13

Page 1

13 TRÁFICO INTERNO DE PESSOA PARA

FIM

DE

EXPLORAÇÃO

SEXUAL ___________________________________

13.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO CRIME A descrição típica é a do art. 231-A do Código Penal, agora com a redação da Lei n° 12.015, de 7.08.2009: “promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual”. A pena é reclusão, de dois a seis anos. O bem jurídico protegido é o interesse público em não incentivar, incrementar, ver disseminada a prostituição ou qualquer outra forma de exploração sexual no território nacional. Sujeito ativo é a pessoa que promove ou facilita o deslocamento, de um lugar para outro, dentro do território nacional de alguém, homem ou mulher. Sujeito passivo é o Estado e também a pessoa quando o agente empregar violência, grave ameaça ou fraude.

13.2 TIPICIDADE O caput do art. 231-A contém o tipo fundamental. O § 1º descreve figura típica equiparada. O § 2º contém causas de aumento de pena, relativas à idade da vítima, sua qualidade de vulnerável, à qualidade do agente e ao emprego de violência, grave ameaça ou fraude. O § 3º trata da hipótese de crime cometido com o fim de obter vantagem econômica.


2 - Direito Penal III – Ney Moura Teles

13.2.1 Conduta São duas as condutas incriminadas. Promover ou facilitar o deslocamento da pessoa dentro do território nacional. Promover é dirigir a realização. É organizar a execução. Na redação da lei anterior, o tipo continha o núcleo verbal intermediar, no sentido de colocar-se na posição intermediária entre outro agente e a pessoa. Identificava-se com a negociação dos interesses do que promove e os da pessoa que iria se deslocar dentro do território nacional. Com a modificação legislativa, o núcleo não está no tipo, mas não há dúvida de que quem intermedeia está promovendo ou facilitando a entrada ou a saída da vítima. Facilitar é, de qualquer modo, auxiliar, contribuir para que fique mais fácil o deslocamento da vítima dentro do território nacional. É vencer dificuldades, romper obstáculos, eliminar empecilhos.

13.2.2 Elementos do tipo É livre o deslocamento de pessoas dentro do território nacional. Todos podem ir e vir. É o direito de locomoção. O que a norma proíbe é a participação dolosa de alguém na locomoção, no deslocamento, de um lugar para o outro, dentro do território nacional, com a finalidade de exercer ela a prostituição ou outra forma de exploração sexual. Não é proibida a locomoção de alguém, de um lugar para outro, mesmo quando tenha a intenção de, noutra cidade, estado ou lugar, exercer o meretrício. Qualquer pessoa, homem ou mulher, pode, livremente, por sua conta própria, ir e vir dentro do território nacional, com a finalidade de exercer a prostituição. Fazê-lo não é crime. A prostituição é atividade lícita. Porém, não é do interesse da sociedade que ela seja facilitada ou incentivada. As condutas incriminadas não dizem respeito à pessoa que vai exercer a prostituição, mas a alguém que, dolosamente, promove ou torna mais fácil a locomoção, e não à prostituta ou à pessoa que irá exercer atividade ligada à exploração sexual. Aquele, portanto, que diligencia para que alguém se desloque dentro do país, que organiza ou que para tanto contribua, de qualquer modo, vencendo obstáculos, incorre na incriminação. Assim o que toma as medidas para a aquisição de passagens em meio de transporte, empresta dinheiro, enfim, que realiza qualquer ato material que se integre no conjunto dos necessários à locomoção ou deslocamento da pessoa.


Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual - 3 Na redação da lei anterior, o tipo empregava as expressões “recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento” da pessoa, que, à toda evidência, são formas de promoção ou facilitação do seu deslocamento. Assim, todo aquele que recrutar, transportar, alojar ou acolher a vítima, está realizando o tipo. O aliciamento, o transporte e o alojamento são circunstâncias que aumentam a pena, como adiante comentado. O tipo não faz nenhuma referência ao consentimento da pessoa que, por isso, é irrelevante, porém, se houver emprego de violência, grave ameaça ou fraude, incidirá a causa de aumento de pena do § 2º, inciso IV, adiante comentada. A promoção ou contribuição para a entrada ou saída da pessoa do território nacional, não se ajusta ao tipo em comento, mas ao do art. 231 do Código Penal, tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual, introduzido pela Lei n° 11.106, de 28.3.2005, cuja redação também foi modificada pela Lei nº 12.015, de 7.08.2009. Cuida-se de crime doloso. O agente, para incidir no tipo, deve estar consciente da contribuição que dá para o deslocamento da pessoa, mas, principalmente, deve saber que ela irá, no lugar para o qual foi deslocada, exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual. Se quem promove ou facilita o deslocamento da pessoa dentro do território nacional não sabe que sua intenção é exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, o fato é atípico, por erro de tipo, excludente do dolo.

13.2.3 Consumação e tentativa Há fato consumado no momento em que se realiza o efetivo deslocamento da pessoa, do lugar onde vivia, para o outro lugar, dentro do território nacional. A tentativa é possível se ela não concluir o seu deslocamento, e ainda quando nem tenha o iniciado, por circunstâncias alheias à vontade do agente, inclusive quando a própria pessoa resolve permanecer onde se encontra.


4 - Direito Penal III – Ney Moura Teles

13.2.4

Figuras típicas equiparadas O § 1º contém a seguinte norma:

“Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa

traficada,

assim

como,

tendo

conhecimento

dessa

condição,

transportá-la, transferi-la ou alojá-la.” Realizará o tipo também aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, bem como aquele que a transportar, transferir ou alojar, sabendo-a traficada. Agenciar é tornar-se agente, tratando ou cuidando da pessoa, como seu representante. Aliciar é atrair ou seduzir. Vender é alienar, mediante recebimento de preço, em dinheiro ou outro valor. Comprar é adquirir mediante pagamento em dinheiro ou outro valor. Transportar é conduzir, ou levar de um lugar para outro. Transferir é fazer passar de um lugar para outro. Alojar é hospedar, acomodar em determinado lugar. O transporte, a transferência e o alojamento só serão incriminados se o agente tiver conhecimento de que a pessoa está sendo objeto de tráfico internacional para fim de exploração sexual. Sem esse elemento subjetivo, sua conduta é atípica.

13.2.5

Causas de aumento e aplicação cumulativa da pena de

multa O § 2° do art. 231-A, com a redação dada pela Lei 12.015, de 7.08.2009, determina que a pena será aumentada de metade, se: “I – a vítima é menor de 18 (dezoito) anos; II – a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato; III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; IV – há emprego de violência, grave ameaça, ou fraude.” O aumento de pena, de metade, ocorrerá em relação à menor idade da vítima ou à sua condição de vulnerável; por uma das relações entre ela e o agente, referidas no inciso III; ou quando houver emprego de violência, grave ameaça ou fraude.


Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual - 5 Haverá aumento se a vítima é menor de 18 anos, independente de ser vulnerável. Também a pessoa que, portadora de enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato. Incidirá a causa de aumento do inciso III, alcançando os professores, educadores, diretores de estabelecimentos de ensino, de saúde, internatos, externatos, casas de internação de menores, enfim, pessoas que estejam exercendo um poder de autoridade, decorrente das relações de tratamento e guarda. Estando o agente nas condições referidas na norma, merecerá maior reprovação pela violação do decorrente dever, legal ou jurídico, de proteger a vítima. Também haverá esse aumento de pena se o agente estiver na posição de garante, isto é, se, por lei ou por contrato, ou qualquer outra forma, tiver assumido a obrigação de proteção, guarda ou vigilância. Essas pessoas – as que têm o dever legal de proteção, guarda e vigilância, e as que de outra forma assumiram a responsabilidade de impedir o resultado lesivo, e as que, com comportamento antecedente, criaram a situação de risco de ocorrer o resultado – são denominadas garantes e estão obrigadas a agir para impedir que qualquer resultado lesivo aconteça com as pessoas que devem proteger, guardar e vigiar. Quando elas mesmas realizam a conduta descrita no tipo, incidirá a causa de aumento, merecendo reprimenda mais severa. A última causa de aumento diz respeito aos meios empregados pelo agente para promover ou facilitar o deslocamento da vítima, dentro do território nacional. Se usa violência, grave ameaça ou fraude, a pena será aumentada de metade. Por violência devem-se entender as lesões corporais, leves, graves ou gravíssimas e também as vias de fato. Grave ameaça é a promessa da causação de um mal importante. Fraude é o engodo, o engano, o meio que o agente emprega para manter a vítima em erro ou levála a apreciar mal a realidade. Além da pena mais severa, o agente responderá, em concurso material, pelo crime contra a pessoa decorrente do emprego da violência – lesão corporal ou morte. Por fim, o § 3º do art. 231 trata de elemento subjetivo que move o agente: fim de lucro. Incidirá sobre o fato concreto, quando o agente, ao realizar o tipo, promovendo ou facilitando a entrada ou a saída da vítima, do território nacional, buscar a satisfação de um lucro pessoal. Esse proveito é de natureza econômica e não precisa ser efetivamente obtido pelo agente para merecer, além da pena privativa de liberdade, a pena de multa.


6 - Direito Penal III – Ney Moura Teles

13.3 AÇÃO PENAL E SEGREDO DE JUSTIÇA A ação penal é de iniciativa pública incondicionada. Estabelece o art. 234-B que os processos nos quais se apuram os crimes definidos no Título VI tramitarão em segredo de justiça. O segredo de justiça não alcança os sujeitos processuais e seus advogados. O fim da norma é, sobretudo, proteger a vítima e o acusado contra qualquer espécie de sensacionalismo.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.