Design para a sustentabilidade ambiental

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O design do ciclo de vida dos produtos

Tradução do inglês Marcelo Ambrósio

Design para a sustentabilidade ambiental: o design do ciclo de vida dos produtos

Tradução

Marcelo Ambrósio

Título original: Design for Environmental Sustainability: Life Cycle Design of Products

Design para a sustentabilidade ambiental: o design do ciclo de vida dos produtos

1st edition: © 2008 Springer-Verlag London Limited

2nd edition: © 2018 Springer-Verlag London Ltd., part of Springer Nature

© 2023 Carlo Vezzoli

Editora Edgard Blücher Ltda.

Publisher Edgard Blücher

Editores Eduardo Blücher e Jonatas Eliakim

Coordenação editorial Andressa Lira

Produção editorial Ariana Corrêa

Preparação de texto Danilo Villa

Diagramação Guilherme Henrique

Revisão de texto Maurício Katayama

Capa Leandro Cunha

Imagem da capa Cadeira Mirra, © Hermann Miller, Inc.

Rua Pedroso Alvarenga, 1245, 4° andar

04531-934 – São Paulo – SP – Brasil

Tel.: 55 11 3078-5366 contato@blucher.com.br www.blucher.com.br

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP) ANGÉLICA ILACQUA CRB-8/7057

Vezzoli, Carlo

Design para a sustentabilidade ambiental : o design do ciclo de vida dos produtos / Carlo Vezzoli ; tradução de Marcelo Ambrósio. – São Paulo : Blucher, 2023.

392 p. : il.

Bibliografia

ISBN 978-65-5506-770-5

Segundo o Novo Acordo Ortográfico, conforme 6. ed. do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, Academia Brasileira de Letras, julho de 2021.

Título original: Design for Environmental Sustainability: Life Cycle Design of Products

1. Ecodesign 2. Desenvolvimento sustentável 3. Projetos de engenharia 4. Sustentabilidade I. Título II. Ambrósio, Marcelo

É proibida a reprodução total ou parcial por quaisquer meios sem autorização escrita da editora.

Todos os direitos reservados pela Editora Edgard Blücher Ltda.

23-1833

Índice para catálogo sistemático:

1. Ecodesign

CDD 745.4

Conteúdo Introdução ............................................................................................. 17 Parte I Quadro de Referências Capítulo 1. Sustentabilidade e descontinuidade .................................. 21 1.1 Desenvolvimento sustentável ............................................................... 21 1.2 Dimensões de sustentabilidade 28 1.3 Sustentabilidade: um apelo à mudança radical ................................... 36 1.4 Os caminhos para a sustentabilidade .................................................. 38 Capítulo 2. Evolução da sustentabilidade na pesquisa e na prática em design.............................................................................................. 43 2.1 Evolução da sustentabilidade no design .............................................. 43 2.2 Seleção de recursos de baixo impacto 44 2.3 Design para o Ciclo de Vida de Produtos ............................................. 46 2.4 Design de sistema produto-serviço para a ecoeficiência ................... 48 2.5 Design para equidade e coesão social 50 2.6 Estética para a sustentabilidade .......................................................... 54 2.7 Estado da arte ....................................................................................... 56 Parte II Design para a Sustentabilidade Ambiental Capítulo 3. Design para o Ciclo de Vida ............................................... 59 3.1 Introdução .............................................................................................. 59
12 Design para a sustentabilidade ambiental: o design do ciclo de vida dos produtos 3.2 Requisitos ambientais dos produtos industriais .................................. 60 3.3 O sistema do ciclo de vida do produto ................................................. 62 3.4 Abordagem (unidade) funcional .......................................................... 68 3.5 Design para o Ciclo de Vida 69 3.6 Implicações para uma abordagem de Design para o Ciclo de Vida .... 71 3.7 Estratégias do Design para o Ciclo de Vida ......................................... 75 3.8 Estado da arte do Design para o Ciclo de Vida .................................... 80 Capítulo 4. Minimização do consumo de material.............................. 83 4.1 Introdução 83 4.2 Minimizar o conteúdo de material de um produto 84 4.3 Minimizar sobras e descartes ............................................................... 90 4.4 Minimizar ou evitar a embalagem ....................................................... 92 4.5 Minimizar o consumo de material durante o uso ............................... 95 4.6 Adotar sistemas flexíveis de consumo de material (durante o uso) .... 100 4.7 Minimizar o consumo de material no desenvolvimento do produto ... 101 Capítulo 5. Minimização do consumo de energia ............................... 103 5.1 Introdução ............................................................................................. 103 5.2 Minimização do consumo de energia durante a pré-produção e produção 104 5.3 Minimização do consumo de energia durante o transporte e o armazenamento .................................................................................... 105 5.4 Selecionar os sistemas de consumo de energia mais eficientes durante o uso 109 5.5 Adotar um sistema de consumo variável de energia para acompanhar as flutuações da demanda .............................................. 117 5.6 Minimização do consumo de energia durante o desenvolvimento do produto ............................................................................................ 119 Capítulo 6. Minimização da toxicidade e nocividade dos recursos .... 121 6.1 Introdução ............................................................................................. 121 6.2 Seleção de materiais não tóxicos e inofensivos .................................. 122 6.3 Selecionar recursos energéticos não tóxicos e não prejudiciais 131
13 Conteúdo Capítulo 7. Otimização da renovação e da biocompatibilidade dos recursos .......................................................................................... 137 7.1 Introdução ............................................................................................. 137 7.2 Seleção de materiais renováveis e biocompatíveis ............................. 138 7.3 Seleção de recursos energéticos renováveis e biocompatíveis ........... 148 Capítulo 8. Otimização da vida útil do produto .................................. 153 8.1 Vida útil 153 8.2 Por que projetar considerando a durabilidade dos produtos 154 8.3 Projetar produtos para a intensificação do uso ................................... 157 8.4 A dimensão social e econômica da mudança ...................................... 160 8.5 Serviços do ciclo de vida ....................................................................... 161 8.6 Diretrizes............................................................................................... 161 8.7 Projetar durabilidade apropriada ......................................................... 162 8.8 Projetar para a confiabilidade 166 8.9 Facilitar a atualização e a adaptabilidade ........................................... 167 8.10 Facilitar a manutenção ....................................................................... 172 8.11 Facilitar o reparo .................................................................................. 176 8.12 Facilitar a reutilização ......................................................................... 178 8.13 Facilitando a remanufatura................................................................. 183 8.14 Intensificar o uso 184 Capítulo 9. Estendendo a vida útil dos materiais ............................... 187 9.1 Introdução ............................................................................................. 187 9.2 Diretrizes............................................................................................... 193 9.3 Adotar a reciclagem em efeito cascata................................................ 194 9.4 Escolher materiais com tecnologias de reciclagem eficiente 196 9.5 Facilitar a coleta e o transporte após o uso 199 9.6 Identificar os materiais ........................................................................ 201 9.7 Minimizar o número de materiais incompatíveis entre si .................. 203 9.8 Facilitar a limpeza ................................................................................ 206 9.9 Facilitar a compostagem ...................................................................... 208 9.10 Facilitar a incineração 208
14 Design para a sustentabilidade ambiental: o design do ciclo de vida dos produtos Capítulo 10. Facilitando a desmontagem ............................................ 211 10.1 Introdução ............................................................................................ 211 10.2 Diretrizes ............................................................................................. 218 10.3 Minimizar e facilitar as operações de desmontagem e separação ... 219 10.4 Usar sistemas com junções reversíveis .............................................. 223 10.5 Usar sistemas de união permanente que possam ser facilmente abertos 226 10.6 Prever tecnologias e formas específicas para a trituração ............... 227 10.7 Utilizar materiais facilmente separáveis quando triturados ............. 229 10.8 Utilizar peças adicionais que possam ser facilmente separadas após a trituração dos materiais ......................................................... 230 Capítulo 11. Restrições e oportunidades para uma abordagem de Life Cycle Design 231 11.1 Restrições econômicas no sistema tradicional de oferta e demanda de produtos ......................................................................................... 231 11.2 Sistemas de produtos-serviços ecoeficientes: novos modelos de negócios que favorecem a introdução da abordagem LCD do produto .......................................................................................... 235 11.3 Tipos de sistemas de produto-serviço ecoeficientes ......................... 236 11.4 Projeto de sistema produto-serviço para ecoeficiência..................... 244 Parte III Métodos e instrumentos para o projeto e a análise ambientalmente sustentável Capítulo 12. Complexidade ambiental e atividade projetual .............. 249 12.1 Introdução 249 12.2 Métodos e ferramentas de apoio para projetos ambientalmente sustentáveis 250 Capítulo 13. Estimar o impacto ambiental dos produtos: Avaliação do Ciclo de Vida.................................................................... 255 13.1 O impacto ambiental do nosso sistema de consumo-produção ...... 255 13.2 Métodos quantitativos para estimar e analisar o impacto ambiental de produtos 265
15 Conteúdo 13.3 Avaliação do Ciclo de Vida (LCA) ....................................................... 266 13.4 LCA e design: importância e limitações ............................................. 277 13.5 Outros métodos quantitativos para avaliação de impacto ambiental ............................................................................................ 280 Capítulo 14. Ferramentas ambientalmente sustentáveis orientadas para o projeto ....................................................................................... 283 14.1 Introdução ........................................................................................... 283 14.2 Ferramentas de avaliação de impacto ambiental.............................. 284 14.3 Ferramentas de orientação para a geração de soluções ambientalmente sustentáveis 289 Capítulo 15. O método MPDS ............................................................... 299 15.1 Introdução ao método MPDS ............................................................. 299 15.2 MPDS na Análise Estratégica do Produto (e briefing) ....................... 301 15.3 MPDS no projeto conceitual ............................................................... 305 15.4 MPDS em projeto (e engenharia) de produto 313 15.5 MPDS em comunicação ...................................................................... 314 15.6 Ferramentas MPDS ............................................................................. 318 15.7 Exemplo de aplicação do método e ferramentas MPDS ................... 340 15.8 Aplicação do método a diferentes contextos de projeto .................. 347 Apêndice A. Critérios e diretrizes de projeto ....................................... 349 A.1 Minimização do consumo de materiais ............................................. 349 A.2 Minimização do consumo de energia ................................................ 350 A.3 Minimização da toxicidade e nocividade dos recursos ..................... 352 A.4 Otimização da renovação de recursos e biocompatibilidade ............ 353 A.5 Otimização do ciclo de vida do produto 353 A.6 Prolongamento da vida útil dos materiais ........................................ 356 A.7 Facilitando a desmontagem ............................................................... 358 Apêndice B. Diagramas de impactos ambientais ................................ 361 Referências ............................................................................................ 371

Capítulo 1. Sustentabilidade e descontinuidade

1.1 Desenvolvimento sustentável

Nos últimos anos, os conceitos de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade ambiental entraram na agenda política internacional. Entendemos esses conceitos como as condições sistêmicas segundo as quais, em nível regional e global, o desenvolvimento social e produtivo ocorre:

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• dentro dos limites da resiliência1 do ambiente, ou seja, de sua capacidade de absorver os efeitos das transformações antropogênicas sem gerar degradação irreversível;

• sem comprometer as necessidades das gerações futuras, ou seja, preservando os recursos, ou melhor, o capital natural 2 que será repassado às gerações futuras; e

• numa estrutura de redistribuição igualitária dos recursos de acordo com um princípio pelo qual cada pessoa tem direito ao mesmo espaço ambiental, 3 ou seja, à mesma disponibilidade de recursos naturais globais.

1.1.1 Introdução do conceito na agenda internacional

A questão ambiental, entendida como o impacto dos sistemas de produção e consumo sobre o equilíbrio dos ecossistemas, começou a ser percebida, na segunda metade dos anos 1960, como consequência da aceleração e difusão da industrialização. É possível lembrar então, nesses anos, dos incidentes de poluição dos lagos norte-americanos, das primeiras catástrofes ecológicas em função da limpeza feita em mar aberto dos tanques dos navios-petroleiros ou ainda das mortes causadas pelo smog em algumas cidades industrializadas.4 No entanto, é a partir do início dos anos 1970 que começam a surgir as primeiras pesquisas científicas sobre limites e problemas ambientais. A deterioração e o esgotamento dos recursos naturais como efeitos indesejáveis do desenvolvimento industrial começaram a ser estudados e discutidos em nível internacional. Os limites naturais de nosso planeta, tanto em relação ao desenvolvimento técnico e produtivo descontrolado quanto ao aumento da população mundial, começaram a ser

1 A resiliência de um ecossistema é sua capacidade de sofrer uma ação de dano sem desestabilizar irreversivelmente seu equilíbrio. Esse conceito, estendido a todo o planeta, introduz a ideia de que o sistema natural no qual se baseiam as atividades humanas possui alguns limites de resiliência, além dos quais se iniciam os fenômenos de degradação irreversível.

2 O capital natural é o conjunto de recursos não renováveis e de capacidades sistêmicas do meio ambiente para produzir recursos renováveis. O termo também se refere à riqueza genética, ou seja, à variedade das espécies que vivem no planeta.

3 O espaço ambiental é a quantidade de energia, água, solo, materiais não renováveis que podem ser utilizados de forma sustentável. Ele indica quanto do ambiente uma pessoa, uma nação ou um continente possuem para viver, produzir e consumir sem ultrapassar os limites da sustentabilidade.

4 Em Londres, em dezembro de 1952, milhares de pessoas morreram por causa do smog de inverno, chamado “a fumaça de Londres”. O termo foi cunhado nesse período unindo as palavras smoke (fumaça) e fog (névoa).

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Capítulo 2. Evolução da sustentabilidade na pesquisa e na prática em design

2.1 Evolução da sustentabilidade no design

O quadro destacado no capítulo anterior revela um crescimento do papel potencial do design, devido ao crescente interesse na inovação de produtos e serviços (não mais somente no processo) e nas mudanças sobre a percepção da qualidade de uma determinada oferta: sua dimensão cultural e estética. Assim, veremos como esse papel crescente realmente adentrou no ensino, na pesquisa e na prática em design. Para isso, buscamos jogar luz sobre sobre as diferentes dimensões pelas quais o mundo do design interpretou e desenvolveu a sustentabilidade.1

1 O que se segue descreve a evolução nos países que atingiram uma industrialização madura.

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A partir dos anos 1970, muitos teóricos e acadêmicos iniciaram um processo de enfoque na seleção de recursos com baixo impacto ambiental, tanto em relação aos materiais quanto às fontes de energia. Os principais temas foram, e ainda são, a eliminação de substâncias tóxicas e o uso de materiais e recursos recicláveis, renováveis e biodegradáveis.

Desde a segunda metade dos anos 1990, o foco foi alterado parcialmente para o nível do produto e para o design de produtos com baixo impacto ambiental. Esse período evidenciou quais os impactos ambientais de um produto e como avaliá-los; o conceito de ciclo de vida foi introduzido e o conceito de unidade funcional foi recontextualizado em termos ambientais.

No final dos anos 1990, com o início de uma interpretação mais rigorosa a respeito da sustentabilidade ambiental (que requer mudanças radicais nos padrões de produção e consumo), parte do foco foi movido para o design de Sistemas Produto-Serviço ecoeficientes, 2 estabelecendo um enfoque consideravelmente mais amplo em relação ao projeto de produtos individuais.

No início dos anos 2000, a pesquisa em design propôs uma discussão sobre um possível papel do design na equidade e coesão social, ou seja, procurou abordar várias questões em acordo com princípios de equidade e de distribuição justa dos recursos naturais disponíveis.

Recentemente, esse tema interligou-se com a escolha de energias renováveis para todos, tornando-se, como vimos, uma questão fundamental para o desenvolvimento sustentável em termos ambientais, socioéticos e econômicos.

Finalmente e transversalmente, em relação às dimensões discutidas até agora, o design para a sustentabilidade tem tratado e proposto contribuições sobre o tema crucial de uma nova estética para a sustentabilidade!

Essas dimensões recentemente introduzidas serão discutidas com mais profundidade nos parágrafos seguintes.

2.2 Seleção de recursos de baixo impacto

Embora não sejam rastreáveis cronologicamente, as questões e critérios básicos dos recursos de baixo impacto podem ser identificados na medida em que entram no debate científico e cultural e, posteriormente, nas práticas de design.

Em retrospecto, é evidente que isso tem ocorrido em função de uma percepção incorreta sobre seu alcance e também de poucas, porém significativas, avaliações e interpretações errôneas (inclusive em termos de design).

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2
Ver Seção 3.7, Parte II.

Capítulo 3. Design para o Ciclo de Vida

3.1 Introdução

Os limites ambientais demonstram claramente que já não é mais possível conceber qualquer atividade de design sem confrontá-la com o conjunto de relações que o produto terá com o meio ambiente durante o seu ciclo de vida. Ninguém mais ignora que um produto industrial precisa ter um baixo impacto ambiental, ao ser produzido, distribuído, utilizado e descartado.

Os requisitos ambientais devem ser considerados desde a primeira fase do desenvolvimento de um produto, juntamente a outros fatores como: custos, prestações de serviço, aspectos legais, culturais e estéticos. E isso é oportuno porque

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é muito mais eficaz agir preventivamente já no projeto do que buscar soluções de recuperação ou paliativas para os danos já causados (soluções end-of-pipe). Em termos projetuais, é muito mais interessante e ecoeficiente intervir diretamente sobre os novos produtos do que projetar e produzir (a posteriori) soluções e produtos com o propósito de gerir os impactos ambientais.

Aplicando uma estratégia ambiental consciente, desde as fases iniciais do projeto, é possível evitar, ou melhor, limitar os problemas, para não ter de perder tempo (e saúde e dinheiro) para reparar os danos já causados. Dessa maneira, é mais fácil unir as vantagens econômicas com as ecológicas.

Durante a segunda metade dos anos 1990, como descrito no capítulo anterior, surgiu uma nova disciplina relativa ao design de produto com baixo impacto ambiental, capaz de lidar com a complexidade de seu tema de forma mais concreta e realista: ficou claro o que se entende por requisitos ambientais de produtos industriais; o conceito de ciclo de vida do produto (para design e avaliação) foi introduzido e o conceito de função foi recontextualizado em termos ambientais. Os parágrafos seguintes examinarão esses conceitos.

3.2 Requisitos ambientais dos produtos industriais

Conforme mencionado anteriormente, durante os anos 1990, como consequência de alguns estudos e novos métodos de avaliação, tornou-se possível avaliar o impacto ambiental da entrada e saída entre a tecnosfera de um determinado produto e a geosfera e a biosfera. Isso permitiu especificar o que se entende por requisitos ambientais de produtos industriais. Esses estudos partiram de uma constatação óbvia (embora não facilmente quantificável): cada efeito ambiental é baseado na troca de substâncias (impacto) entre a natureza e o sistema de produção-consumo. Essas trocas de substâncias (e seus efeitos) podem ocorrer em duas direções:

• como entrada (input): extração de substâncias do meio ambiente; e

• como saída (output): substâncias liberadas no meio ambiente.

Portanto, vejamos quais são os impactos ecológicos nocivos que devem ser considerados em relação aos requisitos ambientais dos produtos.

Quando se fala em recursos – originados pela extração de insumos, para um determinado produto (ou para um processo ligado direta ou indiretamente a ele) – o primeiro efeito nocivo é o esgotamento dos recursos, o que irá criar

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Capítulo 4. Minimização do consumo de material

4.1 Introdução

Minimizar o consumo de material significa reduzir o consumo de matéria-prima de um determinado produto; ou, melhor ainda, reduzir (o consumo) em todas as fases do ciclo de vida e durante todo o serviço oferecido pelo produto. Isto é, em relação à sua unidade funcional.

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A utilização de menos material diminui o impacto não só porque são extraídos menos materiais/meios (pré-produção), mas também porque evita alguns processos (de produção), transporte (distribuição) e descarte.

Além disso, os materiais determinam custos econômicos além dos ecológicos. Dessa forma, minimizar o consumo de materiais é uma fonte geral de economia. Esta seção ilustra as diretrizes para minimizar não apenas os materiais utilizados para e pelo produto, mas também os resíduos e descartes criados durante a produção dos artefatos e suas embalagens, incluindo o consumo de material durante o processo de projeto.

Em particular, as seguintes diretrizes serão ilustradas:

• Minimizar o conteúdo de material de um produto.

• Minimizar as sobras e descartes.

• Minimizar ou evitar embalagens.

• Minimizar o consumo de material durante o uso.

• Adotar sistemas flexíveis de consumo de material (durante o uso).

• Minimizar o consumo de material durante a fase de desenvolvimento do produto.

4.2 Minimizar o conteúdo de material de um produto

A minimização do conteúdo material é considerada, conforme dito acima, como relacionada à função desempenhada pelo produto. Sem entrar na discussão do que é realmente funcional e do que não é, deve-se observar que é importante definir criticamente as funções, no que diz respeito aos seus contextos sociais, culturais e econômicos.

A minimização começa a partir da redução de espessura das paredes do componente (juntamente com o emprego de certas formas geométricas capazes de preservar a rigidez necessária) e termina com a desmaterialização real, por exemplo, pela substituição do hardware pelo software (digitalização).

A miniaturização é outra tendência interessante, a partir do desenvolvimento tecnológico, especialmente no campo da eletrônica (microeletrônica), que permitiu reduzir drasticamente a quantidade de materiais necessários exigidos para uma determinada função.

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Capítulo 5. Minimização do consumo de energia

5.1 Introdução

Com a redução do consumo de energia ocorre uma diminuição do impacto, no sentido de que menos energia precisa ser produzida, transportada e armazenada. Este capítulo ilustra, por meio de exemplos, as diretrizes para minimizar o consumo de energia, considerando tanto a energia necessária para a produção de um produto quanto a energia utilizada pelo produto, em diferentes fases, incluindo as fases de pré-produção, produção e transporte. Um foco especial será dado às seguintes diretrizes:

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• Minimizar o consumo de energia durante a pré-produção e a produção.

• Minimizar o consumo de energia durante o transporte e o armazenamento.

• Selecionar os sistemas de consumo de energia mais eficientes durante o uso.

• Permitir um consumo variável de energia, para acompanhar as flutuações da demanda.

• Minimizar o consumo de energia durante o desenvolvimento do produto.

5.2 Minimização do consumo de energia durante a pré-produção e produção

A minimização energética durante essas etapas refere-se às intervenções que reduzem e otimizam o consumo durante todas as operações relacionadas à produção do produto e aos materiais de seus componentes, partindo do emprego de materiais de menor intensidade energética, otimizando os parâmetros para os processos produtivos, para as estruturas de armazenamento e transporte mais eficientes de materiais e submontagem, para a redução de descartes de volumes de armazenamento mal calculados e para a prevenção de deterioração do estoque antigo, por meio de sistemas de aquecimento, ar condicionado e estruturas de iluminação eficientes para edifícios industriais. Aqui o designer pode intervir com certa contundência na seleção de materiais e processos com baixo consumo energético.

Diretrizes para minimizar o consumo de energia durante as etapas de pré-produção e produção:

• Selecionar materiais com baixa intensidade de energia (Exemplo 5.1).

• Selecionar tecnologias de processamento com o menor consumo de energia possível.

• Utilizar maquinaria com eficiência energética.

• Aproveitar o calor emitido nos processos para preaquecer outros fluxos de outros processos.

• Utilizar os reguladores de velocidade da bomba e do motor com configuração dinâmica.

• Equipar as máquinas com sistemas inteligentes de desligamento de energia.

• Otimizar as dimensões gerais dos motores.

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Capítulo 6. Minimização da toxicidade e nocividade dos recursos

6.1 Introdução

As escolhas de projeto devem ser direcionadas aos recursos (materiais e fontes de energia) que produzem menor impacto para um mesmo serviço ou função oferecida no ciclo de vida de um produto.

O designer desempenha um papel importante na escolha e utilização dos materiais, ainda que geralmente não esteja preocupado com a sua origem ou com o local de descarte após o término do ciclo de vida. O mesmo se aplica à

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seleção de fontes de energia que são necessárias para a fase operacional do produto. Um pouco menos incisivo é seu papel durante a fase de produção e distribuição, mas um designer informado pode oferecer alternativas de baixo impacto também nessa etapa.

É importante lembrar que uma abordagem precisa e eficiente para redução do impacto ambiental passa pelo redesign de todo o sistema do produto. Todo cálculo deve se referir a todo o ciclo de vida e a todos os seus processos. Isso significa que é preciso escolher entre diferentes tecnologias de transformação (algumas delas podem criar emissões tóxicas e prejudiciais e outras, igualmente eficientes, não); também é necessário optar por estruturas de distribuição que causem menos danos ao ecossistema;1 projetar produtos que utilizem menos recursos (energia e consumo de materiais) e com menor impacto. Finalmente, deve-se orientar a seleção de materiais e aditivos de forma a minimizar o risco de emissões nocivas durante os tratamentos de fim de vida útil. Mas os cálculos para a pré-produção também devem levar em consideração o ambiente de trabalho e seus riscos.

Para esclarecer o que está sendo explicado e para orientar os projetistas de maneira mais eficiente, as diretrizes a seguir são divididas em relação ao tipo de recurso (material ou fonte de energia):

• seleção de materiais não tóxicos e inofensivos;

• seleção de recursos energéticos não tóxicos e inofensivos.

6.2 Seleção de materiais não tóxicos e inofensivos

Produtos são constituídos por materiais, portanto os materiais que formam os componentes de um produto determinam os vários impactos ambientais e seus efeitos sobre nossa saúde e nosso ecossistema.

A Norma 91/689/CEE relata uma longa lista de tipos de resíduos tóxicos e prejudiciais (Quadro 6.1).

O quadro a seguir relata alguns dos tipos de resíduos tóxicos e nocivos descritos pela Norma 91/689/CEE.2

1 Em geral, o transporte ferroviário deve ser priorizado em relação a outros transportes terrestres ou aéreos.

2 Para ler a lista completa, veja o site: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/ TXT/?uri=CELEX%3A31991L0689.

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Capítulo 7. Otimização da renovação e da biocompatibilidade dos recursos

7.1 Introdução

Na perspectiva de um desenvolvimento sustentável, destinado a salvaguardar os recursos para as gerações futuras, o grau de renovabilidade1 ou, de outra maneira, o grau de não exaustão desses recursos torna-se de grande importância. Assim, a escolha de um recurso de baixa exaustão (ou alta capacidade de

1 Para mais detalhes, consultar a Seção 13.1.1, “Exaustão dos recursos naturais”, no Capítulo 13 da Parte III.

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renovação) é um critério para a concepção que traz as implicações socioéticas à luz. É crucial esclarecer que a renovabilidade dos recursos depende tanto da sua velocidade de regeneração quanto da frequência da extração. Em outras palavras, um recurso pode ser chamado de renovável se, em um contexto específico, a taxa de consumo antrópica for inferior à taxa natural de regeneração do próprio recurso.2

A biocompatibilidade do recurso precisa ser alcançada não apenas em relação à sua extração (renovabilidade), mas também em relação às emissões dos processos de extração para o meio ambiente. Em outras palavras, as saídas (outputs) para a geosfera e a biosfera não devem alterar o equilíbrio dos ecossistemas. Em particular, esses outputs não devem prejudicar a qualidade do capital natural (recursos). Desse ponto de vista, por exemplo, é sugerido o uso de materiais biodegradáveis.

Como feito anteriormente, pelo interesse de um entendimento claro e de uma estrutura de apoio eficiente aos designers, as diretrizes estão aqui divididas de acordo com a natureza do recurso:

• Selecionar materiais renováveis e biocompatíveis.

• Selecionar recursos energéticos renováveis e biocompatíveis.

7.2 Seleção de materiais renováveis e biocompatíveis

É preciso reconhecer que, enquanto algumas reservas de recursos naturais utilizadas para produzir determinados materiais são muito limitadas (mais limitadas que outras), existem, por outro lado, materiais mais ou menos renováveis.

O gráfico de barras na Figura 7.1 mostra uma avaliação do grau de exaustão de alguns materiais comumente utilizados.3

Para não comprometer o capital natural dos recursos é possível “extraí-los” do sistema de produção e consumo antropogênico utilizando materiais reciclados ou sucatas de produtos descartados ou de processamento. Muitos materiais

2 Por exemplo, a madeira proveniente de duas terras de cultivo diferentes, uma controlada e outra não controlada (esta última levando ao desmatamento), pode ser definida como renovável no primeiro caso, e não renovável no segundo caso.

3 Os números referem-se à produção de 1 kg de cada tipo de material e estão relacionados ao impacto em termos de exaustão. A avaliação é realizada por meio da LCA e, em particular, a partir do método ReCiPe. Para mais detalhes sobre o método ReCiPe, ver o Capítulo 14, Parte III.

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Capítulo 8. Otimização da vida útil do produto

8.1 Vida útil

Quando se fala de otimização ambiental da vida dos produtos, duas são as estratégias disponíveis:

• Aumento da durabilidade dos produtos (e/ou de alguns dos seus componentes).

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• Intensificação do uso dos produtos (e/ou de alguns dos seus componentes): um design que leve ao uso mais frequente do produto, minimizando o tempo de não uso.

Antes de aprofundar essas estratégias, recordemos brevemente o significado (ou melhor, os significados) de vida útil.

A vida útil mede o tempo de um produto e de seus materiais em condições normais de uso 1 Eles podem durar conservando as próprias capacidades e o próprio comportamento dentro de um nível padrão aceito ou mais bem preestabelecido.

A análise sobre a vida útil pode variar de produto a produto e em relação a determinadas funções. Alguns aspectos são: a previsão de tempo de vida de um produto, a quantidade de uso, o tempo de duração das operações ou a vida de prateleira (armazenagem).

Quando a vida útil do produto chega ao seu final, é a fase de eliminação. As principais razões que levam à eliminação dos produtos são as seguintes:

• a degradação de suas propriedades ou a fadiga estrutural causada pelo uso intensivo;

• a degradação devido às causas naturais ou químicas;

• os danos causados por incidentes ou uso impróprio.

Mas também por:

• obsolescência tecnológica;2 e

• obsolescência cultural e estética.3

Vejamos quais diretrizes devem ser seguidas e por que, em termos ambientais, é significativo estender a vida útil de um produto e intensificar seu uso.

8.2 Por que projetar considerando a durabilidade dos produtos

Um produto que é mais durável que outro, exercendo a mesma função, determina geralmente um impacto ambiental menor. Se um produto dura menos, de fato, ele não só gera precocemente mais lixo, mas determina também outros impactos indiretos, como a necessidade de ter que substituí-lo. A produção e a

1 Ou seja, devidamente mantido e dentro dos limites prévios de estresse mecânico.

2 Especialmente produtos de um setor altamente inovador como a infotecnologia.

3 Especialmente os produtos da indústria da moda.

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Capítulo 9. Estendendo a vida útil dos materiais

9.1 Introdução

Prolongar a vida útil dos materiais significa fazê-los durar mais do que os produtos dos quais fazem parte. Este tipo de reencarnação dos materiais pode se dar por meio de dois processos fundamentais. Os materiais podem ser reprocessados em matérias-primas secundárias ou queimados (incinerados) para recuperar seu conteúdo energético.

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O primeiro caso – o reprocessamento de matérias-primas secundárias – é chamado de reciclagem se esses materiais forem usados para fabricar novos produtos industriais, 1 ou compostagem , se as matérias-primas secundárias forem transformadas em matéria orgânica e usadas como fertilizante natural, geralmente misturando e umedecendo o solo com resíduos orgânicos (também chamados de resíduos úmidos).

Em qualquer caso, a vantagem ambiental é duplicada (Figura 9.1). Em primeiro lugar, é evitado o impacto ambiental de materiais dispostos em aterro sanitário. Em segundo lugar, na fase de pré-produção, é evitado o impacto ambiental ocasionado pela fabricação de uma quantidade similar de material ou energia a partir de matéria-prima primária. Não haver o impacto, pela eliminação de alguns processos, é considerado uma vantagem ambiental indireta.

É um entendimento comum que a reciclagem é uma das melhores soluções para uma grande variedade de problemas ambientais. É necessário, portanto, sublinhar o fato de que os processos de reciclagem também produzem impacto. Dentre outros, eles requerem transporte, por exemplo. Para calcular corretamente o efeito ambiental global das estratégias de reciclagem é preciso deduzir o impacto do processo das vantagens indiretas acima mencionadas (Figura 9.2).

A experiência e vários cálculos mostram, entretanto, que a reciclagem de materiais é geralmente positiva para o meio ambiente. É por isso que é recomendado projetar produtos que sejam facilmente recicláveis. Porém, com a análise de todo o ciclo de vida em segundo plano, nem o impacto do processo de reciclagem nem a consistência da hipótese de que ele será realmente reciclado devem ser negligenciados.

Por último, é difícil julgar se o impacto final será maior no caso de incineração ou reciclagem. Embora seja verdade que a queima de plásticos, papel e papelão libera fumaça2 e deixa para trás sérios resíduos, 3 é igualmente verdade, hoje em dia, que os incineradores possuem sistemas de filtragem avançados, devido à legislação rigorosa que procura proteger o meio ambiente e a saúde das pessoas. Muitas vezes, os altos custos de algumas estações de tratamento determinam o maior entrave à sua proliferação. Ou as dificuldades também podem ocorrer por razões políticas e sociais; basta pensar nos frequentes protestos e manifestações de pessoas que não querem ter um incinerador próximo às suas residências. É preciso ainda levar em consideração uma análise criteriosa que seja capaz de

1 Sobre isso, ver Quadro 9.1.

2 A fumaça que contém cloro e bromo é a mais agressiva. As dioxinas emanam das combinações entre estes e outros resíduos orgânicos.

3 A partir desse desperdício, nada além de alguns poucos metais pode ser recuperado.

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Capítulo 10. Facilitando a desmontagem

10.1 Introdução

O Design for Disassembly – DFD (design para a desmontagem) é focado em como projetar produtos facilmente desmontáveis, o que significa que as peças e materiais podem ser separados de maneira fácil e econômica.

A possibilidade de facilitar a separação das peças auxilia a manutenção, o reparo, a atualização e a remanufatura dos produtos.

Design para a sustentabilidade ambiental: o design do ciclo de vida dos produtos

Além disso, a facilitação da separação dos materiais contribui, por um lado, para os processos de reciclagem (se os materiais forem incompatíveis entre si) e, por outro, para a neutralização (no caso de serem tóxicos ou perigosos).

Portanto, os argumentos ambientais por trás da adaptação do design para desmontagem (DFD) estão relacionados com a extensão da vida útil do produto (devido à capacidade de manter, reparar, atualizar e refazer os produtos conforme necessário), a extensão da vida útil dos materiais (por meio da reciclagem, compostagem e incineração) e a neutralização de substâncias tóxicas e nocivas.

O DFD é tratado em um capítulo específico não apenas porque é, como acabamos de ver, importante para muitas estratégias de redução do impacto ambiental, mas também porque o designer, especificamente nessa área, pode desempenhar um papel substancial.

Para que o Design for Disassembly seja definido com maior eficácia é importante compreender as tipologias da desmontagem, as prioridades de uso e os ganhos econômicos e ambientais originados pela sua aplicação (Quadro 10.1).

Quadro 10.1 Desmontagem

A seguir estão descritas as tipologias de desmontagem, as razões econômicas e ambientais para seu uso e as prioridades que podem ser úteis para sua aplicação. Devido às semelhanças com o Design for Assembly (DFA) é útil iniciar com esse conceito, que já foi consolidado em muitas práticas de design para facilitar a montagem.

Desmontagem e montagem

Um dos critérios norteadores do Design for Assembly para verificar a eficácia de montagem de um produto é a facilidade de desmontagem. Dessa maneira, é possível estabelecer uma fundamentação prática de projeto que, considerando as semelhanças e simetrias (montagem-desmontagem), pode ser útil para entender o conceito de DFD. Entretanto, a desmontagem e a montagem não podem ser concebidas para serem iguais, uma é diferente da outra. Na realidade, muitas características importantes variam em grande medida.

Entropia

A desmontagem de um produto começa com um único artefato e continua em direção a um maior estado de desordem. É um processo entrópico, o que significa que, por exemplo, no caso da reciclagem de material, os recipientes e transportadores (mais ou menos automatizados) não são necessários para componentes únicos, mas apenas para os diferentes materiais separados.

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Capítulo 11. Restrições e oportunidades para uma abordagem de Life Cycle Design

11.1 Restrições econômicas no sistema tradicional de oferta e demanda de produtos

Seria reconfortante afirmar que uma abordagem de Life Cycle Design (LCD) em um produto (isto é, reduzir tanto o consumo quanto as emissões/resíduos) também pode obter resultados economicamente sólidos. Nesse caso, de fato, não haveria motivo para preocupações, mas infelizmente a degradação e os riscos crescentes para nossos ecossistemas provam o contrário.

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É um fato que os recursos e a energia possuem custos econômicos e ambientais. Portanto, reduzir o consumo é uma fonte de economia, assim como é um fato que as emissões e os tratamentos de resíduos determinam custos cada vez maiores.

Entretanto, esses fatos por si só não são suficientes para espontaneamente1 motivar o sistema de demanda e de oferta a reduzir consideravelmente o impacto ambiental do atual sistema de produção e de consumo. Mais precisamente, esses cálculos não se aplicam igualmente em diferentes estágios do ciclo de vida do produto. O sistema de oferta e demanda dentro de um ciclo de vida é complexo e é caracterizado por diferentes partes interessadas, mas o interesse único não coincide necessariamente com a redução do impacto ambiental.

Para esclarecer essa afirmação pode ser útil examinar alguns aspectos das relações mútuas entre quem fabrica (e projeta) os bens, os materiais, quem distribui os produtos, quem os usa, quem os descarta e, por outro lado, quem se beneficia com a redução do consumo e das emissões durante diferentes estágios do ciclo de vida.

Para compreender essas condições econômicas, é possível utilizar o mesmo esquema de ciclo de vida, porém substituindo diferentes estágios por diferentes partes interessadas (Figura. 11.1). Com uma cuidadosa inspeção do mercado de abastecimento tradicional, é possível observar que, em termos gerais, os interesses econômicos motivam as partes envolvidas a realizar otimizações de recursos no nível do subsistema. Por exemplo, qualquer pessoa que fabrique os materiais (pré-produção) estaria inclinada a reduzir a taxa de consumo de material por unidade (seta interna na figura), mas estaria, mais tarde, motivada a vender (e pré-produzir) o maior número possível de materiais.

Pelas mesmas razões econômicas, quem fabrica o produto (a máquina de lavar em nosso exemplo, o círculo interno na figura) normalmente envolve inovações para reduzir os custos de material (consumo) e as emissões durante a fase de produção (eventualmente também durante a distribuição) por unidade produzida e, então, a lógica dominante no mercado estimula o produtor a vender (produzir) o maior número possível de produtos.

Eventualmente, o fabricante pode até estar interessado em vender produtos de curta duração, apenas para acelerar sua substituição.

A redução dos fatores de custo e das emissões (valorização ambiental) durante o uso não está necessariamente entre os objetivos comerciais da empresa que fabrica o produto. Durante o descarte os custos não estão ligados ao produto

1 Isto é, sem intervenções legislativas que favoreceriam alguns processos e dificultariam outros, como no caso de ecotaxas e diferentes ecoincentivos.

232

Capítulo 12. Complexidade ambiental e atividade projetual

12.1 Introdução

Nesta parte, serão descritos os métodos e as ferramentas de apoio para análise e projeto para sustentabilidade ambiental.

A inclusão da variável ambiental no processo de projeto torna toda a atividade mais complexa (e interdisciplinar). Novos requisitos (ambientais) devem ser levados em conta e ampliados ao longo de todas as etapas e entre todos os atores do ciclo de vida. Na prática, é necessário possuir mais informações e avaliar mais profundamente as relações:

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• entre o sistema de produção-consumo e o meio ambiente;

• entre diferentes atores do sistema de desenvolvimento de produtos; e

• entre estes últimos e os atores envolvidos no ciclo de vida dos produtos.

Dentro dessa estrutura de maior complexidade projetual, as tecnologias da informação desempenham um papel central pois possuem a capacidade de conter, circular, comparar, elaborar e apresentar de várias formas (e interfaces) a imensa quantidade de informação necessária para administrar esse aumento de complexidade.

A indicação de que a tecnologia da informação é um importante ponto de apoio para a concepção de soluções relacionadas às questões ambientais não deve de forma alguma ser conclusiva. Na verdade, as mudanças exigidas pela transição para a sustentabilidade são sistêmicas e determinam não apenas mudanças tecnológicas, mas também sociais e culturais.

A partir da análise de como as questões ambientais e o LCD se inserem nos processos de desenvolvimento de produtos, emergem duas abordagens.

Por um lado, foram desenvolvidas ferramentas para avaliação do impacto ambiental, para implementar sistemas de análise quantitativa e qualitativa do ciclo de vida de um produto. Essas ferramentas surgiram devido à necessidade de avaliar e comparar propostas alternativas.1 Entre as ferramentas de avaliação quantitativa, a Avaliação do Ciclo de Vida (LCA) é, sem dúvidas, a mais consolidada. Por essa razão, é discutida em um capítulo específico.

Por outro lado, existem várias ferramentas para orientar a geração de soluções ambientalmente sustentáveis.

12.2 Métodos e ferramentas de apoio para projetos ambientalmente sustentáveis

Obviamente, o designer deve trabalhar com informações adequadas e ferramentas de apoio a tomadas de decisão desde o início, com o objetivo de evitar encaminhamentos ou estratégias ilusórias e antever e focalizar com certa confiabilidade os campos mais importantes nos quais intervir. Ou seja, o designer precisa ter instrumentos de análise e avaliação juntamente com ferramentas de orientação à decisão. 1 Ver Capítulo 14 desta parte.

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Capítulo 13. Estimar o impacto ambiental dos produtos: Avaliação do Ciclo de Vida

13.1 O impacto ambiental do nosso sistema de consumo-produção

Cada atividade humana determina uma absorção/aquisição de recursos naturais, bem como a liberação de diferentes emissões de agentes químicos ou físicos, como substâncias, ruído etc.

Tanto as aquisições quanto as emissões são formas de impacto ambiental. As emissões envolvem a liberação de substâncias na natureza, enquanto o consumo de recursos primários determina a extração de substâncias da natureza. Assim, toda forma de impacto é baseada na troca de substâncias entre o meio ambiente e o sistema de produção e consumo.

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Esse sistema, que envolve todas as atividades humanas, ocasiona uma taxa insustentável de carga e descarga no ambiente, o que significa que a quantidade de impacto das emissões e da extração de recursos é maior do que o que o ambiente pode absorver sem perder seu equilíbrio geral, ao mesmo tempo que prejudica a sobrevivência tanto da flora e da fauna quanto da própria humanidade. Os impactos podem ocorrer em diferentes escalas geográficas. Podemos dividi-los em três categorias principais:

• No nível local, quando os efeitos ocorrem nas imediações do local de produção, rota ou aterro sanitário.

• No nível regional, quando os efeitos se fazem sentir em uma determinada área geográfica, por exemplo, smog de zonas industriais.

• No nível global, por exemplo, pela mudança climática.

A seguir, estão listados também os efeitos ambientais mais relevantes que são determinados pelos impactos da extração ou das emissões (ver tabelas compêndios no Anexo):

• exaustão dos recursos naturais;

• aquecimento global;

• exaustão da camada de ozônio;

• smog;

• acidificação;

• eutrofização;

• poluição tóxica do ar, água e solo; e

• resíduos.

13.1.1 Exaustão dos recursos naturais

As reservas mundiais remanescentes de combustíveis fósseis, urânio e alguns outros recursos1 causam sérias preocupações. Na realidade, o esgotamento dos recursos naturais (a entrada de nosso sistema de produção-consumo) é considerado um problema grave no que diz respeito à manutenção desse sistema.

1 Teoricamente, não é possível esgotar os metais, pois eles são sempre recicláveis, embora a possibilidade de redução dos recursos minerais acarrete um forte impacto econômico.

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Capítulo 14. Ferramentas ambientalmente sustentáveis orientadas para o projeto

14.1 Introdução

Este capítulo tratará de algumas ferramentas que foram desenvolvidas exatamente para a orientação do processo de projeto em direção a soluções ambientalmente sustentáveis. Essas ferramentas estão divididas e descritas a partir de dois objetivos diferentes:

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• Ferramentas para a avaliação do impacto ambiental: para a definição de prioridades e a verificação da redução do impacto ambiental do projeto.

• Ferramentas de orientação: para gerar soluções ambientalmente sustentáveis.

14.2 Ferramentas de avaliação de impacto ambiental

A partir dos anos 90, nasceram ferramentas que permitem avaliar o desempenho ambiental de um produto, desde a produção de materiais até sua disposição. O objetivo dessas ferramentas é analisar e interpretar as relações (input/output) que um produto tem com o meio ambiente. A ação é complexa porque:

• O foco não está apenas no produto ou nos materiais dos quais ele é composto. Ao invés disso, a análise é estendida a todos os processos relacionados ao ciclo de vida do produto. Esta é uma ação que implica em aproximações necessárias e, consequentemente, maiores incertezas.

• Mesmo com a coleta de dados suficientes para a compreensão de forma detalhada sobre o que ocorre em todas as fases do ciclo de vida, muitas vezes não há informações confiáveis relacionadas a quais impactos podem ser ligados a essas fases específicas e por meio de quais dimensões.

• Finalmente, nem sempre é possível saber com certeza quais efeitos poderiam estar ligados às causas e aos processos identificados.

Por essas razões, os métodos de análise do ciclo de vida estão sujeitos a algumas críticas: são acusados de serem muito complexos e caros (e, portanto, não são tão amplamente utilizados por empresas como deveriam ser) ou simplificam excessivamente a descrição do que realmente ocorre dentro do ciclo de vida do produto (tornando, portanto, a análise uma aproximação, além de não plenamente confiável). Entretanto, as ferramentas de avaliação ambiental LCA podem ser integradas com sucesso na prática de projeto por meio de um conjunto equilibrado de checagens ocorridas de tempos em tempos, por exemplo, em relação ao nível de complexidade que se deseja alcançar e que nível de simplificação é necessário para tornar a coleta de dados operacionalmente explorável.

Por essa razão, as ferramentas de avaliação (quantitativa e qualitativa) são realmente importantes na atividade de projeto, porque ajudam a identificar problemas. Contudo, por terem uma restrição ao seu campo de análise, elas não sugerem uma orientação quando se geram novas soluções. As ferramentas de orientação serão descritas posteriormente.

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Capítulo 15. O método MPDS

15.1 Introdução ao método MPDS

A unidade de pesquisa Design e Inovação de Sistemas para Sustentabilidade (IDS), do Departamento de Design do Politécnico de Milão, desenvolveu um método e algumas ferramentas para integrar os requisitos ambientais no processo de desenvolvimento de produtos. Esse método é chamado MPDS, sigla de Method for Product Design for Environmental Sustainability (Método de Design de Produto para Sustentabilidade Ambiental). O escopo desse método é complementar e apoiar um processo de design de produto destinado a criar soluções ambientalmente sustentáveis. Esse método é o resultado de mais de vinte anos de pesquisa,

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didática e consultoria a empresas, instituições públicas e associações comerciais.1

O método também é coerente com a norma UNI ISO/TR 14062:2007 (que trata da Integração dos aspectos ambientais no projeto e desenvolvimento de produtos).

Qualquer designer que esteja disposto a realizar um projeto baseado no método

MPDS pode integrar as sugestões fornecidas passo a passo em vários níveis e decidir quais ferramentas usar de acordo com a atividade específica que está sendo tratada, dentro de um determinado contexto operacional. Em outras palavras, esse método é modular, flexível e organizado em processos e subprocessos, para que possa ser facilmente adaptado às necessidades específicas de cada designer e empresa. Além disso, possui fácil aplicação em uma ampla gama de contextos e situações de projeto. Em particular, o método é modular em relação:

• Às etapas do processo: o método pode ser empregado de maneira integral, com todos os processos que contém, ou parcial, por meio da escolha de apenas certos processos relacionados às exigências específicas de um projeto.

• Às ferramentas a serem utilizadas: o método é combinado com uma série de ferramentas e é possível selecionar quais usar no processo de projeto.

A integração do MPDS com as fases típicas do desenvolvimento de novos produtos tem os seguintes objetivos:

• Realizar a análise estratégica do produto (e briefing): avaliar as áreas críticas e as estratégias de LCD com o maior potencial de redução de impacto ambiental em relação ao produto a ser projetado.

• Desenvolver o projeto conceitual: orientar a geração do conceito para soluções ambientalmente sustentáveis com respeito aos produtos atuais.

• Desenvolver o projeto (e a engenharia) do produto: orientar o projeto dos detalhes de um produto para soluções ambientalmente sustentáveis em relação a outros produtos já existentes.

No final do processo de projeto, o método MPDS fornece indicações para a preparação da estratégia e dos documentos que comunicam as características do produto, destacando os aspectos relacionados à sustentabilidade ambiental

1 A unidade já prestou consultoria para, entre outros, a Kone (elevadores), a Necta (máquinas de venda automática), a Electrolux (apliques domésticos), a General Beverage (postos de distribuição), a ASM di Brescia (empresa de serviços públicos e relacionados), a Federlegno-Arredo (associação comercial da indústria de mobiliário), a Artemide (iluminação), a Metropolitana Milanese, a Parà (cortinas), a Fumagalli (cadeiras de rodas) e a Bonaveri (manequins).

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Este livro fornece ferramentas práticas para apoiar processos de design com sustentabilidade. Aqui, o autor apresenta uma visão articulada de métodos, ferramentas e estratégias com as questões ambientais no desenvolvimento de produtos e destaca potenciais diretrizes de design, sempre acompanhadas por estudos de caso de design de produtos ambientalmente conscientes e de alta qualidade. O livro é dividido em três partes. A primeira define o esboço e os cenários do desenvolvimento sustentável e traça a evolução da sustentabilidade na pesquisa e na prática do design; a segunda aborda em profundidade as estratégias utilizadas para projetar e desenvolver produtos ambientalmente sustentáveis e explica os modelos para projetar produtos com baixo impacto ambiental; e a terceira apresenta o impacto ambiental dos produtos e os métodos para avaliá-lo, com foco específico na Avaliação do Ciclo de Vida e com as ferramentas que foram desenvolvidas para apoiar o design de produtos para a sustentabilidade ambiental. Esta é uma leitura essencial para estudantes, designers e projetistas com interesse em processos de desenvolvimento de produtos.

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