A diplomacia de Dilma: uma reconstrução inacabada e imperfeita
Patrícia Cruz / LUZ
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Rubens Ricupero
Formado em Direito pela Faculdade de Direito da USP, seguiu a carreira diplomática, foi embaixador do Brasil nos EUA, na Itália e junto à ONU e ao Acordo Geral de Comércio e Tarifas (GATT) em Genebra. Foi ministro da Fazenda, cabendo-lhe o lançamento do Plano Real, e ministro do Meio Ambiente e da Amazônia.
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omparada às expectativas de mudança, a diplomacia de Dilma deixa a impressão de obra de reconstrução parcial e frustrante: retificou alguns aspectos, mas no essencial, não soube aproveitar as oportunidades para alcançar resultados concretos e duradouros. Embora Dilma não pudesse se dissociar da diplomacia de Lula de modo explícito, parecia claro, no início do governo, que ela buscaria corrigir o que já em 2010 se tornara alvo de crítica geral: o excesso de protagonismo presidencial, a diplomacia de gestos publicitários e vazios de substância, as iniciativas temerárias em áreas distantes das prioridades brasileiras, o silêncio cúmplice em relação a regimes notoriamente ditatoriais e violadores de direitos humanos, a inspiração ideológica e sectária da política externa. Adivinhava-se também a intenção de consertar os estragos no relacionamento com os Estados Unidos e interpretava-se nesse sentido a escolha como novo chanceler de Antonio Patriota, então embaixador em Washington. Dando balanço no quadriênio, reconheça-se que algo foi feito na direção certa. Parte disso não resultou de escolha, mas foi imposição da própria mudança. O exemplo mais claro decorre da retirada de cena de Lula, cujo carisma não tinha como transferir-se à sucessora. Desapareceu o protagonismo, o personalismo exagerado, a diplomacia centrada na figura e na biografia do presidente. O estilo diplomático tor-
DIGESTO ECONÔMICO JULHO/AGOSTO 2014
nou-se em geral mais sóbrio. Outra modificação bem-vinda consistiu no retorno (relativo) à defesa dos direitos humanos e no distanciamento de regimes como o do Irã. Esboçaram-se passos positivos para renovar o relacionamento com os EUA na base, entre outras, do programa Ciência Sem Fronteiras e colaboração em ciência e tecnologia. A aproximação com Washington, que deveria constituir o carro-chefe da nova diplomacia e culminar com a visita de Estado da presidente, foi vítima da espionagem da National Security Agency. Não havia condições políticas para a visita e nesse caso não se pode censurar a decisão de suspender o esforço até que se restabeleçam condições mais propícias. A frustração do elemento mais importante da reconstrução diplomática projeta a imagem de projeto inacabado. Dos dois elementos da fórmula de “destruição criativa” de Schumpeter, fica a sensação de que se destruiu bastante, mas não se criou o suficiente. Da obra de demolição, resta ainda parte considerável, em especial na ideologização da política sul-americana. Não só sobrou o entulho do eixo bolivariano; acrescentaram-se monstrengos novos: a suspensão arbitrária do Paraguai do MERCOSUL como pretexto para precipitar o ingresso da Venezuela; o falso “asilo” ao senador boliviano Roger Pinto. O que faltou edificar, porém, supera em muito o que ficou sem demolir. Esperava-se