
Presidente Lincoln da Cunha Pereira
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Cito BaudeIaire,o maior deles mente edificante e patriótico. Die um dos maiores em qualquer rigido aos filhos, é singelíssimo o língua. Os simbolistas Cruz e Sou- seu conteúdo. Noventa anos depois za e Venceslau de Queiroz de publicado está velho, nem o manisfestaram afinidade poética autor o queria sempre novo. Mas com Teófilo Dias, chancelando, direi que se uma nação há ncccsportanto, sua inclusão na poesia sitada de entusiasmo, essa nação é nova. 0 Brasil. Povo ciclotímico, o brasi-
“Sonoro mar - a música me leiroderiva, rapidamente, da eufo ria à depressão. Onde via tudo
E em éter vasto, sob um teto amargo, M
De brumas a minha alma, feita ao largo,
Para o meu astro pálido se
Contesta Afonso Celso que Teófilo Dias mostrou-se, em seu pai tenha sido o último época, entusiasta paladino da presidente do conselho de IdéiaNova, enão só em poesia. Foi repulicano, antimonárquico e anti-religioso. Estava, portanto, distante do parnasianismo, da “torre de marfim” da arte pela arte. Cataloguemo-lo como simbolista. Afonso Celso de Assis volve.' sua
consumados, embora a mudança de regime, em 15 de novembro, tenha sido tão inesperada que, no Passeio Público, onde cspairccia, o conselheiro Ayres não se dera conta dos acontecimentos do Campo de Sanf Anna. Um dos fundadores da Academia. Afonso Celso foi Jornalista, parlamentar, poeta, historiador, ensaísta. Lançando-sc a uma empreitada dificílima, a de escrever a biogra fia do próprio pai, teve êxito. No gênero biográfico c modelo. Dá-nos a conhecer, minuciosa mente, a vida do Visconde de Ouro Preto, em cujas mãos caiu o impé rio do Brasil. Contesta Afonso Celso que seu pai tenha sido último presidente do conselho de ministros da Monarquia. Saraiva havia aceito a incumbência de ganizar novo gabinete. Mas acontecimentos se precipitaram c historicamente, o 36® gabinete, úl timo do Império, foi presidido pelo Visconde de Ouro Preto. Afonso Celso dedicado brasileiro, sua terra e sua gente.
Sucedeu a Afonso Celso, médico, professor de medicina, sanitarista, humanista, Ciementi Fraga. Sempre me fascinou dicina. Em envolve.
ministros da Monarquia. Saraiva havia aceito a o incumbência de organizar novo gabinete. oros
no a meanos longínquos de minha infância e adolescência, pasmada cidade do Interi paulista, bem me lembro do médi co de família, levando, na visita aos doentes, a valise com os apare lhos de seu ofício. Católico, vi no pecado original, como ensinam teólogos, contra o pelagianismo chave do sofrimento. Vivemos época de fé enfraquecida, não obstante a formidável presença do Papa João Paulo II, peregrino de Deus, na vasta cena do mundo, e o seu carisma no convívio com as em
Do livro mais conhecido pas samos a outros, ^Iguns estudos e escritos de circunstância, reunião de artigo de jornal, como as resor os ,a multidões: Apesar do penoso amortecimento da fé, creio, firme mente e com robusta certeza, que o dogma do pecado original explica.
Figueiredo deve ser estudado por sua formação, pelo ambiente no qual nasceu e cresceu, sobretudo róseo, passa a ver tudo negro. Não por sua fé, vivificada na fonte do lhe iriam mal, portanto, algumas Catecismo da Contra-Reforma. injeções de ufanismo, sem dúvida Católico do credo e do manda- modernizado, de Afonso Celso, amou o mento, inteiriçamente católico, homem fiel aos sacramentos, às Afonso Celso tanto se destacou na penitências da Santa Madre Igreja, firmeza da fé que recebeu do Papa e fiel, também à pátria onde nasceu Pio X o título de conde de Santa Sé, e morreu, numa época e numa idade histórica dominadas pelo laicismo. Se vivia Afonso Celso num país católico, onde a fé sincera do povo se mani festava, com freqüência, nas ceri- postas ao combativo jornalista mônias católicas, nas missas epro- Ferreira de Araújo. Acusando a cissões, vivia, também, num meio República, usa, em defesa da Mosaturado do laicismo diílmdidopela narquia, argumentos válidos ainda França. Não hesito, portanto, em hoje. Afonso Celso, que foi repuarrolá-lo entre os moralistas cató- blicano na Monarquia, converteulicos. Seu livro mais conhecido, se ao Antigo Regime, logo depois “Porque me Ufano de Meu País”, de proclamada a República. Deu justifica a classificação que lhe explicação de suas atitudes no entendi rotular. Comprometeram- opúsculo Guerrilhas. Paradoxal no os adjetivos ufanista, ufanismo, ou não, aderiu aos monarquistas Mas Afonso Celso pretendeu, inconformados com o advento da apenas, escrever um livro moral- República, neste país de fatos
teologicamente, a dor humana so bre a face da terra. Todos somos herdeiros de uma primeira c maior dor, como somos beneficiários da redenção trazida á Terra por Cris to. Não importa que milhões de habitantes do mundo não creiam cm Deus, na Revelação cristã c no destino eterno do ser humano. O dogma prescinde de adesões sem o amparo da graça. Numa de suas epístolas, diz São Paulo que o cor po c o receptáculo do espírito. Ensina a filosofia da Escola que a pessoa humana c hipóstasc de corpo e alma ou substancia completa, dotada de natureza racional. Seu conceito tem sofrido mudanças profundas. Mas os paleocsco- iásticos c os ncocscolásticos reto maram estudos c reflexões do pas sado, demonstrando os fundamen tos inalteráveis da filosofia da pessoa. Os valores espirituais fodiminuídos, embora toda uma
ram corrente de pensamento tente revitalizá-los, enfrentando, resoliitamentc, o desafio da ciência c da técnica, ou do cientismo e do tecnologismo que, se não forem subordinados à soberania do espí rito, nos converterão em peças de
sua gigantesca engrenagem. Por mais que a ciência tenha feito progressos, limitada, ainda, é a sua capacidade para rcsolverproblemas psíquicos e físicos do ser humano, particularmente a ciência médica. Aplicando-se a defender e proteger a vida, a medicina procu ra não só curar, como eliminar, ou quando não lhe for possível, dimi nuir a dor. Não direi da tantas ve zes insuportável dor moral. Essa, a medicina está capacitada, apenas, a disfarçar com os tranqüilizantes. Não a cura. Direi da dor física para cujo combate o médico dispõe e vai dispondo, cada vez mais, de vastos recursos. E a medicina mna vocação altíssima na qual só de vem permanecer, como aconselha
São Paulo, os para ela chamados. Clcmentino Fraga deixou fama de notável medico, de humanista, de cultor das letras na sua castiça ex pressão, de ser humano dotado de raros atributos morais. 0 enfemio para Clcmentino Fraga era o ser criado à imagem e semelhança de Deus. Sabia o médico que a função da medicina é linimentar a dor e
Os valores espirituais foram diminuídos^ embora toda uma corrente de pensamento tente revitalizáAoSy enfrentando o desafio da ciência e da técnica.
prolongar a vida para a distanciar da morte. Sc o nosso itinerário no mundo é balizado de cruzes, cabe à ciência médica estender o mais longe possível esses marcos do caminho da eternidade. Clcmentino Fraga cimipriii a sua vocação mé dica, e ainda Uie acrescentou a de escritor, destacando-se nas letras com tanto brilho quanto na medici na. Abstenho-me de mencionar os trabalhos médicos, estritamente profissionais e técnicos, para citar os estudos sobre o bovarismo, raro no Brasil, sobre Antero de Quental, sobre o humanismo na medicina, sobre a vocação liberal de Castro Alves, sobre a medicina e os médicos na vida de seu glorioso conterrâneo. Rui Barbosa. Valio sa, em todos os sentidos, foi a ba gagem literária deixada por Clcmentino Fraga. E o seu legado com seu alto nome na medicina. Na segunda quinzena de de-
zembro de 1955, próximo do Na tal, assaltou-me a melancolia. Viú vo recente, sem filhos, nem mes mo 0 cargo.de diretor de jornal me distraía a depressão que, ameaça doramente, me sitiava para me as saltar. Percebendo meu estado, um caríssimo casal de amigos me convidou a passar o Natal e o Ano Novo em sua companhia em Paris. Aceitei o convite. O avião que me levou não pôde, no entanto, pousar em Paris. Uma greve paralisara o aeroporto de Orly. Fomos, os pas sageiros, desviados para a alterna tiva de Bruxelas. Telefonei da ca pital belga aos meus amigos, avisando-os que chegaria de trem. Foram à estação me esperar. Quando desenbarquei, estava com eles, na plataforma, um desconhe cido. Para mim desconhecido. Após os cumprimentos, a apresen tação do desconhecido. Era Paulo Carneiro. Assim começou a nossa amizade no remoto inverno de 1955. Durante os dias que passei
em Paris encontramo-nos varias depois, sucessivamente.
versa um
vezes e, sempre que eu ia à França procura va avistar-me com o erudito amigo, mantendo, então, com ele, con de horas. Paulo Carneiro foi espírito jovial, dotado de ex celente humour. Por ter vivido muitos anos em Paris, tomou-se autêntico parigot. Era gourmet exigentíssimo. Lembro-me de almoços e jantares com ele, da esco lha dos pratos e dos diálogos com o sommelier sobre a appelation e 0 millèsíme na escolha dos vinhos. Paulo Carneiro não dispunha de recursos pecuniários para manter trem de vida farto, mas era um fidalgo, um grã-senhor nos convi tes. Esse 0 lado mundano, ameno, da vida de nosso predecessor. Ou tro lado deve colocá-lo entre os grandes brasileiros de seu tempo: o cientista, o filósofo, o humanista. Engenheiro químico, especializou-
se no estudo e aplicações do curare, veneno terrível dos índios da Amazônia. Deveu-lhe a medicina o princípio ativo e o alcalóide, para uso terapêutico. No Instituto Pasteur, de Paris, Paulo Carneiro firmou reputação científica. Era respeitado pelo corpo de pesqui sadores daquela instituição. Em todos os cargos que ocupou Paulo Carneiro sobressaiu-se pela cultu ra, pelos predicados de sua bela inteligência, pelo zelo que punha nas obras a realizar e no dever a cumprir. Num de nossos jantares, falou com paixão dos monumentos egípcios da Núbia, cuja salvação estava sob sua responsabilidade. A barragem de Assuam os submergeria. Impunha-se impedir esse crime contra a arte e o registro histórico. Paulo Carneiro presidiu a comissão da Unesco designada para essa missão. Os recursos afluíram, a tecnologia foi aciona da, e os monumentos foram salvos. Paulo Carneiro já foi louvado pelo meu ilustre antecessor. Em nosso último jantar, em Paris, pro longamos a estada à mesa dialo gando sobre tema filosófico. Ele, fídelíssimo ao pensamento de Augusto Comte; eu, filiado à patrística, à escolástica e seus pro longamentos. Mas nosso diálogo não poderia ter sido mais agradá vel, nem mais exemplar. Deixou bem nítidas as duas posições. Para os filósofos não há corrente de pensamento, da qual discordamos, que não contenha uma parcela de verdade. Segundo Paulo Carneiro, humanidade entrou no estado positivo marcado pela era tecnológica. Para o positivista fo- ram superados os estados teológi co e metafísico e, na realidade do antiteísmo contemporâneo, cada vez mais extenso com a anunciada morte de Deus, a humanidade é o grande ser submetido à lei do pro gresso. Argumentei que o ser hu¬
mano é naturalmentc atraido para a divindade, nutrido de metafísica, e a humanidade, segundo Comte, uma ficção. Argumentei, ainda, que para mim, católico, o positivismo traduz-se por uma tomada de posi ção metafísica. Insisti que não dercconheccr valor vemos comprovadamente histórico na lei dos três estados, embora concorde
Diante do ministério da morte, somos impotentes para decifrá-lo.
Segundo o filósofo de Aix, “ne nhum estudo aprofundado se ela borou do ponto de vista filosófico sobre a morte, não obstante a sua realidade em nosso cotidiano”. Diante do mistério da morte, so mos impotentes para decifrá-lo. Na sua sabedoria, ensina a Igreja a pensarmos na morte c na ressurrei ção. E essa, mesmo, segundo Chatearbriand, no “Lc Génic du Christianismc”, a única licença, para a quebra do silencio regular, concedida aos monges trapistas de Mortagne. O homem não ignora, medita Heidcggcr, que vai para morte. Filósofo da angustia, para Heidegger, o ser humano não sabe o que o espera depois da morte. Para os que têm fé espera-os ressurreição. Os místicos cristãos
Na sua sabedoria, ensina a Igreja a pensarmos na morte e na ressureição. a a veem, mesmo, na morte a afirma ção da vida. Para os que não icm fé espera-os o nada, filosoficamente insustentável. Humildes, vençamo-nos dos imperserutáveis segredos da Providência. Porque Deus Nosso Senhor—c falo como homem de fé .m con- Wi
com a inegável realidade da con quista da Terra pela ciência e a tecnologia. Saímos tarde, cada qual com sua posição filosófica. Deixou-me no hotel quando nos despedimos, como sempre, cor dialmente. No dia seguinte parti para o sul da França. Não mais o revi. Lembro-me com saudade do caro amigo.
chamou tão cedo José Guilherme Merquior? No prefácio de seu último livro, Ro berto Campos faz a mesma rcflexão: “A partida de José Guilherme Merquior, aos 49 anos, no apogeu da produtividade, parece um cruel desperdício. Deus faz dessas coi sas. Fabrica gênios e depois quebra o molde”. Maurice Blondel dera a morte impensável. Não tro no amplo recinto onde caberia debater a morte como fim e consiencomo ressurreição. Aceitemos não serem os pensamentos dc Deus os nossos pensamentos, nem os seus cami nhos os nossos caminhos. Lamen temos que a morte tenha levado José Guilherme Merquior quando o jovem pensador se encontrava na plenitude de seu talento e mui to poderiamos esperar de sua inte ligência fulgurante, de sua riquíssima produção cultural, de a
Pela boca do Isaías profeta diz o Senhor; “Os meus pensamentos não são os vossos pensamentos; nem os meus caminhos são os vos sos caminhos”. Deus somente de cide o nosso destino sem que o saibamos sobre o futuro, ainda que a ciência tenha reduzido em muito a margem do acaso na vida. Nin guém possui a chave da incógnita da morte. Um dos grandes filóso fos deste século, e filósofo católi co, Maurice Blondel, incluiu no seu estudo “La Pensée”, um capí tulo sobre a metafísica da morte.
seus estudos sobre os problemas do nosso tempo. Rendo homena gem ao meu predecessor. Consi dero um privilegio fazer o elogio de morto galardoado de tantos méritos. Nãoconheei pessoalmcnteJose Guilherme Merquior. Nunca nos encontramos. Nunca trocamos palavras. É provável que, em diá logos, divergíssemos, c divergiria mos, cm teses das muitas que nos
preocuparam, c sempre mc preo cupam. Mas é iiTclcvanlc cogitá-lo. José Guilherme Merquior foi de vorado pela curiosidade, que, como dizia, saborosamente, Eça de Queiroz, nuns leva a descobrir a América e noutros a olhar pelo buraco da fechadura. Merquior era da raça dos primeiros. Descobriu continentes. Ou os explorou com a ferramenta da sua inteligência. José Guilhemie Merquior, ca rioca dc nascimento, foi diploma ta, polemista, ensaísta, crítico lite rário, crítico cultural, numa palapolígrafo. A diplomacia é uma
México, e faleceu como chefe da delegação do Brasil à Unesco. Carreira brevíssima, prometida, no entanto, a outras missões, onde seus dotes culturais e o tirocínio de sua profissão se fizessem necessários. Em Londres, Bonn, México, Paris, deixou o rastro luminoso da vasta soma de coniiecimeníos que jun tou com sofreguidão. Diplomata, polemista, ensaísta, crítico literá-
Merquior, na sala das sessões, pedir-lhe para sentar-se ao seu lado, e aconselhá-lo à concha do ouvido — lembrou-o Josué Montello não se envolver em polêmicas de nenhuma espécie, para não coleci onar dissabores. Sem faltar com o respeito ao venerando mestre de tantas obras primas, o mestre que tinha horror à controvérsia, Merquior continuaria firme na ala dos polemistas. Na Academia fo ram eles numerosos e destemidos. Lembro, dentre os mortos. Rui Barbosa, com esse notável exem plar do gênero, “A esfola da calú nia”; lembro Eduardo Prado, José do Patrocínio, Alcindo Guanabara, Carlos de Laet, Silvio Romero, Assis Chateaubriand. Vemo-los impávidos, uns caçando lugares outros castigando a ousaa
Não nos deixou obra volumosa em número, mas todos os seus livros dão o testemunho de uma inteligência superior. comuns, dia dos difamadores, estes enfren tando a prepotência dos detentores do poder, aqueles discordando de conceitosejulgamentos. Merquior foi polemista até os últimos dias de curta vida. Ensaísta, suas obras merecem a perenidade das estan tes. Não nos deixou obra volumosa em número, mas todos os seus lidão 0 testemunho de uma invra, vocação rara, pois o diplomata es colhe exílio voluntário e nele per manece longos anos. Depende a diplomacia da arte da discrição, do comedido e sem ambigüidade das palavras. Escola aprimorada longa tradição, no Itamarati formam os membros da “carrière”, com tal rigor, que nesse meio ori ginal consideram-no tão perfeito quanto o Foreign Office, o Quai d’Orsay e o State Department. Na literatura foram, não pouco, satiri zados os diplomatas. Quem leu Proust lembra-se do marquês de Norpois. Mas a diplomacia é uma profissão seríssima, especialmen te no mundo contemporâneo, onde os problemas e as questões inter nacionais são cada vez mais com-
uso se cm ro plexos. Merquior foi embaixador precoce, pois tudo em sua vida foi precoce. Serviu na secretaria de Estado, em embaixadas, foi asses sor de ministros, embaixador no
rio, crítico cultural. Considero di fícil identificar o diplomata e o polemista na mesma pessoa. Sinto a tentação de admitir que são ho mônimos, tão longe da polêmica está a diplomacia. Mas José Gui lherme Merquior foi tão ágil e va lente polemista como, segundo os colegas, perfeito diplomata. Não é polemista quem quer, mas quem pode sê-lo. Usando a velha figura do espadachim, direi que o polemista age como esses lutado res aos quais nos habituaram Ale xandre Dumas, Edmond Rostand e o cinema de capa-e-espada. Com vivacidade, erudição e coragem engalfmhou-se em debates, agi tando 0 ambiente cultural brasileisenipre se impondo com “donaire.”
Nesta Academia, faço a ima ginação trabalhar e vislumbro e ouço o fantasma do velho Macha do de Assis chamar o jovem
sua
vros
teligência superior, de formação característica nos grandes centros universitários da Europa e dos Es tados Unidos. Qualquer assunto de sua pena ganhava dimensão auto rizada. Era citado e comentado, fosse de sua autoria o artigo de jornal, 0 ensaio de revista ou livro. Fenômeno raríssimo, Merquior conquistou, sem oposição, a famo sa República das Letras, na qual ocupou lugar eminente. A Acade mia o acolheu como um dos valo res mais altos da intelectualidade brasileira. Editado, traduzido e comentado nos Estados Unidos, na Europa, na América Ibérica e, evidentemente, no Brasil, era um dos nomes mais conhecidos e res peitados da cultura brasileira.
Mas esse moço, que atropelou e lúcidos intérpretes dos fenômea vida, apressadamente, foi csco- nosartísticos,políiicoscsociai sdc Lhido pela morte e partiu aos 49 nosso tempo. O primeiro ensaio da anos. Com sua presença ativíssima seleta “Crítica” sobre a poética de na pugna das idéias, provocante Gonçalves Dias, escrito aos 23 como desafio, porfiou em fazer os anos, já anuncia o crítico bem brasileiros se atualizarem pela in- instrumentado. Basta-nos a sua formação. Apegam-se, ainda, a análise da música da Canção do ideologias de idade caduca, já sen- Exílio, onde, nas suas palavras, tenciadas à morte pela História, ressoa, claramente, o motivo da não poucos clérigos nas universi- obsessão com a aparência do estridades, nos “media”, na política. Contra eles, Merquior assestou suas baterias e os bombardeou, abaten do tantos deles e tantos deles ferin do mortalmente. Prosseguiu no trabalho que outros mais velhos fizeram antes o da introdução do Brasil na esfera da modernidade, da qual necessitamos, para superar a ignorância, vencer a pobreza c er guer a nação ao patamar das mais desenvolvidas. Seu talento, seu patrimônio cultural crigiram-no cm crente fiel no poderio da inteligên cia e da palavra pelo êxito de sua ação cultural e pela admiração que suscitou. Como os mais conheci dos escritores da língua portugue sa, reunidos em antologias, Merquior era dono de estilo pesso al na exposição de suas idéias. Es crevia bem. Sua língua tinha, como queria Chomsky, aspecto invetivo. Pensador, prestou inestimável e ainda de todo inavaliado serviço ao Brasil. E tal a irqueza de seu pensamento, tão expressiva a mas sa de suas reflexões, que devo selecionar-lhe trabalhos dos quais colho a sua dimensão, para citá-los nos limites protocolares de um dis curso acadêmico.
Dos ensaios reunidos em “Crí tica”, temos um Merquior de 23 anos a um Merquior de 48 anos. Um quarto de século de leituras, de estudos, de pesquisas, de medita ção, de maturação, de assimilação, de depuração. Nessa longa pará bola, Merquior firmou-se como analista de idéias dos mais argutos
da razão. Foi esse o tio condutor, a meu ver, da sua crítica, a crítica antiformalista, projetada da razão. Seus ensaios, reunidos nesse volu me, o consagraram como um dos maiores críticos dc idéias do Brasil contemporâneo. Para ele, a crítica deve ser independente, julgando, sobretudo, o espírito da obra. Em o “Elixir do Apocalipse”, Merquior obedeceu ao modelo dc Walter Bcnjamin, sopesando o valor dos textos literários cm fun ção dc sua capacidade dc iluminar os problemas da cultura moderna, como SC nos apresentam no cre púsculo do século XX. Proclamando-sc humanista, quis o humanismo com raízes nos ctos brasileiros. Daí afirmar no estudo “Gilberto (Frcyrc) c depois”: “Não conheço pior forma dc colonia lismo inconsciente, dc criptomasoquismo intelectual que essa triste denegação a priori, da lidade ao nosso espírito c à nossa cultura
Esse moço, que atropelou a vida apressadamente, foi escolhido pela morte e partiu aos 49 anos. racionacomo SC a razão fosse um privilégio alheio, um atributo ubíquo do Norte, c não fizesse parle da nosssa humanidade”. Concordo com Miguel Realc que, itinerário filosófico, Merquior opôs ao irracionalismo de Heidcgger, cujo pensamento lisou em várias passagens de ensaios.
No “O Marxismo Ocidental”, livro que li primeiramente em in glês, por tê-lo encontrado numa livraria da Bannhoffstrasse, de Zurich, Merquior focaliza a classi ficação de Maurice Merleau-Ponty dentro do firmamento marxista, e estuda o corpo dc idéias, principal mente filosóficas, que abarcam obra de autores tão diversos quan to Georg Lukacs, Althusscr, Walter Benjamin, Jean Paul Sartre, Gramsci, Habermas. Procede o distinguo. Não há um único mar xismo, porém vários. O marxismo de Lenin e Stalin, e o marxismo a
bilho, reforçando-se na energia com que se firmava o ritmo. Te mos aí o sentido da Canção do Exílio. No ensaio sobre Machado de Assis, Merquior salientou o shopenauriano que concebe a exis tência como uma desalentadora oscilação entre a dor e o tédio, acrescentando que talvez só Baudelaire se compare ao nosso compatriota na argúcia com que define os vários matizes do enjôo moral. Sobre Fernando Pessoa, Merquior considera-o um intrépi do explorador de novos territórios no eixo vital do ego com o que o poeta se afasta tanto da revolta romântica, quanto do mito român tico, sem se afastar da dor universal.E uma síntese admirável do enigma chamado Fernando Pessoa. Colocando-se acima e além de modismos, Merquior fúndou-se na filosofia de Kant, para quem a crítica é positiva pelo uso prático em seu SC anaseus
ocidental que, segundo Merquior, nasceu no começo da década dc 1920, como um desafio doutriná rio ao marxismo soviético. O mar xismo ocidental pinta, segundo Merquior, o movimento como uma espécie dc liberal ou libertária do marxismo infinilamentc mais pró ximo da visão humanista do jovem Marx do que da sombria política do realismo socialista implantado na antiga União Soviética.
Não vou mc alongar. O mar xismo é tributário da filosofia imanentista dc Hcgcl, pois o abso luto imanente o domina, c nesse universo se manteve cm suas ver sões plurais. O imanentismo mar xista, soviético ou ocidental, não abriu para a transccdência, o autentico Absoluto que enche a faculdade apetitiva do sujeito. Historicamente, pelo seu vazio mctafisico, o marxismo é uma uto-
pia trágica, cuja instauração c rea lização pagou-sc com sangue e lá grimas por milhões dc servos do sistema. Insisto que o marxismo ocidental nada mais tem sido, no humanismo ateu, do que uma
epígonos, esse morreu. O messianismo está enterrado, seja o antigo, soviético, seja o ocidental. Enfim, o marxismo já não empol ga, e, a rigor, não interessa, senão a alguns acadêmicos da história das idéias. E o que acrescento às reflexões dc Merquior.
O estudo sobre Carlos Drummond de Andrade obedece à técnica rigorosa da tese universitá-
O temporalismo imanentista não garante a paz na Cidade Terrestre, não desvendando a esperança na Cidade Celeste.
lirismo irônico, não raro de lirismo
prosaico, foi estudada no espaço de poética abundantemente múlti pla. Em “Verso Universo em Drummond”, Merquior nos descerra o poeta na sua grandeza, no denso segredo de onde lhe brotou a inspiração. Na poesia de Drummond, como numa concha acústica, reboou a dor do mundo, esse mundo que se ele se chamasse Raimundo seria uma rima, mas não seria uma solução. A tese de Merquior é definitiva, constitui peça essencial na bibliografia do poeta.
Merquior dedicou um livro a MichelFoucault, figura central, até sua morte, em 1984, da filosofia francesa desde Sartre. Argüiu-o Merquior de niilista da cátedra. Foucault procurou dar fundamen to ético-político, acentua Merquior, ao pós-estruturalismo. Não o fez. Daí 0 rótulo de niilista da cátedra que Melquior lhe acolcheta. Em “De Praga a Paris” Melquior estu da o estruturaiismo, concluindo por afirmar o diagnóstico crítico da cultura de nosso tempo.
“A noção de que uma profun da crise cultural é endêmica à modernidade histórica”, diz Merquior, “parece ter sido aceita de forma ansiosa, mas não propri amente demonstrada — sem dúvia
da porque, mais fi-eqüentemente, os que geralmente a aceitam, os intelectuais humanistas maior interesse em serem vistos como os médicos da alma de uma civilização enferma. No entanto, o remédio é necessário, ou a enfer midade é real? Talvez devamos reconsiderar toda a questão”. Não pode fazê-lo. Merquior expõe o estruturaiismo de Levi-Strauss, um dos maitres à penser da França contemporânea. Discípulo do au tor de “Tristes Trópicos”, deu-nos, nesse ensaio sobre o mestre, o de poimento de quem lhe conheceu a têm o tando que, em conjunto, o mar xismo ocidental “foi apenas imi episódio na longa história da velha patalogia do pensamento ociden tal cujo nome é, c continua a ser, irracionalismo”. Livro denso, es crito antes da derrocada do sistema comunista na Europa Oriental, mantém-se na crítica da doutrina. Tenho para mim, no entanto, que continuarão a escrever os marxianos e marxólogos, mas o marxismo da temporalização re dentora, como o quiseram seus
ria que, submetida à Sorbonnc, foi aprovada com distinção. Temos nessa tese o verso universo do po eta, desde o lirismo inicial do mo dernismo aos últimos poemas, já tocados da ironia melancólica da vida no ocaso. Merquior analisa em profundidade a poética drummondiana, nas várias fases por que transitou, mais do que evo luiu a sua criação. Da pedra no caminlio ao José, do sentimento do mundo ao Boitempo, o universo drummondiano foi inteiro estuda do, perquirido com fascinante identificação de quem lhe assimi lou a mensagem. Merquior assina lou a universalidade do poeta, ob cecado sempre por suas origens. Para Merquior, Drummond foi o mais importante poeta de sua épo ca, classificação altamente louvá vel empais de grandes poetas. Toda a inquietação de Dmmmond, re passada de lirismo, tantas vezes de seu promessa sotcriológica irrealizável. O temporalismo imanentista garante a paz na Cidade Ter¬ nao restre, não desvendando, portanto, a esperança da Cidade Celeste. Merquior reconhece e acentua que fase criativa do marxismo oci dental parece esgotada, acrescen-
profundamente a obra. LeviStrauss, que iniciou carreira uni versitária em São Paulo e to mou contato no Brasil com as cul turas indígenas, é autor consagra do do estruturalismo.
Em “De Praga a Paris”, Merquior procede à ampla análise da obra do mestre, desde logo re conhecendo que “avaliar a obra de Levi-Setrauss é tarefa difícil”. Se 0 estruturalismo apresenta-se com o caráter de sistema, como acen tua Levi-Strauss, Merquior o es tuda sob esse prisma, praticando o método da dissecação. Reconhe cendo que Levi-Strauss abarcava aHistórianumapercepção ampla, dela tendo, mesmo, uma visão sombria, Merquior afirma que o mestre “acende em nossos cora ções algo de que necessitamos ter rivelmente: uma ética goethiana do respeito”. Prosseguindo na análise do estruturalismo e do pós-estruturalismo, estuda o pen samento de Roland Barthes, outro maítre à penser da França con temporânea. Dedica-lhe quase tanto espaço quanto a Levi-Strauss. Festejado em seu tempo, Barthes alçou-se a líder cultural, atraindo ao College de France ondas de entusiastas de seus conceitos, sua prosa e sua percuciente análise dos textos, dos fenômenos lingüísticos, e do es truturalismo. Para Merquior, Barthes teve papel crucial no mo vimento estruturalista, pois, acen tua, foi, por assim dizer, o oficial de ligação entre o estruturalismo e 0 existencialismo; foi, em suma, o modemizador da revolução literá ria antiburguesa. Já em Derrida, Merquior zurziu o estadulho da crítica desconstrução, que teve em Jaeques Derrida o seu mais ilustre nome, salienta Merquior, “vem a ser um negócio bastante melan cólico - a lúgubre inciência de
uma época”. E difícil, como se vê, avaliar na sua dimensão total a obra riquíssima de Merquior. Dai a minha opção por excertos re presentativos de seus livros. Na crítica do estruturalismo c pós-estruturalismo, reconhece no mestre Levi-Strauss posição des bravadora em ciência, e um humanista com perfeito conheci mento de todas as culturas, sobre'm.m
Tem variado o conceito de liberalismo dos séculos passadosy ou, mais delimitadamente, do século passado a estes últimos dias do milênio.
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tudo a do homem que polui o am biente. Merquior fala que o reló gio da História não pode ser atra sado, ao estudar o eminente mes tre, aduzindo que ele se entrega ao j ogo de protestar contra o Ociden te, derrubar a modernidade e arra sar o progresso. O estudo de Merquior faz de “De Praga a Pa ris” obra de consulta necessária em bibliografia, não só brasileira, como estrangeira, sobrè o estru turalismo em seus vários ramos, inclusive os divergentes. Impossibilitado de analisar extensivamente toda a opulenta obra literária de Merquior, detenho-me no seu último livro “Liberalismo - Antigo e Moder no”, antecipado pelo “A Natureza do Processo” e “O Argumento Li beral”. Não é o liberalismo os liberalismos mas renovada, com os tônicos res tauradores do espírito moderno. m.m e a
Comprccndcu-o, admiravelmente, Merquior, transmitindo-nos sua visão com o livro, herdado às le tras como testamento. Dentre os maitres à penser que mais influ ência exerceram no rumo do pen samento mundial, na segunda me tade do século, Raymond Aron coloca-sc cm lugar eminente. Foi o maior c mais autorizado pregadordonovo liberalismo. Merquior dedicou à sua memória “Libera lismo— Antigo c Moderno”. Tem variado o conceito de liberalismo dos séculos passados ou, mais delimitadamente, do sceulo pas sado a estes últimos dias do milê nio. Sua longa história suscita, portanto, uma reavaliação para integrá-lo no mundo moderno. Não entro no exame do liberalismo re ligioso, por não me caber fazê-lo. A Igreja ainda não mudou a sua posição doutrinária, não obstante o ecumenismo pós-conciliar mos trar-se tolerante a esse respeito encílica Centesimus Annus de João Paulo II já lhe constituir preparação. Excluído, pois, o li beralismo na religião católica mos, na sua expressão secular, doutrina liberal assegurar nas so ciedades, quando corretamente praticada, as liberdades funda mentais que exige a dignidade da pessoa humana. Esboroaram totalitarismos sob pressão do legí timo anseio de liberdade dos vos. Quem acompanha o movi mento da História, nestes derra deiros anos do século, vê-se diante da reação da liberdade como força incoercível contra todas as formas de opressão. Corporificando-se no liberalismo político, social e eco nômico, as liberdades da pessoa humana deram ao poder do Estado configuração na qual a nota prin cipal é a sua submissão ao império do direito e da lei. Falhas indigitam-se nessa conceituação. Não há negar. Mas o liberalismo
uma , vca -se os poimpiedosa. A ou uma causa nova.
se impôs, embora possamos coiocar a questào: “qual liberalis mo?”. Para Georges Burdeau, o liberalismo c um estado de espírito, um aconteeimento histórico como poder político c uma filosofia política. Todos os seres humanos aspiram à liberdade e lhe dão, mesmo, a vida em sacrifício, mas os liberalismos não são iguais.
Os vocábulos liberal e libe-
ralismo foram deturpados. Deve mos, por isso, restituir-Ihes o ver dadeiro sentido. Sc o liberalismo político, social e econômico deve ser entendido como autonomia da pessoa e participação mínima do Estado no seu processo, cabe ao poder dobrar-se a esse princípio, cuinprindo-o rigorosamente, do
livro, os autores que formaram e difundiram a filosofia liberal, e sua prática, de Locke a Raymond Aron, este um autêntico sucessor e continuador de Tocqueville, mas com maior ascendência na uni versidade e nos meios de comu nicação de nosso tempo. Bobbio, também autor de sua preferência, antigo socialista, opta por um social-liberalismo, no fundo uma
Estado liberal o
Os vocábulos liberal e liberalismo foram deturpados. Devemos, por isso, restituir-lhes o verdadeiro sentido. mesmo passo que protege nas pes soas as liberdades. Para Merquior miragem neoliberal de uma eco nomia sem Estado é, literalmente, uma utopia. Concordamos. Na so ciedade plural cm que estamos vivendo, corresponde à diversidade de juízos, opiniões, tendências e po sições sociais, econômicas e polí ticas. Não se pode, portanto, falar de uma redução liberal a um só conceito, a uma única definição. Devemos, antes, nos conciliar em do vocábulo liberalismo,
torno expurgando-o dos resíduos im puros que se lhe agregaram. Quando concluí o estudo de Merquior “Liberalismo e Moderno”, convenci-me de que trabalho, redigido com impres sionante massa de argumentos, com rigorosa base filosófica, au torizado suporte em autores clás sicos na matéria, ainda não esgo tou o tema. Se o autor não tivesse
nuança do liberalismo, como o devemos entender em nossos dias, quando o Estado tem, defínitivamente, participação normativa no processo econômico e social, como admite Merquior.
ce caracterizada por uma dialética contínua, embora cambiante, entre 0 crescimento da liberdade e o impacto em direção a uma maior igualdade, de onde a liberdade pa rece emergir mais forte do que enfraquecida. O liberalismo ainda não conquistou o mundo todo, nem mesmo em suas variantes. Como não nos devemos lançar em prospecções futuríveis lembremonos que o benefício já trazido às nações, onde funcionam as insti tuições liberais, anima a esperança de que a História será fecundada pelas liberdades timbradas com a sua etiqueta.
Ao lermos e meditarmos as obras de Merquior, impressiona dos pela riqueza das dissertações, a multiplicidade das questões exa minadas, e, portanto, disputadas, diríam os escolásticos; ao
como indagarmos sobre o seu funda mento filosófico, convencemo-nos de que estamos diante de uma Suma da Cultura Moderna, em vias de se formar, no melhor estilo de suas congêneres do passado, ainda que pontilhada de finíssima ironia. Se tivesse vivido para completar sua obra, provavel mente nos diría a Suma com as grandezas e misérias da cultura moderna, neste século XX, que termina em estertores de crise da civilização. ConcordocomMiguel Reale que Merquior se orintou a partir do críticismo kantiano, para uma visão concreta da História de Hegel, visão que ele considerava indispensável para arrancá-la do esquecimento. Foi o críticismo idealista que Merquior cultivou. Mas o forte pensador brasileiro não se deixou imobilizar no gesso de um sistema. Original na sua Weltanschauung, Merquior en riqueceu a reflexão filosófica trazendo-lhe contribuição própria. É 0 signo predominante de sua po sição no panorama filosófico a
Antigo o partido, provavelmente iria, a meu ver, desenvolvê-lo em outras edi ções, revistas e aumentadas. Do tado de incomum capacidade sintetizadora, Merquior fez desfi lar diante de nós, à leitura de seu
Concluindo seu estudo, Merquior expõe o que chama de inflexão nos meados do século XIX e desvio no término do mesmo século. Finalmente, nas duasútimas décadas renasceu o liberalismo com o liberísmo e seus efluentes, em economia. A corrente liberal está formada; foram-lhe soldados os elos rompidos neste século pelo totalitarismo e pelas ditaduras. Mas o liberalismo continua plural. Pode ser salutar, pode desvirtuar-se. Devemos querer o liberalismo substantivo, embora admitindo-lhe diversídades adjetivas. Na última página de seu substancioso estudo, acentua Merquior que para alguns sociólogos, nossa sociedade pare-
tente, ainda que sejamos hetero doxos, como não poucos se consi deram, nas várias correntes em circulação na galáxia do pensa mento. Se vivesse, quer-nos pare cer que Merquior se inseriria na corrente fenomenológica.
Partindo de alguns maitres à penser para exercer seu clarividente espírito crítico, Merquior classificou Marx de agitador de idéias, tributário de Hegel; estu dou Freud e a psicanálise; a teoria de Jung; os existencialistas, as ar tes, a nova crítica; enfim, a maioria das questões que interessam à indagação da inteligência foram
gações que lhe afluem á mesa dc trabalho de vários países c continemtes. Sua teoria tridimen¬ sional do direito é objeto de teses, de temas de congressos, de fonte de interpretação do fatojurídiconos
Permiti que eu louve a minha terra paulista»
percucientemente estudadas. Houve quem dele discordasse. Sem dúvida. É o destino dos iros e círculos culturais do mundo, polemistas e dos debatedores de Seu salão filosófico, pontualmente idéias. Mas seu espólio é opulen to. Tombou, com a sua morte, uma das colunas da inteligência brasi leira. Muito ainda teremos de es-
ários Associados”, cuja história está, ainda, para ser escrita. Admi ro nesse bravo lutador o periodista notável,o estilista elegante do idi oma, o esgrimista dc idéias, o eru dito das letras clássicas, o espírito jovem que se retempera, a cada dia, cm contato com a realidade, analisada em artigos concisos c primorosos. Admiro, sobretudo, no sólido presidente desta Casa, o esírênuo idealista dos direitos hu manos. Foi providencial tc-Io no meado o governo brasileiro para a Comissão que, cm Paris, iria redi gir o mais importante documento do século. Sua capacidade de tra balho assegurou-lhe a responsabi lidade na redação final, cscorrcita, definitiva da Declaração dos Di reitos Humanos, segundo a qual todos partillhamos do mesmo di reito, o de sermos iguais, ainda que as injustiças deste mundo não te nham sido, infelizmente, elimina das. Dou graças a Deus por ter-me premiado com essa munificência de sua bondade, a presidência desta sessão pelo acadêmico Austregésilo de Athayde.
Todos cantam sua terra, também vou cantar a minha, nas débeis cordas da lira, hei-de fazê-la rainha”
“Paulista sou há quatrocentos brasileiro. Não ficou estritamente expressões da Filosofia do Direito ligado ao kantismo, nem á visão em todo o mundo. E preciso apelar histórica de Hegel, cujo para a imagem da rosa-dos-ventos historicismo não aceitou, como se quisermos ilustrar a procedência lembra Miguel Reale. Merquior das cartas, das consultas, das indafoi um pensador cioso de sua inde pendência, não obstante, indepen dente ou não, todos, no campo filosófico, nos filiemos a uma ver-
Poeta romântico, sensível, Casimiro de Abreu cantou
Permiti que eu louve a minha terra paulista. Nesta mesma tribu na, um de nossos predecessores, Alcântara Machado, lançou a ex pressão que se tomou divisa do antigo patriciado de minha terra:
mais diversos institutos universitáaberto em março e encerrado em novembro, é cenáculo onde, uma vezpormês, um dos freqüentadores profere uma conferência que, em seguida, à debatida. E motivo de sua terra: perar que outra se erga para a substituir. Esse foi o fascinante alegriaserrecebidopeloeminente espírito a quem me coube suceder jus-fílósofo e filósofo, na Academia. Preside esta sessão o meu veNesta solenidade, para mim, Iho companheiro dos tempos heentre todas, memorável, única em róicos dos “Diários Associados”. vida,cujasombrasealonganoocaso, o acadêmico Austregésilo de sauda-me um caríssimo anjigo de Athayde. Uma grande aventura no meio século dedicado ao diálogo, às discussões, aos debates sobre ques tões filosóficas. Não tem rugas essa amizade, e não oficiamos no mesmo altar do pensamento. O acadêmico Iho edifício do centro do Rio de Miguel Reale e eu temos formação Janeiro. Levavam no bolso magra filosófica diferente. Mas não im- quantia emprestada por advogado porta. Colocamos a filosofia acima paulista, nosso predecessor, das filiações. O acadêmico Miguel Alfredo Pujol. Compraram o “O Reale é uma das mais altas Jornal”. Assim nasceram “Os Diplanisfério da informação teve iní cio com Austregésilo de Athayde subindo, em companhia de Assis Chateaubriand, as escadas de veanos Não tenho essa ventura. Vie ram da Itália para o Brasil meus avós paternos no fim do século passado com três filhos menores, e meus avós matemos, também da Itália, no início do século, com duas filhas menores. Paulista sou, portanto, analogicamente, há no-
venta anos. Mas paulista somos todos quantos nos impregnamos do “espirito bandeirante”, de que falou Gilberto Frcyrc. Estamos certos, desde os remotos anos da nossa formação histórica, que a obra comum é mais completa do que a individual, sc a estudannos à luz da teoria holista dc Gcllncr. Todos precisamos dc inter-relação c a praticamos num tácito concer to. Longe dc mim, animado que sou dc sentimento nacional, longe de mim pretender sobranccar São Paulo às demais províncias da nos sa pátria. Cada uma dela guarda o seu tesouro cívico original, a parti cipação no grande todo. São peças da História dc que muito nos orgu lhamos, pois, nas latitudes tropi cais, criamos uma civiliazação in comparável, por seu desenvolvi mento c suas notas humanistas. Venho, no entanto, lembrar a obra épica dos paulistas, como justo preito ao meu povo. Gilberto Frcyre, com sua luneta dc atento
observador, traçou o perfil admi rável do homem do planalto, o empreendedor, o criador de rique za, 0 ílindador de cidades, o perpé tuo bandeirante, animado sempre do mesmo espírito que empurrou para os sertões os grandes nomes do glorioso passado de São Paulo. Acentua Gilberto Freyre, com acertado julgamento sócio-psicológico, que o que pennanece no bandeirismo do São Paulo, étnica e culturalmente plural de hoje, é, principalmente, o élan, o motivo, a condição do “espírito bandeiran te”. Esse espírito subsiste no pla nalto, imbuindo-se de seu fluido, constante e forte, quantos vivem e trabalham em São Paulo, seja qual for sua origem e procedência. A missão de São Paulo é a de provo car emulação. Os bandeirantes partiram de São Paulo. Os empre endedores lançaram-se no risco das empresas, sem outro suporte senão o da vontade. As iniciativas, o fer mento social, o choque de opi¬
niões, as correntes políticas, o di namismo cósmico dos paulistas estão vivos, palpitantes em todos os ramos da atividade humana. São Paulo cumpre a sua missão, pois os paulistas são permanentemente tocados pelo espírito impalpável que os acompanha no tempo e no espaço, “o espírito bandeirante”, feito de civismo e da glória de criar para a Nação. Esse é São Paulo. Ao encerrar seu formoso discurso de posse, nesta mesma tribuna, disse 0 poeta Cassiano Ricardo: “Venho de Piratininga. Só não trago esme raldas”. Também eu venho de Piratininga. Também eu não trago esmeraldas. Mas trago, t aqui a ofereço a vós todos, a minha inaba lável fé paulista na grandeza do Brasil.
JOÃO DE SCANTCMBURGO in^es-
sou, com o discurso de posse acima, na Academia Brasileira de Letras. Sua posse na Cadeira 36, realizou-se em 26 de maio de 1992.
íServiço Fechado)
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desse pensador singular que com- fundamental intitula-se A extenpõe com tanta originalidade os são humana — Introdução à Filovalores da ação e da transcen- sofia da Técnica, o que quer dizer dência! Viestes, assim, confirmar da ação programada segundo dita0 antigo ensinamento de Fichte de mes da razão para a realização de que a Filosofia que se tem depende objetivos práticos. Compreen do homem que se é.
destes que foi a técnica que con verteu o Mundo Moderno cm
Permiti que vos diga, breve mente, em que consiste, no meu Mundo Contemporâneo, graças à entender, a originalidade de sua força revolucionária e Blondel, inconformado com o uniformizante, como o notou conceito de Deus-moíor-imóvel da concepção aristotélica, incompa tível com a idéia de criação que é a contribuição por excelência da tradição judaico-cristã, a qual im porta em amoroso movimento do Criador no sentido da criatura como fonte de caritas, de amor transcendental. Se Deus é o fim absoluto não pode deixar de ser, com efeito, o alvo perene da ação do homem fundindo-se ação com transcendência. Assim interpreto Blondel, o mais transcendente dos cultores da ação, que tanto vos atrai, concebida conforme bem o lembrais, como “itinerário para a autêntica plenitude”.
É sempre a problemática da ação que ainda vos leva a escrever livros dedicados ao “espírito paulista”, ou seja, a interpretar a razão comunitária e pioneira da gente bandeirante, desde os primórdios da colonização até a Semana de Arte Moderna, e essa admirável integração dos elemen tos alienígenas em sua vida social e política, lado a lado com pauli stas de quatrocentos anos; ou, então, a procurar na cultura do café á razão de ser da expansão industrial de São Paulo, sustentando, de manei ra original, a tese segundo a qual a cultura cafeeira teria sido um dos sustentáculos da unidade nacional, como base econômica, durante decênios, de nossos quadros institucionais.
Por fim, como era de esperar-se, vossa obra filosófica
pensador c amante dos estudos políticos c históricos, estais em condição dc suceder a José Gui lherme Merquior, o Alvares dc Azevedo dc nossa Filosofa, não somente por ter nos deixado tão cedo, mas também pelas intuições c interpretações geniais com que penetrou no âmago dc nossa cultu ra, descortinando-nos os valores do futuro.
Poucas vezes tive a ventura dc conviver mais demoradamente com esse jovem surpreendente, mas, cm nossos encontros fecun¬
Nenhuma profissão mais do que a de jornalista exige tão viva correlação entre a teoria e a praxe. c sena ar- 'Mí * dc que faziOS
Heidegger, pois, ao mesmo tempo que estende os poderes do ho mem, condiciona-o à poten cialidade das máquinas. E na rup tura técnica que podemos encon trar a causa maior do desmorona mento do chamado “socialismo real”, quando os russos se aperce beram que, não obstante o pseudocientifismo socialista de K. Marx, não era possível haver duas estruturas paralelas e conflitantes de processo científico e econômi co. A tecnologia, em suma, dissol veu a ideologia socialista, assim como converteu o capitalismo em capitalismo democrático. Ora, em vosso livro, que é de 1970, já apontais os valores positivos e ne gativos da técnica, não esconden do vossas preocupações.
Mais não será necessário acrescentar, meu caro João de Scantimburgo, para demonstrar que sendo, como sois, jornalista,
dos, jamais soube o que mais ad mirar nele, se a sua prodigiosa eru dição, SC o acume da inteligência na análise dos mais singulares pro blemas, sempre com admirável compreensiva visão do todo. Foi a rara altitude dc seu intelecto, sível a todas as palpitações da aventura humana, c sobranceiro todos os modismos filosóficos, tísticos e políticos am ruidosa praça os medíocres e futeis
que lhe permitiu oferecer segurança o diagnóstico de nossa época, não tendo lido neces sidade da derrocada do muro dc Berlim para iluminar-nos a rota essencial da História.
Polígrafo, com
como bem qualificastes, deixa-nos Merquior um acervo de obras cujo sentido global somente poderá ser capta do através de reiteradas análises o que porão em realce seus méritos de historiador das idéias; de críti co, ora entusiasta, ora severo, de obras nacionais e alienígenas; do demolidor corajoso de falsos ído los, sem jamais deixar de apontar o que neles pode haver de univer salmente valioso, como o fez, por exemplo, ao examinar as figuras de Freud ou de Foucault; do hermenêuta profundo de nosso patrimônio literário, quando reve la, como bem poucos o lograram, toda a riqueza de sua sensibilida-
de estética; c, para marcar sua so lidariedade com o drama dc nossa gente o pesquisador das correntes políticas da mais palpitante alualidade.
Ao longo dc nossa existência vamos compondo nossos rosários dc lembranças dc nossa existência coloquial — transfiguradas cm contas inspira das pelo afeto familiar, ou, então, pelas que a amizade consagra com outras mais que o convívio inte lectual seleciona c projeta no hori zonte ideal dc nossos propósitos. Merquior foi uma das contas mais preciosas do meu doce e saudoso cnfilcirar dc imagens, as quais, a final, acabam se fundindo à luz do amor, da amizade c da admiração espiritual. Ai dos que não sabem ir confeccionando, para sua alegria interior c a claridade das horas dc solidão, o colar dos personagens mais representativos de sua vida espiritual!
Fique-nos, pois, a imagem de Merquior como um astro na galá xia de nossas recordações melho res, e, ao contemplá-lo, renovare mos a emoção de ouvir estrelas sentida pelo poeta maior do parnasianismo, cujos valores es téticos ele soube isentamente assiseixos rolados
nalar no tempo, por nunca ter su bordinado seus juízos críticos à periodicidade das escolas. E no seio das Academias que se apre ende o sentido da real eternidade das letras, não obstante o fluxo incessante das tendências literári as. É desse sentido de pennanência estética, como intencionalidade perene de beleza sob infinitas for mas, que provêm a nossa tão
E sempre a problemática da ação que vos leva a escrever
livros dedicados ao
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espírito
paulista^*.
incompreendida imortalidade, menos do sujeito que ama do que do objeto amado.
E, Acadêmico João de Scantimburgo, acabastes de regis trar vosso nome no Livro-tombo quase secular desta Casa, fazendo
jus ao colar e à espada com que se completa o ritual desta ceri mônia. Nem sempre se atenta a seu significado simbólico, que cada um interpreta a seu modo, mas é preciso esclarecer-lhe a imagem.
Em verdade, passais apertencer à auri verde companhia ofícialraente reconhecida como guardiã da língua, 0 solo sagrado da República das Letras, sendo o colar o símbolo da fidelidade ao dever do bom combate emprol dos valores do idioma, donde 0 singular uso da espada a serviço da linguagem, o instrumento surpre endente que quanto mais se usa tanto mais se afia.
Com fardão, colar e espada, armado cavaleiro do idioma de Luís de Camões a Fernando Pessoa, de Castro Alves a Guilherme Almeida, Cassiano Ricardo e Menotti Del Piechia, 0 trio de ouro de nossa Academia Paulista de Letras, e membros ilustres também da Aca demia Mater, Sede bemvindo!
MIGUEL REALE recebeu com sauda ção, em nome da Academia Brasilei ra de Letras, o novo imortal João de Scantimburgo. A sessão realizou-se em 26 de maio de 1992.
(Serviço Aberto)
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(Da Interpretação do artigo 205 da da Lei das S.A.)
I. Introdução
1. Os efeitos da morte do usuífutuário de ações sobre o direito aos dividendos e as ações decor rentes de bonificação não tem sido matéria de estudos específicos no Brasil, embora constitua questão de interesse prático e doutrinário, na qual há divergências entre as várias legislações.
2. Trata-se, na realidade, de situação jurídica na qual incidem tanto 0 Direito Comercial como o Direito Civil, por estar numa área de superposição das normas de ambos, constituindo, assim, em certo sentido, um desafio para o jurista e um exemplo de escola no tocante às técnicas adequadas de interpretações que devem ser aplicadas.
3. As questões jurídicas em debate abrangem, pois, a definição do direito do usufmtuário ao divi dendo e à parcela dos lucros não distribuídos, além de se estabele cer qual é o titular dos respectivos direitos, ou seja, aquem (o Espólio do usufrutuário falecido ou os proprietários plenos que eram, até a morte do usufmtuário, simples nu-proprietários) devem ser pagos os dividendos, cujo valor foi aprovado após a morte do usufm tuário mas que se referem, no todo ou em parte, ao lucro produzido
enquanto estava vivo.
servas, a distribuição extraordiná ria de ações c podendo ainda ter, cm tese, outras fomias, razão pela qual a doutrina reconhece que o usufruto de ações levanta nume rosas e sérias dúvidas que foram sendo resolvidas, no tempo, inicialmentc pela doutrina c pela juris prudência c, mais rcccntcmcntc, pela própria legislação.
4. Embora a matéria pareça regida, clara e inequivocamente, pelo art. 205, caput, da Lei n° 6.404, justifica-se a análise da questão, pois, embora se invoque o adágio “interpretatio cessat in Claris”, evidencia-se que não pode preva lecer a aplicação exclusiva do processo literal, devendo ainda, para se obter uma conclusão in contestável, ser procedido ao exa me de espírito da lei, de sua siste mática e dos elementos históricos, recorrendo-se, na medida cabível, aos princípios geais e até às normas de direito estrangeiro para compará-las com as regras espe cíficas vigentes no direito brasi leiro. sua esnos na um O
II. do Conceito de Dividendo
5.0 direito ao recebimento do dividendo constitui um direito es sencial do acionista (art. 109,1 da Lei das S.A,), abrangendo a parcela de lucro líquido que a sociedade distribui periodicamente, em fun ção da titularidade de cada ação, com base no balanço do exercício social e de acordo com a lei e os estatutos.
6. O direito do acionista de participar dos lucros é mais amplo do que o seu direito ao dividendo, abrangendo a distribuição de re-
7. A doutrina c a jurispmdcncia caracterizaram os lucros societários como não sendo, na sua totalidade, necessariamente frutos na sência, só se transformando mesmos quando cristalizados forma de renda periódica. Assim, para os fins de Direito Civil, a tota lidade do lucro líquido da empresa não constitui, para o acionista, fruto ou uma renda. Enquanto lucro social representa a diferença entre as receitas e as despesas da sociedade, após as amortizações e demais ajustes decorrentes da lei ou dos estatutos, o direito do acionista ao dividendo somente surge e se exerce sobre a parte do lucro que não é capitalizado, mas destinado a ser percebido pelos sócios e que é de finido, pela Assembléia Geral, de conformidade comas determinações estatutárias e o acordo de acionistas, quando houver.
8. O lucro do acionista depen de, pois, de decisão da sociedade
que. de acordo com normas prccstabeiccidas. mas com certo poder discricionário, distingue entre a receita destinada a ser
disiribuida aos acionistas, c a par cela do lucro qiic deve ser capita lizado c incorporado ao ativo social.
9. No passado, cntcndia-scquc a Assembléia Geral podia decidira matéria discricionariamcntc. sen do até considerada soberana, tese que a doutrina espanhola ainda defende, com base na analogia en tre a estrutura política da empresa cdo Bstado. Atualmente, prcfcrc-sc admitir que existe um poder dis cricionário (e nào soberano), sub metido às normas jurídicas, que constam na lei e nos estatutos, e limitado pela teorias do abuso de direito c do desvio de poder. De qualquer modo, de acordo com a legislação vigente, cabe à Assem bléia Geral Ordinária decidir li vremente a respeito do destino do lucro, desde que pago o dividendo obrigatório e obedecidas as normas legais c estatutárias.
10. De acordo com as determi-
12. De qualquer modo, en quanto os dividendos sào, geralmente. considerados frutos civis ou até, em boa técnica, “frutos quase civis” ou “frutos civis ir regulares” (Alejandro Bergamo, Sociedade Anônimas, vol. 3 (Las Acciones), n° 1.070, pág. 447), as bonificações são, ao contrá rio. caracterizadas como cons-
Surgiu um consenso para que só se admita o direito ao dividendo após a decisão da Assembléia Geral Ordinária. em
tituindo produtos.
13. Em parecer que publica mos, há cerca de vinte anos, já assinalamos a importância dessa
Curso de Direito Civil - Parte Geral, 6^ ed., 2^ tiragem, São Pau lo, Revista dos Tribunais, 1991, pág. 206). Não há dúvida que, en quanto os dividendos das ações constituem frutos, as ações dadas em bonificação são produtos, pois não decorrem necessária ou nor malmente da vida societária e im portam em desvalorização das ações bonifícadas, que sofrem uma redução no seu preço ou valor, em virtude de emissão das novas ações distribuídas gratuitamente aos acionistas. A distinção entre fru tos e produtos é importante no tocante ao regime legal da posse e do usufruto, assim como no to cante ao regime de bens (Clóvis Beviláqua, ob. cit., pág. 307).
15. Assim, tanto a doutrina, como a jurisprudência sempre en tenderam que a atribuição dos frutos, no usufruto, importava em exclusão dos demais acessórios e particular dos produtos, pois a hipótese é de direito excepcional, aplicando-se a norma inclusione unius fit exclusio alterius.
16. Já em 1927, era essa a conclusão de Américo Mendes de Oliveira Castro, monografia sobre Regimes Ma trimoniais na qual expõe o se guinte:
nações legais, surgiu um consen so, na doutrina c na jurisprudência, para que só se admita o direito ao distinção entre frutos (dividendos) dividendo após a decisão da As sembléia Geral Ordinária que es tabelece o destino a ser dado lucro líquido, separando, no inteda sociedade, o valor na sua e produtos (bonificações) e a im possibilidade de se ampliar o conao ceito técnico dos frutos para abran ger as bonificações (ARNOLDO a ser WALD, As bonificações e o reser ginie de bens, in Revista de Di reito Mercantil, 30/43).
14. De fato, é mansa e pacífica a distinção que a lei e a jurispru dência fazem entre fhitos e produ tos, esclarecendo que os primeiros são as riquezas normalmente pro duzidas pelo capital, enquanto os 11. Mesmo em relação ao di- segundos constituem utilidades videndo, a sua caracterização como extraídas de um bem que não se fruto civil, embora sendo predo- reproduzem periodicamente e lhe minante, tem sido objeto de algu- reduzem o valor (Clóvis mas divergências, ou reservas de Beviláqua, Código Civil Coordem técnica, na doutrina e na nientado, Vol. 1, comentário ao jurisprudência.
resse pago aos acionistas do lucro a reinvestido. Há, assim, uma linha divisória nítida e incontestável entre o direito ao recebimento do dividendo e o referente às bonificações ou à valorização da ação (no caso de ações sem valor nominal). art. 60, pág. 307,; Amoldo Wald,
●'Na verdade, o art. 271, V (do Código Civil), referindo-se apenas aos frutos e n3o sendo admissível que 0 legislador ignorasse que frutos não se confun dem com produtos, é licito concluir que o art, 271, V, deve ser interpretado literal e restritivamente....”
(Regimes Matrimoniais. Rio. 1927, pág. 266) 17. Verificaremos, a seguir, que tanto a doutrina como a juris prudência definiram as ações rece bidas em bonificação como “ex tensões do bem e não frutos”, na excelente síntese de Pontes de Miranda que reconhece expressa mente a incidência da incomunicabilidade sobre “as ações em bonificação, as ações-filhas”, afirmando o eminente civiüsta que:
ína material, pela devassa que significa 0 acesso do amante aos negócios do marido em razão das confidências da mulher. E, sobretudo, uma poluição moral com desdobramentos religiosos terrí veis para o homem traído, cuja linhagem poderá vir a ser comprometida pela bastardia.
Nas aparências, o valor indi vidual da mulher como pessoa digna de amar e ser amada está longe de ser considerado. Na peça em exame, que por sua própria natureza é um documento em de fesa do marido, que se diz traído, logicamente a veracidade do perfil da esposa ficará sempre em suspenso.
O que nos diria em sua defesa a mulher de Eufíletos, essa figura silenciosa do passado.
(1) Diz o marido; “As leis não apenas mc absolvem dc qualquer crime, como tam bém mc ordenam csla vingança.”
(2) A medida que o Econômico dc Xenofonte faz uma representação masculina da espo sa perfeita, o texto cm exame pode scr com
cic confrontado; por outro lado. com a análise das implicações do adultério. s2o esclarecidos alguns desdobramentos polí ticos do crime, cm especial quanto ã ques tão da cidadania c à estabilidade da cidade-estado,
Í3) Para Scmònides de Amorgos íscc. VII e VI a.C.;. cm pricípio, a mulher, flagelo eter no, é um grande mal (mégiston... kakón) dado por Zeus aos homens; a mulher abelha, discreta c afeiçoada ao marido, é a única que não merece censuras porque faz a felicidade dele. A ela se associam prosperidade do oikos c geração de filhos ilustre. (Cf Sátira contra as mulheres, fr. 7, w 83-92). Sobre a mulher abelha, cf lambem Focílides de Milcio (scc. VI a.C.), fr. 2.
(4) Sobre o conceito dc epiclera assim nos es clarece L. Bcauchct; "Dc um modo geral c indcpcndcntcmcnlc da situação da fortuna dc seu pai a epiclera pode ser definida: a filha, legitima ou adotiva, chamada a su ceder a seu pai, casada ou não à época do falecimento deste, mas não tendo então filho maior, se ela c casada, e não tendo também, nesta mesma época, nem irmãos, consangüíncos ou adotivos, ou descen dentes deles, nem seu avô paterno” In “Histoire du droit privé de la république athéniennc”, vol. I, p. 409.
(5) Cf. L. Bcauchct, “Histoire du droit privé de la république athénicnne” vol. I, p. 233 et seqs; 378 ct seqs, 382 et seqs.
(6) Por exemplo, prisão para fins de resgate. Mas a lei previa ação pública para o caso de prisão indevida. O suposto adúltero tinhadircitoàgrapháádikoshcirchthenai (cf. Pscudo-Dcmóstcncs, Contra Neera, 65 et seqs).
(7) Cf. hral. 25, 29. 44. Pscudo-Demóstcncs, Contra Nccra. 64. (8) liralóslencs, rcfuyiando-sc iimto á lareira, assumia a condição de suplicante que o colocava, aos olhos dos gregos, sob a proteção di\ ina.
(9) Na mulher de Iscôinaco. no Kconôniico. c. no Assas.sínio de Kratóstenes, na mulher de Hufiletos de antes do aihiltcrio. podem ser reconhecidos traços da mullier abelha dc Focílides de Mileto. Segundo o poeta, c uma bênção conseguir núpcias com esse tipode mulherqueéboa governanta c sabe füzero trabalho doméstico (Iiêdà melís.scs oikonómos t’agathà kai epístatai ergán/.csthai) (frag. 2).
(10) Aliás, o ato dc trancar omarido no quarto à chave, dentro c tirar a chave tem duplo significado: dc um lado o marido fica envaidecido pelo suposto interesse e ciú me da mulher, dc outro, esta, sabendo que ele não pode chegar ao térreo e surpreendê-la com o amante, tem liberda de e segurança para fruir da companhia deste.
(11) fissaé bema idéia do verbo utilizado, várias vezes, no texto: cUaphlheíro, isto é, des truir, corromper: cm se tratando dc mulher, sedu/ir. Mesma idéia para o substantivo diaphlhorá: dcstniição, ruína, perda.
(12) A maior gravidade, atribuída pela lei ática aocrimcdcadullério.ecomparativamcntc ao dc violação trai o espirito dc uma so ciedade que valoriza a ótica masculina, não a feminina.
GILDA NAÉCIA MACIEL DE BAUr<OS é professora da Faculdade de Educação da USP.
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ALVARO PEDREIRA DE CERQUEIRA
O Digesto Econômico, n^’352, publicou interessante eonfcréncia dc Dom Luciano Mendes dc Almeida, presidente da CNBB c Arcebispo de Mariana, MG, sobre o tema acima. Num resumo muito breve, s. ex‘‘ revd" reconhece as causas da pobreza no Brasil, mantem mais da metade dc
Dom Luciano atribui ao baixo ní vel dc educação a pricipal delas, sendo csla a consequência da de sagregação da família, que por sua vez decorre, principalmcntc, da falta dc moradia, setor cm que há déficit dc 15 milhões de sascr socicausas.
ves de SC esperar que a solução venha de cima para baixo, da União c dos Estados. Está certíssimo, a nosso juízo, o presidente da CNBB, pois sua proposta atende a um princípio basilar do liberalis mo, que é 0 princípio da subsidiariedade; a União não deve fa zer o que pode ser feito pelos Es tados: os Estados não devem fazer o que pode scr feito pelos muni cípios; e estes não devem fazer o que pode ser feito pelos indi víduos associados ou individu almente.
E uma satisfação para nós li berais ouvir de um dignitário ecle siástico brasileiro uma análise das causas da probreza em nosso País diferente da concepção marxista que atribui a pobreza à exploração do trabalho pelo capital, e procura eliminar o pauperismo através da luta de classes. Será que os ventos na CNBB começam a soprar em outra direção que para o antigo e fracassado Leste vermelho? Cosque que nossa população com renda dc meio lário mínimo para menos dc renda familiur “per capita", devem atribuídas a diveras áreas da edade. Analisando suas
li(ia com a realidade e não com emoções, trabalha com os fatos, para ver qual o melhor caminho a seguir. Por isso é que no socialis mo as intenções são melhores que os resultados, e no liberalismo os resultados são melhores que as intenções.”
a um dcncias, segundo os técnicos do resiramo.
Cita ainda o ilustre prelado novelas dc TV como fator estimu lante da desagregação familiar, invés dc promover os valores da família, no que obviamente tem razão. Conclui a palestra propon do uma ação centrada ao nível dos municípios, inclusive como de melhorar a presença no campo de algumas pessoas que gostariam dc trabalhar no campo. Lembran do que o País tem cerca de 4.500 municípios, disse que aí está a grande chave para a solução desse grave problema, resultante da rcncia de educação, que como viu é em boa parte resultante da falta de moradia adequada. Ao in-
mo as ao
turno dizer quer os adeptos da teo logia da libertação não são amigos dos pobres, mas da pobreza, pois pregam o socialismo, que conduo adotaram à meio ziu os povos que pobreza e à opressão. Donald Stewart Jr., fundador do Instituto Liberal do Brasil, disse recente mente numa palestra em Curitiba que “é essencial entender que o socialismo lida com os desejos de mais justiça e mais humanidade que são objetivos nobres e louvá veis. O liberalismo, ao contrário, ca¬ se
Não sabemos se o discurso de Dom Luciano na Associação Co mercial de São Paulo indica uma mudança de pensamento da Igreja no Brasil. A CNBB tem apoiado nas eleições os partidos da chamada esquerda progressista que adotam ideologia marxixsta com símbo los como a estrela vermelha e até a foice e 0 martelo da fracassada Revolução dita proletária e comu nista de 1917, na Rússia. Esses partidos, cujas alas mais radicais gostariam que o Brasil adotasse o socialismo, dizem que o capitalisfracassou na América Latina. Esse engano é cometido por muita gente boa de nossa sociedade — intelectuais, professores, jornalis tas e artistas —, além da maioria do clero católico. Ora, o capitalismo, entendido como economia de mercado, nunca foi adotado na América Latina, a não ser recen temente no Chile, A cultura herdada pelo Brasil de Portugal e pelos países hispano-americanos da Espanha trouxe para o nosso Continente os mesmos costumes das sociedades ibéricas: o mercantilismo. O mercantilismo (de mercador) é um costume que vem da época do absolutismo do
poderreal, em que os reis de Portu- a desvaloriza celercmcnte, produz gal e Espanha concediam a seus o mais iníquo dos impostos (que parentes e amigos o privilégio de se soma aos outros 56 tributos) terem capitanias hereditárias, car- que é a inflação. Aí está o retrato tórios e operar monopólios, em de corpo inteiro das causas da podetrimento da liberdade geral de breza na America Latina, qualquer cidadão entrar no mer-
É hoje sabido
e Dom no m
o
cado para explorar qualquer nc- Luciano o confirma cm seu disgócio, em concorrência que só vi- curso em foco — que a riqueza das ria beneficiar 0 cidadão consumi- nações tem origem na qualidade dor com a melhoria do salário real.Só que para competir mercado é requerida a competên cia do empresário, o que resulta na seleção dos melhores em cada ramo, não sobrando lugar neces sariamente para os amigos do rei. Logicamente, este regime pressu põe a igualdade de todos perante a lei que deve submeter inclusive Estado, isto é, os governantes, a burocracia e os políticos. Este é o verdadeiro regime de Estado de Direito.
Nunca houve tal regime na América Latina, porque se não havia mais reis (no Brasil desde 1889 com a proclamação da Re pública), os reis foram substituí dos pelo Estado (leia-se governantes, burocratas e políti cos). E o regime de privilégios cartoriais continuou na América Latina sob a forma de monopólios (petróleo, energia, telecomunica ções), oligopólios (veículos automotores, cimento), reservas de mercado (informática e outros), além de centenas de empresas es tatais e órgãos públicos com seus cabides de empregos que são feudos dos políticos. O empreguismo e 0 nepotismo são o buraco negro que dissipa a riqueza pro duzida pela sociedade e que é consumida pelo Estado voraz e perdulário, com mínimo de servi ços prestados à sociedade e aos escorchados contribuintes. O re sultado é que 0 incontrolável déficitpúblico, sempre financiado pela emissão de moeda sem lastro que
É hoje sabido que a riqueza das nações tem origem na qualidade de seu capital humano, que é preparado em investimentos, em educação, saúde e saneamento básico.
a 13 anos. As escolas das redes públicas seriam j") r v a t i za d a s, passando as professoras, ate então funcionárias públicas, a constituir suas próprias empresas dc serviços de Educação que iriam concorrer disputando a preferência dos pais carentes pela escolha dc sua escola, cao município caberia fiscalizar o padrão dc serviço das escolas privatizadas. O mesmo deveria ser feito com os serviços dc saúde e com a Previdência Social.
Estamos certos dc que Dom Luciano Mendes dc Almeida está empenhando profundamente não só em mitigar a pobreza, mas cm ajudar a promover o desenvolvi mento econômico do Brasil. Va léria a pena sugerir a s. cV‘ revd'' a leitura dc um livro rcccntcmentc publicado pelo ICEG — International Center for Economic Growth, com sede no Panamá, c do qual o IL c um instituto corres pondente. Resenhado por The Newsletter da entidade, vol. 6, n*’ 1“ de julho/92, “The Silent Revolutíon: The Infomial Sector in Five Asian and Ncar Eastem Countries” (A Revolução Silenci osa: O Setor Informal cm Cinco Países Asiáticos e do Oriente Mé dio), de A. Lawrcnee Chickering e Mohamed Salahdine, 1991, 245 pp., demonstra claramente sas do subdesenvolvimento dos países estudados.
Segundo a resenha, mento fundamental de A Revolu ção Silenciosa é que o reconheci mento da economia informal im põe que se repense o vocabulário do desenvolvimento econômico. Tennos usuais como “capitalise “socialismo” perdem sua exatidão semântica quando se ve rifica que muitos dos capitalistas dos países em desenvolvimento são na realidade mercantilistas agarrados ao privilégio dos subsí dios e favores governamentais, e
de seu capital humano que só é preparado através de investimen tos em educação, saúde e sanea mento básico. Então, o Brasil pre cisa emagrecer o Estado se quiser engordar o cidadão. Educação, saúde e saneamento são assuntos a serem cuidados ao nível dos mu nicípios, como quer Dom Luciano. Além de o Ministério da Educação, da Saúde e da Previdência serem desnecessários (devem ser extin tos), não é preciso que os muni cípios tenham redes de escolas, nem mesmo os Estados, com vasta burocracia fora das salas de aula consumindo os recursos que de veríam remunerar bem os profes sores. Com uma pequena buro cracia em cada município, na área de educação, os impostos desti nados à educação seriam, em sua maior parte, transformados em cheques-educação doados aos pais carentes de crianças em idade de 6 as cauo argumo
que muitos dos socialisías, mal-sucedidos nas tentativas de animar a economia através da intcr\'cnçào go\crnamcntaL mantem uma situação predatória cujo prin cipal objeti\'o é assegurar bcncHcios para a própria elite dirigente daqueles países. Como a maioria dos estahlishnwnis. essa aliança perversa entre os dois ostensivos rivais promove seus próprios inte resses pela exclusão dos outros.
Os excluídos são os “informais” definidos aqui como cidadãos cujas atividades econômicas care cem de legalização. Eles, confor me se diz, são os verdadeiros em preendedores capazes de imbuir a sociedade cm desenvolvimento com 0 seu dinamismo, e não os marginais anti-sociais que a teoria tradicional descreve. E, longe de serem deficientes, preservam tra dições comunitárias que ajudam a
manter coesa a nação. Os infor mais conseguem o auto-govemo pela combinação de sua busca de liberdade individual com o com prometimento com a comunida de. A pobreza dos informais resul ta não da falta de qualificação, mas de oportunidade.”
ÁLV.\RO PEDREIRA DE CERQUEIRA é diretor-executivo do Instituto Liberal Minas Gerais.
JOSUE MONTELLO
Entre os papéis literários en contrados no arquivo de Lindolfo Collor, e que sua família fez che gar às minhas mãos, figuram os de um livro inconcluso sobre Camilo Castelo Branco.
Certo, o desterro em Portugal nunca é verdadeiramente um desterro; vale, mesmo, muitas vezes, Trata-se de uma meticulosa como um rcccontro. Aquele recnbiografia, capaz de mediar entre o contro que levou um estivador livro pioneiro de Alberto Pimentel português a dizer aos exilados dc e os três volumes da biografia 1932,quandoonavioqueoslevava monumental de Aquilino Ribeiro, do Brasil ia atracando no Cais com igual poder de fascinação pelo Sodré, em Lisboa: homem e pelo escritor. .— Ai, que os gajos estão dc
A biografia camiliana, como volta! sabem os camilianistas, tem seus Os gajos se chamavam momentos supremos, que de certo Austregésilo de Athayde, Guimodo lhe assinalam as mudanças Ihcrme de Almeida, Júlio dc Mesde itinerário. Nesses momentos quita Filho, entre muitos, todos únicos, aquele que, no entender de expatriados por terem pensado em restituir o País à plenitude demo crática. analistas e biógrafos, mais se des taca, constituindo o seu ponto culminante, é aquele que o leva à Cadeia da Relação, na cidade do Porto, em consequência de romance pessoal com D. Ana Plá cido.
Se o exílio, em Portugal, nunca é verdadeiramente um desterro, seu com a mesma língua, os mesmos costumes, os mesmos sentimentos, a verdade é que não chega a neu- Ora, a biografia de Camilo, tralizar por inteiro o sentimento de por Lindolfo Collor, está completa distância da terra natal, da família, até esse momento. Corresponde a dos amigos, e da consciência de uma narrativa integral. Algo como o próprio romance camiliano, na sua intensidade maior. Inédita, como se acha, é apenas a leitura de alguns; publicada, constituirá, no Lindolfo Collor poder-se-ia ter meu entender, a melhor contribui- orientado da direção de um escrição brasileira às comemorações do tor político, como Alexandre Hercentenário da morte do mestre de culano, ou Garrett, para nele conAfnor de perdição.
tendo aberto no Brasil o caminho para uma política trabalhista mo derna, que SC via expatriado porter ido demais no campo dc suas con vicções democráticas.
Eça, com efeito, embora nuncahouvesse participado ativamente da militância política, batera-se vccmentcmcnte por um cabedal de idéias rcalmenle ousado para a sua época e o seu país, no jornal, no livro, nas revistas, nas conferências públicas. Dava à causa moderna a sua pena de escritor, mas lhe re cusava a participação pessoal que o teria levado, ou ao ministério, ou ao parlamento, a exemplo do que ocorreu, na sua geração, com Oli veira Martins.
A fina ironia, que o mestre do romance moderno cm Portugal soubera transferir para seus livros dc ficção c suas crônicas de jornal, como que o desviou da rota política, circunscrevendo toda pessoal ao campo puramente lilerário. Faz rir à custa do Conde de Gouvarinho .ou do Conselheiro Acácio, mas sem mais de inspiração política que li terária, tenha o dom de impeli-lo a valer-se dele na tribuna parlamcnpróprio Collor, já que este a escre veu na fase cm que viveu exilado em Portugal.
Ao dar por si em Portugal, tar. Mesmo assim, Eça estaria mais perto do político Lindolfo Collor do que Camilo Castelo Branco. E foi para Camilo que ele se orien tou. A razão fundamental que o há de ter conduzido ao mestre de Boêmia do espirito seria, no meu entender, a concordância inteleccentrar o seu interesse intelectual.
A biografia de Camilo, saída Próximo de seu tempo e de sua da pena de Lindolfo Collor, faz geração Eça de Queiroz ajustar-separte também da biografia do ia melhor ao político e escritor, que a sua açao que esse riso. queo expatriamento é sempre uma punição ou uma violência imere cida.
tual, no plano piiramcntc literário.
Camilo, em verdade, como escritor essencial mente romântico, destoa das grandes figuras român ticas de seu tempo, no plano in ternacional. como Lamartine, Viclor Hugo e Chaleaubriand, para ser csscncialmente homem de le tras. Mas não é um omisso. Não. nãoc. Basta ler.í ejueJa de um an/o, entre os seus romances de inspira ção política, para prontamente re conhecer que não lhe faltava poder de expressão que lhe necessário como militante. Em de militante — fez-se diletante. Divertiu-sc. Escarneceu. Zombou. Sem participar da luta política di reta. Aquela que chega ao poder, para exercer uma ação social rele vante, ou que insistcntcmcntc o denuncia, para Icvá-Io a outros caminhos.
Camilo c csscncialmente escritor. A palavra, nesse mestre derramado, é um dom literário. O dom por cxcclcncia. Aquele que dá à fluência da composição a pa lavra imediata, na claridade do gênio da língua. Daí a confissão dc nosso Coelho Neto, quando afir mava a seu amigo c conterrâneo
Humberto dc Campos (e este recolheu ao Diário secreto) que, Eça dc Queiroz merecia a sua ad miração, Camilo era, para ele religião- Um devoto, não um cor religionário.
cárcere ali encontrou o Camilo, bem Camilo, genuinamente Camilo. O escritor não se achava ali para pagara sociedade por suas idéias avançadas. Estava ali por ter arrebatado ao marido legítimo, na cidade do Porto, uma bela mulher, D. Ana Plácido. Esta, presa igualmcníc ali, noutra cela mais distan te, tinha no cárcere o seu piano.
Gemia nas teclas, suspirando, e com isto dava os recados mais apaixonados ao seu poeta e roman cista.
necessário dizer, numa forma es sencialmente camiliana, ele o dizia, deixando no texto a marca de seu gênio.
Bem podemos compreender por que um escritor como Fialho de Almeida, militando na geração posterior à de Camilo, lhe conferia 0 posto supremo, entre os mestres de bem escrever. E o que dele disse, em páginas de reverência intelectual, é plenamente confir mado pelos vestígios da influência de Camilo na prosa do mestre de 0
pais das uvas.
Eu já tive oportunidade de rastrear, na obra de nosso Macha do de Assis, 0 claro influxo da obra camiliana, e disso guardei memó ria no pequeno estudo incluído em minhas Estampas literárias (Simões dos Reis, Rio, 1956). Em 1939, numa viagem a Manaus, ali encontrei um mestre maranhense, João Leda, às voltas publicação do conjunto de estudos camilianos. Sinal de romancista português ainda extremados admira-
Camilo é essencialmente o escritor, A palavra^ nesse mestre derramado, é iim dom literário. o com a seus que 0 contava com dores debruçados sobre seus textos. Hoje, já serão poucos desses devotos na mais extensa área da língua portuguesa. Daí também o pouco que se fez para celebrar a obra e a glória camiliana, emnosso País, no ano do centenário da morte do escritor.
Quando Lindolfo Collor se faz escritor, Camilo ainda é, no Brasil, um mestre reconhecido e procla mado. Não teria mais o prestígio intelectual que lhe fora atribuído tempo de Pedro II e que levara o nosso Imperador a ir ao seu contro, em Portugal era o mestre que fornecia ao nosso Mário Barreto os exemplos ade quados com que este ilustrava, para o público brasileiro, as suas lições de português. Quem leu as Memórias do
Camilo, na cela repleta de li vros, tinlia o que lhe bastava para distrair as horas reclusas: papel, pena c tinta, e ali escrevia. Ali nasceu o Amor de perdição. Ali nasceram, as Memórias do cárce re. E mais O romance de um ho mem rico. E artigos, e cartas, e pequenos ensaios. Tudo a lhe es correr da pena vertiginosa, como fio de água que se precipita em cascata. o se , a Tinha como ninguém o gênio do idioma. Conhecia a língua dos clássicos e a língua do povo. E associava-se ao que aprendera nos estudos e nas festas de arraial o poder criativo pessoal inicomparável. Como que a língua por tuguesa era propriedade sua. E sua fiel servidora. Tudo quanto era ao enmas ainda
Em Portugal, não terá sido as sim. Portugal é genuinamente camiliano. A alma popular, inter pretada pela guitarra nos seus fa dos mais chorados, é por isso mes mo camiliana.
O livro de Lindolfo Collor, que eu tive oportunidade de ler recentemente, esteve quase a ser a grande biografia camiliana de au toria de um brasileiro. Algo assim como 0 que aconteceu com Eça de Queiroz, objeto de uma exemplar biografia de Luís Viana Filho.
Anos e anos levou Lindolfo
Collor a compor o seu livro. Visi tou OS- lugares por onde andou e viveu Camilo. Para quem lhe co nhecia profundamente a obra, essa viagem há de ter sido uma festa para o espírito. Sei bem o que isso é porque em parte cumpri também igual itinerário. Jamais esqueci a visita a São Miguel de Seide. Galguei-lhe os 13 degraus que le vam ao pavimento superior lade ando uma acácio (a famosa acácia do Jorge, filho doido do escritor) a alongar, cá embaixo, por cima dos últimos degraus, os ramos magros que 0 rigor do outono desnudara.
Detive-me no lugar exato em que Camilo se matou. O espaço ocupado por ele quando escrevia, acendendo durante o dia, para po der enxergar, o pavio do lampião de bronze. Depois, no Porto, visi tei a cela de Camilo. Tive em mãos o grosso livro em que eram registradas as entradas e saidas dos presos. Vi também o ponto de partida do Amor de perdição.
Daí naturalmente o dobrado
interesse com que li, nos seus ori ginais, a biografia inconclusa dc Camilo pornosso patrício Lindolfo Collor. O texto ficou completo até 0 momento em que o romancista vive a sua paixão tempestuosa por D. Ana Plácido.
Esse momento, como assina lamos, vale pelo momento culmi nante da biografia camiliana. Explica-a. E até certo ponto a jus tifica, iluminando-a. O mais, que haveria de vir com o passar do tempo, como que já está contado c explicado. Daí ter dado o meu conselho
para que a Nova Fronteira publi casse o belo texto.
Mais do que o livro de um pesquisador, às voltas com a vida global de Camilo, é a explicação dessa vida. Leva-se até o ponto cm que ela alcança a sua hora solar, a do meio-dia. Daí em diante, já o rio está formado e caminha para a sua foz.
c dc chegada — cscrcvcu-a o gran de amigo do romancista, Alberto Pimcntcl. Intitulou-a O romance do romancista.
Dc fato, essa vida tem o sabor dc um romance. Dc um romance camiliano. A que não falta a ex pressão genuinamente romântica. Como a maior parte da ficção que saiu da pena do escritor.
Dessa biografia, dá-se agora a sua chave, na publicação do texto que nos ficou, no acervo dc papéis de Lindolfo Collor. O mestre gaúcho levou-a até o momento que a Conviría dar-lhe explica, vida^pcrdurávcl. Tanto para a gló ria dc Camilo, no Brasil, quanto para a glória dc seu biógrafo bra sileiro
após a sua leitura sem esquecer que a po demos comparar a uma espécie assim de capela inacabada. Como um distante esboço das que admi ramos no Mosteiro da Batalha.
Aprimeirabiografiade Camilo aquela que tem ponto de partida
JOSUÉ MONTKLLO c escritor, membro da Academia Brasileira dc Letras, cx-embaixadordo Brasil junto à Unesco.
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MARCO
Não há na literatura consenso sobre concepções dc estratégicas tccno-organizacionais rumo à fá brica automatizada ficxivcl.
Dois aspectos são básicos:
1) a quetão tccno-organi— zacional está embebida cm idios sincrasias culturais;
2) experimenta-se fase de maturação.
adaptação dinâmica às perturba ções e variações que possam atuar sobre o processo produtivo. Cabe aos especialistas deste campo uma luta conra a entropia. Começa a criar volimie uma literatura sobre os pesadelos de software, dificuldades de inte gração dc complexos sistemas de comunicação, problemas dc pa dronização e interfaceamento, etc.
organi-
Note-se que Savage (1988) destaca o desafio dc implementação do CIM (Computer Intcgrated Manufacturing) c 80% zacional e 20% técnico. Este é um fato que caracteriza bastante Sistema Toyota dc Produção.
os o
O que se evidencia como uni versal é que o Homem-Fen-amenta, melhor, o Trabalho-Vivo sendo expelido do centro de gra vidade do processo produtivo e as consequências inegavelmente são serão profundas.
Estes aspectos são importantes para uma perspectiva de contextualização da Engenharia de Pro dução pois as questõe de técnica e cultura, idiossincrasias culturais relação entre as classes, divisão social e internacional do trabalho, Primeiro Mundo X Terceiro Mundo, Ocidente X Nao-Ocidente, etc-, constiUiem água da fonte onde nossos engenheiros, administra dores, etc. têm de beber.
O SFF (Sistema Flexível de Fabricação) é um catalizador des se processo de atuar sobre famílias de peças similares, mesmo aleato riamente. Tem-se um grupo de máquinas-ferramenta com CNC, um sistema de alimentação automatizado sob supervisão de sistemas de controle computadorizaos. O SFF tem seu “nicho” onde há exigência de grande nível de flexibilidade, quantidade e pro dutividade com altíssima comple xidade de gerenciamento. Trata-se de segmento significativo da eco nomia, daí a repercussão atual.
Do Não-Ocideiite: algumas considerações: Alguns fatos são significati vos de nosso tempo: 1) ascensão de povos não-ocidentais, particularmente o oriente asiático;
2) o novo paradigma tecno lógico: a microeletrônica.
que no fundo lhe era estranha toda cosmovisão que não. fosse unitária foi explicitado a partir do Renas cimento (...) Paralelamente, o pensamento da máquina precede a própria máquina. O racionalismo, 0 impirismo, o sensualismo, o positivismo, 0 materialismo e cer tas formas do idealismo são ma nifestações do pensamento de fa bricação. Descartes, com sua teo ria resextensa funda o novo reflexo condicionado; concebe os animais e processos vitais como puro automatismo; compara o coração a uma bomba e um relógio; con-sidera-se homens de criar um número indeterminado de máquinas semo— ventes, Deus, muito mais perfeito, mundo como um enge-
criou 0 nheiro perfeito supremo (...) a máquina não nasce do acaso, nem do simples progresso científico, científico e a
mas que o progresso máquina nascem de projetos cultu rais, nascem como funções cultu rais (nota: grifo do original), são expressões de uma cultura, da qual vivemos na plena civilização (...)”. Assiste-se à uma profunda transformação de repercussão universal. Da Europa Ocidental, o capitalismo e a ascensão da bur guesia à expansão colonial leva o “Homo Industrialis” a todos os rincões do planeta. Esse fruto do Ocidente que emerge dos séc. XVI-XVIII hegemoniza-se sobre 0 planeta até meados do séc. XX. Disse Nehru (Malraux, 1968:267-268): “(...) sob certos e e
A fábrica automatizada flexí vel carrega implicitamente uma capacidade da engenharia produ tiva de “ordenar o aleatório”, de
Da Europa ocidental dos séc. XVI-XVIII emerge o Industrialis”. Barbuy (1961:52) Homo registra que: “(...) mas o que Idade Média não explicitou, pora
bíblica. Wycliffe, no século XIV, mares nunca dantes navegados — foi umpré-reformador que insistiu as impressões são raras. Só cm na necessidade do conhecimento Coimbra os livros comcçama apadireto das Escrituras. Em nosso recer. J. Jcan Martin asseverava país, hoje em dia, encontramos um que “a península ibérica não comeco longínquo da resistência que pensou, no tempo dc Felipe II, seu esse rebelde encontrou, por parte atraso em matéria dc indústria do das autoridades e do clero, na livro. A Espanha e Portugal peroposição com que se depara, por manecem, sobretudo, como um exemplo, o Summer Institute of mercado para livros estrangeiros, Linguisties, uma entidade protes tante americana, no seu empenho % de alfabetizar as línguas indígenas, i a fun de permitir aos índios, jun tamente com a conservação escrita de suas crenças e cultura, a leitura dos textos sagrados, com conseqüente evangelizaçào.
Com a Contra-Reforma nos
Com a Contra-Reforma nos países latino-am erican os, a educação e a cultura passaram a ser monopolizadas pelos Jesuítas.
longa até depois da Independên cia. A lembrança dessas circuns tâncias do aparecimento da Im prensa e da dilúsãü da leitura c interessante para explicar o funesto atraso cultural mente do atraso econômico c seguido naluralconservadorismo político — que afeta a Ibéria cm geral, Portugal c o Brasil cm particular, no desen volvimento da civilização moder na. Livro é cultura c conhecimen to. E 0 prórpio conhecimento é poder como já afirmava Francis Bacon: nam et ipsa scieníia
potestas esí. Acrescentava Bacon leitura fazia um homem que a completo; enquanto o discurso apenas um homem preparado e escrever um homem exato... países latinos-americanos, a edu cação e a cultura passaram a ser monopolizadas pelos Jesuítas, sem que Franciscanos e Dominicanos perdessem, contudo, suas respec tivas áreas de ação pastoral. Mas o maquiavelismo tolerante da Com panhia de Jesus, no terreno religi oso e moral, é um dado importante de tal modo que a inércia dos edida questão. Infelizmente, no século tores desses países contrasta, sinXVIII, 0 iluminismo da Razão na gularmente, com a atividade dos Espanha e em Portugal—naépoca teólogos e com a amplitude do dita do Despotismo Esclarecido, movimento místico de que são tecom Pombal por exemplo — con- atro”. A Espanha passa a exportar cebeu como única solução para a maciçamente para a América cololibertação e criatividade do pen- nial a pacotilha arcaica e obras de sarnento a luta contra os Jesuítas, francaria de uma literatura de que eram os únicos verdadeiros e evasão. Notai que, no apogeu da eficientes educadores, particular- literatura ibérica, só são produzi mente nas colonias da América do dos romances como o Dom
Sul. Surgiu a opinião fatal que o Quixote, teatro como o de Calanticlericalismo é sinônimo de derón, e poesia épica como a de cultura e que caberia, portanto, ao Camões. Há obras de teologia, alEstado o monopólio da educação. O Liberalismo do século XIX en tre os latinos é essencialmente anti-clerical mas, num tal ambien te negativo, o culto da leitura não gumas notáveis, mas nada de pen samento abstrato, nem de história, nem de ciência, nem de erudição, nem de filosofia. O pensamento que 0 Brasil e os outrosm países da América latina herdam de suas Vale lembrar que, no Portugal metrópoles destaca-se pela indido apogeu de seu poder marítimo gência e banalidade.
quando Vasco da Gama e Pedro
Ninguém lê no Brasil colonial Alvares Cabral penetravam em e essa situação tenebrosa se proprosperou.
Comparai essa indiferença pela palavra cscrila com o “precoce e invencível amor da leitura” que Edward Gibbon “não trocaria por todos os tesouros da índia”. Diria um outro inglês, Pcarsall Smith, que “para muita gente a vida é que são elas...Euprefiro Icrl”. Comum livro sob um braço e uma espada no outro, os descendentes dos Pu ritanos ingleses conquistariam o mundo, enquanto os portugueses se deixavam fascinar pelos tesou ros da índia...que em breve se lhes iriam escapar das mãos.
Sem livros, sem leitura, sem conhecimento abstratos, a defasagem em nosso progresso mental e tecnológico nos foi deixando para trás, na rabadilha e no marasmo comum dos sub-desenvolvidos, do que se chama hoje o Terceiro-Mundo. Até hoje pouco se lê no Brasil. Prefere-se o contato rápido e superficial do jornal; da revista, de preferência ilustrada; do livro de bolso; quando não a aquisição banal de informação passageira pelo veículo puramente audiovisual do rádio e da televisão. Esta re gistra, tipicamente, um desenvol vimento gigantesco.
Mas c errôneo pensar, como sói ocorrer cm nossa terra que o cinema, a TV c os outros modernos sistemas eletrônicos conseguirão jamais sobrepujar o meio prático, barato e confortável que, para a transmissão do pensamento, é o livro. O jornalista c ensaísta inglês Norman Macrac. cm sua espécie dc utopia futurista ^"The 2025 Reporr antecipa a idade do TC, o íeleconimwiicatmg Computer ter minal. Num tclão a três dimensões, no escritório ou salão, poderemos projetar confortavelmente as pá ginas dos livros que desejamos e, quase instantaneamente, requisitar da “biblioteca universal” no Ban co dc Dados, pelo Modem ligado ao telcfone-tclevisão, o trecho dessa ou daquela obra famosa de que prccisannos, sem longa pro cura numa estante. Mas será isso um desenvolvimento tecnológico da idéia de livro, não a supressão do mesmo. O livro sempre conti nuará, como pretendia o famoso Dr. Samuel Johnson, a “nos ensi nar a gozar a vida ou, pelo menos, a suportá-la”... E se Valéry tinha razão ao afirmar, jocosamente, que “os livros têm os mesmos inimigos do que os homens; o fogo, a umi dade, os animais, o tempo e seu próprio conteúdo' futuramente, graças a tais recursos da Informática, poderão superar to dos aqueles males, menos o último.
A miséria da leitura em terra corresponde ao analfabetismo real e funcional: fora os que não sabem mesmo ler e escrever, pode-se calcular em 40 milhões número de analfabetos funcionais e, para se aquilatar a extensão da calamidade, basta notar a dificul dade que, nas missas de domingo, os participantes convidados para a Palavra, mesmo de classe média, revelam na U e 2"* leituras.
pensamento lógico, claro e preciso nosso Pecado Original! como desejava Descartes, se res tringe a uma elite reduzida. Dizia Universidade de Comell em Ithaca, ainda aquele filósofo, em seu fa- estado de Nova York, encontrei moso Discurso, que “a leitura de sete livros de minha autoria: havia todos os bons livros é como uma centenas de livros brasileiros.
Uma vez, na Biblioteca da conversa com as pessoas mais ho- Imaginem por aí a capacidade ginestas dos séculos passados que gantesca desse tesouro que é a deles foram autores, e mesmo uma library de uma cidade americana conversa estudada, da qual só nos de província. Há mais livrarias em revelam o que há de melhor em qualquer grande metrópole ameri cana ou européia do que no Brasil inteiro. No Rio de Janeiro existem 60 livrarias, uma para cada mil habitantes! Na Biblioteca
umas cem
Central da Universidade de Harvard, pode-se verificar a pre sença regular de 178 revistas e publicações periódicas brasilei ras. Duvido que um número idêntico exista na Biblioteca da Universidade de Brasília, que é hoje 0 padão da República — e muito menos 178 períodicos do resto do mundo! Na biblioteca do Itamaraty recebe-se quando muito uma dúzia de revistas estrangeiras seus pensamentos”. A Câmara dos e a explicação é invariável: fal^ de Deputados, que reflete a cultura do verbas. EmHarvard, ondees^ ou, povò por ser dele representante, meu filho era obrigado a ler e expõe às claras o desastre de falta a 200 páginas por dia em seu cmso de leitura. O descalabro da instru- de mestrado enquanto na un dação Getúlio Vargas, onde tirou o
A
miséria da leitura em nossa terra corresponde ao analfabetismo real e funcional.
ginas por semana!
ção pública; a exigüidade das ver bas de Educação; a pobreza das diploma, seus colegas protestavam bibliotecas; a contaminação das e ameaçavam greve pelo absurUniversidades por ideologias es- do” de um professor exigir 60 pápúrias que seduzem graças ao primarismo de seus slogans e à projeção dos ressentimentos naci onais sobre bodes expiatórios es trangeiros; a ignorância e as su perstições do sincretismo afrocristão, magia e macumba, genera lizadas na massa da população e é de crer que.
Aliás, qualquer observador pode notar que a expressão de um
Um professor de literatura amigo meu, de uma das grandes universidades brasileiras, reve lou-me uma circunstância que o abalava e intrigava. O professor é estrangeiro e, iniciando seu curso, constatou que seus alunos nunca fazendo papel de religião, mas al- haviam lido qualquer obra da litecançando mesmo as elites que se ratura universal. Sua “literatura crêem cultas; o sucesso do se limitava ao Fq/a, às histórias em populismo demagógico como quadrinhos ou, quando muito, um substitutivo da democracia — eis romance erótico ou policial. Alalguns efeitos de uma tradição de guns haviam lido Jorge Amado e pouca leitura que vem dos Veríssimo. A experiência traumaprimórdios de nossa história. Eis o tica desse professor coincide com nossa o
a minha própria quando, na Uni versidade de Brasília, lecionei Re lações Internacionais e Ciência Política. Para meu desgosto e sur presa, verifiquei que meus alunos eram totalmente ignorantes de his tória universal. Ora, como se pode aprender relações internacionais sem possuir uma base, de curso secundário, sobre essa disciplina. Nenhum de meus jovens ouvintes, mesmo os mais inteligentes, sabi am claramente distinguir a Primeira da Segunda Guerra Mundiais: eram eventos obscuros que se perdiam na noite dos tempos pré-históricos. Meu amigo da literatura tentou remediar a situação, como eu também, recomendando aos alunos que lessem em casa uma biblio grafia mínima. Pura perda! Reconciliamo-nos então com a solução—ele, de ler cada primeiro dia na semana letiva, algum trecho da Ilíada, do Hamlto, do Dom Casmurro ou da Insustentável Le veza do Ser; e eu, de fornecer ao distinto auditório um esboço dos principais eventos históricos dos últimos duzentos anos, que devi am ter aprendido no Segundo Grau. Ao chegar aos exames, uma de minhas mais atentas e esforçadas alunos, saiu-se no exame como esta pérola: ao tratar da trilogia Liberté, Egalité et Fraternité, da Revolução Francesa, gravou-se em sua memória e apareceu no papel a imagem da batalha de Valmy, ga nha em 1917 por Jeanne D’Are, quando nasceu o nacionalismo francês e o general De Gaulle pro nunciou a célebre frase: “neste lu-
nóstico é correto. Mas a enfermi dade tem origens mais profundas. Além das causas históricas a que me referi acima, atribuo a repug nância nacioinal pela leitura séria a uma falta de disciplina mental c a uma estranhada preguiça intelec tual. São traços culturais que cos tumo considerar corolários de mi nha interpretação do caráter nacio nal brasileiro. Seríamos afetivos e intuitivos, tipo psicológico em que a atividade do pensamento ainda jaz no vcstíbulo da consciência. Afinal, como assinalava Sir Richard Stcclc, “ler está para a mente como o exercício para o corpo”. Ora, nossa mente lógica c abstrata é raramente exercitada c mais raramente ainda atinge a ma turidade da idade adulta.
Queixam-se os entendidos dos defeitos de nossos cursos do Primeiro e Segundo Graus. O diag-
É isso o que torna a profissão de escritor cm nossa terra uma das mais ingratas possíveis. Depois de labutarmos para alcançar o inte resse de um editor que, com ou sem razão, não invoque a estagnação do mercado livreiro, ainda temos de vencer a resistência dos críticos dos jornais que, quando se deci dem, costumam restringir seus co mentários aos que obedeçam a seus próprios critérios do que seja “po liticamente correto. Enfrentamos depois os livreiros: é ainda mais difícil entrar numa livraria do que a um pecador no céu. E, finalmen te, 0 mais difícil de tudo: encontrar cidadãos que, à despesa com a compra de um livro, não prefiram as de uma entrada de cinema ou de uma partida de futebol. “Tive sem pre a impressão que só as pessoas que escrevem sabem ler”, afirmava um escritor francês. Paul Léautaud. Nós aqui, escritores, somos obriga dos a trocar nossos livros, por corte sia, uns aos outros: é uma boa ma neira de fazer amizades... Possuímos, ceríamente, mui tos e notáveis escritores, geral-
mente romancistas, que são lidose fazem merecido sucesso. Há mes mo, entre eles, hest-sellers. Há também outros que, como diria o espirituoso Chamfort (que, por es crever demais, acabou sendo víti ma do Terror durante a Revolução Francesa), fazem sucesso por cau sa do relacionamento que ocorre “entre a mediocridade as idéias do autor c a mediocridade das idéias do público". Mas, cm ambos os grupos, qual deles atingiu jamais a ei fra de um mi hão de 1 i vros vendi dos, como sói acontecer frcqücntemente na Europa c na América? “O Vento Levou", desde que foi publicado nos EUA cm 1936, já vendeu 45 milhões de exemplares cm lodo 0 mundo, 50000 num só dia, pouco depois do lançamento. Comparem, incidcn-talmcnlc, com os efeitos da TV: cm tres ou quatro dias, mais de cem milhões de pesso as viram na tclinlia o famoso filme de Clark Gablc c Vivienne Lcish Gone with lhe Wimi.
O contraste entre a leitura na América do Norte, na Europa oci dental e na Ásia orientai, de lado, c a leitura no Brasil é melhor um índice das disparidades de desen volvimento do que as diferenças do PIB pcrcapita. É uma questão de cultura, apenas. Sem leitura, em esse vício impune” como suma, a chamava Valéry Larbaud, o grande romancista francês que tão bem conhecia a América Latina e nossa língua, e é o título de um de seus livros há consciência moral, não há de mocracia, não há liberdade e não há desenvolvimento. Leitura é po der. Pois, em nossa época, o poder é a infonnação e o conliecimento. não há Cultura, não gar e nesta data começa uma nova era na história da humanidade”... (felizmente Du-mouriez, Verdun e Goethe não entraram na marme lada).
J.O. DE MEIRA PENNA é embaixador aposentado. É professor da Universi dade de Brasília e autor de numerosa obra.
JOSÉ NÊUMANNE PINTO
O inundo está mudando c a gente ncin percebe direito, não é mesmo? As mudanças são tão vi olentas que SC pode falar numa nova revolução, talvez semelhante à francesa, à Americana ou à Glo riosa: a Terceira Revolução In dustrial. E até mesmo num novo paradigma. Uma leitura, mesmo superficial, das obras de Alvin Toffler, John Naisbitt, Jaeques Julliard c, principalmente, Peter Dmckcr, nos dá uma idéia de como será este “admirável mundo novo”, muito diferente do “admirável mundo novo” do romancista Aldous Huxley.
Uma frase de Peter Drucker, em sua obra clássica As Novas Realidades, pode muito bem de finir os resultados dessa revolução. De acordo com o homem que volucionou a teoria da administra ção, “hoje a realidade é algo que nem Jefferson nem Marx, qualquer pessoa antes de 1950 ou 1960, podería ter imaginado: sociedade de “empregados inte lectuais” (loiowledge employers) que não exploram nem são explo rados; que individualmente não são capitalistas, mas quel coletiva mente são donos dos meios de produção através de seus fundos de pensão, fundos mútuos e fundos de investimentos; que, no trabalho, são subordinados a alguém, mas que também freqüentemente che fiam outros. Essas pessoas são de pendentes e independentes mesmo tempo. Elas possuem mo¬
para poderem mostrar serviço”.
Alguma idéias a respeito des se “admirável mundo novo” podem ser esboçadas, rapidamente, no seguinte rumo:
Depois da sociedade in dustrial, hoje, pode-se falar numa “sociedade instruída”. Em tal so1 ciedade, verificam-se algumas mudanças em realção à clássica sociedade industrial, principal¬ mente.
a) 0 conhecimento passa a fa zer parte do patrimônio de qualquer indivíduo, seja ele, ou não, pro prietário, esteja na condição de empregado ou de empregador; b) a informação, transmitida da forma mais veloz (onreal time) e com o menor índice possível de desperdício (o mínimo ruído pos sível), é 0 produto mais disputado e, portanto, o mais caro do mercado; c) 0 aprendizado passa a ser valor a mais, mas um valor em os homens precisam
Naisbitt é justamente definida como “fixar culturas e valores”);
bilidade. Mas também precisam ter acesso a uma organização não como empregados, então como consultores se e) 0 emprego deixa de ser uma mera relação de trabalho e passa a fazer parte do conceito mais abrangente de propriedade, que,por isso mesmo, ganha um valor inigualável. Na sociedade medie val, ou seja, rural, a propriedade, praticamente, se limitava à terra, ficando seu conceito restrito ao aspecto meramente físico, poden do, por isso mesmo, ser contada, medida e pesada. Na sociedade industrial, ao conceito de proprie dade foi incorporada elasticidade, mercado financeiro.
graças ao Passou a existir a propriedade simbólica (as ações), também po dendo ser contada, medida e pe sada, mas, agora, deixando de ter uma feição física própria. Na “so ciedade instruída”, a abstração do conceito atinge seu ponto máximo. O talento individual e a capacidade de comunicação dos indivíduos fazem, hoje, parte do patrimônio de uma pessoa ou de um determi nado grupo de pessoas. A propri edade é, cada vez mais, a célula da economia de mercado. Mas agora ree nem uma
mn si mesmo aprender a aprender, cada vez mais; d) a educação, entendida como “prioridade absoluta”, nas “megatendências”, best-seller do americano John Naisbitt, não pode limitada à simples instrução, incorpora uma tábua de valomorais, sem os quais perde, completamente, sua eficiência (não podemos nos esquecer de que a segunda “megatendência” de todos são, de certa forma, propri etários. Afinal, cada um é propri etário de seu próprio cérebro, f) a experiência vivida passa a contar muito. É, tipicamente, um mundo à feição de Confiício. Não por acaso, o “novo paradigma” tem seus melhores exemplos nos paí ses do Pacífico, sob influência das colônias de origem chinesa, com ser mas res ao
forte influência confucionista.
g) O Estado volta a suas fun ções originais, deixando ao mer cado livre as tarefas de produzir, distribuir e consumir bens. Na precisadefmição de Peter Drucker, “o governo não é mais considerado um órgão capaz de produzir uma sociedade melhor — e muito me nos uma sociedade perfeita”. A palavra de ordem, no “admirável mundo novo”, é privatização, com os empregados entrando na com posição acionária das empresas, administradas profissionalmente, não mais por indivíduos ou grupos familiares.
2 — Neste “admirável mundo novo”, modificaram-se, portanto, as relações de trabalho. Basta ler os ensaios mais recentes do pro fessor de Ciência Política na USP e na Unicamp Leôncio Martins Rodrigues para se perceber que o sindicalismo, dentro das limita ções históricas impostas pelo “trade-unionismo” britânico, pelo marxismo-leninismo e pelo pragmatismo americano, perde, com pletamente, 0 sentido. O sindicalismo operário está per dendo a alma para salvar a pele. Hoje, o interesse de todos os lados da produção é a melhor organiza ção do trabalho, ou seja, a admi nistração mais competente. Se gundo Peter Drucker, a adminis tração faz, cada vez mais, parte das ciências conhecidas como “huma nidades”.
Da mesma forma, o “novo paradigma” está matando velhos conceitos de organização do tra balho. A “sociedade instruída” enterrou o conceito fundamental do “fordismo”, isto é, o cumpri mento de tarefas mecânicas, que se complementaram. O “homem ins truído” precisa tomar conheci mento de quase todo o processo produtivo, não ser isolado numa tarefa “alienada”. Apesar da valo-
rização da administração nesta nova era, com a radicalização dos conceitos organizacionais dc Frcderick Taylor, o homem con temporâneo não tem mais sua efi cácia medida pelo número dc ho ras trabalhadas, mas pela natureza de sua tarefa. O conceito do traba lho vigiado perde, complctameníe, o sentido, hoje em dia.
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M WÉit
Na Terceira
Revolução Industrial até o dinheiro é uma abstração funcional da informação. -mÊ.i
3 —No mundo da informática, os netos de Norbert Wiener (o pio neiro da “cibernética”) tendem a desconhecer o valor do dinheiro em papel e a valorizar mais o di nheiro transmitido em sinais ele trônicos nas telas dos computado res e pelos cabos de fibra ótica, que transmitem impulsos telefônicos. Na Terceira Revolução Industrial, até 0 dinheiro é uma abstração fun cional da informação.
4 — Neste mundo, a velha práxis política perde 0 sentido. Uma nova política emerge com novos temas e novas exigências. Não mais a demagogia, o assistencialismo desenfreado, o nepotismo descon trolado e 0 patrímonialismo cúpido. Ou seja, recorrendo ainda ao gran de Peter Drucker, “nós presencia mos hoje na política o mesmo que ocorreu com o surgimento da mer dicina “moderna” por volta de 1700: um abandono das panacéias
cm favor dc diagnósticos específi cos e da busca dc remédios especí ficos para males específicos”, a) Na “sociedade administra da”, vale mais o bom gerente do que 0 bom orador. O universo da palavra se limita, dando, agora, razão ao que dizia o velho Adhcmar dc Barros no passado (“O Brasil precisa dc um gerente”, ele dizia). Cada vez mais importa o adminis trador, tendo menos valor o manipulador das emoções frívolas da massa,
b) Na “sociedade instruída”, cxigc-sc do político a discussão dc temas como a sobrevivência do planeta e da vida (ecologia), a ga rantia dos direitos individuais, a transparência na manipulação do patrimônio coletivo c a manuten ção dos valores morais, indispen sáveis para a decência da vida cm comunidade, com um mínimo in dispensável dc qualidade. O poder está cm discussão nesta “nova so ciedade”. “O poder”, já concluiu o jornalista c escritor francês Jaeques Julliard, cm artigo na revista Le Nouvel Observateur, “não serve para nada”,
c) Em resumo, liberdade indi vidual com responsabilidade co letiva é o lema e a palavra dc ordem deste “admirável mundo novo”.
No Brasil, esse mundo descri to aí parece uma utopia. Ainda estamos muito longe de chegar lá. Ao contrário do que ocorreu na Europa, o Estado brasileiro nunca cumpriu sequer suas funções bá sicas de distribuir a lei de forma adequada e suprir as necessidades come-zinhas de educação, segu rança pública e saúde básica da população carente e desassistida, em sua grande maioria. Ao contrá rio dos Estados Unidos, também a sociedade civil não chegou a de senvolver uma vida autônoma, ca-
paz dc assegurar um clima dc pros peridade, justiça c decência, requi sitos fundamentais para a vida em sociedade no século XXI, que está chegando por aí.
Nas sociedades do presente e do futuro, cidadania c um gênero dc primeira necessidade. Infelizmente, o brasileiro c um cidadão dc segunda classe. Talvez a melhor definição a respeito seja a do pro fessor Roberto da Matta, um an tropólogo brasileiroque atualmente dá aulas no insitute Hclcn Kellogg, na Universidade dc Notre Dame, cm Illinois, nos Estados Unidos, mas continua mais empenhado cm identificar a naturezacaalma desse desconhecido, que é o homem co mum, que sofre c ama nas ruas de nossas cidades c no campo.
No ano passado, cm Curitiba, abrindo o seminário “Brasileiro: Cidadão?”, promovido pelo Gru po Bamerindus, o professor Ro berto da Matta descreveu esse ho mem como sendo “aquele ser fragilizado pela ausência de reco nhecimento social, aquele indiví duo sem rosto, sem direitos e sem recursos, colocado numa espera intcmiinável que é o símbolo mais perfeito, no Brasil, da ausência de uma verdadeira cultura da cidada nia. Vale infelizmente dizer: de uma cultura igualitária, aberta à mobilidade. Uma cultura efetiva mente moderna e democrática, na qual os direitos individuais contemplados efetivamente na prática social e não apenas nas leis. Porque ninguém sabe melhor do que nós como é fácil contemplar tais direitos nas leis...”
de papel a cumprir, nessa guerra. A queda do Muro de Berlim istituiu a opção pela economia de mercado como definitiva em nosso tempo. Esta é uma grande vantagem para a empresa privada. Mas, para que isso oconra, ela tem um papel im portante a cumprir no necessário treinamento para o exercício da cidadania. Nesse sentido, o empre-
A empresa precisa entender o tempo dedicado ao lazer como extensão do tempo trabalhado por seu funcionário.
sário, também, não pode ficar es perando que 0 Estado prepare o cidadão. A empresa tem uma fun ção social. Ou ela a desempenha ou seráultrapassada pela velocida de dos fatos.
1 sao
Não lhe basta treinar o funcionário. A empresa precisa participar ativamente de sua for mação educacional, não relegando esse papel apenas para o Estado. Afinal, não são os próprios empre sários que pregam o Estado míni mo?
4 — O empresário é, perma nentemente, convocado a partici par do enorme esforço gerencial, que se exige da administração pú blica. Ele não pode mais limitar suas atividades políticas à tentati va de obtenção de alguma vanta gem, fiel à velha Lei de Gérson. Aliás, gostaria de lembrar que está na moda agora é a Lei de Júnior, que valoriza conceitos nobres como humildade, austeridade, talento e empenho.
Esse homem comum não pode mais ficar esperando o Estado para conquistar sua condição funda mental de participante na produ ção e no consmno de riquezas e no processo de decisão política. A conquista tem de ser da sociedade e a empresa privada tem um gran¬
2 — A empresa precisa enten der 0 tempo dedicado ao lazer como extensão do tempo trabalhado por funcionário. Na “sociedade instruída”, o repouso do guerreiro também faz parte da batalha.
3 A “sociedade instruída” precisa ser, também, a sociedade saudável. A empresa tem a obriga ção precípua de garantir a saúde de seus seu trabalhadores.
No mesmo seminário de Curitiba, a que me referi antes, outro intelectual, o historiador José Murilo de Carvalho, autor de Os Bestializados, reclamou que o processo de absorção dos concei tos de cidadania está ocorrendo de forma lenta demais no Brasil. Afinal, como ele mesmo lembrou na ocasião, “o cidadão esclarecido é uma peça incômoda, reivindicadora”. Por isso, a tendência é sempre considerá-lo um empeci lho, um obstáculo ao crescimento da empresa ou da própria economia. Trata-se de um equívoco, e de um equívoco grave. O cidadão esclarecido é a célula fundamental do grande tecido social que está sendo costurado no mundo inteiro. Sem sua participação, não existe riqueza a ser produzida, quanto mais a ser partilhada. E o Brasil não sairá do atraso e da estagnação em que está atolado, se não per ceber, e logo, isso. Gostaria de encerrar essa pequena digressão com uma lembrança que foi feita pelo professor José Murilo de Carvalho, em sua palestra no se minário de Curitiba. Naquela oca sião, ele lembrou que Euclides da Cunha escreveu em seu texto clás sico Os Sertões, uma frase que refletiu, muito bem, o ambiente do final do século XIX: “Estamos condenados à civilização. Ou pro gredimos ou desaparecemos”. Agora, que estamos no final
do século XX, O professor José Murilo de Carvalho nos fez uma advertência, que deveria calar íimdo em nossas almas, quando sairmos daqui e voltarmos ao co tidiano do trabalho: “Estamos condenados à democracia. Ou nos democratizamos ou desaparece mos”. E democracia, meus ami¬
gos, não é um jogo formal, mas uma prática diária c permanente, que exercitamos em casa, com a família, ou nas cmresas, com os colegas de trabalho e funcionários. Democracia é, cada vez mais, na Terceira Revolução Industrial, o constante, o incansável, o inevitá vel exercício da cidadania. Em cada
pequeno gesto, muito mais do que em cada grande palavra. Muito obrigado a todos pela pacieneia!
JOSE .NEUMANNE PINTO c jornalis ta, c.scritor e autor do livro A Repú blica na Lama. O tc.xto c dc palestra proferida no seminário “Cidadania Empresarial”, realizado pela Câmara Americana de Comércio em setem bro deste ano.
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