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MODELO CONCEITUAL: CARGA ALOSTÁTICA – NEUROPLASTICIDADE – SENSIBILIZAÇÃO CENTRAL

SEÇÃO II O TRONCO

“O Cérebro continuamente mapeia o mundo – registra experiências e percepções e as define como seguras ou danosas ” (Dr. Bessel Van Der Kolk)

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O modelo conceitual que sustenta o encadeamento do processo saúde-doença, expresso na condição de dor, que é objeto de estudo na minha trajetória, iniciou-se ainda no mestrado quando o alvo foi estudar dor e ansiedade em crianças. Uma temática inspiradora que me incitou a compreender fatores que permeiam estas percepções de sofrimento. Na base desta cadeia estão as estruturas sociais e econômicas que penalizam indivíduos pobres e com baixa escolaridade, mais propensos a doenças e com menos acesso aos sistemas assistenciais. Desde o princípio isso foi claro no modelo conceitual para compreender como os múltiplos fatores se associam com estes sentimentos numa perspectiva que integra a biologia ao meio. Foi baseado nesta ótica que estruturei o modelo hierárquico para determinar os fatores associados à ansiedade pré e pós-operatórias.

A base conceitual desta estrutura hierarquizada baseia-se num modelo teórico da Alostase, cujo princípio é o processo de alcançar a estabilidade ou homeostase, através de mudanças fisiológicas ou de comportamento mediados pela ativação dos sistemas neuro-imuneendócrinos. Estes compreendem os três sistemas de ajustamento ao meio. Na perspectiva deste modelo, o estresse ativa cascatas de reações fisiológicas que visam uma resposta protetora, coordenada e adaptativa para manter o equilíbrio frente a demandas internas ou externas, seja por danos físico ou emocional. Consideramos que o cérebro é o centro de processamento das entradas sensoriais do meio externo e interno, e que integra as reações de ajustamento imputadas pela carga alostática. Entendemos que estas demandas desencadeiam respostas ao estresse, que fisiologicamente, caracteriza-se por ser um processo intensivo para vencer os desafios impostos pela carga alostática. De acordo com esse modelo, o processo disfuncional manifesto como doença ocorre quando os estressores ultrapassam a capacidade adaptativa e vencem a resiliência dos sistemas neuro-imune-endocrino. Assim, a dor e a ansiedade são o resultado de alterações psicológicas e fisiológicas, que induz a disfunção e a doença. Embora a

MEMORIAL WOLNEI CAUMO

dor tenha finalidade adaptativa no contexto de dor aguda, a dor crônica é destituída de finalidade adaptativa. Esta cursa com alterações neuroplásticas disfuncionais que definem a dor crônica como uma doença associada a processos de neuroplasticidade mal adaptativa.

SEÇÃO II O TRONCO

O modelo da carga alostática deu suporte teórico desde o princípio da minha vida como pesquisador e culminou com a criação de uma escala para avaliação de estresse pré-operatório como preditor de risco para a dor pós-operatória moderada a intensa. Embora este artigo, que tem na sua base o modelo da carga alostática tenha sido publicado em 2017 no British Journal Anaesthesia, o jornal de maior impacto na área da anestesia, esse modelo, que explica o processo de adoecimento como uma resposta desajustada às demandas fisiológicas dos meios internos ou externos compreende o alicerce da minha produção científica. Trata-se de um modelo que permite estudar o fenômeno dor nas suas dimensões – cognitivas, avaliativas, terapêuticas e sociais, numa perspectiva biopsicossocial. Além desse estudo, a pesquisa em seres humanos ao longo de minha trajetória acadêmica foi alinhada a uma perspectiva translacional, com estudos pré-clínicos desenvolvidos pela professora Dra. Iraci Torres. Portanto, para facilitar a compreensão da produção do conhecimento durante minha trajetória, neste memorial os artigos serão apresentados em cinco eixos, incluindo estudos pré-clínicos e clínicos.

AVALIAÇÃO DA DOR: DOMÍNIOS, MÉTODOS E MECANISMOS

Os estudos clínicos compreendem os eixos relacionados à avaliação do comportamento relacionado à dor por meio de medidas clínicas, marcadores da neuroplasticidade e estratégias terapêuticas.

Temos, também, contribuições que são relevantes para aproximar “mente” e “corpo”, na medida em que fornecemos informações sobre como a dor se relaciona com aspectos emocionais. Nosso trabalho tem permitido que sejam disponibilizados instrumentos para captar os diferentes aspectos do comportamento relacionados à dor. Nesta perspectiva, temos criado, adaptado e validado instrumentos para a população brasileira. O sucesso do trabalho de nosso grupo tem sido premiado com grande reconhecimento internacional. Assim, estamos criando no Brasil, de forma pioneira, uma plataforma de ciência e inovação no campo do estudo da dor e da neuromodulação vinculada a centros de excelência ao redor do mundo.

Nesta sessão, vamos apresentar como foi sendo construído o processo de compressão do fenômeno dor e as estratégias desenvolvidas no laboratório de Dor e Neuromodulação, que