabe que me apaixonei e faz pouco caso, dos meus olhares.

Não canta muito e anda sozinho, diferente dos outros que fazem disputas da cantoria mais estridente, (os Quero Queros já ganharam) este é desconfiado e arredio, quase silencioso.

O Bem-te-vi, da pitangueira, é o mais faceiro, toma banho de areia, incha o peito e passa cantada em toda ave que passa pela frente.

As Curruíras, são as metidinhas, parecem comadres sussurrando segredos, de galho em galho sabem da vida de toda passarinhada.

78 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Tantos deles, que não sei dizer o nome, será que passarinho sabe que o homem deu nome a todos? (LS 2017).

Leila Silveira Santo Ângelo /1977 teatro e dança. Novo Hamburgo /2000 entidades Culturais participando Codic, estudando as leis de Políticas Públicas Para Cultura. 2002 Secretaria de Cultura e Turismo de Novo Hamburgo criação inúmeros projetos. Cinema ao ar livre, Mostra de Curtas, oficinas com Gilson Vargas e outros. Produtora e organizadora de Festivais de Teatro, de Dança, de Canto Coral, Semana Missioneira. Produtora e Diretora Teatro Tanabeira da Petrobras desde 2017, Assistente de Direção no curta A Cidade é a Casa, atriz do curta Histórias Estranhas 2. Secretária Colegiado Cinema Canoas. Roteirista em espetáculos de teatro, tem blogs na internet desde 2009, participação em Coletâneas de Poesias de Minas Gerais, Encontros de Poesias na região do Vale dos Sinos e Porto Alegre.

Crônicas | 79

Lilian Rocha

Trânsito I Atravessava a rua enquanto o sinal estava vermelho para os carros. Faltavam trinta segundos, vinte segundos... São três faixas. Avisto do outro lado Ele. Será que é Ele? Está tão diferente, gordo, barbudo, parece desleixado. Será que Ele também me reconheceu? O que será que está pensando da minha aparência?

Dez segundos, paro na segunda faixa, Ele também. Nossos olhares se cruzam, voltamos no tempo. Ele, com um corpo de um verdadeiro atleta, eu, jovial, olhos brilhantes, sorrindo sempre!

O tempo para.

Novamente a contagem de quarenta segundos, seguimos atravessando as faixas.

O tempo simplesmente passou, assim como o desgaste de uma relação e aquele olhar vazio do último encontro que não mudou.

80 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Trânsito II Noite quente, andava pelas ruas da Cidade Baixa à procura de algum amigo para rachar umas cervejas.

Som urbano ecoava, trânsito, conversas, música dos bares e um misto de luzes não psicodélicas com a escuridão das ruas e avenidas, transformavam aquela caminhada em um ritual.

Cada rosto que passava, trazia em sua memória lembranças guardadas no Portal da Adolescência, anos 80, quem sabe 90, Rock Nacional, colegas da velha UFRGS. Já confundia as ruas com o Bonfim, Floresta, Campus do Vale. E isso que ainda nem havia bebido.

Surpreso, esbarra em um corpo, olha nos olhos... Incrível! Era o João, amigo de tantas festas do Kafu. Olha um pouco mais para baixo, João estava de mãos dadas com uma menina de 12 anos, filha mais nova do seu segundo casamento. João aparentava ser um senhor bem-sucedido.

João não ia querer sair com ele para tomar umas cervejas, ainda mais que estava com a menina. João perguntou como estava a sua vida... a sua vontade era de não contar que não se casou com a Claudinha, colega da Física e que não conseguiu acabar a Física, nem tão pouco a Engenharia ou a Contábeis. Bem que gostaria de ter feito Fisioterapia, mas, deixou de lado esse sonho de faculdade e isso também não queria contar.

Respondeu que estava tudo bem, que vivia na Cidade Baixa e que curtia todas as noites, principalmente as quentes.

Ele o fitou, sorriu e falou para a filha: – Hehehe, continua o mesmo o colega do papai. Vamos filhota pegar a mamãe no cinema.

Crônicas | 81

Foi um soco no estômago. João tinha uma vida padrão, formado, com esposa e filhos e moderno... a mulher ia sozinha no cinema.

Foi uma despedida fria, um apertar de mãos, sorrisos amarelos, sequer trocaram whatsapp.

Seguiu a sua jornada, com a certeza de que o seu ritual não poderia acabar assim.

Caminhava pela José do Patrocínio, avistou a Débora, seria demais para ele, não iria suportar. Com os olhos em névoa tenta atravessar a rua, ficou face a face com o Cruzeiro do Sul. Seu ritual se completa. Hoje, bebe com as estrelas, quer melhor companhia?

Lilian Rocha É natural de Porto Alegre, é Farmacêutica e Analista Clínica (UFRGS), especialista em Homeopatia (ABH), Musicista (Liceu Palestrina) e Escritora. Autora dos livros A Vida Pulsa- Poesias e Reflexões (Alternativa), 2013, Negra Soul (Alternativa), 2016 e Menina de Tranças (Taverna), 2018. Coautora do livro Leli da Silva- Memórias: Importância da História Oral (Alternativa), 2018. Coorganizadora da Antologia Sopapo Poético- Pretessência (Libretos), 2016. Membro da Coordenação do Sarau Sopapo Poético- Ponto Negro da Poesia, Acadêmica da Academia de Letras do Brasil- Seccional RS (ALB-RS), Diretora de Organizações Sociais da ALB-RS, Conselheira da Associação Negra de Cultura (ANdC), Membro da Sociedade Partenon Literário e da Internacional Writers and Artist Association (IWA), Acadêmica da Academia União Cultural. Seus poemas são publicados em diversos sites, blogs, antologias, revistas e redes sociais.

82 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Lourdes Morales Dallacosta

Livros andarilhos Os livros nômades vão para lá, vem para cá, estão por aqui e estão por ali, recheados de lições e autênticos aprendizados para o crescimento social e intelectual dos leitores. Essa preciosa bagagem que nós, entusiasmados escritores carregamos conosco precisa ser valorizada. Os livros, lidos e relidos tantas vezes quanto possível, até assimilação e entendimento do conteúdo, manuseados tantas vezes quanto for necessário deixarão para todos o mais valoroso dos tesouros! A humildade, o maior e mais sábio de todos os sentimentos, é o alicerce que nos guia para itinerários corretos, evitando pontes perigosas ou travessias indesejáveis.

Enquanto estamos a caminho, descobriremos o valor do autoconhecimento; aprenderemos que nossas escolhas nem sempre serão proveitosas; ora acertamos, ora somos acertados. As inconveniências de uma decisão mal tomada podem nos levar a um itinerário íngreme.

Crônicas | 83

A literatura nos proporciona ao longo do tempo o conhecimento de nós mesmos e do próximo, através do incansável manuseio de livros, e mais livros, que nos tornarão pessoas especiais. Seremos, então, visionários de um mundo espetacular, vendo e ouvindo o que nos é salutar, o que nos dá bem-estar e nos instiga a sermos solidários com os outros. Aprendemos com essas relíquias e, através delas viajamos dentro de nós mesmos e conhecemos o mundo que nos cerca. Essas transformações em nosso interior possibilitam aperfeiçoarmos nossa vivência aqui na Terra com mais amor, paz e melhor convivência com as pessoas, compreendendo suas limitações, suas verdades e sua visão de mundo. Assim, alcançaremos mais e mais degraus na escada da sabedoria do entendimento e do ser e crescer como pessoas autenticamente saudáveis, compreensivas, solidárias e de bem com a vida.

Asas e… mais asas!!!

Por que minha obsessão, por que estas asas? Elas não se cansam de voar por escolas e mais escolas, espalhando livros, e orientando sobre o poder da leitura em nossa vida? Porque foram esses inseparáveis amigos, os livros que proporcionaram-me ser tudo o que sou e ter o conhecimento que tenho sobre o viver, sobre o conhecimento do mundo e o entender as pessoas nas suas individualidades. Na dança do manuseio dos livros jamais sairemos do ritmo e a melodia cada vez é mais emocionante.

Só a paixão pela leitura nos enriquece, nos fortalece, e nos auxilia a termos condições de voar cada vez com mais intensidade seja qual for nosso tempo e o bastante entusiasmo pelo aprender... aprender e aprender...

84 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Nunca será tarde demais para começar nossas plantações, não importa a hora, ou quem fará a colheita. Ela virá com certeza! Para tanto, olhar sempre para a frente!

Estar em contínuo matutar sobre o agora, o hoje, e deixar o ontem no passado, isolado. O que passou, passou...o caminho que estamos seguindo é neste trajeto que devemos estar atentos.

O que o vento espalhou é difícil juntar, então em frente, alçando voos o quanto mais alto e prolongado na incessante busca do que lhe dá prazer e alegria de bem viver.

Esta é a visão de mundo daqueles que se embriagam de tanto ler, reler, tresler e manter a mente sempre alerta aos novos ensinamentos de outros livros e mais outros livros.

Lourdes Morales Dallacosta É formada em Letras- português/espanhol e respectivas literaturas. Integra a Casa do Poeta de Santa Maria. É membro da Academia de Letras do Brasil e da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências– ALPAS 21 de Cruz Alta-RS, Cadeira nº 62, tendo como Patrona Ruth Farias Larré. É voluntária como produtora cultural, da Turma do IQUE - Centro de Convivência da UFSM, radialista, declamadora, apresentadora, animadora e noticiarista, mentora e organizadora do Aconchego das Artes e Comunicação e, ainda, organizadora do Piqueniques Literário, instrutora de dicção oratória e da arte declamatória.

Crônicas | 85

Maria Alice Ferreira da Rosa

Pipas ao vento Senhor, acalmai os ventos. / Tornai nosso céu azul. Abençoai nossas pipas e papagaios, para que sejam lançadas com muita paz e segurança. Senhor, iluminai nossas almas, para que dela flua uma beleza sincera e harmoniosa. Senhor, tu és soberano, dai-nos a sabedoria divina para transformar nossos sonhos em realidade... (Oração do Pipeiro) Dançam, coloridas, as pipas no ar. Ventos de agosto. Hora de soltar papagaio. Ou pipa, ou pandorga, ou arraia, cafifa, quadrado, pepeta ou ainda outros nomes por esse Brasil afora.

A praia, terreno livre, sem fios, sem trânsito, é o local mais que apropriado para essa brincadeira, que vem de tempos imemoriais, comprovadamente mais de 200 anos a.C, na China. É muito interessante toda a atividade que envolve essa brincadeira – fazer, ou melhor, construir a pipa é uma arte. Que um de meus irmãos, Paulo Cesar, dominava com maestria e tinha paciência de ensinar à exaustão quem quisesse aprender.

86 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Na falta da praia em nossa cidade, usávamos as calçadas e ruas, praças e canteiros centrais das avenidas para empiná-las.

E eram várias ao mesmo tempo.

Uma corridinha, e a pipa solta começava a subir. A arte de dar linha e puxar, soltar e prender, se cabeceava era preciso recolher e corrigir a rabiola.

Para recolher era preciso muito cuidado, ou poderia cabecear e bater no chão, se espatifando e, portanto, estaria imprestável.

Não podíamos desperdiçar o papel.

A cada uma que subia e se estabilizava, a linha correspondente, presa numa lata vazia de ervilha, massa de tomate ou palmito, que era trazida até o chão e firmada com uma pedra grande.

E ficávamos, extasiados, assistindo ao colorido balé aéreo que as pipas proporcionavam.

E desta forma as tardes de agosto se iam entre a escolha dos bambus, seus cortes, a confecção das pipas e a melhor parte, que era empinar.

Se o vento aumentava anunciando chuva, as pipas eram cuidadosamente recolhidas e guardadas para a próxima tarde. Uma relação realmente de carinho, como se as pipas tivessem vida própria. Talvez carregassem em si um pouco do sonho de voar de cada um de nós. Na impossibilidade de subirmos nós mesmos, dávamos linha a nossas pipas, e nos realizávamos ao vê-las voando mais e mais alto.

Assim na vida venho construindo e empinando pipas figuradas. Quantos relacionamentos começaram na escolha do bambu certo, buscado direto na moita, que foi colhido, cortado, aplainado para que as pontas deixassem de machucar. Depois o corte do papel, cujas cores deviam combinar em tons e contrastes agradáveis aos olhos.

Com muito afeto era construída a pipa do relacionamento, e chegava a hora mais terrível: ver se conseguiria empinar esse Crônicas | 87

relacionamento, se dando linha ele iria alto, ou iria cabecear e se espatifar no asfalto da vida.

Se não dermos linha nossa pipa não sobe. O ciúme é a negativa da linha – nega à pipa sua própria natureza de voar alto. E a pipa no chão se quebra mais fácil ainda.

A perfeição da pipa está na altura de seu voo – quanto mais alto conseguirmos empinar, soltando a linha generosamente, mais bonita de se ver, mais perfeita como pipa.

Mas, dando linha, corremos o risco de vê-la se ir para sempre, restando-nos apenas a lembrança de suas cores a sorrirem do alto.

Muitas vezes – que acontece reiteradamente em minha vida – quando minha pipa voava alto, dançando linda contra o céu azul, outra pipa traiçoeira, com cerol, sorrateiramente a arrebatava de mim.

Ou, ela própria, rebelde, por si mesma, arrebentava a linha e se ia, deixando o vazio na paisagem que compunha.

Sobravam-me a lembrança do carinho com que a construí, sua figura a bailar no ar, e o resto da linha que ficava em minhas mãos.

Só quem empinou pipas em criança e perdeu outras depois de adulto sabe a poesia que há nas pipas voando alto, mas não livres. Porque quando se soltam e partem no voo solo deixam de ser pipas, são varetas grudadas em papéis soltos no vento, sem dono, sem destino, sem volta...

Vejo-as, agora, daqui de minha janela, sorrindo para mim e para a praia aqui em embaixo, e morro de inveja das pipas que voam alto e dos moleques que as prendem à Terra.

Que vontade de empinar uma pipa!

Maria Alice Ferreira da Rosa É nascida em São Paulo, SP. Blogueira (Blog de Alice – Alinhavando Letras), publicou, em 2013, o livro de crônicas Alinhavando Letras, em 2016, o livro Pena e Poesia, e, em 2019 o livro de contos O pescador de Sorrento e outras histórias. Participou das antologias O Caminho do Sucesso, Incontro Letterario a Milano, Memórias de Viagem, Senta que lá vem prosa!, Paulistânea e Jardim de Palavras, todas pela Editora Oficina do Livro e ainda da antologia bilíngue Paz e Pace pela A.C.I.MA. ITÁLIA.

88 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Marinês Bonacina

Vidas resilientes Numa tarde de outono, em um posto de saúde da cidade, estou em uma consulta de rotina. Aguardando a chamada para a consulta, distraída, olho as pessoas ao redor, ouço a voz da chamada de cada paciente e percebo uma senhora de mais ou menos 60 anos se aproximar. Ela se locomove em uma cadeira de rodas bem equipada, motorizada que maneja facilmente, porém em seu braço uma guia que está no pescoço de um menino de mais ou menos 10 anos. Aparência de cansada, mas, bem conservada, belas roupas, sapatos e bolsa modernos. O menino com boa aparência, bem vestido, tênis de marca. Mas um olhar perdido para o ambiente, olhando cuidadosamente para todos os lados. Ambos em silêncio aguardam a chamada para serem atendidos, a senhora conduz a cadeira e o menino segue ao lado.

Aproximo-me da atendente (enfermeira), conhecida, amizade de um longo tempo, nos olhamos e digo que “cena triste!”, ela complementa dizendo: “muito triste!”, criança com autismo e a mãe sofreu um infarto.

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Finalizando a consulta vou para a rua, em direção ao retorno de minha casa, rua arborizada, muitas pessoas andando, umas indo em direção ao posto, outras retornando. Ao lado uma banca de jornal e revistas, um senhor empurrando uma cadeira de rodas, gastas e finas, muito usada e retorcida. Com vestes bem simples, chinelo de dedos. Sentada na cadeira uma menina, aparência sofrida, cabelos presos, roupas amassadas e simples. Ambos com olhar assustado, olhando em torno, e para a direção do posto. Fiquei a pensar nesse pai e filha, e em que circunstância da vida teria deixado a menina nesta condição.

No caminho vou tentando assimilar e compreender as duas cenas, que acabara de presenciar, na qual me deparei em um curto período tempo. São pais e filhos que sofrem, em situações desgastantes e contextos diferenciados. Estão recorrendo a um atendimento público, terão eles igualdade em seus tratamentos?

E o que a vida os reserva... Estão todos presos a um determinado destino, em realidades diversas, e então seus caminhos se cruzam por motivos similares. Estes são filhos, e muitas vezes são os pais.

Para seguir neste caminho, em meio às adversidades, há de ser resiliente, pois uma vida está entrelaçada à outra, e dependem entre si.

Marinês Bonacina Jornalista, radialista. Presidente Casa do Poeta Latino-Americano - CAPOLAT. Embaixadora Universal da Paz, Genebra – Suíça - Cercle Universel des Ambassadeurs de la Paix. Consulesa de “Poetas Del Mundo” em Porto Alegre, Z-ENE-RS. Diretora Cultura na Fundação de Educação e Cultura do Sport Club Internacional.  mabjornal@gmail.com

90 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Oneida Maria Di Domenico

Poemas à flor da pele Quando conheci a Poemas, em 2016, estava em plena comemoração de seus dez anos de fundação - jovem, cheia de vida, de expectativas, glamourosa, muito bem organizada por Soninha Porto e muitos outros Poetas renomados e engajados.

Agrega pessoas com diversificados talentos e de muitos lugares, em razão de dar espaço para quem ama o que faz e assim ser valorizado, pois a coletânea viaja por lugares longínquos.

Eu cheguei há apenas um ano. Bastou para me apaixonar, uma vez que, como coautora na Coletânea, deixei expresso um poema que muito amei, esse primeiro foi sobre o Laney.

Encontrei pessoas que me deixaram à vontade e me transmitiram muita paz, sabedoria, solidariedade, por haver uma motivação, qual seja: além do ego, além do nó, e sim ‘um por todos e todos por um’, para fazer laços com o intuito de construir pontes e assim abrir caminhos para ir mais longe.

Agradeço pela oportunidade de conhecer a todos, pois acrescentar e somar torna uma entidade cada vez mais forte, e chama Crônicas | 91

mais talentos que vêm dignificar a arte em todos as suas manifestações possíveis.

Participei de todos os demais aniversários e coletâneas, em 2017, 2018, 2019 e já estou me preparando para 2020.

Registro que com o passar do tempo melhorei minha escrita e minhas amizades, tornei-me mais culta, pois encontrei pessoas com as quais pude conversar sobre minha bagagem já adquirida anteriormente.

A Soninha foi a que mais me exigiu, no sentido de escrever mais, com o que, até poemas sensuais andei fazendo. Ela que sempre alegre, competente, criativa, e um pouco atrapalhada nos faz mais gente do que pensávamos ser.

Enfim, estarei à Flor da Pele até quando Deus quiser, com poemas, crônicas, histórias, estórias e historietas. GRATIDÃO.

Oneida Maria Di Domenico Natural de Campos Novos/SC. Radicada em Canoas/RS. Bel. em Direito. Publicou três livros solos. Participou de diversas Coletâneas/Antologias: Poemas à Flor da Pele de Porto Alegre; Sem Fronteiras Pelo Mundo; Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências (a Palavra do Século 21); Casa do Poeta Latino Americano (CAPOLAT); e, Associação de Jornalistas e Escritores do RJ (AJEB/RJ). Recebeu os Troféus: Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade, Mário Quintana; destaque da Helvétia Edições em Genebra/Suíça; Colunista Bernardo Guedes. Recebeu Medalhas: Mérito Lítero-Cultural Euclides da Cunha, pela Academia de Letras Brasil – Seccional Suíça; Honra ao Mérito – Graciliano Ramos, pela A.M.L; Selo de Excelência Cultural da Poemas à Flor da Pele; Prêmio Literarte de Melhores do Ano 2018. Membro Correspondente da União Brasileira de Escritores - RJ/RS e Mérito Cultural Maria de L. F. Balassiano da AJEB/RJ. Como Embaixadora Imortal da Paz pela Organização Mundial de Defensores dos Direitos Humanos – OMDDH recebeu: Comenda Internacional Diplomata Rui Barbosa; Princesa Isabel; Joaquim Nabuco e, HC em Literatura. Membro Correspondente da União Brasileira de Escritores (UBE/RJ/RS) e Associação Gaúcha de Escritores (AGES).  omdi.domenico@gmail.com

92 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Orlando Sampaio Silva

Não o procure apenas no horizonte Meu pai saiu de casa e não voltou. Esperei um tempo razoável, mas ele não voltou.

Procurei-o. Fui ao seu local de trabalho recente e aos antigos; ele não havia aparecido.

Perguntei por ele a amigos, colegas, conhecidos e vizinhos; ninguém o havia visto.

Fui ao bar em que costumava tomar seu aperitivo; ele não havia estado lá.

Consultei os parentes espalhados pelo mundo; surpresos, ninguém sabia dele.

Entrei em contato com autoridades: a polícia nada tinha a informar; desprezando as veleidades éticas, consultei deputados, senadores e ministros; inutilmente.

Alimentando a esperança de encontrá-lo no isolamento da meditação no mistério do sagrado, também, apelei, nas igrejas, aos padres e aos bispos; as respostas foram sempre a mesma: ninguém sabia do seu paradeiro.

Crônicas | 93

O silêncio total. Desesperador!

Inconformado, saí pelo mundo à sua procura, atravessei mares e continentes, fui a dezenas de cidades, vilas e aldeias, em viagens perdidas.

A busca continuou.

A esperança estava no acaso, no imprevisto, no imponderável.

Certa vez, tendo chegado a um lugar estranho, no qual eu nunca havia estado, encontrei-me, casualmente, com um ser que irradiava a pureza absoluta. Confiante, perguntei-lhe por meu pai, e ele me disse: – “Não o procure apenas no horizonte”.

Não tendo compreendido o significado daquelas palavras, já cansado, prossegui em minha jornada, determinado a encontrar o meu pai.

O tempo passou.

Um dia, lembrei-me do que me havia dito aquele ser puro, e resolvi olhar para o alto. Foi neste momento que, para a minha felicidade, enfim, vi meu pai. Ele caminhava nas nuvens, de mãos dadas com a minha mãe; seguiam tranquilos e amorosos, leves e despreocupados, seu caminho sem fim.

Então, eu, seu filho, vivendo a ventura absoluta, pensei: – Eles encontraram a plenitude do amor e da felicidade sem limites; eles vivem, no tempo e no espaço, o afeto restaurador, que redime, no reencontro definitivo, na eternidade. (23/04/2018)

Orlando Sampaio Silva Nasceu no dia 24/01/1932, em Bragança/PA; É advogado (OAB/SP); antropólogo, membro efetivo da Associação Brasileira de Antropologia-ABA; Mestre e doutor e professor titular (UFPA); é autor de nove livros de antropologia e de poesias, entre estes: “Eros na Poesia” (Ed. Somar, 2018).  osavlis@gmail.com

94 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Roberto Ferrari

Ser poeta O ser poeta é viajar através de um mundo de sensações e emoções. Escrever poesias é conversar com a alma e falar a linguagem do coração.

Muita gente me pergunta por que escolhi o Amor como tema principal de minhas poesias e só tenho uma resposta: Porque o Amor habita a minha alma! Pode parecer a quem não vive o amor, a quem se entregou a um materialismo exagerado que escrever sobre este sentimento é cansativo para quem lê e limitado para quem escreve, mas quero ressaltar que todos nós devemos ter o amor enraizado na alma, sem ele nossa vida seria cinza, não teria as cores da paixão, da natureza enfim o colorido da vida.

Certa vez me falaram que a vida não era uma poesia e discordei na hora, porque o que é a vida se não for uma poesia com toda a beleza da natureza, dos relacionamentos que engrandecem nosso viver sendo bons ou ruins. Sou poeta 24 horas, ou seja, tudo para mim é motivo para escrever poesia. Amo escrever Crônicas | 95

como também amo viajar pela alma e descobrir sua sensibilidade, seus segredos.

Como poeta e uma pessoa sensível, não posso passar um dia sem colocar no papel minhas emoções, uns dias mais tristes e outros mais felizes.

O que me apaixona quando escrevo minha poesia é saber que cada pessoa vai ler de uma forma e o efeito sobre sua alma será conforme o momento daquela pessoa. Já dizia Mario Quintana a minha poesia lê as pessoas e não elas que a leem. Sigo as palavras deste grande poeta, pois esta é a realidade da poesia escrita com sentimentos e não aquela escrita por escrever tão somente.

Conheci grandes almas poéticas na minha vida e admiro a todos eles por serem poetas em tempo integral. Ser poeta é a cada momento da nossa vida, poder enxergar a felicidade ou mesmo a tristeza e saber colocar no papel toda essa emoção.

Agradeço aos grandes imortais por serem fonte do meu aprendizado e de minhas constantes viagens através de suas poesias.

Esta é a confissão apaixonada de um poeta que ama a vida, a natureza e o próximo e sente orgulho em falar de AMOR.

Roberto Ferrari Nasceu em São Paulo e aos 54 anos de idade iniciou sua carreira literária em 2011 e já publicou diversos livros como Sublime Amor, Ventos da Paixão, Identidade Assassina. Pertence a várias Academias de Letras e é Presidente da ACLASP- Academia de Ciências, Letras e Artes de São Paulo e ocupa a cadeira 39 da ABRASCI, cujo Patrono é Vinícius de Moraes.

96 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Rosangela Godolphim Plá

Visão portuária O porto lugar de partida. Ali todo o desconforto da ansiedade deu lugar a visões da costa portuária, lugar de desembarque.

Andando por vielas bem fortificadas havia flores em todas as janelas.

Ensaiavam uma grande felicidade, davam a impressão de não ter, naquele lugar sofrimentos ou enfermidades. Lugar para apaixonar, o amor estaria esperando por mim? Foi então que desci das nuvens, na ilusão me dei conta de que não tinha trazido bagagem. O porto era só um lugar de sonhos guardados no coração. É tão sombrio pensar, que partir para um lugar longínquo, foi só um sonho salvo só na memória. As turbulências da mente, estão cada dia maiores, nas fases de articular os pensamentos.

As nuvens já não estão tão brancas. Ainda assim descortino o cotidiano. Não vejo mais tantos pássaros, os dias estão calados.

As árvores choram, vertem de si lágrimas, nunca tinha visto o cipreste chorar, ou as flores. Até o pé de palmeira chorou derramou água viscosa.

Crônicas | 97

Hoje sonhar com a terra nascida dentro de mim é o maior desafio. Ainda encontro fertilidade no amor à natureza. Meus encontros sazonais com as flores refrescam o calor dos meus pensamentos. Amar a maior riqueza.

E meu porto está em pleno tráfego de embarcações, que levam o amor a todas as cidades, embrulhados com as mais perfumadas flores que encontrei no caminho de volta para casa. Meu porto de Chegada.

Rosangela Godolphim Plá Nasceu em Porto Alegre, Escritora e Poeta, de dois livros solos, ‘Amanhecer da Rosa” e “Olhares de Flor”, Participante de 22 Coletâneas. Associada Adjunta do Colégio Brasileiro de Genealogia.

Acadêmica da ALB- Academia de Letras do Brasil, Seccional RS. Associada da Poemas à flor da Pele. Academia de Letras ALB/ Academia de Literatura do Brasil-Guarapari/ES. Em 2018, recebeu Diploma de Sócia Honoraria do Instituto Cultural Português. Em 2019, Premiada pela Poemas à Flor da Pele na categoria de Artes, tendo primeiro lugar no concurso. E sua pintura exposta na contra capa da Décima Quarta Edição. E recebeu o Prêmio Máscara.

98 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Soninha Athayde

De retrovisores, portões, paredes e caminhos floridos.

Conhecido no bairro há muito tempo, lá vem ele empurrando o carrinho com sobras que vai recolhendo pelo caminho. Vez por outra, a mão fechada aproxima-se do nariz, num típico ato de quem cheira algo. Sim, é uma substância que lhe detona o corpo, mas que o mantém falante. Conhece todos pelas ruas por onde passa. Dá “oi” aos conhecidos mais antigos. Porém, por vezes, descola-se da realidade que o circunda e conversa com o retrovisor de um carro parado. Dialoga com um portão que o acolhe por instantes.

São histórias que vai criando ao sabor da imaginação, ao estado de espírito do momento, com perguntas e respostas cujo enredo vai construindo.

Quem o conhece e o assiste “cheirar”, frequentemente, não se surpreende com estas conversas dirigidas a alguém, digamos, virtual. Credito este comportamento aos efeitos nocivos da droga.

Surpreendente, porém, é encontrar a cena que segue.

Encostada à parede, fala em voz alta. É perfeitamente audível e compreensível o diálogo que desenvolve. Calça botas Crônicas | 99

e está bem vestida. Em torno de quarenta anos, é a idade que aparenta. Com papéis nas mãos, questiona e responde o que lhe perguntam. Às vezes, demonstra exasperação. Em outros momentos, parece dar maior atenção ao que ponderam. Por vezes, desencosta da parede e caminha alguns passos. Retorna, porém, à posição inicial. De quando em vez, apresenta suas razões com veemência, alterando o tom de voz.

Alguns passantes a ignoram. Outros detêm o olhar sobre ela, imaginando alguma situação de conflito que esteja acontecendo.

Há quem, porém, tenha se detido com mais atenção a esta cena. E juntou-se a outro alguém que já estava, há mais tempo, observando a tal senhora. O primeiro observador concluiu que a conversa, que já se estendia por um bom tempo, era uma conversa totalmente virtual.

Ante a surpresa do recém-chegado observador, que imaginava existir um celular escondido sob a roupa, bem como um fone de ouvido, pôde ele ver quando a loquaz senhora dirigiu-se à parede de vidro, empunhando o tal papel e mostrando o que nele havia escrito.

Tudo como se olhos dali brotassem e pudessem ler o que ali estava escrito. Esta cena aconteceu em um supermercado da nossa Capital. E esta pessoa não parecia ter envolvimento com drogas.

Ah! Segundo um funcionário do supermercado, ela é conhecida por tal comportamento.

Algo surreal! Ou melhor, tão real àquela mente que o Pokémon GO estaria já defasado no tempo. Uma realidade virtual que dispensaria o aplicativo, porque construído e elaborado na própria mente do indivíduo. É muita loucura? É!!!

Mas o que dizer de quem procura o tal bonequinho por lugares tão estranhos como junto a minas terrestres? Ou do outro lado da rua, na lateral direita de um poste? E que, para lá chegar, desconecta-se do que está ao redor e numa volúpia de alcançar o tal boneco atravessa a rua sem olhar para os lados?

A realidade virtual é, sem dúvida, um avanço tecnológico de grande utilidade, por exemplo, na medicina e em outros campos do saber. Ela está presente em nossa vida toda vez que projetamos um elemento virtual em nosso mundo de verdade.

100 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Pois é! Quanto ao catador de quase tudo o que encontra, a sua realidade mistura-se à imaginação desaguando numa realidade mais rica, pelo menos para ele. Por que não? É criatura e criador ao mesmo tempo!

E a senhora do supermercado? Acredito que vá pelo mesmo caminho. É criadora e criatura igualmente. Cada um em um território totalmente pessoal e único.

Para que Pokémon? Para que realidade aumentada?

Eu, apostando no hardware e software internos, prefiro caminhar pelo parque descobrindo por trás de alguma árvore, de repente, um cachorro vira-lata marcando território.

Ou, quem sabe, na curva do caminho, esbarre num olhar mais atento, promissor até. Ou, ainda, um conhecido, de há muito, que inicia por um “oi” uma nova aproximação.

Melhor mesmo é caminhar de mãos dadas com aquele alguém. Outra possibilidade é, também, caminhar de mãos dadas com o vento. Ele poderá nos conduzir, mansamente, para a próxima curva do caminho onde nos aguarda a surpresa pelo inusitado: um tapete de flores onde nosso software vai colorir uma nova narrativa para mais um dia no parque.

Somos criaturas criadoras que percorrem caminhos diversos. Nossa origem, porém, é igual na essência.

E quando O VENTO transforma-se em música, como no vídeo que acompanha este texto, sua letra apenas confirma a origem que a nós todos une.

Observação: Crônica publicada em 05 de outubro de 2016.

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Sonia Maria Dürchnabel Athayde Literariamente Soninha Athayde, nasceu e reside em Porto Alegre. Graduada em Letras e Direito pela PUCRS. Lecionou por um tempo. Posteriormente, exerceu o cargo de Assessora Jurídica junto ao Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Ocupa a Cadeira n° 43 da Academia de Artes Literárias e Culturais do Estado do RS, a Cadeira 64 da Academia de Letras do Brasil e a Cadeira 04 da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves. Integra a Associação das Jornalistas e Escritoras do Brasil, a Associação Poemas à Flor da Pele, sendo membro honorário da Divina Academia Francesa de Artes, Letras e Cultura, Paris/França.

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Crônicas | 101

Soninha Porto

Eu gosto de escrever O que não garante escritos frequentes. Às vezes são longos períodos revisitando textos guardados, lendo outros autores, me isolando dos escritos, só vendo filmes na TV, aliás, sou apaixonada por filmes antigos, épicos, de ação e até mesmo os de histórias infantis.

Mas às vezes, estranho meus escritos, não parecem meus, é um estranhamento que me faz rir, por lembrar e reviver os momentos de onde tais palavras brotaram de meu ser.

Do tempo gostoso que vivi com meus pais, sem medos e sem responsabilidades, das peraltices da minha infância, eu era danadinha! Da adolescente rebelde, que pintava e bordava. Ah, e o colégio, ai que saudades! Trouxe amigas pela vida afora, lembro também, era a “Cocotinha da PUC”!

E o primeiro amor? Que sofrimento! Por não saber se era correspondido. E não era. E outros que vieram, parecendo eternos, mas que não eram, inacreditavelmente.

E dos três filhos que tenho? Lembranças e mais lembranças, de quando nasceram de minhas barrigonas e aquela ansiedade de 102 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

ser responsável por novas vidas, que chegavam com toda vontade de viver.

O ontem tem histórias, muitas. Muitos versos cheios de metáforas e sonhos, da poeta bunitinha, mas que hoje, maduramente, supera grisalhos, rugas e dores, a armazenar as memórias.

Estes períodos em branco, me fazem ir pra dentro, bem fundo, viajar por situações das mais diversas, nos vazios e em momentos inesquecíveis.

Penso, muitas e muitas vezes sem respostas que me satisfaçam: – sou escritora mesmo? Ou tudo não passa de sonhos, de ser alguém especial, uma mulher que tem algo a dizer às pessoas, que as toquem como fui tocada pelas minhas vivências e quem sabe tenham semelhanças com as minhas. Será?

Me descobri escrevendo compulsivamente em 2002, tenho centenas de textos espalhados no virtual, em antologias e em dois livros, o doEu e o do Livro em Branco, são quase vinte anos de textos por aí... Lógico, alguns bem ruins, faço mea culpa, mas alguns adoro, como os que fiz a Drummond e a Quintana. Falo em voz alta O Transformação, que está sempre na ponta da língua: Ouço e vejo fantasmas poeta....

Ao rever um texto, escrito há mais de sete anos, surgem as incertezas: porque ser escritora, a vibrar por um ajuntamento de letras e palavras, com sentido ou até mesmo sem nenhum? Tento reagir aos brancos e reajo: – Tenho algo ainda a dizer.

Fico feliz, sinto um chamado interior de movimentar palavras e fazê-las escorrer por poros e dedos.

Novas pinceladas ao texto antigo fez nascer um poema novo. É assim mesmo.

Soninha Porto De Cruz Alta e mora em Porto Alegre/RS. Editora, escritora e Poeta.

Crônicas | 103

Teresinha Couto

Visita à praia de Arambaré Afã, pilotada por dançarinos imortais, singrou pelo imenso mar verde das lavouras de arrozais em direção à Praia de Arambaré, em mais um portal de uma nova história que nasce brilhante, como o sol energizado, apesar de espessas nuvens d’água, encobrindo o azul do céu, com ventos moderados dando-nos uma temperatura agradabilíssima.

Todos com grande expectativa e apreensão pelo novo: o que iríamos encontrar pela frente?

Em 09 de dezembro de 2020, a glória nos invadiu quando A Casa de Cultura abriu suas portas, dando-nos direcionamento aos pontos turísticos da região pelo guia turístico, Paulo Gusmão, juntamente com os Naturalistas, Leandro Pereira, Diretor da empresa Eco Turismo e Flavio Correia, que, ansiosos nos aguardavam e com profundo conhecimento da região, explanaram brevemente dados históricos do Município Praiano/RS, que por volta de 1930, através de um plebiscito passou a se chamar: Arambaré.

104 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Nome indígena que quer dizer: Sacerdote que espalha Luz, isto é, no amanhecer, o sol reflete seus raios na Lagoa dos Patos, dando um tom dourado a toda região. Anteriormente chamada: Barra do Velhaco, onde 80% das terras pertenciam a Camaquã e 30% a Tapes. A localidade foi habitada, inicialmente, por Indígenas da tribo Caingangue. Aos poucos, outros povos foram se instalando e, atualmente, agrega turistas vindos de todas as partes do Brasil, totalizando, aproximadamente 230 mil habitantes. Apesar, do cultivo predominante ser do arroz, os proprietários de engenhos, por falta de incentivos fiscais fecharam suas portas. Hoje, as instalações estão sendo utilizadas como centro cultural da região. Por falta de frentes de trabalho e melhoria nos estudos, a juventude da localidade migrou para as “grandes” cidades. Atualmente a economia do Município é extraída da pecuária, cultivo do arroz e culturismo.

O prédio, aonde chegamos em cima da hora, era um casulo aconchegante e crivado de cultura da região praiana, caracterizada por frondosas figueiras nativas. É uma cidade hospitaleira, de encantos mis, que acolheu em seus braços, o grupo de dança, Inclusão Sem Fronteiras da ACERGS, coordenado por Janete Rhuana Vernes.

Na sequência, a equipe direcionou-nos à trilha das Bromélias Em silêncio, dirigimo-nos à trilha para captar cada ruído que a bela natureza nos proporcionava naquele instante. Onde, foi possível circularmos por 800 metros, com total acessibilidade.

Guiados por corrimãos de cordas, e a cada 50 metros, havia uma placa de alumínio escrita em braile, decodificando cada espécime de arbusto ali encontrado, em um santuário de espécimes raros, de arbustos, flores, frutos e animais silvestres, citando entre eles, o pêssego silvestre, que pode ser utilizado na produção da cerveja artesanal, e a bromélia, a qual, dá um colorido todo especial ao ambiente. Formando assim, um ecossistema preservado por ambientalistas municipais.

Crônicas | 105

Após visitamos o Piquete Ventos Minuano, onde fomos recepcionados pelo Sr. Erion, à moda bem campeira, ao som de violão e cantigas descrevendo o município. Embalada pelo calor da emoção, recitei o poema: Busca da Liberdade, para saudar a todos os presentes.

A seguir, fomos agraciados com um belo almoço oferecido por Clóvis Cavalheiro Da Rosa - Diretor da Empresa de Transporte Portovan, que nos conduziu até o local, juntamente com a estudante Vanessa Veiga, que nos amadrinhou na viagem.

Não há como esquecer do tão sonhado mergulho nas profundezas da Lagoa Dos Patos, a nossa boia, levada nas mãos, fez brotar a confiança mútua conquistada em anos de relacionamentos, e as luzes das estrelas que começavam a brilhar a nosso favor.

Oh, vento que paira no ar, no balanço das ondas da lagoa dos Patos! Os dançarinos bailavam carimbando areia no ar com o tinido de botas e esporas, em ritmo do vaneirão. O calor da emoção, a quarenta graus elevou o coração a uma despedida missioneira.

Breve, voltaremos para tomar o delicioso chimarrão. O retorno foi banhado por uma alegria contagiante de dançarinos do grupo Inclusão Sem Fronteiras da ACERGS.

Teresinha Couto Nasceu em Cerro Largo/RS, em 10 de outubro de 1953. Brasileira, viúva, mãe de um filho.

Deficiente visual total, alfabetizada em escrita e leitura braille. Fez Pedagogia e pós-graduação em Orientação e Supervisão Escolar. Foi Orientadora Educacional de uma escola que atende crianças e adolescentes com ou sem deficiência em Porto Alegre. Ingressou em uma oficina de poesia para alicerçar seu estilo literário. Atualmente faz Literatura Espanhola. Tomou posse da cadeira 124, da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências, como Acadêmico Correspondente, na ALBAS 21. Bem como, da cadeira 66, da ALB/RS.

106 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Waninha Monteiro

Saudades de mãe Muito difícil viver sem nossa mãe. Dói muito. É uma dor que não passa. Se você tem sua mãe agora, cuide dela, visita, leve pra passear. Porque depois que ela partir não adianta chorar. Perder a mãe é como perder um braço, uma perna, um olho. Você nunca mais é uma pessoa inteira. Parece que se foi um pedaço seu, uma parte de você.

Você sonha sempre com ela. A sensação é que ela vem te visitar toda noite. Vem te dizer baixinho: Eu não parti. Estou aqui com você.

Mãe é aquela coisa essencial na sua vida. Tudo que você precisa para viver.

E quando você tem um problema? Precisa de uma ajuda? Ela chega logo pra resolver.

Mãe parece um manual de instruções. Faz isso, faz aquilo, ela sempre dá um jeito.

Crônicas | 107

Quando ela se vai, parece que você perdeu o rumo, deixou o gps em casa.

A conexão com ela não acaba nunca. Você sempre lembra dela, principalmente quando está triste, aflito, pois é só pensar nela, se percebe que não se está sozinho.

Eu sinto tanta saudade de você!

Só de dizer essa frase a ligação completa. Mãe é tudo! Analgésico, antitérmico, antidepressivo. Tudo. Mãe é o melhor remédio! Às vezes a pessoa olha pro céu, fica imaginando-a lá e parece ouvir a voz dela sussurrando em seu ouvido: – Fica calmo. Eu estou aqui.

E assim conseguimos força para caminhar, nessa estrada chamada vida. Mãe: Amor eterno!

A igreja que existe em você É muito comum vermos pessoas se dizendo cristãos. Pessoas que aos domingos vão a Igreja e voltam felizes, iluminados, afirmando: “O culto foi lindo! Estou renovado!”

Mas no caminho encontram cães abandonados, moradores de rua, drogados, doentes. Olham e passam direto afirmando: Precisam de Deus, o governo não faz nada! E só.

Jesus Cristo não agia assim. Não vivia preso na sinagoga. Jesus andava pelas ruas, falava do amor de Deus sim, mas alimentava quem tem fome, curava, dava abrigo, agasalhava.

Acredito que não adianta muito sair emocionada da Igreja com os louvores, sermões e orações se nós não tivermos um comprometimento com o outro.

Eu vou acreditar que somos Igreja quando as ceias de Natal e 108 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Ano Novo, acontecerem nas praças, onde ficam os mais necessitados.

Quando aos domingos, formos para as ruas, assim como Jesus levar Deus, alimento e amor.

A Igreja está dentro de nós. A Igreja somos nós.

Wani Monteiro da Silva Escritora, professora, pedagoga, participou de várias antologias, recebeu vários prêmios, troféus e medalhas, tem um livro lançado.

Tem como objetivo de vida, se renovar a cada dia, repensando seus erros e caminhando para novos acertos. Tem como grandes incentivadores suas filhas e netos.

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Poemas e Prosas 110 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Imagem: Google

Poemas à Flor da Pele • Volume 14 | 111

Adélia Einsfeldt

Liberta-te Descalça o medo do perigoso inimigo da descrença de ti mesmo interpreta o tempo sem constrangimento mistura as cores do destino corta arestas de espinhos quebra taça de fel reacende a vela retira a ferrugem das entranhas desenterra os sonhos arquivados esquecidos na memória desata os nós do desespero 112 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

abre a fechadura emperrada empurra a porta solta o grito preso na garganta ouve a voz da lucidez ou mergulha na loucura resgata a tua vida das garras dos abutres da insensatez derruba a casa das incertezas quebra tijolos de rigidez equilibra em paredes lisas escorrega até o calabouço afoga no poço toda angústia e temor joga no lixo o que não presta e o que resta expõe na vitrine sem preço marcado deixa brotar a semente revela-te carvalho.

Poemas e Prosas | 113

Sutileza Não encontro as palavras perdidas que o vento carrega embaladas nos ramos dançam nas folhas árvores se aninham nos ninhos dos passarinhos ao tocar tuas mãos o coração palpita ondulada vertigem no olhar.

Adélia Einsfeldt Nasceu e reside em Porto Alegre/RS. Escritora e poeta. Publicou livros: Animais se Divertem; PÉTALAS, haikais em parceria ASAS da MADRUGADA e IMPACTO. Ocupa cadeiras nas Academias: ALFRS; ALB/RS; Castro Alves; ALERS; Escritores de Piracicaba/SP; Internacional da União Cultural/RJ; DIVINE - França/Paris. Corresp. ALPAS 21. Membro efetivo da IWA Intern. Writers and Artists Assoc. (USA); Partenon Literário, AJEB, AGEI, Ligia Averbuck IEL, Poemas à Flor da Pele, Movimento Elos Literários Salvador/BA. Publicações em coletâneas e jornais no Brasil e pelo mundo.

114 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Ceres Scheffer

Manhã azul no jardim inglês A luz fria da manhã Pinta de azul Todas as flores E o verde das folhagens Cobre-se de cinza prateado Ando descalça No teu jardim inglês Pra não acordar Os sonhos do teu gramado E quando o sol me descobre... já fui embora Sou sonho colorido No jardim da tua vida.

Poemas e Prosas | 115

De partida Lentamente sem pressa sem vontade de retornar Partir Lentamente sem poder ficar Olhos nos olhos Braços calados Partir (mas...)

Esquecer de se levar.

Ceres Eli Vargas Scheffer Natural de Cachoeira do Sul, professora, com Licenciatura em Desenho e Artes Plásticas, Especialista em Avaliação Institucional e Mestre em Educação é Coordenadora do Núcleo de Avaliação Institucional da Universidade de Santa Cruz do Sul. Escreve poesia com as palavras do coração. Já teve poesias publicadas no Projeto ¨Poemas nos Ônibus de POA/RS e participou de Antologia de Poemas à Flor da Pele e de várias Antologias da AGEI/POA.

116 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Eliana Sebben

Louvores ao vale Ó videiras da minha infância, o céu azul e calmo, Que se mostram fecundas, no ventre do vale.

Vestem rochedos ao longo, nos penhascos mais altos, Ondulando pelas encostas e o verdejante das araucárias.

Quando o vento sussurra nas vinhas, com os cachos maduros, Harmonizando a essência das mãos cheias de sulcos, Onde conhecem caminhos irrepetíveis, Porque o tempo amadureceu a vida.

Toda a graça, todo o prazer da vida em cânticos, Eu prefiro, nas horas difíceis, procurar a videira, Dona dos meus sentimentos, da minha inspiração.

Meu coração bate diferente, numa súbita felicidade, Rainha do meu céu, consoladora dos meus aflitos.

Modesta como os lábios beijados, unindo corpo e alma, Meu olhar vencido veste o vale, no clamor de uma prece.

Que sempre será minha morada, minha liberdade, Poemas e Prosas | 117

E meu coração perdido, devastado, tristemente chora.

Eu me reverto ao vale adentro, nunca desisti!

E os lindos cachos me falam de ti, do teu encanto Ó vale! Não quero mais sofrer e me recuso ficar só Meu exausto coração desesperado, tem cicatrizes O amor da vida sempre foi muito dolorido Os caminhos traçam saudades, Mal compreendo o tumultuar dentro do meu coração.

Vivo de lembranças, Diante da nossa música, nos calamos, Desfeito um sonho, uma realidade, Mas, é tempo de colheita.

Livre, livres para recomeçar, Destino, despejo ... destino, meu destino.

Eliana Sebben Descendente de imigrantes italianos, nasceu na cidade de Bento Gonçalves, em 15 de novembro de 1963. Filha de Recy Bernardo Sebben e Josephina Debona Sebben. Tem três filhos: Dante Emanuel, Monique Ohana, Liana Bárbara, maravilhosos e fabulosos, motivos permanentes de sua alegria e seu maior motivo de viver e de toda sua felicidade. Em 1983 foi destaque especial no IV Concurso Nacional de poesias, em Brasília. Em 1984 obteve o terceiro lugar no XI Concurso de Contos, Crônicas e Poesias, no salão Nobre da Prefeitura de Bento Gonçalves, também em 1984, lançou seu primeiro livro, Um Pouco de Menina, Um Pouco de Mulher, em Bento Gonçalves. Em 1986, na 13-edição do Concurso de Contos, Crônicas e Poesias, obteve o terceiro lugar, durante a comemoração à XIX Semana de Bento Gonçalves. Em 1987, na 14ª edição do mesmo Concurso de Contos, Crônicas e Poesias, obteve Menção Honrosa. Em 1989 lançou seu segundo livro, Lençóis, na Biblioteca Pública de Bento Gonçalves. Em 1997, novamente no Concurso de Contos, Crônicas e Poesias, sobre a festa Nacional do Vinho, 30 Anos da Fenavinho de Bento Gonçalves, obteve o primeiro lugar em Crônica, com o poema Nostro Vino. Em 2005 lançou seu terceiro livro, Poemas para o Amor sem Fim, no salão Nobre da Prefeitura e foi a escritora homenageada na 20ª Feira do Livro da cidade de Bento Gonçalves. Tem participação em várias Antologias, além de homenagens em jornais.

118 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Goreti Ávila

Amar você Amar você é andar por areias movediças É sobreviver a silêncios infindos É encurtar a distância Em sonhos e devaneios É uma espera que consome É uma saudade que dilacera a alma Mas ainda assim O laço não se desfaz E eu continuo Ligada a você Para sempre Nesta vida E em todas as vidas Que eu tiver...

Castelos

Lá fora a chuva cai Devagarinho Constante O barulho da calha A bater no chão, ritmado É música suave Calmaria, acalanto.

No meu coração, é tsunami Furor implacável Pensamentos confusos Sentimentos contraditórios Que jogam na correnteza As minhas verdades, certezas Construídas com tanto cuidado Pela vida afora E que hoje São apenas escombros Do meu castelo Tão bonito Que o tempo não poupou Poemas e Prosas | 119

Desejos Não tenha medo Só tenho doçuras e carinhos quentes Para te oferecer Sem laços, sem prisões onde a corrente é o toque dos dedos A passear por teu corpo Misturando cheiros e gostos, Pelo simples prazer de sentir Sem falsos pudores, sem máscaras Resgatando desejos antigos, Guardados, escondidos.

Que renascem De um laço invisível, tão forte, Que prende, que une O único compromisso É fazer feliz.

Sem amarras, Sem culpa Eterno Enquanto for bom.

Encontro Do improvável Nasce o momento mágico Do vocabulário escasso As palavras mais doces De onde não havia quase nada Muito se desvenda A ternura mais pura Os corações mais cheios De sentimentos primitivos Brota o mais palpável amor A mais genuína poesia O encantamento E as mãos se entrelaçam Os olhos se procuram E o coração se aquieta...

120 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Moço bonito Moço bonito Da pele morena Do olhar enigmático Cheio de segredos Que mexem com minha imaginação E me confunde.

Moço moreno Da voz de veludo Às vezes tão duro Cruel, insensível, Outras tão doce Tão terno Encantador.

Quem é você?

O que quer?

Me desconcerta Provoca Encanta Seduz Moço bonito Da pele morena Adoro você.

Noite sem fim Os olhos secos, insones, Abertos no escuro, Buscam uma luz que não vem.

Tantas perguntas, pensamentos desconexos, Coração em desassossego não relaxa, não para, Não cabe no peito.

Coração sobrevivente, Precisa serenar para continuar a missão Que lhe foi confiada.

E essa lembrança doce, Abranda a tsunami, que se dilui, Noite sem fim Os segredos turbulentos, Retornam aos seus esconderijos no âmago do seu ser Protegidos na escuridão da noite.

Mas há que continuar, de qualquer jeito.

A qualquer custo Só sei que é assim.

Poemas e Prosas | 121

Para sempre O olhar cigano Observa, analisa, pondera Se vale a pena encarar Os olhos verdes Observam, analisam, ponderam O risco, a novidade Quem, o que quer?

Então um gesto De provocação, abusado, Aproxima, envolve, Se estudam, se buscam, se tocam Se reconhecem E o encontro acontece E hoje Passado o tempo Ainda se olham, se analisam E concluem Que um é do outro Inteiro, parceiro Olhar cigano e olhos verdes Que falam Do amor que nasceu Cresceu Virou para sempre Em todas as vidas Que houver Ele vai renascer.

Recomeço Mataram meus sonhos, tive medo Me escondi dentro de mim Censuraram meus desejos e eu os sufoquei Nos porões do meu ser Desmentiram minhas verdades, Me confundi, perdi a noção Cortaram o meu caminho Tive de ir por onde desse Por fim morri por inteiro Numa longa e solitária agonia Me colocaram na terra E ela era forte Era boa E, como Fênix, mais uma vez, Eu renasci.

Maria Goreti Lopes Ávila Nasceu em Caçapava do Sul, e atualmente reside em Cachoeira do Sul. Cursou a faculdade de letras e assina seus trabalhos como Goreti Ávila.

122 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Iara Pacini

Plena solidão Ruídos no silêncio da noite Saem dos pirilampos verde-azulados A voar no castelo do imaginário Constelações brilham no etéreo anil.

Livros pendurados no teto Como abajures de alto valor Na varanda sonhos de outrora Pueris indagações ainda vagas.

Medo é o preço que carregamos Dos labirintos da alma ainda vivos Areias nas vivências sempre à espera Sem viver a dois em plena solidão.

Minuetos no amanhecer Gentilezas de flores e valsas Pequenas lembranças relicários Do ontem recente no peito adormecido.

Poemas e Prosas | 123

Saio da Solidão Cúmplice de todos os sonhos Parceira permanente do fascínio Levei flores para a varanda Levantei arrastei tapetes Deixei o corpo dividido Harmonizei-me feito vinho Bom do néctar ao volume.

Insisti contei contos inteiros Contemplei assim o crepúsculo Da geometria plena daí Diviso o horizonte da vida Percebo não estar mais só Agora tenho o sol Que ilumina veste meu jardim.

Já recupero a esperança As sombras de leve esvaem-se Vem um mundo de belezas Saio de minha saudade Eterna companheira que castiga Solidão se vai como folha solta Em poemas pétalas inventadas.

124 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

João A.L. Afonso

Em 2020 flores somente Flores que encantam, perfumam nosso ser Flores de todos os tipos ao amanhecer Flores coloridas queridas por nós, resplandecer Flores somente pra você meu grandioso ser Flores que encantam, reluzem brilham com o luar Flores de maio que vem pra abrilhantar Flores dos cantos, jardins, das praças, do mar Flores dos campos, do lar venham me abraçar Flores que encantam, mergulham no rio da vida Flores que estão em todos os lugares a me amar Flores que entortam meu coração, minha querida Flores da cidade encantada venham para meu mar Flores em 2020 somente, me buscam me fazem brilhar Flores em poemas, à flor da pele me instigam, me ligam Flores que induzem seu carinho, um ninho o sol a raiar Flores se vestem lindas em todo o lugar se interligam Poemas e Prosas | 125

Flores de agora deste tempo único de amar Flores de beleza pura e singela vejo de minha janela Flores douradas, amarelas, brancas, vermelhas a declamar Flores cheirosas com espinhos cuidados com ela.

Flores dos beija-flores nos jardins a voar Flores das borboletas encantadas musas do ar Flores das abelhinhas que mergulham a contextualizar Flores das carochinhas que vem me cativar Flores dos jardins encantados de um poeta de longe Flores exalam perfumes e são pura lindeza Flores dos bosques encantados, cidades de monges Flores que não terminam são de pura beleza.

Flores então me encantam pela sua sutileza Flores que abraçam minha alma e deixam pureza Flores são meus encantos da vida realeza Flores dos castelos encantados uma fortaleza.

João Alberto Lemos Afonso, (J. AFONSO) É natural de Pedras Altas-RS, escritor e artista plástico com formação em Desenho e licenciado pelo “INPI-909241287”. Na literatura interage com contos em verso e prosa, poesias e na arte trabalha as técnicas de desenho, pintura em acrílico, óleo onde a evolução e a relação do homem com a arte nos transporta para um mundo de imaginação sonho, magia e energia. Uma frase: “O escritor, artista procura estar sempre criando em uma constante transformação do ser, mostrando em seu trabalho o que há de melhor do abstrato, real e simbólico em suas obras, contos e poesias”. Possui mais de 46 exposições, instalações, no Brasil e Exterior. Participação Acadêmica: ALAB - Academia de Letras e Artes Buziana-Rio de Janeiro- Brasil (ALAB) como acadêmico correspondente. ANBA - Academia Niteroiense de Belas Artes Letras e Ciências – Rio de Janeiro – Brasil. Efetivo da Cadeira nº 38 Amadeu Clemente Modigliani. ALAV – Academia de Letras e Artes de Valparaiso no Chile – Chile – como acadêmico correspondente. ALAF - Academia de Letras e Artes de Fortaleza - Ceará- Acadêmico Correspondente. Núcleo de Letras y Artes de Buenos Ayres- Argentina. ALMAS - Academia de Letras, Música e Artes de Salvador – BA como Acadêmico Fundador. ARTPOP - Academia de Artes de Cabo Frio - RJ. ALB- Academia de Letras do Brasil - RJ. www.jafonso.com.br | WhatsApp- 055-49-999444203

126 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Jussara Nodari Lucena

A estação do amor “Um distúrbio nos espelhos O mar estilhaçando seu cinza Amor, amor, minha estação” Sylvia Plath. In Os mensageiros.

O sol sorri ao ver-se refletido nas águas em faiscantes estilhaços de ouro.

Orgulha-se o mar, em sua lenta dança, de seu milagre de parir espumas.

Em estrelas de nácar, transformam-se os beijos dos amantes em noites de lua cheia.

O perfume morno da noite aconchega os vagalumes, quando eles apagam suas lanternas.

Ao dormir, Iemanjá espalha seus cabelos noturnos sobre as águas.

O sorriso perfumado da gardênia cura mágoas de amor.

Nus, os morangos e as maçãs ruborizam-se ao se sentirem oferecidos nas bancas dos mercados.

E eu me envolvo nos véus macios da ternura e voo contigo pelos céus rubros da nossa Paixão. É verão, a estação do Amor.

Poemas e Prosas | 127

A busca “...Em busca da palavra exata me engasguei num horizonte curto demais(...)”

Ana Cristina Cézar. In Chamei uma enfermeira.

Desejei sentir o Infinito, e saí em busca da emoção exata, do sentir perfeito.

Feri minha pele em agudas pedras, arranhei-me nos espinhos, pois queria ver o retrato da Dor. E foi em meus próprios olhos, refletidos no espelho, que sua imagem surgiu.

Não precisei ir para a guerra para saber o que era o Ódio, pois ele estava bem perto de mim: na tua voz.

Nua, cobri-me de geada para conhecer o Frio profundo, e descobri que ele morava em teu coração.

Embrenhei-me na profundez das trevas, visitei escuras cavernas para entender o Medo, e ele habitava em mim.

Pensei em todas as maldades do mundo para ouvir o som da raiva, e ela gritou-me desde a tua boca.

Por fim, traguei brasas vivas para descobrir a exata sensação do fogo, e eis que ela surgiu na minha desconsolada Paixão.

128 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Do silêncio E havia um Silêncio tão vasto entre nós, tão profundo, como antes da criação do Universo, quando nem som nem Silêncio existiam.

Era um obscuro Silêncio, que feria nossos ouvidos com o punhal de suas negras palavras.

Poço de ecos turvos, lago de queixumes, mar de indiferenças, tão vazios eram nossos Silêncios.

De repente o beijo. O suave toque de um beijo.

Em nossos lábios, um roçar de seda, um toque de asas transparentes, o sussurro da Ternura rompeu o Silêncio.

E logo um crescente de álgidas chamas ardeu em nossas bocas como rubro perfume, devolvendo ao Silêncio a paixão de nossas vozes caladas.

Jussara Nodari Lucena Brasileira, reside na cidade de Porto Alegre, Brasil. É graduada em Pedagogia e Ciências Jurídicas e Sociais. Integra diversas Associações e Academias. Possui contos e poemas premiados, e participa de Revistas, Jornais, Antologias e Seleções no Brasil, Portugal e Uruguai. Publicou, em conjunto com o Escritor uruguaio Nelson Guerra, o poemário bilíngue espanhol/português “PINDORAMA - Terra de Palmeiras”. AEDI, Montevideo, Uruguai. Livros solo: “Esta pele que eu não quero mais”, contos. Metamorfose, Brasil. “De Rosas e Punhais”, poemas, Edição Prêmio por vencedora no Concurso “Antologia 300 Poetas Lusófonos Contemporâneos”, GMH - Editorial, Lisboa, Portugal. jussaramarial@yahoo.com.br/ www.jussaralucena.com.br

Poemas e Prosas | 129

Lin Quintino

Fim de tarde Era fim de tarde, à noite se avizinhando Eram as horas mais gastas do dia O corpo cansado da labuta se recolhia ao íntimo de sua casa, num andar trôpego de cansaço.

Os ossos, atravessavam-lhes o vento frio da noite, os pés se recusavam a mais um passo e os ombros vergavam ao peso do tempo.

Olhou, e os olhos furavam a escuridão que se avançava em sua direção como um manto encobrindo tudo.

O sol que anoiteceu antes que ele completasse sua caminhada, o privou do maravilhoso espetáculo que se passava no horizonte.

130 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

De repente, alguma coisa o fez eriçar os pelos.

Neste espaço insondável de medo sentiu o sopro gelado do vento.

Esperou, aguçou os ouvidos... Nada veio...

Cessou o rugir e o agitar-se do vento, agora úmido e pesado caiu lhe sobre os ombros como um lençol que envolve um morto...

Apressou-se nos passos...

Ainda, ouviu o ruído alongado do vento...

Lin Quintino Mineira, poeta e escritora. Graduada em Letras e Psicologia. Autora de nove livros de poemas.

Participa de Coletânea nacionais e internacionais. Faz parte de Poemas À Flor da Pele e de várias academias. Participa, também, do Núcleo de Artes e Letras de Buenos Aires.

Poemas e Prosas | 131

Luciana Pessanha Pires

A marcha Aquela mulher, elemento de transição, condução de água, tornou manifesta a cor de seus desejos.

Suas razões foram expostas ao mundo.

E a todo ser que só faz perder o brilho, ela deixou seu cunho.

Determinou que todos devem encher-se de admiração, de encanto.

E regular os passos, evocar uma marcha, seguir o curso, ser refluxo de água.

132 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Soneto da paz almejada Soneto da paz almejada Haja paz onde o amor esvai-se, avesso e vista-se de luz o pensamento em ardente comunhão, sem tormento qual trigo repartido em franco apreço.

Sem ressalvas a qualquer impostura, a remir o mal que demais se inflama, que se desfrute a paz, tal partitura, comungue o que haurimos da vida: ama!

Renuncia à aridez da armadura surdinando o apelo da intolerância nos trajetos, em gentil tessitura.

Em confluência unirracial, face à vertiginosa circunstância: paz, meta humanitária - essencial.

Luciana Pessanha Pires É natural de Itaperuna/RJ, professora, poeta, escritora, ativista cultural. Experiência em idealização e coordenação de oficinas e concursos literários, curadoria de festa literária e eventos afins. Presidente Emérita da Academia Itaperunense de Letras, membro da Academia Internacional da União Cultural.

Poemas e Prosas | 133

Magalhe Oliveira

Virei poeta e tudo o que eu quiser ser Virei poeta, uns dizem que sempre fui Agora sei! É isso que sou e serei até morrer Extirpei um câncer que queria me matar Da dor da orfandade Com as lágrimas da saudade Fiz prosas e versos Meu corpo virei do avesso No avesso encontrei O que sempre fui e serei A voz que estava tão fraca Brotou forte e ecoa Não mais me calo Travestida das cores da Frida Kalo Farei meus versos Pregando a igualdade Denunciando mazelas e truculências Virei poeta feminista Que sou desde que me construí gente Minhas palavras são instrumentos De defesa de direitos e equidade

134 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Virei poeta, virei lua cheia Sou verso, poema, rima e tudo o que eu quiser ser

Sem qualquer medo de ser feliz Brinco com as palavras e elas brincam comigo Divertidamente, vamos construindo Prosas, versos, estórias, puxadas pelas memórias De outros tempos felizes Somos infância com suas euforias Somos benquerenças e alegrias Somos bruxas, palhaços, bailarinas Equilibristas, acrobatas, cientistas Somos imaginação e ternura Carrinhos de rolimã na ladeira Somos pão na mesa e fartura Palavras em voo, mundo inventivo Onde todos entram na roda Dizem seus versos e não vão embora Nas estórias que invento, tenho como intento Não perder a esperança Sem ela o mundo perde a cor A criança que habita em mim Convida a que habita em você, Para bem alto, recitarmos nossos versos Para combater o tempo da maldade Que teima em querer voltar Versos poemas, para seguirmos em frente Sem qualquer medo de ser feliz Magalhe Oliveira Escritora e Poeta feminista, acadêmica da ALB/RS, cadeira 95, Patrona Patrícia Galvão, integrante da Diretoria da AJEB/RS, Conselheira do Movimento Vento Livre de incentivo à literatura e membro de Agremiações e Coletivos literários. Tem seus poemas publicados em várias coletâneas, dentre elas a Poemas à Flor da Pele 2019. Seu livro solo “Pegadas de elefante que cabem na tua estante” será lançado esse ano e está no prelo.

Poemas e Prosas | 135

Márcia Gonçalves

Vocação Apaixonada por meus filhos, Casada com o magistério, Enamorada pelos meus alunos E fiel às professoras Irmãs que a vida me deu Cadernos, lápis, borracha, Livros, apostilas, papéis, Cola, tesoura e brilhos Habitam meus olhos cansados.

A noite chega... perco o sono...

Vem a inspiração para a aula planejar.

O dia amanhece O show vai começar.

136 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

No palco me apresento, E em cada sala de aula Me alimentando e aprendendo Com a imensa sabedoria De cada criança que amo.

Oração O nome do meu pai, O nome da minha mãe, O nome do meu irmão Eu respeitarei todos, E que chegue em mim seus desejos.

Que eu possa realizar os sonhos deles, Para que não lhes falte o alimento da alma.

Que eles me perdoem as falhas, Assim como lhes perdoo seus entendimentos.

Desejo que não nos deixemos Cair em desamor, E com amor nos livremos Unidos Dos perigos do mundo E das maldades dos homens, Amém.

Marcia Gonçalves É natural do Rio de Janeiro. Reside em Porto Alegre desde 1991. Professora, no ensino infantil e fundamental. Dá aula particular para reforço escolar e aula de Inglês. Gosta de ler, assistir filmes históricos, documentários, visitar museus e ouvir música.

“Meu PAGO é minha paixão “Rio de Janeiro,” mas divido este meu querer com minha QUERÊNCIA amada “Porto Alegre.”

Poemas e Prosas | 137

Marcinha

A chuva do passado O barulho da chuva batendo na janela faz renascer sentimentos de melancolia em que a memória caminha pelo passado para reviver cenários de felicidade à revelia de qualquer desejo de rever o que já não é.

Lembranças desenham-se sobre o vidro e num ato rápido e quem sabe impensado, com urgência, decido abaixar as persianas a fim de tentar interromper o desavisado que insiste e quer invadir meus pensamentos.

Não quero visualizar os retratos de ontem e não terá nenhum raio, trovão ou tempestade capaz de reacender o que trago adormecido e resguardado nas gavetas trancafiadas para que não machuque meu projeto de futuro.

138 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Deslocada No avesso e no apropriado procurei meias verdades para explicar tamanha paixão.

E em tudo que vasculhei só encontrei mentiras em formas de vaidades.

Que me tornaram assim um ser perdido, tonto e deslocado sem entender o que achei e sem um caminho a seguir

Início de romance Um corpo encostado no meu, um beijo colado no meu lábio, uma perna trançada na minha coxa e num instante o mundo tremeu.

Pensamentos em intercâmbio e nasce uma relação hetedoroxa.

Teu abraço logo correspondeu e descansou sobre a blusa roxa.

Dois corações que se entrelaçam e dois corpos que se aterrissam no romance recém inaugurado.

Márcia Fernanda Peçanha Martins Conhecida como Marcinha, é jornalista, formada pela PUCRS, militante de movimentos sociais, sindicais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens pela Zero Hora, Correio do Povo, assessorias de comunicação social empresariais e governamentais. Colunista do site www.coletiva.net, escritora e poeta, com textos publicados em antologias da Poemas à Flor da Pele. Diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/ POA). Mantém o blog: marcinhaprodigio.blogspot.com

Poemas e Prosas | 139

Margarete Soares da Silva

Oceânico O rio treme de medo quando se dá conta que irá se deparar com o oceano, pois sabe que quando ele entrar no mar, ele deixará de existir.

Porém o seu medo passa, quando ele se dá conta que deixará de ser rio, mas passará a ser oceano.

Assim somos nós, cada fase é um aprendizado que nos faz maior.

E quando a gente vê, o oceano já transbordou em nós.

140 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Brevidades Tão bom seria se a morte fosse breve, e tivesse o livre arbítrio para poder dizer: – Vou logo ali e não demora eu estou de volta.

Quietudes Há quietudes e silêncios aparentes, mas que escondem imensos barulhos internos.

Margarete Soares da Silva Publicitária, escritora e poeta, participante de várias antologias Poemas. É natural de Pelotas/RS e mora em Canoas.

Poemas e Prosas | 141

Marilene Huff

Visão do dia da mulher Mulher... Fonte de luz!

O nosso dia são todos os dias do ano!

Somos mãe, amiga, companheira e flor!

Somos mulher, dona do nosso cotidiano!

Estamos escrevendo nosso destino.

Somos poesia, melodia, voz e verso!

Somos a terra, o céu, o sol, a lua, a chuva, a constelação!

Somos dona de todos os dias do universo.

Sabemos que nem todas as mulheres são livres, Mas um dia serão.

Então podemos comemorar o nosso dia com Parabéns a você.

142 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Acordar.

Abrir a janela e ver o sol nascer, receber energias que o sol traz todas as manhãs.

Agradecer a Deus pela oportunidade de morar em Porto Alegre, cidade que escolhi para viver.

Daqui a pouco outras escolhas...

Quem sabe uma janela voltada para o Guaíba vendo o pôr do sol. É uma ideia...

Marilene Huff Aposentada, mora em Porto Alegre. Membro da Estância da Poesia Crioula, Comissão Gaúcha de Folclore e Academia de Letras do Brasil/Seção RS. Participou de algumas Antologias. Contadora de histórias do Projeto Conte Mais.

Poemas e Prosas | 143

Neuza Pinto Nissen

Pele Sensibilidade, amor e dor Saudade agonizante Conforta Passos lentos, sedentos Solidão, ora paz, ora tormento Sensibilidade, mulher Estupro, amarras, sofrimento Arma, tiros, corpo caído Silêncio...

Agressão, não mais Punição sim, embora tardia Impunidade, falsidade A fala da pele O grito do poeta JUSTIÇA, JUSTIÇA JÁ!

144 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Poeta e o punhal Feres o poeta?

Isto é pecado Serás sentenciado Ficará gravado Nas entrelinhas dos versos Sangrando nos manuscritos Do lado triste da história Mas não esperes a fama Teu nome estará subentendido Na vida ou após a morte Poeta é sempre poeta Sentimento é seu nome Ou seu castigo!

Neuza Pinto Nissen Nasceu em 16/04/1953, natural de Porto Alegre, dois livros publicados, Um Anjo Me Conduz e Suspiros Eternos, Editora Beco dos Poetas e Escritores Ltda. Participou das Coletâneas Voo Independente XI e Voo Independente XII, Coletânea Palavras 2012. Organizou Coletânea Diamante Bruto, Editora Beco dos Poetas e Escritores Ltda.

Poemas e Prosas | 145

Paulo Vargas

Olhar de criança Quando o universo abre portas, Para o mundo imaginário, Num solo antes gregário, Mesmo numa visão torta, O que mais importa, É desvendar segredos, De latentes degredos, Numa busca sem busca, Em certa miragem ofusca, Esbarrando no tato dos dedos.

Ao despacito visualiza, Um colorido a mais, De solapados sazonais, Onde universo avaliza, Tornando se uma brisa, Dum deserto a imaginação, Tudo toma direção, Na posse dum egoísta, A esfera frente às vistas, Dum pequeno artesão.

146 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Depois junto a amigos, Aprende e ensina, Utopia frente a retina, Faz que não veja perigo, Num cosmos sem inimigo, Onde sem guerra, estouro, No planeta como calouro, Desafiando seus pais, Os gestos midas para tais, Tudo que toca vira ouro.

Vive muitos personagens, Dentro do próprio eu, Dum cristão a um ateu, Percorrendo mundo em imagens, Aterrissa nas paragens, De herói a bandoleiro, Na noite um luzeiro, Em momento imprevisível, Até mesmo o invisível, Vira o seu companheiro.

O pai vê o concreto, A criança o abstrato, São diferentes retratos, Em distintos dialetos, Por certo seletos, Nesse mundo atlético, Entre éticos e aéticos, Onde pensar não alcança, Que surrealismo da criança, É campo fértil e poético.

A culpa é do trabalho, Será mesmo que é, Os pais num certo sopé, Procuram ficar pelos atalhos, Poemas e Prosas | 147

E num momento falho, Nesse campo não se lança, Não construindo aliança, Permanecendo no terreno, Deixa de lado o pequeno, Não vive mundo de criança.

Mas estas facetas, Vão ficando pelo caminho, E o voo do passarinho, Vai ficando na gaveta, Magias e também tretas, Que foi polindo um viver, Passando a ter outro crer, Eliminando suas imagens, Todos aqueles personagens, Reduzindo num só ser, Quem sabe tempo caótico, Não possibilita a imaginação, De viajar amplidão, Lapidando o ser gótico, E comercial hipnótico, Que nas mentes se lança, Mas nos sábios não avança, Onde o estro se completa, Por certo somente poeta, Tem os olhos de criança.

Paulo Vargas Nasceu em Montenegro. Cursa faculdade de Letras na UNIP, com ênfase em espanhol. Poeta, pajador e declamador, com mais de cento e trinta letras gravadas por grupos e cantores gaúchos.

Tem dois livros publicados, em diversas epígrafes, desde o camperismo gaúcho a temas universais.

Instrutor de danças tradicionais há vinte anos. Pertence à academia literária do Vale dos SinosAlvales. Participa de diversas antologias pela Vivara (editora de Paraíba), Alvales, pela editora Trevo de São Paulo, entre outros.  paulovargaspv@yahoo.com.br, poesiaspaulovargas@gmail.coma

148 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Rosângela de Souza Goldoni

Prosa em poética madura Filha mais velha de três irmãos, sentia-se sozinha.

Entre idades, um fosso nas brincadeiras.

Limitava-se aos amigos imaginários.

Casa de amigos ou amigos em casa (os reais) nem pensar.

Afinal, como no velho ditado, “um é pouco, dois é bom, três é demais”. Ou melhor, naquela casa, suficiente para aquela mãe totalmente do lar. Sem opções, centrou-se nas leituras.

Era tudo que poderia ter e fazer uma vez que residia distante dos grandes centros.

Das leituras às aventuras nos livros de Geografia e História do ginásio, um pulo.

Viajou tanto que conheceu meio mundo numa virtual dimensão inimaginável à época.

Sua escola, por concurso e opção dos pais, ficava num município vizinho. Tão longe de casa e da sua realidade social que só lhe restava ser a primeira aluna da classe.

Mais uma vez sozinha durante a adolescência.

Seus trabalhos de grupo eram individuais.

Poemas e Prosas | 149

A mãe explicava, a professora entendia, a mocinha sozinha.

Classificou-se no vestibular em troca de uma bolsa.

Vida corrida e passada; filhos e neto, uma estrada.

Hoje, senhora e plena de si, livre de amarras, entendeu ser sua melhor companhia.

Exala poesia madura e, no seu olhar, ainda resiste um quê de futuro.

Vida nova Abro portas, até então desconhecidas, para a vida.

Reinvento-me em energias e terapias.

Desafio o frio que me envolve em mantas de nuvens ao amanhecer, dança e movimento, terra, água, fogo e ar.

A natureza alimenta o corpo que se alonga frente ao espelho num renascimento crescente.

Mantras ecoam entre o verde o querer a caminho da Luz Interior!

Minha paz em você.

Rosângela de Souza Goldoni Nasceu em 31/12/1952. Natural de Niterói, RJ, Brasil. Bancária aposentada, hoje bacharel em Direito pela UFF. Afiliada às seguintes Associações Culturais no Brasil: 1) Poemas à Flor da Pele, Porto Alegre, RS; 2) Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil (AJEB/RJ); 3) membro titular da União Brasileira de Escritores (UBE/RJ). Em 2017 filiou-se à APP (Associação Portuguesa de Poetas) e à ACLAL (Academia de Letras e Artes Lusófonas). Participa de diversas publicações coletivas pelo Brasil, crônicas, poesias, revistas literárias. Seu primeiro livro solo foi lançado em 2014 (FIAPOS DE LUCIDEZ) em Porto Alegre. O segundo, OBSERVAÇÕES OUTONAIS, em 2018 na mesma Feira.

150 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Rozelia Scheifler Rasia

Todo dia é santo Todo dia é santo Anjo da guarda Anjo do incenso Anjo do mal Todo dia é santo Pela lança do sol Pelo escudo da lua Pelo ímpeto do amor.

Todo dia é santo Pelo fogo Pelo sal Pela água Todo dia é santo Bem-me-quer, flor-de-lis Areia, deserto Céu, infinito Poemas e Prosas | 151

Todo dia é santo Verbo sacro, marca maldita Êxodo, apocalipse Início-fim-reinício Todo dia é santo Por Alláh Por Deus Por Jeovah

O cinamomo À sombra do cinamomo, na ingênua paz das crianças, confundia o verbo ao traduzir as expectativas do que queria viver com emoções já vividas.

Nos velhos galhos retorcidos, tentava ver o mundo, que ainda se resumia à paisagem ao alcance dos olhos, mas minha alma sentia aquela árvore conectada à força dos ipês e aos segredos das acácias.

A copa do cinamomo era a pirâmide que guardava a infância do mundo espelhada nas imagens do caleidoscópio na dualidade do meu ser e na pluriforma que viria adolescer.

152 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Na tela infinita, o mestre pincelava novas estrelas, a luz amarela refletida no verde mesclava-se às egrégoras visíveis no universo em mandalas entrelaçadas ao arco-íris das antigas luas.

Escondida entre as flores lilases, sentia a harmonia do canto cósmico, mesmo, sem ainda entender o significado das palavras místicas e eternas que vibravam do hades ao paraíso.

O cinamomo, logo, será cinzas, a eternidade, o existir.

A árvore da vida continuará a desafiar as gerações a decifrarem o código do tempo, então, o futuro apagará a elipse das horas e sempre será agora.

Rozelia Scheifler Rasia Reside em Cruz Alta - RS. Idealizadora e Presidente da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências “A Palavra do Século 21” – ALPAS 21 e da Editora Gaya. Prof. Mestre, em Estudos Literários - Crítica Literária - UPF; Especialista em Fundamentos Teórico-metodológicos de Ensino - UFSM / UNICRUZ; Graduada em Ciências Econômicas e Sociais - UNICRUZ; Graduada em Filosofia Ciências e Letras - UNICRUZ; Pesquisadora de arqueologia das religiões; Embaixadora da Paz pela Salotto Culturale “Palazzo Recupero” - Martina Franco/Itália. Integrante de dezenas de academias literárias no Brasil e em outros países. Moderadora do Fórum Universidades Leitoras / Brasil/ Espanha e Portugal. Embaixadora de Prêmio Victoria – Buenos Aires / AR. Poeta, escritora, editora, incentivadora das artes, letras e ciências

Poemas e Prosas | 153

Soninha Porto

Caminhante Por estradas pedregosas profusas de armadilhas e vazios.

Vai por partes: à procura da luz quer suavizar a alma e abrandar o rosto determinado a livrar-se na estrada venturosa de tristezas, iras e desgostos.

Tem amor também muito amor pendurado na bagagem carregada segue mesmo em tropeços sem se importar de só driblar encruzilhadas há que reunir forças mesmo em tentativas absurdas de engolir os nós da garganta.

154 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Esmorecer?

Nunca.

Prosseguir sempre Temeroso ou determinado crê em si, o que o favorece É gente de sorrir de celebrar a vida absorve lamentos e ergue as mãos em preces.

Em enigmas a benzer-se aflora-se em bálsamos dança em pedras pontiagudas como se em tapetes de veludo cantarola sem querer a velha música do Roberto revive a menina feliz lá de dentro ela lhe acena e a faz sorrir por querer onde estás menina?

No imaginário de caminhos poeirentos na incessante busca do amor pleno luminosa de sorriso largo alargando os dias na busca do infinito recheado de tesouros onde estão lapidadas as pedras recolhidas ao longo do caminho brilhante com suas pegadas sabe-se forte, desabrochada, arrojada tênue e leve feito borboleta a voar.

Soninha Porto De Cruz Alta, mora em Porto Alegre/RS. Editora, escritora e Poeta.

Poemas e Prosas | 155

Viviane Schiller Balau

Amor pelas palavras em suas múltiplas formas de amar Quero sentir o amor pelas palavras em suas múltiplas formas de amar; Sentindo em vários versos, em forma de poesia para sentir-me em todo o meu ser; o que sentiremos nessa vida...

Que expressamos em cada forma de amor pelas palavras mostrando que tem um significado que é levado ao céu por um sentimento tão sublime de amor entre quaisquer casais e animais que temos muito amor e carinhos uns pelos outros; e quando perdemos um ente querido sempre sentimos esse amor de uma saudade pelos momentos e as lembranças que se fazem presente que o amor nos faça impulsionar para continuarmos em frente.

156 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 4

Esses momentos que nos fazem pensar que nessa vida o que resta é o VERDADEIRO AMOR. De que sentimos nesse momento de simplificar intensamente e estar vivo em busca de um mundo melhor que nos traz paz e felicidade.

Se encontrarmos uma esplendorosa maneira de poder viver nesses tempos de muita violência nos dias de hoje sem imaginar o que viveremos em cada momento da vida e o que nos espera nesses anos que se passa de não saber se vamos viver ou morrer

Além do horizonte Quero sentir aqui você, Mesmo estando além do horizonte, Saber que tudo está bem contigo Nesse mundo espiritual E quero ter essa certeza que Tua caminhada não foi em vão.

E hoje, o que restou foi...

Apenas a dor da saudade.

Que se transformou numa linda Estrela cadente para trazer um pouco...

De luz e amor nesse coração sofrido Que sente falta do filho, amigo e companheiro de vida.

Que simplesmente se calou para sempre.

Viviane Schiller Balau Mora em Porto Alegre é sócia correspondente da academia cachoeirense de letras/ES, tem certificado de destaque especial, menção-incentivo, participação, e também é ativista cultural, participa de coletâneas e antologias e criou jornal O Mundo Mágico da Poesia que circulou um tempo e teve que parar por falta de patrocínio; e ganhou o troféu Cecilia Meirelles e Carlos Drummond de Andrade. vivis.balau@gmail.com

Poemas e Prosas | 157

Zaira Cantarelli

Abrigo Junto a lareira contemplo a dança das chamas sombras ondulantes deslizam pelas paredes ouço o crepitar das brasas o rumor do vento o hálito do fogo penetra em mim e o frio funde-se ao abrigo de tua ausente companhia.

Zaira Cantarelli É de Cachoeira do Sul, mora em Porto Alegre/Tapes. Com formação em Letras, escritora e poeta, Coordenadora do grupo VIVAPALAVRA.

158 | Contos e Crônicas (e outros) • Volume 14

Irislene Castelo Branco Morato

Presidente Coordenadora da AJEB-MG Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil Coordenadoria Minas Gerais

ROSA BRANCA A Rosa Branca da Liberdade e da Paz é simbólica, mas de profundo significado.

A paz e a liberdade são conquistas de todos aqueles que conseguem o desapego de tudo e de todos. E se libertam para receber o manto de luz e a felicidade suprema da paz íntima. Toda evolução acontece de dentro para fora, passo a passo, com a conquista da sabedoria interior.

Como a rocha, que habita na Terra, no mundo mineral não está estática, nós Humanos agregamos conhecimento que promove todas as nossas mudanças, nos tornam pacíficos e dá significado as nossas vidas!

A Poemas à Flor da Pele é essa “Rosa Branca”, uma menina-moça de 14 anos em 29 de abril de 2020, linda, serena e pacífica que agrega e produz conhecimento. Contando com vinte quatro obras, na sua bagagem com essa obra, que ricamente oferece em Prosa e Verso, crônicas, contos e poemas da mais alta qualidade literária, neste Volume 14.

Serenidade, ser sereno pacífico, transitar entre dois mundos da própria vida. São dois lados da mesma moeda, lá e cá em conexão com planos superiores, através do qual todos nós sejamos pacíficos. A Associação Cultural Poemas à Flor da Pele, com seus Coautores, escritores seletos de todo o Brasil, cumpre esse papel com excelência, transitando em planos diversos do saber, com consistência e qualidade, em todos seus projetos culturais.

Sua Presidente Emérita e fundadora Soninha Porto, ativista cultural, mãe dessa menina-moça, “Rosa Branca”, juntamente com a atual Presidente da Poemas, Claudete Silveira, estão de parabéns por fazer esse fomento Cultural Nacional.

A Física Quântica, a física moderna e a Neurociência estão provando a existência da antimatéria e a existência de vários planos de energia. Somos nós que atraímos, através do pensamento, níveis de energia e conhecimento superiores. Essa informação é preciosa para o nosso crescimento evolutivo, a nossa humanidade. Somos caminhantes desse Universo em expansão.

Com a conquista da paz interior descobrimos a liberdade suprema e a real felicidade.

A caminhada é grande e necessária ao conhecimento, evolução e mudanças intimas de cada um de nós através da busca do saber pela Cultura.

Que a Poemas à Flor Pele conquiste, a cada dia, uma Rosa Branca da Paz!

Sandra Antonioli

Pioneira Poemas, Porto Alegre/RS

Dia desses, ouvia o Professor Mario Sergio Cortella num vídeo e ele comentou sobre o significado da palavra “antologia”. Achei sensacional sua história, dizendo que “antologia” vem do grego e significa ramalhete de flores, de onde vem o antúrio, ou várias flores em um só lugar. E esse livro corresponde realmente a isso: flores e seus perfumes unidos em cada página.

Nesse mesmo tempo, fui convidada a escrever a orelha desse livro Coletânea Contos&Crônicas (e outros), em comemoração ao seu 14° ano. Logo eu, que leio muito, mas não escrevo nada. Nem lembro muito bem qual foi a minha resposta ao convite, mas ela foi considerada afirmativa e aqui estou para contar um pouco desses quatorze anos.

Durante esse tempo, fiz algumas viagens com o grupo, mas também já fui bilheteira, garçonete, conselheira, amiga e dei alguns pitacos. Nas viagens rimos, choramos, tivemos muitas alegrias e até alguns problemas, nada que não pudesse ser resolvido.

Afinal, somos seres humanos (graças a Deus), porém, por sermos assim, tivemos que administrar egos, ciúmes, decepções, frustrações. Esse percurso cheio de altos e baixos ajudou a nos fortalecer como associação e como um corpo coletivo.

Também acompanhei o crescimento de poetas, contistas, cronistas, cada dia mais livres, mais soltos, deixando as palavras fluir através da poesia. Afinal, essa é nossa paixão em comum. Vi muita gente se libertar da maneira mais bonita e lírica, afinando suas palavras, melhorando seu estilo e aprimorando sua estética. Desenvolveu-se, assim, no coletivo, um misto de sentimentos de palavras, ações, razão, coração e, principalmente, humanidade. Essas coisas tão densas que a arte pode nos proporcionar.

E as risadas? Tivemos muitos divertimentos, flertes, namoros, passeios, encrencas e, junto, muito aprendizado. Como crescemos, não é mesmo? Nem tudo o que passamos foram flores, embora algumas estejam, agora, florindo em outro plano: deixaram sua marca nos nossos corações e fazem poesia no céu. É muito difícil resumir esses quatorze anos em uma orelha, mas sou bastante agradecida à Poemas à Flor da Pele, que, através dos meus olhos e ouvidos, me oportunizou conhecimento, cultura e carinho, seja através da música, do teatro, ou da sua razão de existir: as poesias.

Vocês são demais! E até eu já estou escrevendo aí, gente!

Adélia Einsfeldt Álvaro Luiz Cardoso Ana luiza Conceição Anna Maria Petrone Pinho Arahilda Gomes Alves Astrid Kampf Beutler Ceres Scheffer Claudete Silveira Dariely de Barros Gonçalves Eliana Sebben Elizabeth Remor Krowczuk Evanir Plaszewski Everton Nobre Gislaine B Camarata Goreti Ávila Iara Pacini Irislene Castelo Branco Morato Ivanilde Morais de Gusmão Jania Souza João A.L. Afonso João Riél Jorge Du Barbosa

Jussara Lucena Leila Silveira Lilian Rocha Lin Quintino Lourdes Morales Dallacosta Luciana Pessanha Pires Magalhe Oliveira Márcia Gonçalves Marcinha Margarete Soares da Silva Maria Alice Ferreira da Rosa Marilene Huff Marinês Bonacina Neila Santos Neuza Pinto Nissen Oneida Maria Di Domenico Orlando Sampaio Silva Paulo Vargas Regina Guimmaraes Roberto Ferrari Plá Rosângela de Souza Goldoni Rosangela Godolphim Rozelia Scheifler Rasia Sigrid Spolzino Porto Pontes Sonia Mi Soninha Athayde Soninha Porto Teresinha Couto Vilson Santanense Viviane Schiller Balau Waninha Monteiro Zaira Cantarelli