Filosofia autentica

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O pensamento, então, como atividade racional compreensível pelos interlocutores, equivalerá a fazer frases ou proposições com sentido (frase 5); e isso, por sua vez, equivale a fazer frases que representam estados de coisas ou relações entre coisas. A totalidade dessas proposições é a linguagem (frase 6); a linguagem, portanto, representa o “mundo”. Por fim, aquilo que não puder ser dito na linguagem passa a ser considerado como não pertencente ao “mundo” (frase 7), quer dizer, não pertencente ao conjunto das coisas observáveis e representadas na linguagem. O sentido do “mundo” ou tudo o que se refere ao seu porquê é algo que não entra na linguagem, uma vez que não corresponde a nenhuma coisa representada por ela. Assim, ainda que haja algum sentido para o “mundo”, ele está fora do “mundo” (frase 8), porque está fora da linguagem. Wittgenstein não afirma que fora do “mundo” há um sentido. Se ele o afirmasse, não respeitaria sua própria visão e produziria uma “cãibra” mental, pretendendo pronunciar-se sobre algo que não corresponde a nenhuma coisa exprimível pela linguagem. Mas, ao falar de um “fora” do “mundo”, Wittgenstein também não pretende negar que o “mundo” tenha algum sentido. Se o negasse, produziria outra “cãibra”, porque também se pronunciaria sobre algo que simplesmente não faz parte da descrição do “mundo”. Tais cãibras nascem quando se pretende tratar como parte do “mundo” ou da linguagem aquilo que está fora deles.

Ludwig Wittgenstein (1889-1951)

Foi um filósofo austríaco de grande destaque no pensamento contemporâneo. Foi responsável pela revolução linguística que fez a Filosofia concentrar-se na relação entre linguagem e pensamento. Seu trabalho costuma ser dividido em duas fases, marcadas respectivamente pelas obras Tractatus logicophilosophicus e Investigações filosóficas (obra publicada postumamente).

Sem cair nessa armadilha, Wittgenstein não se compromete com um lado de “fora” da linguagem ou do “mundo”. Afirmar que o sentido do “mundo” está “fora” dele significa indicar que algo como um “sentido do mundo” (sua finalidade e mesmo sua origem) simplesmente não pode ser pensado com nossa aparelhagem mental e linguística. Mais coerente, então, é calar-se sobre aquilo de que não se pode falar (frase 10). Wittgenstein reconhece a importância extrema, para a vida humana, de preocupações como essas (o sentido da existência, além de outras que também não remetem a nada de observável diretamente, como é o caso da Ética ou da arte); elas só não dizem respeito ao conhecimento racional. Em outro momento de sua atividade filosófica, Wittgenstein altera aspectos importantes da sua primeira concepção de linguagem e de “mundo”. Escrevendo

O sentido do “mundo” e da vida está fora do “mundo” Ludwig Wittgenstein 1

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O mundo é a totalidade dos fatos. [...] O que é o caso, o fato, é a existência de estados de coisas. O estado de coisas é uma ligação de objetos (coisas). [...] O nome substitui, na proposição, o objeto. O pensamento é a proposição com sentido. A totalidade das proposições é a linguagem. Os limites de minha linguagem significam os limites de meu mundo. O sentido do mundo deve estar fora dele. No mundo, tudo é como é e tudo acontece como acontece. [...] A solução do enigma da vida no espaço e no tempo está fora do espaço e do tempo. [...] Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar.

Filosofia e filosofias – existência e sentidos

WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus logicophilosophicus. Tradução Luiz H. Lopes dos Santos. São Paulo: EdUSP, 1994. p. 275-281 (proposições 1.11, 2, 2.01, 3.22, 4, 4.001, 5.6, 6.41, 6.4312, 7).


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