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Sertanistas Botucatuenses A R T I G O

Olavo Pinheiro Godoy

Da Academia Botucatuense de Letras

Aproveitando o mês de abril, dedicado aos índios, um turista recostado em cômoda poltrona do Peabiru Hotel, cerra os olhos para uma sesta. Suavemente, deixa ele rolar a memória à procura de recordações que distendam e convidem ao sono.

Mas a imaginação é quase sempre caprichosa. E todo capricho, por natureza, é teimoso. As imagens que se lhe apresentam - lá sabe o turista por que - talvez em razão da bela mata que se vê ao longe - são fotos, audiovisuais, filmes que viu, em diferentes ocasiões, sobre índios, seus costumes, suas moradias, seus ritos de festa, de luto e de guerra.

O candidato à sesta consegue escapar, por fim, a perseguição indígena, pouco propícia à distensão, e de palpebras baixadas, na insistente procura do sono, vai fazendo emergir da memória, mansa e suavemente, a lembrança dos sertanistas Villas Boas que, dos bons ares da serra botucatuense, partiram para as matas no afã de civilizar os índios Lembrou que aqui também aportou para se dedicar ao seu primeiro emprêgo de médico, do Instituto Experimental Agrícola (Fazenda Lageado), o sanitarista e também sertanista Noel Nutels. Segundo depoimento do próprio Noel, que aqui conheceu os irmãos Orlando, Leonardo e Cláudio Villas Boas, foram eles marcantes em sua vida e vocação.

tudo Enfrentaram e sofreram os ataques da malária na defesa de seu ideal maior. Nosso turista se distende. Sente que sono se vai acercando. Mas, por seus ouvidos adentro penetra os sons da mata numa lembrança distante. Corria o ano de 1949 e o Ministro João Alberto nomeia Noel Nutels médico da expedição RONCADOR-XINGU, então confiada aos irmãos Villas Boas. Os Villas Boas penetram no sertão de Mato Grosso ao norte do estado, numa zona de transição florística entre o Planalto Central e a Amazônia A região toda ela plana, onde predominam as matas altas entremeadas de cerrados e campos, é cortada pelos formadores do Xingu e pelos seus primeiros afluentes da direita e da esquerda Os cursos formadores são os rios Kuluene, Ronuro e Batoví Os afluentes, os rios Suiá Missú, Maritsauá-Missú, Uaiá-Missú, Auaiá-Missú e Jarina.

Segundo os irmãos Villas Boas, antes mesmo de ser criada a Expedição Roncador-Xingu, em 1949, já, em 1946, eles haviam chegado aos formadores do Xingu e, os seus povoadores indígenas eram, nas suas várias práticas e costumes, estritamente os mesmos encontrados pelo etnólogo alemão Karl von den Steinem, em 1877, em sua expedição etnográfica. Era idêntica a distribuição das aldeias na região, o mesmo intercâmbio e relações entre elas; a mesma índole pacífica, a mesma hospitalidade, curiosidade, traduzindo-se, ao contato com estranhos, nas atitudes ingênuas e amistosas que tanto impressionaram o explorador alemão, mercendo dele o mais minuciosos e expressivo registro.

aldeamentos construídos pelos civilizados; fica proibido o desmembramento da família indígena, mesmo sob o pretexto de educação e catequese dos filhos; garante-se a posse coletiva pelos indígenas das terras que ocupam e em caráter inalienável; garante-se a cada índio os direitos do cidadão comum, exigindo-se dele o cumprimento dos deveres segundo o estágio social em que encontra.

Ao lado de Darcy Ribeiro, Heloisa Alberto Torres, José Maria da Gama Malcher e do General Rondon, os irmãos Villas Boas vão conversar com o Presidente Vargas para a criação do Parque Nacional do Xingu. Tudo inútil. O parque só seria criado mesmo no governo de Jânio Quadros, em 1961 e, aumentado em sua dimensão, em 1968.

Tempos depois, o Dr. Noel Nutels encontra-se com o Ministro João Alberto Lins de Barros que, depois de conseguir carta branca de Getúlio Vargas para criar a Fundação Brasil Central, espera poder desbravar e recuperar o sertão. O turista, repousando, dolentemente em sua poltrona, rememora que o sertão possui inimigos mortais dentre eles a malária que os espera nos charcos, pantanais eáguas paradas. Independente do homem que chega ou sai. É mal de tocaia. No sertão e no mundo todo. Não é como a tuberculose, mal adventício, pelo menos para o habitante legítimo da selva, seu dono de muitos séculos. Vem na companhia do desbravador. É companheira das injustiças e incompreensões dos que estão chegando. E, os irmãos Villas Boas sabiam disso

A presença dos irmãos Villas Boas seria uma continuação do serviço de proteção ao índio criado pelo governo em 1910 Um dos grandes idealizadores desse serviço foi, sem dúvida, o Marechal Rondon que sensibilizado com a situação telegráfica, sem empregar a força, conseguira contatos pacíficos com os índios dos territórios atravessados pela linha telegráfica

Orlando, Leonardo e Cláudio Villas Boas concretizaram o novo tipo de política indigenista: os índios passam a ter o direito de viver segundo suas tradições, sem ter que abandoná-las necessariamente; a proteção é dada aos índios em seu próprio território, pois já não se defende a idéia colonial de retirar os índios de suas aldeias para fazê-los viver em

O turista volta a divagar: Na tribo dita selvagem, não há mandões, nem chefões. O cacique é tão só um líder-conselheiro. Tudo se resolve com o consenso de todos. É uma democracia plena Não há entre os índios, fazendeiros nem colonos, patrões nem empregados, proprietários nem marginalizados, ricos nem pobres; não há leis, regulamentos, repartições, taxas, impostos, toda esta inferneira que você conhece. Em suma, nada há do que divide, hierarquiza e jugula. A espontânea nudez de ambos os sexos é completa, ou quase tanto. Todos andam inteiramente à vontade pela selva, procurando petiscos para comer: peixe, ave, besouro ou fruta. De volta, repartem com as famílias tudo que pegaram. Ninguém que ser mais do que ninguém, nem pensa muito no dia de amanhã. É, enfim, o paraíso na terra.

Em entrevista à revista Visão (10/02/1975), Orlando Villas Boas disse: “Se um índio der um tremendo berro no meio da aldeia, ninguém olhará para ele, nem irá perguntar por que ele gritou. O índio é um homem livre”.

Os irmãos Orlando, Cláudio e Álvaro Villas Boas. no destaque, Leonardo Villas Boas, o mais velho e que faleceu primeiro
Casal Agnelo e Arlinda Villas Boas e filhos: Nelson e Orlando (ao lado do pai), Arlinda Lourdes segurando Álvaro, Cláudio (sentado) e atrás Acrísio. Leonardo (na frente) e atrás, Erasmo.

"A semente"

Ouvindo as palavras de um pastor, fiquei com aquela mensagem na mente.

Disse ele que rogou por inspiração para sua pregação naquele dia, naquela ocasião especial.

O interessante é que ele e a sua esposa sonharam o mesmo sonho, e tinham a mesma palavra inspiradora: a semente.

EXPEDIENTE

Talvez tivesse falado dormindo e ela em seu sonho ouviu, ou os dois vivem há tanto tempo juntos e se conhecem tão bem que muitas vezes nem precisam de palavras para se comunicarem.

As vezes um simples olhar trocado e a comunicação foi feita.

Devem ser assim as almas gêmeas.

O evento era um casamento de dois jovens criados na mesma comunidade, conheciam-se desde crianças e seu amor já existia desde os quinze anos.

Seu relacionamento foi uma feliz consequência.

Esse lindo par era a semente perfeita de um novo lar cristão bem formado.

Todos que ali estavam afiançavam e abençoavam a sua união.

Nunca tinha visto algo semelhante ao que ocorreu depois.

Nessa comunidade costumam realizar encontros supervisionados para os jovens e num deles, durante sua adolescência, foram entregues aos seus pais uma chave correspondente ao coração de cada um, para que fossem guardadas carinhosamente para quando encontrassem seu parceiro (a).

Em um lindo momento da cerimônia os pais dos noivos que tinham guardadas as chaves do coração deles, fizeram solenemente a entrega dessa chave.

Entoaram lindos cânticos durante a cerimônia.

Uma pessoa lá me chamou a atenção a ponto de não conseguir tirar os olhos, principalmente quando todos cantavam ao som dos músicos.

Cantava de olhos fechados e com total entrega que se via sobre ele uma aura dourada envolvendo sua pessoa.

Balancei a cabeça pensando, é o efeito das luzes do por do sol incidindo sobre essa figura.

Mas como já escurecia naquela tarde perfeita rendi-me á ideia que suas energias eram mesmo douradas, e a semente crística nele se sobressaia e a todos inspirava.

DIRETOR: Armando Moraes Delmanto

EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO: Gráfica Diagrama/ Edil Gomes

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Tels: 14.99745.6604 - 14. 991929689

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