Digesto Econômico nº 454

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m estudo divulgado no início do ano pelo instituto de pesquisas Imazon, chamado "A Pecuário e o Desmatamento na Amazônia na Era das Mudanças Climáticas", mostra a relação que haveria entre o aumento do rebanho bovino brasileiro e o desmatamento na Amazônia Legal. Por conta de pressões do mercado e da sociedade (ou mesmo como artifício de marketing), algumas empresas anunciaram que não irão mais comprar carne e couro de bois oriundos de áreas desmatadas ilegalmente, exigindo de seus fornecedores essa garantia. Entre essas empresas estão grandes varejistas como Walmart, Pão de Açúcar e Carrefour, e fabricantes de calçados, como Nike e Timberland. Os ambientalistas torcem para que essa iniciativa se multiplique. Uma das principais preocupações do Imazon é com o aumento na emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE), resultantes das queimadas para limpar o solo antes do plantio de pastagens. Os GEE emitidos por todos os países vêm causando o aquecimento do planeta e desequilíbrios climáticos, como o aumento de chuvas e secas. Além disso, cientistas projetam que a continuação das emissões causará catástrofes ainda neste século, como secas, extinção de espécies, colapso de produção agrícola e migrações. A redução dos desmatamentos será essencial para reduzir as emissões brasileiras, pois as queimadas contribuíram com mais de 50% (em equivalente CO2) das emissões nacionais em 1994, segundo o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT). Entre os fatores que têm contribuído para o desmatamento ilegal na região Amazônica, o relatório do Imazon destaca falhas na fiscalização, a existência de frigoríficos clandestinos, o crédito subsidiado, a ocupação de terras públicas por grileiros e a morosidade da legislação em retomar essas terras. Segundo o instituto, entre 1990 e 2006, o rebanho bovino brasileiro aumentou cerca de 40%, saltando de 147 milhões de cabeças para 206 milhões, de acordo com dados do IBGE. O fato fez com que o Brasil se tornasse em 2004 o maior exportador de carne bovina do planeta. Porém, grande parte desse crescimento se deu a partir do desmatamento ilegal, afirma o instituto. Os números mostram que 80% deste crescimento ocorreu na Amazônia Legal, cujo rebanho saltou de 26 milhões (18% do total nacional) para 73 milhões de cabeças, o equivalente a 36% do total nacional. Mato Grosso e Pará somaram cerca de 60% do total do rebanho da região. Rondônia dobrou sua participação relativa de 7% para 16% do total do rebanho regional, passando de quinto para terceiro maior rebanho entre 1990 e 2006. O rebanho cresceu em um grande número de municípios da Amazônia, avançando de leste para oeste e de sul para o centro da região. Entre 2005 e 2006, o rebanho caiu no Mato Grosso (2,2%), Pará (3,1%) e Tocantins (2,5%), enquanto ficou estável ou cresceu nos demais Estados. De acordo com o estudo, as pastagens fora da Amazônia estão diminuindo por causa da substituição de pastos por culturas mais rentáveis, principalmente cana-de-açúcar, algodão e grãos. Por outro lado, na Amazônia, onde o rebanho mais cresce, a área de pastos aumentou expressivamente. Entre 1990 e 2006, foram desmatados 30,6 milhões de hectares na região, conforme estimativas do Instituto Nacional de Pesquisas

Carlos Ossamu Espaciais - Inpe. Descontando desta área 5,3 milhões de hectares destinados à agricultura e reflorestamento, o Imazon estima que 25,3 milhões de hectares foram potencialmente ocupados por pastos entre 1990 e 2006. Porém, o total de pastos pode ser maior, considerando que a área agrícola foi reduzida em 2,2 milhões de hectares entre 2005 e 2006, mas não há certeza se essa área foi transformada em pastos em 2006. Por outro lado, o pasto pode ser menor, pois parte do aumento da área de culturas agrícolas na Amazônia Legal ocorreu no cerrado, cujo desflorestamento não é medido pelo Inpe. De qualquer forma, essa estimativa revela que a pecuária continua como a principal ocupação das áreas desmatadas na Amazônia, ocupando de 75% a 81% do total desmatado entre 1990 e 2005. Essa estimativa é compatível com dados do IBGE , que afirma que 70% das áreas desmatadas foram ocupadas por pastos em 1995. Segundo o estudo do Imazon, uma outra análise faz a conexão da expansão da pecuária com o desmatamento. Dados indicam que 73,4% da variação da área desmatada anualmente entre 1995 e 2007 decorreu da variação do índice de preço do boi gordo (IGP em São Paulo) no ano anterior (entre 1994 e 2006). Na maioria dos anos, o desmatamento subiu e desceu conforme a subida e queda do preço do gado no ano anterior. Em alguns anos ocorreu o contrário, mas esse fato é explicável pela influência do preço da soja no desmatamento. Isso ajuda a explicar o fato de que entre 2001 e 2003 o desmatamento tenha subido, seguindo um padrão similar à subida do preço da soja, enquanto o preço do gado caiu. Nos anos em que os preços do gado e soja caíram juntos, as taxas de desmatamento caíram mais rapidamente. O gado produzido na Amazônia é comercializado por várias vias, seja como gado vivo, seja como carne. A estimativa do Imazon é que a produção total de carne a partir de gado da Amazônia ficou em torno de 2,8 milhões de toneladas em 2005. Destes, 2 milhões de toneladas, ou 71%, foram processados por 65 frigoríficos inspecionados pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF), conforme levantamento de campo realizado. O restante, cerca de 800 mil toneladas equivalentes em carcaça, foi comercializado como boi vivo e carne processada por frigoríficos com inspeção estadual e por matadouros clandestinos. A estimativa é que os frigoríficos com SIF destinaram 95% da produção para o mercado nacional e 5% para outros países, considerando os dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Do total destinado ao mercado nacional, 88% foram consumidos fora da Amazônia e apenas 12% na região. A participação da Amazônia nas exportações de carne brasileiras cresceu expressivamente entre 2000 e 2006, de 6% (10 mil toneladas) para 22 % do total (263,7 mil toneladas). As exportações cresceram mais rapidamente depois de 2005, pois a região ganhou parte do mercado que deixou de ser abastecido pelos Estados do Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná em decorrência de casos de febre aftosa em Mato Grosso do Sul e Paraná. O controle da febre aftosa nos principais polos produtores da região facilitou as exportações e pode haver um crescimento ainda maior. Em 2005, cerca de 30% dos frigoríficos no Mato Grosso, Tocantins, Rondônia e Pará estavam autorizados a ex-

JULHO/AGOSTO 2009 DIGESTO ECONÔMICO

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