CUT3/2007

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Organizadoras: Marta Regina Domingues e Marilane Oliveira Teixeira

Educação Integral dos Trabalhadores Setores Econômicos Químico: Plásticos, Telecomunicações, Construção Civil e Agropecuário: Aves e Suínos

• Maria Ciavatta •Gaudêncio Frigotto • Vinicius Gaspar Garcia • Fabiano Lago Garrido • José Dari Krein • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto • Marcelo Weishaupt Proni • Marise Ramos • Anselmo Luís dos Santos • Ricardo Azevedo Silva • Wagner Wiliam da Silva • Cristiano dos Reis Souza


Presidente da República LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Ministro do Trabalho e Emprego CARLOS LUPI Secretário Executivo do Ministério do Trabalho e Emprego RONALDO AUGUSTO LESSA SANTOS Secretário de Políticas Públicas de Emprego - SPPE ANTONIO SÉRGIO ALVES VIDIGAL Diretor do Departamento de Qualificação - DEQ ANTONIO ALMERICO BIONDI LIMA Coordenadora-Geral de Qualificação - CGQUA TATIANA SCALCO SILVEIRA Coordenador-Geral de Certificação e Orientação Profissional - CGCOP MARCELO ÁLVARES DE SOUSA Coordenador-Geral de Empreendedorismo Juvenil MISAEL GOYOS DE OLIVEIRA (C) copyright 2005 - Ministério do Trabalho e Emprego MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO Secretaria de Políticas Públicas de Emprego - SPPE Departamento de Qualificação - DEQ Esplanada dos Ministérios, Bloco F, 3° andar, Edifício Sede, Sala 306. CEP 70059-900 - Brasília - DF Telefones: (0XX61) 3317-6239/ 3317-6004 Fax.: (0XX61) 3224-7593 E-mail: qualificação@mte.org.br Tiragem: 3000 exemplares ELABORAÇÃO, EDIÇÃO E DISTRIBUIÇÃO: ESCOLA SINDICAL SÃO PAULO-CUT Rua Dona Brígida, 299 – Vila Mariana CEP 04111-080 - São Paulo – SP Telefone (0XX11) 5084-2131 Site: www.escolasp.org.br E-mail: escolasp@uol.com.br

Obs.: Os textos não refletem necessariamente a posição do Ministério do Trabalho e Emprego


Organizadoras: Marta Regina Domingues e Marilane Oliveira Teixeira

Educação Integral dos Trabalhadores Setores Econômicos Químico: Plásticos, Telecomunicações, Construção Civil e Agropecuário: Aves e Suínos

• Maria Ciavatta •Gaudêncio Frigotto • Vinicius Gaspar Garcia • Fabiano Lago Garrido • José Dari Krein • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto • Marcelo Weishaupt Proni • Marise Ramos • Anselmo Luís dos Santos • Ricardo Azevedo Silva • Wagner Wiliam da Silva • Cristiano dos Reis Souza

2007


CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES Rua Caetano Pinto, 575 - CEP 03041-000 – Brás – São Paulo – SP Telefone: (0XX11) 2108-9200 – Fax: (0XX11) 2108-9200 Site: www.cut.org.br

DIREÇÃO EXECUTIVA NACIONAL DA CUT – 2006/2009 Presidente ARTUR HENRIQUE DA SILVA SANTOS SINERGIA – Sind. Trab.Ind. de Energia Elétrica do Estado de SP

Secretária de Organização DENISE MOTTA DAU SindSaúde - Sind. dos Serv. Pub. em Saúde do Estado de SP

Vice-Presidente CARMEN HELENA FERREIRA FORO Sind. Trab. Rurais de IgarapéMiri – PA

Secretária Sobre a Mulher Trabalhadora MARIA EDNALVA BEZERRA DE LIMA Sind. Trab. Educação do Estado da PB

Vice-Presidente WAGNER GOMES Sind. dos Metroviários do Estado de SP Secretário Geral QUINTINO MARQUES SEVERO Sind. Trab. Ind. Metalúrgicas de São Leopoldo – RS Primeiro Secretário ADEILSON RIBEIRO TELLES SEPE -Sind. Est. Dos Profissionais da Educação do Estado do RJ Tesoureiro JACY AFONSO DE MELO Sind. dos Bancários de Brasília – DF Primeiro Tesoureiro ANTONIO CARLOS SPIS Sind. Unificado dos Petroleiros do Estado de SP Secretário de Relações Internacionais JOÃO ANTÔNIO FELICIO APEOESP – Sind. dos Professores do Ensino Oficial do Estado de SP Secretária de Política Sindical ROSANE DA SILVA Sind. dos Sapateiros de Ivoti – RS Secretário de Formação JOSÉ CELESTINO LOURENÇO (TINO) SIND-UTE – Sind. Único dos Trab. em Educação do Estado de MG Secretária de Comunicação ROSANE BERTOTTI Sind. Trab. Agricultura Familiar de Xanxerê – SC Secretário de Políticas Sociais CARLOS ROGÉRIO DE CARVALHO NUNES Sind. dos Assistentes Sociais do Estado do CE

Diretoria Executiva ANÍZIO SANTOS DE MELO APEOC - Sind. Serv. Pub. Lot. Sec. De Educação e de Cultura do Estado do CE ANTONIO SOARES GUIMARÃES (BANDEIRA) Sind. Trab. Rurais de Pentecostes - CE CARLOS HENRIQUE DE OLIVEIRA Sind. Serv. Pub. Municipais de São José do Rio Preto - SP CELINA ALVES PADILHA AREAS SINPRO - Sind. dos Professores do Estado de MG DARY BECK FILHO Sind. Trab. Ind. Dest. Refinação de Petróleo do Estado do RS ELISANGELA DOS SANTOS ARAÚJO Sind. Trab. Rurais de São Domingos - BA EVERALDO AUGUSTO DA SILVA Sind. dos Bancários de Salvador - BA EXPEDITO SOLANEY PEREIRA DE MAGALHÃES Sind. dos Bancários do Estado de PE JOSÉ LOPEZ FEIJÓO Sind. Trab. Ind. Metalúrgicas do ABC – SP JULIO TURRA FILHO SINPRO - Sind. dos Professores do ABC – SP LUCIA REGINA DOS SANTOS REIS SINTUFRJ - Sind. Trab. em Educação da UFRJ

MANOEL MESSIAS NASCIMENTO MELO SINDPD – Sind. dos Trab. em Informática do Estado de PE MILTON CANUTO DE ALMEIDA SINTEAL - Sind. Trab. Em Educação do Estado de AL PASCOAL CARNEIRO Sind. Trab. Ind. Metalúrgicas de Salvador – BA ROGÉRIO BATISTA PANTOJA Sind. Trab. Ind. Urbanas - AP TEMÍSTOCLES MARCELOS NETO Sind. Serv.Pub. em Saúde do Estado de MG VAGNER FREITAS DE MORAES Sind. dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região - SP VALÉRIA CONCEIÇÃO DA SILVA Sind. Trab. Em Educação do Estado de PE Conselho Fiscal - Efetivos MARIA JULIA REIS NOGUEIRA Sind. Trab. Pub. Fed. Saúde e Previdência do Estado do MA VALDEMIR MEDEIROS DA SILVA Sind. dos Previdenciários do Estado da Bahia DILCE ABGAIL RODRIGUES PEREIRA Sind. Trab. Comércio Hoteleiro, Rest. Bares e Hospitalidade de Caxias do Sul – RS Conselho Fiscal - Suplentes ALCI MATOS ARAÚJO Sind. Empreg. no Comércio do Estado do ES JOSÉ CARLOS PIGATTI Sind. Trab. Energia Elétrica do Estado do ES ODAIR JOSÉ NEVES SANTOS Sind. dos Professores Públicos e Especialistas em Educação do Estado do MA


Organizadoras: Marta Regina Domingues e Marilane Oliveira Teixeira

Educação Integral dos Trabalhadores Setores Econômicos Químico: Plásticos, Telecomunicações, Construção Civil e Agropecuário: Aves e Suínos Marta Regina Domingues: Educadora, Mestra em Educação, Política e Sociedade pela PUC/SP; Assessora Pedagógica da Secretaria Nacional de Formação da CUT desde 1998 e Coordenadora Pedagógica do Projeto Especial de Qualificação Profissional – PROESQ – Quem luta também educa! 2005-2007 Marilane Oliveira Teixeira: Economista, Mestra em Economia Política pela PUC/SP; doutoranda em Economia Social do Trabalho, no Instituto de Economia da Unicamp e formadora da Escola Sindical São Paulo-CUT. Maria Ciavatta: Doutora em Ciências Humanas (Educação), Professora Titular Associada ao Programa de Pós-graduação em Educação – Mestrado e Doutorado da Universidade Federal Fluminense, Coordenadora do GT “Trabalho e Educação” (2002-2004) da Associação de Pesquisa e Pós-graduação em Educação (ANPEd), Pesquisadora sênior apoiada pelo CNPq e FAPERJ. Gaudêncio Frigotto: Doutor em Ciências Humanas (Educação) Professor Titular Visitante da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Professor Titular Associado ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense. Membro do Comitê Diretivo do Conselho Latino americano de Ciências Sociais (CLACSO), Pesquisador sênior apoiado pelo CNPq. Vinicius Gaspar Garcia: Economista, Pesquisador da FACAMP e doutorando em Economia Social e do Trabalho no Instituto de Economia da Unicamp. Fabiano Lago Garrido: Sociólogo, mestrando em Economia Social e do Trabalho no Instituto de Economia da Unicamp. José Dari Krein: Doutor em Economia do Trabalho, Professor do Instituto de Economia da Unicamp e Pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho - Cesit.

Sebastião Lopes Neto: Ex-metalúrgico. Membro da Coordenação da Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas - IIEP Alexandre Custódio Pinto: Físico (Graduação e Licenciatura), Mestre em Ensino de Ciências pela Universidade de São Paulo, Pesquisador da Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas - IIEP Marcelo Weishaupt Proni: Economista, Pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho – Cesit, e Professor do Instituto de Economia da Unicamp. Marise Ramos: Doutora em Ciências Humanas (Educação), Professora Adjunta da Faculdade de Educação da UERJ e Professora do CEFET-Química, em exercício de cooperação técnica na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz - EPSJV/FIOCRUZ. Anselmo Luís dos Santos: Economista, Professor e Pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho – Cesit, do Instituto de Economia da Unicamp. Ricardo Azevedo Silva: Economista, mestre em Desenvolvimento Econômico Espaço e Meio Ambiente e doutorando em Economia Aplicada pelo Instituto de Economia/UNICAMP. Atualmente integrante da equipe de pesquisa do CESIT/IE/UNICAMP e professor bolsista no curso de graduação do IE/UNICAMP. Wagner Wiliam da Silva: Economista e mestrando do Instituto de Economia da Unicamp. Bolsista da CAPES. Cristiano dos Reis Souza: Filósofo (Graduação), Mestre em História pela Universidade de São Paulo, Pesquisador da Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas - IIEP.


SECRETARIA NACIONAL DE FORMAÇÃO - CUT Secretário Nacional de Formação

JOSÉ CELESTINO LOURENÇO Coordenador-Geral

MARTINHO DA CONCEIÇÃO Assessoria

ARCHIMEDES FELÍCIO LAZZERI MARISTELA MIRANDA BÁRBARA MARTA REGINA DOMINGUES PAULA CRISTINA BERNARDO Secretária

LUCI FERNANDES

ESCOLA SINDICAL SÃO PAULO - CUT Conselho Político

Secretário Nacional de Formação

Sind. Químicos do ABC

JOSÉ CELESTINO LOURENÇO

APARECIDO DONIZETI DA SILVA Sind. dos Petroleiros de SP Apeoesp

JOSÉ SAMUEL MAGALHÃES

CARLOS RAMIRO DE CASTRO Sind. Bancários de SP Sinsexpro

CARLOS TADEU VILANOVA Sindsaúde

CÉLIA REGINA COSTA Presidente da CUT Estadual

EDÍLSON DE PAULA OLIVEIRA Escola Sindical SP-CUT

ELIAS SOARES

LUIZ CLÁUDIO MARCOLINO Sind. Metalúrgicos do ABC

TARCISIO SECOLI Coordenação Coordenador Geral/Secretário de Formação CUT-SP

CARLOS TADEU VILANOVA

Apoio Administrativo CLARICE MARIA DE MELO ESTHER RIVELLES

Coordenador Administrativo

MARIA DA CONCEIÇÃO C. ALVES

ELIAS SOARES

SONIA CALIL ELIAS ROCHA VANDERLEI SOARES CABRAL

Escola Sindical SP-CUT

Coordenador de Formação

HELIO DA COSTA

HELIO DA COSTA

Secretário Estadual de Formação

Equipe de Formação ANA PAULA ALVES OLIVEIRA

CARLOS TADEU VILANOVA

ELAINE OLIVEIRA TEIXEIRA ELIAS SOARES ERNANI FERNANDES MOREIRA HELIO DA COSTA KARIN ADRIANE HUGO LUCAS LENIR DE VISCOVINI MARILANE OLIVEIRA TEIXEIRA MARIO HENRIQUE GUEDES LADOSKY MARLUSE CASTRO MACIEL NEIDE DOS SANTOS VERÃO PÉRSIO PLENSACK WILLIAM NOZAKI

Apoio Pedagógico HELANNE APARECIDA PEREIRA MARIA DE LOURDES INÊS OÑA

Coordenação Geral CARLOS TADEU VILANOVA Coordenação Financeira ELIAS SOARES Coordenação Pedagógica MARTA REGINA DOMINGUES


Apresentação

E

sta publicação é fruto de estudos e pesquisas desenvolvidos no âmbito do Projeto Especial de Qualificação – PROESQ – Quem luta também educa!, iniciativa da Central Única dos Trabalhadores – CUT, por meio da Secretaria Nacional de Formação da CUT e da Escola Sindical São Paulo-CUT. O PROESQ - Quem luta também educa! foi realizado a partir de convênio estabelecido entre a Escola Sindical São Paulo-CUT e o Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, dentro do Plano Nacional de Qualificação – PNQ, e financiado pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. O Conselho Deliberativo do FAT – Codefat, um dos mais importantes órgãos tripartites e paritários do país, delibera sobre várias políticas afeitas ao Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda. Entre elas, a política de qualificação social e profissional. Com a finalidade de desenvolver e aprimorar metodologias e tecnologias apropriadas para a educação e qualificação social e profissional de trabalhadores e trabalhadoras, um dos objetos de estudo aos quais nos dedicamos no desenvolvimento do Quem luta também educa! foi a Educação Integral dos Trabalhadores. Nesta publicação focalizamos, em especial, a perspectiva de uma Educação Integral e os significados das mudanças históricas acerca de educação, formação e qualificação profissional, um panorama da Educação Profissional no Brasil no nível médio, as atuais dinâmicas do mundo do trabalho nos setores econômicos Químico: Plásticos, Telecomunicações, Construção Civil e Agropecuário: Aves e Suínos, assim como análises de cursos relacionados a estes setores econômicos. Nossa expectativa, ao realizar este trabalho, é de que as análises e reflexões aqui apresentadas subsidiem as ações do movimento sindical em geral, estimulem a socialização de outras experiências e, em especial, contribuam para subsidiar processos de negociação e contratação coletiva da qualificação socioprofissional, seja no âmbito das políticas públicas educacionais, seja no âmbito das relações capital-trabalho.

Desejamos a todos uma excelente leitura!

Artur Henrique da Silva Santos – Presidente Nacional da CUT José Celestino Lourenço – Secretário Nacional de Formação da CUT e membro do Conselho Político da Escola Sindical São Paulo-CUT Carlos Tadeu Vilanova – Secretário de Formação da CUT São Paulo e coordenador geral da Escola Sindical São Paulo-CUT

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Sumário Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11 Capítulo 1 - A Relação entre Educação e Qualificação Profissional Frente às Mudanças no Mundo do Trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .13 • Gaudêncio Frigotto • Maria Ciavatta • Marise Ramos Capítulo 2 - Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio . . . . . . . . . . . . . . . .31 • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto • Cristiano dos Reis Souza Capítulo 3 - Setor Econômico Químico: Plásticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .47 Mudanças Recentes na Indústria Brasileira de Transformação de Plásticos e Impactos Sobre a Demanda por Qualificação Profissional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .47 • Anselmo Luís dos Santos • Fabiano Lago Garrido A Educação Profissional para o Setor Químico: Plásticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .74 • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto Capítulo 4 - Setor Econômico de Telecomunicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .85 As Mudanças no Setor de Telecomunicações no Brasil e suas Implicações para Discutir a Qualificação Profissional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .85 • Ricardo Azevedo Silva • José Dari Krein A Educação Profissional no Setor de Telecomunicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .114 • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto Capítulo 5 - Setor Econômico de Construção Civil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .121 Mudanças Recentes no Processo Produtivo e Demandas por Qualificação Profissional na Construção Pesada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .121 • Vinicius Gaspar Garcia •Anselmo Luís dos Santos • Marcelo Weishaupt Proni • José Dari Krein A Educação Profissional no Setor de Construção Civil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .135 • Sebastião Lopes Neto •Alexandre Custódio Pinto Capítulo 6 - Setor Econômico Agropecuário: Aves e Suínos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .139 Evolução e Perfil do Emprego no Setor de Frangos e de Suínos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .139 • Marcelo Weishaupt Proni • Wagner Wiliam da Silva Educação Profissional no Setor Agropecuário: Aves e Suínos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .172 •Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto

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Introdução Aos leitores e leitoras,

O

s debates acerca das relações entre educação e qualificação profissional, mundo do trabalho e políticas governamentais e sindicais têm revelado a necessidade de se abordar estas questões de modo integrado. A forma como estes distintos campos se constituíram historicamente, com conhecimentos, determinações e desenvolvimentos diferenciados, marcados também por interesses que no limite se revelam antagônicos entre as classes fundamentais (Trabalho e Capital), tem delimitado e restringido cada um dos campos a experiências e análises endógenas, muitas vezes auto-referidas, inibindo a exposição de um todo relacionado e sistêmico e dificultando a apreensão e tomada de decisões que influenciam mutuamente as várias políticas e direitos envolvidos. A partir desta compreensão, esta publicação foi organizada com o objetivo de propiciar aos leitores a percepção de diálogos entre os campos abordados por meio dos quais, sob diferentes perspectivas, podemos apreender inter-relações, potencialidades e insuficiências para a garantia de direitos fundamentais aos trabalhadores e trabalhadoras e para a sociedade mais ampla.Vários especialistas e estudiosos contribuíram para que pudéssemos alcançar este objetivo e aos quais agradecemos pelo desprendimento, profissionalismo e dedicação. A partir de uma análise teórica sobre a relação entre Educação e Qualificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho, no capítulo 1, e da elaboração de um panorama da Educação Profissional de Nível Médio no Brasil, no capítulo 2, procuramos compor os cenários dos setores: químico de plásticos, construção civil, telecomunicações e agropecuário (aves e suínos). Desta forma, os capítulos 4 a 6 foram organizados contemplando as configurações gerais dos setores, sua importância econômica e as transformações recentes ocorridas, evolução do emprego, perfil dos trabalhadores e estrutura ocupacional, além das demandas por qualificação profissional. Para cada setor, em cada um destes capítulos, foram selecionados e analisados planos de curso de entidades que oferecem Educação Profissional de Nível Médio. Consideramos que as excelentes análises e as críticas e posições delas decorrentes, que permeiam todo o texto, são um valioso instrumento de reflexão e subsídios para a tomada de decisões, para as entidades sindicais e sua atuação no campo das políticas públicas de educação e de emprego, assim como para os governos, a academia e outras entidades da sociedade civil. Tendo como perspectiva a Educação Integral de trabalhadores e a constituição de relações democráticas, pautadas pela negociação coletiva e a garantia de direitos no mundo do trabalho, desejamos que a leitura desta publicação se transforme em um rico processo de aprendizagem para todos os leitores e leitoras! As organizadoras.

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• Gaudêncio Frigotto • Maria Ciavatta • Marise Ramos O trabalho reduzido à mercadoria força-de-trabalho na sociedade capitalista2

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revolução capitalista ou burguesa, entendida no processo histórico, engendra um caráter "civilizatório" em relação aos modos de produção pré-capitalistas. A ruptura como o Estado Absolutista, com certas visões metafísicas de realidade e de conhecimento e a abolição da escravidão, constitui-se em necessidade intrínseca das relações capitalistas no plano ideológico e no plano das relações econômicas e políticas. Os avanços, que porventura tenham ocorrido com a implantação da sociedade capitalista, são restritos e relativos, pois mantêm a divisão dos seres humanos entre aqueles que detêm a propriedade privada de capital (propriedade de meios e instrumentos de produção com o fim de gerar lucro) e aqueles que para se reproduzirem e manter suas vidas e a de seus filhos precisam ir ao mercado e vender sua força de trabalho, tendo em troca uma remuneração ou salário3. Tanto o trabalho quanto a propriedade, a ciência e a tecnologia, sob o capitalismo, deixam de ter centralidade como produtores de valores de uso para os trabalhadores: resposta a necessidades vitais destes seres humanos. A força de trabalho expressa sua centralidade ao se transformar em produtora de valores de troca, com o fim de gerar mais lucro ou mais valor para os capitalistas. O trabalho, então, de atividade produtora imediata de valores de uso para os trabalhadores, se reduz a mercadoria força de trabalho e tende a se confundir com emprego. O capital detém como propriedade privada, de forma crescente, os meios e instrumentos de produção. A classe trabalhadora detém apenas sua força de trabalho para vender. Ao capitalista interessa comprar o tempo de trabalho do trabalhador ao menor preço possível, organizá-lo e gerenciá-lo de tal sorte que ao final de um período de trabalho – jornada, semana ou mês – o pagamento em forma de salário represente apenas uma parte de tempo pago e a outra se transforme em ganho do capitalista ou um sobrevalor (mais valia ou tempo de trabalho não pago)4. Este texto é parte de estudo formulado por Gaudêncio Frigotto, Maria Ciavatta e Marise Ramos no âmbito do PROESQ – Quem luta também educa! em 2005, intitulado: A relação entre Educação, Qualificação e Certificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho e das classificações ocupacionais, considerando as realidades do trabalho nos mercados formal e informal. 2 As idéias básicas apresentadas neste item foram apropriadas de Frigotto, Gaudêncio. Concepções e mudanças no mundo do trabalho e o Ensino Médio, 2005, mimeo. 3 É crucial que se distinga a propriedade que temos de determinados objetos ou coisas que são para o uso de quem as possui - casa, carro, terra, etc, com a propriedade privada que é um capital utilizado para incorporar trabalhadores assalariados que produzam para quem tem este capital. A acumulação e o lucro, no capitalismo, advêm de uma relação contratual da compra e venda da força de trabalho entre forças desiguais: quem detém capital e quem detém apenas sua força de trabalho. Estar de um lado ou de outro não é uma questão de escolha, mas resultado de um processo histórico que precisa ser apreendido. A dificuldade de perceber a exploração reside no fato de que o capital compra o tempo de trabalho dos trabalhadores numa transação e contrato sob o pressuposto da igualdade e liberdade das partes. Na realidade trata-se apenas de uma igualdade e liberdade formal e aparente. O poder de uns e de outros é assimétrico. 4 Ao analisar o processo capitalista de trabalho, Marx vai mostrar que no processo de produção o trabalho morto tende a prevalecer sobre o trabalho vivo marcado pela presença do seu produtor (o operário ou o proletário). (Marx, 1983) . 1

Capítulo 1

A Relação entre Educação e Qualificação Profissional Frente às Mudanças no Mundo do Trabalho1


Educação Integral dos Trabalhadores

No plano da ideologia a representação que se constrói é a de que o trabalhador ganha o que é justo pela sua produção, pois parte do pressuposto de que os capitalistas (detentores de capital) e os trabalhadores que vendem sua força de trabalho, o fazem numa situação de igualdade e por livre escolha. Apagam-se processos históricos que transformaram as relações de classes. Entre estas há de se perceber que a classe detentora do capital para se tornar hegemônica superou outras que se fundavam em relações escravocratas e servis. Essa dissimulação fica mais mascarada mediante o contrato de trabalho que legaliza essa relação desigual. A educação, mediante as noções de capital humano, sociedade do conhecimento e pedagogia das competências para a empregabilidade, tem sido utilizada em contextos históricos diferentes, como suportes ideológicos desta dissimulação. Passa-se a idéia de que os países, regiões e grupos sociais pobres, assim o são, porque investem pouco em educação. Mas como investir mais em educação se são países, regiões e grupos sociais pobres? É historicamente mais sustentável afirmar que esta condição os impede de investir em educação por terem sido expropriados de diferentes formas. Neste contexto, irônico e cínico, aqueles que são vítimas da exploração, espoliação e alienação passam a ser culpados por serem explorados5.

Autonomia ou adaptação: a “nova” identidade do trabalhador No contexto de acumulação flexível do capital, a autonomia do trabalhador pode ser analisada sob dois ângulos. Pelo primeiro, a autonomia que se exerce no interior de uma organização de trabalho manifesta-se na capacidade de responder positivamente aos eventos que ocorrem durante o processo de trabalho. Pelo segundo ângulo, a autonomia é vista como uma condição que permite ao indivíduo mudar de emprego numa mesma empresa ou de uma empresa para outra ou mesmo de um setor de atividade para outro. Como diz Koch (1999), já que a realidade faz com que as pessoas sejam provavelmente levadas a mudar de emprego ou de profissão ao curso de sua vida ativa, elas passam a ter obrigação de se preparar para isso e de gerir sua vida profissional. Desenvolver esse tipo de autonomia é o mesmo que desenvolver sua empregabilidade, mediante a atualização permanente de suas competências. A autonomia deve ser analisada, ainda, em face do trabalho coletivo. Para as empresas, a autonomia das equipes de trabalho muitas vezes permite o deslocamento dos problemas de produção para essas mesmas equipes, acreditando-se que elas sejam a melhor instância para a produção de soluções. Ao se conferir autonomia às equipes, as competências individuais podem ser explicitadas e apropriadas, primeiramente, pelos colegas, posteriormente, pela empresa. Portanto, a autonomia de equipe permite que se desenvolvam competências coletivas independentemente da presença das pessoas particulares na organização. Em outras palavras, permite que a empresa se libere das pessoas individualmente, apropriando-se de seus saberes. Assim, conferir autonomia aos 5

Para um aprofundamento deste aspecto, ver o texto "Educação profissional e desenvolvimento" de Frigotto, G, Ciavatta. M. e Ramos, M. (2004).

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A relação entre Educação e Qualificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho

trabalhadores individuais e coletivos pode ser tanto uma estratégia de competitividade das empresas isoladas, como também, uma tentativa de suprimir os antagonismos entre trabalho e capital. Nesse quadro, a competência assume-se como categoria de representação que permite estabelecer uma adequação entre as características do trabalho, suas modalidades de organização e as capacidades individuais dos trabalhadores. Permite, também, adaptar os requisitos dos empregos às exigências novas em termos de profissionalização, sempre com vistas à adaptabilidade do trabalhador, seja internamente na organização ou quando desligado de um emprego formal. Este princípio da adaptabilidade – que requer uma personalidade responsável, comprometida e autônoma, ao lado de posturas flexíveis frente às incertezas – recebe o investimento da empresa, mediante um gerenciamento exercido sobre a personalidade do trabalhador. Isso favorece a interiorização dos valores da empresa e a internalização de seus modos de controle. Esse tipo de gestão é instrumentalizado pela valorização das características psico-cognitivas e sócio-afetivas do indivíduo, em outras palavras, do saber conjugado ao saber-ser. Nesse contexto, a identidade social é deslocada para a empresa à medida que o princípio de pertencimento do trabalhador a empresa prevalece sobre seu pertencimento a uma sociedade e a uma classe. O direito da empresa sobre seus trabalhadores prevalece sobre os direitos sociais e econômicos conferidos pela cidadania. Como diz Gorz (1998), a empresa exige a devoção incondicional e pessoal de cada trabalhador aos seus fins e instrumentaliza suas competências com esse objetivo. Assim, a subjetividade que se destaca nesse processo é o contrário de uma subjetividade livre, pois o mundo vivido está circunscrito pelo sistema de fins e de valores da empresa. Verifica-se, assim, que a gestão por competência pode intensificar a precarização das relações de trabalho, mediante o desenvolvimento de um tipo de autonomia tanto individual quanto coletiva, dirigida ao interior e ao exterior da empresa. Investido dessa autonomia, o trabalhador sente-se parte integrante da empresa e, mediante um sentimento de identidade com a organização, abnega-se de todas as suas competências em prol dos objetivos da empresa. Por outro lado, as condições de trabalho favorecem a aquisição de novas competências intercambiáveis no mercado de trabalho. Este é mais um elemento de compromisso mútuo: a empresa contribui para o desenvolvimento da empregabilidade do trabalhador enquanto este reverte suas competências a favor dela. Muitas vezes, chega-se a fazer uma apologia ao trabalho independente, autônomo e flexível. Este tipo de trabalho não se caracterizaria somente pelo auto-emprego, mas também pela possibilidade de mudar constantemente de emprego por vontade própria. Gorz (op. cit.) diz que esta é a forma mais visível que adota a tendência de abolição do trabalhador assalariado, posto que também incide sobre as relações da empresa com seu pessoal estável. Neste caso, a empresa adota a forma de individualização e de flexibilização dos salários. Sobre isso, Tanguy (1997) salienta que o processo obstinado de individualização preconizado sob modelo da competência, qualquer que seja o método adotado, tem um objetivo certo: tornar socialmente aceitáveis as

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Educação Integral dos Trabalhadores

diferenças salariais. Essa lógica tende a fazer com que se aceitem as diferenças salariais como resultado da propriedade e de ações individuais. As formas de sociabilidade próprias dos empregados também se modificam, caracterizando-se pela rarefação das trocas, formação de clãs rivais e confrontos abertos ou dissimulados6. Alguns aspectos explicam esse fenômeno. Um deles é a polivalência, que responsabiliza cada empregado pelo conjunto das tarefas que concernem a um processo, reduzindo suas oportunidades de recorrer aos outros e de colaborar com a equipe. Um outro aspecto é que a possibilidade de ascender a tarefas mais complexas e a processos mais difíceis depende tanto do interesse pelo trabalho quanto da eventualidade de um reconhecimento da competência, fato que se apresenta numa relação profundamente individualizada. A distribuição do trabalho torna-se assim conflituosa, pois os empregados se confrontam com estratégias individuais ou de grupos que, ao mesmo tempo, têm como objeto a divisão do trabalho e os critérios de promoção. Além disso, tornando-se ator da mudança, o empregado pode ser levado a fazer proposições que vão ao encontro daquilo que os outros membros da equipe consideram como de seu interesse. Assim, o coletivo que, nas organizações tayloristas era uma amálgama de indivíduos intercambiáveis e interdependentes, torna-se uma soma de indivíduos independentes, diferenciados, concorrentes e às vezes potencialmente antagônicos. As direções de empresas adquirem, então, margens de negociação infinitamente vantajosas em relação aos sindicatos e às organizações de classe. Substituindo a negociação coletiva pela negociação individual e os salários convencionais por remunerações individualizadas, os trabalhadores deixam de ser os membros de uma coletividade ou de uma profissão definidos por seu estatuto público, para se tornarem provedores particulares de serviços particulares em condições também particulares. Na visão de Castel (1998), é a própria estrutura da relação salarial que está ameaçada num contexto em que se modifica o próprio conceito de sociedade e o sentido das questões sociais. A relação formação-emprego fica, assim, tensionada, já que a formação pressupõe o potencial do indivíduo para fazer evoluir seus postos a mais autonomia e complexidade, o que acaba por incutir nele o sentimento de responsabilidade pela eventual exclusão que resulta de seu fracasso. A lógica da competência, destinando ficticiamente aos homens um papel que lhes é por outro lado recusado, contribui para disfarçar a seus olhos as relações de poder vivenciadas no trabalho e fora dele] (Dugué, 1998). 6

É importante destacar que a competitividade entre trabalhadores nas organizações empresariais não é algo fundado exclusivamente pela noção de competência. As relações de trabalho tecidas sob a égide do conceito de qualificação, comportam também certa competitividade entre trabalhadores e entre grupos no interior da produção. Entretanto, sob o prisma da relação contratual, a regulação pelo conceito de qualificação asseguravalhes direitos conquistados pela categoria que se aplicavam indistintamente aos indivíduos que a compunham. Sob a égide da competência, essa relação contratual é estritamente individual, tornando naturais as relações de competitividade entre os trabalhadores como aspectos que fazem parte do jogo do livre mercado.

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A relação entre Educação e Qualificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho

Conceituando as categorias relacionadas à preparação da força de trabalho A questão sobre a formação do homem em sua totalidade, perante o modo de produção capitalista, é central para a compreensão das relações sociais e sua possível transformação. Com a complexificação do trabalho industrial, esse tema passou a atravessar os debates sobre educação, confundindo-se, em certa medida, com o problema da qualificação – de um lado, como“qualificação humana”, de outro, como“qualificação profissional”. Essa confusão não é aleatória, antes se relaciona a forma como a humanidade se amolda social e culturalmente perante a forma que adquirem os processos de produção, considerados os processos de trabalho e as relações de produção. Como o fundamento da produção capitalista é a propriedade privada e a sua ética é o lucro, as ações que visam a conformação sociocultural do homem adquirem uma dimensão muito mais economicista, no sentido de promover sua adaptação à produção social da existência sob os moldes capitalistas e, portanto, de desenvolver capacidades que possibilitem a venda da força de trabalho e sua equivalente reprodução. O homem produz sua existência por meio do trabalho e, por meio deste, entra em contato com a natureza e com outros homens, desenvolvendo relações econômicas e sociais. Assim sendo, analisar formas, processos e perspectivas que a formação humana adquire na sociedade capitalista implica investigar as múltiplas formas que toma o trabalho coletivo e o modo como o homem age e se modifica ao se constituir em parte deste trabalho. A realização dessa tarefa enfrenta desafios drasticamente diferentes, dependendo do ponto de vista do qual se faz a análise, se do capital, se do trabalho. Vimos percebendo que o posicionamento sob o primeiro ponto de vista tem sido firme por parte dos capitalistas. O mesmo, porém, parece não ocorrer por parte da classe trabalhadora e seus intelectuais orgânicos. Esse fato é bem demonstrado por Franco (1998), quando diz que, no processo de ressignificação da formação dos trabalhadores, a formação profissional tem para os empresários um endereço claro: aumentar a produtividade do trabalho, a qualidade e a competitividade dos produtos, gerar riqueza, além de manter o poder de decisão sobre as condições e qualidades das mudanças. Por outro lado, do ponto de vista dos trabalhadores e com respeito às suas necessidades de sobrevivência, parece haver menos clareza quanto às opções concretas de formação profissional e às possibilidades de valorização de sua força de trabalho. A maior ou menor clareza quanto a essas questões varia de acordo com a cultura de organização coletiva, as lutas e o poder de reivindicação e de negociação dos trabalhadores perante a classe empresarial de cada sociedade. Algumas questões precisam ser colocadas, todas elas instigadas pela necessidade de compreender a forma pela qual o indivíduo se constitui ante o modo de produção capitalista. A primeira: como o homem se desenvolve a partir das relações sociais de produção e, portanto, como se encontram ou se desencontram os elementos que atuam no processo de formação humana, cuja categoria central é o trabalho? A segunda: em que medida a classe capitalista e a classe trabalhadora se apropriam desse processo de formação, limitando-o a dimensão de formação para o trabalho e, portanto, aos processos de qualificação profissional, ou ampliando-o a dimensão da formação humana? Por fim, e relacio-

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nada as primeiras: que mudanças estão ocorrendo no mundo do trabalho que ampliam ou reduzem as ações sócio-coletivas no sentido da formação humana? Para organizarmos essas idéias, é preciso, inicialmente, dizer que compreendemos por formação humana o processo de conhecimento e de realização individual que se expressa socialmente e que ultrapassa a dimensão do agir unicamente determinado pela necessidade de subsistência. Aqui, pode-se perceber que não entendemos o indivíduo isolado de suas relações sociais. Marx, nos Manuscritos Econômico-Filosóficos (1978, p. 10), afirma:“o indivíduo é um ser social (...). A vida individual e a vida genérica do homem não são distintas, por mais que, necessariamente, o modo de existência da vida individual seja um modo mais particular ou mais geral da vida genérica”. O processo de formação humana pressupõe o desenvolvimento do indivíduo como particularidade e como generalidade, ou seja, como ser social individual, que reúne em si “o modo de existência subjetivo da sociedade pensada e sentida para si, do mesmo modo que também na efetividade ele existe tanto como intuição e gozo efetivo do modo de existência social, quanto como uma totalidade de exteriorização de vida humana”(ibid.). Desta forma, esse processo visa promover a possibilidade de o homem se desenvolver e se apropriar do seu ser de forma global, de todos os seus sentidos e potencialidades como fonte de gozo e de realização. Sob o modo de produção capitalista, os sentidos humanos foram subjugados à lógica da propriedade privada, que atrela o gozo e a realização à posse dos objetos como capital – valorizáveis e geradores de lucro – ou como meio de subsistência socialmente determinado – destinados a satisfação de necessidades de diversas ordens. Em lugar de todos os sentidos físicos e espirituais apareceu assim à simples alienação de todos esses sentidos, o sentido do ter (ibid.). Igualmente, as potencialidades humanas – físicas, intelectuais e emocionais – foram também alienadas do homem e apropriadas pela classe capitalista como mercadoria força de trabalho. Ou, nas palavras do próprio Marx (ibid., p. 16): [Na propriedade privada] cada indivíduo especula sobre o modo de criar no outro uma nova necessidade para obrigá-lo a um novo sacrifício, para levá-lo a uma dependência, para desviá-lo para uma nova forma de gozo e, com isso, da ruína econômica. Cada qual trata de criar uma força essencial estranha sobre o outro, para encontrar assim satisfação para seu próprio carecimento egoísta. Com a massa de objetos cresce, pois, o reino dos seres alheios aos quais o homem está submetido e cada novo produto é uma nova potência do engano recíproco e da pilhagem recíproca. O homem torna-se cada vez mais pobre enquanto homem, precisa cada vez mais do dinheiro para apossar-se do ser inimigo, e o poder do seu dinheiro diminui em relação inversa à massa da produção: isto é, seu carecimento cresce quando o poder do dinheiro aumenta (...). A quantidade de dinheiro torna-se cada vez mais sua única propriedade dotada de poder.

Sendo assim, os processos sociais de formação humana sob o modo de produção capitalista são a relação dialética de subsunção do homem ao capital e a luta contra essa mesma subsunção. Essa dialética é expressão da objetivação da essência humana, que se realiza pelo trabalho na sua dimensão concreta e abstrata, quando o homem tanto se reconhece como sujeito, como pode se perder no seu próprio objeto. O homem só não se perde em seu objeto quando este se configurar como objeto humano ou homem objetivado. E isso somente será possível quando se lhe configurar como objeto social e quando ele mesmo se configurar como ser social, assim como a sociedade se configurará

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nesse objeto como ser para ele. Assim, enquanto, de um lado, para o homem em sociedade a efetividade objetiva se configura em geral como efetividade das forças essenciais humanas, como efetividade humana e por isso como efetividade de suas próprias forças essenciais, todos os objetos se lhe apresentarão como objetivação de si próprio, como objetos que confirmam e efetivam sua individualidade, como seus objetos, isto é, o objeto vem a ser ele mesmo. (ibid., p. 12).

Isso quer dizer que nos processos de produção estão em jogo tanto as forças subjetivas do indivíduo, potencialmente capazes de produzir sua própria existência, desde que liberado do julgo capitalista, como as forças objetivas estranhas a ele, determinadas pelo movimento constante de valorização do capital, que promove a separação entre esse mesmo indivíduo e o produto de seu trabalho. De forma simples, o fundamento dessa dialética é o sentido que toma a relação sujeito – objeto: o homem se objetiva para ele ou para o capital. Enquanto se objetiva para o capital, sua subjetividade é apropriada pelo capital e o homem se estranha a si mesmo, não se reconhece como sujeito. A formação humana é expressa, portanto, pelas formas históricas que adquire essa luta, na qual atua um conjunto de sujeitos coletivos, representantes das classes fundamentais – burguesia e trabalhadores –, cada qual com o objetivo de configurá-la, respectivamente, sob a ótica do capital e sob a ótica do trabalho. Essa luta é orientada segundo as categorias básicas das relações sociais de produção – a divisão social e o nível de complexificação do trabalho. Estas, em conseqüência, orientam também a organização das estruturas sociais responsáveis por concretizar as ações destinadas a realizar essa formação, segundo aquelas óticas, sempre em contradição entre si. Essas ações, que são organizadas no plano da sociedade civil, compostas pelos diversos sujeitos coletivos, efetivam-se segundo a ética de sociabilidade capitalista predominante nas fases históricas do capitalismo, com vistas à conquista de hegemonia de uma determinada classe. Historicamente, a escola foi legitimada para desempenhar formalmente esse papel. Não obstante, o homem aprende também pelas experiências de trabalho, pela relação que se estabelece com a realidade material e com os outros homens. Essas experiências não se isolam umas das outras, antes compõem a cultura social segundo os padrões ético- políticos que predominam ou tendem a predominar numa dada organização societária. Não obstante, o foco a ser posto no trabalho e na educação se justifica porque justamente a partir deles a formação humana, como processo contraditório, é marcada pelos valores capitalistas. Esse processo, a medida que se institucionaliza, forja categorias apropriadas para defini-lo socialmente: educação regular, formação profissional, educação profissional, qualificação profissional7. Da mesma forma, novas instituições vão sendo criadas, cada qual destinada a realizar uma ou mais de uma dessas ações, de forma desagregada e pontual, expressão também da forma como passam a se constituir os processos de formação humana. Devido a isso, é importante colocar ordem nas 7

Motivada pelo uso inflacionado desses termos ao se tratar da preparação da força de trabalho e, principalmente, por verificar a substituição gradual do termo “formação profissional” por “educação profissional”, Franco (op. cit.) escreveu um artigo que busca “pensar além da semântica”, discutindo as novas formas que assumem o processo de aquisição e utilização do conhecimento, em que a contextualização parece ser o eixo fundamental.

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idéias, dando significado a cada uma dessas categorias e selecionando aquelas que podem estar expressando os recortes concretos que contribuem para a formação humana, seja na ótica do capital ou na ótica do trabalho. A educação regular, entendida como aquela que se desenvolve por meio da instituição escolar, consolidou-se como categoria do pensamento liberal, pelo menos enquanto direito formal dos povos, ainda que ela não tenha sido historicamente universalizada e assegurada a todos os indivíduos. Concebida a educação como forma de socializar os indivíduos segundo valores e padrões culturais e ético-morais de uma determinada sociedade e meio de socializar de forma sistemática os conhecimentos científicos construídos pela humanidade e definidos como universais pelas classes dominantes, o direito a ela consta como condição necessária para o exercício da cidadania, de acordo com os princípios liberais. Adquirindo uma característica social, o ensino, que durante a aristocracia se realizava particularmente no seio das próprias famílias, passa a contar com espaços coletivos: as escolas. A gênese histórica da escola, como espaço institucional de realização dos fins acima mencionados, se dá, portanto, ao longo do século XVIII e coincide com o advento da Ciência Moderna e do Estado Moderno. Neste período, a sociedade está se produzindo por meio da cooperação e da manufatura e necessita de um novo saber e de uma nova educação. A educação das populações é condição necessária para laicizar o saber, a moral e a política, separando nitidamente fé e razão, natureza e religião, política e igreja. Pautando-se pela igualdade natural entre os homens, o discurso pedagógico burguês é de uma educação de base para todos formadora do cidadão. A pedagogia moderna se origina da totalidade de questões políticas centradas no Iluminismo, que giram em torno da origem do poder, de sua legitimidade, das formas de governo, da soberania do Estado e do povo, da participação e da cidadania. A educação moderna8 vai se configurando baseada nos novos confrontos sociais e políticos, ora como um dos instrumentos de conquista da liberdade, da participação e da cidadania, ora como um dos mecanismos para controlar e dosar os graus de liberdade, de civilização, de racionalidade e de submissão suportáveis pelas novas formas de produção industrial e pelas novas relações sociais entre os homens. Em outras palavras, desde o século XVIII, ela se insere no plano de luta hegemônica, devido a sua dimensão socializadora e de formação de consciências que prevalece inicialmente, já que a consolidação da cidadania é o seu mote principal. Porém, no projeto da classe burguesa ascendente, essa cidadania é muito mais de caráter formal e delimitada ao direito de propriedade privada e à liberdade. Aos não-proprietários cabia uma cidadania de segunda ordem: enquanto cidadãos passivos, teriam direito à proteção de sua pessoa, de sua liberdade e de sua crença, não sendo qualificados como membros ativos do Estado. Filosoficamente, a caracterização do papel social da educação ao final do século XVIII e no século XIX percorrerá, de um lado, o humanismo e o racionalismo ilustrado – o que reforçará a crença na educação como precondição para a participação política do homem comum – e, de outro, o pensamento da economia política, que defenderá a educação da gente comum, dos trabalhadores, como mecanismo de libertação dos obstáculos 8

A análise a seguir baseia-se em Arroyo (1993).

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que se poderiam opor à marcha inexorável do progresso econômico. O pensamento iluminista entendia as diferenças sociais como diferenças de capacidades, resultando daí que a tarefa central seria libertar o homem de si mesmo, tarefa eminentemente pedagógica. O racionalismo ilustrado, por sua vez, reforçava a centralidade da educação e da racionalidade como condição do homem histórico e político. Por outro lado, dificilmente a burguesia poderia manter uma visão da história fundada na evolução do espírito humano ou uma concepção política que mantivesse a ilustração dos homens, enquanto instrumento de modificação de uma consciência que poderia modificar o mundo ou construir uma nova ordem. A burguesia não poderia ignorar a conexão entre os planos social, político e econômico para equacioná-los devidamente a seu favor e construir a ordem capitalista. Os ilustrados perceberam as mudanças políticas e econômicas da revolução burguesa, mas não souberam entender o nexo que existia entre revolução e progresso, e tentaram alcançar os mesmos resultados por meio de um programa de reformas compatível com a ordem social vigente. Se os ilustrados no início propunham modificar a ordem social e política atuando sobre a consciência e a instrução, posteriormente avançam na convicção de que o fundamental estava na reforma política. O projeto burguês passa pela transformação da propriedade, pela libertação das forças produtivas e pelo estabelecimento de formas de organizações sociais e políticas capazes de banir quaisquer entrave ao progresso econômico. A medida que se vai consolidando o capitalismo, aumenta a combatividade popular que se reflete na instabilidade social. A repressão não bastava. Era necessária uma visão nova da realidade que mostrasse que o progresso era para todos. As teorias da economia política refletiram a interpretação da nova realidade e estiveram mais próximas do projeto burguês do que o racionalismo ilustrado, tanto que Adam Smith, em A Riqueza das Nações, expõe seu pensamento sobre educação, ao tratar dos gastos do Estado. Justifica a necessidade de educação em função da divisão parcelar do trabalho: seria conveniente que o Estado facilitasse, encorajasse e até mesmo impusesse a quase toda a população a necessidade de aprender os pontos mais essenciais da educação: ler, escrever, contar e rudimentos de geometria e mecânica. Assim, a educação dos trabalhadores pobres teria por função discipliná-los para a produção, proporcionando para a maioria da população somente o mínimo necessário para fazer do trabalhador um cidadão passivo que, apesar de tudo, tenha alguns poucos direitos (ibid.). Observamos, então, que o projeto burguês de educação, desde o final do século XVIII, já é fortemente marcado pela concepção de educação para as massas como fator de racionalização da vida econômica, da produção, do tempo e do ritmo do corpo. Em outras palavras, a educação do trabalhador, no projeto burguês, é subsumida à necessidade do capital de reproduzir a força de trabalho como mercadoria. A dimensão relativa à constituição da classe trabalhadora como sujeito de direitos sociais e políticos fica demarcada nos limites da ordem burguesa. A educação de caráter geral, clássico e científico, destinase a formação das elites dirigentes. É preciso ressaltar, porém, que essa dualidade não atravessa a história de forma linear e sem contradições. Ao contrário, a educação é pensada em relação a cidadania, participação e liberdade no momento em que as massas tinham

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de ser constituídas como trabalhadores disponíveis, livres para o mercado, e os súditos tinham de ser feitos cidadãos livres para a participação na cidade, no novo convívio social. A construção da moderna utopia social e política passou a ser impensável sem a educação, mesmo que esta tivesse que receber as determinações econômicas que passam a predominar a partir do século XX. Quais processos educativos formais se destinam, então, aos trabalhadores? Se analisarmos do ponto de vista da base técnica do trabalho que passa a comandar o processo produtivo na grande indústria e que levou o trabalho à sua máxima parcialização e simplificação, a educação escolar não seria imediatamente necessária, já que as tarefas podiam ser rapidamente aprendidas no próprio posto de trabalho. Ao trabalhador que efetivamente operava as máquinas, adicionavam-se seus ajudantes, na sua maioria, crianças9. É a perspectiva de estas últimas virem a serem os futuros trabalhadores adultos que incita a instalação de escolas destinadas menos ao ensinamento das técnicas de trabalho do que a adaptar essas crianças à rotina e ao ritmo de trabalho com disciplina e docilidade. São as workhouses, que se convertem em Schools of Industry ou Colleges of Labour, surgidas primordialmente na Inglaterra, no século XVIII, que introduzem na cultura ocidental a prática da “formação para o trabalho”(Enguita, 1989). O ideário iluminista, que via na educação a possibilidade de libertação do povo das paixões bestiais e a elevação do homem à condição de cidadão político, diminuía de importância para a classe trabalhadora. Como explica Enguita (ibid.), os projetos de lei que pretendiam assegurar um mínimo de instrução literária às crianças das classes populares foram sistematicamente rejeitados, durante parte do século XIX, não só na Inglaterra, que já dispunha de um certo arsenal industrial, como também na França, berço da ilustração. Isso é interessantemente captado na seguinte citação que faz Enguita, ao demonstrar a concordância que tinham entre si alguns filósofos franceses, como Destutt de Tracy, La Chalotais e mesmo Voltaire, que reprovavam que: (...) ensinassem a ler e a escrever pessoas que não necessitavam mais que aprender a desenhar e a manejar o buril e a serra, mas que não querem continuar fazendo-o (...). O bem da sociedade exige que os conhecimentos do povo não se estendam além de suas ocupações. (Charlot e Figeat, 1985, p. 84, apud Enguita, ibid.., p. 111).

O avanço das relações capitalistas de produção, no entanto, obrigou a relativizar-se esse cerceamento, já que a proliferação da indústria iria exigir um novo tipo de trabalhador. Já não bastaria que fosse piedoso e resignado (qualidades desenvolvidas pela religião), embora isto continuasse sendo necessário. Era preciso também aceitar trabalhar para outro e fazêlo nas condições que este outro lhe impusesse. Enguita (ibid.) explica que a educação, desde a infância, oferecia a vantagem de poder modelar as crianças (os adultos das gerações seguintes) desde cedo, de acordo com as necessidades da nova ordem capitalista e industrial, as novas relações de produção e os novos processos de trabalho. Não obstante, a preparação para o trabalho, ao longo do tempo, não se esgota no simples doutrinamento e disciplinamento. Destaque-se que a expansão dos mercados, a 9

Nogueira (1990), nos cinco primeiros capítulos de seu livro, analisa a exploração e a regulação do trabalho infantil na sociedade industrial emergente.

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formação dos Estados Nacionais, que reuniram os povos dentro de fronteiras, sob um poder e algumas leis comuns e por meio de uma só língua, e que fizeram emergir levas de imigrantes a alguns países; a extensa migração cidade-campo e outros tantos fatores criavam massas de indivíduos que precisavam vender sua força de trabalho no mercado que, aos poucos, já apresentava alguma retração. A sociedade burguesa passa a investir na criação do exército industrial de reserva. Ao mesmo tempo, a tendência de universalização de um conjunto de técnicas básicas entre indústrias de ramos diferentes foi gerando na população a necessidade de dominar uma certa quantidade de conhecimentos e destrezas para se desenvolver em qualquer trabalho ou fora dele, em uma sociedade que se industrializava e se urbanizava. A aprendizagem, portanto, já não podia ocorrer diretamente ou, pelo menos, exclusivamente, no próprio local de trabalho, voltando-se às escolas que, aos poucos, passa a assumir o papel não só de socialização, mas também de transmissão do saber técnico, que, para os trabalhadores, se restringiria ao suficiente para o desempenho no posto de trabalho. As técnicas que compõem um processo produtivo, relacionando conhecimentos e destrezas necessárias para pô-lo em prática, a medida que se aprimoraram, condensaramse em alguns ofícios parciais desse mesmo processo, que, como sinalizamos acima, passaram a se constituir como básicos mesmo em indústrias de ramos diferentes. Um novo tipo de saber, menos especializado do ponto de vista da produção completa do produto, como no caso do artesanato ou mesmo da manufatura, mas suficiente para garantir ao trabalhador alguma mobilidade entre as diferentes indústrias e mesmo no interior delas, vai-se constituindo e adquire, aos poucos, um caráter de profissão, relacionado ao domínio de um ofício. Isso, além de tudo, permitia aos empregadores estabelecer parâmetros mínimos para a definição do perfil do trabalhador necessário na produção. Assim sendo, o ensino levado a cabo pelas escolas destinadas a formar trabalhadores já não visaria somente o disciplinamento, mas seria aquele capaz de conferir ao trabalhador o domínio de um ofício. A formação para o trabalho passa a significar formação profissional. A emergência das profissões modernas se constitui, então, em conseqüência e mesmo em referência tanto da divisão fabril como da divisão social do trabalho. Não é nossa intenção aqui discutir seus fundamentos, mas percebemos que as profissões passam a compor a divisão fabril e social do trabalho em termos horizontais (quantidades equivalentes de conhecimentos e destrezas de qualidades diferentes) e em termos verticais (quantidades diferentes de conhecimentos e destrezas de qualidades também diferentes), de acordo com as classes sociais a que se destinam – operários fabris ou técnicos, engenheiros, cientistas, e assim por diante. Esse é o ápice da divisão entre trabalho manual e intelectual10 que se verifica tanto na sociedade como no interior da fábrica. Do ponto de vista das profissões, essas passam a ser classificadas de acordo com o seu nível de complexidade, implicando a construção da hierarquia social, que, por sua vez, se relaciona 10

A divisão entre trabalho intelectual e trabalho deve ser sempre relativizada, uma vez que o trabalho manual, por mais repetitivo que seja, não prescinde absolutamente de algum nível de intelectualidade e, muitas vezes, ao trabalho intelectual também está associado algum nível de trabalho manual. A questão, portanto, deve ser analisada mais em termos da quantidade e da qualidade de conhecimentos que são postos em jogo na realização do trabalho, o que, por sua vez, interfere na classificação profissional e social.

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com o nível de escolaridade necessário para o desenvolvimento de cada uma delas. O interessante de observar é que, mesmo considerando as profissões nos seus diversos níveis de complexidade, de sofisticação e de hierarquia, desde as mais simples e rudimentares, até aquelas que requerem um elevado patamar de escolaridade e, portanto, de conhecimento técnico-científico, a categoria formação profissional se identificou com o trabalho simples e se afastou do trabalho complexo. No Brasil, a Lei no 9.394/96, que ampliou o conceito de educação para além da escolar, institucionalizou a formação profissional como modalidade educacional, independentemente do nível de ensino ou de se realizar em escolas ou instituições especializadas, passando a utilizar a terminologia educação profissional no lugar de formação. O adjetivo profissional, aplicado ao nível médio de ensino, gerou, ainda, uma nova figura: o técnico de nível médio11, categoria que se interpôs entre o operário e os profissionais de nível superior. No Brasil, o ensino técnico, desde a LDB de 1961, ocorreu no interior do sistema escolar, nas Escolas Técnicas, de forma integrada ao nível médio de ensino (que já recebeu a denominação de secundário, 2º grau e, com a Lei no 9.394/96, voltou a se chamar nível médio). A dualidade desse grau de ensino, quando se consolidou a equivalência entre o ensino propedêutico e o técnico, não é de ordem formal, mas social, na medida em que ele se destinou às classes subalternas, que, privadas de uma perspectiva de longos anos de escolaridade, a ele se dirigiam em busca da possibilidade de inserção no mercado de trabalho mais precocemente. A partir dos anos 90, como resposta às transformações que se vieram processando no mundo do trabalho, esse nível e modalidade de ensino estão passando por uma reforma, consolidada pela Lei no 9394/96 e legislações correlatas. As classificações dos processos de preparação da força de trabalho parecem ter sido características do modelo taylorista-fordista de organização da produção no que se refere ao modo de organizar o ensino, seja por via formal e escolar (pela qual se deu, principalmente, a formação do técnico), seja por ações diretas das empresas realizadas normalmente por seus Centros de Formação (onde se deu a formação dos operários qualificados). Tendo em vista o modo de organização do ensino, em face do modo de organização do trabalho, a categoria qualificação parece ter tomado vários sentidos. O uso mais corrente do termo qualificação se relacionou aos métodos de análise 11

Machado (1989), no livro Educação e Divisão Social do Trabalho, analisa o significado histórico do surgimento do técnico industrial. No estágio de acumulação flexível do capital, caberia verificar se esse tipo de trabalhador ainda cumpre um papel relevante na divisão do trabalho e na manutenção da hegemonia do capital. Com a emergência do trabalhador polivalente, pressuponho que há transformações significativas quanto à hierarquização em três níveis gerais de trabalhadores (operários, técnicos e engenheiros), com a gradual retração dessa camada intermediária. Coerentemente com a análise que fazemos em relação aos efeitos da reforma da educação profissional no Brasil, considero que esse nível intermediário tenderá a ser ocupado por um número muito reduzido de profissionais mais qualificados que os atuais técnicos de nível médio – os técnicos de nível superior ou tecnólogos. A formação outrora destinada aos técnicos de nível médio tende a se realizar de forma mais flexível e rápida, conferindo aos trabalhadores qualificações parciais ou unidades específicas de competências (através de cursos modulares), originando os operários polivalentes. Aos tecnólogos tende a ser destinada uma formação relativamente mais estruturada, porém de caráter eminentemente prático. É também com base nessa percepção que levanto a hipótese de que a dualidade estrutural da educação eleva-se, sob o patamar mais complexo de racionalidade técnica, aos níveis superiores de formação.

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ocupacional, que visavam identificar as características do posto de trabalho e delas inferir o perfil ocupacional do trabalhador apto a ocupá-lo. Em outras palavras, procurava-se identificar que tipo de qualificação deveria ter o trabalhador para ser admitido num determinado emprego. Desta forma, o termo “qualificação” se relacionou tanto ao processo quanto ao produto da formação profissional, quando visto pela ótica da preparação da força de trabalho. Neste sentido, um trabalhador desqualificado poderia vir a ser qualificado para desempenhar determinadas funções requeridas pelo posto de trabalho por meio de cursos de formação profissional. Por outro lado, visto pela ótica do posto de trabalho, o termo “qualificação” se relacionou ao nível de saber acumulado expresso pelo conjunto de tarefas a serem executadas quando o trabalhador viesse a ocupar aquele posto. Essa abordagem contribuiu para a formulação dos códigos das profissões e para sua classificação no plano da hierarquia social. A associação do termo qualificação aos processos de trabalho e ao desenvolvimento do saber profissional e social do trabalhador sob o modo de produção capitalista, considerando a relação pedagógica que se estabelece pelo uso dos meios de produção e pelo contato com outros trabalhadores na objetivação do trabalho abstrato, ocorreu a medida que se buscou verificar a tendência a ser tomada pelo trabalho não só quanto à complexidade/simplicidade, como também aos efeitos sobre o trabalhador na sua totalidade (força de trabalho e ser humano). Sob essa perspectiva, à qualificação do trabalho se associava o potencial das relações técnicas e sociais de elevar o conhecimento do trabalhador, tanto de ordem explícita como tácita. Dessas análises emergiram as teses da qualificação e desqualificação do trabalho e a da polarização das qualificações. Esta última foi uma variante consagrada, durante um longo período de tempo, do debate aberto por Braverman (1976), no início dos anos 70, em torno da desqualificação inelutável, gradual, progressiva, como conseqüência do aprofundamento da divisão do trabalho no capitalismo. Segundo a tese da polarização das qualificações, a modernização tecnológica estaria criando, de um lado, uma massa de trabalhadores qualificados e, de outro, uma massa de trabalhadores desqualificados (Hirata, 1994). Hirata12 (ibid.) explica que a qualificação se consolidou como um conceito-chave da sociologia do trabalho, cuja multidimensionalidade é ressaltada por autores como D. Kergoat (1982, 1984) e M. Freyssenet (1977, 1992). Segundo esses autores, são as seguintes as dimensões do conceito de qualificação: qualificação do emprego, definida pela empresa a partir das exigências do posto de trabalho; qualificação do trabalhador, mais ampla do que a primeira, por incorporar as qualificações sociais ou tácitas que a noção de qualificação do emprego não considera – essa dimensão, por sua vez, é suscetível de decomposição em qualificação real (conjunto de competências e habilidades técnicas, profissionais, escolares e sociais) e qualificação operatória (“potencialidades empregadas por um operador para enfrentar uma situação de trabalho”, cf. M. Sailly in a. Lerolle, 1992, p. 7, apud Hirata, op. cit.); finalmente a dimensão da qualificação como relação social, como resultado, sempre cambiante, de uma relação de forças capital-trabalho, 12

Ainda que a pesquisadora refira-se especialmente à sociologia do trabalho francesa, parece-nos que a multidimensionalidade a que se refere incide sobre o conceito, podendo ser sociologicamente generalizada.

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noção que resulta da própria distinção entre qualificação dos empregos e qualificação dos trabalhadores (cf. D. Kergoat, 1984, p. 27, op. cit.) Sob o referencial taylorista-fordista da produção, a convivência dessas múltiplas dimensões do conceito de qualificação não esteve livre de contradições. Isso porque, do ponto de vista do capital, há a tentativa constante de mantê-lo circunscrito às normas instituídas de produção de valor e acumulação do capital. Entretanto, na medida em que o trabalhador se educa também pelas relações sociais, a própria ação laborativa e a participação no processo de trabalho acabam por ampliar seus saberes. Por outro lado, é na dimensão relacional da qualificação que se potencializa o acirramento da correlação de forças entre capital e trabalho, tornado estratégico na luta pela emancipação dos trabalhadores. Portanto, ao se falar de qualificação profissional há de se considerar a multidimensionalidade do conceito aqui comentado e quais as tendências que tende a tomar o trabalho frente à nova materialidade produtiva. As transformações produtivas passaram a colocar limites a simples estratégia de racionalização dos processos de trabalho, simplificação das tarefas produtivas e fragmentação organizacional, características do taylorismo-fordismo. Em vez da parcialização das tarefas, a automação integrada e flexível exige dos trabalhadores a função de gerir sua variabilidade, tornando inadequada a formação rápida e específica. Dos trabalhadores, passa-se a requerer a capacidade de elaborar uma representação mental do que está ocorrendo em toda a extensão do processo, a partir da qual as ações operatórias são definidas e executadas. Atributos como pensamento abstrato, capacidade de se comunicar, organizar-se em equipes, liderar, tomar decisões e outros são destacados. Em outras palavras, parece haver uma valorização da subjetividade e do saber tácito do trabalhador, destacando-se a qualificação real em comparação à qualificação formal. Assim, a preparação da força de trabalho parece requerer conhecimentos de caráter globalizante, de modo que a formação profissional tende a ser ineficaz sem uma sólida educação básica13. Vinte anos depois dos primeiros estudos sobre as conseqüências da introdução das novas tecnologias na divisão do trabalho e na qualificação, autores como M. Freyssenet (1992), B. Coriat (1992), H. Kern & M. Schumann (1989) constatam a requalificação dos operadores, ou uma reprofissionalização, com o aprofundamento da automatização de base microeletrônica nas indústrias. Essa requalificação estaria relacionada à adoção dos novos modelos de organização industrial que levariam as empresas a adotarem organizações do trabalho qualificantes. Os novos paradigmas da produção exigiriam uma massa de conhecimentos e atitudes bastante diferentes das qualificações formais requeridas pelas organizações de trabalho de tipo taylorista-fordista. Essa discussão, porém, não se esgota nesse ponto, uma vez que a alteração qualitativa na forma de ser do trabalho, de um lado, impulsiona para uma maior qualificação e, de outro, para uma desqualificação. O primeiro movimento resulta da redução da dimensão variável do capital, em decorrência do crescimento da sua dimensão constante, que, em outras palavras, se resume na substituição do trabalho vivo pelo trabalho morto, 13

É possível que, para além de uma variação semântica, este seja um dos motivos de se verificar um uso mais freqüente da categoria educação profissional em lugar de formação.

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A relação entre Educação e Qualificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho

oferecendo a possibilidade de o trabalhador se aproximar do que Marx chamou de“supervisor e regulador do processo de produção”(Antunes, 1995, p. 47). Em contraposição a esse movimento, Antunes (ibid.) demonstra que, paralelamente a essa tendência, se dá a desqualificação de inúmeros setores operários, atingidos por uma diversidade de transformações que levaram, de um lado, à desespecialização do operário industrial oriundo do fordismo e, de outro, a massa de trabalhadores que oscila entre os temporários (que não têm nenhuma garantia de emprego), os parciais (integrados precariamente às empresas) e os subcontratados. Esses são os trabalhadores da economia informal que envolve cerca de 50% da população trabalhadora dos países avançados. A referida desespecialização dos operários profissionais, em decorrência da criação dos trabalhadores multifuncionais, introduzidos pelos novos paradigmas de produção e de organização do trabalho, também significou um ataque ao saber profissional dos operários qualificados, a fim de diminuir seu poder sobre a produção e aumentar a intensidade do trabalho.“Os trabalhadores qualificados enfrentaram esse movimento de desespecialização como um ataque à sua profissão e qualificação, bem como ao poder de negociação que a qualificação lhes conferia, realizando inclusive greves contra essa tendência” (Coriat, 1992, apud Antunes, ibid, p. 53). Esse processo, segundo Freyssenet (1989, apud Antunes, ibid, p. 54), mostra que, enquanto se visualiza uma tendência para a qualificação do trabalho, se desenvolve também intensamente um nítido processo de desqualificação dos trabalhadores, que acaba configurando um processo contraditório “que superqualifica em vários ramos produtivos e desqualifica em outros". Nas palavras de Mészáros (1989, apud Antunes, ibid.): Pode-se constatar, portanto, de um lado, um efetivo processo de intelectualização do trabalho manual. De outro, e em sentido radicalmente inverso, uma desqualificação e mesmo subproletarização intensificadas, presentes no trabalho precário, informal, temporário, parcial, subcontratado etc. Se é possível dizer que a primeira tendência – a intelectualização do trabalho manual – é, em tese, mais coerente e compatível com o enorme avanço tecnológico, a segunda – a desqualificação – mostra-se também plenamente sintonizada com o modo de produção capitalista, em sua lógica destrutiva e com sua taxa de uso decrescente de bens e serviços.

Mesmo estando vivo o debate em torno da dimensão qualificante, desqualificante ou requalificante do trabalho e do trabalhador, não se pode negar que a divisão do trabalho se processa, nesse final de século, de forma sofisticada e contraditória. O que permanece estruturalmente inalterado nesse contexto, porém, é a manutenção da distinção fundamental na forma de conceber a educação das classes trabalhadoras, se na dimensão civil-democrática – ótica do trabalho – se na dimensão funcionalista-produtivista – ótica do capital. A perspectiva, no entanto, de que os novos paradigmas produtivos estariam tornando o trabalho mais qualificante, provocando um novo movimento determinante da preparação, inserção e manutenção da força de trabalho – a requalificação e a reprofissionalização – abriria para os trabalhadores novos horizontes da luta contra hegemônica, possibilitando a (re) apropriação do saber pelo trabalhador e ao mesmo tempo que potencializando a reapropriação de sua subjetividade e a construção emancipatória da classe. Esse fato, do ponto de vista educativo, encaminharia a reconstrução da educação

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Educação Integral dos Trabalhadores

em geral e da escola em particular como processo de formação da cidadania, tendo em vista o exercício de direitos e obrigações típicos da democracia. A recuperação do grande propósito da educação implicaria proporcionar ao filho das classes trabalhadoras a consciência e, em conseqüência, a motivação (além de instrumentos intelectuais), que lhe permitiria o engajamento em movimentos coletivos, visando tornar a sociedade mais livre e igualitária. Por essa ótica, a educação escolar cumpriria também muitos outros propósitos, que resultariam na capacidade do indivíduo em se inserir de forma adequada na vida adulta: profissional, familiar, esportiva, artística, e assim por diante. Uma visão, em síntese, não marcada pela contradição entre a formação do cidadão e a formação do profissional, mas que se orientaria para a formação humana. Foi neste contexto que se abriu o espaço para uma possível construção da educação unitária, politécnica ou tecnológica, compreendida como aquela capaz de formar o homem culturalmente e profissionalmente, dissolvendo toda e qualquer separação entre cultura e técnica, formação geral e formação específica, saber teórico e saber prático. A educação unitária desenvolveria todos os potenciais humanos, proporcionando a capacidade de interação autônoma e consciente com a tecnologia. Para o capital, no entanto, a educação do trabalhador se manteve vincada pelo caráter funcionalista-produtivista da educação polivalente, como preparação dos indivíduos para o ingresso na divisão social do trabalho. Sob um novo patamar de racionalidade técnica, a hegemonia das classes empresariais tem motivado a emergência de novas categorias, pretensamente mais adequadas para expressar as demandas requeridas pelos sistemas produtivos sob o modo de produção capitalista visando, inclusive, dissolver a contradição positiva provocada pelas perspectivas de evolução do nível de qualificação profissional dos trabalhadores. Demonstração inequívoca desse movimento é o deslocamento do conceito de qualificação pela noção de competência. É bem verdade que esse deslocamento, num primeiro plano, ocorre em relação a algumas das dimensões da qualificação, provocando a crise do valor dos diplomas e das trajetórias lineares e rígidas de profissionalização. No entanto, como fenômeno não imediatamente visível, o efeito principal deste deslocamento pode vir a ser o esmaecer dos debates e da luta no sentido da formação humana.

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A relação entre Educação e Qualificação Profissional frente às mudanças no mundo do trabalho

Bibliografia ANTUNES, R. Adeus ao trabalho. Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo, Cortez Editora, 1995. ARROYO, M. Educação e cidadania: quem educa o cidadão. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1993. BRAVERMAN, H. Travail et capitalisme monopoliste. Paris: Maspero, 1976. BRASIL. Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. CASTEL, R. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes, 1998. DUGUÉ, E. A gestão das competências: os saberes desvalorizados, o poder ocultado. In: DESAULNIERS, J. Trabalho e Formação e Competências. Porto Alegre: EDPUCRS, PP. 101-132, 1998. ENGUITA, M. A face oculta da escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. FRANCO, M. C. Qualificação, Formação ou Educação Profissional. Contexto & Educação. Ijuí, julho/setembro, 1998. FRIGOTTO, G. Trabalho como princípio educativo; por uma superação das ambigüidades. Boletim Técnico do SENAC, Rio de Janeiro, 11(3):175-192, set./dez. 1985. ______. (Org.) Trabalho e conhecimento, dilemas na educação do trabalhador. São Paulo, Cortez, 1987. ______. A Produtividade da escola improdutiva.SP., Cortez, 1984. ______. Tecnologias, relações sociais e educação. Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, n. 105, abril/junho, 1991. ______. Educação e crise do capitalismo real. São Paulo, Editora Cortez, 2003, 5ª Edição. ______.(Org.) Educação e crise do trabalho: perspectivas de final de século. Rio de Janeiro, Vozes, 1998. FRIGOTTO, G., CIAVATTA, M. e RAMOS, M. A Gênese do decreto N. 5.154/2004: um debate no contexto controverso da democracia restrita, Rio de Janeiro, 2004, mimeo. GORZ, A. Misérias del presente, riqueza de lo possible. Buenos Aires: Paidós, 1998. HIRATA, H. Da polarização das qualificações ao modelo das competências. In: FERRETTI, C. et. alli (org). Tecnologias, Trabalho e Educação: Um debate multidisciplinar. Petrópolis: Vozes, pp. 124-134, 1994. KOCH, P. Enterprise qualificante et enterprise apprenante: concepts et théories soujacentes. In: Educacion Permanente, n. 140, 1999. MACHADO, L. Educação e divisão social do trabalho. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1989. ______. Qualificação do trabalho e relações sociais. In: Gestão do trabalho e formação do trabalhador. Belo Horizonte: MCM, 1996. MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os Pensadores). NOGUEIRA, M. Educação, saber, produção em Marx e Engels. São Paulo: Cortez, 1990. TANGUY, L. Competência e integração social na empresa. In: ROPPÉ, F. e TANGUY, L. Saberes e competências: o uso de tais noções na escola e na empresa. São Paulo: Papirus, pp. 167-200, 1997.

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• Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto• Cristiano dos Reis Souza

A

Educação Profissional Técnica consiste em um importante meio para que, socialmente inseridos, o trabalhador e a trabalhadora possam ter uma consciência das necessidades e circunstâncias de seu tempo. Para um trabalhador com dificuldades para permanecer por longos períodos em processos educativos formais14 , a educação para o trabalho se reveste de caráter ímpar, momento essencial de contato com o mundo do conhecimento. Por outro lado, o aumento da capacidade produtiva desvinculado de uma ampliação da demanda tem gerado um crescente número de desempregados, não apenas no Brasil. Diante disto, o trabalhador tem conhecimento da necessidade de agregar valor à sua força de trabalho por meio de mais habilidades e conhecimentos, seja no intuito de se manter empregado ou alcançar um emprego, a propalada empregabilidade. Mesmo considerando que a Educação Profissional não é garantia efetiva de emprego, sem uma qualificação ou requalificação, as possibilidades de emprego são remotas. Para o presente texto, utilizamos como fonte de dados e informações o Censo Escolar realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - Inep, um estudo comparativo do Inep entre os anos 2003 e 200515, bem como o Censo Escolar de 2006. Utilizamos também o Cadastro Nacional de Cursos Técnicos - CNCT. O órgão é responsável pelo registro e divulgação dos planos de cursos aprovados pelos Conselhos Estaduais de Educação ou pelos órgãos regionais da Secretaria Estadual de Educação. Neste sentido, o diploma de técnico emitido pela instituição de ensino terá validade em todo o território nacional desde que registrado no CNCT. O CNCT disponibiliza em seu sítio na internet os planos de cursos apresentados pelas instituições escolares responsáveis pela execução dos cursos técnicos, base de dados que utilizamos no presente estudo e análises preliminares. É importante ressaltar, desde já, que se trata de uma base de dados imensa, englobando todas as escolas técnicas e cursos do país. Os planos não seguem uma mesma padronização na apresentação das informações, embora todos devam apresentar informações relativas à justificativa, objetivos, modo de ingresso, avaliação, entre outras, e cada entidade o faz da sua maneira e seguindo critérios de organização e planejamento de cada uma. Em outras palavras, dado o tamanho da base de dados, neste texto, limitamo-nos a fazer algumas aferições e comparações preliminares que devem posteriormente ser aprofundadas e debatidas. O presente texto tem por objetivo traçar um panorama da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, suas tendências e modificações nos últimos anos decorrentes do crescimento do desemprego, e pela crescente demanda por uma formação profissional direcionada à recolocação no mercado de trabalho.Visa também, contribuir para Ver FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS, M. O trabalho como princípio educativo no projeto de educação integral de trabalhadores. In: COSTA, H.; CONCEIÇÃO, M. (orgs.) Educação integral e sistema de reconhecimento e certificação educacional e profissional. São Paulo: CUT, 2005. 15 Educação profissional técnica de nível médio no censo escolar. Brasília: Inep/MEC – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2006. 14

Capítulo 2

Panorama da Educação Profissional no Brasil Ensino Médio


Educação Integral dos Trabalhadores

incentivar estudos que analisem as transformações na Educação Profissional Técnica no Brasil e sua interface com o mercado de trabalho, e, sobretudo, que discutam os currículos e os modos de ensino e aprendizagem desenvolvidos nos cursos técnicos profissionalizantes. A Educação Profissional Técnica de Nível Médio está regulamentada pelo Decreto n.º 5.154, de 23 de julho de 2004, que estabeleceu a articulação entre os cursos e programas da Educação Profissional Técnica e o Ensino Médio. Estes são classificados nas modalidades integrada, concomitante e subseqüente. Os cursos concomitantes e subseqüentes são aqueles em que o educando faz matrículas distintas para o Ensino Médio e para a Educação Profissional. Na modalidade integrada, o educando faz uma única matrícula para cursar a Educação Profissional Técnica e o Ensino Médio. O Censo Escolar do Inep16 aponta uma série de transformações no setor em período recente. 1 - ESTABELECIMENTOS E MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DE NÍVEL MÉDIO, 2003 A 2005 Ano

Estabelecimento

2003 2004 2005(*)

2.789 3.047 3.294

Variação % em relação ao ano anterior 9,3 8,1

Matrículas 589.383 676.093 747.892

Variação % em relação ao ano anterior 14,7 10,6

Fonte: MEC/Inep – Censo Escolar - (*) Inclui as três formas de articulação da Educação Profissional Técnica com o Ensino Médio.

No período entre 2003 e 2005, a Educação Profissional Técnica de Nível Médio registrou crescimento tanto nas matrículas quanto nos estabelecimentos escolares. Houve aumento de 18,1% no número de estabelecimentos e de 26,9% no número de matrículas. O Censo Escolar de 2006 apresentou um crescimento do número de matrículas nos cursos de Educação Profissional. Em 2005, o número de matrículas e de estabelecimentos considera as três formas de articulação entre o Ensino Médio e a Educação Profissional Técnica (integrada, concomitante e subseqüente), enquanto as tabelas do Censo Escolar de 2006 registraram apenas as matrículas sob a modalidade concomitante e subseqüente. 2 - NÚMERO DE MATRÍCULAS EM 2005 E 2006 SEGUNDO ETAPAS E MODALIDADES DA EDUCAÇÃO BÁSICA, EM 29/3/2006 Etapas/Modalidades de Educação Básica Total Educação Infantil Creche Pré-escola Ensino Fundamental Ensino Médio EJA Presencial Semipresencial Educação Especial Educação Profissional

2006

2005

55.942.047 7.016.095 1.427.942 5.588.153 33.282.663 8.906.820 5.616.291 4.861.390 754.901 375.488 744.690

56.471.787 7.205.039 1.414.343 5.790.696 33.534.700 9.031.302 5.615.409 4.619.426 996.000 378.074 707.263

Fonte: MEC/INEP. Censo Escolar 2006

16

Fonte:MEC/Inep/DEE – Censo Escolar 2003 a 2005

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Diferença: 2005-2006 -529.740 -188.944 13.599 -202.543 -252.037 -124.482 882 241.964 -241.099 -2.586 37.427

Variação % em relação a 2005 -0,9 -2,7 1,0 -3,6 -0,8 -1,4 0,0 5,0 -31,9 -0,7 5,3


Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

Em 2006, ocorreu aumento de 5,3% no número de matrículas em cursos de Educação Profissional em todo o território nacional. Em números absolutos, foram 37.427 matrículas que demonstram a necessidade e preocupação dos trabalhadores com sua qualificação profissional e com a busca de um posto de trabalho. A Educação de Jovens e Adultos - EJA - também cresceu no período, cerca de 5%. Entretanto, verificou-se diminuição de 1,4% no número de matrículas no Ensino Médio. Em 2005, do total de 3.294 estabelecimentos de ensino de Educação Profissional que atuavam em todo o território nacional, 71,3% eram administrados de maneira privada (particular, confessional, comunitário e filantrópico); 20% eram estaduais; 4,5% federais e 4,2% municipais. Embora os estabelecimentos privados aparecessem em maior quantidade, os estabelecimentos de ensino de caráter administrativo público (federais e estaduais, principalmente) não eram menos importantes em quantidade de absorção da demanda. As escolas de Educação Profissional Técnica de dependência administrativa pública apresentaram proporcionalmente maiores percentuais de matrículas do que as escolas de dependência privada. 3 - ESTABELECIMENTOS POR DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA, 2003 A 2005 – BRASIL Ano 2003 2004 2005(*)

Total 2.789 3.047 3.294

Federal N.º 138 143 147

% 4,9 4,7 4,5

Estadual N.º % 553 19,8 602 19,8 659 20,0

Municipal N.º % 115 4,1 130 4,3 138 4,2

Privada N.º % 1.983 71,1 2.172 71,3 2.350 71,3

Fonte: MEC/Inep/DEE – Censo Escolar 2003 a 2005 (*) Inclui as três modalidades de articulação da Educação Profissional Técnica com o Ensino Médio.

4 - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA, 2003 A 2005 – BRASIL Ano 2003 2004 2005(*)

Total 589.383 676.093 747.892

Federal N.º % 79.484 13,5 82.293 12,2 89.114 11,9

Estadual N.º % 165.266 28,0 179.456 26,5 206.317 27,6

Municipal Privada N.º % N.º % 19.648 3,3 324.985 55,1 21.642 3,2 392.702 58,1 25.028 3,3 427.433 57,2

Fonte: MEC/Inep/DEE – Censo Escolar 2003 a 2005 (*) Inclui as três modalidades de articulação da Educação Profissional Técnica com o Ensino Médio

Em 2005, as escolas federais embora representassem apenas 4,5% dos estabelecimentos em 2005, concentravam 11,9% das matrículas, as estaduais representavam 20% dos estabelecimentos e absorviam 27,6% de matrículas, as instituições municipais representavam 4,2% dos estabelecimentos e registraram 3,3% de matrículas, enquanto as instituições privadas representavam 71,3% dos estabelecimentos e absorviam 57,2% das matrículas. A distribuição geográfica das escolas e o seu crescimento em número de matrículas mostram marcados contrastes. Quando comparados números de matrículas entre as diferentes regiões geográficas do país, numa intersecção entre as dependências administrativas (federal, estadual, municipal e privada), entre modalidades de oferta (concomitante, subseqüente e integrado) verifica-se uma assimetria evidente, como se observa nas tabelas a seguir.

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Educação Integral dos Trabalhadores

5 - ESTABELECIMENTOS QUE OFERECEM CURSOS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA, SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA. Regiões Geográficas

Total

Federal

Estadual

Municipal

Privada

Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

97 285 2073 718 121 3294

12 52 47 27 9 147

35 32 252 328 12 659

2 14 108 10 4 138

48 187 1666 353 96 2350

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2005 - (*) Oferecem cursos nas formas concomitante, subseqüente e integrada

5A - ESTABELECIMENTOS QUE OFERECEM CURSOS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA, SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA (PERCENTUAL) Regiões Geográficas

Total %

Federal %

Estadual %

Municipal %

Privada %

Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

2,94 8,65 62,93 21,80 3,67 100

8,16 35,37 31,97 18,37 6,12 100

5,31 4,86 38,24 49,77 1,82 100

1,45 10,14 78,26 7,25 2,90 100

2,04 7,96 70,89 15,02 4,09 100

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2005 - (*) Oferecem cursos nas formas concomitante, subseqüente e integrada

Em 2005, 62,93% das unidades escolares estava na região Sudeste, região com maior concentração de estabelecimentos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Nesta região, encontrava-se 70,89% de todos os estabelecimentos privados instalados no país, o que caracteriza uma acentuada presença da iniciativa privada. A região contava também com 78,26% das unidades escolares municipais que ofertavam cursos de Educação Profissional no país. A região Sul apresentava 21,8% do total de unidades que ofereciam cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Havia, na região, certo equilíbrio entre o número de estabelecimentos de Educação Profissional da iniciativa privada e o número de estabelecimentos da iniciativa pública (tabela 5). A presença das unidades de ensino sob administração estadual se sobressaia em relação às demais regiões do país, representando 49,77% do total de unidades estaduais em todo o território nacional. GRÁFICO ILUSTRATIVO DA DISTRIBUIÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR REGIÃO GEOGRÁFICA DO BRASIL - 2005

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Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

A região Nordeste era a terceira em números, concentrava 8,65% do total de estabelecimentos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio em 2005. Na região, encontravam-se 35,37% de todas as escolas federais, percentual maior que o verificado na região Sudeste, em cujo território concentrava-se 31,97% das escolas federais. As escolas municipais de Educação Profissional correspondiam a 10,14% do total de unidades municipais do país, as escolas estaduais representavam 4,86% do total de unidades estaduais em todo o território nacional. As unidades sob dependência administrativa privada representavam 7,96% das unidades privadas de todo o país, porém, ao se observar apenas a região Nordeste e os números de estabelecimentos, a iniciativa privada tinha mais da metade (65,61%) de todos os estabelecimentos de Educação Profissional da região (tabela 5A). A região Centro-Oeste concentrava em seu território 3,67% das unidades escolares que ofertavam cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Na região, as unidades federais representavam 6,12% de seu total nacional; a presença de escolas municipais e estaduais era relativamente pequena, apresentava percentuais de 2,9% e 1,82%, respectivamente, em relação aos totais verificados no país. As escolas sob administração privada, por sua vez, representavam 4,09% de todas as escolas privadas nacionais, porém, representavam 79,34% dos estabelecimentos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio da região. A região Norte tinha o menor número de unidades escolares que ofereciam cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio, eram 2,94% do total nacional. Na região, as unidades federais representavam 8,16% do total do país, as estaduais eram 5,31%, e as municipais 1,45% do total nacional, ou seja, apenas dois municípios em toda a região Norte. As unidades privadas instaladas na região representavam 2,04% das escolas privadas do país, mas, quando observada apenas a região Norte, representavam 49,48% de todas as escolas de Educação Profissional Técnica. DISTRIBUIÇÃO RELATIVA PEA E MATRÍCULAS EM EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO, SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA - 2005

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Educação Integral dos Trabalhadores

6 - DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA, SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA – 2005 Brasil e Regiões Total do Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

PEA 96.031.971 7.150.702 25.472.294 41.364.821 15.137.954 6.906.200

Percentual 100 7,4 26,5 43,1 15,8 7,2

fonte: IBGE/PNAD

Na comparação entre o número de matrículas e o percentual da população economicamente ativa - PEA – separado por região geográfica (gráfico acima), verificou-se claramente as desproporções regionais. O percentual de matrículas em cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio nas regiões Sudeste e Sul eram superiores ao percentual da PEA residente nas regiões. Em contrapartida, quando se observa as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o percentual de matrículas nos cursos de Educação Profissional era muito menor que o percentual da PEA, principalmente para as regiões Norte e Nordeste. Em outras palavras, a população trabalhadora, nestas três últimas regiões dispunha de menor acesso aos cursos de Educação Profissional em relação à população trabalhadora que residia nas regiões Sudeste e Sul. Neste sentido, é importante observar o crescimento de matrículas entre 2005 e 2006, na tabela 7 abaixo. 7 - MATRÍCULAS EM CURSOS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, SEGUNDO A REGIÃO GEOGRÁFICA (PERCENTUAL) 2005 - 2006 Regiões Geográficas Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

Matrículas 2005 19.972 69.109 437.242 153.289 27.651 707.263

% de matrículas Matrículas 2006 % de matrículas 2,82 9,77 61,82 21,67 3,91 100,00

29.362 94.480 431.480 160.434 28.934 744.690

3,94 12,69 57,94 21,54 3,89 100,00

Variação 2005/ 2006 47,0 36,7 -1,3 4,7 4,6 5,3

Fonte: MEC/INEP/DEEB – Censo Escolar 2005 e 2006

Entre 2005 e 2006, conforme já apontado, houve um crescimento de 5,3% no número de matrículas em cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio em todo o país. No período, a maior variação ficou a cargo das regiões Norte e Nordeste, de 47,0% e 36,7% respectivamente. A região Sudeste apresentou variação negativa de -1,3%, enquanto as regiões Sul e Centro-Oeste apresentaram variação de 4,7% e 4,6% respectivamente, crescimento significativo, mas inferior aos 5,3% nacional. O crescimento nas matrículas de Educação Profissional foi marcadamente acentuado nos estados do Nordeste (290,8%) e da Região Norte (161,1%)17. Entre 2005 e 2006, 17

Fonte: MEC/INEP/DEEB – Censo Escolar 2005 – 2006. (Tabela 17 – Educação Básica – matrículas e variação percentual na educação básica por dependência administrativa e unidades da federação 2005 – 2006)

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Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

na região Nordeste, o destaque ficou para o Estado de Alagoas com um aumento de 87,9% nas matrículas. Pernambuco teve aumento de 65,3%. Já o Estado da Paraíba apresentou crescimento de 60,1% nas matrículas. Na região Norte, destacou-se o Estado de Tocantins com crescimento de 125,1% nas matrículas entre 2005 e 2006. O Amazonas teve crescimento em matrículas da ordem de 59,9% e os Estados do Pará e do Amapá registraram alta em torno de 40%. Entretanto, em um movimento oposto aos demais estados da região, o Estado do Acre apresentou decréscimo de 28,5% nas matrículas. Na região Sudeste, houve um decréscimo nas matrículas em Educação Profissional de 1,3%, porém enquanto o volume de matrículas cresceu 63% no Estado do Espírito Santo, diminuiu 5,6% no Rio de Janeiro e 2,6% em São Paulo. O número de matrículas permaneceu praticamente estável no Estado de Minas Gerais. Na região Sul, verificou-se crescimento no Estado do Paraná (aumento de 8,7% nas matrículas) e no Estado de Santa Catarina, cujo crescimento foi de 9%. Para o Estado do Rio Grande do Sul, o aumento ficou em 0,5% nas matrículas, crescimento inexpressivo comparado ao crescimento de 5,3% de matrículas em âmbito nacional. Na região Centro-Oeste, enquanto o Estado de Goiás teve aumento de 15,1% nas matrículas de Educação Profissional e o Distrito Federal teve crescimento de 12,1% nas matrículas, o Estado do Mato Grosso apresentou recuo de 12,9% e o Estado do Mato Grosso do Sul registrou decréscimo de 11,3% nas matrículas. 8 - MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, POR REGIÃO GEOGRÁFICA E DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA, EM 29/3/2006 Total

Região Geográfica Brasil Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste

Total 744.690 709.160 29.362 27.585 94.480 86.711 431.480 417.586 160.434 153.167 28.934 24.111

Urbana Federal Estadual Municipal Privada 62.882 220.746 22.263 403.269 4.946 13.038 63 9.538 22.247 29.070 1.586 33.808 21.999 111.868 18.187 265.532 11.288 61.106 2.361 78.412 2.402 5.664 66 15.979

Total 35.530 1.777 7.769 13.894 7.267 4.823

Federal 16.996 418 5.006 5.747 3.320 2.505

Rural Estadual Municipal Privada 12.964 7811 4.759 364 995 1.901 257 605 6.930 296 921 3.380 74 493 389 184 1.745

Fonte: MEC/INEP. Censo Escolar 2006

8A - MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, POR REGIÃO GEOGRÁFICA E DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA – PERCENTUAL - 2006 Região Geográfica Brasil Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste

Total % 100 4 13 58 22 4

Total 95,23 93,95 91,78 96,78 95,47 83,33

Urbana Federal Estadual Municipal Privada 8,44 29,64 2,99 54,15 16,84 44,40 0,21 32,48 23,55 30,77 1,68 35,78 5,10 25,93 4,22 61,54 7,04 38,09 1,47 48,87 8,30 19,58 0,23 55,23

Total 4,77 6,05 8,22 3,22 4,53 16,67

Rural Federal Estadual Municipal Privada 2,28 1,74 0,11 0,64 1,42 1,24 3,39 5,30 2,01 0,27 0,64 1,33 1,61 0,07 0,21 2,07 2,11 0,05 0,31 8,66 1,34 0,64 6,03

Fonte: MEC/INEP. Censo Escolar 2006

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Educação Integral dos Trabalhadores

As matrículas em cursos de Educação Profissional eram majoritariamente urbanas, 95,23% contra 4,77% em âmbito rural. As matrículas urbanas eram feitas em organizações privadas num montante de 54,15% do total de matrículas de todo o território (urbana e rural), em contraste com 29,64% das matrículas em unidades estaduais de ensino, 8.44% em federais e apenas 2,99% em unidades municipais. Para as matrículas em estabelecimentos rurais, dos 4,77% do total de matrículas, 2,28% foram efetuadas em unidades escolares federais; 1,74% em estaduais e 0,11% em municipais. Somente 0,64% do total de matrículas foram efetuadas em unidades escolares privadas rurais. Em outras palavras, a Educação Profissional rural era eminentemente de administração pública, 47,84% das matrículas foram federais; 36,49% estaduais, 2,28% municipais. As entidades de caráter privado respondiam por 13,39% das matrículas em Educação Profissional em âmbito rural. Nas regiões Norte e Nordeste havia significativa predominância nas matrículas realizadas em unidades de administração pública, quando feita comparação com as demais regiões. Enquanto o setor privado respondia por 32,48% das matrículas na região Norte, as matrículas em escolas federais representavam 16,84% do total, e as estaduais 44,4%. Na região Nordeste, as matrículas em federais eram 23,55%, as estaduais 30,77% e as municipais 1,68%; em contraste com os 35,78% das matrículas em unidades escolares privadas. Na região Sudeste, as matrículas em escolas do setor privado representavam 61,54% das matrículas urbanas, a rede estadual concentrava 25,93% das matrículas urbanas, a rede federal concentrava 5,1% das matrículas urbanas, e a rede municipal concentrava 4,22% das matrículas urbanas. Somados os percentuais, as escolas federais, estaduais e municipais concentravam juntas 35,25% das matrículas urbanas. Na região Centro-Oeste, 55,23 das matrículas urbanas eram em escolas da rede privada. A rede estadual concentrava 19,58% das matrículas urbanas, a rede federal concentrava 8,30% das matrículas urbanas, e a rede municipal tinha apenas 0,23% das matrículas urbanas. As escolas federais, estaduais e municipais somavam 28,11% das matrículas. A região Centro-Oeste analisada separadamente tinha o maior percentual relativo de escolas rurais, representando 16,67% das matrículas da região. Na região Sul, 48,87% das matrículas urbanas estavam em escolas privadas. A rede estadual tinha 38,09% das matrículas urbanas, a rede federal tinha 7,04% das matrículas urbanas, e a rede municipal tinha 1,47% das matrículas urbanas. Os percentuais da rede federal, estadual e municipal somados concentravam 46,0% das matrículas urbanas. Observa-se, assim, que havia certo equilíbrio entre as matrículas em escolas públicas e privadas na região.

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Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

9 - MATRÍCULAS NOS CURSOS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR FAIXA ETÁRIA E REGIÃO GEOGRÁFICA. Regiões Geográficas Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

Total Menos de 15 19.972 1.392 69.109 1.182 437.242 5.396 153.289 2.353 280 27.651 707.263 10.603

De 15 a 17 De 18 a 19 De 20 a 24 De 25 a 29 De 30 a 39 Mais de 39 1.946 2.757 6.130 3.369 3.096 1.282 4.993 12.725 26.448 12.273 7.986 3.502 77.943 78.159 123.619 66.275 56.906 28.944 17.752 28.177 51.857 24.128 20.106 8.916 1.537 3.709 8.969 5.545 5.096 2.515 104.171 125.527 217.023 111.590 93.190 45.159

Fonte: MEC/Inep/Deeb. Censo Escolar 2005. - (*) Matrículas nas formas concomitante e subseqüente. A idade foi obtida a partir do ano do nascimento informado ao Censo Escolar

A faixa etária que concentrava o maior número de matrícula era da população com idade entre 20 a 24 anos, 30,68% do total das matrículas nacionais; a faixa etária de 18 a 19 anos, idade em que o(a) adolescente conclui o Ensino Médio regular, concentrava 17,75% das matrículas; a faixa etária de 15 a 17 anos representava 14,73% das matrículas. Somados os percentuais de 15 anos a 19 anos, com as idades mais próximas ao período regular em que o(a) educando(a) cursa o Ensino Médio, tinha-se 32,48% das matrículas em Educação Profissional. A faixa etária entre 25 e 29 anos concentrava percentual de 15,78% das matrículas; a faixa etária entre 30 e 39 anos representava 13,18% das matrículas e a faixa etária com mais de 39 anos concentrava 6,39% das matrículas. Os percentuais das faixas etárias acima de 25 anos somados perfaziam o índice que representava 35,35% das matrículas, o que demonstrava um retorno de parcelas da população que já estava em atividade a cursos de Educação Profissional de nível técnico. 9A - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR FAIXA ETÁRIA E REGIÃO GEOGRÁFICA – PERCENTUAL Regiões Geográficas Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

Total Menos de 15 De 15 a 17 De 18 a 19 De 20 a 24 De 25 a 29 De 30 a 39 Mais de 39 6,97 9,74 13,80 30,69 16,87 15,50 6,42 3 1,71 7,22 18,41 38,27 17,76 11,56 5,07 10 1,23 17,83 17,88 28,27 15,16 13,01 6,62 62 1,54 11,58 18,38 33,83 15,74 13,12 5,82 22 1,01 5,56 13,41 32,44 20,05 18,43 9,10 4 1,50 14,73 17,75 30,68 15,78 13,18 6,39 100

Fonte: MEC/Inep/Deeb. Censo Escolar 2005.

Quando comparadas as matrículas considerando-se as faixas etárias atendidas nas diferentes regiões geográficas brasileiras, verificam-se algumas oscilações (tabela 9 e 9a). Os percentuais da região Norte indicavam uma maior participação de jovens menores de 15 anos quando feita comparação proporcional com as demais regiões. Porém, a população de 15 a 17 anos atendida (9,74%) e a de 18 a 19 anos (13,80%) apresentaram percentuais abaixo do verificado em âmbito nacional. Na faixa etária de 20 a 24 anos o percentual era de 30,69%, próximo aos 30,68% de todo o território. As faixas de 25 a 29 anos, de 30 a 39 anos e de mais de 39 anos estavam todas ligeiramente acima dos percentuais nacionais. Na região Nordeste, a faixa etária de menos de 15 anos representava 1,71%, destacava-se o percentual da faixa etária de 15 a 17 anos de 7,22% enquanto a média

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Educação Integral dos Trabalhadores

nacional era de 14,73%. Para a faixa etária de 18 e 19 anos o percentual estava ligeiramente acima da média nacional. Para a faixa etária de 20 a 24 anos, o percentual de 38,27% estava acima da média nacional de 30,68%. Enquanto a faixa etária de 25 a 29 anos apresentava percentual um pouco acima da média nacional, as faixas etárias de 30 a 39 anos e mais de 39 anos apresentavam índices abaixo da média nacional. Na região Sudeste, os percentuais eram bem próximos aos da média nacional, trata-se da região que apresentava a maior concentração de matrículas, influenciando grandemente os percentuais nacionais. A região Sul também registrava percentuais de participação das diferentes faixas etárias próximos aos verificados em todo o território. Por sua vez, a região Centro-Oeste tinha uma concentração de matrículas nas faixas etárias acima de 25 anos quando comparada às demais regiões, em sentido inverso ao observado nas faixas etárias de pessoas com menos de 20 anos que registravam percentuais abaixo dos constatados em esfera nacional. A faixa de 25 a 29 anos representava 20,05% do total de matrículas daquela região e 18,43% estava concentrado na faixa etária de 30 a 39 anos. Para a faixa etária de mais de 39 anos, o índice verificado foi de 9,1%, acima do percentual verificado para o país inteiro para a mesma faixa etária que era de 6,39%. 10 - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR SEXO E A REGIÃO GEOGRÁFICA 2003 A 2005 – BRASIL Regiões Geográficas Região Norte Região Nordeste Região Sudeste Região Sul Região Centro-Oeste Brasil

Total 19.972 69.109 437.242 153.289 27.651 707.263

Masculino 10.516 31.903 218.758 77.603 12.623 351.403

Percentual 52,65 46,16 50,03 50,63 45,65 49,68

Feminino 9.456 37.206 218.484 75.686 15.028 355.860

Percentual 47,35 53,84 49,97 49,37 54,35 50,32

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2005 (*) Matrículas nas formas concomitantes e subseqüentes

Quanto a diferença de participação entre educandos do sexo masculino ou feminino, havia uma proporcionalidade, ambos em torno de 50%, apenas as regiões CentroOeste e Nordeste apresentavam percentuais ligeiramente maiores de matrículas para o sexo feminino. A região Centro-Oeste registrava 54,35% das matrículas do sexo feminino contra 45,65% do sexo masculino e a região Nordeste concentrava 53,84% de matrículas do sexo feminino contra 46,16% do sexo masculino. As tabelas e gráficos, bem como os comentários visam apresentar, de modo geral, os números e dados dos últimos censos escolares no que tange a Educação Profissional. Podemos notar tendências claras de expansão da demanda e oferta de cursos da Educação Profissional Técnica de Nível Médio em todo o país, uma forte presença da iniciativa privada e grande concentração de escolas e matrículas na região Sudeste. As regiões Norte e Nordeste ampliaram, sensivelmente, suas matrículas nas redes públicas, demonstrando uma clara dependência em relação às instituições públicas de ensino para o atendimento da demanda por Educação Profissional Técnica de Nível Médio nas regiões. Focalizaremos, no próximo capítulo, os dados referentes à Educação Profissional relacionada aos diferentes setores econômicos e suas características gerais de oferta e demanda.

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Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

Educação profissional e os setores econômicos A Educação Profissional não pode, sob pena de se tornar inócua, desvincular-se do mercado de trabalho, afinal, é pensando em conseguir um trabalho e em uma carreira profissional que a maioria dos educandos se matricula em escolas técnicas. 11 - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR SEXO E A REGIÃO GEOGRÁFICA 2003 A 2005 – BRASIL 2003

Área Profissional Brasil Agropecuária Artes Comércio Comunicação Construção Civil Desenvolvimento Social e Lazer Design Geomática Gestão Imagem Pessoal Indústria Informática Meio Ambiente Mineração Química Recursos Pesqueiros Saúde Telecomunicações Transportes Turismo e Hospitalidade

N.º 589.383 39.135 5.782 6.676 4.063 13.767 6.733 5.997 1.403 87.407 963 109.559 82.969 6.618 1.318 18.068 358 174.073 12.536 1.378 10.580

2004 % 100 6,6 1,0 1,1 0,7 2,3 1,1 1,0 0,2 14,8 0,2 18,6 14,1 1,1 0,2 3,1 0,1 29,5 2,1 0,2 1,8

N.º 676.093 46.239 5,625 6.683 5.005 14.025 18.605 7.625 1.145 89.418 579 114.741 89.748 8.410 1.588 21.580 172 220.081 11.811 2.236 10.777

% 100 6,8 0,8 1,0 0,7 2,1 2,8 1,1 0,2 13,2 0,1 17,0 13,3 1,2 0,2 3,2 0,0 32,6 1,7 0,3 1,6

2005 N.º % 747.892 100 50.485 6,8 8.190 1,1 5.522 0,7 8.242 1,1 14.379 1,9 18.632 2,5 7.413 1,0 1.399 0,2 110.849 14,8 1,052 0,1 132.976 17,8 89.630 12 11.084 1,5 2.480 0,3 26.142 3,5 122 0,0 235.605 31,5 9.842 1,3 1.891 0,3 11.957 1,6

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2003 a 2005

São 20 áreas profissionais assim divididas de acordo com a classificação definida na Resolução CNE/CEB nº. 04/1999, que estabelece as competências profissionais e as cargas horárias mínimas para cada habilitação. Dentre os setores econômicos, destaca-se, em números de matrículas, o setor de Saúde com 235.605 matrículas em 2005, seguido pelo setor da Indústria com 132.976 matrículas. O setor de Gestão também era bastante expressivo com 110.849 matrículas, além da Informática que concentrava 89.630 matrículas em 2005. O setor econômico de Saúde apresentou crescimento de matrículas entre 2003 e 2005, de 29,5% em 2003 para 31,5% em 2005. Os setores de Indústria e de Gestão mantiveram-se estáveis, com pequenas variações, enquanto o setor de Informática que contava com 14,1% das matrículas em 2003, passou para 12% em 2005. As matrículas em cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio, quando separadas por sexo e idade, demonstram características importantes a serem analisadas. Observa-se que havia setores econômicos (ou áreas profissionais) com predominância masculina, e outros que eram femininos, como o setor da indústria para os homens e o setor de saúde para as mulheres. Alguns atraíam principalmente os mais jovens, o setor

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Total 707.263 42.837 8.190 8.225 4.799 13.500 15.462 7.391 1.379 102.408 1.052 128.153 80.765 10.407 2.112 24.970 114 233.493 9.190 1.581 11.235

Masc. 351.403 31.726 3.680 4.890 2.175 7.933 1.881 2.299 836 37.095 62 114.436 51.539 5.645 1.502 13.619 87 60.921 6.454 1.132 3.491

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2005

Brasil – Totais Agropecuária Artes Comércio Comunicação Construção Civil Desenv.Social e Lazer Design Geomática Gestão Imagem Pessoal Indústria Informática Meio Ambiente Mineração Química Recursos Pesqueiros Saúde Telecomunicações Transporte Turismo e Hospitalidade

Fem. 355.860 11.111 4.510 3.335 2.624 5.567 13.581 5.092 543 65.313 990 13.717 29.226 4.762 610 11.351 27 172.572 2.736 449 7.744

Menos de 15 anos De 15 a 19 anos De 20 a 24 anos De 25 a 29 anos 10603 1,5% 229.698 32,5% 217.023 30,7% 111.590 15,8% 732 1,7 27.873 65,1 10.075 23,5 2.205 5,1 1.311 16,0 2.590 31,6 1.936 23,6 1.015 12,4 6 0,1 772 9,4 1.673 20,3 1.359 16,5 45 0,9 3.363 70,1 764 15,9 342 7,1 291 2,2 4.799 35,5 4.660 34,5 1.805 13,4 510 3,3 2417 15,6 4.054 26,2 2.699 17,5 16 0,2 2.443 33,1 1.995 27,0 1.117 15,1 0,0 455 33,0 527 38,2 212 15,4 984 1,0 34.430 33,6 35.031 34,2 14.529 14,2 16 1,5 78 7,4 219 20,8 241 22,9 1.035 0,8 44.685 34,9 41.199 32,1 20.627 16,1 2.092 2,6 47.709 59,1 19.231 23,8 6.458 8,0 116 1,1 2.922 28,1 3.447 33,1 1.513 14,5 175 8,3 447 21,2 686 32,5 365 17,3 92 0,4 7.999 32,0 8.791 35,2 4.106 16,4 0,0 56 49,1 27 23,7 8 7,0 2.833 1,2 37.038 15,9 76.056 32,6 50.459 21,6 95 1,0 4.159 45,3 2.917 31,7 1.189 12,9 2 0,1 582 36,8 476 30,1 229 14,5 252 2,2 4.881 43,4 3.259 29,0 1.112 9,9

De 30 a 39 Mais de 39 anos 93.190 13,2% 45.159 6,4% 1.259 2,9 693 1,6 817 10,0 521 6,4 1.944 23,6 2.471 30,0 220 4,6 65 1,4 1.231 9,1 714 5,3 3.370 21,8 2.412 15,6 1.096 14,8 724 9,8 106 7,7 79 5,7 10.888 10,6 6.546 6,4 291 27,7 207 19,7 15.716 12,3 4.891 3,8 3.844 4,8 1.431 1,8 1.584 15,2 825 7,9 324 15,3 115 5,4 3.018 12,1 964 3,9 17 14,9 6 5,3 45.717 19,6 21.390 9,2 657 7,1 173 1,9 210 13,3 82 5,2 881 7,8 850 7,6

Educação Integral dos Trabalhadores

da informática e da indústria, por exemplo. Outros eram constituídos por educandos com mais idade que buscavam cursos técnicos como parte de etapas de requalificação profissional ou de readaptação às novas exigências reguladoras sobre o conhecimento e a escolaridade para os profissionais em seus setores de atuação. Conforme se observa na tabela abaixo: 12 - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, POR SEXO E IDADE, SEGUNDO ÁREA PROFISSIONAL, 2005 – BRASIL


Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

12A - MATRÍCULAS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, POR SEXO E IDADE, SEGUNDO ÁREA PROFISSIONAL, 2005 – BRASIL - PERCENTUAL Setor Econômico Brasil - Totais Agropecuária Artes Comércio Comunicação Construção Civil Desenv. Social e Lazer Design Geomática Gestão Imagem Pessoal Indústria Informática Meio Ambiente Mineração Química Recursos Pesqueiros Saúde Telecomunicações Transporte Turismo e Hospitalidade

Total 707.263 42.837 8.190 8.225 4.799 13.500 15.462 7.391 1.379 102.408 1.052 128.153 80.765 10.407 2.112 24.970 114 233.493 9.190 1.581 11.235

% por setor 100 6 1 1 1 2 2 1 0 14 0 18 11 1 0 4 0 33 1 0 2

Masc. 351.403 31.726 3.680 4.890 2.175 7.933 1.881 2.299 836 37.095 62 114.436 51.539 5.645 1.502 13.619 87 60.921 6.454 1.132 3.491

Fem. % masc. no setor % fem. no setor 355.860 50 50 11.111 74 26 4.510 45 55 3.335 59 41 2.624 45 55 5.567 59 41 13.581 12 88 5.092 31 69 543 61 39 65.313 36 64 990 6 94 13.717 89 11 29.226 64 36 4.762 54 46 610 71 29 11.351 55 45 27 76 24 172.572 26 74 2.736 70 30 449 72 28 7.744 31 69

Fonte: MEC/Inep/Deeb – Censo Escolar 2005

Apesar de haver um equilíbrio entre a participação feminina e masculina nos cursos, alguns setores apresentavam maior concentração de homens ou mulheres. Embora houvesse certa constância quanto à faixa etária, havia cursos que atraíam maior número de educandos com menor idade, e outros que atraíam os educandos de mais idade. O setor econômico de Desenvolvimento Social e Lazer, em 2005, era predominantemente feminino, com 88% de educandas em contraste com 12% de educandos. Ocorria um contraste acentuado também no setor de Gestão, as matrículas do sexo feminino correspondiam a 64% das matrículas do setor, enquanto as matrículas do sexo masculino perfaziam 36%. O setor de Turismo e Hospitalidade também concentrava marcante presença de mulheres, 69% contra 31% de homens; o setor de Design registrava o mesmo percentual de matrículas que o encontrado no Turismo quanto à divisão de sexo, 69% de mulheres e 31% de homens. Entretanto, o destaque maior verificou-se no setor de Saúde. O setor econômico concentrava o maior número de matrículas, 33% de todas as matrículas da Educação Profissional Técnica de Nível Médio do país, cuja participação feminina representava 74% no setor, bem acima das matrículas masculinas que correspondiam a 26% neste setor econômico. A área de Imagem Pessoal também concentrava maior número de mulheres na comparação com o volume de matrículas de homens, 94% contra 6%. Mas o total de matrículas no setor ainda era pouco expressivo considerando-se o total de matrículas no país.

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Educação Integral dos Trabalhadores

Por outro lado, alguns setores tinham predominância masculina: o setor econômico da Agropecuária concentrava total de 74% de matrículas masculinas, enquanto as femininas correspondiam a 26%. O setor econômico de Telecomunicações também concentrava mais matrículas masculinas, 70% contra 30% de matrículas femininas. Contudo, os destaques ficaram para os setores econômicos da Indústria e da Informática. O setor da Indústria era o segundo maior em número de matrículas, perfazendo 18% das matrículas em relação ao total de matrículas em cursos de Educação Profissional Técnica de Nível Médio em todo o país, sendo 89% de suas matrículas masculinas e apenas 11% femininas. As matrículas no setor da Informática correspondiam a 11% do total verificado no país, cuja distribuição por sexo estava em 64% de homens contra 36% de mulheres. (Ver gráfico a seguir). O setor da Informática concentrava o maior número de matrículas nas faixas etárias de 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos. De 15 a 19 anos eram 59,1% do total de matrículas no setor e 23,8% estava na faixa etária de 20 a 24 anos. O setor da Indústria também apresentava maiores concentrações nestas faixas etárias, mas numa proporção próxima a encontrada em âmbito nacional. Eram 34,9% na faixa etária de 15 a 19 anos e 32,1% na faixa etária de 20 a 24 anos. No setor de Saúde, as matrículas eram relativamente elevadas para as faixas etárias acima de 25 anos. Enquanto a faixa etária de 15 a 19 anos representava apenas 15,9% das matrículas neste setor e a faixa etária de 20 a 24 anos correspondia a 32,6 % das matrículas - percentual próximo ao verificado nacionalmente -, já a faixa de 25 a 29 anos correspondia a 21,6% das matrículas, a faixa de 30 a 39 anos perfazia 19,6 %, e a faixa de mais de 39 anos representava 9,2% do total no setor. GRÁFICO ILUSTRATIVO DA DISTRIBUIÇÃO DE MATRÍCULAS NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL POR SEXO - 2005

Ficou evidente, assim, um retorno de pessoas à Educação Profissional Técnica de Nível Médio numa etapa da vida distante da época escolar regular, ao menos para área de Saúde. A soma de matrículas de educandos acima de 25 anos em âmbito nacional correspondia a 35,4% do total de matrículas em 2005.

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Panorama da Educação Profissional no Brasil – Ensino Médio

Considerações finais A grande maioria dos planos de curso consultados, como veremos nos capítulos seguintes, seguia as diretrizes do Decreto 2208/97, dividindo-se os cursos em módulos e substituindo os conteúdos e assuntos científicos e tecnológicos por competências e habilidades para o âmbito da produção. Muitos argumentavam em seus planos de curso que de tal maneira, contribuiriam para a absorção dos egressos no mercado de trabalho, aumentariam sua “empregabilidade” e de certa forma contribuiriam para a cidadania, de um modo manietado de compreender cidadania. Atribui-se grande ênfase à concepção empresarial de recursos humanos como que antecipando o treinamento e condicionamento comportamental às novas técnicas de organização de pessoal, que o técnico concluinte da Educação Profissional Técnica de Nível Médio teria não apenas que aceitá-las, mas sobretudo, impô-las aos trabalhadores que possivelmente coordenaria. A Educação Profissional é especialmente importante para a classe que vive do trabalho, entretanto, está predominantemente ligada às oscilações e ditames gerais dos agentes do mercado, às regras de competitividade e produtividade para aumento da expropriação de mais-trabalho. Neste sentido, é vergonhoso constatarmos que os planos de cursos não tinham coerência e às vezes pareciam redigidos às pressas, com parágrafos inteiros sem tratamento gramatical e sintático adequado, o que os tornava incompreensíveis em alguns trechos. Não apresentavam tratamento para o desenvolvimento das propaladas competências, e alguns nem mesmo apresentavam acervo bibliográfico. Caberia perguntar: a educação tratada como “mercadoria” tem respaldo jurídico para ser questionada em órgãos como os Procons? Ou a educação se insere em um direito básico e inalienável da pessoa humana a partir da qual o ser humano cria sua vivência participativa em sua sociedade?

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Educação Integral dos Trabalhadores

Bibliografia ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2001. ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1983. BRECHT, B. A santa Joana dos Matadouros. São Paulo, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997 (Coleção Leitura). COSTA, H.; CONCEIÇÃO, M. (orgs.) Educação integral e sistema de reconhecimento e certificação educacional e profissional. São Paulo: CUT, 2005. DALLARI, D. A. O que é participação política. São Paulo: Abril Cultural / Brasiliense, 1982. BRASIL. 2006. Educação profissional técnica de nível médio no censo escolar. Brasília: Inep/MEC – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. GOUNET, T. Fordismo e toyotismo na civilização do automóvel. São Paulo: Boitempo, 2002. OLIVEIRA, C.A.B.; MATTOSO, J. et alli (orgs.) O mundo do trabalho: crise e mudança no final do século. São Paulo: Scritta; Campinas: Cesit, 1994.

Fontes pesquisadas: MEC/Inep/DEE – Censo Escolar 2003 a 2005. Banco de Dados do CNCT/MEC

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• Anselmo Luís dos Santos • Fabiano Lago Garrido Introdução

E

ste texto faz um levantamento das principais mudanças tecnológicas na organização do trabalho e nas ocupações da Indústria de Transformação de Plásticos no Brasil. O objetivo é identificar os impactos que tais transformações têm provocado em termos de novas exigências de formação e qualificação profissional da força de trabalho. A cadeia produtiva do plástico é constituída por três elos: as centrais petroquímicas, as empresas produtoras de resinas termoplásticas e as unidades transformadoras. No Brasil, há três centrais petroquímicas: Braskem, no Pólo Petroquímico de Camaçari, na Bahia; Petroquímica União (PQU), em Santo André/Mauá, São Paulo; e Copesul em Canoas, Rio Grande do Sul. São 15 as empresas produtoras de resinas termoplásticas, tais como a própria Braskem, a Polibrasil, a Dow, a Basf, a Solvay, entre outras. O maior número de empresas encontra-se na etapa de transformação, que compõem o elo final da cadeia; mais de 8.500 unidades18. Este último segmento da indústria petroquímica é o objeto de estudo do presente trabalho. A Indústria de Transformação de Plástico – geradora do maior volume de emprego na cadeia produtiva da indústria petroquímica - é constituída, em sua grande maioria, por Micro e Pequenas Empresas (MPEs) que apresentam baixos níveis de desenvolvimento tecnológico e de capacitação da força de trabalho. Em função dos diversos problemas organizacionais e de financiamento, típicos do segmento de MPEs, e diante das elevadas exigências em termos de montante de capital, de atualização tecnológica e de qualificação profissional da indústria plástica, essas unidades geralmente também não dispõem de estrutura e de recursos próprios suficientes para sustentar programas de formação profissional. Considerando o quadro de mudanças tecnológicas e organizacionais em curso no segmento - ainda que mais lento no Brasil se comparado a países mais avançados – e a relação entre as novas demandas por maior qualificação dos trabalhadores deste setor com a elevação dos padrões de competitividade e de empregabilidade, torna-se evidente a importância de políticas públicas de formação e qualificação profissional de força de trabalho para o segmento de transformação de plástico. Além desta introdução e de uma seção dedicada às considerações finais, este trabalho contempla outras quatro seções. Na seção 2, apresenta-se uma caracterização geral do ramo industrial, considerando sua configuração regional e as dinâmicas de expansão da produção e de transformação da estrutura produtiva a partir dos anos 90. Na seção 3, discute-se as mudanças estruturais e tecnológicas mais recentes, destacando-se 18

Dados da Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM 2006).

Capítulo 3

Setor Econômico Químico: Plásticos Mudanças Recentes na Indústria Brasileira de Transformação de Plásticos e Impactos Sobre a Demanda por Qualificação Profissional


Educação Integral dos Trabalhadores

especialmente as inovações mais importantes e as dificuldades da indústria de transformação plástica brasileira em absorvê-las. Neste sentido, destacam-se principalmente os problemas mais agudos do segmento de MPEs, dado o baixo nível de investimento em Planejamento e Desenvolvimento – P&D e, principalmente, a fragilidade das políticas governamentais de financiamento para o setor. Na seção 4, realiza-se uma caracterização geral das ocupações e do perfil dos trabalhadores deste ramo de atividade industrial, com o objetivo de identificar as principais mudanças recentes que estão associadas às novas demandas por qualificação de força de trabalho. Na seção 5, são apresentadas algumas experiências de formação e qualificação profissional, em curso atualmente no país, destinadas a melhorar a qualificação da força de trabalho para o segmento19.

Caracterização geral do setor A Indústria de Transformação de Plásticos no Brasil pertence à cadeia produtiva da indústria petroquímica, integrando um de seus três grandes grupos de empresas, classificadas em empresas de 1ª, 2ª e 3ª geração. A central de matérias-primas petroquímicas, que produz basicamente três componentes (etileno, benzeno e propileno) a partir da nafta - um derivado do petróleo - e do gás residual de refinaria, integra as indústrias de 1ª geração. As indústrias de 2ª geração conformam-se pela produção, a partir das três matérias-primas básicas acima citadas, de seis principais tipos de produtos: a) polietilenos de baixa densidade; b) polietilenos de alta densidade; c) PVC; d) poliestireno; e) náilon; e f) polipropileno20. As indústrias de 3ª geração, objeto deste estudo, produzem um amplo e diversificado conjunto de produtos, especialmente aqueles que chegam ao consumidor final. As unidades produtoras, em sua grande maioria, são micros, pequenas e médias empresas. Essas transformadoras plásticas utilizam os produtos fornecidos pelas indústrias de segunda geração das seguintes formas: a) com o polietileno de baixa densidade, elas produzem embalagens para produtos de limpeza, alimentícios (cesta básica), lonas plásticas para agricultura, frascos, entre outros produtos; b) com o polietileno de alta densidade, elas produzem garrafas, brinquedos, utensílios domésticos, frascos, embalagens e tupperwares; c) com o PVC, as A realização deste estudo contou com consultas em diversas publicações, principalmente de documentos e pesquisas realizados pelo SENAI e entidades nacionais vinculadas ao setor petroquímico e do sub-setor dos transformados plásticos, tais como: Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim); Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), Instituto Nacional do Plástico (INP), entre outras associações e sindicatos regionais. As entrevistas realizadas com profissionais ligados ao setor foram fundamentais para o desenvolvimento do presente estudo. Além disso, foram utilizadas diferentes bases de dados, principalmente as informações disponibilizadas pelas associações do setor e dos dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS/MTE) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD/IBGE). 20 Os plásticos são divididos em duas categorias importantes: termofixos e termoplásticos. Os termofixos, que representam cerca de 20% do total consumido no país, são plásticos que, uma vez moldados por um dos processos usuais de transformação, não podem mais sofrer novos ciclos de processamento, pois não se fundem novamente, impedindo nova moldagem. Os termoplásticos, mais largamente utilizados, são materiais que podem ser reprocessados várias vezes pelo mesmo ou por outro processo de transformação. Quando submetidos ao aquecimento a temperaturas adequadas, esses plásticos amolecem, fundem-se e podem ser novamente moldados. Como exemplos, podem ser citados: polietileno de baixa densidade (PEBD); polietileno de alta densidade (PEAD); policloreto de vinila (PVC); poliestireno (PS); polipropileno (PP); politereftalato de etileno (PET); poliamidas (náilon). 19

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Setor Econômico Químico de Plásticos

Fonte: Extraído de: Observatório Econômico - Boletim Nº 13, Ano 04. Santo André, Julho / Agosto / Setembro 2006.

indústrias geram inúmeros produtos para construção civil, como tubos e conexões, perfis rígidos e flexíveis, fios e cabos, além de bolsas de sangue; d) o poliestireno é a matéria-prima aplicada à produção de peças para eletrodomésticos, tubos, embalagens, partes internas de geladeiras, copos descartáveis e canetas; e) o náilon é usado pela indústria têxtil na produção de tapetes e carpetes, lingerie, roupas, além de fios para pneus, cintos de segurança, correias e plásticos de engenharia; f) o polipropileno é aplicado na fabricação de peças para a indústria automobilística, móveis, tapetes, têxteis, utensílios domésticos, embalagens e seringas descartáveis. O quadro abaixo ilustra a conformação da cadeia petroquímica. O setor de transformação de plásticos no Brasil reúne 8.523 indústrias que empregam 258 mil trabalhadores. Marcado fortemente pela presença de MPEs, 87% das empresas empregam até 50 trabalhadores e 94% até 99. Ou seja, as médias e grandes empresas, que empregam 100 ou mais trabalhadores, representam apenas 6% do total (ABIPLAST. 2006). Embora as empresas menores constituam a maioria das unidades produtivas do setor, há uma forte concentração da produção segundo o porte das empresas: 10% das indústrias concentram cerca de 80% do total da produção (Valor Econômico/2004). Do ponto de vista regional também se observa uma elevada concentração da produção, sendo o ABC Paulista o principal pólo produtor em termos de unidades, onde se concentra metade dos estabelecimentos. As transformadoras dependem de acesso a matérias-primas que são produzidas numa estrutura oligopolizada (oligopsônio), em função da estrutura mais concentrada na produção das empresas de 1ª e 2ª gerações, o que garante a estas um maior poder de barganha. Considerando as dificuldades de acesso a insumos importados (custos de transporte, problemas de assistência técnica e outros custos de internalização do produto), o segmento de transformadoras plásticas, marcado pela forte presença de MPEs, apresenta pressões que contribuem para elevação de custos e limitam suas margens de lucro. O setor de transformados plásticos apresenta uma grande concentração na produção de embalagens (42%). A produção de produtos plásticos para a construção civil representa 10% do total dos transformados plásticos. Cerca de 11% da produção deste setor são para produtos descartáveis, 11% são componentes técnicos, 9% para o setor agrícola, 5% são artigos de utilidades domésticas, 3% artigos de calçados, 1% artigos laminados e 1% brinquedos (veja o Gráfico 1).

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Educação Integral dos Trabalhadores

GRÁFICO 1 - DISTRIBUIÇÃO DA PRODUÇÃO DOS TRANSFORMADOS PLÁSTICOS. BRASIL, 2005

Fonte: Extraído do site da ABRE 2005.

GRÁFICO 2 - PARTICIPAÇÃO DO VALOR DAS EMBALAGENS PLÁSTICAS NO MERCADO NACIONAL DE EMBALAGENS. BRASIL, 2005.

Fonte: Extraído do site da ABRE 2005.

A produção de embalagens plásticas representou 32% do valor total da produção de embalagens (de plásticos, metais, vidro e madeira) em 2005 (veja Gráfico 2). Segundo a Associação Brasileira de Embalagem (ABRE), este segmento tem alcançado um alto padrão de avanço tecnológico e de competitividade, levando o país a ser hoje um exportador de embalagens, com destaque para os filmes de plástico. Entre 2002 e 2003, as exportações brasileiras de embalagens plásticas cresceram 30%. Somente no primeiro semestre de 2004 aumentaram 13% frente ao mesmo período de 2003 (ABRE. 2004/2005)21. 21

Filme plástico é uma película plástica normalmente usada como sacolas de supermercados, sacos de lixo, embalagens de leite, lonas agrícolas e proteção de alimentos na geladeira ou em forno de microondas. A resina mais usada é o polietileno de baixa densidade (PEBD), que corresponde a 32% do total de polímeros consumidos no mercado brasileiro de plástico. No Brasil, são produzidas 210 mil toneladas anuais de filme plástico.

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Setor Econômico Químico de Plásticos

A análise da distribuição espacial das empresas de transformação de plástico no Brasil mostra que o Estado de São Paulo reúne o maior número de empresas do setor, com 47% do total, seguido de longe pelos Estados do Rio Grande do Sul (12,3%), Santa Catarina e Paraná (ambos com 8%), Rio de Janeiro e Minas Gerais (ambos com 6%) e os outros 21 estados que somados representam 12% do total de empresas do setor. Apesar da grande concentração nas regiões Sul e Sudeste, as empresas das regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte do país começam a ter uma crescente, embora ainda pequena, participação no setor. Isso pode representar uma tendência para maior desconcentração da localização das empresas nos próximos anos. A participação do número de empresas localizadas no Estado de São Paulo, em relação ao total do setor, reduziu-se de 51,4% para 47%, entre 1999 e 2005. Alguns estados apresentaram pequeno aumento na participação, em termos de número de empresas, como Santa Catarina e Paraná, com cerca de 1% de crescimento na participação nacional cada um (veja Tabela 2). Apesar da queda, a hegemonia de São Paulo não está ameaçada, ainda que outras regiões como Goiás, Alagoas e Bahia tendam a aumentar sua participação no número de empresas de transformados plásticos, em parte devido aos mecanismos da guerra fiscal, como é o caso da concessão de incentivos fiscais nas regiões Centro-Oeste e Nordeste do país. Em Alagoas, por exemplo, um decreto que instituiu os Arranjos Produtivos Locais (APLs) prevê isenção total de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na compra de ativos fixos; crédito fiscal presumido de 50% do ICMS na saída dos produtos; e venda de terreno a preço simbólico para quem quiser estabelecer uma fábrica na região. Os benefícios fiscais também têm cumprido um papel relevante para alavancar a indústria em Goiás. No início dos anos 90, o Estado era mero comprador de materiais plásticos. Hoje tem 130 fábricas produzindo sete mil toneladas mensais de todos os tipos de segmentos, com crescimento acentuado no ramo de sopros, voltado para produção de frascos para cosméticos, produtos de limpeza e alimentos. O forte peso dos incentivos na ramificação da indústria do plástico para novas regiões do país é inegável, mas não é considerado o mais importante. O setor envolve uma infinidade de produtos e todos dependem do crescimento da economia em geral. No segmento de embalagens flexíveis, utilizadas principalmente pela indústria alimentícia, responsável por 40% de toda a produção de plástico, o efeito da revitalização econômica no país é bem maior. Segundo previsões da Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (ABIEF), se o conjunto da economia brasileira crescer 4% ao ano, a indústria plástica avançará num ritmo anual de 10% a 12%. Em outros estados, o desenvolvimento da indústria do plástico foi potencializado após a instalação de pólos petroquímicos. No Rio Grande do Sul, a criação do Pólo Petroquímico de Triunfo, há 25 anos, deu início a um processo de expansão que faz com que hoje o Estado ostente o posto de quarto produtor do Brasil, conforme dados da MaxiQuim, com 315 mil toneladas fabricadas em 2003, e faturamento em torno de R$ 2,1 bilhões. Com a maioria das empresas concentradas na região da Grande Porto Alegre e cerca de 25 mil empregos diretos gerados, o Estado tem uma produção variada, que vai de sacos plásticos e baldes industriais a tubos de PVC. No Rio de Janeiro, o início das operações da Rio Polímeros, em 2008, deverá alavancar a produção de materiais plásticos, hoje

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Educação Integral dos Trabalhadores

em torno de 139 mil toneladas por ano. O Governo Estadual também concede incentivos, principalmente isenção de ICMS, para empresas que se instalam na Baixada Fluminense. Um quadro mais detalhado da distribuição espacial das empresas de transformados plásticos no país pode ser extraído a partir da avaliação dos dados da Tabela 1, que apresenta o número total de empresas e seus empregados na maioria dos estados, entre os anos de 1999 e 2005. TABELA 1 - EMPRESAS E EMPREGADOS FORMAIS DO SETOR DE TRANSFORMADOS PLÁSTICO, SEGUNDO UNIDADES DA FEDERAÇÃO. BRASIL, 1999 E 2005.

UF Rondônia Acre Amazonas Para Tocantins Maranhão Piauí Ceara Rio G. do Norte Paraíba Pernambuco Alagoas Sergipe Bahia Minas Gerais Espírito Santo Rio de Janeiro São Paulo Paraná Santa Catarina Rio G. do Sul Mato G. do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal Total

Empresas 4 1 51 14 2 15 8 75 27 56 140 27 14 136 393 55 486 3.426 442 397 759 17 14 85 21 6.665

1999 % Empregados 0,06 13 0,02 19 0,77 2.792 0,21 386 0,03 6 0,23 253 0,12 175 1,13 2.119 0,41 452 0,84 1.282 2,1 3.411 0,41 729 0,21 411 2,04 3.598 5,9 8.969 0,83 1.311 7,29 13.849 51,4 93.697 6,63 11.097 5,96 16.992 11,4 17.929 0,26 240 0,21 181 1,28 1.739 0,32 266 100 181.916

% 0,01 0,01 1,53 0,21 0,00 0,14 0,10 1,16 0,25 0,70 1,88 0,40 0,23 1,98 4,93 0,72 7,61 51,51 6,10 9,34 9,86 0,13 0,10 0,96 0,15 100

Empresas 17 2 90 19 12 17 18 113 36 73 181 26 23 218 559 75 515 4.136 683 687 1.086 32 47 151 28 8.844

2005 % Empregados 161 0,2 49 0,0 9.698 1,0 547 0,2 173 0,1 448 0,2 491 0,2 3.038 1,3 866 0,4 2.086 0,8 5.074 2,1 1.387 0,3 722 0,3 7.023 2,5 14.730 6,3 1.892 0,9 12.120 5,8 117.757 46,8 17.458 7,7 26.537 7,8 25.265 12,3 720 0,4 642 0,5 3.749 1,7 298 0,3 252.931 100

% 0,1 0,3 0,1 (0,0) 0,1 0,2 (0,0) (0,1) (0,1) 0,1 0,4 0,4 0,0 (1,5) (4,6) 1,1 1,8 0,9 0,1 0,3 0,4 -

Var. (em%) 2005/03 Empresas Emprego 0,13 0,1 0,0 0,25 2,3 0,0 0,11 0,1 - 0,04 0,0 0,08 0,1 0,15 0,0 0,1 - 0,01 0,1 - 0,05 0,1 - 0,12 0,2 0,05 0,1 0,42 0,8 0,42 0,9 0,02 0,0 - 1,47 (2,8) - 4,63 (5,0) 1,09 0,8 1,81 1,2 0,89 0,1 0,10 0,2 0,32 0,2 0,43 0,5 (0,0) -

Fonte: MTE/RAIS, 1999 e 2005. Elaboração própria.

Após a queda de cerca de 44% no faturamento total do setor de transformados plásticos, em 2001, ocorreu uma progressiva recuperação no período de 2002 a 2005, quando o faturamento total de transformados plásticos no Brasil duplicou de US$ 8 bilhões para US$ 15,9 bilhões (veja Gráfico 3). Em 2005, a indústria brasileira produziu 4,213 milhões de toneladas de plástico. Segundo a Abiplast, foram produzidos 4,68 milhões de toneladas de resinas termoplásticas, o que significa um aumento de 12,63% na produção, em comparação com 2005. O consumo aparente nacional de resinas ficou em 4,09 milhões de toneladas, registrando, assim, um aumento de 10,25% em relação ao consumo do ano anterior. Dados da ABIPLAST - que não incluem a transformação de PET – mostram que

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Setor Econômico Químico de Plásticos

em 2006 o consumo per capita de plástico no Brasil foi de 21,78 kg, volume que tem se mantido nessa faixa desde o ano 2000 e que representa um volume reduzido, se comparado com o consumo per capita anual de plástico nos EUA, que varia entre 140 a 150 quilos, ou de países europeus, como a Bélgica, onde atinge 180 quilos (veja Tabela 2). TABELA 2 - INDICADORES DE CRESCIMENTO DO SETOR DE TRANSFORMADOS PLÁSTICOS. BRASIL, 2000/2005. Indicadores Consumo de Plástico 2000 – 2005 (Ton - %) Faturamento do Setor em US$ - % Importações de Artefatos Plásticos (%) Ton - % US$ - % Exportação de Artefatos Plásticos (%) Ton - % US$ - % Balança Comercial do Setor Plástico Ton - % US$ - % Produção por Empregado (em Toneladas) Consumo Per Capita de Plástico no Brasil (Kg) Participação do Setor Plástico no PIB Nacional (%)

2005 2003 2004 2000 2001 2002 (0,23) (3,71) 11,07 8,61 (2,44) 2,43 21,07 15,62 40,95 25,76 (33,40) 20,87 8,28 3,92 30,38 3,99 (7,24) (5,32) 17,89 (5,04) 26,42 3,39 (6,87) 1,09 11,14 41,03 3,86 19,01 9,80 (9,07) 22,93 28,94 24,21 18,69 10,51 (12,29) (110,19) (78,02) (79,71) (30,26) (52,48) (49,74) (414,75) (297,53) (376,28) (189,11) (253,16) (258,46) 16,31 16,97 17,55 20,17 18,95 17,95 23,15 21,75 23,61 23,52 22,68 22,83 2,00, 1,84 2,18 1,66 1,33 1,76

Fonte: Dados da ABIPLAST - Dados de Importação e Exportação - Sistema ALICE - Jan/2006 – MDIC.

O faturamento, em moeda nacional, da Indústria do Plástico em 2006 reduziu-se relativamente ao comparado com 2005. A indústria brasileira do plástico fechou 2006 com um faturamento bruto total de R$ 37,5 bilhões, representando um encolhimento de 3,17% em relação aos R$ 38,7 bilhões faturados em 2005. Entretanto, de acordo com levantamento da área econômica da Abiplast, o cálculo em dólar revela uma receita bruta de US$ 17,24 bilhões, o que configura um aumento de 8,14% na comparação com os US$ 15,9 bilhões apurados no ano anterior. Segundo a entidade, a principal razão para essa diferença foi a valorização da moeda nacional em relação à norte-americana (veja Gráfico 3). GRÁFICO 3 -B FATURAMENTO DA INDÚSTRIA DO PLÁSTICO. BRASIL, 2000/2005 (EM US$ MILHÕES).

Fonte: Faturamento - ABIPLAST - importações e Exportações de Artefatos - Sistema ALICE Jan/2006 – MDIC.

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As exportações alcançaram 275 mil toneladas, para mais de 50 países (33% para os do Mercosul, 23% para os países da ALADI, 14% para os Estados Unidos e 14% para a União Européia, entre outros). As importações em 2005 foram de 325 mil toneladas, no valor de US$ 1,23 bilhão, contra exportações de US$ 974 milhões, o que resultou num déficit comercial setorial de US$ 258 milhões. Em 2006, embora tenha havido crescimento tanto na importação quanto na exportação, o saldo continuou negativo e apresentou um crescimento em relação a 2005. Em 2006, as exportações de transformados plásticos totalizaram US$ 1,10 bilhão, registrando um crescimento de 13,4% em relação a 2005. Já as importações totalizaram US$ 1,44 bilhão, apontando um aumento de 17,7% na comparação com o ano anterior. Com isso, o saldo negativo na balança do setor subiu de US$ 258 milhões, em 2005, para US$ 344 milhões, em 2006, contrariando tendência de queda dos anos anteriores, num cenário de maior valorização do Real. O Fórum Nacional de Competitividade da Cadeia Plástica, de caráter tripartite, instalado em agosto de 2000, sob a coordenação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), foi criado com o intuito de desenvolver políticas para o fortalecimento da competitividade do setor. Em relatório de julho de 2006, o Fórum apresenta um balanço de suas atividade e a projeção de investimentos para o setor de transformados plásticos nos próximos anos. De acordo com o referido relatório,“os últimos cálculos indicam que, para um cenário conservador, com previsão de crescimento do PIB de 3,1%, os investimentos deverão atingir cerca de US$ 5,6 bilhões, sendo US$ 446,8 milhões na indústria de transformação (sem considerar substituição de máquinas e compras de moldes) e US$ 5,1 bilhões nas indústrias de resinas termoplásticas e insumos básicos. Com previsão de crescimento do PIB de 4,7% a.a., (...) o total investido deverá ser de US$ 13,8 bilhões, US$ 1,0 bilhão na 3ª geração (sem considerar substituição de máquinas e compras de moldes) e US$ 12,8 bilhões na 1ª e 2ª gerações petroquímicas” (MDIC. 2006). O maior programa atualmente é o de Arranjos Produtivos Locais (APL) do Plástico do Grande ABC, que terá investimento de R$ 4 milhões e poderá beneficiar 500 micro, pequenas e médias empresas de sete municípios da região22. O APL do Plástico na Grande ABC integra um conjunto de medidas para aumentar a competitividade das empresas do setor, responsáveis por um faturamento anual de R$ 2,4 bilhões (6,3% do total nacional) e 11 mil empregos diretos na região.Voltado para as empresas transformadoras, o APL do Plástico do Grande ABC prevê, ao longo de 40 meses, ações de consultoria e capacitação para gestão e processos. As iniciativas destinam-se, prioritariamente, aos participantes do grupo piloto, com cerca de cem empresas (Observatório Econômico/2006). Parte do investimento previsto para o APL do Grande ABC será destinada para a construção do Centro de Tecnologia do Plástico, na Fatec do município de Mauá, onde serão montados os laboratórios, salas de aulas e biblioteca do curso de tecnologia do Plástico, aberto em agosto de 2006. As empresas petroquímicas do Pólo de Capuava entram como financiadoras deste projeto, junto com a Fundação Paula Souza, contando ainda com a participa22

Arranjos produtivos locais são aglomerações de empresas localizadas em um mesmo território, que apresentam especialização produtiva e mantêm algum vínculo de articulação, interação, cooperação e aprendizagem entre si e com outros atores locais tais como governo, associações empresariais, instituições de crédito, ensino e pesquisa.

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ção do Centro de Informação e Apoio ao Plástico (Ciap), o IPT, a FEI-Mauá, o IMES, a Universidade Federal do ABC, a Universidade Metodista e a Escola Senai Mario Amato referência nacional nas áreas do Plástico, Cerâmica e Borracha, que também deverá abrigar uma das 14 faculdades do Senai-SP.

Mudanças estruturais, tecnológicas e na organização do trabalho O mundo do trabalho tem sido afetado nas últimas décadas por um conjunto de mudanças estruturais, tecnológicas, produtivas e organizacionais que estão impondo novos desafios para a ação sindical e criando novas demandas para a formação e qualificação profissional. As empresas têm buscado, por meio deste processo de inovação e reestruturação produtiva, aumentar a sua competitividade e produtividade, no contexto de uma economia mundial globalizada, constituindo um mercado de trabalho cada vez mais seletivo e competitivo. No caso do Brasil, que enfrenta um cenário macroeconômico marcado por 25 anos de estagnação econômica, a competição e a seletividade do mercado de trabalho tornam-se processos ainda mais intensos. O processo de inovação tecnológica e as mudanças organizacionais – enquanto parte de uma nova estratégia competitiva - têm provocado um redesenho de perfis profissionais e uma reestruturação das ocupações e postos de trabalho, na medida em que os processos de inovação exigem uma força de trabalho melhor qualificada frente aos novos padrões tecnológicos. Os processos organizacionais no interior das empresas redefinem-se de acordo com as novas técnicas gerenciais e de produção, tais como reengenharia, produção enxuta, sistemas de qualidade e gerenciamento de redes, gerando estruturas institucionais mais complexas que também pressionam por novas demandas em relação à formação e qualificação profissional. Surge como uma imposição de muitas empresas que a força de trabalho seja cada vez mais polivalente, flexível e familiarizada com as novas tecnologias e as novas estratégias de organização do trabalho. Neste contexto, observa-se que o setor petroquímico tem experimentado um processo de crescente amadurecimento tecnológico, resultando em maior competição por inovações de produtos nos diversos processos de produção, em que pese o quadro de grande desigualdade no interior da cadeia produtiva. A seguir, são abordadas as mudanças tecnológicas e organizacionais que estão em curso no conjunto do setor petroquímico e, em seguida, as mudanças no ramo dos transformados plásticos.

Mudanças estruturais e a petroquímica brasileira. O setor petroquímico brasileiro foi afetado por um cenário de maior competição internacional, com a abertura comercial brasileira realizada nos anos 90. Houve, após a abertura, uma queda nos investimentos em P&D, justamente no momento em que o mercado tornou-se mais competitivo. Os investimentos do início desta década concentraram-se na busca da redução de custos e em engenharias não-rotineiras23, com esforços das empresas em 23

Engenharia não-rotineira são atividades de engenharia que envolve a utilização de conhecimentos para obtenção de soluções inovadoras.

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obter certificações de qualidade, além de investimentos de curto prazo devido à insegurança do ambiente macroeconômico. Verificou-se ainda uma significativa redução, a patamares considerados mínimos, do intercâmbio entre universidades, setores de ciência e tecnologia e indústrias. Este quadro somente começou a mudar na segunda metade dos anos 90, após as empresas já terem alcançado a otimização de seus processos produtivos. Mas a pequena escala de produção, os baixos gastos em P&D, juntamente com a reduzida demanda por produtos petroquímicos com maior conteúdo tecnológico no mercado interno, contribuíram para desestimular as empresas brasileiras na expansão da sua capacidade inovadora, adiando a busca por conteúdo tecnológico de ponta (SENAI. 2004). Os gastos em P&D na petroquímica brasileira não chegam a 1% da receita líquida anual, enquanto os líderes internacionais do setor investem 4% de uma base de faturamento muito superior. Este patamar reduzido de investimento em P&D tem sido uma deficiência que acompanha o setor, antes e após a abertura comercial dos anos 90, não tendo em momento algum ultrapassado o patamar de 1% de investimento. Considerando o conjunto da cadeia produtiva, são as indústrias de 1ª e 2ª gerações as que mais investem em inovação e pesquisa, sendo que no âmbito das transformadoras plásticas, segmento caracterizado por milhares de micro e pequenas empresas, este tipo de gasto é ainda mais reduzido ou mesmo raro. Por outro lado, tem sido crescente a participação das empresas estrangeiras no mercado nacional, seja por exportações diretas de seus produtos, seja por meio do estabelecimento de subsidiárias ou mesmo por aquisição de empresas já existentes. Neste sentido, o licenciamento de tecnologias estratégicas parece ser improvável ou mesmo muito dispendioso. A alternativa para a indústria nacional continua sendo o crescimento dos investimentos em P&D no país. Com algumas exceções, as empresas brasileiras detêm pouco conhecimento em produtos/aplicação, pois geralmente foram incorporando a cultura da sócia estatal, Petrobrás, a qual sempre priorizou os processos produtivos. Como o crescimento da petroquímica brasileira foi elevado no final dos anos 1970 e início dos anos 80, período no qual a tecnologia estava disponível, prioridade foi dada para a especialização dos técnicos e busca de melhorias em engenharia de processo. Isso se intensificou com a abertura comercial brasileira, quando as empresas passaram a se preocupar principalmente com a redução de custos, para garantir níveis de competitividade mínimos necessários à sobrevivência (SENAI. 2004). A Braskem – uma das cinco maiores indústrias privadas de capital nacional do setor de petroquímicos básicos (indústria de 1ª geração) e líder de mercado na América Latina no segmento de resinas termoplásticas – é a empresa brasileira que tem registrado o maior índice de investimento em pesquisa e inovação e obtido resultados satisfatórios24. Em 2003, por exemplo, grande parte de seus investimentos em P&D foram destinados ao lançamento de uma resina inédita no mercado latino-americano: uma nova família de polietilenos, baseada na tecnologia do metaloceno25, que se destina a aplicações que exigem melhor qualidade. 24

O processo de reestruturação na petroquímica brasileira e as privatizações realizadas, desde o início da década de 1990, deram lugar a significativa redução da presença do Estado, a participação mais intensa dos grupos privados nacionais e, mais recentemente, a fusão/integração sob o comando do consórcio Odebrecht-Mariani, transformando-o atualmente no grupo líder patrimonial da petroquímica brasileira, com a criação da Braskem.

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O Centro de Inovação e Tecnologia Braskem (CITB), em Triunfo (RS), onde trabalha uma equipe de mais de 150 pesquisadores, gera importantes desenvolvimentos tecnológicos para a empresa que, em 2003, registrou sua centésima patente e conseguiu apoiar seus clientes com a realização de mais de mil testes. Entretanto, apesar destes avanços, localizados em maior parte nas empresas de 1ª e 2ª gerações, os níveis de investimento em inovação e pesquisa continuam muito abaixo da média dos países líderes no setor, tendo em vista o elevado montante do faturamento destes. O Brasil não apresenta incentivos fiscais e/ou financiamentos a juros subsidiados para as atividades de P&D. O Sistema Nacional de Inovação ainda não está integrado ao setor. Somente agora, com o início da discussão de uma Lei de Inovação26, é possível visualizar uma preocupação do governo com esta importante atividade para a petroquímica brasileira. As empresas brasileiras do setor, com poucas exceções, não aparentam possuir uma estratégia tecnológica definida (SENAI. 2004).

As transformações recentes na indústria de transformados plásticos Embora num ritmo mais lento e num contexto marcado por diversas dificuldades, a Indústria de Transformação de Plásticos brasileira tem acompanhado as mesmas inovações da indústria internacional. O segmento da indústria de transformação de plásticos recebe impactos, em termos de inovações tecnológicas, das mudanças ocorridas no conjunto da indústria petroquímica. A indústria de resina, por exemplo, tem baseado seu esforço competitivo numa estratégia de descomoditização27, que “tem por objetivo capturar nichos de mercado de alto valor agregado, por meio de atendimento aos requisitos dos usuários de forma mais completa possível. A inovação em aplicações torna-se essencial para a criação de novas oportunidades de negócios, mediante a criação de novos mercados. Essas inovações, mesmo quando desenvolvidas na indústria petroquímica, são efetivadas no setor de transformados plásticos” (TEIXEIRA. 2005). As mudanças na estrutura da indústria de transformados plásticos no Brasil têm sido pressionadas pela concorrência das empresas estrangeiras que atuam no setor (39,7%)28, as quais têm ampliado a participação tanto no mercado de produtos técnicos de alta qualidade como no mercado de produtos finais. Em resposta, a indústria nacional tem buscado desenvolver processos de inovação que vão desde a tentativa de aperfeiçoamento O polietileno com tecnologia metaloceno é o mais moderno processo para fabricação de resinas plásticas, matéria-prima usada como embalagem para alimentos. A Braskem é a primeira da América Latina a fabricar o metaloceno. A previsão era de que o potencial de mercado da resina chegaria a US$ 100 milhões anuais, até 2006. Somente nos Estados Unidos, a demanda por metalocenos vem crescendo 25% ao ano. 26 A Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, estabelece medidas de incentivos a inovação e a pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas para a capacitação e ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento industrial do País. 27 Descomoditização pode ser caracterizado como um processo de crescente sofisticação e segmentação em especialidades. 28 Segundo dados de um estudo promovido pelo Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia da Unicamp (NEIT), em março de 2003 (a partir da PIA-IBGE), a indústria de transformados plásticos participava com 4,1% do faturamento total da indústria brasileira, sendo que as empresas estrangeiras correspondiam a 39,7% do total do setor. 25

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na relação e gestão entre as empresas de 2ª e 3ª gerações até a difusão de novos produtos, cuja qualificação para a sua produção (a exemplo das blendas e grades) tem chegado mais às empresas grandes e médias. Há também o esforço de ampliação dos pólos de ferramentaria de Caxias do Sul e Joinville, além da criação de novas unidades. O processo produtivo da indústria de transformação plástica, ao contrário da produção de resinas, baseada em processos contínuos, é caracterizado pelo uso de máquinas organizadas em processo discretos ou intermitentes29. Os principais processos de produção de plásticos são: filme-extrusão, injeção e sopro. Várias inovações estão sendo introduzidas nas máquinas que são utilizadas pela indústria de transformação plástica. Entretanto, a necessidade de modernização do parque de máquinas é reconhecida pelo Fórum da Competitividade coordenado pelo MDIC30. As principais inovações nas máquinas são as seguintes: introdução de dispositivos de controle automatizados (CLPs) com interface amigável, baseados em sistema operacional Windows e que permite a interligação com sistema de geração do tipo ERP (Electronic Data Processing); extrusoras que permitem a extrusão de várias resinas ao mesmo tempo (coextrusão), dando ao produto final características técnicas e de design particulares; injetoras que incorporam manipuladores automáticos (robôs) para realizar a operação de descarga do produto na máquina; uma nova família de injetoras permite a injeção de mais de uma resina (multicomponentes), tornando possível a fabricação de peças com características técnicas e de design diversificadas; permanente evolução das máquinas no sentido da precisão mecânica que aumenta a repetibilidade e a produtividade dos processos de transformação; a inovação em design é outra ferramenta competitiva importante na indústria de transformação de plástico (TEIXEIRA. 2005). Na atividade de design, a principal inovação é a utilização de ferramentas de prototipagem rápida31, que permite a concepção de produtos com o uso de CAD, a simulação da fabricação de peças experimentais, antes que o molde propriamente dito seja feito por meio Nas indústrias do tipo contínuo os equipamentos executam as mesmas operações de maneira contínua e o material se move com pequenas interrupções entre eles até chegar ao produto acabado. Nas indústrias com processos discretos ou intermitentes há diversidade de produtos fabricados e tamanho reduzido do lote de fabricação, aspectos que determinam que os equipamentos apresentem variações freqüentes no trabalho. Pode ser divido por lotes (ao término da fabricação de um produto outros produtos tomam seu lugar nas máquinas, de maneira que o primeiro produto só voltará a ser fabricado depois de algum tempo) ou por encomenda (o cliente apresenta seu próprio projeto do produto, devendo ser seguidas essas especificações na fabricação). 30 Deve-se ressaltar que, além da atualização em termos de máquinas e equipamentos, os principais fatores de competitividade para as transformadoras plásticas são dados pelas condições de acesso a matérias-primas (preços, qualidade e diversidade), pela capacidade das empresas em ampliar seus mercados, especialmente naqueles mais dinâmicos e com elevado valor agregado, e pela possibilidade de acessos freqüentes a novos moldes e matrizes (Teixeira. 2005). 31 Nos últimos anos surgiu uma nova família de máquinas altamente inovadoras que permitem, com tecnologias e materiais diferentes, obter um protótipo de um modelo ou de um molde, de maneira precisa e rápida a partir do modelo sólido gerado no sistema CAD 3D (software de modelagem). Tais máquinas, conhecidas como máquinas de Prototipagem Rápida, permitem obter peças físicas acabadas, de modo automático, de qualquer forma e em dimensões finais, com complexidade e detalhes que não permitiriam sua obtenção em máquinas convencionais de usinagem, ou tornariam sua execução demorada ou complexa em centros de usinagem numericamente comandados. Estima-se que as economias de tempo e de custos proporcionadas pela aplicação das técnicas de prototipagem rápida na construção de modelos sejam da ordem de 70% a 90%. 29

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de usinagem integrada por computador. Segundo Teixeira (2005), lentamente está se formando uma mentalidade de valorização do design como ferramenta competitiva. Com isso, investe-se cada vez mais na formação de pessoal para essa área. Para isso, ferramentas computadorizadas, desde o CAD32/CAE, passando pela prototipagem rápida, até usinagem, usadas de forma integrada, são inovações que precisam ser difundidas com mais vigor na indústria brasileira33. Além disso, as atividades de aditivação e compostagem têm resultado no desenvolvimento de novas aplicações, exigindo a integração das áreas mercadológicas e de desenvolvimento de aplicações (via formulações). Em termos de gestão, algumas empresas estão adotando ferramentas gerenciais modernas, como Gestão de Qualidade Total, Seis Sigma, Produção Enxuta etc. Além disso, as empresas mais qualificadas estão procurando implantar sistemas integrados de gestão, aproveitando os novos controles computadorizados das máquinas, integrando-os com ERPs34. Também devido a predominância de micro e pequenas empresas, o setor de transformados plásticos tem passado por um processo ainda lento de modernização tecnológica, motivado pela entrada de empresas estrangeiras, principalmente enquanto concorrentes no mercado de materiais plásticos para as indústrias automobilísticas, eletrônicas e de eletrodomésticos, além do aumento gradual da sofisticação do mercado consumidor de produtos finais. Essas MPEs transformadoras de plástico, descapitalizadas e sem condições de pleitear financiamentos, não têm sido capazes de realizar os investimentos necessários e sustentar a demanda, e de certa forma “a aposta da indústria de bens de capital para plástico reside no poder de fogo das grandes transformadoras”(VALOR ECONÔMICO. 2004).35

Evolução do emprego, perfil dos trabalhadores e estrutura ocupacional: impactos sobre a demanda por qualificação profissional. Apesar de todos os problemas enfrentados pela indústria transformadora de plásticos, observa-se uma forte expansão do número de ocupados no setor: mais de 35% somente entre 2002 e 2005 . Do total de ocupados neste último ano, apenas 13% eram empregados Computer Aided Design (CAD), ou Desenho Auxiliado por Computador é o nome genérico de sistemas computacionais (softwares) utilizados pela engenharia, geologia, arquitetura e design para facilitar o projeto e desenhos técnicos. 33 O setor de transformados plásticos no Brasil encontra restrições quanto à modernização tecnológica e à melhoria de sua competitividade também decorrentes das dificuldades de acesso a financiamento e ao custo elevado do investimento em máquinas e equipamentos. Ambas de fabricação alemã, a máquina BA 25, por exemplo, custa em torno de R$ 3 milhões, enquanto que a BM 304-SE, aproximadamente R$ 500 mil. A BA 25 é uma máquina sopradora considerada top de linha em matéria de sopradora de plástico, com 20 litros de capacidade e força de fechamento equivalente a 15 toneladas. A BM 304-SE é uma sopradora de simples estação de até 5 litros (Valor Econômico 2004). 34 ERP: Enterprise Resource Planning (Planejamento de Recursos Empresariais) - são sistemas de informações transacionais cuja função é armazenar, processar e organizar as informações geradas nos processos organizacionais agregando e estabelecendo relações de informação entre todas as áreas de uma companhia. 35 Embora o segmento de MPEs do setor de transformados plásticos tenha maior dificuldade para realizar investimentos em inovação, tecnologia e qualificação da força de trabalho, algumas iniciativas de entidades governamentais e empresariais estão buscando fortalecê-lo. Uma destas iniciativas tem sido o apoio ao desenvolvimento de Arranjo Produtivo Locais (APL), organizados e/ou apoiados por instituições como o SEBRAE, SENAI e órgãos governamentais ligados aos Ministérios do Desenvolvimento, Industria e Comércio Exterior (MDIC) e Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), com a participação do BNDES. 32

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sem carteira assinada, 2,6% eram trabalhadores por conta própria, 3,7% eram empregadores, apenas 1% eram trabalhadores não remunerados e cerca de 80% trabalhadores com carteira de trabalho assinada36. A proporção de trabalhadores sem carteira assinada ainda reduziu de 13,9% em 2002 para 13% em 2005 (PNAD/IBGE). Estes dados mostram, portanto, que a forte expansão da ocupação não esteve associada ao aumento da informalidade, mas se manteve no segmento o elevado grau de formalização. A expansão do emprego formal (39%) foi expressiva entre 1999 e 2005 (RAIS/MTE), aumentando num ritmo superior ao crescimento do número de empresas (32,7%) do setor, e contribuindo para que o número médio de empregados por empresa aumentasse de 27,3% para 28,6%, no período de 1999 a 2005. Com a expansão da produção, observa-se também uma média maior de expansão do emprego em 2004 (6,9%) e 2005 (7,4%), taxas mais elevadas do que a média do período 2001-2003 (RAIS/MTE. 2000 a 2005). Este elevado ritmo de crescimento do emprego formal indica a necessidade de aumentar a oferta de cursos de formação e qualificação de força de trabalho para o segmento. A distribuição dos empregados, segundo as unidades da federação, apontando o Estado de São Paulo como o principal empregador (quase 120 mil empregos formais em 2005) e como o maior gerador de vagas (mais de 24 mil entre 1999 e 2005) mostra que boa parte dos esforços de formação e qualificação profissional deve ser realizada neste Estado (veja Tabela 1). Na seqüência, os esforços nesse sentido devem também ser direcionados para os estados de Santa Catarina - que passou da terceira para a segunda posição no período 1999-2005, com 26.537 empregados neste último ano, com a abertura de mais de 9.500 novas vagas no período. Também deve ser dada atenção especial ao Rio Grande do Sul, que passou a ocupar o terceiro lugar em 2005, com 25.265 empregados, abrindo mais de 7 mil novas vagas entre 1999 e 2005, além de ter 1.086 empresas (mais do que as 687 existentes em Santa Catarina). A expressiva abertura de novas vagas, entre 1999 e 2005, nos estados do Amazonas (quase 7 mil), do Paraná (6.361 novas vagas), de Minas Gerais (5.761 novas vagas) e Bahia (quase 3.500 novas vagas) também colocam estes estados como prioritários para a realização de cursos de formação e qualificação profissional para o segmento da indústria de transformação plásticos. Apesar de o Estado do Rio de Janeiro apresentar uma participação expressiva (5%) no total do emprego formal da indústria plástica brasileira em 2005, sua participação relativa no emprego formal total reduziu-se, sendo o único Estado a eliminar empregos formais (- 1.729 vagas), entre 1999 e 2005. O emprego formal no conjunto dos estados mencionados representava mais de 90% do total em 2005, e nesses estados concentraram-se cerca de 70% dos novos empregos formais gerados pela indústria de transformação plástica brasileira, entre 1999 e 2005. Entretanto, considerando as taxas expressivas de crescimento do emprego formal em vários estados da região Nordeste, o público alvo prioritário para os programas de for36

A participação de trabalhadoras (36,3%) no total de empregados sem carteira de trabalho assinada é mais elevada do que a participação do gênero no total de ocupados no setor (25,5%). Cf PNAD/IBGE 2002 e 2005.

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mação e qualificação profissional, definido pelo Plano Nacional de Qualificação Profissional, e ainda as históricas desvantagens em termos de rede de qualificação e formação de recursos humanos naquela região, esforços especiais devem ser direcionados principalmente aos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Alagoas. A análise do perfil dos trabalhadores do setor formal da indústria de transformação de plásticos mostra que o conjunto é constituído, em sua grande maioria, por pessoas do gênero masculino, de 18 a 49 anos, com grau de instrução entre o Ensino Fundamental completo e o Ensino Médio completo, recebendo salários entre 1 e 5 mínimos (veja Tabelas 3,4,5 e 6). Entretanto, observa-se que mais de 21% do total não concluíram sequer o Ensino Fundamental e 34% não concluíram o Ensino Médio. Isso mostra que parcela expressiva da força de trabalho tem conseguido desenvolver suas atividades com reduzida instrução formal, mas também que há um volume elevado de trabalhadores que poderiam ser alvo prioritário de cursos de formação voltados para a elevação do grau de instrução formal e de programas de certificação. A elevação da escolaridade ganha relevância quando se observa que entre 1989 e 2005, enquanto o total de empregos formais quase dobrou, ocorreu uma redução absoluta do número de empregados que não concluíram sequer o Ensino Fundamental (veja Tabela 5). Além disso, o reduzido grau de instrução formal revela as limitações impostas à maioria dos trabalhadores deste setor em termos de poder desenvolver as atividades mais sofisticadas colocadas pelos processos tecnológicos, organizacionais e pelas novas exigências em termos de organização do trabalho devido às transformações em curso no setor. Apesar da presença majoritária do gênero masculino nestas atividades, o volume de empregados do gênero feminino elevou-se no mesmo ritmo do gênero masculino, entre 1999 e 2005, revelando que o acesso às atividades neste segmento não está fechado para o gênero feminino; ao contrário, deve estar sendo melhorado pelo maior grau médio de escolaridade que este gênero apresenta (veja Tabela 3). Considerando a maior participação relativa no universo de assalariados sem carteira assinada neste setor e as históricas práticas de discriminação do gênero feminino no mercado de trabalho, a organização de cursos de formação e de qualificação para os trabalhadores deste segmento deve identificar os grupos ocupacionais que eventualmente encontrem-se fechados para o trabalho feminino, assim como identificar quais deles estão associados a melhores postos de trabalhos, em termos de rendimentos, benefícios trabalhistas e prestigio ocupacional, com o objetivo de garantir que a presença feminina seja ampliada nos cursos de formação e qualificação que contribuam para o acesso aos melhores postos de trabalho, reduzindo com isso as enormes diferenças de gênero existentes no mercado de trabalho brasileiro. A forte presença de jovens trabalhadores de 18 a 29 anos na indústria de transformação plástica sugere que este é um segmento também aberto para pessoas jovens e com reduzido grau de formação e qualificação profissional (veja Tabela 4). Assim, o desenvolvimento de cursos de formação e qualificação, com certificação compatível aos ensinos fundamental e médio, para jovens desempregados nas regiões de maior presença e expansão do emprego na indústria plástica poderá contribuir para reduzir as altas taxas de desemprego e a situação de vulnerabilidade em que se encontram os jovens no mercado de trabalho brasileiro.

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TABELA 3 - EMPREGADOS DO SETOR FORMAL NA INDÚSTRIA PLÁSTICA, SEGUNDO GÊNERO. BRASIL, 1989, 1999 E 2005 % 72,8 27,2 100

1999 132.386 49.530 181.916

Gênero Masculino Feminino Total

Var. (em %) 2005/99 39,1 39,0 39,0

% 72,8 27,2 100

2005 184.095 68.836 252.931

Fonte: MTE / RAIS 1989 / 1999 / 2005 (CNAE - Grupo 252).Elaboração Própria.

TABELA 4 - EMPREGADOS DO SETOR FORMAL NA INDÚSTRIA PLÁSTICA, SEGUNDO FAIXA ETÁRIA. BRASIL, 1989, 1999 E 2005 Faixa Etária Ate 17 anos 18 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 64 anos 65 ou mais Ignorado Total

1989 9.216 46.651 26.615 31.544 12.550 4.963 301 1.056 132.896

% 6,9 35,1 20,0 23,7 9,4 3,7 0,2 0,8 100

1999 2.801 47.603 38.464 57.197 27.207 8.196 426 22 181.916

% 1,5 26,2 21,1 31,4 15,0 4,5 0,2 0,0 100

2005 2.761 66.535 53.876 75.268 40.431 13.492 566 2 252.931

% 1,1 26,3 21,3 29,8 16,0 5,3 0,2 100

Var. (em %) 2005/99 -1,4 39,8 40,1 31,6 48,6 64,6 32,9 -90,9 39,0

Fonte: MTE / RAIS 1989 / 1999 / 2005 (CNAE –Grupo 252).Elaboração Própria.

TABELA 5 - EMPREGADOS DO SETOR FORMAL NA INDÚSTRIA PLÁSTICA, SEGUNDO GRAU DE INSTRUÇÃO. BRASIL, 1989, 1999 E 2005 Grau de Instrução Analfabeto 4ª série incompleta 4ª série completa 8ª série incompleta 8ª série completa 2º grau incompleto 2º grau completo Superior incompleto Superior completo Ignorado Total

1989 2.675 18.959 39.896 38.331 18.431 6.762 5.702 687 936 517 132.896

% 2,0 14,3 30,0 28,8 13,9 5,1 4,3 0,5 0,7 0,4 100

1999 2.086 8.441 22.680 40.012 45.148 20.281 32.009 4.591 6.668 181.916

% 1,2 4,6 12,5 22,0 24,8 11,2 17,6 2,5 3,7 100

2005 569 6.271 14.758 32.713 55.461 30.795 93.747 7.810 10.807 252.931

% 0,2 2,5 5,8 12,9 21,9 12,2 37,1 3,1 4,3 100

Var. (em %) 2005/99 -73 -26 -35 -18 23 52 193 70 62 39

Fonte: MTE / RAIS 1989 / 1999 / 2005 (CNAE - Grupo 252).Elaboração Própria.

A abertura de novos empregos formais, no período de 1999 a 2005, totalmente concentrada nas faixas de rendimentos de até 5 salários mínimos, especialmente na faixa de 1 a 2 salários mínimos, aliado ao fechamento de vagas nas faixas de rendimentos superiores, sugere que os empregos formais gerados não estão associados a fortes requerimentos técnicos de formação e qualificação profissional, que geralmente são acompanhados de salários mais elevados (veja Tabela 6). Os requisitos profissionais para ocupar a maior parte das vagas geradas pela indústria plástica devem estar muito mais associados ao grau de instrução formal, ou seja, à conclusão do Ensino Fundamental e, principalmente, do Ensino Médio.

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Setor Econômico Químico de Plásticos

TABELA 6 - EMPREGADOS DO SETOR FORMAL NA INDÚSTRIA PLÁSTICA, SEGUNDO FAIXA DE RENDIMENTO MÉDIO. BRASIL, 1989, 1999 E 2005. Faixa de Rendimento médio Até 1,00 SM De 1,01 a 2,00 SM De 2,01 a 5,00 SM De 5,001 a 10,00 SM Acima de 10,01 SM Ignorado Total

1989 3.095 50.219 62.719 10.393 3.741 2.729 132.896

% 2,3 37,8 47,2 7,8 2,8 2,1 100

1999 1.318 29.076 104.507 31.664 14.689 662 181.916

% 0,7 16,0 57,5 17,4 8,1 0,4 100

2005 2.773 82.596 128.134 27.007 10.595 1.826 252.931

% 1,1 32,7 50,7 10,7 4,2 0,7 100

Var. (em %) 2005/99 110,4 184,1 22,6 -14,7 -27,9 175,8 39,0

Fonte: MTE / RAIS 1989 / 1999 / 2005 (CNAE - Grupo 252).Elaboração Própria.

Os dados da Tabela 7 mostram a composição da estrutura ocupacional da indústria plástica brasileira e sua evolução no período de 2003 a 2005. Observa-se que 40 tipos de ocupações são responsáveis por mais de 90% do emprego formal neste ramo de atividade. Apenas entre 2003 e 2005, o volume de emprego formal aumentou 18%, o que significou a abertura de pouco mais de 38 mil novas vagas. Esta expansão ocorreu tanto para o conjunto de ocupações específicas da indústria plástica, como para ocupações gerais, que são encontradas nos mais diversos ramos de atividade produtiva, tais como: ocupações administrativas, nas atividades de limpeza, segurança, de alimentação de empregados, de construção e reparos dos edifícios etc. A conformação de um segmento constituído por grupos de ocupações específicas ao ramo de transformação plástica, ou seja, de grupos ocupacionais mais diretamente ligados à produção de transformados plásticos pode permitir que a análise da estrutura ocupacional e de sua evolução recente revele de forma mais clara quais são as atividades específicas do segmento que apresentam maior expressão quantitativa e maior expansão do volume de emprego, passo importante para diagnosticar as demandas por formação e qualificação profissional associadas ao desenvolvimento das atividades principais do ramo plástico. Este segmento constituído por ocupações quantitativamente mais expressivas e específicas do ramo plástico está constituído na Tabela 8. É formado por 16 grupos ocupacionais que eram responsáveis por 163 mil empregos formais em 2005, cerca de 65% do total dos 252 mil empregos formais do ramo plástico . A análise destes grupos ocupacionais específicos do ramo plástico deve considerar pelo menos duas dimensões: a) a distribuição da estrutura ocupacional; e b) as dinâmicas de expansão e redução das ocupações. Na primeira perspectiva, observa-se que oito grupos de ocupações mais importantes em número de empregados respondem por 86,5% do total dos empregados em ocupações específicas do ramo plástico. O grupo de ocupações constituído por embaladores e alimentadores de produção e operadores de instalações em indústrias químicas, petroquímicas e afins são, de longe, as mais importantes em número de empregados . O fato de representarem mais da metade dos empregados no grupo de ocupações específicas do ramo plástico já justifica uma atenção especial em relação aos requisitos de formação e qualificação profissional a elas associadas. Além disso, considerando a dinâmica de expansão do emprego nessas duas ocupações, observa-se que elas foram responsáveis – principalmente a de embaladores e alimentadores - pela abertura de

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Educação Integral dos Trabalhadores

16 mil novas vagas, cerca de 45% das novas vagas abertas no grupo de ocupações específicas do ramo plástico, entre 2003 e 2005 (veja Tabela 7). TABELA 7 - EMPREGADOS DO SETOR FORMAL DA INDÚSTRIA PLÁSTICA, SEGUNDO O TIPO DE OCUPAÇÃO. BRASIL, 2003 E 2005 Tipo de Ocupação Embaladores e alimentadores de produção Operadores de instalações em indústrias químicas, petroquímicas e afins Técnico em ciências físicas e químicas Escriturários em geral, agentes, assistentes e auxiliares administrativos Operadores de utilidades Trabalhadores de usinagem de metais e de compósitos Trabalhadores da produção gráfica Operadores de outras instalações químicas, petroquímicas e afins Escriturários de controle de materiais e de apoio À produção Técnicos de nível médio em operações industriais Condutores de veículos e operadores de equipamentos de elevação Mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos industriais Trab. de montagem de tubulações, estruturas metálicas e de compósitos Trab. nos serviços de administração, conservação e manutenção Supervisores de produção, em indústrias químicas, petroquímicas e afins Gerentes de áreas de apoio Técnicos de nível médio em operações comerciais Trabalhadores da confecção de roupas Gerentes de produção e operações Operadores de instalações e equipamentos de produção de metais e ligas Trabalhadores nos serviços de proteção e segurança Outros trabalhadores da conservação e manutenção Supervisores de serviços administrativos (exceto atendimento ao público) Trabalhadores de conformação de metais e de compósitos Trab. de instalações e equipamentos de material de construção e cerâmica Montadores de máquinas e aparelhos mecânicos Vendedores e demonstradores Profissionais de organização e administração de empresas e afins Trabalhadores de manobras sobre trilhos e movimentação e cargas Trab. de tratamento térmico e de superfícies de metais e de compósitos Trabalhadores da confecção de calçados Trabalhadores das industrias têxteis Técnicos das ciências administrativas Trabalhadores de informações ao público Eletricistas eletrônicos de manutenção industrial, comercial e residencial Técnicos em eletroeletrônica e fotônica Escriturários contábeis e de finanças Montadores e instaladores de equipamentos eletroeletrônicos em geral Trabalhadores da construção civil e obras públicas Operadores de equipamentos na preparação de alimentos e bebidas Sub Total Total

2003 34.606 34.443 11.957 11.494 10.759 8.018 7.874 6.608 6.589 5.215 4.312 3.563 3.427 3.409 3.077 2.457 2.427 2.372 2.106 2.069 1.982 1.853 1.827 1.675 1.669 1.620 1.612 1.568 1.559 1.463 1.436 1.201 1.139 1.088 1.068 1.017 975 974 855 785 194.148 214.694

% 2005 16,1 47.718 16,0 37.424 5,6 10.547 5,4 13.382 5,0 11.862 3,7 9.098 3,7 9.487 3,1 8.244 3,1 7.915 2,4 6.556 2,0 5.012 1,7 4.361 1,6 3.645 1,6 3.929 1,4 3.238 1,1 2.978 1,1 2.786 1,1 2.422 1,0 2.577 1,0 2.362 0,9 2.137 0,9 2.379 0,9 2.002 0,8 1.775 0,8 1.732 0,8 1.991 0,8 2.189 0,7 1.952 0,7 1.652 0,7 1.977 0,7 1.462 0,6 1.870 0,5 1.213 0,5 1.231 0,5 1.262 0,5 1.162 0,5 1.327 0,5 1.778 0,4 1.169 0,4 1.194 90,4 228.997 100 252.931

% 18,9 14,8 4,2 5,3 4,7 3,6 3,8 3,3 3,1 2,6 2,0 1,7 1,4 1,6 1,3 1,2 1,1 1,0 1,0 0,9 0,8 0,9 0,8 0,7 0,7 0,8 0,9 0,8 0,7 0,8 0,6 0,7 0,5 0,5 0,5 0,5 0,5 0,7 0,5 0,5 90,5 100

Var. (em %) 2005/03 37,9 8,7 - 11,8 16,4 10,3 13,5 20,5 24,8 20,1 25,7 16,2 22,4 6,4 15,3 5,2 21,2 14,8 2,1 22,4 14,2 7,8 28,4 9,6 6,0 3,8 22,9 35,8 24,5 6,0 35,1 1,8 55,7 6,5 13,1 18,2 14,3 36,1 82,5 36,7 52,1 17,9 17,81

Fonte: MTE/RAIS, 2003 e 2005. (CNAE - Grupo 252). Elaboração Própria.

O grupo ocupacional técnicos em ciências físicas e químicas ocupa uma posição importante na estrutura ocupacional do ramo plástico, empregando mais de 10 mil trabalhadores. Entretanto, foi a única ocupação que apresentou redução do número de empregados (-1.400 postos de trabalho), entre 2002 e 2005, o que significou a

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Setor Econômico Químico de Plásticos

perda de participação desta ocupação na estrutura ocupacional do ramo plástico. Considerando que este péssimo desempenho ocorreu num contexto de expressiva elevação da produção e do emprego no ramo plástico, parece muito provável que a formação de técnicos para ocuparem particularmente estas funções não deve ser prioridade para os programas de formação profissional. Isso não significa, no entanto, que não possa haver demandas de técnicos para ocuparem outras ocupações no ramo plástico, ou mesmo que não possa haver demandas, regionalmente localizadas, por esses profissionais. Neste sentido, vale destacar que o grupo ocupacional formado por técnicos de nível médio em operações industriais é o oitavo mais importante, em número de empregados, dentre os grupos de ocupações específicas do ramo plástico. Somente entre 2003 e 2005 foram abertas mais de 1.300 novas vagas para este posto de trabalho (veja Tabela 8). Os grupos ocupacionais constituídos pelas ocupações de operadores de utilidade e trabalhadores de usinagem de metais e de compósitos são, respectivamente, o quarto e o quinto em número de empregados, dentre os grupos de ocupações específicas do ramo plástico. Além disso, em cada um destes grupos ocupacionais ocorreu um aumento de cerca de 1.000 empregados formais, entre 2003 e 2005. A importância destas ocupações na estrutura ocupacional e a recente geração de novas vagas também justificam uma atenção especial em relação às demandas por qualificação profissional a elas associadas, entretanto deve-se ressaltar que em função de uma expansão relativamente menor de empregados, diante do ritmo de expansão das demais, essas ocupações perderam participação na estrutura ocupacional do ramo plástico (veja tabela 8). O número de ocupados nos grupos ocupacionais trabalhadores da produção gráfica (sexta em número de ocupados) e operadores de outras instalações químicas, petroquímicas e afins (sétima em número de ocupados) apresentou um expressivo aumento relativo; em cada uma delas foram gerados pouco mais de 1.600 empregos formais, entre 2003 e 2005. Portanto, as demandas por formação e qualificação profissional associada a estas ocupações merecem também atenção especial, ainda mais se considerarmos que, dentre os oito grupos ocupacionais mais importantes em número de empregados do ramo plástico, estes dois, juntamente com embaladores e alimentadores de produção e técnicos de nível médio em operações industriais, conseguiram ampliar suas participações relativas na estrutura ocupacional; as demais tiveram suas participações relativas reduzidas. Dentre o conjunto dos outros oito grupos ocupacionais que ocupam posições menos importantes em termos de geração de empregos formais específicos do ramo plástico – responsáveis, em conjunto, por apenas cerca de 13,5% do total de empregados -, destaque deve ser dado aos responsáveis pelo maior dinamismo em termos de expansão absoluta e relativa do emprego, entre 2003 e 2005, tais como: mecânicos de manutenção e máquinas e equipamentos industriais (+ 800 vagas e expansão relativa de 22%); trabalhadores de tratamento térmico e de superfícies de metais e de compósitos (+ 514 vagas e expansão relativa de 35%); gerentes de produção e operações (+ 471 vagas e expansão relativa de 22%); montadores de máquinas e aparelhos mecânicos (+ 371 vagas e expansão relativa de 23%). Os demais grupos ocupacionais deste

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Educação Integral dos Trabalhadores

conjunto de ocupações menos importantes, além de apresentarem taxas mais modestas de expansão relativa, dado também o reduzido peso na estrutura ocupacional, apresentaram volume reduzido de variação do número de empregados, no mesmo período (veja Tabela 8). TABELA 8 - EMPREGADOS EM GRUPOS OCUPACIONAIS TÍPICOS DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMADOS PLÁSTICOS. BRASIL, 2003 E 2005. Tipos de Grupos Ocupacionais Embaladores e alimentadores de produção Operadores de instalações em indústrias químicas, petroquímicas e afins Técnico em ciências físicas e químicas Operadores de utilidades Trabalhadores de usinagem de metais e de compósitos Trabalhadores da produção gráfica Operadores de outras instalações químicas, petroquímicas e afins Técnicos de nível médio em operações industriais Mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos industriais Trab. de montagem de tubulações, estruturas metálicas e de compósitos Supervisores de produção, em indústrias químicas, petroquímicas e afins Gerentes de produção e operações Operadores de instalações e equipamentos de produção de metais e ligas Trabalhadores de conformação de metais e de compósitos Montadores de máquinas e aparelhos mecânicos Trab. de tratamento térmico e de superfícies de metais e de compósitos Sub Total Total

2003 34.606 34.443 11.957 10.759 8.018 7.874 6.608 5.215 3.563 3.427 3.077 2.106 2.069 1.675 1.620 1.463 138.480 214.694

% 16,1 16,0 5,6 5,0 3,7 3,7 3,1 2,4 1,7 1,6 1,4 1,0 1,0 0,8 0,8 0,7 64,5 100

2005 47.718 37.424 10.547 11.862 9.098 9.487 8.244 6.556 4.361 3.645 3.238 2.577 2.362 1.775 1.991 1.977 162.862 252.931

% 18,9 14,8 4,2 4,7 3,6 3,8 3,3 2,6 1,7 1,4 1,3 1,0 0,9 0,7 0,8 0,8 64,4 100

Var. (em %) 2005/03 37,9 8,7 - 11,8 10,3 13,5 20,5 24,8 25,7 22,4 6,4 5,2 22,4 14,2 6,0 22,9 35,1 17,6 17,81

Fonte: MTE/RAIS, 2003 e 2005. (CNAE - Grupo 252). Elaboração Própria.

Os dez principais grupos ocupacionais, em termos de maior dinamismo na expansão do emprego nos últimos anos, de acordo com a análise das informações da estrutura ocupacional do emprego formal no ramo plástico, assim como de algumas mudanças observadas no período de 2003 a 2005, estão hierarquizados, por ordem de importância, na Tabela 9. TABELA 9 - EMPREGADOS NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMADOS PLÁSTICOS SEGUNDO A ORDEM DE IMPORTÂNCIA DAS OCUPAÇÕES. BRASIL, 2003 E 2005 Ordem de importância da ocupação Embaladores e alimentadores de produção Operadores de instalações (e outras instalações) em indústrias químicas, petroquímicas e afins Trabalhadores da produção gráfica Técnicos de nível médio em operações industriais Operadores de utilidades Trabalhadores de usinagem de metais e de compósitos Mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos industriais Trabalhadores de tratamento térmico e de superfícies de metais e de compósitos Gerentes de produção e operações Montadores de máquinas e aparelhos mecânicos Fonte: Elaborado a partir da Tabela 8.

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Variação do emprego (2003-2005) 13.112 4.617 1.613 1.341 1.103 1.080 798 514 471 371


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A expansão do emprego neste conjunto diferenciado de ocupações, composto pelos dez grupos ocupacionais que apresentaram maior dinamismo nos últimos anos, deve ter impactos diferenciados em termos de demandas por formação e qualificação profissional. Em alguns casos, a demanda provavelmente poderá ser atendida pela elevação da escolaridade e por processos de certificação de ensinos fundamental e/ou médio (como no caso de embaladores), acrescidos de curtos períodos de treinamento e aprendizado nas próprias empresas (como nos casos de alimentadores da produção, operadores de utilidades e provavelmente de muitas atividades dos operadores de instalações - e outras instalações - em indústrias químicas, petroquímicas e afins). Nestes casos, a formação e qualificação prioritariamente para trabalhadores jovens ou com 50 anos ou mais, em grupos com forte presença do gênero feminino e de pessoas com reduzido grau de escolaridade pode ser capaz de atender a demanda de muitas empresas, ao mesmo tempo em que pode melhorar a situação de diversos grupos vulneráveis no mundo do trabalho. Em outros casos, esta demanda deve ser atendida pela oferta de cursos técnicos de Ensino Médio ou cursos equivalentes mais especializados (como provavelmente nos casos dos técnicos de nível médio em operações industriais, trabalhadores de usinagem de metais e de compósitos, mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos industriais, trabalhadores de tratamento térmicos e de superfícies de metais e de compósitos, montadores de máquinas e aparelhos mecânicos, operadores de máquinas)39. Deve-se destacar que alguns estudos apontam como ocupações principais no ramo plástico os ferramenteiros para a produção de moldes e matrizes e os técnicos de laboratórios, de polímeros e de operação de ferramentas de CAD/CAE. Nestes casos, a priorização de grupos populacionais vulneráveis em situação de desemprego nos programas de formação e qualificação deve ser complementada pela necessidade de atender as demandas associadas aos trabalhadores já ocupados e que necessitam elevar sua escolaridade, alcançar a certificação de Ensino Médio numa especialidade técnica, ou mesmo passar por cursos de aperfeiçoamento, atualização de conhecimentos e reciclagem. O aumento da demanda por profissionais que possam atuar no desenvolvimento de design de peças e matrizes, como engenheiros mecânicos e outros trabalhadores da produção gráfica, é geralmente apontado em vários estudos. As atividades de designers capazes de trabalhar no projeto de peças e moldes, assim como as atividades desenvolvidas por engenheiros de materiais e de polímeros também são consideradas ocupações em destaque no ramo plástico. Nestes casos, as demandas por qualificação profissional parecem estar associadas a maiores requisitos técnicos e científicos e à elaboração de programas voltados para profissionais com formação técnica e de nível superior relativamente especializados. 39

As empresas que participam de cadeias de suprimento organizadas de acordo com a montagem modular passam a contar com trabalhadores em atividades de montagem. As qualificações requeridas por essas atividades, que não são elevadas, geralmente têm sido supridas por treinamento interno das próprias empresas. É exigido do técnico um conhecimento mais aprofundado sobre propriedade de polímeros – envolvendo a composição dos materiais empregados e dos seus efeitos – que lhe permita estabelecer as relações entre as estruturas dos polímeros e suas propriedades (Teixeira 2005).

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Educação Integral dos Trabalhadores

Em geral, o conhecimento técnico sobre a propriedade de polímeros, sobre as propriedades dos novos produtos, blendas40, plásticos de engenharia e especiais, assim como sobre as atividades de formulação e compostagem são conteúdos que têm sido destacados por especialistas como importantes para atender às novas demandas por formação e qualificação profissional associadas às diversas ocupações que se encontram em expansão na indústria da transformação de plásticos. Conteúdos que busquem qualificar os trabalhadores para integrar diferentes etapas da transformação de plásticos também têm sido apontados como aspectos estratégicos para atender a demanda por novos tipos de profissionais, como os capazes de trabalhar na integração entre o design, a ferramentaria (moldes e matrizes) e técnicos que possam fazer a ligação das informações de mercado com o desenvolvimento de aplicações, via formulação e compostagem41. Embora seja evidente a necessidade de implantar diversos programas de formação e de qualificação profissional para atender as demandas de qualificação profissional criadas pelas recentes transformações que têm ocorrido na indústria de transformação plástica, elas não precisam representar “mudanças radicais” em termos do conhecimento já adquirido. Segundo Teixeira (2005), há a necessidade de “uma ampliação do conhecimento e da experiência dos trabalhadores, no sentido de incorporar qualificação no uso de tecnologia de informação, manutenção preventiva de máquinas e ferramentas gerenciais ao conhecimento básico na área de polímeros”.

Experiências recentes de formação profissional para o ramo plástico Nesta seção, são descritas algumas experiências de formação e qualificação profissional, atualmente em curso no setor de transformados plásticos no Brasil. Observa-se que as diversas experiências de formação e qualificação profissional são marcadas pela necessidade de lidar com a forte heterogeneidade da estrutura produtiva do ramo plástico. Uma das importantes iniciativas de formação e qualificação profissional no ramo plástico é a que vem sendo implantada, desde 2005, pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT), com o apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP). Considerando a forte presença de micro e pequenas empresas no ramo plástico, num país marcado por elevada extensão territorial, o programa tem se caracterizado pela utilização de Unidades Móveis: veículos equipados com laboratório e técnicos que vão às empresas prestar assistência tecnológica e realizar treinamento da força de trabalho. Com a criação de uma Unidade Móvel de Atendimento aos Transformadores de Plástico do Estado do Rio de Janeiro (FINEP. 2005), o projeto do INT foi iniciado com a O nome vem do inglês “blend”, que significa mistura. Uma blenda polimérica é uma mistura de polímeros, normalmente, da mesma família química. A finalidade da mistura é a obtenção de um material de características físicas, químicas e físico-químicas diferenciadas, combinadas de modo a conservar as vantagens de cada polímero. 41 Compostagem é um conjunto de técnicas aplicadas para controlar a decomposição de materiais orgânicos, com a finalidade de obter, no menor tempo possível, um material estável, rico em húmus e nutrientes minerais contendo atributos físicos, químicos e biológicos superiores (sob o aspecto agronômico) aos encontrados nas matérias-primas. 40

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aquisição de máquinas e equipamentos (extrusora dupla rosca co-rotante)42 capazes de atender a demanda por qualificação de boa parte das empresas instaladas neste Estado. Cerca de 25% das empresas do ramo plástico neste Estado empregam a extrusão como processo de transformação de plásticos. Como parte do mesmo projeto, o INT terá ainda uma máquina injetora - que, sob forte pressão, injeta o plástico no molde e dá forma ao produto - e de uma sopradora, além de equipamentos de caracterização, como o calorímetro diferencial de varredura43 e o reômetro de torque acoplado à câmara interna de mistura44. No Estado de São Paulo, destaca-se o projeto PRUMO (Projeto de Unidades Móveis), também desenvolvido pelo INP, em parceria com o IPT e as empresas do Pólo do Grande ABC. Neste projeto, engenheiros e técnicos realizam o trabalho de campo para atender às empresas no fornecimento de diagnóstico sobre deficiências produtivas e apresentar propostas de solução. Outra experiência de apoio ao desenvolvimento tecnológico do setor de transformados plásticos tem sido a Redetec - Rede de Tecnologia de Plásticos do Estado do Rio de Janeiro, uma associação sem fins lucrativos que reúne 45 das principais universidades, centros de pesquisa e instituições de fomento do Estado e que conta com a participação do INT, FINEP, SENAI-RJ e do Instituto de Macromoléculas da UFRJ. Por meio da competência técnica instalada em suas associadas, são oferecidos recursos tecnológicos às empresas para incorporá-las em suas áreas de competência, assim como promover capacitação profissional. Como referência nacional na área de transformados plásticos e similares, destaca-se também a experiência de formação profissional desenvolvida pelo SENAI. Além de desenvolver cursos e assessorias para atender às necessidades das empresas deste setor, possui especialistas nos processos de injeção, extrusão, sopro, termoformagem e design de produtos. Apenas no ano de 2006 foram treinados mais de 5.500 alunos em cursos da Formação continuada desenvolvidos na Escola do SENAI e em empresas. Segundo informações do SENAI, mais de 30 empresas do segmento do plástico tiveram seus empregados certificados, representando aproximadamente 1.110 alunos certificados em 77 treinamentos. Ameaçando a hegemonia das monorroscas, as extrusoras dupla-rosca co-rotante têm atendido às solicitações do mercado em termos de redução de gastos e aumento da escala de produção, além de menor consumo energético e degradação mínima das resinas. Este tipo de extrusora permite o desenvolvimento de novos compostos e grades de termoplásticos e também o estudo e a simulação de condições ótimas do processo de extrusão. A máquina recebe o termoplástico puro, em pedaços pequenos, faz a fusão com os componentes necessários para transformar o material no sentido desejado e produz os filamentos. Esse processo é empregado para produzir os diversos tipos de plásticos utilizados pelas indústrias. 43 Na técnica utilizada com o calorímetro diferencial de varredura, a amostra a ser investigada e um material de referência são aquecidos concomitantemente e submetidos a um programa controlado de temperatura. O princípio básico da técnica é manter a diferença de temperatura da amostra e da referência constante. Qualquer evento físico-químico que ocorra na amostra (fusão, cristalização, transição vítrea) que envolva a troca de calor com o meio deverá ser compensado com o fornecimento ou retirada de energia para que a diferença de temperatura permaneça constante. Desta forma, a técnica fornece uma curva que representa a diferença entre as energias entregues para a amostra e a referência, registrada em função da temperatura ou do tempo. 44 Reômetro de Torque é uma câmara de mistura fechada para mistura de borracha. 42

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Outra experiência relevante é a que tem sido iniciada no âmbito do Plano Setorial de Qualificação (Planseq), do setor de transformação de materiais plásticos – considerado ainda um plano piloto - desenvolvido por meio de convênios assinados entre as centrais sindicais (CUT e Força Sindical) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com a participação de entidades empresariais, como o Sindicato da Indústria de Material Plástico de São Paulo (SINDIPLAST) e a Associação Brasileira da Industria do Plástico (ABIPLAST)45. Seu objetivo para 2007 é a qualificação profissional de 4.480 trabalhadores, envolvendo profissionais atualmente vinculados às empresas (3.990 vagas) e trabalhadores desempregados (490 vagas), em 18 municípios em quatro estados. O fato de o maior número de vagas estar destinado aos profissionais que estão na ativa reflete a necessidade de qualificar a mão-de-obra já empregada. Os locais selecionados pelo Planseq para a realização dos cursos contemplam 12 municípios/regiões do Estado de São Paulo (Município de São Paulo; Guarulhos e região; Região do Grande ABC; Osasco e região; Campinas e região; Jundiaí e região; Rio Claro e região; Sorocaba e região; São Carlos e região, Bauru e região; Jaguariúna e região; Marília e região), além de três municípios da Bahia (Lauro de Freitas; Camaçari; Feira de Santana), dois municípios do Rio Grande do Sul (Montenegro e Gravataí), e um município no Paraná (Curitiba). As aulas do plano de formação da Planseq-Plástico serão ministradas pela Fundacentro, Centrais Sindicais, Abiplast e Sindiplast, atendendo o seguinte público alvo: 1) qualificação de 40 educadores que já possuem formação específica na área de transformados plásticos (operadores ou técnicos) e 20 na área de humanas e sociais; e 2) a qualificação de 4.480 trabalhadores na área de operação em máquinas injetoras de materiais plásticos. Os cursos serão desenvolvidos com uma carga horária de 200 horas, sendo 160 horas para conhecimentos específicos e 40 horas para conhecimentos gerais. O curso de moldagem por injeção (operação em máquinas injetoras - básico) será destinado aos trabalhadores desempregados e o curso de qualidade em materiais plásticos (operação em máquinas injetoras - avançado), aos trabalhadores das empresas em processo de reestruturação produtiva e aos empregados nas empresas organizadas em arranjos produtivos locais (APL)46. A discussão acerca da necessidade de formação e qualificação profissional no segmento da indústria plástica tem sido debatida com mais intensidade há vários anos, pelos sindicatos e empresas do setor, no âmbito do Fórum de Competitividade da Cadeia Produtiva do Plástico, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. A prioridade indicada por trabalhadores e empregadores é a qualificação em máquinas injetoras, com o objetivo de fortalecer tecnologicamente a cadeia produtiva do O V Seminário do setor Plástico do Grande ABC, sob o tema “Modernização e fortalecimento da 3ª Geração”, realizado em Santo André no mês de setembro de 2006, discutiu algumas das políticas de apoio à inovação e ao desenvolvimento industrial implementadas por órgãos públicos. Um dos importantes temas abordados no evento foi a implementação da Planseq (Plano Setorial de Qualificação) para o ramo plástico. 47 Os 4.480 subdividem-se da seguinte forma: 490 trabalhadores/as sem ocupação cadastrados/as no Sistema SINE e/ou beneficiários/as das demais políticas públicas de trabalho e renda; 3.780 trabalhadores/as em empresas afetadas por processos de modernização tecnológica, privatização, redefinições de política econômica e outras formas de reestruturação produtiva; 210 trabalhadores/as em empresas organizadas em Arranjos Produtivos Locais – APL. Cf. Entrevista com Julio Cesar Sacramento, assessor da CNQ. 45

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plástico. Para atender a esta demanda, no âmbito do Plano Setorial de Qualificação (Planseq), o MTE deve direcionar recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para formação e qualificação profissional no ramo plástico. Em contrapartida, as empresas e sindicatos, que são parceiros no projeto, deverão ceder equipamentos e espaço físico para o treinamento dos trabalhadores. (Cf. site do MTE)47

Considerações Finais Apesar de todas as dificuldades enfrentadas recentemente, a indústria brasileira de transformação de plásticos tem apresentado expressiva expansão da produção e do emprego. Composta em sua grande maioria por MPEs, muitas empresas do segmento apresentam dificuldades em inovar ou ter acesso às inovações tecnológicas mais avançadas do setor, além de limitações financeiras para a realização de atividades de formação e qualificação profissional. Neste sentido, a importância do papel das políticas públicas destaca-se não somente nos incentivos para o desenvolvimento de pesquisas e para a modernização tecnológica, mas também na promoção de capacitação profissional adequada aos desafios colocados pelas mudanças enfrentadas pelo setor. Várias iniciativas do setor público têm sido verificadas neste sentido, também expressas pelas discussões e orientações do fórum Nacional de Competitividade da Indústria Plástica e por vários cursos de formação e qualificação profissional atualmente sendo desenvolvidos. Entretanto, o elevado ritmo de expansão do emprego no segmento nos últimos anos, fato que pode ser acentuado por uma eventual aceleração do ritmo de crescimento da economia brasileira, assim como as mudanças tecnológicas e na organização do trabalho, apontam para a necessidade de ampliar os programas de formação e de qualificação profissional, tanto no sentido de elevar o grau de instrução formal dos trabalhadores já ocupados no setor, como no sentido de ampliar o leque de iniciativas de qualificação para atender às necessidades de formação e qualificação específicas associadas aos diferentes e importantes grupos ocupacionais, inclusive daqueles que têm exigido aprofundamento do conhecimento técnico e especializado, em nível médio ou superior em diversas atividades: desenvolvidas em laboratórios; que exigem conhecimento de polímeros; nas operações de ferramentas de CAD/CAE; na usinagem de metais e compósitos; nas atividades de manutenção, de operações industriais e de máquinas; no tratamento térmico e de superfícies; nas estratégicas etapas de design e de ferramentaria em moldes e matrizes, que também exigem integração; nas atividades de técnicos que possam fazer a ligação das informações de mercado com o desenvolvimento de aplicações, via formulação e compostagem. As características da localização geográfica da produção e do emprego e suas 47

O Planseq, instituído em 2004, é uma das ações setoriais do Plano Nacional de Qualificação (PNQ), da Secretaria de Políticas Públicas de Emprego do MTE. Já foram instalados Planseqs nas áreas de Metalurgia, Aeronáutica, Turismo, Petróleo e Gás, Agricultura Familiar e Trabalho Doméstico Cidadão. Convênios assinados em fins de 2006 possibilitarão a abertura de novos cursos em 2007, em que serão beneficiados cerca de 50 mil trabalhadores, nas áreas Naval, Hotelaria, Serviços Turísticos, Hidrelétrica, Plástico, Microcrédito, Manejo Florestal, Catadores de Material Reciclável, Serviços Industriais, Comércio, Logística, Software Livre, Biodiesel, Fruticultura, Plásticos, Software Livre, Software (proprietário), Acampamentos de Reforma Agrária, Máquinas Agrícolas, Agricultura Orgânica e Biodiesel”. Cf. MTE, Assessoria de Imprensa 2007.

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recentes tendências de transformações também apontam para a necessidade de que os programas de formação e de qualificação profissional sejam orientados para atender às necessidades das regiões e/ou unidades da federação onde a indústria de transformação de plástico encontra-se em ritmo mais elevado de expansão ou concentra maior parte do emprego. Por fim, cabe ressaltar a importância de que os programas de formação e qualificação profissional possam seguir, também nesse ramo de atividade, as orientações que definem o público alvo prioritário do Plano Nacional de Qualificação e buscam reduzir as desvantagens dos grupos mais vulneráveis no mundo do trabalho brasileiro. Considerando a expressiva expansão recente do emprego deste ramo de atividade, o aumento do emprego de forma mais desconcentrada - especialmente em estados menos industrializados das regiões Nordeste e Norte -, a elevada rotatividade no emprego que caracteriza o mercado de trabalho brasileiro e, principalmente, o fato de que parcela expressiva dos ocupados na indústria de transformação de plástico consegue desenvolver suas atividades sem profundo conhecimento técnico ou especializado, deve-se dar atenção especial aos grupos vulneráveis constituídos pela população desempregada, jovem ou com mais de 50 anos, com baixo grau de escolaridade, do gênero feminino, além de outras minorias com desvantagens e discriminadas no mercado de trabalho brasileiro. Certamente, a incorporação deste segmento nos programas de qualificação poderá atender parte importante da demanda das empresas por profissionais adequadamente qualificados para inúmeras ocupações, ao mesmo tempo em que contribui para reduzir o desemprego de grupos tradicionalmente mais vulneráveis, contribuindo para que a expansão do emprego e o desembolso de recursos públicos possam ter efetivamente como resultado também o combate à enorme desigualdade social brasileira.

Bibliografia ABIEF - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE EMBALAGENS PLÁSTICAS FLEXÍVEIS. In. http://www.abief.com.br. ABIPLAST - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DO PLÁSTICO. Histórico da Balança Comercial dos Produtos Transformados de Plástico (1996-2006).. In. http://www.abiplast.org.br. ______, Perfil 2005 - Indústria Brasileira de Transformação de Material Plástico. Abril, 2006. ABIQUIM - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA QUÍMICA. Anuário da Indústria Química Brasileira. Edição 2006. ______, RAC – Relatório de Acompanhamento Conjuntural. Ano 16. Nº 01. Janeiro de 2007. Equipe de Economia e Estatística da Abiquim. In. www.abiquim.org.br. ______, Custo da Mão-de-Obra na Indústria Química Brasileira. Edição 2006. CARUSO, Luiz Antonio Cruz e PIO Marcello José. Recomendações: setor petroquímico. Brasília: SENAI/DN, 2005. (Série Antena Temática, 2). CORRÊA, Marcia Marisa e OLIVA, Eduardo de Camargo. O Grande ABC Paulista: Políticas Públicas e Perspectivas de Desenvolvimento de um Arranjo Produtivo

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do Plástico. In. www.anpad.org.br. FURTADO, João. Estudo da Competitividade de Cadeias Integradas no Brasil: impactos das zonas de livre comércio. Cadeia: Petroquímica. Nota Técnica Final. UNICAMP – IE – NEIT. Campinas, Fevereiro de 2003. HIRATUKA, C. ; GARCIA, R. ; SABBATINI, Rodrigo . A indústria petroquímica brasileira: limites e possibilidades nas configurações produtivas globalizadas. In: João Furtado e Marcelo Pinho. (Org.). Indústria Brasileira: limites e possibilidades nas configurações produtivas globalizadas. São Carlos: Editora da Universidade Federal de São Carlos, 2003, v. , p. 39-84. INP – INSTITUTO NACIONAL DO PLÁSTICO. Prumo – Projeto de Unidades Móveis. Tecnologia e Serviços. In. www.inp.org.br. LIMA, Maria de Souza Ilca. Setor Petroquímico. Brasília, SENAI/DN 2004. (Série Ocupações Emergentes, 3). MAXIQUIM – Assessoria de Marcado. In. www.maxiquim.com.br. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR Secretaria do Desenvolvimento da Produção. Cadeia Produtiva da Indústria de Transformação Plástica – Perfil. Fórum de Competitividade. Abril, 2004. ______, Fórum de Competitividade da Cadeia Plástica. Breve resumo e andamento. Nota Técnica nº 55/06/CGTP/DESIT/SDP. Data: 21/07/2006. OBSERVATÓRIO ECONÔMICO. A hora e a vez do transformador plástico. In. Observatório Econômico. Boletim Nº 13, Ano 04. Santo André, Julho / Agosto / Setembro 2006. PLÁSTICOS EM REVISTA. O Plástico no Brasil. Edição de Agosto/2005. In. www.exportplastic.com.br. SENAI-DN. SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL – DEPARTAMENTO NACIONAL. Monografia do setor Petroquímico. Brasília 2004. (Série Monografias Ocupacionais 6). ______, Setor Petroquímico. Antena Temática – Brasília 2005. (Caderno Em Tempo nº 12). ______, Setor Petroquímico: mudança tecnológica e qualificação profissional. Brasília 2004. SOUZA, Maria Carolina A. F. de. Estudo da Competitividade de Cadeias Integradas no Brasil: impactos das zonas de livre comércio. Cadeia: Plásticos. Nota Técnica Final. UNICAMP – IE – NEIT. Campinas, Dezembro de 2002. TEIXEIRA, Francisco Lima Cruz. Indústria de transformação de plástico: mudanças estruturais e tecnológicas e impactos na formação profissional. Brasília: SENAIDN, 2005. VALOR ECONÔMICO. Valor Análise Setorial – Indústria do Plástico. 2004. In. www.valoronline.com.br.

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A Educação Profissional para o Setor Químico: plásticos • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto

A

educação profissional para o setor de plásticos está vinculada ao ramo geral da indústria na classificação do CNCT - Cadastro Nacional de Cursos Técnicos. As indústrias de plástico fazem parte do ramo petroquímico e apresentam expansão, em parte, devido ao seu baixo consumo no país quando comparado aos outros países, além de seu atrativo de baixo custo que conduz a uma substituição de outros materiais. Tendo em consideração a grandiosidade do banco de dados do CNCT, e da magnitude de certos setores econômicos, buscou-se selecionar planos de cursos de várias regiões do Brasil, podendo assim verificar se há algum enfoque distinto para o mesmo setor em localidades em que atuam empresas que podem não ter a mesma base produtiva, observando-se assim a interligação e dependência do curso a características regionais. Por outro lado, buscou-se selecionar uma instituição de ensino sob administração federal, outra estadual, outra privada particular ou privada confessional ou filantrópica, para todos os setores econômicos. Assim, objetiva-se dar uma diversidade numa pequena amostragem, e olhar se há alguma dissimilitude na perspectiva de ensino-aprendizagem a partir da dependência administrativa, considerando que todas devem se enquadrar às mesmas normas estabelecidas pela legislação. As habilitações são cursos com carga horária de, no mínimo, 1.200 horas, que permitem aos concluintes a obtenção de diploma de Técnico, são destinados aos educandos egressos do Ensino Médio ou que o estejam concluindo. Em geral, seu itinerário formativo é composto por qualificações que fazem parte das etapas para o concluinte ser técnico no setor, e a somatória de suas cargas horárias é a carga horária necessária ao Técnico, com algumas variações entre os cursos técnicos e as instituições de ensino. Contudo, as qualificações podem ser cursadas separadamente, têm carga horária menor, alguns cursos apresentam estágios para cada qualificação, outros apenas para as habilitações. Por exemplo, o itinerário formativo de um Técnico de Transformação de habilitação) é formado pelas qualificações de Desenhista de Produtos Termoplásticos (h Plásticos em Computador; Operador de Máquinas Transformadoras de Termoplásticos; Preparador de Máquinas Injetoras ou Extrusoras ou Extrusoras-sopradoras; Laboratorista de Caracterização de Polímeros; Analista de Processos e Produtos Plásticos. Em sua grande maioria, as instituições educacionais apresentam, em seus planos de curso, também processos de reconhecimento e certificação de habilidades, capacidades e competências adquiridas em atividade produtiva, fora de um espaço propriamente didático/pedagógica ou escolar, haja vista que inúmeros trabalhadores tiveram sua formação profissional nos locais de trabalho. Cada setor econômico tem suas exigências e especificidades nesse processo de certificação de competências adquiridas fora de ambiente escolar, que servem para o educando “saltar”etapas do itinerário formativo. Para uma análise comparativa dos planos de curso do setor econômico de plásticos, no que tange a forma e conteúdo do ensino-aprendizagem proposto, bem como o perfil do trabalhador requerido para ingresso e conclusão, selecionamos quatro planos de diferentes regiões e de diferentes dependências administrativas:

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CEFET-RS Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas – Administração Federal. Escola SENAI Mário Amato (São Bernardo do Campo – SP) – Administração Privada Particular. Centro de Educação Tecnológica Tupy (Curitiba – PR) – Administração Privada Filantrópica. Escola de Educação Profissional Farroupilha (RS) – Administração Privada Comunitária. O Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas – CEFET-RS está sob a administração federal, localiza-se no centro da cidade de Pelotas, ministra cursos com Habilitações e Qualificações. Os cursos do CEFET-RS são de Técnico de Transformação de Termoplásticos (habilitação), Desenhista de Produtos Plásticos em Computador (qualificação), Operador de Máquinas Transformadoras de Termoplásticos (qualificação), Preparador de Máquinas Injetoras ou Extrusoras ou Extrusoras-sopradoras (qualificação), Laboratorista de Caracterização de Polímeros (qualificação), Analista de Processos e Produtos Plásticos (qualificação). TABELA DE CARGA HORÁRIA DO CEFET-RS Habilitação ou qualificação Técnico de Transformação de Termoplásticos Desenhista de Produtos Plásticos em Computador Operador de Máquinas Transformadoras de Termoplásticos Preparador de Máquinas Injetoras ou Extrusoras ou Extrusoras-sopradoras Laboratorista de Caracterização de Polímeros Analista de Processos e Produtos Plásticos

Carga horária 1200 horas 300 horas 400 horas 300 horas 90 horas 210 horas

Estágio 400 horas -

O CEFET-RS elaborou uma proposta “flexível de forma a atender as futuras determinações do MEC”, em conformidade à LDB 9.394/96, Decreto 2.208/97, Portaria 646/97. Neste sentido, é salutar destacar já na introdução do plano uma ênfase dada ao trato pedagógico quanto a uma adaptação do currículo às novas tecnologias, adjetivadas como modernas, e às novas formas de organização do trabalho, de acordo com a “nova filosofia empresarial”. O ensino-aprendizagem colocado em prática pela unidade estaria dentro de uma acepção técnica voltada a capacitar o educando às necessidades de uma economia cada vez mais globalizada. Em sua justificativa e objetivos, o CEFET reconhece que as novas dinâmicas produtivas não têm sido acompanhadas pela construção da “cidadania plena - o direito à educação, à saúde, ao bem-estar econômico, à profissionalização e à convivência entre diferentes”. Desta maneira, a Educação Profissional contribuiria para a cidadania abrindo a possibilidade para a “geração de renda, a empregabilidade e o bem-estar sócio-econômico.” O CEFET-RS, assim, teria como objetivo atender aos cidadãos difundindo desde as conquistas científicas e tecnológicas da sociedade, valorizando a cultura do trabalho, até mobilizar valores necessários a tomada de decisões. Para alcançar objetivos tão pretensiosos, a proposta de curso do CEFET-RS

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apresenta a exigência de “uma forte integração entre educadores, empregadores e trabalhadores”, no intuito de dar oportunidade “ao trabalhador adquirir as competências essenciais e profissionais, que lhe permitirão a conquista plena da sua cidadania”. Ora, uma forte integração entre interesses não imediatamente conciliáveis sob a égide da “nova filosofia empresarial” não é problematizada, nem tampouco se questiona se os conflitos entre capital e trabalho são temas e assuntos pertinentes aos objetivos gerais do ensino-aprendizagem dentro do repertório científico de nossa sociedade democrática (ou em vias de democratização) e em construção de uma cidadania plena, posto se tratar de uma entidade de ensino de caráter federal e pública. A cidadania plena, embora citada, não é conceituada, e se confunde ao conceito de empregabilidade, em cujo desenvolvimento o trabalhador, ao adquirir (comprar a mercadoria conhecimento e agregar valor à sua força de trabalho) as competências essenciais e profissionais, conquistaria a plena cidadania. Em outras palavras, seria como que uma cidadania conquistada individualmente (sua) por meio da Educação Técnica de Nível Médio. Entre as diversas dificuldades apresentadas pelo CEFET-RS quanto aos recursos humanos para este ramo industrial em crescimento – conforme pesquisa SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados - Ano Base 1998) solicitada pelo MEC-SEMTEC – mostrava-se que as empresas não mantinham relacionamento com as escolas profissionalizantes de seu próprio setor econômico e os profissionais eram treinados na própria empresa. Constatou-se pouca qualificação e“carências ocupacionais”dos trabalhadores, além de apresentarem dificuldades de expressão, o que remete à formação básica de qualidade; constatouse ainda, em 1998, uma predominância dos profissionais qualificados em cursos rápidos em nível operacional. O curso técnico do CEFET-RS é direcionado a egressos do Ensino Médio que são selecionados por meio de prova. O número de vagas para cada habilitação é estabelecido a partir da disponibilidade de laboratórios e de docentes capacitados, assim como segundo os estudos de demanda, sob responsabilidade da Gerência de Estrutura Funcional e Processos de Ensino. Apesar do plano de curso declarar que “o profissional egresso do CEFET-RS terá como atributos capacidade de raciocínio, autonomia intelectual, pensamento crítico, iniciativa própria, espírito empreendedor e capacidade de visualização e resolução de problemas”, os temas tratados são estritamente técnicos e voltados basicamente às funções e ocupações da indústria de plásticos. A tecnicidade é definida em “sentido especifico dentro do jargão próprio de um ofício, uma arte, indústria ou ciência” (dicionário Houaiss da Língua Portuguesa). Entretanto, a condição humana não é apenas formada por uma dimensão técnica e operacional. Se nela podemos apontar a importância do homo faber sobre uma dimensão puramente laboral do animal laborans, não se pode diminuir a condição humana a essas duas instâncias, pois ela traz em si intrínseca e inerentemente os atributos para ação, que não se limitam à fabricação do meio no qual vivemos, mas a ordenação política deste meio no qual vivemos. 48 A condição humana porta em si mesma três condições básicas e inalienáveis relacionadas às suas três atividades fundamentais: o labor, o trabalho e a ação. O labor é uma ativi48

ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1983, p. 13-20.

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dade ligada estritamente à vida biológica, idêntica a atividade de qualquer outro animal no planeta em busca de sobrevivência. O trabalho está ligado à mundanidade, ao mundo artificial que empresta permanência ao mundo porque sobrevive e transcende as vidas individuais. Já a ação ocorre entre os homens sem a mediação das coisas ou matéria, é a atividade ligada à pluralidade, cada ser humano é um ser-no-mundo (dasein heideggeriano) e não um Homem ideal isolado. A atividade de ação é a conditio sine qua non, assim como a conditio per quam de toda vida política possível. Assim, considerando que o ser humano é um animal político49 que vive entre outros seres humanos, a atividade da ação e o aprendizado para tal não deve ser desprezado ou obliterado por imediatismos técnicos e vinculados a interesses privados e particulares restritos ao aumento da produtividade e a ganhos materiais privados apenas. Retornando ao plano em análise, entre as competências desenvolvidas, constam algumas que fugiriam a uma visão restrita à tecnicidade dos plásticos, tais como: Analisar o sistema sócio-econômico-cultural da produção industrial capitalista no contexto regional, nacional e internacional com ênfase no setor plástico; interpretar a legislação e as normas técnicas referentes aos diversos tipos de produtos, à saúde e à segurança no trabalho, bem como observar a preservação do meio-ambiente.

Entretanto, como as demais tarefas técnicas são em maior número, e não se estabelecem a carga horária para os temas, não é possível enxergar a magnitude e amplitude de tais assuntos em comparação às demais temáticas. Apenas o módulo de Desenhista de Produtos Plásticos em Computador apresenta em caráter de ação suporte Relações Humanas no Trabalho. As competências não apresentam os temas tradicionais de ensino de Física, Química e Matemática, nem tampouco outros de escopo mais humanístico. As provas de admissão já selecionam os que melhor se destacarem nessas matérias quando egressos do Ensino Médio formal. As competências e etapas de aprendizagem são caracterizadas predominantemente pela análise técnica: elaborar gráficos e tabelas, identificar características dos materiais utilizados e das máquinas e procedimentos de produção, além de outros ligados à qualidade dos produtos. Observa-se temas ligados à segurança do trabalho e postura para evitar doença, posto que constam da legislação do trabalho. Enfim, mesmo que a introdução do plano estabeleça a exigência de uma forte integração entre educadores, empregadores e trabalhadores, os temas mais abrangentes para a classe trabalhadora não fazem parte do elenco de assuntos da formação, tampouco os órgãos representativos da classe trabalhadora são citados como co-elaboradores do plano e temas a serem estudados. Além disso, uma formação não puramente técnica e operacional deveria levar em conta conteúdos da cultura mais humanística como parte do acúmulo científico a que chegamos, visto que um estudante egresso do Ensino Médio é ainda jovem e não teve etapas formativas que lhe dessem instrumentos, capacidade e conteúdos para a sua educação plena e cidadã - arcabouço que lhe permitisse efetivamente ter uma autonomia intelectual e exercer uma cidadania plena e coletivamente construída. 49

DALLARI, D. A. O que é participação política. São Paulo: Abril Cultural / Brasiliense, p. 13-17.

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A Escola SENAI Mário Amato está sob administração privada particular. Entidade participante do Sistema S localiza-se em São Bernardo do Campo – SP, região com forte presença industrial no parque industrial do ABC paulista. Dispõe da habilitação de Técnico em Plásticos; a qualificação de Controlador de Processos Industriais em Plásticos, e a qualificação de Projetista de Moldes para Plásticos. A carga horária dos cursos, habilitações e qualificações são apresentadas no plano de curso, como segue: PLANO DE CURSO PARA: Habilitação: Carga horária sem estágio Carga horária do estágio Qualificação: Carga horária sem estágio Carga horária do estágio Qualificação: Carga horária sem estágio Carga horária do estágio

Técnico em Plásticos 1200 horas 400 horas Controlador de Processos Industriais em Plásticos 600 horas não tem Projetista de moldes para Plásticos 600 horas não tem

Segundo seu plano de curso, o SENAI participa de um grupo de trabalho formado por entidades de ensino e pesquisa, sindicatos patronais e de trabalhadores, transformadores e fabricantes de máquinas para elaborar currículos “mais adequados à nova realidade” de expansão, modernização, competição e globalização da economia. Por outro lado, o documento reconhece que há uma preferência e maior capacidade para angariar postos de trabalho para os trabalhadores com base científica mais sólida, condição indispensável para se adaptar mais rapidamente às constantes mudanças da tecnologia e da organização do trabalho. Em seu documento consta que embora a mão-de-obra do setor de plásticos tenha sofrido retração de 4,5% no período de 1997 a 1999, as contratações posteriores substituíram os trabalhadores por aqueles com maior nível de escolaridade. Neste quadro, a Escola Senai Mario Amato estabelece que o “curso técnico de plásticos tem por objetivo habilitar profissionais em planejamento, execução e controle do processo produtivo nas indústrias de transformação de plásticos e em plantas petroquímicas, fundamentando suas ações em requisitos de sistemas da qualidade e na preservação ambiental”. Para ingresso, o educando precisa ter finalizado o Ensino Médio ou estar em curso. Embora a Escola Senai Mario Amato se reserve o direito de determinar outros critérios baseados na idade, experiência e aprovação em processo seletivo “dependendo das circunstâncias”. Essas circunstâncias outras a que o plano faz alusão não são explicitadas no documento. Contudo, pode se aferir que essas circunstâncias estão muito mais voltadas aos critérios empresariais e das diretrizes da indústria e muito menos ao atendimento da demanda dos trabalhadores e de seus órgãos representativos. Tais circunstâncias podem estar vinculadas aos limites estruturais da escola, mas também não está esclarecido no plano. A organização do curso técnico de plásticos segue a tabela abaixo:

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CARGA HORÁRIA TOTAL 120 60 30 30 270 45 30 75 30 30 105 30 60 45 30 30 30 90 60 1200 400 1600

Observa-se que o componente curricular de Relações Humanas representa apenas 30 horas do total de 1.200 horas. Organização do Trabalho e Segurança e Gestão Ambiental também dispõem apenas de 30 horas cada. Componentes curriculares que tratariam de assuntos não restritos aos universos fabril e técnico compõem juntos uma carga horária de 90 horas de um total de 1.200. O curso técnico é, portanto, extremamente técnico e pressupõe a formação geral nos estágios educativos/pedagógicos anteriores, no Ensino Médio, como suficientes para a formação do profissional competente da área da indústria de plásticos. Nestas 30 horas, caberá ao docente desenvolver atividades de Relações humanas que dêem contam da abrangência de assuntos definidos no plano como: “Comunicação; Percepção e diferenças individuais; Liderança; Trabalho em equipe; Análise de problemas e tomadas de decisão; Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); Motivação; Processo de mudança”. O que salta aos olhos não são apenas a amplitude e quantidade de tópicos a serem tratados, mas a ausência de uma definição quanto ao sentido e a perspectiva em que esses assuntos serão apresentados e desenvolvidos. Para o componente curricular Organização do Trabalho e Segurança, o plano estabelece os seguintes tópicos: “Estudo das organizações; Estruturação de empresas; Administração de vendas; Análise de valor; Sistemas de manufatura: kanban, just-in-time; Análise de falhas e efeitos; Simplificação do trabalho; Higiene e segurança; O trabalho da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes - CIPA; Administração da manutenção; Elaboração de relatórios”. Enquanto o componente curricular Gestão Ambiental fica estabelecido tratar das seguintes temáticas: “Desenvolvimento industrial e impactos no meio ambiente; Legislação ambiental; Sistemas de gestão ambiental na indústria; Gerenciamento de resíduos; Prevenção da poluição; Reciclagem e plásticos biodegradáveis.”

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O mesmo comentário feito para o componente Relações Humanas cabe para os dois componentes seguintes, isto é, não apenas o tempo é escasso para assuntos de grande importância para uma formação humana e cidadã, como a abrangência dos temas é demasiada para o tempo disponível. Acrescente-se a isso o fato de o documento esclarecer que a Escola SENAI Mario Amato, em sua ênfase formativa empresarial, privilegiar a contratação de docentes e técnicos que “graduados em engenharia ou tecnologia, com formação e experiência profissional condizentes com os componentes curriculares que compõem a organização curricular do curso”, para que se possa ver que o enfoque está distante de uma preocupação com uma educação profissionalizante técnica focada no trabalho como princípio para uma educação integral do educando50, pois os componentes acima destacados estão para além de um tratamento e do escopo de uma formação docente em engenharia ou tecnológica. O Centro de Educação Tecnológica Tupy está localizado na cidade de Curitiba – PR. Trata-se de uma instituição de administração privada filantrópica. Ministra habilitação de Técnico em Plásticos. As qualificações são em Assistente Técnico de Processos e Laboratório para Materiais Plásticos, Assistente de Processamento e Caracterização de Plásticos Commodities e Termofixos e Assistente de Processamento e Caracterização de Plásticos de Engenharia. As cargas horárias apresentadas no plano são as que seguem: HABILITAÇÃO E QUALIFICAÇÕES: 1. Habilitação: Carga Horária: Estágio –Horas 1.1 Qualificação: Carga Horária: 1.2 Qualificação: Carga Horária: 1.3 Qualificação: Carga Horária:

TÉCNICO EM PLÁSTICOS 1200 horas 400 horas Assistente Técnico de Processos e Laboratório para Materiais Plásticos 300 horas Assistente de Processamento e Caracterização de Plásticos Commodities e Termofixos. 300 horas Assistente de Processamento e Caracterização de Plásticos de Engenharia 300 horas

O Centro de Educação Tecnológica Tupy tem como justificativa de seu curso, entre outras coisas, os novos paradigmas tecnológicos que “transformaram o perfil do trabalhador demandado pelas empresas”, fazendo com que as oportunidades de emprego sejam maiores para os profissionais mais preparados e “e este preparo passa, necessariamente, pela educação e treinamento, bases para o conhecimento, o saber e aprimoramento humano.” O ingresso no curso é feito por meio da realização de teste de avaliação de conhecimentos para os candidatos egressos ou concluintes da 2ª série do Ensino Médio,“para determinar o nível de conhecimento dos candidatos e classificá-los para a matrícula”. Segundo o Plano de Curso, o curso é dividido em módulos e busca desenvolver no educando a capacidade de selecionar e classificar material plástico em função do produto 50

FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS. M. O trabalho como princípio educativo no projeto de educação integral de trabalhadores. Op. cit.

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final, desenvolver formulação de compostos poliméricos para melhorar o desempenho dos materiais, entre outras considerações técnicas. Além disso, treina e ou capacita o educando a supervisionar o processo produtivo fabril, bem como auxiliar na solução de problemas ligados à produção, controlar processos de reciclagem de plásticos, e atuar na gestão de resíduos da indústria. Portanto, determinações de base técnica voltadas somente aos requisitos industriais e fabris, e com foco na perspectiva empresarial. Os conteúdos programáticos que fogem de uma tecnicidade da produção de plásticos são aqueles tradicionais do Ensino Médio, a saber: sistemas numéricos, frações, percentagens, regras de três, equações de 1º e 2º graus, matrizes, funções. Outros conteúdos considerados no documento como bases instrumentais são: leitura e interpretação de texto, redação e noções básicas de inglês; sem, contudo, distinção das cargas horárias disponíveis para estes assuntos. O corpo docente apresentado no documento tem formação variada e ampla, são profissionais formados em Licenciatura em Letras, Pedagogia, Licenciatura em Estudos Sociais, Engenharia Mecânica e Química Industrial, entre outras. É importante salientar que a bibliografia apresentada no documento não contempla qualquer livro de caráter menos técnico, mesmo aqueles ligados à redação têm um direcionamento tecnicista. Apesar de se tratar de uma entidade filantrópica, conforme cadastro no CNCT, a entidade compartilha de um enquadramento pedagógico subordinado aos paradigmas das novas tendências de gerenciamento produtivo às novas maneiras de organização de pessoal que buscam criar condições para uma maior competitividade e produtividade, em detrimento da qualidade e formação humana para a vida, bem como não problematiza as mudanças e novas condições de trabalho a que estão sendo submetidos os trabalhadores. A Escola de Educação Profissional Farroupilha está localizada em Farroupilha – RS – e ministra cursos de Técnico em Processamento de Polímeros. A qualificação de Ajudante de Preparador de Plásticos, a qualificação de Moldador de Polímeros Básico, e a qualificação de Moldador de Polímeros Avançado têm sua dependência administrativa definida como privada comunitária nos cadastros do CNCT. A carga horária dos cursos são as que seguem: HABILITAÇÃO, QUALIFICAÇÕES E ESPECIALIZAÇÕES: 1. Habilitação : Carga Horária: Estágio –Horas 1.1 Qualificação : Carga Horária: 1.2 Qualificação : Carga Horária: 1.3 Qualificação : Carga Horária:

Técnico em Processamento de Polímeros 1400 horas 300 horas Ajudante de Preparador de Plásticos 700 horas Moldador de Polímeros Básico 1050 horas Moldador de Polímeros Avançado 1400 horas

Seguindo o PROEP - Programa de Expansão da Educação profissional - o plano de curso se referencia principalmente quanto às demandas do mundo do trabalho e às exigências da tecnologia moderna. Neste sentido, o documento propõe uma formação

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que não dissocie a formação mais técnica de um aprendizado teórico “através da aprendizagem de conceitos, que formam a estrutura cognitiva”, sem se esquecer das competências específicas. O documento apresenta uma preocupação com a formação do cidadão “consciente de suas responsabilidades individuais e sociais, apto a participar produtivamente e promover mudanças que beneficiem a sociedade.” Entre os objetivos gerais propostos, merecem destaque: promover o desenvolvimento profissional dos cidadãos do município e da região, fortalecendo sua integração social”; “contribuir para a expansão do ensino técnico, formando profissionais para o desenvolvimento científico e tecnológico na indústria de transformação de polímeros. “atuar em estreito relacionamento com o setor produtivo, colhendo subsídios para atualização do currículo, detectando necessidades de ampliação da oferta de seus serviços (...)

Os objetivos gerais propostos pela instituição pretendem auxiliar e desenvolver profissionalmente os cidadãos levando em conta as especificidades do ramo de plásticos, em estrita consonância com o setor produtivo, pois assim ampliará a absorção dos egressos do curso técnico pelas indústrias de plásticos instaladas naquela região. O que fica evidente nos objetivos específicos é exatamente a preocupação em qualificar e habilitar o “profissional a atuar” na produção, tratamento operacional que é ensinado por meio de diferentes módulos em que está dividido o curso técnico. No item objetivos específicos não há qualquer alusão à formação cidadã dos profissionais que serão capacitados a atuar nas fábricas. É condição para o ingresso de educandos ter concluído a primeira série do Ensino Médio. E na ocasião que houver excedente de candidatos em relação ao número de vagas, os candidatos serão selecionados por meio da realização de provas escritas de português, matemática, física e química, sendo que as notas obtidas nas provas de português e química serão usadas como critério de desempate. O plano estabelece as competências profissionais que se pretende desenvolver junto ao educando-técnico da área, entre as quais destacamos algumas: “coordenar e desenvolver equipes de trabalho que atuam na instalação, na produção e na manutenção, aplicando métodos e técnicas de gestão administrativa e de pessoas”;“aplicar normas técnicas de saúde e segurança no trabalho e de controle de qualidade no processo industrial”; “aplicar normas técnicas e especificações de catálogos, manuais e tabelas em projetos, em processos de fabricação, na instalação de máquinas e de equipamentos e na manutenção industrial”; “projetar produto, ferramentas, máquinas e equipamentos, utilizando técnicas de desenho e de representação gráfica com seus fundamentos matemáticos e geométricos”; “elaborar projetos, leiautes , diagramas e esquemas, correlacionando-os com as normas técnicas e com os princípios científicos e tecnológicos”; “desenvolver atividades de operação, supervisão e controle do processamento de polímeros termoplásticos e termorrígidos”; “coordenar equipes de trabalho que atuam na produção, aplicando métodos e técnicas de gestão administrativa e de pessoal, considerando a influência dos processos e do produto no meio ambiente”.

Observa-se claramente que as necessidades da produção é que determinam o processo de ensino-aprendizagem, pois mesmo quando os fundamentos matemáticos e geométricos ou os princípios científicos e tecnológicos são citados estão subordinados ao projeto do produto, das ferramentas, máquinas e equipamentos e/ou aos projetos, layout, dia-

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grama e esquemas para a produção. As demais competências citadas no documento são, de igual modo, restritas aos aspectos operacionais e/ou técnicos. Para os módulos onde matemática e química são necessários, o plano já a nomeia como aplicada [aos processos de produção plástica]. Assim como a língua portuguesa que é tratada como português instrumental, e a língua inglesa como inglês técnico. Entretanto, deve-se evidenciar que mesmo classificando a língua portuguesa como instrumental dentro de um módulo de estudo, o escopo proposto é abrangente e significativo, mas diante da magnitude de temas técnicos e da não discriminação da carga horária destinada ao estudo da língua portuguesa (português instrumental) ou ao inglês técnico torna-se difícil visualizar a viabilidade executiva da proposta no que tange a uma aplicação didáticopedagógica coerente, e, sobretudo, que esses módulos sejam meios e situações propícias para que os educandos possam ter um aprimoramento teórico e reflexivo. Mesmo que estabelecido que português instrumental seja inerente às atividades do técnico, o repertório proposto vai desde uma relação entre linguagem e pensamento até a abordagem conceitual, processo explicativo e processo argumentativo, passando pelas questões gramaticais que habilitam o educando numa melhor exposição de suas idéias. Já o tratamento do inglês técnico parece ser puramente no sentido de capacitar o educando a compreender expressões da língua inglesa utilizadas nos processo produtivos do plástico. O corpo docente apresentado no plano tem ampla formação, com predominância para a atuação de engenheiros, contando também com a presença de pedagogos e profissionais habilitados em letras. A bibliografia é vasta e com marcado acento técnico-profissional, mesmo para os módulos em que algum livro mais abrangente pudesse ser aproveitado. De uma maneira geral, os cursos técnicos de todas as entidades analisadas acima são para estudantes que já terminaram o Ensino Médio, ou o estão cursando. O enfoque central é invariavelmente a tecnicidade da produção de plásticos, em cuja justificativa aponta-se o acesso ao emprego e renda – aumentando a “empregabilidade”do profissional – como o mais salutar, e estreita-se à Educação Profissional Técnica de Nível Médio ao escopo das regras e organizações da produção capitalista. Pode-se dizer que além das competências e atividades operacionais que se busca desenvolver por meio das ações didático-pedagógicas, existe um esforço primordial em se criar um comportamental de aceitação a nova organização toyotista, em sua vertente brasileira.51 A insegurança e rotatividade – sempre presentes no mercado de trabalho brasileiro – são ampliadas e inseridas como inerentes e parte essencial das novas relações entre capital e trabalho. A Educação Profissional é predominantemente técnica e prepara o estudante para a obediência ao regimento interno das empresas.

51

Ver: OLIVEIRA, C.A.B.; MATTOSO, J. et alli (orgs.) O mundo do trabalho: crise e mudança no final do século. São Paulo: Scritta; Campinas: Cesit, 1994.

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• Ricardo Azevedo Silva • José Dari Krein Introdução

O

setor de telecomunicações passou e continua passando por expressivas mudanças nos últimos anos. As mudanças fazem parte de um processo de reestruturação e modernização da economia mundial, em que o setor Terciário tem ganhado importância estratégica. As particularidades da nova ordem econômica mundial, pautada na crescente internacionalização da produção que acentua o entrelaçamento das economias nacionais e regionais, remodelaram o ambiente econômico, alterando as condições de inserção dos diversos agentes nos mercados, especialmente num contexto de instável e baixo dinamismo do produto e de crescente liberalização financeira e comercial. O fenômeno contemporâneo denominado globalização vem alterando profundamente as estruturas produtivas, as relações técnicas e sociais de produção e os padrões organizacionais e locacionais (Diniz. 2000). Tal processo é resultado das radicais e cada vez mais velozes mudanças tecnológicas, determinadas pela intensa concorrência capitalista sob a liderança da tecnologia da informação, o que permitiu e induziu a generalização dos novos meios de comunicação e controle baseados na informática, telemática, sistemas on line, internet, e-mail, telefonia móvel, TV a cabo, etc., que vêm facilitando e barateando os transportes e as comunicações. Isto tem ainda potencializado o aumento do fluxo de informações econômicas, científicas, tecnológicas, culturais e políticas, expandindo o comércio internacional e inter-regional de bens, alterando a natureza da produção, consumo e comércio de serviços, inclusive possibilitando o crescimento do comércio de serviços à distância, aumentando o fluxo de capitais e de pessoas, notadamente financeiro e, assim, acelerando a integração mundial. A constante busca de valorização do capital em um ambiente de intensa concorrência capitalista passa cada vez mais a requerer serviços ágeis de telecomunicações que permitam ampla mobilidade geográfica da riqueza financeira. Neste contexto, o Terciário tem sido palco de importantes inovações tecnológicas e organizacionais. Assim como de expressivas mudanças no que tange ao funcionamento de suas atividades e à importância de sua participação no processo produtivo da economia contemporânea, estabelecendo novas relações com os outros dois grandes setores (primário e secundário) e, paralelamente, introduzindo novos elementos no que se refere aos seus conceitos e definições. As Telecomunicações, assim como a informática, têm sido um setor-chave nesse processo, ganhando importância crucial na economia reestruturada ao exercer um papel fundamental na reorganização recente da economia. Ao mesmo tempo, olhando para a dinâmica da econômica brasileira, pode-se observar que houve a incorporação deste novo padrão tecnológico combinado com um processo de privatizações, que simbolizam importantes alterações no modelo de desenvolvimento que se procurou viabilizar no país.

Capítulo 4

Setor Econômico de Telecomunicações As Mudanças no Setor de Telecomunicações no Brasil e suas Implicações para Discutir a Qualificação Profissional


Educação Integral dos Trabalhadores

O setor de Telecomunicações apresentou algumas novidades dentre as quais se destacam: adoção da tecnologia digital; novas possibilidades de aplicação e ampliação da gama de serviços de telecomunicações; profunda alteração no quadro de agentes envolvidos com o setor e; expressiva elevação dos investimentos no setor, mas com a criação de postos de trabalho em proporção menor que a esperada. As novas empresas procuraram ocupar o nicho de mercado, dado o tamanho da população brasileira e as garantias legais asseguradas pelo Governo e pelas agências reguladoras, ao proporcionar tarifas atraentes. Temos com isso, a explosão da telefonia móvel, da internet e de outras atividades que combinam comunicação e informação. São bens de serviços que vão sendo incorporado no dia-a-dia da população. A busca de agilidade e flexibilidade no processo produtivo – num contexto de reestruturação defensiva diante da abertura comercial e de um processo de internacionalização da produção em determinados segmentos – está entre os fatores que contribuíram para ampliar a importância e condicionar o desempenho recente do Terciário no Brasil. Estes dois processos produziram uma ampla modernização no setor de telecomunicações, com conseqüências sobre o perfil de trabalhadores demandados (maior escolaridade, menor faixa etária e maior taxa de rotatividade), redução dos empregados diretamente ligados ao sistema e uma piora nas condições de trabalho (jornada, remuneração e forma de contratação). O emprego aumento nos call centers e nos serviços terceirizados, na fase pós-privatização até 2002, quando as empresas foram obrigadas a cumprir metas de expansão da rede. O emprego nas terceirizadas também apresenta queda a partir de então. O objetivo deste artigo é examinar a mudança do perfil dos trabalhadores em telecomunicações motivada pela reestruturação do setor (em particular, pela terceirização de funções e pelo avanço do emprego no telemarketing), assim como discutir como se alteraram as exigências de qualificação, ou melhor, de competências exigidas dos trabalhadores pelas empresas do setor. O presente texto está estruturado, além dessa introdução, em quatro partes. Na primeira parte se faz uma caracterização da evolução e das mudanças ocorridas no setor no Brasil, destacando o papel das privatizações e o processo de reestruturação produtiva. Na segunda parte, destacam-se as inovações organizacionais, enfatizando a crescente racionalização da gestão e a expansão da terceirização. Na parte seguinte, discutem-se as mudanças no perfil dos trabalhadores do setor, tendo como referência a RAIS e destacando o crescimento do emprego no segmento de call center. Por último, antes das considerações finais, identificam-se as práticas de formação profissional presentes no setor.

As mudanças recentes nas telecomunicações no Brasil A atividade de Telecomunicações, assim como a atividade de informática, está no centro dos processos de modernização de vários setores da economia brasileira como os setores bancário e de transporte. É certo que também exerceu influência decisiva sobre o processo de reestruturação produtiva em geral. Não só no que tange a modernização das telecomunicações e seus avanços tecnológicos, mas também devido à forte expansão de serviços ao público em geral, com grandes avanços na segunda metade da década de 1990.

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A transição proporcionada pelo progresso da microeletrônica na década de 1970, com a passagem da fase analógica para a fase digital, permitiria importantes avanços tecnológicos nos serviços de telecomunicações. Tais avanços se fariam visíveis na década de 1990 no Brasil, especialmente em sua segunda metade. O progresso tecnológico na produção de equipamentos de comutação e transmissão permitiu uma redução dos custos do setor de telefonia e melhorias na qualidade de transmissão de sinais. Foram importantes a redução do porte dos equipamentos, o aumento da capacidade de transmissão de sinais e a digitalização das redes. As novas tecnologias de comutação e transmissão permitiram novos usos e novas aplicações das telecomunicações possibilitando a transmissão conjunta de voz [imagem] e dados. Dentre estas inovações se destacam a substituição das centrais de comutação eletromecânicas por centrais automáticas baseadas em tecnologia eletrônica digital; as novas técnicas de multiplexação52 ; e a utilização de novos meios de transmissão nas redes de telefonia (microondas, fibras ópticas e satélites). A convergência tecnológica entre o setor de telecomunicações e outros segmentos do complexo eletroeletrônico, sobretudo a informática, permitiu a introdução de inovações na oferta de serviços de telecomunicações. Esta interação ampliou significativamente o leque de serviços de telecomunicações, em especial, dos serviços de valor adicionado, como por exemplo, serviços de videotexto; serviços bancários eletrônicos; fax e correio eletrônico. Também surgiram novos serviços de valor adicionado que são ofertados por rede específica. São eles, os serviços de telefonia móvel celular tradicional e via satélites; de trunking (serviços de comunicação interna em atividades específicas como transporte rodoviário de carga, de segurança, etc.); de videoconferência; de troca eletrônica de documentos padronizados; de acesso a bancos de dados e de pesquisa na internet, etc. (Oliveira, 2004: 4)

No campo da produção e prestação de serviços, os avanços em relação à transferência de dados/informações tiveram importância central na reestruturação do processo operacional e organizacional das atividades produtivas na década de 1990. Ao proporcionarem novas formas de procedimentos e controle; ampliar e facilitar o acesso a informações; agilizar as transações econômicas/comerciais e o relacionamento entre produtores/prestadores de serviços com seus fornecedores e clientes. Como exemplos da interação entre os modernos serviços de telecomunicações e outras atividades econômicas, destacam-se os sistemas de Transferência Eletrônica de Fundos (TEF) e a Troca Eletrônica de Dados (Eletronic Data Interchange-EDI).53 Os serviços de telecomunicações tornaram-se estratégicos para as empresas, assumindo grande importância no cenário concorrencial, onde as disputas se acentuaram com o desenrolar do reordenamento da economia brasileira na década de 1990 (Silva, 2002). Os serviços deixam de ser vistos como insumos/custos e assumem uma conotação estratégica no processo de realização da produção/serviços para o mercado. 52

53

“Multiplexadores são equipamentos que interligam as centrais telefônicas e têm a função de transmitir simultaneamente vários canais de transmissão de voz e dados.” (nota da autora) A TEF é um serviço que originalmente tem por finalidade permitir a um cliente efetuar pagamentos a um Estabelecimento Comercial, por meio de uma Instituição Autorizadora (Banco), por meio da troca de mensagens eletrônicas, usando computadores e cartões magnéticos, sem a necessidade do uso de papel moeda, cheque ou qualquer outro meio físico de pagamento. Já a EDI é a troca de documentos via sistemas de teleinformática entre duas ou mais organizações de forma padronizada (Troca Eletrônica de Dados). Tem como um dos principais objetivos, ao substituir o fluxo de papéis entre elas, agilizar e reduzir os custos dos processos mercantis.

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Nos últimos anos, o processo de inovações tecnológicas contribuiu para a convergência dos setores de informática e telecomunicações, fazendo surgir a telemática, como base do desenvolvimento. Neste sentido, as tecnologias de informação (TI’s)54 são introduzidas para viabilizar a obtenção de vantagens competitivas, através da combinação de incremento da produtividade com aumento da flexibilidade, ao mesmo tempo que também permitem o desenvolvimento de inovações organizacionais e na forma de relacionar fornecedores, clientes e distribuidores. O uso das TI’s passou a ser considerado como estratégico, dado que está vinculado a uma necessidade das firmas se adequarem a este novo contexto de inovações tecnológicas, na medida que a informação passou a ser importante para garantir maior competitividade. O fato de proporcionar melhor interação entre clientes e fornecedor é para os setores da economia uma grande vantagem competitiva. Esta interação é viabilizada pela difusão de redes de comunicação de dados e de serviços modernos de telecomunicações. (Borges, 2000: 16)

O processo de privatização das telecomunicações esteve no centro da reestruturação e modernização das atividades econômicas no Brasil nos anos de 1990. O setor de Telecomunicações brasileiro nasceu privado e foi após sua estatização que começou a ganhar impulso no país, ainda que fortemente concentrado nas regiões do Brasil mais avançadas economicamente. Durante a existência do sistema Telebrás, criado em 1972, o número de terminais instalados passou de 1,4 milhões para mais de 20 milhões, segundo Araújo (2007). Contudo, foi após o processo de privatização, combinada com a nova configuração do setor internacionalmente, que as telecomunicações vêm apresentando um crescimento exponencial no país. Processo que, também, coincide com a consolidação de um novo padrão tecnológico. Diante da necessidade de rápida adequação ao nível tecnológico alcançado, a capacidade estatal de prover os serviços de telecomunicações nos novos padrões tecnológicos passa a ser questionada. A fragilidade das finanças públicas diante de volumosos investimentos que se faziam necessários aliada à ampla aceitação do discurso neoliberal de redução da intervenção estatal apontava a privatização dos serviços de telecomunicação como forma de alcançar o novo patamar tecnológico que se estabelecia no setor mundialmente. O Brasil, assim como diversos países, adotou a privatização do setor. Nestas operações prevaleceram como principais estratégias das empresas a internacionalização e o estabelecimento de alianças e acordos de cooperação técnica e financeira. O setor de Telecomunicações que operava com base no monopólio público em pouco tempo iria ser transferido para a iniciativa privada. Como parte do Programa Nacional de Desestatização, preparou-se a transição de todo o sistema nacional de telecomunicações para as mãos do capital privado, em que o controle pelo capital estrangeiro prevaleceria em quase toda a atividade (Silva, 2001). No processo de preparação para as privatizações, o governo injetou recursos no sistema Telebrás e fez uma reengenharia nas empresas. Antes de vender as empresas telefônicas, o governo investiu R$ 21 bilhões neste setor em dois anos e meio (1996/1998) e vendeu tudo por uma entrada de R$ 8,8 bilhões. No total, mesmo considerando o valor em moedas podres, o Sistema Telebrás foi vendido por R$ 23 bilhões, sendo o saldo líquido de R$ 2 bilhões. (Silva, 2001b: 20; Biondi, 1999). Com o intuito de tornar mais atrativas as empresas do grupo Telebrás à privatização, o governo promoveu uma redução da mãode-obra empregada, a terceirização e a recomposição da lucratividade das empresas do setor. 54

As TI’s englobam o conjunto de tecnologias utilizadas na coleta, armazenamento, processamento e transmissão da informação, incluindo voz, dados e imagens, as quais se originam da indústria de informática e telecomunicações. (cf. Tauile, 1994 e Rovere, 1994)

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Segundo Araújo (2007), enquanto o número de empregados na Telebrás caiu de 94,6 mil em 1994 para 87,3 mil trabalhadores em 1997, o lucro da empresa subiu de R$ 560 milhões para R$ 3,9 bilhões neste mesmo período. A rápida recomposição do lucro era um indicador aos investidores interessados na privatização que o setor tinha potencial de retorno ao investimento a ser realizado. Com a privatização em 1998 estava liquidado o monopólio público dos serviços de telecomunicações no Brasil. Antes da privatização, o setor de telecomunicações era formado por 30 operadoras estaduais (Telesp, Telemig, Telerj, etc) e a Embratel (satélites, ligações interurbanas/internacionais), sendo todas empresas estatais e controladas pela holding Telebrás. Após a privatização, a Telebrás foi dividida em 13 empresas, sendo uma de telefonia de longa distância (Embratel), três de telefonia fixa (Telesp, Tele Centro-Sul Participações S.A. e Tele Norte-Leste Participações S.A., denominada Telemar) e oito empresas de telefonia celular. As operadoras de telefonia móvel eram Telesp Celular, Tele Sudeste Celular Participações S. A., Telemig Celular Participações S. A., Tele Celular Sul Participações S. A., Tele Nordeste Celular Participações S. A.,Tele Leste Celular Participações S. A.,Tele Centro-Oeste Participações S. A. e a Tele Norte Celular Participações S. A. (Queiroz, 2005) A privatização e a entrada de várias empresas estrangeiras aceleraram a modernização dos serviços de telefonia e a introdução de novos serviços de telecomunicações no país. Como registra Oliveira (2004), as mudanças no quadro regulatório e institucional do setor de telecomunicações nacional foram vitais para introdução de inovações na atividade. Como parte do processo de privatização foi estabelecido55 um novo modelo regulatório e institucional para o setor por meio da criação da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e do Plano Geral de Outorgas. Foram estabelecidas no Plano de Outorgas as bases do regime de concorrência para os serviços públicos que, a partir de então, seriam oferecidos via concessão e estariam sujeitos a metas de universalização dos serviços. Esse plano estabeleceu regras definindo o número, os serviços ofertados e as regiões de atuação das empresas concessionárias. O novo regime de concorrência estabeleceu duas etapas. Uma etapa de transição que vigorou até 2002 na qual as concessionárias atuariam sob regras restritas e cumpririam algumas obrigações no âmbito do Plano Geral de Metas de Qualidade e do Plano Geral de Metas de Universalização. A partir de 2002, o plano previu outra etapa na qual as concessionárias, depois de cumpridas as metas de universalização estabelecidas, poderiam atuar em outras áreas. Também se permitiu a entrada de novas empresas nessa segunda etapa. Após 2002, as concessionárias e as empresas “espelho”passaram a operar fora da área de atuação restrita e a concorrência foi aberta para novas empresas entrantes. Na telefonia móvel celular as unidades da TELEBRÁS foram reunidas em oito companhias para atuarem em dez áreas geográficas pré-definidas56. O regime regulatório também estabeleceu dois estágios, no primeiro, a concorrência foi restrita a duas empresas em cada área de atuação (SMC/Sistema Móvel Celular); no segundo, após 2001, as empresas da Banda A e B passaram a concorrer com novas empresas do SMP/Sistema Móvel Pessoal (Banda C, D e E). Entre 2002 e início de 2004, todas as operadoras migraram do regime de prestação de serviços SMC para o regime SMP. (Oliveira, 2004:7) 55 56

Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/16/06/1997). Área 1 – Região Metropolitana de São Paulo; Área 2 – Interior e Litoral de São Paulo; Área 3 – RJ e SP; Área 4 – MG; Área 5 – PR e SC; Área 6 – RS; Área 7 – GO, DF, MS, MT, TO, RO e AC; Área 8 – AM, PA, RR, AP e MA; Área 9 – BA e SE; e Área 10 – AL, PE, PB, RN, CE e PI.

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Como Oliveira (2004) ressalta, o novo quadro regulatório e institucional acabou por privilegiar a entrada de grandes operadoras internacionais no mercado nacional, que passaram a controlar tanto a telefonia fixa quanto a móvel. No Quadro 1, a seguir, a autora mostra as principais empresas da telefonia fixa e seus respectivos grupos controladores em 2003. QUADRO 1 - BRASIL: PRINCIPAIS EMPRESAS DA TELEFONIA FIXA E RESPECTIVOS GRUPOS CONTROLADORES Empresas Brasil Telecom

Grupos controladores Telecom Italia, Timepart Participações (fundos de investimento) e Techold Participações (Opportunity e fundos de pensão Sistel, Telos, Funce, Petros e Previ) Embratel MCI (EUA) 57 GVT - Global Village Telecom Magnum Group (Holanda) e IDB Group (Israel) Intelig National Grid (Reuno Unido), France Telecom e Sprint/MCI (EUA) Telemar BNDESPar, Fiago, AG Telecom, Asseca Participações, Lexpart Participações, L. F. Telecomunicações, BRASILcap e BRASIL Veículos Telefônica Telefónica Internacional (Espanha) Vésper Embratel Fonte: sites das empresas. Quadro extraído de Oliveira (2004).

Como podemos constatar no Quadro 1, entre as maiores empresas a única empresa de capital nacional é a Telemar. Entretanto, além da Telemar devemos destacar, devido a sua importância regional, as empresas CTBC Telecom e a Sercomtel Telecom. A CBTC é de capital privado nacional e atua em algumas regiões dos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul e no interior de São Paulo enquanto a Sercomtel atua no Estado do Paraná (Londrina) e seu capital é estatal/municipal. Considerando além dos serviços de telefonia fixa, os de telefonia móvel, Queiroz (2005) se reportando ao ano da privatização das teles destaca que a entrada do capital estrangeiro foi expressiva, mas a participação do capital nacional no processo de privatização também foi importante naquele ano. O baixo valor pago pelas empresas entrantes e as condições facilitadas de pagamento preservaram a capacidade de gasto dessas empresas em novos investimentos no setor tanto na ampliação dos serviços quanto na modernização tecnológica. Com a entrada de novos agentes na exploração da atividade acelerou-se a aplicação de novas tecnologias e ampliou-se a oferta de novos serviços de telecomunicações. “Além do segmento de transmissão de dados, os investimentos das empresas de telefonia fixa também têm se destinado para os segmentos de infra-estruturas de redes (sistemas de satélites, fibras ópticas, backbones58) e de internet de banda larga. Merecem destaque os investimentos da Embratel em infra-estrutura de satélite. Através de sua empresa subsidiária Star One esta empresa oferece, via satélite, serviços de valor adicionado e internet em banda larga. (...) No segmento de internet de banda larga, a estratégia das empresas está na aplicação desta tecnologia para o EDI, comércio eletrônico, internet banking, etc. no mercado corporativo (empresas do setor financeiro, serviços industriais, unidades de governo, etc.) e para o mercaEm abril de 2004, esta empresa foi vendida para o grupo mexicano TELMEX.. Este grupo, por sua vez, também é dono da América Móvil que controla a empresa de telefonia móvel celular Claro. 58 Backbone é a parte da rede que carrega o tráfego mais pesado sendo, por isso, o nível mais alto na hierarquia de uma rede. 57

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do residencial de alta e média renda. Com a implantação da RDSI, quase todas as empresas de telefonia fixa investiram em provedores de internet de banda larga, dentre elas, Speedy (Telefônica), Velox (Telemar), BrTurbo (Brasil Telecom) e Turbonet (GVT). As empresas de telefonia móvel celular também oferecem serviço de internet pelo celular através das tecnologias WAP e WMP (CTBC net,VivoWap e VivoWap1x). Também foram implementadas inovações na forma de ofertar serviços de valor adicionado, são exemplos, as centrais de dados (data center) e as centrais de atendimento (call center e contact center). (Oliveira, 2004a: 19)

Contudo, apesar do aumento da oferta destes novos serviços de telecomunicações no mercado brasileiro, a principal mudança ocorreu com a expansão da telefonia móvel celular e o call center. Segundo dados da ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), o número de acessos da telefonia móvel celular aumentou de 800 mil em 1994 para 34 milhões em 2002. Sendo que um ano depois, este segmento superou a telefonia fixa atingindo 46 milhões de acessos. O serviço pré-pago representou cerca de 76% do total dos acessos em 2003. Atualmente, o número de celulares em operação no país já superou os 100 milhões de aparelhos, segundo a ANATEL. Em 2006, mais 153 municípios passaram a contar com o serviço de telefonia móvel, contudo, cerca de 2.300 municípios brasileiros continuam sem acesso a esse serviço. Considerando a população dos municípios que contam com o serviço, a telefonia celular está disponível para 89,42% da população brasileira, mas apenas 58,66% dos municípios têm cobertura. Estes dados indicam que ainda há um espaço considerável para expansão da telefonia celular no Brasil. De 1997 até janeiro de 2007, a telefonia móvel multiplicou em 22 vezes o número de assinantes atingindo 100.717.141 usuários, um crescimento de 2.113% em pouco mais de nove anos de existência da ANATEL. Neste período, a tele-densidade do serviço de telefonia celular evoluiu de 2,8 telefones, para 53,61 celulares para cada 100 habitantes.59 Esse número não deixa de ser um avanço, contudo o maior responsável por esse avanço é o celular pré-pago, que no início de 2007 já representava, segundo a ANATEL, 80,6% do total de celulares em operação, fato intimamente relacionado ao baixo poder aquisitivo da população brasileira. Um dos motivos do avanço do pré-pago, e conseqüentemente dos celulares como um todo, é o baixo custo de aquisição de um aparelho para aqueles que não podem pagar uma assinatura de um telefone móvel ou de um fixo. O assinante do pré-pago sempre tem a alternativa de só receber ligações caso esteja sem condições financeiras para inserir créditos.60 O mercado de telefonia móvel ganhara mais uma empresa, a Unicel, que teve sua proposta aceita pela ANATEL em fevereiro de 2007 para atuar como operadora de A unidade da federação líder em densidade é o Distrito Federal (DF), com índice de 112,11 celulares para cada 100 habitantes. Depois vem o Rio Grande do Sul (RS) com 69,28. 60 Segundo dados da ANATEL, a Vivo, embora venha perdendo mercado, em janeiro de 2007, ainda era a empresa líder de mercado em telefonia celular com 28,85%, seguida da TIM, com 25,51% do mercado. A liderança da Vivo vem sendo ameaçada desde 2005, visto que a partir deste ano a diferença entre as duas maiores operadoras de telefonia móvel caiu de 11,12 pontos percentuais para 3,34 pontos percentuais. Em abril de 2007 a TIM veiculou comerciais de televisão afirmando que já era líder de mercado. Em terceiro lugar permanece a Claro com 23,96% do mercado e em quarto vem a Oi da Telemar, com 13,09% do mercado. A Telemig Celular/Amazônia Celular tem 4,67% do mercado e a 14BrasilTelecom GSM tem 3,46% do mercado, ambas com ligeiros ganhos em relação a 2006. A CTBC Telecom Celular manteve os 0,37% enquanto a Sercomtel Celular tem 0,09%. Somando a telefonia fixa e celular, a Telefônica, dona de 50% da Vivo é a empresa líder de mercado no Brasil. 59

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telefonia celular no maior mercado do país, a área metropolitana de São Paulo. A operadora irá concorrer com a Vivo, a Tim e a Claro, que já prestam serviços nessa região, e para atrair os consumidores promete tarifas 40% mais baratas que a média praticada por suas concorrentes. No que tange a tecnologia adotada, segundo a ANATEL, a Tecnologia GSM61 permanece líder do mercado, com 64.567.422 acessos, ou 64,11% do total. São 59,8 milhões de aparelhos no Brasil operando com tecnologia GSM, o equivalente a 61,93% dos celulares ativos. Já a tecnologia CDMA62 tem 25.853.004 acessos em serviço, ou 25,67% do total, e a TDMA63, 10.236.885, ou 10,16% do total. Sem expressão, a tecnologia analógica AMPS64 possui apenas 59.830 acessos (0,06% do total). Outro avanço importante dos serviços de telecomunicações no país foi quanto a ampla disponibilização de linhas fixas a preços reduzidos. Contudo a expansão dos terminais de telefonia fixa após a privatização foi bem inferior a expansão da telefonia móvel. Os terminais fixos instalados subiram de 22,1 milhões em 1998 para 53 milhões em 2005. Nesse mesmo intervalo de tempo os telefones públicos passaram de 589,1 mil para 1,65 milhões. Entretanto, o processo de expansão da telefonia fixa no início do atual século, com o cumprimento das metas pelas empresas de telefonia, sofreu uma reversão em seu ciclo de crescimento. Ocorreu uma retração das encomendas à indústria produtora de teleequipamentos e uma redução da demanda por prestação de serviços de telecomunicações. Uma das conseqüências foi o efeito negativo sobre o nível do emprego no setor de Telecomunicações como um todo. 65 A reversão do ciclo de expansão da telefonia fixa, segundo Oliveira (2004), impactou de forma mais intensa sobre o emprego terceirizado, justamente o que apresentou maior crescimento durante a fase de expansão da telefonia. Aproximadamente 30 mil postos de trabalho foram excluídos neste segmento entre 1997 e 2002, conforme dados da GSM é a sigla para Global System Mobile (sistema móvel global). É a tecnologia mais usada no mundo, especialmente na Europa, representando 73% do mercado internacional. Embora essa tecnologia seja tratada como “novidade" mais avançada no Brasil, ela é anterior ao CDMA e ao TDMA. Mas não significa que o GSM seja inferior ou mais atrasado que o CDMA. A facilidade de roaming e a dificuldade de fraudes representam duas de suas vantagens. 62 A sigla CDMA significa Code Division Multiple Access (acesso múltiplo por divisão de código). Os dados e a voz são separados dos sinais por códigos e depois transmitidos em um amplo conjunto de freqüências, sobrando assim mais espaço para a transferência de dados. Esse foi um dos motivos da CDMA ser mais indicada para o acesso ao 3G, que consiste em acesso a banda larga e troca de pesadas mensagens multimídias. Mas apenas 14% do mercado global pertence ao CDMA. 63 TDMA é a sigla para Time Division Multiple Access (acesso múltiplo por divisão de tempo) que se tarta de um sistema de celular digital que funciona dividindo um canal de freqüência em até seis intervalos de tempo distintos. Cada usuário ocupa um espaço de tempo específico na transmissão e isso impede problemas de interferência. 64 A sigla AMPS significa Advanced Mobile Phone System (sistema avançado de telefone móvel) e foi a primeira geração de sistemas celulares. Formada por sistemas analógicos, essa tecnologia estabeleceu a estrutura e funcionalidades básicas associadas a estes sistemas como roaming e handover entre células. 65 Para ilustrar a queda do emprego em outros setores pode-se citar como exemplo o caso das empresas LUCENT TECNOLOGIES, NORTEL NETWORK e XTAL FIBERCOR (empresa que durante o período estatizado fabricava fibra óptica para telecomunicações), que fecharam suas unidades de montagem de equipamentos para telefonia móvel, demitindo trabalhadores que atuavam em seus parques de montagem, trabalhadores com especialização técnica e larga experiência no setor. No caso da Xtal, a empresa além de fechar as portas, não pagou os direitos dos demitidos, que os buscam na Justiça. Informações de Welton Araújo (2007). 61

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Associação Brasileira de Empresas Prestadoras de Serviços de Telecomunicações levantados pela autora. Houve também substituição de técnicos mais especializados por mão-de-obra com menor remuneração e qualificação. Contudo, apesar do aumento da concorrência nos serviços de telecomunicações após a privatização do sistema TELEBRÁS, os preços das tarifas não diminuíram, não se observando desta forma uma das vantagens esperadas e apontadas pelos defensores da privatização de serviços públicos. Cabe destacar que para a telefonia fixa a concorrência é limitada, uma vez que as empresas necessitariam investir na construção de novas redes de cabo e uma infra-estrutura, o que ocorre somente para os grandes consumidores (grandes empresas e instituições, governos, etc.) e não para o conjunto da população. Na verdade, temos presenciado constantes reajustes no valor das tarifas de ligação e das assinaturas que, como ressalta Oliveira (2004) ainda é bastante elevado para a realidade brasileira. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), os preços das tarifas públicas tiveram uma elevação muito maior do que o IPCA, que é a medida oficial do governo para inflação. Entre 1994 e 2004, enquanto o IPCA acumulou uma elevação de 244% e a tarifa de água e esgoto 404%, os serviços de telefonia fixa sofreram um aumento de 982% em suas tarifas. 66 O alto custo das tarifas associado ao baixo poder aquisitivo da população brasileira levou ao aumento da inadimplência e do número de desligamento de linhas telefônicas. A inadimplência também esteve ligada à ânsia das empresas para atingirem as metas pré-estabelecidas, o que as motivou a reduzirem suas exigências em termos de aprovação e seleção dos seus clientes no que tange à sua capacidade de pagamento dos serviços. Após o cumprimento das metas de universalização, as empresas conseguiram autorização da ANATEL para reduzir o número de terminais públicos (TPs) instalados, sob a alegação do baixo rendimento dado o alto custo de manutenção, devido ao vandalismo na quebra de orelhões. O problema é que essa política de redução de TPs e de elevação das tarifas dificulta o acesso aos serviços telefônicos fixos de uma parte expressiva da população, que não tem menor poder aquisitivo. Quadro, que também contribuiu para a redução de postos de trabalho. Contudo, apesar da inadimplência, a demanda por serviços de telecomunicações é crescente, o que vem melhorando o desempenho econômico das empresas que operam no setor. Por exemplo, a Telemar, agora sob a marca Oi, obteve um crescimento de 18% no lucro líquido em 2006 em relação a 2005, atingindo um valor de R$ 1,3 bilhão. É o maior da história da empresa67. 66

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Uma das causas do aumento mais que proporcional da telefonia e de outros serviços privatizados em relação aos demais produtos da economia está relacionado à escolha do IGPM como o índice que corrigiria as tarifas após as privatizações. Esse índice é fortemente influenciado pelo preço de produtos cotados no mercado internacional, ou seja, preços fortemente atrelados ao dólar. Justamente em 1999 logo após a privatização da telefonia, o Real sofreu um processo de forte desvalorização frente ao dólar que refletiu para que este índice subisse bem mais que os outros índices de correção da inflação. Atualmente, a correção das tarifas é baseada em um índice especifico para telefonia criado em janeiro de 2006, o IST (Índice de Serviços de Telecomunicações) que variou 3,22% em 2006. Apenas no último trimestre de 2006, a operadora lucrou R$ 613,3 milhões, quantia 47,4% maior que a obtida no mesmo período de 2005.

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O setor de telecomunicações brasileiro ainda é considerado um dos mais promissores do mundo e os elevados investimentos realizados no setor por empresas que operam os serviços de telecomunicações é um indicador disso.68 Segundo dados da Folha de São Paulo, os investimentos em tecnologia da informação (TI) no Brasil em 2007 devem superar em 15,4% os realizados em 2006, atingindo R$ 45 bilhões, representando 2,2% do PIB brasileiro. A região Sudeste, que possui a maior concentração de grandes indústrias, mantém-se como o principal pólo de investimentos em TI no Brasil, respondendo por mais de 60% do total dos investimentos no ano de 2006. Apesar do forte crescimento, o setor, com exceção do segmento de call center, não é gerador de muitos postos de trabalho, fazendo com que os ganhos de produtividade fiquem muito altos.

Mudanças organizacionais e tecnológicas A primeira e central mudança do setor foi a alteração do padrão tecnológico, como exposto acima. As empresas continuam investindo pesadamente em inovações e na expansão dos serviços de telecomunicações, procurando acompanhar a evolução internacional do setor e respondendo à expansão da demanda. Segundo o jornal Folha de São Paulo, o setor tem realizado investimentos elevados no Brasil. Conforme a ANATEL, entre 2000 e 2005, foram investidos em telefonia fixa R$ 52,2 bilhões e R$ 38,3 bilhões em telefonia móvel. Somando os investimentos em serviços de comunicação em massa totalizam R$ 112,2 bilhões, nesse mesmo período. Segundo a Folha, as operadoras de serviços de telefonia fixa, celular e de TV por assinatura investiram R$ 18 bilhões em 2006 no Brasil, visando principalmente as novas tecnologias. Ao casar serviços de transmissão de voz, dados e vídeo, as empresas têm dois propósitos. Um deles é fazer a compensação financeira entre operações menos e mais rentáveis. O outro objetivo das teles é acabar com a troca de operadora, tornando o consumidor cativo, especialmente no momento em que começam a concorrer com empresas de comunicação. Neste caso é importante que a operadora ofereça os mesmos serviços que suas concorrentes como o pacote de cabo, telefone e acesso à internet. Atualmente a Telefónica é o maior investidor privado do país. Entre 1998 e 2006, essa empresa investiu R$ 29 bilhões no Brasil, sem contar os recursos para a compra da tele na privatização. A empresa anunciou ainda investimentos de R$ 15 bilhões no Brasil para os próximos quatro anos e assim chegará em 2010 com investimentos que totalizarão R$ 44 bilhões no país. Seus novos investimentos serão aplicados tanto em telefonia fixa quanto móvel, além de call center e internet. Somando as áreas de telefonia fixa e celular, a Telefónica é a líder no mercado brasileiro de telecomunicações. 68

A Telemar, que passará a se chamar Oi Fixo, atualmente está presente em 16 estados (Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Roraima e Sergipe) e, segundo pretende investir R$ 2,4 bilhões em 2007, estimulada pelos bons resultados que vem obtendo. A TIM, mesmo que com dificuldade para apresentar lucro (em 2006 fechou no vermelho depois de obter lucro no ano anterior), investiu R$ 1,6 bilhão em 2006, valor expressivo ainda que 38,5% menor ao investido em 2005. Aproximadamente 26% dos investimentos foram direcionados à melhoria dos sistemas de tecnologia da informação, segundo a Folha de São Paulo.

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Em segundo lugar, do ponto de vista organizacional, há fusões e aquisições, como forma de ampliar a competitividade frente a concorrência, de inibir a entrada de novas operadoras e de ampliar sua participação no mercado tanto de produtos de massa quanto para grandes clientes. Até o momento, a concorrência mais intensa ocorre no setor de telefonia móvel. Na fixa, ela é relativa, pois ainda permanece um loteamento de área das principais operadoras e as tentativas de constituição de empresas “espelho”69 não tiveram sucesso, como foi o caso da Vésper, no Estado de São Paulo. Em terceiro lugar, destaca-se a terceirização, como forma de reduzir custos e burlar a regulação do trabalho do setor. Ela ocorre em três níveis. Em primeiro lugar, ela começou em alguns setores internos ligados à manutenção do patrimônio, da faxina, da infra-estrutura e da portaria, ainda no período em que as empresas eram estatais. Depois, a terceirização ocorreu na rede externa, que é constituída pelas áreas de manutenção, expansão e instalação de linhas telefônicas e centrais. Essa terceirização ocorreu após a privatização, trazendo, nos primeiros anos, uma infinidade de problemas, pois os empregados eram, em geral, inexperientes e sem qualificação para o exercício da função. Questão que ocasionou uma explosão de reclamações no Procon, tornando o setor um campeão de queixas durante quatro anos seguidos (Uchima, 2005). Essa questão levou a um problema de falta de profissionais qualificados, fazendo com que houvesse, no caso de São Paulo, um curso específico para formar cabistas, instaladores, ligadores, etc (Araújo, 2007b). A tendência recente é a concentração das empresas terceirizadas de prestação de serviço70, o que está levando a uma nova rodada de racionalização de custos e empregos. Por exemplo, na região de Campinas, assim como de Recife, uma única empresa faz o trabalho da rede externa. O que acarretou uma brutal queda no número de empregados. Por exemplo, entre 1999 e 2002, na Região Metropolitana de Campinas, havia quatro empresas prestadoras de serviços para a Telefônica, contratadas para atender as metas da ANATEL de universalização, juntas elas empregavam aproximadamente 10 mil trabalhadores. A partir de 2003, com o afrouxamento das metas e por pressão da empresa principal houve fusões destas empresas, reduzindo o total de trabalhadores para menos de 2 mil. Uma redução de aproximadamente 80% dos empregos, segundo Araújo (2007b)71. Na terceira fase, a terceirização atingiu a planta interna das empresas, que são responsáveis pela comutação e transmissão de dados, atingindo setores com maior grau de qualificação profissional (Campelo, 200772 e Uchima, 2005). Uma das estratégias utilizadas foi fazer a terceirização por meio da contratação de ex-profissionais, que sustentaram, pelo seu conhecimento técnico, o período de transição até a viabilização de um quadro técnico capaz de executar o serviço. É um processo que leva à redução drástica dos contratados diretamente, provocando uma alteração do perfil dos trabalhadores em telecomunicações, como será visto Empresa espelho foi o nome dado às empresas que receberam autorização para explorar o Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC nas áreas definidas pelo Plano Geral de Outorgas da ANATEL e passaram a concorrer com as teles fixas oriundas da privatização da Telebrás. 70 Informação confirmada por dois dirigentes sindicais: Cristina Campello de Recife e Welton Araújo, São Paulo. 71 Entrevista concedida em abril de 2007, especificamente para a elaboração do presente artigo. Welton Araújo é dirigente sindical do SINTETEL/SP. 72 Entrevista concedida em abril de 2007, especificamente para a elaboração do presente artigo.Cristina Campelo é dirigente sindical do SINTTEL/PE. 69

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abaixo. Por último, a terceirização avançou sobre o atendimento aos clientes, especialmente pelo desenvolvimento do call center, que, em muitos casos, é uma nova firma, mas com controle acionário da empresa de telefonia. A combinação entre a inovação tecnológica, reengenharia e terceirização levou a uma redução do número de empregados. Essa redução intensificou-se após 2002, a partir do momento que as empresas atenderam as metas de expansão e da chamada telefonia social. A partir de então, também há uma expansão mais lenta da demanda pelo telefone fixo, o que reduz o número de novas instalações. A expansão de empregos ocorreu no segmento do call center, do comércio na área da telefonia móvel e nos serviços especializados e integrados para grandes clientes. Além disso, também há mudança no perfil dos trabalhadores do segmento, como será visto abaixo.

Características do perfil do emprego em telecomunicações A transferência da operação dos serviços de telecomunicações para a iniciativa privada foi um marco em termos de mudanças no perfil da mão-de-obra empregada no setor, especialmente em relação à faixa etária, ao tempo de permanência no serviço, ao padrão de remuneração e das condições de uso do trabalho. Tal mudança no perfil tem relação direta com a redução de postos de trabalho na empresa principal e com a reorganização realizada no setor privatizado. Algumas funções clássicas desapareceram outras profissões foram transferidas para empresas terceirizadas e, ainda, outros segmentos desenvolveram-se, tais como o call center. Embora as centrais de atendimento aos clientes (call centers) tenham gerado um volume expressivo de novas oportunidades de trabalho, caracterizaram-se por uma deterioração das condições de trabalho em termos de rendimentos e intensificação das atribuições. Como podemos observar na Tabela 1, em 2002, as 20 maiores empresas de call center já empregavam 122.294 pessoas. As empresas de telemarketing pertencentes à concessionária de telefonia fixa Telefônica (Atento) e à Telemar (Contax) possuíam o maior número de trabalhadores. Do ponto de vista geográfico, o Estado de São Paulo, em função de sua posição como centro comercial e financeiro, abrigava as principais empresas deste segmento.

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TABELA 1 - PESSOAL OCUPADO EM EMPRESAS DE CALL CENTERS – 2002 Empresas Atento Brasil Contax Teleperformance Brasil CSU TeleSystem CBCC ACS Contact Center Telefutura Contact Center Dedic Softway Telemarketing Criativa Telemarketing SPCom TMKT Brasilcenter TMS Call Center EDS TeleTech Vermont Sitel Telesoluções Telemarketing & Call Business Uranet Total

Nº de ocupados 25.000 19.000 7.710 6.000 5.320 2.500 9.500 5.310 5.700 5.040 3.500 3.734 4.518 1.990 8.510 750 900 2.000 4.000 1.312 122.294

Fonte: http://www.callcenter.inf.br

Entre 2002 e 2006 houve um crescimento expressivo de números de empregados. As 20 maiores, em 2006, já empregavam em torno de 220 mil trabalhadores. TABELA 2 - PESSOAL OCUPADO EM EMPRESAS DE CALL CENTERS - 2006 Empresa Atento Contax Teleperformance Dedic Telefutura CSU ACS Softway Provider TMKT A&C Contact Center Brasilcenter Sercom SPCom Contractors G&P - Contact Center Uranet Ask! TMS - Call center Telesoluções Subtotal (20 maiores) Demais Empresas* Total

Nº de ocupados 52.000 49.554 18.500 16.065 12.200 8.679 7.000 7.000 5.593 5.276 4.700 4.518 3.800 3.800 3.520 3.464 3.365 3.320 3.300 3.200 218.854 45.886 264.740

Fonte: http://www.callcenter.inf.br - * empresas com mais de cinco empregados.

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Como podemos verificar na Tabela 2, as duas maiores empresas de call center do Brasil mais que dobraram o número de seus empregados entre 2002 e 2006, consolidando-se no grupo das empresas que mais empregam no país. Podemos apontar três causas importantes para o enorme crescimento de postos de trabalho em call centers. A primeira está relacionada ao elevado crescimento do número de clientes de telefonia fixa e principalmente de telefonia móvel no país. Esse crescimento conseqüentemente também exigiu um aumento dos empregados em atendimento ao cliente por telefone. Outra causa importante está relacionada a terceirização dos serviços de atendimento ao consumidor (SACs) nos mais variados setores, antes realizados pelas próprias empresas. Assim, muitas outras empresas priorizaram a relação com os seus clientes por meio do tele-atendimento. Em terceiro lugar, o telemarketing passou a ser um serviço de venda de produtos dos mais variados tipos, destacando-se, por exemplo, os produtos bancários, de comunicação/informação e da própria telefonia. Apesar dos índices expressivos do emprego nos call centers, isto precisa ser relativizado. Por um lado, os call centers criam novas oportunidades ocupacionais proporcionadas pelas inovações tecnológicas e organizacionais, em um ambiente de maior abertura e concorrência econômica. Por outro lado, eles eliminam postos de trabalho em empresas que tinham atendimento direto a seus clientes. Na tabela 3, é possível verificar esse movimento, pois há ao mesmo tempo, um forte crescimento de novos empregos e uma redução, em menor número, de postos de trabalho nas empresas concessionárias de telefonia. Tabela 3 - Número de Empregados das Empresas de Telefonia Fixa Empresas Telemar sem Contax73 Contax (Call center da Telemar) Brasil Telecom Telefônica Embratel CBTC Telecom

1998 32326 (c/ Contax) 12818 22219

Sercontel

2002 11205 17842 5676 9516 12010

2004 9181 27392 5800 7125 13882

2005 7566 5803 7770 13880 8932 (6255 do Call center) 560

Fonte: Araújo (2007)

A tabela 3 mostra que ocorreu uma queda significativa no número de ocupados em três das quatro principais operadoras de telefonia fixa, após 1998. A Embratel foi a única das quatro que não apresentou queda do nível de emprego, contudo é preciso considerar que não encontramos o número de empregos em 1998 para essa empresa e que depois de 2002, ela comprou a Vesper, a Primesys e parte da Net, o que elevou o número de seus empregados. Considerando apenas os funcionários que não trabalham em call center, as sete empresas relacionadas na tabela 3 respondiam por 38.256 ocupações em 2005. Neste mesmo ano, segundo a revista Clientesa74, os trabalhadores em call center com mais de cinco empregados somavam 240 mil ocupados. As duas maiores operadoras de telefonia fixa do país, Telemar e Telefônica, mesmo 73 74

Inclui a empresa Oi de telefonia celular. Cf. http://www.callcenter.inf.br.

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depois do corte de vagas que o setor sofreu após 2001, ano de cumprimento da metas, ainda apresentaram queda sensível de empregados. Juntas possuíam 20.721 empregados em 2002, excluindo os call centers, número que cai para 15.336 ocupações em 2005, ou seja, uma extinção de 5.385 vagas, ou cerca de recuo de 25% do quadro de empregados em apenas três anos. Isso em um contexto de franca expansão da telefonia no país, cujo número de aparelhos fixos instalados subiu de 45,1 para 58 milhões neste período. Mesmo a telefonia celular que vem apresentando um incrível crescimento tem sofrido ligeira queda em seus postos de trabalho, como é possível observar nas principais operadoras de telefonia móvel, conforme tabela 4. Tabela 4 - Número de Empregados das Principais Empresas de Telefonia Móvel Empresas Vivo Claro Tim

2000 6674 7327 2468

2002 7843 5286 2381

2005 6151 6432 2446

Fonte: Araújo (2007)

Das três principais empresas de telefonia móvel relacionadas na tabela 4, acima, apenas a Tim não apresentou queda no número de ocupados entre 2000 e 2005. A queda mais sensível se deu na empresa Claro, ainda que essa empresa venha ganhando participação em um mercado em enorme expansão e que entre os funcionários citados na tabela acima estejam seus operadores de call center, atividade que vem expandindo fortemente o número de empregos. Analisando os dados da RAIS, que contabiliza apenas os empregos formais, podemos verificar que, a despeito do espetacular crescimento dos serviços de telefonia no Brasil, o número de empregos em telecomunicações entre 1995 e 2005 praticamente não se alterou tendo até mesmo sofrido uma ligeira queda, como podemos ver na tabela 5, a seguir. Embora o número de ocupados nas Telecomunicações praticamente não tenha aumentado entre 1995 e 2005, exceto por cinco estados e o Distrito Federal, todos os demais estados brasileiros perderam ocupações neste intervalo. Vale ressaltar que houve uma acentuada concentração de ocupações no Estado de São Paulo e que ocorreu uma forte queda de vagas no Estado do Rio de Janeiro. O intrigante é que o enorme crescimento de ocupações que constamos nas empresas de call center não afetou o número de ocupados contabilizados pela RAIS. A hipótese para esse resultado é que a RAIS ainda não conseguiu captar o emprego em telemarketing, pois parte das empresas que o realizam identificam-se como prestadoras de serviços a terceiros. É um campo especulativo que precisa ser melhor observado em pesquisas futuras. Apesar das limitações nos dados da RAIS é possível observar que a maioria dos empregados está localizada nas empresas de grande porte (tabela 6). As empresas com mais de 500 funcionários respondiam por 60% das ocupações formais do setor em 2005, sendo que as empresas com mais de mil funcionários respondiam por 43% dos ocupados.

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TABELA 5 - NÚMERO DE OCUPAÇÕES NO SETOR DE TELECOMUNICAÇÕES DO BRASIL Unidade da Federação Rondônia Acre Amazonas Roraima Para Amapá Tocantins Maranhão Piauí Ceara Rio Grande do Norte Paraíba Pernambuco Alagoas Sergipe Bahia Minas Gerais Espírito Santo Rio de Janeiro São Paulo Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás Distrito Federal Total

1995 n. absoluto % 649 0,54 312 0,26 1.317 1,10 214 0,18 2.854 2,39 239 0,20 292 0,24 1.255 1,05 776 0,65 637 0,53 1.095 0,92 1.476 1,23 2.961 2,48 982 0,82 728 0,61 4.752 3,98 10.623 8,89 1.862 1,56 23.817 19,92 32.563 27,24 8.506 7,12 3.616 3,02 7.278 6,09 1.527 1,28 1.357 1,14 2.461 2,06 5.388 4,51 119 .539 100,00

2000 n. absoluto 283 249 781 88 2.073 87 141 599 456 1.887 1.800 1.374 459 333 4.636 11.457 538 23.494 37.532 8.161 3.497 5.293 683 720 1.983 4.907 113.511

% 0,25 0,22 0,69 0,08 1,83 0,08 0,12 0,53 0,40 1,66 1,59 1,21 0,40 0,29 4,08 10,09 0,47 20,70 33,06 7,19 3,08 4,66 0,60 0,63 1,75 4,32 100,00

2005 n. absoluto 366 176 676 64 1.864 115 219 479 223 1.177 533 948 2.479 307 324 2.974 8.111 703 15.166 42.228 13.781 3.598 4.095 3.209 995 6.045 7.225 118.080

% 0,31 0,15 0,57 0,05 1,58 0,10 0,19 0,41 0,19 1,00 0,45 0,80 2,10 0,26 0,27 2,52 6,87 0,60 12,84 35,76 11,67 3,05 3,47 2,72 0,84 5,12 6,12 100,00

Fonte: RAIS

TABELA 6 - EMPREGOS FORMAIS EM TELECOMUNICAÇÃO POR TAMANHO DE EMPRESASEGUNDO O NÚMERO DE OCUPADOS Faixas de tamanho de empresa por número de ocupados Até 4 vínculos ativos De 5 a 9 vínculos ativos De 10 a 19 vínculos ativos De 20 a 49 vínculos ativos De 50 a 99 vínculos ativos De 100 a 249 vínculos ativos De 250 a 499 vínculos ativos De 500 a 999 vínculos ativos 1000 ou mais vínculos ativos Total

1995 n. absoluto % 2.140 1,8 2.578 2,2 4.418 3,7 7.948 6,6 9.229 7,7 9.550 8,0 8.649 7,2 10.644 8,9 64.383 53,9 119.539 100,0

2000 n. absoluto % 2.360 2,1 3.013 2,7 5.224 4,6 8.862 7,8 9.474 8,3 13.103 11,5 13.414 11,8 15.574 13,7 42.487 37,4 113.511 100,0

2005 n. absoluto % 2.550 2,2 3.095 2,6 4.777 4,0 7.528 6,4 6.432 5,4 12.078 10,2 11.303 9,6 19.252 16,3 51.065 43,2 118.080 100,0

Fonte: RAIS

Desdobrando os dados pelas principais ocupações, conforme indicado na tabela 7, pode-se observar que os “operadores de telefonia e telemarketing” representavam 22,2%

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do total da mão-de-obra formal do setor. Depois, vêm os “escriturários em geral, agentes, assistentes e auxiliares administrativos, etc” e “técnicos de telecomunicações”, que representavam, respectivamente, 12,8% e 10,6% do total dos empregados formais. Além disso, têm-se os instaladores e reparadores de linhas e cabos elétricos, telefônicos, etc, que correspondiam a quase 7% dos profissionais. Faz-se necessário apontar uma ressalva: as empresas preferem contratar como técnico e não como instaladores e cabistas com o propósito de não reconhecer os adicionais de riscos inerentes a essas funções, especialmente de periculosidade e seguro acidente trabalho. Em todo caso, o que chama a atenção é que as ocupações técnicas representavam somente 22.146 postos de trabalho, ou seja, 18,8% do total de empregos formais. Mesmo admitindo problemas na base de dados na RAIS é um número pequeno em comparação, por exemplo, ao número de gerentes, diretores e supervisores, que correspondiam a 11% dos empregos formais em telecomunicações no país. Nos técnicos estão excluídos os postos de trabalho que exigem nível superior, bastante expressivo, conforme tabela abaixo. TABELA 7 - TRABALHADORES EM TELECOMUNICAÇÕES POR OCUPAÇÃO NO BRASIL– 2005 Ocupação Operadores de telefonia e telemarketing Operadores do comércio em lojas e mercados Técnicos em telecomunicações Técnicos de vendas especializadas Técnicos diversos Escriturários em geral, agentes, assistentes e auxiliares administrativos Instaladores e reparadores de linhas e cabos elétricos, telefônicos Supervisores de atendimento ao público e de pesquisa Supervisores Diversos Gerentes e Diretores Analistas de sistemas computacionais Engenheiros Profissionais de relações públicas, publicidade, mercado e negócios Economistas, administradores, contadores e afins Outras ocupações Total dos ocupados

Número de ocupados n. absoluto % 26.218 22,2 6.306 5,3 12.550 10,6 3.218 2,7 6.378 5,4 15.056 12,8 7.751 6,6 1.251 1,1 2.830 2,4 8.712 7,4 5.506 4,7 5.314 4,5 3.810 3,2 2.113 1,8 11.067 9,4 118.080 100,0

Fonte: RAIS

Contudo, a elevada representatividade dos cargos de nível superior, cargos de chefia e até mesmo de técnicos não impediu a grande prevalência de baixas remunerações. Como pode ser constatado na tabela 8. Considerando os dados da RAIS (empregos formais), é notável a deterioração das remunerações no setor de telecomunicações como um todo, que já se desenhava nos anos em que se preparava para a privatização. Depois disso, a tendência foi acentuá-la. Como se pode verificar, houve uma forte transferência para empregos com remuneração mais baixa. Em 1994, ao menos 55% dos ocupados formais ganhava mais de 10 Salários Mínimos (SM). Destes, 45% com mais de 15 SM e 30% com mais de 20 SM. Já em 2005, quase 50% ganhava até 4 SM, sendo 24% com até 2 SM.

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TABELA 8 - DISTRIBUIÇÃO DOS RENDIMENTOS DO TRABALHO FORMAL EM TELECOMUNICAÇÕES POR FAIXAS DE RENDIMENTO (EM SALÁRIOS MÍNIMOS) Faixas de Rendimento Até 1 SM Mais de 1a 2 SM Mais de 2 a 3 SM Mais de 3 a 4 SM Mais de 4 a 5 SM Mais de 5 a 7 SM Mais de 7 a 10 SM Mais de 10 a 15 M Mais de 15 a 20 SM Mais de 20 SM

1994 1,17 3,00 3,13 3,05 3,03 6,41 14,15 20,46 13,96 31,63

1999 0,63 5,82 6,63 6,27 6,47 14,11 14,76 16,53 10,03 18,75

2003 0,86 16,06 13,13 9,08 6,51 9,75 11,55 13,12 7,68 12,24

2005 1,47 22,61 13,59 9,21 6,29 9,12 10,22 11,30 6,60 9,58

Fonte: RAIS; Araújo (2007)

Segundo Araújo (2007), o governo brasileiro, com o objetivo de garantir maior competitividade e rentabilidade aos investidores, editou diversas leis modificando a carta laboral dos trabalhadores em telefonia com intuito de atrair investidores externos, assegurando-lhes por via legal a possibilidade de reduzir seus custos com mão-de-obra. Essa estratégia compôs juntamente com outras ações, como o investimento de R$21 bilhões no setor, os esforços do governo para tornar o setor mais atrativo para a privatização. Assim, como se pode verificar, um setor que remunerava bem sua mão-de-obra formal, passou notadamente por um processo de intenso achatamento salarial. Como os salários não podem ser reduzidos por Lei podemos inferir que houve uma profunda rotatividade no setor, na qual os empregados bem remunerados foram substituídos por empregados mal remunerados. Essa rotatividade também pode ser observada com a diminuição do tempo de permanência no serviço e a redução das faixas etárias dos trabalhadores. Contudo, como podemos constatar na tabela 9 abaixo, os novos ocupados no setor, apesar da redução da remuneração média, possuem um grau de escolaridade sensivelmente mais elevado. Entre 1994 e 2005, houve uma forte redução da parcela dos ocupados sem o 2º grau completo e um sensível aumento de ocupados com superior completo, conforme tabela abaixo. TABELA 9 - DISTRIBUIÇÃO DOS EMPREGOS FORMAIS EM Grau de Escolaridade Até 2º Grau incompleto 2º Grau Completo Superior Completo

1994 34,2 40,6 18,6

1999 24,0 44,0 25,9

2005 6,6 42,6 35,3

Fonte: RAIS; Araújo (2007)

O Ensino Médio é um pré-requisito na contratação de novos trabalhadores, como política das empresas de ter uma força de trabalho mais escolarizada para facilitar obtenção de certificados de qualidade. Essa elevação de escolaridade tem relação com a política de contratação das empresas de call centers, que exige o Ensino Médio completo para a função de operador de tele-atendimento. Como o desemprego é muito alto, especialmente entre os jovens, muitas vezes, as vagas de operadores são preenchidas por pessoas com curso superior completo ou estudantes universitários.

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Paralelamente ao aumento da escolaridade, houve também um expressivo aumento de ocupados com faixa etária mais baixa, como pode ser notado na tabela 10 abaixo. É possível constatar um expressivo aumento de ocupados entre 18 e 24 anos e um pouco menos acentuado entre 25 e 29 anos, enquanto ocorreu uma forte redução da parcela de ocupados com mais de 40 anos. TABELA 10 - DISTRIBUIÇÃO DAS OCUPAÇÕES FORMAIS POR FAIXA ETÁRIA 1994 7,5 11,4 36,8 35,4 8,8 0,2

Faixa Etária 18 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 64 anos 65 ou mais

1999 16,2 16,2 29,7 31,3 6,0 0,1

2005 23,5 24,7 30,1 16,3 5,4 0,1

Fonte: RAIS; Araújo (2007)

As tabelas acima nos levam a concluir que houve uma nítida substituição de trabalhadores com maior idade e melhor remuneração por uma força de trabalho mais jovem, mais escolarizada e com baixa remuneração. Outra modificação importante diz respeito ao tempo de permanência no emprego.Tal modificação também não caminhou no sentido de melhorar as condições de trabalho uma vez que houve uma sensível redução do tempo de permanência no emprego dos trabalhadores formais em telecomunicações entre 1994 e 2005, como podemos observar na tabela 11 a seguir. TABELA 11 - DISTRIBUIÇÃO DOS TRABALHADORES FORMAIS EM TELECOMUNICAÇÕES, SEGUNDO O TEMPO DE PERMANÊNCIA NO EMPREGO POR FAIXAS MENSAIS TEMPO DE EMPREGO (EM MESES) Até 2,9 3,0 a 5,9 6,0 a 11,9 12,0 a 23,9 24,0 a 35,9 36,0 a 59,9 60,0 a 119,9 120,0 ou mais

1994 3,8 2,7 4,7 7,5 4,1 3,9 14,5 58,9

1999 25,0 7,6 10,3 10,4 6,2 5,1 7,0 28,4

2005 11,2 10,7 16,3 21,5 10,1 13,1 9,0 8,1

Fonte: RAIS; Araujo (2007)

A maior modificação ocorreu na parcela de empregados com mais de 10 anos (120 meses) de empresa que despencou de 58,9% para 8,07%. Assim, esse setor no qual seus trabalhadores apresentavam uma longa permanência no emprego passou a ter 60% de sua força de trabalho com menos de dois anos de casa em 2005, parcela esta que não chegava a 20% em 1994. É interessante observar ainda que em 1999, logo após a privatização do setor, houve uma queda acentuada de trabalhadores entre 5 e 10 anos de casa e principalmente com mais de 10 anos seguida de um incrível aumento da parcela com menos de 3 meses, em relação a 1994. Isso denota uma forte substituição da mão-de-obra com maior tempo de casa por recém contratados.Em relação à produtividade, os dados da

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TABELA 12 - RESULTADO DE SETORES SELECIONADOS – BRASIL 2003 - (EM R$ 1.000) Setor Energia Telecomunicações Logística Saúde Construção Tecnologia da Informação Saneamento Comunicação Serviços Especializados Turismo e Alimentação Esportes e Entretenimento Associações de Classe Total

Receita Líquida Receita Líquida por Funcionário 82.079.280,00 519,99 65.657.602,00 704,77 50.197.824,00 109,76 26.097.250,00 76,17 24.007.945,00 81,37 16.906.632,00 138,58 15.079.627,00 32,81 13.769.014,00 128,58 5.078.496,00 77,92 2.901.369,00 32,39 1.129.277,00 42,43 532.441,00 111,82 303.436.757,00 95,57

Fonte: Queiroz (2005); Gazeta Mercantil.

Gazeta Mercantil levantados por Queiroz (2005) apontam o setor como um dos que apresentavam, em 2003, a melhor relação de receita líquida por funcionário no Brasil. Dos setores expostos na tabela 12, o setor telecomunicações era de longe o que apresentava a melhor relação receita líquida por funcionário. Exceto pelo setor de energia, a contribuição de cada funcionário das telecomunicações para a formação da receita líquida era muito maior do que a observada nos demais setores relacionados na tabela 12 (acima). Entre as atividades do setor de telecomunicações a telefonia móvel, seguida de perto pela telefonia fixa, apresentava, em 2003, a melhor relação receita líquida por funcionário como mostra a tabela 13. Já as atividades de telemarketing e call center apresentavam uma relação muito baixa, contribuindo para reduzir a média do setor. TABELA 13 - RESULTADO DAS TELECOMUNICAÇÕES POR ATIVIDADE - 2003 (EM R$ 1.000) Telecomunicações Telefonia Fixa e de longa distância Telefonia Móvel Telemarketing e Call center Diversos Total

Receita Líquida Receita Líquida por Funcionário 42.058.915,00 931,95 20.438.704,00 1.085,32 1.420.023,00 38,91 1.739.960,00 477,59 65.657.602,00 704,77

Fonte: Queiroz (2005); Gazeta Mercantil.

Os dados apresentados nas duas tabelas acima indicam que o setor de Telecomunicações não é um setor de trabalho intensivo e que a mão-de-obra é altamente produtiva. Esse setor entre os relacionados na tabela 13,é o que obteve, em 2003, a maior receita líquida, mostrando-se altamente rentável e com baixo contingente de mão-de-obra. Portanto, esse é um setor em que não ocorre o fenômeno de inchaço do terciário. Os vários dados relacionados ao emprego em telecomunicações levantados até aqui não desenham um quadro favorável aos trabalhadores do setor. Os empregados do setor embora apresentem elevada escolaridade e contribuam fortemente para a composição da receita líquida têm sofrido queda acentuada em seus níveis de remune-

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ração e seu tempo de permanência no emprego. O setor também tem privilegiado fortemente a contratação de empregados com pouca idade e eliminado os trabalhadores com mais idade e maior tempo de casa. No que se refere à criação de postos de trabalho apenas os call centers têm mostrado dinamismo, elevando fortemente o número de ocupações. Entretanto, mesmo criando elevada quantidade de postos de trabalho, vem propiciando empregos precarizados, seja em termos de remuneração, seja em termos das condições de trabalho. Por outro lado, como parte do crescimento do emprego no setor está relacionada a terceirização dos serviços de atendimento ao consumidor de empresas de outros setores, os call centers acabam contribuindo para a eliminação de vagas de trabalho em outros setores. Como as ocupações em call centers são basicamente as únicas que vêm apresentando crescimento no setor de telecomunicações, na seção seguinte procuraremos descrever as suas principais funções: os operadores em telefonia e telemarketing. Outra questão é a baixa qualidade dos empregos gerados em call centers, que tende imprimir altas exigências com forte pressão sobre os operadores, mas com baixa remuneração e condições de trabalho precárias e marcadas pela insegurança. Expressão dessas condições de uso e remuneração do trabalho está na altíssima taxa de rotatividade do segmento. Também é preciso considerar que um call center tem elevada flexibilidade em termos de localização, permitindo a transferência das empresas para municípios nos quais a mão-de-obra é mais barata e apresentam maiores incentivos fiscais. 75 Neste início do século XXI, as centrais são, do ponto de vista estritamente técnico, facilmente deslocáveis para regiões que tenham aluguéis mais baratos e concedam abonos fiscais para a implantação. Outra alternativa que o segmento vem perseguindo é a instalação em antigas zonas industriais, hoje em declínio, muitas vezes beneficiando-se de subvenções oferecidas pelo Estado, na tentativa de recuperar esses centros, dando nova função a antigos edifícios, antes destinados a linhas de produção industriais. O Brasil vive o mesmo fenômeno de outra forma, descentralizando lentamente suas centrais de atendimento para zonas e cidades periféricas aos grandes centros urbanos. (...) O deslocamento das centrais para municípios menores tem grandes vantagens para os empresários, que relacionam como ganhos materiais a redução do preço do espaço físico e dos custos com vale-transporte e impostos como, por exemplo, o imposto sobre serviços com percentuais menores. (Venco, 2006: 52 e 53)

Características da função de operador de call center76 Os serviços de atendimento ao consumidor (SACs), antes vinculados às vendas, ganharam impulso notável recentemente. A expansão dos serviços de consulta telefônica gratuita, via 0800, por exemplo, é um dos vetores do avanço dos SACs. Segundo Esse foi o caso da Vésper, antes de ser adquirida pela Embratel, que fez um investimento considerável em um prédio moderno e contratou cerca de 1000 empregados em Campinas, pagando um salário razoavelmente maior que o mercado para seu atendentes além de oferecer bons benefícios. Pouco mais de um ano funcionando a Vésper fechou seu call center em Campinas e demitiu todos os funcionários. Paralelamente abriu um call center em Macaé-RJ pagando quase a metade do salário que pagava em Campinas. 76 Esta seção foi amplamente baseada na Tese de Doutorado de Selma Venco. Essa autora realizou vários estudos sobre operadores de call center. Sendo a sua tese um estudo bastante aprofundado sobre a profissão. Ver Venco (2006). 75

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Venco (2006), esse impulso está relacionado em parte com o desenvolvimento dos direitos ao consumidor e o crescimento expressivo desse tipo de serviço, que já aparecia no início da década de 1990. Contudo, foi com o avanço da tecnologia que associou a informática e as telecomunicações que a atividade ganhou impulso. Esse novo impulso foi marcado pelo surgimento de grandes call centers, empresas destinadas a captar serviços de empresas dos mais variados ramos como bancos, indústrias, comércio, seguradoras, etc. Os call centers são espaços que agregam diversas equipes incumbidas de, via telefone, informar, vender, oferecer suporte técnico e serviços como cobrança de títulos. Essas empresas têm se expandido no Brasil, ampliando a quantidade de serviços prestados por seus operadores. 77 As funções realizadas no interior dos call centers pelos operadores são bastante diversificadas, porém podemos classificá-las em três grupos ou tipos de atendimento: ativo, receptivo e híbrido. O atendimento receptivo, como descreve Venco (2006), recebe ligações dos clientes e dá orientações, informações, suporte técnico ou prestação de serviços, como nos SACs ou nas informações sobre serviços públicos, financeiros e etc. 78 Já o atendimento ativo parte das centrais de atendimento e, como ressalta Venco (2006), é praticamente sinônimo de venda, ainda que inclua informações referentes ao produto vendido. Ao contrário do atendimento receptivo que em muitos casos funciona 24 horas sete dias por semana. Nesse tipo de abordagem o contato se limita a um determinado período do dia79 . Por sua vez, o atendimento híbrido combina o atendimento receptivo e o ativo, o que exige mais habilidade e experiência do operador, uma vez que este deve estar apto para atuar em ambas as situações. O tempo médio do atendimento pelos operadores de call centers varia de acordo com os objetivos de cada transação seja esta comercial ou informativa. No Brasil, segundo Venco (2006), o tempo médio é de 3,27 minutos, não sendo registradas alterações significativas entre os diferentes tipos de atendimento, com exceção das operações de cobrança de débitos financeiros, que duram em média 4,27 minutos Em outros países onde há forte presença de call centers o tempo médio de atendimento costuma ser maior que a média brasileira, variando de 3,6 a 9,7 minutos.Vale ressaltar que, quando, por razões diversas, esse tempo médio de atendimento não é alcançado, os trabalhadores são punidos pelas empresas. A punição vai desde uma simples advertência verEssa diversificação de serviços fez surgir a denominação de contac centers que, segundo Venco (2006) se distingue dos call centers por oferecerem, além de atendimento ativo ou receptivo, sistemas informatizados e incorporarem tecnologias para atender clientes e fornecedores, expressão do próprio avanço da atividade. 78 Segundo Venco (2006), nessa modalidade de atendimento, destaca-se a equipe de retenção, que também recebe chamadas, mas está incumbida de reverter pedidos de cancelamento de determinado serviço ou produto como TV a cabo, assinatura de revista, jornal, banda larga etc. As estratégias para impedir a revogação de contratos de serviços ou produtos baseiam-se em “argumentos verdadeiros”, baseados na oferta de descontos, melhores formas de pagamento ou brindes. A autora aponta que algumas empresas adotam também “argumentos falsos”, alegando problemas técnicos, muitas vezes inexistentes, dando informações conflitantes com atendimentos anteriores ou ainda, concretizados em scripts fraudulentos. 79 O telemarketing é realizado de segunda a sexta-feira, das 9h00 às 21h00 e, aos sábados, das 10h00 às 16h00. 77

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bal até a supressão de prêmio de qualidade, passando inclusive por ameaça de demissão por justa causa e suspensão. O serviço dos operadores de call center é monitorado e supervisionado, sendo que, os primeiros são dez vezes mais numerosos que os monitores e supervisores no Brasil. A base da pirâmide hierárquica, como descreve a autora, é composta exclusivamente por operadores, ficando no patamar seguinte os supervisores de equipe, incumbidos de obter dos operadores o alcance das metas, e os monitores, que ouvem as ligações dos operadores e apontam falhas no atendimento dos operadores. No próximo degrau ficam os subgerentes, responsáveis por analisar os relatórios de produtividade, depois os gerentes responsáveis pelas campanhas ou contas e, em outro nível, as gerências de recursos humanos, comercial e marketing. No degrau mais alto da pirâmide fica a superintendência. Essa escala é acompanhada por um significativo diferencial de remuneração, na perspectiva de privilegiar os níveis mais elevados. Remuneração que tende para as escalas mais altas ser flexível, de acordo com as metas alcançadas. Para a função de operador de call center no Brasil é exigida a escolaridade mínima de Ensino Médio completo, mas o estudo de Venco (2006) apurou em locais com dificuldade de recrutamento da força de trabalho escolaridade menor e remuneração inferior ao piso salarial da categoria. Em 2005, o Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing negociou pisos de R$ 558,62 para operadores não comissionados e de R$ 510,92 para comissionados. Em 2005, segundo Venco (2006), 21,9% dos operadores de call center possuíam curso superior enquanto 73,7% possuíam Ensino Médio e 4,4% apenas o Ensino Fundamental. No que tange ao gênero, a presença feminina prevalece. As empresas estimam que elas representem entre 80 e 85% dos operadores. As empresas de call center dão treinamento aos seus operadores antes de passarem a exercer sua função. Contudo, embora as empresas declarem aplicar treinamento com duração média de 4,4 semanas, o estudo de Venco (2006) apurou que o treinamento inicial costuma ser de apenas três dias, ainda que as empresas apliquem, com certa freqüência, treinamentos esporádicos para os operadores, visando eliminar falhas no atendimento. Contudo, as entrevistas realizadas pela autora revelam insatisfação por parte dos operadores em relação aos treinamentos oferecidos pelos call centers. Para eles o treinamento apresenta importantes lacunas de formação e informação que dificultam o trabalho. Os operadores apontam uma inadequação dos treinamentos frente às exigências diárias de produtividade, sendo que o conjunto de informações dadas está muito aquém das necessárias para o pleno desenvolvimento do trabalho de operador. Eles também entendem que as empresas deveriam dar apoio prévio no que se refere às técnicas para contornar os maus tratos recebidos dos clientes. Se atentarmos para discrição da função de operadores de call center, especialmente de telemarketing entenderemos que realmente há uma necessidade de treinamentos mais complexos frente às exigências da função. Conforme a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) atualizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego:

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a função dos operadores de telemarketing é estabelecer contatos, exclusivamente via telefone, com usuários e clientes, visando a concretização de vendas, a solução de problemas, a prestação de apoio técnico, a realização de pesquisas em tempo real ou seu cadastramento. Na consecução dessas atividades, devem sempre seguir ‘roteiros e scripts planejados e controlados para captar, reter ou recuperar clientes’ (CBO, 2000). Venco (2006: 63)

Para exercer essa função as empresas fazem uma série de exigências em relação às qualificações dos operadores. Essas exigências foram pesquisadas e registradas por Venco (2006:63): Para o desempenho dessas funções, determinou-se que os operadores devem ter nível de escolaridade equivalente a, no mínimo, Ensino Médio completo até o ensino superior incompleto, além de freqüentar cursos básicos de qualificação profissional de até 200 horas-aula, não se explicitando se esses cursos são oferecidos pela empresa. Como requisitos básicos para o desempenho da função, apontam-se ainda boas dicção e audição e aptidão para trabalhar sob pressão. Neste sentido, enfatizam-se como competências as derivadas da educação formal _ expressar-se bem e ter boa compreensão das mensagens dos clientes _ e também características pessoais como ser paciente, saber administrar conflitos entre o cliente e a empresa e ser capaz de trabalhar em equipe.

Frente às várias exigências que a função de operador de call center exige, a dificuldade de ascensão e a baixa remuneração em más condições de trabalho, os trabalhadores ocupados na função não se vêem estimulados, o que certamente influi para a elevada rotatividade que se observa nessas ocupações. Venco (2006) registra que a rotatividade é normalmente associada à repetitividade e à monotonia do trabalho, mas destaca que se deve considerar também a pirâmide ocupacional, limitadora das possibilidades de ascensão. Segundo a autora, em 2005, enquanto 13,4% dos trabalhadores pediram demissão, 15,7% foram demitidos e pouco menos de 5% foram promovidos. Segundo as entrevistas de Venco (2006) para os operadores essa ocupação é temporária, pois consideram que o fato de ficarem muito tempo “em linha”os torna depressivos, e emocionalmente, instáveis. Partindo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), o estudo de Venco (2006) faz alguns registros importantes sobre as características pessoais dos operadores de telemarketing, tomando os anos de 2002 e 2004 como base. Ao menos alguns de seus registros valem ser reproduzidos aqui: Segundo a PNAD, em 2002 havia 132.286 operadores de telemarketing no Brasil, passando para 215.232, em 2004. A despeito do crescimento na ordem de 38%, os números ainda são distantes dos apresentados pelo setor patronal. Podem-se tecer algumas hipóteses para explicar essa discrepância. A primeira é que essas informações podem ser indícios de desvio de função, ou diferença entre a forma da contratação e a função efetivamente exercida. Por exemplo, os trabalhadores podem estar registrados como “auxiliares administrativos” ou “escriturários”, mas de fato serem operadores de telemarketing, informação que esta pesquisa não alcançaria. Isso pode ser atribuído ao fato de o setor estar ainda em fase de regulamentação, por sua criação relativamente crescente. Há iniciativas das esferas patronal e sindical para se estabelecer parâmetros mais homogêneos para o segmento.

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Quanto ao sexo, todas as pesquisas coincidem. Tanto a PNAD, quanto a ABT80 e também a pesquisa The Global Call Center Industry Project, Relatório Brasil, indicam que 7 em cada 10 operadores são mulheres, tanto em 2002 quanto em 2004. A faixa etária predominante no Brasil é de até 25 anos, constituindo praticamente 60% da categoria. Os homens são mais jovens que as mulheres, representando 63%, enquanto as mulheres, 54%. Apesar de as empresas declararem que a contratação no setor ocorre a partir dos 18 anos completos, a Tabela 6 mostra um mesmo percentual para homens e mulheres (5%) com 16 ou 17 anos em 2002, tendo se reduzido para 3% em 2004. A pirâmide etária é, portanto, significativamente afunilada, com uma base extensa de jovens até 25 anos e poucas pessoas acima de 41 anos. Em 2004, metade da categoria tinha até 24 anos. Há jovens que ainda freqüentam o Ensino Médio, 20% do sexo masculino e praticamente um terço do público feminino. Por outro lado, 65% do total de operadores de telemarketing declararam freqüentar um curso universitário e, dentre estes, os percentuais de homens e mulheres são, respectivamente, 70% e 64%. Em 2004, praticamente 13% dos operadores declararam ter grau de escolaridade inferior ao Ensino Médio. Outros 59% atendem às exigências do setor, no que se refere à escolaridade. Em suma, o operador de call center se caracteriza, segundo os dados da PNAD, por elevada escolaridade, predominância do sexo feminino e idade reduzida, reforçando os dados de outras fontes, como a RAIS. As outras fontes de dados nos mostram também que ele é mal remunerado e permanece pouco tempo no emprego. Segundo essa autora, as empresas brasileiras vêm disputando o mercado estrangeiro, constituindo a demanda por profissionais poliglotas. Em 2004, estimou a existência de 5 mil operadores atendendo no Brasil em outro idioma.Venco (2006) cita que a revista Call to Call elaborou um guia apontando a consolidação deste nicho de mercado no Brasil. Segundo essa revista, a Atento, empresa da Telefônica, em 2005, já operava em várias línguas, mantendo 150 posições de atendimento. Contudo, não dispomos de dados sobre estes profissionais. Mas podemos afirmar que a função de operador de call center é exercida por um profissional qualificado/escolarizado, que trabalha intensamente, mas é mal remunerado e que atua em más condições de trabalho. Reflexo dessa situação é a altíssima rotatividade da mão-de-obra no segmento.

As experiências de qualificação profissional O sistema Telebrás tinha uma escola de qualificação de seus profissionais muito desenvolvida. As empresas privadas desativaram os programas continuados de qualificação profissional, privilegiando a estratégia de recrutar profissionais mais jovens e com maior escolaridade no mercado e de estabelecer convênios pontuais com escolas, sindicatos e outras entidades que realizavam cursos específicos. 80

Associação Brasileira de Telecomunicações.

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Diante do quadro de menor investimento das empresas na qualificação profissional, especialmente as terceirizadas, e a crescente exigência de elevação da escolaridade como condição para contratação ou manutenção do emprego, alguns sindicatos começaram a desenvolver programas de elevação de escolaridade, de formação de técnicos para atuação na rede externa e de operadores para o tele-atendimento. Essa experiência estava localizada em algumas entidades e não na realidade de todo o país. Para ilustrar, podemos citar três exemplos distintos. O primeiro exemplo é a experiência de elevação de escolaridade, que está sendo desenvolvida em Pernambuco, compreendendo turmas de ensinos fundamental e médio 81. O programa tem a finalidade de oferecer elevação de escolaridade para os empregados de empresas terceirizadas, como contribuição para a manutenção no emprego, pois estas estão adotando a escolaridade como critério de seleção de pessoal. O programa, que está se expandindo para outras capitais do Nordeste, começou em Recife e foi viabilizado por meio de convênios com o governo de Pernambuco e a Prefeitura Municipal de Recife. Ele também está respaldo por negociação coletiva. Em 2007, há mais de 200 alunos matriculados. 82 A segunda experiência está ocorrendo no Rio de Janeiro, que envolve tanto um programa de elevação de escolaridade como de formação profissional. O programa de elevação de escolaridade existe desde 1998 e formou 332 operadores de serviço nos ensinos fundamental e médio até 2006. Estes dois programas também fizeram parte do Projeto Integração da CUT Nacional e foram financiados, em boa parte, por recursos do FAT/MTE. Ainda no Rio, desenvolveu-se a experiência de um Programa de Qualificação Profissional Gratuito em convênio com as secretarias municipal e estadual de Trabalho, financiado com recursos do FAT, atingindo, segundo o sítio do sindicato83 , cerca de 4.000 alunos nos mais variados cursos na área de telecomunicações: de instalador e reparador de linha de acesso, cabista, ligador de DG, operador de Telemarketing, Básico de fibra óptica, Sistema Móvel Celular, Projeto de Rede Telefônica, Montagem e Manutenção de Micro, dentre outros. Outra experiência foi desenvolvida no Estado de São Paulo pelo Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações em convênio com a empresa de telefonia com a finalidade de, num primeiro momento, formar profissionais, especialmente, para a área técnica da chamada rede externa do sistema telefônico (cabista, instalador e reparador de linha telefônica, ligador de Distribuidor Geral, atendentes, técnico em expedição de dados, etc). O programa funcionou entre 1999 e 2002, formando profissionais para suprir a carência de mãode-obra especializada, devido a grande rotatividade e a necessidade de a empresa cumprir as metas de expansão da rede, incluindo a telefonia social. Depois do cumprimento das metas, a Telefônica não renovou o convênio, pois a demanda por estes profissionais caiu substantivamente, como abordado acima. Atualmente, o sindicato tem um programa de treinamento de operadores em tele-atendimento e telemarketing, com duração de 15 dias, contendo uma jornada de 4 horas diárias. O programa é realizado em convênio com algumas prefeituras. É um curso localizado no segmento que apresenta grande rotatividade e continua apresentando uma expansão no nível de emprego. 84 A experiência está expandindo-se para cinco capitais do Nordeste. Informações repassadas por Cristina Campelo, dirigente sindical da FITTEL e do Sindicato de Pernambuco. 83 http://www.sinttelrio.org.br/qualific.htm 81

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Em síntese, pode-se verificar a existência de cursos localizados de elevação de escolaridade e formação profissional, mas a estratégia prevalecente das empresas é a contratação de profissionais disponíveis no mercado, dado o elevado desemprego, inclusive com maior escolaridade. Os cursos estão direcionados fundamentalmente para empresas terceirizadas, que prestam serviços para as concessionárias do serviço de telefonia.

Considerações Finais Da mesma forma como ocorreu nos países capitalistas desenvolvidos, o setor de telecomunicações no Brasil passou por expressivas mudanças e ganhou importância estratégica na economia. Nesse processo não se pode negar que houve um forte incremento da oferta dos serviços de telecomunicações no país e a facilitação do acesso pela população a esses serviços. O setor não só se caracteriza pela inovação de produtos, mas também pela constante racionalização de custos e mudanças organizacionais e tecnológicas, que alteraram o segmento onde estão localizados os trabalhadores e o seu perfil. Apesar da expansão dos serviços e do aumento de usuários, houve uma expressiva redução no número de profissionais diretamente contratados pelas empresas de telefonia, como analisado acima. A redução também ocorreu, especialmente após 2002, nas empresas terceirizadas, pois houve um processo de fusão das prestadoras de serviços, que levou a uma racionalização das atividades executadas. A redução tornou-se mais evidente a partir do momento em que as empresas de telefonia atingiram as metas de universalização colocadas nos editais de privatização. Portanto, a redução do emprego ocorreu tanto na planta interna quanto na rede externa (em geral, terceirizada). Mesmo com a fantástica expansão da telefonia celular, não houve ampliação do emprego diretamente vinculado ao sistema telefônico entre 1994 e 2005. O único segmento que está, nos últimos anos, aumentando as contratações de forma significativa é o de call center. É uma atividade nova que está em franca expansão, pois combina um sistema de atendimento a clientes com a promoção de um telemarketing ativo, que vende novos produtos e serviços. É uma atividade facilitada pelas transformações no sistema de comunicação, mas que continua dependendo do trabalho humano para se viabilizar. Além disso, do ponto de vista organizacional, é setor novo e de ponta, em que o trabalho já é absolutamente cronometrado, vigiado e controlado, deixando pouco espaço para eliminação da porosidade. Apesar da forte expansão do emprego no setor de telemarketing, ele, em alguma medida, também, em menor grau, é responsável pela eliminação de postos de trabalho em outros setores, especialmente, os voltados para o atendimento direto do público. As transformações alteraram significativamente o perfil dos trabalhadores que estão no setor de telecomunicação em 2005 em relação a 1994. Os dados mostram que o profissional atual tende a ser mais escolarizado, estar em uma faixa etária mais jovem, permanecer menos tempo no emprego e ter uma condição de remuneração e de benefícios mais baixa. É um quadro que mostra que a perspectiva profissional é mais As informações foram passadas por Welton Araújo (2007).

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curta, insegura e instável, com uma grande rotatividade na maioria das ocupações. Na perspectiva de pensar uma política de qualificação profissional pode-se observar a prevalência de três segmentos muito distintos no setor de telecomunicação. Em primeiro lugar, as empresas de telefonia, tanto fixa quanto móvel, tendem a ter um contingente menor de trabalhadores, com maior qualificação e que estão em postos estratégicos de gestão ou de desenvolvimento de produtos e serviços. Profissionais que são recrutados no mercado, em que a política de qualificação tende a ser individualizada. Em segundo lugar, há a ampla rede externa de prestação de serviços que são executados por empresas terceirizadas. Neste segmento há uma demanda de elevação da escolaridade e também de formação técnica, que comportam programas de qualificação profissional coletivo. Em terceiro lugar, há a expansão do setor de telemarketing, que recruta profissionais com maior escolaridade, por causa da necessidade de expressar-se corretamente. Mas, do ponto de vista técnico, é um trabalho rotineiro, com o script previamente definido. O principal requisito profissional advém da escolarização. Como é um segmento em expansão, há espaço para programas de qualificação profissional. As transformações do segmento, combinadas com o estreitamento do mercado de trabalho vivenciado pelo país após os anos 1990, fizeram com houvesse uma piora no valor da remuneração e das condições de trabalho, com um visível achatamento salarial, elevação da rotatividade e a prevalência de um ambiente de maior insegurança e instabilidade na relação de emprego85. Características intrínsecas aos segmentos que estão ocupando um número maior de trabalhadores no setor das telecomunicações.

Bibliografia ARAUJO, W. J. Privatização da Telecomunicações. Campinas-SP: CESIT/IE/UNICAMP, 2007. (Monografia de Especialização). BIONDI, Aloysio. O Brasil Privatizado: um balanço do desmonte do estado. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 3a reimpressão, jun., 1999. BORGES, M. M. C. Os Impactos da Reestruturação Produtiva sobre o Mercado de Trabalho no Setor de Telecomunicações: o caso da empresas CTBC. Uberlândia-MG: UFU, 2000. (Dissertação de Mestrado). CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo: Editora Paz & Terra, 1999. COSTA FILHO, Samuel & SILVA, R. A. Aspectos da Economia Brasileira nos Anos 90. Informe Econômico. Teresina-PI : UFPI/Dpto. de Economia, n. 11, janeiro, 2001. GADREY, Jean. Emprego, Produtividade e Avaliação do Desempenho dos Serviços. São Paulo: USP/UNICAMP/CEBRAP, Seminário Temático Interdisciplinar: Os Estudos do Trabalho; dez., 1999. KON, Anita. Atividades Terciárias: induzidas ou indutoras do desenvolvimento econômico?

Para ARAUJO (2007:3), “O que se observa é que enquanto as empresas alcançam metas de qualidade, aumentam seu nível de competitividade, ampliam seus investimentos, vêem suas ações se valorizarem, os trabalhadores vêem sua renda em queda livre, seus postos de trabalho destruído, e suas conquistas históricas dissiparem como um véu de fumaça.”

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In: Seminário em Comemoração do Centenário de Nascimento de Raul Prebish. Rio de Janeiro: IE/UFRJ, 2001. (mimeo). DINIZ, Clélio Campolina. Global-Local: Interdependências e Desigualdades ou Notas para uma Política Tecnológica e Industrial Regionalizada no Brasil. Rio de Janeiro: IE/UFRJ, Estudos Temáticos/Nota Técnica 9, julho de 2000. OLIVEIRA, Hipólita S. A Introdução de Inovações Tecnológicas e Organizacionais nas Grandes Redes de Comércio Varejista e Atacadista e nos Serviços de Telecomunicações dos Grandes Aglomerados Urbanos do Brasil. In: Mercado de Trabalho e Modernização no Setor Terciário Brasileiro (Projeto de pesquisa e formação técnica DIEESE/CESIT/CNPq). Campinas: UNICAMP/IE/CESIT, fev., 2004. (versão preliminar). OLIVEIRA, Sirlei M. Reestruturação das Telecomunicações no Brasil: uma (re)visão das estratégias de gestão da produção e das relações de trabalho na cadeia produtiva (estudo de caso da telefonia fixa em São Paulo – 1990-2003). São Paulo: USP, 2004b (Tese de Doutorado). QUEIROZ, E. A. Reestruturação do setor de telecomunicações brasileiro e impactos na atuação sindical: o estudo de caso da empresa Telemar. In: Mercado de Trabalho e Modernização no Setor Terciário Brasileiro (Projeto de pesquisa e formação técnica DIEESE/CESIT/CNPq). Campinas: UNICAMP/IE/CESIT, 2005. (CD-ROM). SILVA, R. A. Reconfiguração das Atividades Produtivas na Década de 1990. In: Emprego e Desenvolvimento Tecnológico: estudos DIEESE/CESIT. São Paulo, DIEESE – Campinas, CESIT, 2002. CD-ROM. SILVA, R. A. Aspectos da Privatização no Brasil. Informe Econômico.Teresina - PI : UFPI/Dpto de Economia, n. 12, abril, 2001. UCHIMA, R. Flexibilização das Relações de Trabalho na Telefonica SP. Relatório de pesquisa Cesist/Dieese/CNPq. Campinas, Instituto de Economia/Unicamp, 2005. VENCO, S. B. Tempos moderníssimos nas engrenagens do telemarketing. Campinas: Unicamp, 2006. (Tese de Doutorado).

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A Educação Profissional no Setor de Telecomunicações • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto

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setor econômico de Telecomunicações tem a característica de estar vinculado às mudanças tecnológicas constantes, bem como ser um setor em intensa atividade e importância num contexto histórico de valorização do processo conhecido atualmente como globalização. As telecomunicações têm avançado grandemente como resultado de uma maior circulação de informações e mercadorias entre os mercados regionais e internacionais. Por outro lado, as transformações na base tecnológica que viabilizaram a Terceira Revolução Industrial estão subordinadas à crescente utilização de equipamentos de comunicação e troca de informações em velocidade sempre crescente, tanto para o processo de produção interno nas unidades produtivas, quanto em relação às diferentes empresas de um mesmo setor produtivo, além daquelas envolvidas no transporte, armazenamento e logística. Em outras palavras, trata-se de um setor que cresce, emprega e é essencial no atual desenvolvimento técnicocientífico da base produtiva capitalista. A carência de força de trabalho qualificada para suprir as necessidades das empresas aparece como a justificativa principal nos planos de cursos. Além disso, percebe-se claramente a sinalização para um processo de transformação que exige “treinamento”e conhecimentos aplicáveis em contínuo processo de renovação, ou seja, um profissional dinâmico “antenado”com as necessidades e conversões no processo produtivo. Selecionamos os planos de cursos das seguintes instituições de ensino: SENAI-DR/AP (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial); Instituto Monte Horebe / DF; Centro Público de Educação Profissional de Jaguariúna / SP; Centro de Educação Profissional Hermann Hering / SC. O SENAI-DR/AP (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) localizado em Macapá ministra a habilitação de Técnico em Telecomunicações, a qualificação de Mantenedor de Sistemas de Comutação, a qualificação de Mantenedor de Sistema de Transmissão e a qualificação Administrador de Redes de Comunicação de Dados. A carga horária dos cursos segue abaixo: HABILITAÇÃO, QUALIFICAÇÕES E ESPECIALIZAÇÕES: 1 Habilitação : Carga Horária: Estágio–Horas 1.1 Qualificação : Carga Horária: Estágio–Horas 1.2 Qualificação : Carga Horária: Estágio–Horas 1.3 Qualificação : Carga Horária: Estágio–Horas

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Técnico em Telecomunicações 1500 horas 320 horas Mantenedor de Sistemas de Comutação 600 horas Mantenedor de Sistema de Transmissão 520 horas Administrador de redes de comunicação de dados 380 horas 320 horas


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O plano de curso registrado junto ao CNCT apresenta em sua justificativa as conclusões de uma pesquisa de mercado junto ao empresariado da região em que se evidencia a necessidade de “técnicos competentes e habilidosos” nas especificidades e precisões demandadas para o setor. O documento apresenta ainda “a emergente necessidade de atender o setor produtivo, o trabalhador nas inovações éticas do trabalho, bem como os anseios profissionais da juventude que ora estão voltados para o contexto tecnológico”. O plano não explicita o que a instituição de ensino compreende por inovações éticas no trabalho e quais seriam as necessidades do trabalhador, nem tampouco desdobra as causas e conseqüências da juventude estar ora voltada para as profissões representadas com maior interface com as inovações da tecnologia, nem mesmo cita os conhecimentos científicos a que os avanços tecnológicos recentes estão subordinados. O curso, conforme podemos depreender de seu plano tem em seus componentes curriculares a preocupação em contemplar: a tecnologia e as competências da área de telecomunicações no fazer e os valores humanos no ser, a fim de implementar educação integral do homem, como estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB 9.394/96.” Segundo o documento, “o curso proposto atenderá a caracterização da área, o setor produtivo, a Legislação de Ensino, a formação do educando e mais precisamente o bem estar da sociedade.

Entre os objetivos, destacamos alguns itens que demonstram como “os valores humanos” são tratados dentro de uma abordagem primordialmente técnica e instrumental, no escopo de operações que visam muito mais formar (dar forma a) um supervisor “competente e habilidoso” tecnicamente para aumentar a produtividade e criar condições para atender a competitividade entre as empresas. Os objetivos selecionados são, por exemplo: (...) competências voltadas para o senso crítico-social, de modo a estar atento e receptivo às inovações sociais e o emergente crescimento das telecomunicações em concomitância com outras áreas de tecnologia, visando a melhoria da qualidade de vida da sociedade”; “adquirir competências e habilidades gerais e específicas para exercer com eficiência e eficácia os serviços concernentes a telecomunicações”;“atender as solicitações do setor produtivo em conjunto aos anseios profissionais dos educandos com tendências à área de Telecomunicações, e proporcionar maior desenvolvimento no campo da produção do meio da competitividade e da realização profissional.

O público alvo do curso são estudantes com mais de 17 anos e egressos concluintes do Ensino Médio, condições básicas requeridas no processo de seleção para os cursos da entidade. As competências e habilidades esperadas para os educandos concluintes da habilitação ou qualificações são, entre outras: desenvolver projetos de pesquisa e aplicação de sistemas (...) subordinado à ... orientação de engenheiros e outros profissionais de nível hierarquicamente superior (...)”; “coordenar e assistir tecnicamente profissionais que atuam na fabricação de componentes e equipamentos eletrônicos, antenas, bem como na instalação ou manutenção, zelando e responsabilizando-se pela higiene e segurança do trabalho”; “realizar estudos sobre organização e simplificação do trabalho, arranjo físico de oficinas laboratórios ou postos de trabalho, normas e procedimentos de produção, testes e inspeção, propondo as medidas necessárias ao aperfeiçoamento das atividades de produção, controle de qualidade e melhoria das condições de trabalho”; “identificar as necessidades do mercado e classificar serviços para os sistemas de comutação fixa e móvel”; “identificar a demanda de serviços dos sistemas de comutação.

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Todos os outros requisitos para conclusão consideram apenas as características essencialmente voltadas à tecnicidade de telecomunicações. Não há citação sobre um treinamento para a CIPA – Comissão Interna para Prevenção de Acidentes – que consta das normas legais para a segurança do trabalho. O curso prioriza em demasia o ensino-aprendizagem da tecnicidade operacional da indústria, treinando o estudante para o empresariado, sem mostrar que caberia ao concluinte saber, por exemplo, os direitos trabalhistas previstos na CLT, as normas de segurança e os órgãos de classe e instituições responsáveis pela vigilância, zelo e sua cobrança frente às instituições privadas de produção. Embora o custo e gerenciamento do sistema de ensino seja social e público, seu objetivo é o aumento e melhora da produtividade de forma que garanta a competitividade e a expansão da extração de mais trabalho da classe que vive do trabalho86. Isto posto, como justificativa norteadora do curso assumido pela entidade, os objetivos perseguidos e o público alvo, é necessário observar como é a divisão curricular e a distribuição de carga horária por componente curricular que estão fora de um enquadramento puramente técnico, no intuito de se verificar os entraves e soluções para que se torne exeqüível o que se mira como ensino-aprendizagem por essa instituição. Observemos que o curso não busca formar apenas empregado para as empresas, mas também empregador do ramo. Sabendo da ampliação da terceirização e transferência de emprego formal para uma contratação entre instituições jurídicas, cabe perguntar como seria possível a um jovem recém egresso do Ensino Médio e formação técnica tornar-se um empreendedor com autonomia de atuação? O componente curricular Empreendedorismo ministrado por bacharéis em Ciências Econômicas (sendo que um dos docentes tem especialização em MBA Gestão Empresarial), tem carga horária de 20 horas; o componente Higiene e Segurança do Trabalho tem carga horária de 20 horas; o componente Inglês técnico tem carga horária de 40 horas; o componente Educação ambiental tem carga horária de 40 horas; e o componente Psicologia e Cidadania em Telecomunicações tem carga horária de 60 horas. Considerando as competências, habilidades e bases tecnológicas em que estão divididos os conteúdos dos componentes curriculares acima, bem como as cargas horárias estabelecidas, e a bibliografia utilizada em cada um deles, não é difícil se perceber que a proposta tende a se limitar ao operacional de uma empresa, mantendo-se um ensino dentro dos limites mínimos de um esclarecimento dos temas, não se tratando de componentes curriculares, em flagrante contraste com a carga horária e atenção dada aos temas técnicos, produtivos e operacionais de acordo com um tratamento pedagógico direcionado à produção. O Instituto Monte Horebe, registrado no CNCT como instituição privada particular, é mantido por Master Cursos Técnicos e Preparatórios Ltda, está localizado em Brasília, na Asa Sul, e ministra a habilitação de Técnico em Telecomunicação com carga horária de 1.350 horas, sendo que destas 150 horas são destinadas a estágio; ministra também a qualificação de Auxiliar de Telecomunicações com carga horária de 560 86

ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2001, p.101-115.

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horas. Os cursos são oferecidos à distância e seguem as novas demandas de mercado. O instituto traz em seu plano de curso registrado no CNCT trechos de difícil compreensão. Transcrevemos abaixo algumas epígrafes que iniciam o documento por seu teor esclarecedor quanto à visão de ensino e educação que a instituição almeja. “Construir um projeto pedagógico que assuma um currículo por competências pressupõe a centralidade do aluno, portanto, da aprendizagem, um foco na qualidade e na autonomia, uma prática pedagógica diversificada, uma escola diferenciada, uma pedagogia ativa. Isto implica uma mudança do papel da escola e, conseqüentemente, de um novo ofício de professor, cujo objetivo é fazer aprender.” Ruy Berger “É competente aquele que é capaz de articular conhecimentos, habilidades e atitudes para solucionar problemas profissionais.” Educação Profissional na nova LDB “A Educação Profissional está concebida sob um paradigma pedagógico que, embora novo do ponto de vista da sua incorporação oficial, já há algum tempo freqüenta e inspira discursos e estudos, sem estar, ainda, presente de forma significativa na real prática educacional. De acordo com esse paradigma e como resposta ao novo perfil que a laboralidade ou a trabalhabilidade vem assumindo, o foco central da educação profissional transfere-se dos conteúdos para as competências.” Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível Técnico Nesse caminho de fazer aprender a articular conhecimentos, habilidades e atitudes para solucionar problemas profissionais, para que o estudante alcance o grau de um profissional competente, ministrar-se-á um ensino-aprendizagem voltado às competências em detrimento de conteúdos, posto que a instituição segue as determinações da Lei, considerada como inovadora pela instituição, que assim estabelece e propõe a Educação Profissional Técnica de Nível Médio no país. O objetivo geral do curso apresentado no plano de curso é: ... habilitar e qualificar profissionais para as atividades referentes a projetos, produção, comercialização, implantação, operação e manutenção de sistemas de telecomunicações tendo em vista a comunicação de dados digitais e analógicos, comunicação, transmissão, recepção, redes e protocolos, telefonia.

O curso se justificaria tanto pela ampliação de ganhos e empresas do ramo de Telecomunicações como pela ausência de profissionais qualificados para as novas formas de produzir do ramo, com base em posicionamento do empresariado que considera superado o conhecimento técnico dos profissionais em atuação. O plano ainda salienta que os docentes, devido a dedicação exclusiva ao ensino, estão fora da atuação no mercado de trabalho de telecomunicações e, portanto, estariam desatualizados frente à crescente inovação e tecnológica introduzida na área. Por último, mas não

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menos importante, o plano de curso para a instituição será “um instrumento, o qual que contém meios que permitirão toda equipe técnica e administrativa do Instituto Monte Horebe e ao grupo de Docentes, maior segurança no desenvolvimento de suas funções e ações pedagógicas”. Os objetivos giram em torno das necessidades e demandas de recursos humanos dos empresários do setor na região Centro-Oeste, principalmente em Brasília. O profissional deve estar “afinado com as demandas do mercado de trabalho”, preparado para a globalização. Contudo, o documento, a partir de sua proposta pedagógica, salienta que o objetivo do instituto é a Educação Profissional Técnica de Nível Médio ao educando em várias dimensões, desde a emocional até a crítica e intelectual, para que o educando possa construir sua própria visão de mundo e ser capaz de transformar a realidade em que atua. Ora, é imprescindível analisar como um curso à distância é estruturado para que se almeje a potencialidade de formar técnicos competentes para o trabalho em um setor econômico em intensa transformação tecnológica, direcionado justamente a atender às demandas de inovações frente a profissionais que estariam defasados, e ao mesmo tempo ter uma formação cidadã e crítica. Nesta direção, destacamos que os objetivos educacionais do documento versam somente sobre o aprendizado técnico e o tratamento empresarial da formação de recursos humanos. O item Organização Curricular apresenta repetições quanto às necessidades de aprimoramento técnico-prático constante em concordância com a perspectiva do capital, fazendo apologias da capacidade de um saber que deveria ser novo, considerando-se que aquilo que cada trabalhador conhece a partir de sua experiência de vida profissional não “serve para mais nada”, em clara depreciação aos conhecimentos do saber fazer operário, característica própria de uma realidade brasileira em que os trabalhadores travam conhecimento diretamente no local de trabalho. O curso está dividido em módulos. As cargas horárias referentes aos módulos são as seguintes: Ordem 1.º 2.º 3.º 4.º 5.º 6.º 7.º Subtotal Parte Prática TOTAL

Módulos Métodos Quantitativos Gestão Eletricidade Telecomunicações I Telecomunicações II Eletrônica Desenho Técnico Estágio Supervisionado

Carga Horária Total 80 80 200 200 240 200 200 1200 150

TOTAL

1.350

Por se tratar de curso à distância, o “atendimento da tutoria é realizado de forma presencial – agendamento ou pelos meios de comunicação: FAX, Internet”; os horários, duração e local de estudo possuem“flexibilidade”. As avaliações para conclusão, certificação ou diplomação são feitas de modo individual, presencial e sem consulta conforme cronograma divulgado pelo instituto.

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O documento traz uma lista do corpo docente com formação técnica e acadêmica compatível, assim como um plano para o estágio supervisionado e a documentação e formulários pertinentes. Não há qualquer bibliografia no plano de curso, nem tampouco uma descrição dos conteúdos e temática de cada módulo, bem como não se esclarece qual é a bibliografia sugerida para o educando estudar à distância, também não há descrição dos procedimentos didáticos, limitando-se a apresentar a operacionalidade para o trabalho técnico e específico exigido do concluinte. O Centro Público de Educação Profissional de Jaguariúna está localizado na região metropolitana de Campinas, no centro de Jaguariúna. Ministra curso de Habilitação Profissional de Técnico em Telecomunicações, qualificação de Assistente de Telecomunicações e qualificação de Reparador de Sistemas de Telecomunicações. As cargas horárias das habilitações e qualificações são: HABILITAÇÃO, QUALIFICAÇÕES E ESPECIALIZAÇÕES: 1 Habilitação : Carga Horária: Estágio–Horas 2. Qualificação : Carga Horária: Estágio–Horas 3. Qualificação : Carga Horária: Estágio–Horas

Habilitação Profissional de Técnico em Telecomunicações 1200 horas 120 horas Assistente de Telecomunicações 400 horas 40 horas Reparador de Sistemas de Telecomunicações 400 horas 40 horas

Está registrada no CNCT como uma instituição de ensino de administração privada comunitária. Com o objetivo de facilitar ao egresso do curso sua absorção no mercado de trabalho, o plano de curso da instituição argumenta ser “de fundamental importância a elaboração de uma matriz curricular que esteja voltada para a construção das competências realmente necessárias para atuação deste profissional no mercado de trabalho”. Os módulos em que o curso está dividido correspondem às habilitações e competências específicas que se espera do egresso. Entre os objetivos listados no documento, predominam como nos demais planos analisados, um tratamento técnico voltado às competências conforme legislação; apenas os itens finais da lista escapam desse enquadramento estrito, a saber: ... compreender a importância e a necessidade da aplicação de princípios e valores éticos e morais, perante as diversas situações da vida do cidadão (...); “entender e valorizar o hábito da leitura como um dos meios de comunicação que conduzem à informação e à atualização do profissional”; “desenvolver uma postura crítica, investigativa e prepositiva da atual crise ambiental, na perspectiva da construção de uma cidadania participativa e ativa”; “atuar com responsabilidade e iniciativa.

As competências são as norteadoras do tratamento didático-pedagógico. Em sua estrutura curricular, seja em habilitação ou qualificação, não há um único módulo que trate de assunto diferente do especificamente técnico, cujo tratamento é de modo operacional e em competências exigidas do profissional. O documento apresenta um plano sobre o estágio supervisionado, os equipamentos

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e instalações disponíveis. O acervo bibliográfico descrito é pequeno e delimitado aos módulos e competências laborais. O critério de seleção dos docentes é apresentado sem que os docentes contratados sejam descritos conforme o módulo lecionado e formação técnico-acadêmica condizente. O Centro de Educação Profissional Hermann Hering está localizado em Blumenau – SC e ministra a Habilitação de Técnico em Telecomunicações e a qualificação de Eletrônica Básica. A instituição é de administração privada particular, conforme cadastro no CNCT. CARGA HORÁRIA 1. Habilitação: Carga Horária Estágio Supervisionado 2. Qualificação Carga Horária

Técnico em Telecomunicações 1680 horas 280 horas Eletrônica Básica 700 horas

Entre os objetivos propostos, destaca-se uma preocupação formativa que não seja apenas técnica, mas também humanística, em cujo desenvolvimento o educando possa aplicar conhecimentos científicos e tecnológicos. Além das habilidades ligadas aos procedimentos para a produção, o plano apresenta em seus objetivos específicos a intencionalidade de capacitar o educando para a vida na condição de cidadão, onde os conhecimentos científicos seriam priorizados para desencadear um tratamento das habilidades técnicas. Entre as competências exigidas e desenvolvidas, poucas demonstram um distanciamento quanto às atividades e operações direcionadas ao trabalho propriamente dito. Destacamos apenas duas, que embora estejam limitadas ao tratamento para o processo de produção, podem trazer uma abordagem diferenciada e mais humanística a partir de uma interpretação e atividades que dependeriam sobremaneira do docente. Por exemplo, esperase que o técnico tenha a competência de “interpretar legislação, normas de saúde e segurança de trabalho, de qualidade e ambientai.”. Se o docente tiver uma postura e bibliografia mais “progressista”, esta seria uma competência que poderia ser desdobrada em ensino-aprendizado crítico, voltado à uma cidadania ativa. Entretanto, predomina a abordagem técnica onde o educando é ensinado a supervisionar o trabalho, analisar os processos e interferir para aumentar e melhorar a produtividade. Haja visto que está entre as competências exigidas a capacidade de avaliar os “processos de execução; atuar na concepção de projetos; conhecer e correlacionar as formas de gestão administrativa; definir métodos de execução”. Entre os componentes curriculares, destacamos os itens Gestão Ambiental (42 horas), Inglês Instrumental (84 horas), Relacionamento Interpessoal e Segurança do Trabalho (28 horas cada). Os conteúdos a serem desenvolvidos nestes módulos são abrangentes e pertinentes, embora, à primeira vista, pareça demasiado longo quando se considera a carga horária a eles destinada. O acervo bibliográfico descrito é composto somente por livros técnicos da área de telecomunicações. Porém, o corpo docente tem formação diferenciada e diversificada, condizente com a divisão em módulos e o tratamento proposto, ou seja, são profissionais com formação técnica e também humanística em conformidade com o objetivo geral proposto no plano.

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• Vinicius Gaspar Garcia•Anselmo Luís dos Santos • Marcelo Weishaupt Proni •José Dari Krein Introdução Historicamente, o setor da Construção sempre foi considerado grande absorvedor de força de trabalho, tanto por apresentar uma elevada relação emprego/produto quanto por gerar muitas ocupações associadas a menores exigências de qualificação profissional. Após enfrentar uma forte crise nos anos 1980 e 1990, em função das reduzidas taxas de crescimento econômico, da crise no setor de construção residencial e dos baixos volumes de investimento produtivo e infra-estrutura, o setor vem, desde 2004, apresentando sinais de recuperação. Mas, permanecem muitas dúvidas a respeito dos impactos da introdução de inovações tecnológicas e organizacionais sobre o emprego neste setor de atividade econômica. Este artigo tem como objetivo identificar as novas demandas por formação e qualificação profissional no segmento da construção pesada brasileira, especialmente nas atividades associadas às grandes obras de engenharia civil e infra-estrutura e às áreas de transporte e energia87. Para tal, será realizada, na próxima seção, uma caracterização geral do setor da Construção e do segmento da construção pesada, que busca mostrar sua importância em termos de produção e emprego no conjunto do País e sua evolução recente. Considerando a importância das transformações produtivas, tecnológicas e organizacionais na determinação do padrão de demanda por força de trabalho no segmento, a seção 3 é dedicada à análise das características do processo produtivo da construção pesada e suas transformações recentes. Neste sentido, serão analisadas as mudanças no padrão tecnológico (máquinas e inovações), mudanças organizacionais nas relações de trabalho, o perfil do trabalhador na Construção e a evolução das principais ocupações nos últimos anos. A seção 4 é dedicada à análise das novas demandas por formação e qualificação profissional no segmento e a seção 5 às considerações finais88.

Caracterização geral do setor da construção no Brasil Dada a inter-relação do setor de Construção com os demais, há uma forte relação entre o seu desempenho e o nível de atividade mais geral do país. Esta relação, entretanto, está também muito associada ao volume de investimento realizado e aos gastos públicos em O macro-setor da construção inclui ainda obras residenciais e serviços que não são objetos de análise deste estudo. Os dados sobre o setor, de maneira geral, estão agregados (com ênfase para a construção civil), dificultando a análise isolada dos ramos da construção pesada. Essa separação será feita sempre que possível, embora diversas ocupações “básicas” sejam comuns tanto para as obras civis quanto para a construção pesada. 88 Além da análise de informações secundárias (PNAD/IBGE, CBIC, PAIC, CAGED e outras), este estudo foi complementado por entrevistas com pessoas que atuam no setor de construção, tanto na esfera sindical quanto na patronal. 87

Capítulo 5

Setor Econômico de Construção Civil Mudanças Recentes no Processo Produtivo e Demandas por Qualificação Profissional na Construção Pesada


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infra-estrutura, pois a construção civil e as obras em infra-estrutura (transporte, energia, telecomunicações etc.) são essenciais para o desenvolvimento de outros setores de atividade. Nos últimos 15 anos, a contribuição do setor de Construção para o PIB nacional variou entre 7% e 10%, evidenciando o peso desta atividade para o crescimento econômico do país. Além disso, pode-se observar que existe uma clara correlação entre o PIB do Brasil e a taxa de crescimento do setor de Construção89. Nos últimos cinco anos, o Brasil só conseguiu uma taxa significativa de expansão em 2004, quando o PIB cresceu 4,9% e o setor de Construção 5,7%. A participação relativamente menor na formação do PIB (7,2%) não expressa uma série de efeitos indiretos que a Construção proporciona em termos de possibilidades de crescimento em outras áreas. Considerando a relevância de investimentos no setor da Construção, dado o seu caráter estratégico para o desenvolvimento nacional, e a existência de uma série de carências em infra-estrutura econômica e social (energia, rodovias, ferrovias, portos, saneamento, habitação etc), deve-se ressaltar que o desenvolvimento do País requer a criação de condições para um maior ritmo de expansão do setor, o que teria fortes impactos positivos em termos de geração de postos de trabalho, pois além de expressiva participação no PIB, o setor de Construção tem um peso importante no que se refere à geração de empregos no País. Em 2005, o setor como um todo respondia por 6,5% do total de pessoas ocupadas no Brasil, cerca de 5,6 milhões de pessoas90, conforme a Tabela 1. TABELA 1 - TAXA DE CRESCIMENTO DO PIB E DO SETOR DE CONSTRUÇÃO PARTICIPAÇÃO NO PIB - BRASIL - 1991 A 2005 Taxa de crescimento real do PIB (em %)

1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Brasil

Construção

1,03 (0,54) 4,92 5,85 4,22 2,66 3,27 0,13 0,79 4,36 1,31 1,93 0,54 4,90 2,30

(1,19) (6,29) 4,46 6,99 (0,43) 5,21 7,62 1,54 (3,67) 2,62 (2,66) (1,85) (5,20) 5,70 1,30

Participação setor construção no PIB Brasil 7,12 7,63 8,26 9,15 9,22 9,52 9,91 10,13 9,36 9,06 8,56 7,96 7,23 7,28 7,32

Fonte: Sistema de Contas Nacionais, IBGE - Extraído do site da Câmara Brasileira da Indústria da Cosntrução

Em função do comportamento da construção residencial e dos investimentos, em especial daqueles associados ao setor público, em alguns momentos, o crescimento do PIB pode não resultar em crescimento da construção, como foi o caso do ano de 1995, quando o país cresceu 4,2% e o setor de construção ficou estagnado. Mesmo assim, o setor representou cerca de 9% do PIB. 90 Dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio (PNAD), realizada anualmente pelo IBGE, nos anos em que não é feito o Censo. 89

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Além de não apresentar forte concentração regional do emprego, alguns estudos têm mostrado que o emprego no grande setor da Construção apresenta uma tendência de desconcentração regional, ou seja, um movimento de deslocamento das atividades, em particular da construção civil, do Sudeste para o restante do País. Entre 1985 e 2003, a participação relativa do pessoal ocupado no setor da Construção no Sudeste caiu de 63,7% para 50% do total do País, tendência que se manteve pelo menos até 2005. Neste ano, os 5,6 milhões de trabalhadores ocupados na Construção, no conjunto do país, estavam distribuídos da seguinte forma: 2,6 milhões (45,4%) no Sudeste; 1,2 milhões (21,4%) no Nordeste; 850 mil (15,1%) no Sul; 610 mil (10,8%) no Centro-Oeste e 442 mil (7,8%) no Norte. Ao mesmo tempo, a participação de todas as outras regiões tem aumentado, particularmente no Norte e CentroOeste91. Nos últimos três anos, apesar das taxas relativamente reduzidas de crescimento do PIB, observa-se certa recuperação do setor da Construção, principalmente em termos de expansão do emprego. De acordo com pesquisa recente da Fundação Getúlio Vargas (FGVSP), depois de cair 3,1% em 2003, o nível de emprego na construção cresceu 5,3% em 2004, 8,3% em 2005 e 7,0% em 2006, no conjunto do País92. Quando comparamos o setor de Construção com as demais atividades econômicas, em 2005, observa-se que ele era o sexto que mais absorvia trabalhadores no País (veja Tabela 2). TABELA 2 - PESSOAS OCUPADAS - BRASIL 2005 Setores de Atividades Agricultura Comércio Indústria Educação, saúde e serviços Serviços Construção Administração Transporte, armazenagem Outros serviços coletivos, sociais Alojamento Outras atividades ou mal definidas

% 20,5 17,8 14,9 8,8 7,6 6,5 4,9 4,5 3,8 3,7 7,0

Fonte: PNDA, 2005

A característica de grande gerador de oportunidades de trabalho sempre esteve associada a este setor, assim como a informalidade, caracterizada pela forte presença de trabalhadores sem carteira assinada e ocupados por conta própria, reduzida participação de empregados com carteira assinada – cerca de 20% - e elevada informalidade das empresas93 . De acordo com os dados da Pesquisa Anual da Indústria da Construção (PAIC), em 2004 apenas 1,5 milhão de trabalhadores eram empregados das 109 mil empresas formais e com situação regular junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, o que representava apenas 28% do total de mais de 5 milhões de ocupados no setor, segundo a PNAD/IBGE94. Apesar de representar Boletim Ocupacional Senai (2005). Projeções para o Setor de Construção Civil. “Construcarta – Nível de Atividade”. FGV-SP, Ano 8, n. 294, Fevereiro de 2007. 93 “Os trabalhadores e a reestruturação produtiva na construção civil brasileira”. Resenha DIEESE – Estudos Setoriais n. 12 (2002). 94 Mesmo no contingente de 1,5 milhões, existem trabalhadores sem vínculo empregatício, pois no conjunto dos ocupados nas empresas o IBGE considerou familiares que trabalhavam sem remuneração. A PAIC/IBGE (2004) restringiu sua amostra às empresas formais do setor de construção. Foram consideradas todas as empresas com 30 ou mais empregados, além de uma amostra das empresas menores. 91

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apenas 2,2% do total de empresas da “construção formal” do País, as médias (100 a 499 empregados) e grandes empresas (500 ou mais empregados) concentravam 52,5% do total de empregados, em 2004. Refletindo o maior grau de organização, os salários médios geralmente eram maiores nas grandes (3,9 salários mínimos) e médias empresas (3,2 salários mínimos); acima da média do segmento (3,0 salários mínimos) e das empresas de pequeno porte (2,3 salários mínimos). Na construção pesada, a estrutura de mercado era bastante concentrada. Este setor é caracterizado principalmente pelas obras de infra-estrutura, com destaque para os seguintes grupamentos: construção de rodovias; usinas e estações hidroelétricas; obras de distribuição de energia; oleodutos e gasodutos; ruas, praças e estacionamentos; pontes, viadutos, elevados, túneis, contenção de encostas; e redes de instalações de torres de telecomunicações; captação, tratamento e distribuição de água; redes coletoras de esgoto; fundações e perfurações de poços de petróleo e gás. Segundo a PAIC (2004), pouco mais de um terço dos valores de obras e serviços da “construção formal”do País concentravam-se no sub-setor de obras em infra-estrutura. Neste sub-setor era muito elevada a participação das grandes e médias empresas, responsáveis por mais de 80% das obras, serviços e produtos realizados em 2004 (PAIC). Assim, as grandes e médias empresas concentram-se mais nas obras de infra-estrutura, sendo que as pequenas tinham participação expressiva (50%) nas edificações residenciais (veja Tabela 3)95 . Os dados do PAIC, de 2003 e 2004, mostram uma tendência de maior concentração no setor da “construção formal”. A participação das pequenas empresas no valor das construções executadas reduziu-se de 50% para 41,7% do total, com crescimento tanto das médias quanto das grandes empresas.

TABELA 3 - BRASIL - 2004 - PRODUTOS E SERVIÇOS - VALOR POR PORTE DAS EMPRESAS - R$ MILHÕES Produtos e Serviços Obras residenciais Edificações industriais Edificações comerciais Outras edificações não-resid. Obras de infra-estrutura Outras obras Trabalhos prévios da construção Obras de acabamento Aluguel de equip. de constr. Total do setor de construção

Pequeno 9.233 2.266 114 3.151 6.539 3.222 2.427 1.090 218 28.260

Média 6.602 3.247 235 1.492 11.019 2.898 2.081 346 173 28.093

Grande 2.499 4.429 1.812 1.157 12.196 3.302 1.469 422 255 27.541

Total 18.334 9.942 2.161 5.800 29.754 9.422 5.977 1.858 646 83.894

Fonte: PAIC/IBGE - 2004.

Grande parte das atividades de construção, especialmente do sub-setor de infraestrutura, estava concentrada nas grandes empresas. Sobre esse aspecto, pesquisa da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) apresenta o seguinte ranking das 15 maiores empresas do setor de Construção (Tabela 4): 95

Deve-se ainda levar em conta que os ocupados que não foram contabilizados no PAIC – por não estarem nas empresas da amostra – concentravam-se, provavelmente, no setor informal e na construção de edificações e residências, o que aumentaria significativamente a participação deste sub-setor no agregado da construção.

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TABELA 4 - FATURAMENTO DAS 15 MAIORES EMPRESAS DO SETOR DE CONSTRUÇÃO Ranking 2005 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 Total

Empresa Norberto Odebrecht Camargo Corrêa Queiroz Galvão Andrade Gutierrez OAS Delta Construções Mendes Junior Trading Walter Torre Jr. Serveng Civilsan Construcap CCPS Gafisa Racional Carioca Christiani Nielsen Rossi Residencial Método

Estado RJ SP RJ MG SP RJ MG SP SP SP SP SP RJ SP SP

Faturamento em R$ x 1.000 3.296.098 1.150.906 1.052.220 903.056 780.562 500.630 385.741 358.939 333.823 322.717 320.618 266.700 242.471 220.781 219.377 10.354.639

% 31,8 11,1 10,2 8,7 7,5 4,8 3,7 3,5 3,2 3,1 3,1 2,6 2,3 2,1 2,1 100,0

Fonte: www.cbic.org.br. Revista “O Empreiteiro” - Junho de 2005 - Elaboração

As cinco maiores empresas, conhecidas como as “gigantes” do setor de Construção – Norberto Ordebrecht, Camargo Côrrea, Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez e OAS – respondiam por 69,4% do faturamento global do setor em 2005, cerca de R$ 7,2 bilhões. Em média, para o conjunto das cinco empresas, 60% deste valor era proveniente de contratos com o setor público e 40% do setor privado. Considerando o faturamento de cada uma, com exceção da Andrade Gutierrez, a maior parte dos contratos era com o setor público (93% no caso da OAS; 81% na Queiroz Galvão e 56% na Ordebrecth e Camargo Côrrea). Assim sendo, os dados do PAIC e deste ranking seguem a mesma direção ao apontar uma concentração no setor de construção em termos de faturamento e até geração de empregos. No âmbito da construção pesada, esta concentração era ainda mais forte, pois para as grandes obras de infra-estrutura eram geralmente contratadas as “gigantes” do setor, que individualmente ou em conjunto venciam as licitações, como no caso do Metrô na cidade de São Paulo. A desconcentração regional já apontada, por sua vez, não se aplicava quando se observa a origem das grandes construtoras. Apesar de atuarem, cada vez mais, em todo o País e até mesmo no exterior, as 15 maiores em termos de faturamento são oriundas da Região Sudeste.

Mudanças tecnológicas e organizacionais A partir de meados da década de 1990, com a intensificação do processo de abertura comercial e financeira, privatizações e concessões de serviços públicos, além dos reduzidos ritmos de expansão do PIB e dos investimentos públicos, uma série de transformações ocorreu na estrutura produtiva brasileira. Nesta seção, serão apontadas algumas tendências de mudanças tecnológicas (máquinas e inovações) e organizacionais (nos métodos de organização da produção e do trabalho).

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De maneira geral, o setor de Construção é considerado uma “indústria tradicional”, onde há lenta difusão de inovações, uma vez que os processos estabelecidos ainda atendem às várias necessidades do setor (SENAI, 2005)96. Essa avaliação, porém, é correta naquilo que diz respeito à construção civil (edificações), onde não se espera qualquer tipo de“ruptura tecnológica”. Na construção pesada, especialmente nas obras de infra-estrutura, a utilização de novas máquinas e equipamentos tem ocorrido de maneira mais freqüente. Devem-se destacar, neste aspecto, novos materiais e máquinas que, para serem considerados inovadores devem levar à utilização de novos equipamentos e exigir qualificação profissional distinta daquela habitualmente necessária. De acordo com este critério, a PAEP97, realizada pela Fundação SEADE em 2001, apontou uma taxa de inovação média da ordem de 4% nas empresas indústrias do Estado de São Paulo. A indústria da construção como um todo teve um percentual de inovação abaixo desta média, de apenas 3%. Porém, os sub-setores relativos à construção pesada tiveram um índice de 6%, ou seja, o dobro do total do setor e mais do que a média geral. Para Joaquim Passos Maia, da Associação Brasileira de Engenharia Industrial (ABEMI), as mudanças associadas aos processos de inovação tecnológica no setor da Construção, de fato, representam uma demanda por trabalhadores mais qualificados na construção pesada. Tal situação justifica a implantação de projetos como o Plano Setorial de Qualificação (Planseq)98, concebido também no âmbito do Programa Nacional de Mobilização da Indústria de Petróleo e Gás (PROMINP). Ainda que as mudanças no padrão tecnológico sejam mais lentas na construção civil e mais velozes na construção pesada, deve-se ressaltar que seus impactos não são necessariamente separados entre estes dois segmentos da construção, pois várias ocupações são demandadas tanto nas edificações civis quanto nas obras de infra-estrutura. Assim sendo, o estudo do SENAI citado anteriormente é interessante ao identificar as chamadas “tecnologias emergentes específicas”, que foram avaliadas quanto à sua capacidade de difusão da seguinte forma: rápida: tecnologias que alcançarão dois terços de sua aplicação potencial no mercado até 2009; tradicional: tecnologias que alcançarão um terço de sua aplicação potencial no mercado até 2009 e dois terços até 2015; lenta: tecnologias que alcançarão um terço de sua aplicação potencial no mercado entre 2009 e 2015 e dois terços após 2015; Ao avaliarmos os segmentos tecnológicos presentes principalmente nas grandes construções de infra-estrutura, cinco foram classificados como tendo uma velocidade tradicional de difusão: 1) aditivos super plastificantes para concreto; 2) formas metálicas para as estruturas de concreto; 3) estruturas mistas de concreto e aço; 4) alvenaria estrutural de blocos de concreto; e 5) equipamentos a laser para controle geométrico de obras. “Tendências para o Setor de Construção Civil” – Série Difusão Tecnológica e Organizacional – SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), Brasília, 2005. 97 Fundação SEADE – Pesquisa da Atividade Econômica Paulista – PAEP (2001). 98 O Planseq pode ser entendido como uma ramificação setorial do PNQ – Plano Nacional de Qualificação. 96

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Apenas um segmento, o de sistema de concreto protendido, foi considerado como sendo de rápida difusão, ao menos no ramo estrutural das construções. Nenhum segmento, das tecnologias selecionadas, foi classificado como sendo de lenta difusão tecnológica, evidenciando que as maiores mudanças realmente estão nos ramos da construção pesada. Cabe destacar ainda duas tecnologias que podem interferir no processo produtivo, especialmente nas grandes edificações civis. A primeira é a chamada drywall – sistema de vedação vertical que utiliza chapas de gesso acartonado com estruturas metálicas – que permite a “construção seca”. O sistema Web, via Internet, para o relacionamento entre os agentes da cadeia, que já está em curso, também traz impactos para o ritmo e organização do trabalho na construção. Observando de maneira global as mudanças tecnológicas no setor de construção, parecem permanecer dois desafios básicos para o trabalhador: a) aprimorar-se nas funções tradicionais da construção (mesmo com a relativamente lenta difusão destas práticas) e b) adquirir conhecimentos específicos, principalmente no que se refere ao manejo das novas máquinas e equipamentos da construção pesada. No que se refere às mudanças organizacionais, estudos do SENAI destacam a introdução de normas de desempenho, particularmente nas obras de infra-estrutura, aspecto marcado por maior aproximação entre os agentes envolvidos na construção, ou seja, entre aqueles que concebem o projeto e os executores. Os primeiros tenderiam a ampliar suas atribuições no que tange a correção e prevenção de defeitos nas obras, regularização técnica de edificações e manutenção do ambiente construído. Este maior grau de exigência reflete, naturalmente, nos executores, isto é, nos trabalhadores diretamente envolvidos com a construção, cuja qualificação exigida estaria aumentando. Em termos da organização do trabalho, a utilização de sistemas construtivos baseados na pré-fabricação de elementos tem transformado o processo de construção em sistemas de montagem. Esta é uma tendência tanto das edificações civis quanto dos setores da construção pesada, que trabalham com máquinas novas que permitem uma escala de produção bem mais elevada. É interessante notar, entretanto, que estes processos não excluem as práticas tradicionais de construção, como salientamos anteriormente, que são básicas nas edificações e nas obras de infra-estrutura. Considerando uma base já precária nas relações de trabalho do setor da Construção, com elevada participação de trabalhadores autônomos, empregados sem carteira de trabalho assinada, pequenas empresas subcontratadas e trabalhadores terceirizados, observa-se também um movimento de flexibilização dos contratos e da jornada de trabalho, ao menos até 2003. O crescimento desta atividade a partir de então contribuiu para mitigar a tendência, embora, além dos baixos salários, dos menores benefícios trabalhistas, do elevado número de acidentes de trabalho, permaneça ainda grande informalidade e precariedade nas relações de trabalho no setor da Construção. A terceirização, por sua vez, deixou de ser uma tendência e se tornou realidade predominante no setor de Construção (DIEESE, 2002). De acordo com Aparecido S. Martins, educador em cursos oferecidos por meio do Planseq – Prominp, é importante destacar que, mesmo na qualificação, já existe um conflito capital-trabalho que se expressa, dentre outras dimensões, pela retórica de que o

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trabalhador deve “vestir a camisa”ou “ser um parceiro”da empresa contratante. Assim, na Construção este discurso também parece ser usual, evidenciando uma contradição com os dados elevados de precariedade, informalidade e terceirização no setor.

Estrutura ocupacional e o perfil dos trabalhadores na construção A análise da estrutura ocupacional do setor formal da Construção mostra que cerca de um quarto do total são ajudantes de obra, geralmente chamados de serventes (veja Tabela 5)99. Esta ocupação é uma das que exige menor grau de formação e qualificação profissional no segmento, assim como apresenta o mais reduzido salário médio, 1,5 salário mínimo mensal. O outro grande grupo ocupacional da Construção é constituído pelos trabalhadores da construção civil e obras públicas, onde estão os pedreiros, também representando cerca de um quarto do total de ocupados do setor formal100. Neste caso, tanto o rendimento médio mensal é um pouco mais elevado (2,3 salários mínimos), quanto as ocupações estão associadas a maiores exigências de formação e qualificação profissional. Num conjunto expressivo de seis grupos de ocupações ligadas diretamente à produção no setor da construção e associadas às exigências de significativa qualificação e/ou experiência profissional estão ocupados mais de 15% do total: trabalhadores de montagem de tubulações, estruturas metálicas e de compósitos (4,2% do total), condutores de veículos e operadores de equipamento de elevação (4,1% do total), supervisores da extração mineral e da construção civil (3,2%), trabalhadores de acabamento de obras (1,8%), trabalhadores elementares da manutenção (1,2%), técnicos em construção civil, de edificações e obras de infra-estrutura (1%). Os rendimentos médios mensais da maioria destes grupos ocupacionais são significativamente mais elevados do que os relativos aos ajudantes e trabalhadores da construção e de obras públicas, especialmente no caso dos técnicos e dos supervisores. Isto também sugere que, em geral, a maioria destas atividades está associada a maiores exigências de formação e de qualificação profissional. O grupo ocupacional constituído pelos engenheiros, arquitetos e afins (1,6% do total de ocupados) também é um grupo importante nas atividades específicas da construção civil, cujas atividades requerem elevada formação e qualificação profissional e, como era de se esperar, este grupo composto por cerca de 20 mil pessoas tem o nível mais alto de rendimento: em média, 12 salários mínimos mensais. Alguns grupos de ocupações ligadas diretamente à produção, mas que requerem conhecimentos técnicos específicos de outras áreas, também se destacam na estrutura ocupacional da Construção: instaladores e reparadores de linhas e cabos elétricos e de Deve-se sempre considerar, no entanto, que os empregados no setor formal da construção representam, em geral, cerca de um quinto do total e que, portanto, a estrutura apresentada expressa a situação dos assalariados com carteira e não do conjunto do setor. 100 A Pesquisa Mensal de Emprego (PME/IBGE), realizada pelo IBGE em seis Regiões Metropolitanas, aponta para duas ocupações principais nos canteiros de obras: pedreiros e serventes. Os primeiros representavam 42,6% dos ocupados na construção civil, recebendo, em média, R$ 595 mensais. Os serventes, por sua vez, eram 19,5% do total, com R$ 313 de rendimento médio. Chama atenção uma grande diferenciação regional, pois um indivíduo ocupado na construção em Recife, por exemplo, recebia (R$ 398) 45,1% do valor aferido na Região Metropolitana de São Paulo (R$ 725). 99

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comunicação (2,3%), montadores e instaladores de equipamentos eletroeletrônicos em geral (2,0%), técnicos em eletrônica e fotônica (1,2%), eletricistas eletrônicos de manutenção industrial, comercial e residencial (1,2%), mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos (1,0%). Nestes casos, observam-se rendimentos mais elevados apenas nas ocupações de técnicos em eletrônica e fotônica (4,6 salários mínimos) e de mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos (3,3 salários mínimos). Nos principais grupos ocupacionais cujas atividades são de caráter administrativo, gerencial ou de apoio às atividades da construção encontram-se ocupados mais de 11% do total, com destaque, em termos de participação, para os grupos dos escriturários, agentes, assistentes e auxiliares administrativos (com 4,3% do total), dos trabalhadores nos serviços de administração, conservação e manutenção (2,7%), dos escriturários de controle de materiais e de apoio à produção (1,7% do total), dos trabalhadores nos serviços de proteção e segurança (1,7%), dos supervisores de serviços administrativos (1%). Dentre estas ocupações, rendimentos significativamente mais elevados do que a média do setor da Construção (2,9 salários mínimos) são encontrados apenas para os supervisores; nos demais grupos os rendimentos são geralmente reduzidos. Nestes 20 grupos ocupacionais acima mencionados estavam ocupados 86% do total dos trabalhadores do setor da Construção em 2005 (RAIS/MTE), estando os outros 14,2% distribuídos em 150 grupos ocupacionais distintos. Nota-se, portanto, principalmente a significativa importância quantitativa dos ajudantes de obras e dos pedreiros, assim como dos trabalhadores especializados e técnicos em processos típicos da construção e em outras áreas (elétrica, eletrônica, comunicações, mecânica) e dos trabalhadores das atividades de apoio, administração e gestão. TABELA 5 - OS VINTE GRUPOS MAIS REPRESENTATIVOS DO SETOR DE CONSTRUÇÃO - FREQUÊNCIA E RENDIMENTO Ajudantes de obras Trabalhadores da construção civil e obras públicas Escrituários em geral, agentes, assistentes e auxiliares administrativos Trab. de montagem de tubulações, estruturas metálicas e de compósitos Condutores de veículos e operadores de equipamentos de elevação Supervisores da extração mineral e da construção civil Trab. nos serviços de administração, conservação e manutenção de edificações Instaladores e reparadores de linhas e cabos elétricos e de comunicação Montadores e instaladores de equipamentos eletroeletrônicos em geral Trabalhadores de acabamento de obras Trabalhadores nos serviços de proteção e segurança Escrituários de controle de matérias e de apoio à produção Engenheiros, arquitetos e afins Outros trabalhadores da conservação e manutenção Técnicos em eletroeletrônica e fotônica Eletricistas eletrônicos de manutenção industrial, comercial e residencial Trabalhadores elementares da manutenção Supervisores de serviços administrativos Técnicos em construção civil, de edificações e obras de infraestrutura Mecânicos de manutenção de máquinas e equipamentos industriais Outros grupos ocupacionais Total Construção - Brasil 2005

Frequência 300.093 299.026 53.064 52.136 50.822 40.167 34.029 29.033 24.545 22.887 21.350 21.189 20.310 18.476 14.646 14.533 14.495 12.648 12.609 12.140 177.197 1.245.394

% Freq. 24.1 24.0 4.3 4.2 4.1 3.2 2.7 2.3 2.0 1.8 1.7 1.7 1.6 1.5 1.2 1.2 1.2 1.0 1.0 1.0 14.2 100.0

S.M. 1.5 2.3 3.0 3.4 3.0 4.8 1.5 2.5 2.2 2.1 2.0 2.9 12.0 2.0 4.6 2.9 2.0 5.9 6.0 3.3 * 2.9

Fonte: PAIC/IBGE - 2004.

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A estrutura ocupacional no setor da Construção é também marcada por elevada participação de trabalhadores por conta própria e empregadores, que em conjunto representam aproximadamente 45% do total de ocupados no setor (DIEESE. 2002)101. A elevada rotatividade é outra característica ocupacional marcante do setor da Construção. Segundo dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME/IBGE), na Região Metropolitana de São Paulo 52,8% dos ocupados no setor não chegavam a completar um ano na mesma empresa. Em função dos elevados índices de acidentes de trabalho, a questão da saúde e segurança no trabalho deve ser sempre levada em conta na caracterização deste setor, como demonstram a natureza das atividades acima mencionadas. Neste sentido, Lima Jr. (2000) enfatiza a necessidade de um acompanhamento constante, principalmente no caso dos trabalhos terceirizados, das normas e padrões de segurança a serem respeitados nas obras102. O trabalhador típico da Construção é do sexo masculino, com uma média de idade em geral superior àquela verificada nos demais setores da economia103. A baixa escolarização é também observada neste setor, mais da metade não tinha sequer o Ensino Fundamental completo (DIEESE. 2002), o que trouxe implicações óbvias para a qualificação profissional, embora muitas atividades fossem difundidas pelo learning by doing (“aprendendo fazendo”). Segundo Lima Jr (2000), em pesquisa realizada em 2000, 72% dos trabalhadores da construção nunca havia freqüentado cursos ou treinamentos específicos e cerca de 20% eram analfabetos. Dentre os trabalhadores era muito reduzida a contribuição previdenciária (cerca de 30%) e grande parte deles tinha uma jornada semanal acima da média – quase a metade (48,8%) tinha jornada de trabalho superior a 44 horas semanais (DIEESE. 2002). Com exceção de algumas funções específicas e de elevada qualificação, a baixa remuneração também era outro aspecto característico do setor: 73% dos trabalhadores recebiam, em 2002, menos de 3 salários mínimos. Deve-se ainda ressaltar o alto índice de faltas no trabalho como decorrência de problemas de saúde, além de um percentual acima da média de casos de alcoolismo. A sobreposição das ocupações que aparecem tanto nas edificações civis quanto nas obras de infra-estrutura dificulta um estudo mais profundo sobre o perfil específico do trabalhador na construção pesada. Pode-se dizer, porém, que não deve haver alterações significativas quanto ao gênero, prevalecendo uma grande maioria de homens nestas atividades. Em relação à escolaridade, no que tange a operação dos equipamentos, há certamente um nível mais elevado. Finalmente, sobre os rendimentos, como as obras de infra-estrutura são realizadas na sua maioria pelas grandes construtoras, é provável que a remuneração média seja maior para os trabalhadores diretos e que salários mais baixos sejam destinados para os envolvidos com as funções básicas (terceirizadas). “Os trabalhadores e a reestruturação produtiva na construção civil brasileira”. Resenha DIEESE – Estudos Setoriais n. 12 (2002). 102 Lima Jr., J. M (2000) – Segurança e saúde no trabalho de construção: experiência brasileira e panorama internacional. Brasília, OIT – Secretaria Internacional do Trabalho. 103 Um estudo do SESI, com base nos dados da RAIS de 2003, mostrou que a participação feminina no setor da construção era extremamente baixa, apenas 70 mil pessoas num universo de 11,8 milhões de mulheres trabalhadoras formais. Como proporção dos ocupados formais na construção, apenas 7,1% era do sexo feminino. 101

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Novas demandas de formação e qualificação profissional O SENAI publicou recentemente um estudo com tendências e projeções de crescimento das ocupações no setor da Construção104. Embora a ênfase seja nas edificações civis, o próprio estudo destaca que a referência utilizada, com base na CNAE/IBGE, engloba também as obras de infra-estrutura. Desta forma, foram identificadas ocupações que aumentaram sua participação na estrutura ocupacional do setor, o que estaria associado às mudanças organizacionais e tecnológicas (sejam de processo ou relativas a novos materiais/máquinas). Foram identificadas neste grupo as seguintes ocupações: gerentes de operações comerciais e de assistência técnica; técnicos em segurança do trabalho; almoxarifes e armazenistas; trabalhadores de estrutura de alvenaria; trabalhadores de estrutura de concreto armado; trabalhadores de montagem de estruturas de madeira e metal; aplicadores de materiais isolantes; gesseiros; aplicadores de revestimento cerâmico, pastilhas pedras e madeiras; encanadores e instaladores de tubulações; montadores de equipamentos eletrônicos em geral; operadores de máquinas e equipamentos de elevação; operadores de equipamentos de acabamento de chapas e metais; eletricistas de manutenção eletroeletrônica. Em termos das projeções de crescimento, destacam-se os “aplicadores de materiais isolantes”e “gesseiros”, que se relacionam com a já referida técnica de construção seca (drywall). Para estes grupos ocupacionais, espera-se uma expansão de 30% no emprego nos próximos três anos. Nas demais atividades, com exceção dos “montadores de estruturas de concreto”, onde deve haver estabilidade, prevê-se crescimento moderado do emprego, entre 10% e 30% até 2008. Além das ocupações citadas anteriormente, gostaríamos de enfatizar os ramos de petróleo e gás, que compõem o setor de construção pesada. Neste sentido, é preciso chamar a atenção para o PROMINP – Programa de Mobilização da Indústria de Petróleo e Gás Natural. Este programa, concebido no âmbito do Ministério de Minas e Energia, envolve as atividades de construção pesada, na medida em que tem como objetivo fortalecer a indústria nacional de bens e serviços por meio da implantação de projetos na área do petróleo e gás natural105. A necessidade de qualificação profissional foi reconhecida pelo PROMINP como uma das principais questões a serem enfrentadas. Tanto é que, no conjunto do programa, está em 104 105

Boletim Ocupacional Senai (2005) – Projeções para o Setor de Construção Civil. Neste sentido, cabe ressaltar que nas áreas específicas de exploração e produção, transporte marítimo, abastecimento, gás e energia foram feitos investimentos da ordem de U$ 40 bilhões no Brasil e no exterior, entre 2003 e 2006.

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Educação Integral dos Trabalhadores

execução um plano de qualificação profissional que visa capacitar, gratuitamente, mão-deobra especializada em 150 categorias profissionais consideradas críticas para o setor de petróleo e gás. Diversas áreas, estados e municípios já foram selecionados para os ciclos de qualificação profissional106 . Naquelas categorias, a oferta de trabalho atual é inferior a demanda prevista, indicada pelo potencial de expansão estimado no PROMINP e no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que incorporou as metas do programa. Também nestes casos percebe-se certa tendência de desconcentração regional da construção e da indústria pesada, isto é, também na área de energia parece haver um movimento de disseminação em âmbito nacional, explorando-se as particularidades locais. Este programa de qualificação profissional pode ser considerado de grande envergadura, pois estão previstos cerca de 750 cursos diferentes e 5.400 turmas, envolvendo aproximadamente 80 instituições de ensino, nos vários níveis. Para tal, de acordo com o Ministério de Minas e Energia,“o plano está organizado de forma a contemplar entidades de diferentes características, com papéis diversos, que vão abranger as várias etapas da cadeia de Educação Profissional, com a premissa de assegurar a homogeneidade e o padrão de qualidade de todo o processo de qualificação”. Para o ciclo com início previsto em março de 2007 estavam definidos os seguintes cursos e respectivas localidades: Lixador – Coari-AM e Manaus-AM; Inspetor – Dimensionamento de Solda – Curitiba-PR; Inspetor de Dutos – Manaus-AM, SalvadorBA,Vitória-ES e Rio de Janeiro-RJ; Encarregado de Montagem Mecânica – Mossoró-RN; Instrumentista Montador – Mossoró-RN; Engenharia – Controle de Qualidade – Rio de Janeiro-RJ; Inspetor de Soldagem – Rio de Janeiro-RJ; Engenheiro Elétrico – Rio de Janeiro-RJ; Desenhista e Projetista de Tubulação – Rio de Janeiro-RJ; Engenheiro Projetista – Rio de Janeiro-RJ; Encarregado de Solda – Rio de Janeiro-RJ; Inspetor – Pintura – Rio de Janeiro-RJ; Encarregado de Elétrica – Rio Grande-RS; Encarregado de Instrumentação – Rio Grande-RS; Eletricista – Força e Controle – Rio Grande-RS; Eletricista Montador – Rio Grande-RS;

Instrumentista Montador – Rio Grande-RS; Instrumentista – Sistemas – Rio Grande-RS; Supervisor de Planejamento – Rio Grande-RS; Caldeireiro – Rio Grande-RS; Encanador – Rio Grande-RS; Mecânico Montador – Rio Grande-RS; Mecânico Ajustador – Rio Grande-RS; Pintor – Rio Grande-RS; Soldador de Estrutura – Rio Grande-RS; Soldador de Tubulação – Rio Grande-RS; Supervisor de Planejamento – Salvador-BA; Operador de Trator – Salvador-BA; Projetista – Salvador-BA; Revestidor – Salvador-BA; Inspetor – Laboratorista de Concreto – São Paulo-SP; Engenheiro – Apoio Administrativo – São Paulo-SP; Desenhista Projetista de Automação – São Paulo-SP; Engenheiro Desenhista – São Paulo-SP; Encarregado de Solda – Vitória-ES;

A escolha destas 35 ocupações/funções é um claro indicativo das atividades que 106

Alagoas (Maceió); Amazonas (Coari e Manaus); Bahia (Salvador); Ceará (Fortaleza); Espírito Santo (Vitória e Linhares); Mato Grosso do Sul (Três Lagoas); Minas Gerais (Belo Horizonte); Paraíba (João Pessoa); Paraná (Curitiba); Pernambuco (Recife); Rio de Janeiro (Rio de Janeiro); Rio Grande do Norte (Mossoró); Rio Grande do Sul (Porto Alegre e Rio Grande); Rondônia (Porto Velho), Santa Catarina (Itajaí), São Paulo (Paulínia, Santos, São José dos Campos e região metropolitana de São Paulo), e Sergipe (Aracaju).

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Setor econômico de Construção Civil

exigem uma demanda adicional na construção pesada, inclusive nos seus aspectos administrativos e gerenciais. Como este é apenas um dos primeiros ciclos de cursos oferecidos a partir do PROMINP, cabe um acompanhamento sistemático das ações de qualificação do programa, que para além das ocupações apontam também para as regiões do país onde se prevê o crescimento das indústrias de petróleo e gás. Para finalizar esta seção, vamos destacar um trecho da entrevista que foi realizada com Aparecido S. Martins, que atou como educador em 2006 num projeto de qualificação financiado pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). Este programa, que envolveu o SENAI, a Escola Sindical São Paulo – CUT e o Ministério do Trabalho e Emprego, atendeu trabalhadores desempregados nas modalidades de pedreiro, carpinteiro e armador, na região do Vale do Paraíba, em São Paulo, tendo em vista a ampliação das refinarias da Petrobrás. Na opinião do entrevistado, a participação destes diferentes agentes – o SENAI responsabilizou-se pelo treinamento técnico e a Escola Sindical pelo módulo de formação cidadã – evidenciou um conflito de concepções em termos de qualificação profissional. Uma visão “empresarial”relaciona os altos índices de desemprego e a baixa taxa de novas contratações no setor, dentre outros aspectos (carga tributária, direitos trabalhistas etc.), com a falta de qualificação do trabalhador. Nesta perspectiva, a responsabilidade recai sobre o trabalhador desempregado, que não atende aos requisitos profissionais exigidos pelo mercado. Contrapõe-se a isso a visão defendida por Aparecido S. Martins e outros educadores que atuam neste projeto. De acordo com uma perspectiva inspirada em Paulo Freire, a qualificação deve propiciar uma formação“libertadora”do indivíduo, ou seja, um processo de autoconhecimento e compreensão da realidade sobre a base da cidadania, dos direitos e da justiça social. O desafio, a nosso ver, está justamente em compatibilizar as duas visões: como oferecer uma qualificação profissional que atenda as demandas do segmento empresarial e, ao mesmo tempo, resgate o sentimento de dignidade e ofereça ao trabalhador uma possibilidade maior de valorização das suas habilidades?

Considerações Finais Este artigo buscou apresentar um panorama a respeito do setor de Construção, com ênfase nas atividades de infra-estrutura. Em primeiro lugar, uma descrição geral do setor apontou para sua importância em termos de participação no PIB e na geração de empregos no País. Dados os efeitos multiplicadores desta atividade, depois de um período longo de estagnação ou baixo crescimento, espera-se uma retomada dos investimentos com base nas metas do PAC, que tem na construção pesada um de seus eixos fundamentais. Neste sentido, é provável que aumente a demanda por uma força de trabalho melhor qualificada e que esteja apta para incorporar os avanços tecnológicos e organizacionais que vêm sendo adotados nas grandes corporações do setor. E é bom lembrar que esta demanda deve se manifestar em várias regiões do País, o que reforça a constatação da necessidade de oferta de cursos específicos em municípios selecionados. Por outro lado, as características do processo produtivo recomendam atenção para que este movimento de expansão não se realize perpetuando aspectos que foram sempre associados à Construção: informalidade acentuada, baixos salários, alta rotatividade

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Educação Integral dos Trabalhadores

e terceirização. Especialmente na construção pesada, como se viu recentemente nas obras do Metrô em São Paulo, a segurança é um item decisivo, que exige um monitoramento diário em termos das normas e critérios a serem seguidos nas obras em construção. Em outras palavras, espera-se que a qualificação profissional contribua para melhorar as condições de trabalho e as relações de trabalho no setor e não o contrário, isto é, evitando que as empresas apenas substituam seus trabalhadores ou atualizem suas capacitações, sem compromisso com uma mudança favorável na gestão da mão-de-obra, redução na jornada de trabalho e elevação dos salários. Portanto, o cenário global que se apresenta é positivo, na medida em que foram identificadas uma série de ocupações com potencial de crescimento na construção pesada, como mostraram os dados do SENAI e do PROMINP. Mas, para aqueles que pretendem promover cursos de qualificação profissional nesta área, que certamente serão cada vez mais necessários, é preciso levar em conta as características históricas do trabalho em construção – acima mencionadas – e acrescentar aos conteúdos técnicos da Educação Profissional uma discussão sobre cidadania e formas de valorização do trabalhador. Porque os avanços em termos de produtividade trazidos pelas inovações tecnológicas e organizacionais devem propiciar, também, melhores condições de trabalho e de vida para o conjunto dos trabalhadores do setor.

Bibliografia CBIC – Câmara Brasileira da Indústria da Construção – Banco de Dados (www.cbic.org.br) Brasília-DF, 2007. DIEESE – Os trabalhadores e a reestruturação produtiva na construção civil brasileira. Resenha – Estudos Setoriais n. 12 – São Paulo, 2002. FGV-SP – “Construcarta – Nível de Atividade” – Ano 8, n. 294, São Paulo, Fevereiro de 2007. Lima Jr., J. M (2000) – Segurança e saúde no trabalho de construção: experiência brasileira e panorama internacional. Brasília, OIT – Secretaria Internacional do Trabalho. PAIC – Pesquisa Anual da Indústria da Construção – 2004. IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro-RJ. PNAD – Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio – 2004 e 2005. IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro-RJ. PROMINP – Programa de Mobilização da Indústria de Petróleo e Gás Natural. Ministério de Minas e Energia, Brasília-DF. RAIS – Relação Anual de Informações Sociais – 2005. Ministério do Trabalho e Emprego – Brasília-DF. SEADE – Pesquisa da Atividade Econômica Paulista – PAEP (2001) – São Paulo, SP. SENAI – “Tendências para o Setor de Construção Civil” – Série Difusão Tecnológica e Organizacional – Brasília-DF, 2005. SENAI – Boletim Ocupacional Senai – Projeções para o Setor de Construção Civil – BrasíliaDF, 2005.

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Setor econômico de Construção Civil

A Educação Profissional no Setor de Construção Civil Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto

A

área profissional de Construção Civil passa atualmente por uma grande expansão. As instituições empresariais são otimistas quanto ao crescimento do setor, bem como o governo atual tem lhe dado grande atenção por seu potencial de gerar empregos diretos e indiretos. Para uma análise preliminar do tratamento didático-pedagógico para a formação de profissionais da área de construção civil, selecionamos as entidades abaixo: Escola Técnica Municipal de Sete Lagoas / MG; Centro Federal de Educação Tecnológica do Piauí; Unidade de Ensino Descentralizada de Sinop – CEPROTEC/MT; Centro de Habilitação Filosofia e Cultura / SP. A Escola Técnica Municipal de Sete Lagoas está localizada em Sete Lagoas, MG, ministra a habilitação de Técnico em Edificações. É uma entidade de ensino pública municipal. As cargas horárias são as que seguem em quadro abaixo: HABILITAÇÃO, QUALIFICAÇÕES E ESPECIALIZAÇÕES: 1 Habilitação : Carga Horária: Estágio–Horas

Técnico em Edificações 1200 horas 300 horas

O plano de curso estipula como objetivo propiciar o desenvolvimento do educando com “a aquisição de conhecimentos, capacidade de compreensão, análise, síntese, aplicação, avaliação, aquisição de habilidades psicomotoras, interesses e atitudes profissionais para que possa atuar com eficiência, individual e integradamente com grupos multiprofissionais (...)”. Os candidatos ao ingressarem no curso deverão estar cursando o 3º ano do Ensino Médio ou já o terem concluído. Interessante notar que logo após a exposição de objetivo amplo, o plano passa a uma visão das competências de acordo com o estabelecido pela legislação para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. As competências para atuar na área consideram desde o planejamento anterior à obra, passando pelo controle e gerenciamento dos trabalhadores, até o registro e aprovação do projeto junto aos órgãos públicos competentes. São definidas, por exemplo, como a competência de buscar informações para o cálculo da viabilidade do empreendimento; preparar projetos arquitetônicos e de instalações; implantar e gerenciar um canteiro de obras; preparar processos de aprovação de construções junto aos órgãos competentes; ser capaz de trabalhar em equipe e aplicar métodos e técnicas de gestão administrativa e de pessoas. O técnico diplomado deve estar capacitado a supervisionar a construção, cuidando do gerenciamento dos recursos humanos, dos recursos técnicos, dos cálculos de custos e da aplicabilidade técnica, ou seja, uma formação para o trabalho e preocupado apenas com as atitudes condizentes com a visão patronal, e no escopo das competências laborais.

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Educação Integral dos Trabalhadores

Todos os componentes curriculares estão intimamente ligados aos ditames da produtividade da obra, entre os quais a Redação Técnica e Inglês Instrumental são os únicos componentes não estritamente voltados à tecnicidade da construção civil. E posto que cada um tem carga horária de 24 horas, pode-se aferir que se torna inviável qualquer aprofundamento teórico de abrangência mais geral na formação do educando. Mesmo o componente curricular Cálculo está direcionado a resolver problemas e situações de uma obra dentro do contexto cotidiano de trabalho, procedimento essencial e indispensável que auxilia o aprendizado de cálculos e de qualquer outra temática, porém é extremamente limitado para uma formação mais humana e social que vise a emancipação humana e a cidadania ativa. O plano apresenta um programa para o estágio supervisionado. O acervo bibliográfico descrito está restrito a livros técnicos. O corpo docente tem formação ampla e variada condizente com os componentes curriculares a que cada professor está vinculado. O Centro Federal de Educação Tecnológica do Piauí está localizado em Teresina, PI, ministra a habilitação de Técnico em Estradas com carga horária de 1.200 horas. Trata-se de uma entidade pública federal que teve seu plano de curso aprovado junto ao CNCT em 2003. O plano de curso apresenta um “currículo voltado para a formação de competências e habilidades necessárias ao desenvolvimento do cidadão”, tendo como objetivo “formar profissionais com sólidos conhecimentos técnicos, científicos e humanísticos para atuarem no planejamento, elaboração de projetos, execução, manutenção e restauração de estradas”. O curso do CEFET-PI em consonância a outros programas dos CEFETs acima analisados segue as competências laborais necessárias à execução das tarefas em obras, no caso em construção e manutenção de estradas, em detrimento de outros conteúdos e componentes voltados realmente a uma formação científica e humanística como apresentado na parte de justificativa e objetivos do plano. O curso é dividido em três módulos centrais: Planejamento e Projeto de Estradas, Execução de Obras de Estradas, Manutenção de Estradas, cada um com 400 horas de carga horária. O acervo bibliográfico é apenas de livros técnicos, e relativamente pequeno comparado a outros acervos de outros CEFETs. O corpo docente apresenta formação técnica e acadêmica adequada ao enfoque predominantemente para a execução de obra e produção. Não se verifica, ao menos no plano de aula, carga horária para conteúdos e assuntos que sejam para formação geral do educando jovem egresso do Ensino Médio, na perspectiva de uma formação humana focalizada na ação política e participativa. A Unidade de Ensino Descentralizada de Sinop –CEPROTEC/MT está localizada no Mato Grosso, ministra habilitação em Educação profissional técnica de nível médio em Edificações, qualificação em Assistente em Planejamento em Obras Civis, qualificação em Assistente em Instalações de Obras, qualificação em Assistente de Supervisor em Obras Civis. Trata-se de uma entidade pública estadual. O curso técnico é destinado aos egressos do Ensino Médio ou a jovens que já estejam cursando o 3º ano. As cargas horárias dos cursos são as seguintes:

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HABILITAÇÃO, QUALIFICAÇÕES E ESPECIALIZAÇÕES: Habilitação: Carga Horária Total: Qualificação Módulo I: Carga Horária: Qualificação Módulo II: Carga Horária: Qualificação Módulo III: Carga Horária:

Educação Profissional Técnica de Nível Médio em Edificações 1.540 horas Assistente em Planejamento de Obras Civis 496 horas Assistente em Instalações de Obras Civis 540 horas Assistente de Supervisor de Obras Civis 504 horas

A filosofia preconizada no plano de aula visa à formação de “cidadão com conhecimentos para exercerem a cidadania e o trabalho tendo como referência o cultivo de valores e atitudes que auxiliem na formação de uma sociedade justa e democrática”. Por outro lado, o objetivo geral já delimita esta filosofia ao preconizar que: ... tem por objetivo formar profissionais, promovendo a construção de competências que contemplem habilidades, conhecimentos e comportamentos que atendam às demandas do setor produtivo e das relações sociais. Este curso busca principalmente o aprendizado de novas técnicas, atualização tecnológica, gestão de pessoas e problemas, tendo em vista uma resposta à demanda quantitativa da região e um significativo aumento da melhoria qualitativa das obras de construção civil.

É interessante notar como o plano de curso reafirma conceitos ideologicamente difundidos sem ao menos relativizá-los ou mesmo questioná-los dentro de uma intencionalidade educativa, pois os objetivos específicos apresentam a pretensão de formar profissionais para atuar com contrato formal ou como autônomos, proporcionando “a jovens e adultos a aquisição de competências e habilidades, permitindo-lhes manter a sua empregabilidade, bem como prepará-los para futuras evoluções e ocupações dentro da área da construção civil”. Ora, a empregabilidade de cada trabalhador não depende de sua Educação Profissional Técnica de Nível Médio apenas, envolve uma série de outras condições econômicas e, sobretudo, políticas. Propor em um plano de curso, que a aquisição de competências e habilidade permitiria a cada indivíduo isoladamente manter-se empregado e/ou trabalhando de modo remunerado corresponde a uma visão muito estreita. As competências gerais do técnico em edificações, o perfil profissional de conclusão, é constituído de um aprendizado para um profissional responsável por supervisionar uma obra, desde a organização do material, leitura de um projeto, até aquelas ligadas à gestão de pessoal, sempre pensando na produtividade e competitividade. Os módulos (qualificações) são organizados em componentes curriculares de acordo com os objetivos. Os componentes Comunicação Lingüística e Ética e Cidadania e Empreendedorismo têm carga horária de 32 horas cada (módulo I), Segurança no Trabalho tem carga horária de 64 horas (módulo II), e Urbanismo com carga de 32 horas (módulo III) constituem-se em componentes curriculares que permitiriam uma interface ou interdisciplinaridade, contribuindo para uma abordagem menos técnica e mais humana. Salientemos que o plano ressalta que a área de Construção Civil mantém relação com diversos setores econômicos, fazendo parte de uma grande cadeia produtiva e sendo base para desenvolvimento de outras, o que por si só já justificaria certo trato pedagógico ampliado.

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Educação Integral dos Trabalhadores

Entretanto, o plano repete para cada componente curricular as competências, habilidades e base tecnológica apresentada em seus itens anteriores, dificultando a apreciação da maneira pela qual se pretende executá-lo. Segundo o plano, a ênfase seria técnica e operacional, mesmo considerando, por exemplo, que as questões urbanas (urbanismo) para ser apreendidas e compreendidas em toda a sua amplitude necessitariam de elementos que estão além de uma base tecnológica que vise apenas as “simbologias e convenções técnicas; espaço urbano; normas técnicas; leis e posturas locais; códigos de obras”. O acervo bibliográfico descrito é grande e com vários exemplares, em comparação aos demais planos aqui previamente analisados. O corpo tem formação acadêmica compatível com destaque para a área de engenharia. Não é apresentado qualquer docente com formação acadêmica na área de humanas, os profissionais com esta formação estão alocados nas funções de coordenação e supervisão da escola. O Centro de Habilitação Filosofia e Cultura está localizado em Mairiporã, SP, entidade privada filantrópica, conforme registro no CNCT, ministra a Habilitação Profissional de Técnico em Edificações com carga horária de 1.200 horas, acrescidas de 160 horas de estágio. O curso é destinado aos egressos concluintes do Ensino Médio. O objetivo traçado no plano visa “habilitar cidadãos a competir em igualdade de condições por melhores oportunidades de trabalho, de crescimento profissional e pessoal, desenvolvendo-lhes na profissão escolhida, o espírito criativo, o dinamismo e a iniciativa com vista a manter e acentuar a eficiência e a eficácia no trabalho. Valorizando-lhes a experiência extra-escolar, desenvolvendo-lhes seus modos de pensar, agir e sentir concernentes à moderna sociedade brasileira, capacitando-lhes à compreensão dos fundamentos científicos e tecnológicos dos processos produtivos (...)”. A concepção de propiciar, por meio da educação, uma competição em igualdade demonstra a percepção das desigualdades sociais pela entidade. Além do conhecimento prévio do trabalhador ser considerado como salutar, uma valorização do saber-fazer do trabalhador, os fundamentos científicos e não apenas o saber técnico-tecnológico dos processos produtivos são objetivados. Interessante notar que o perfil profissional de conclusão não é apresentado em uma lista infindável de competências, mas na pretensão de formar “um profissional com autonomia intelectual, crítico e criativo voltado para a prestação de serviços a engenheiros e arquitetos, acompanhando a construção de edifícios, casas, indústrias, instalações hidráulicas, realizando desenhos de arquitetura e projetos de construção civil”. Embora esta descrição vaga leve a crer que se predomina uma concepção de ensino profissional não apenas direcionado a uma prática de ensino-aprendizagem baseada em competências e habilidades operacionais, as competências são apresentadas na organização curricular. Entretanto, os componentes curriculares descritos no documento seguem a legislação vigente, como os demais planos apresentados, e não dispõem de horas para estudos não-técnicos. O corpo docente é formado por profissionais com registro no CREA, mas não se descreve a formação acadêmica dos mesmos. Não há descrição de acervo bibliográfico, apenas citação de quantidades dos materiais disponíveis.

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• Marcelo Weishaupt Proni • Wagner Wiliam da Silva Introdução

O

propósito deste artigo é examinar a demanda de força de trabalho em duas atividades bastante dinâmicas do chamado “agronegócio”: a produção de carne de frango e derivados e a produção de carne de porco e derivados. Como é sabido, o crescimento destas atividades a partir de meados da década passada gerou novas oportunidades de emprego e renda no País, em especial em pequenas cidades da região Sul. Mas, é importante analisar de que maneira a expansão e a reestruturação destes segmentos, em particular a entrada de novas empresas, a introdução de inovações tecnológicas e as mudanças organizacionais, afetaram o volume e as condições de trabalho no setor. O artigo é composto de sete seções, incluindo esta introdução e as considerações finais. A próxima seção procura mapear o desempenho econômico recente das duas atividades referidas, inclusive identificando os estados que concentram os estabelecimentos mais modernos. Em seguida, são apresentadas as principais mudanças no processo produtivo, com ênfase na maior integração da cadeia produtiva, e são discutidas as razões do aumento de produtividade verificado nos últimos dez anos. Na quarta seção, é examinado o processo de especialização na criação de aves e suínos, que gerou novas demandas de qualificação profissional em razão da carência de trabalhadores especializados em ocupações específicas. Na seqüência, a análise prioriza a intensificação do trabalho e as dificuldades na contratação de trabalhadores nos abatedouros. Na sexta seção, é feito um panorama da evolução recente do mercado de trabalho no setor, procurando explicitar a mudança ocorrida no perfil dos trabalhadores. Para isso, a análise procura inicialmente dimensionar o crescimento da ocupação nestas atividades e mostrar as diferenças entre os principais estados produtores na geração de novos postos de trabalho; a seguir, é feita uma caracterização do emprego no setor, destacando a distribuição salarial e outros atributos; depois, são descritas as características pessoais (sexo, idade e instrução) dos empregados no setor; enfim, são mencionadas as ocupações típicas ou mais representativas nos segmentos de criação e abate. Ao final, é feita uma síntese das principais precariedades no quadro de emprego, são acrescentados comentários sobre os tipos de cursos de formação profissional mais requeridos no momento e são indicadas algumas conclusões. Deve-se esclarecer, ainda, que a análise do desempenho econômico recente do setor tomou como referência os relatórios de entidades representativas107, ao passo que as projeções de crescimento para os próximos anos se basearam em relatórios do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Por sua vez, as mudanças no 107

Neste texto utilizamos os relatórios da ABEF – Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos, para dados relativos à produção nacional e mundial e mercado nacional e internacional. As mesmas informações relativas à carne suína foram colhidas a partir da base de dados estatísticos da ABIPECS – Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína. Os dados estatísticos relativos ao mercado de carne bovina foram coletados na base de dados da ABIEC – Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne. A opção por estas bases de informação se deve tão somente pelo fato de serem elas as alimentadoras das informações consideradas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Capítulo 6

Setor Econômico Agropecuário: Aves e Suínos Evolução e Perfil do Emprego no Setor de Frangos e de Suínos


Educação Integral dos Trabalhadores

perfil ocupacional foram analisadas a partir de tabulações especiais da Relação Anual de Informação Social (RAIS) do Ministério do Trabalho e Emprego. A reestruturação empresarial e suas conseqüências para o trabalho foram identificadas a partir de estudos acadêmicos selecionados e complementadas por meio de entrevistas com especialistas no ramo.

Panorama geral da produção no setor A expansão das três principais atividades de produção de carnes no Brasil tem se dado em ritmo bastante distinto. A produção brasileira de carne de frango cresceu em média 9,2% ao ano, entre 1990 e 2006, enquanto o setor produtor de carne suína auferiu no mesmo período um crescimento médio anual de 6,4%; por sua vez, a produção brasileira de carne bovina teve crescimento de 4,8% ao ano entre 1994 e 2005. Considerando que a produção mundial de carne de frango vem crescendo a uma taxa de 3,2% a.a.,108 nota-se que a produção brasileira cresce a um ritmo bem mais acelerado. Em 1999, o Brasil respondia por 11,6% da produção mundial; em 2006, nossa produção correspondeu a 15,5% da produção mundial, tendo em 2003 superado a produção da União Européia (Tabela 1). O País é hoje o terceiro maior produtor mundial. TABELA 1 - PRODUÇÃO MUNDIAL DE CARNE DE FRANGO PRINCIPAIS PAÍSES (1999 - 2006) – EM MIL TONELADAS ANO 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006*

EUA 13.367 13.703 14.033 14.467 14.696 15.286 15.869 16.162

Fonte: USDA / ABEF

CHINA 8.550 9.269 9.278 9.558 9.898 9.998 10.200 10.350

BRASIL 5.526 5.977 6.736 7.517 7.843 8.494 9.297 9.336

UE 6.614 7.606 7.883 7.788 7.512 7.627 7.736 7.425

MÉXICO 1.784 1.936 2.067 2.157 2.290 2.389 2.498 2.610

MUNDO 47.554 50.097 52.303 54.155 54.282 55.952 59.092 60.090

* Preliminar

Deve-se acrescentar que, em 2000, o Brasil produziu quase 6 milhões de toneladas de carne de frango e consumiu pouco mais de 5 milhões de toneladas (Tabela 2), ao passo que em 2005, com o aumento expressivo da exportação do produto, o País produziu cerca de 9,3 milhões de toneladas, mas o consumo cresceu menos (atingiu pouco mais de 6,5 milhões de toneladas). Ao observar a Tabela 2, também é possível verificar que houve um grande salto de produtividade no setor avícola entre 1990 e 2005. Considerando a relação entre a quantidade de matrizes de corte alojadas e a produção total de carne, nota-se que em 1990 esta relação 108

Em termos mundiais, Fernandes Filho e Queiroz (2002) demonstram, com base nos dados publicados no ANUALPEC de 2000, que entre 1991 e 2000 a produção de frango teve uma taxa de crescimento de 44,6% (4,2% a.a.), ao passo que a produção mundial de carne suína variou 15,8% (1,6% a.a.), ficando novamente a produção bovina responsável pelo pior desempenho, tendo sofrido retração no período de 4,8% (-0,5% a.a.). Com base nos dados da ABIPECS, constata-se que entre 1998 e 2006 o crescimento médio anual da produção mundial de carnes suínas foi de 2,2% ao ano, tendo melhorado o desempenho se comparado ao período anterior; já a produção mundial de carne de frango apresentou no período de 1999 a 2006 desempenho um pouco inferior ao apresentado no período anterior (taxa de crescimento de 3,2% ao ano).

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

era de 142 kg, ao passo que em 2005 ela salta para 253 kg de carne produzida para cada matriz alojada. O crescimento da produtividade também é expressivo na produção de ovos: enquanto em 1990 se obtinha uma produção média anual de 41 caixas de 30 dúzias de ovos por matriz alojada, em 2005 esta produção salta para 73 caixas de 30 dúzias. TABELA 2 - INDICADORES DE PRODUÇÃO NO SEGMENTO AVÍCOLA NO BRASIL Ano

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Produção total Produção de de carne de carne frango volfrango (mil t) tada ao consu-mo interno (mil t) 2.267 1.968 2.522 2.200 2.727 2.351 3.143 2.710 3.411 2.930 4.050 3.617 4.052 3.483 4.461 3.812 4.875 4.262 5.526 4.755 5.977 5.070 6.736 5.486 7.517 5.917 7.843 5.921 8.494 6.069 9.297 6.535

Consumo per capita (kg/hab.) 13,6 14,96 15,74 17,87 19,06 23,21 22,05 23,83 26,31 29,14 29,91 31,82 33,81 33,34 33,89 35,48

Alojamento de Alojamento de matrizes de matrizes: ovos corte (mil cabebrancos ças) (mil cabeças) 15.932 661,1 17.009 626,1 17.275 484,5 18.913 507,8 20.817 659,5 22.068 503,9 21.773 461,8 23.115 470,4 25.058 582,9 28.966 552,8 27.535 699,8 28.597 611,3 30.499 628,9 31.035 566,1 33.293 654,4 36.663 617,4

Alojamento de Produção de ovos brancos e matrizes: ovos vermelhos vermelhos (mil (mil cx. 30 dz.) cabeças) 37.370 247,3 37.930 257,1 39.412 205,3 35.184 201,9 37.396 230,5 44.627 335,5 44.255 268,2 34.989 240,9 37.877 268,4 41.021 271,4 41.100 306,4 42.433 292,1 45.801 238,7 55.346 200,2 57.829 269,6 62.022 230,2

Fontes: ABEF – Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frango (www.abef.com.br), APA – Associação Paulista de Avicultura (www.apa.com.br), UBA – União Brasileira de Avicultura (www.uba.org.br) e Avisite (www.avisite.com.br). Elaboração: Secretaria de Política Agrícola-MAPA.

No caso da suinocultura, a Tabela 3 mostra que o País é hoje o quarto maior produtor mundial, mas detém uma parcela marginal da produção global. Note-se que a produção nacional tem se mantido relativamente estável quando comparada a produção mundial. Se em 1998 o Brasil respondia por 2,7% da produção mundial, em 2006 a produção nacional de carne suína equivaleu a 3% da mundial. TABELA 3 - PRODUÇÃO MUNDIAL DE CARNE SUÍNA - PRINCIPAIS PAÍSES (1998 - 2006) – EM MIL TONELADAS País China União Européia 1 Estados Unidos Brasil Total

1998 38.837 17.777 8.623 2.400 88.424

1999 38.907 18.144 8.758 2.400 89.270

2000 40.314 17.649 8.597 2.600 90.083

2001 41.845 17.645 8.691 2.637 92.057

2002 43.266 17.845 8.929 2.798 95.318

2004 2003 2005* 2006** 45.186 47.210 48.500 50.000 17.921 21.614 21.550 21.660 9.312 9.056 9.435 9.590 2.950 3.059 3.140 3.230 98.421 100.917 102.704 104.990

Fonte: FAO / Abipecs - * Estimado - ** Previsão - 1 Até 2003, 15 membros; a partir de 2004, 25 membros.

Olhando a Tabela 4, pode-se perceber que a produção brasileira atingia quase 2,6 milhões de toneladas para um consumo interno de pouco mais de 2,4 milhões de toneladas, em 2000, ao passo que em 2005 a produção havia se elevado para 2,7 milhões de toneladas e o consumo caiu para menos de 2,1 milhões de toneladas. Ou seja, o aumento da produção destinada à exportação foi bem maior que o crescimento da produção total, na década atual.

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Educação Integral dos Trabalhadores

Apesar de a produção nacional não ter obtido um crescimento muito superior à produção mundial, a produtividade da suinocultura também tem apresentado resultados bastante satisfatórios. Considerando os dados apresentados na Tabela 4, podemos observar que se em 1995 foram abatidas 9,5 cabeças para cada matriz alojada; em 2005 o abate por matriz alojada chegou a 14,6 cabeças. Quanto a relação entre a produção total de carne e a quantidade de cabeças abatidas, os ganhos também são evidentes: enquanto em 1990 os animais abatidos tinham em média o equivalente a 54,7 kg de carne, em 2005 esta média saltou para 79,4 kg. A Tabela 4 apresenta outra informação que merece especial atenção das autoridades sanitárias e dos organismos ligados ao setor. Note-se que em 1996 o abate com SIF – Sistema de Inspeção Federal – representava 59,7% do total dos animais abatidos; até 1999 esta proporção cresceu e atingiu a marca de 82,1% do total do abate; entretanto, a partir de 2000 esta relação começou novamente a decrescer e em 2004 os animais abatidos com SIF representavam apenas 60,3% do total dos abatidos. TABELA 4 - INDICADORES DE PRODUÇÃO NO SEGMENTO DE SUINOCULTURA NO BRASIL Ano 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Matrizes alojadas (mil cabeças) nd nd nd nd nd 2.125 2.231 2.237 2.281 2.312 2.461 2.663 2.860 2.467 2.349 2.343

Abate (milhões de cabeças) 19,2 19,9 19,7 19,8 19,2 20,1 20,7 20,4 22,4 23,5 32,3 34,9 37,7 34,5 33,0 34,1

Abate com SIF (milhões cabeças) nd nd nd nd nd 12,0 14,2 13,0 18,3 19,3 19,4 21,1 21,6 20,9 19,9 nd

Produção (mil toneladas) 1.050 1.130 1.190 1.260 1.330 1.470 1.560 1.540 1.699 1.834 2.556 2.730 2.872 2.697 2.620 2.708

Consumo (mil toneladas) 1.033 1.115 1.147 1.226 1.301 1.439 1.501 1.481 1.617 1.748 2.426 2.472 2.398 2.206 2.113 2.084

Consumo per capita (kg/hab.) 7,3 7,7 8,0 8,3 8,5 9,2 9,6 9,3 10,0 10,7 14,3 14,4 13,8 12,5 11,8 11,5

Fonte: ABIPECS – Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (www.abipecs.com.br). Elaboração: Secretaria de Política Agrícola / MAPA.

Olhando a Tabela 4, pode-se perceber que a produção brasileira atingia quase 2,6 milhões de toneladas para um consumo interno de pouco mais de 2,4 milhões de toneladas, em 2000, ao passo que em 2005 a produção havia se elevado para 2,7 milhões de toneladas e o consumo caiu para menos de 2,1 milhões de toneladas. Ou seja, o aumento da produção destinada à exportação foi bem maior que o crescimento da produção total, na década atual. Apesar de a produção nacional não ter obtido um crescimento muito superior à produção mundial, a produtividade da suinocultura também tem apresentado resultados bastante satisfatórios. Considerando os dados apresentados na Tabela 4, podemos observar que se em 1995 foram abatidas 9,5 cabeças para cada matriz alojada; em 2005 o abate por matriz alojada chegou a 14,6 cabeças. Quanto a relação entre a produção total de carne e a quantidade de cabeças abatidas, os ganhos também são evidentes: enquanto em 1990 os animais abati-

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dos tinham em média o equivalente a 54,7 kg de carne, em 2005 esta média saltou para 79,4 kg. A Tabela 4 apresenta outra informação que merece especial atenção das autoridades sanitárias e dos organismos ligados ao setor. Note-se que em 1996 o abate com SIF – Sistema de Inspeção Federal – representava 59,7% do total dos animais abatidos; até 1999 esta proporção cresceu e atingiu a marca de 82,1% do total do abate; entretanto, a partir de 2000 esta relação começou novamente a decrescer e em 2004 os animais abatidos com SIF representavam apenas 60,3% do total dos abatidos. Concentração da produção na região Sul No que diz respeito à distribuição regional da produção, tanto o segmento de frangos quanto o de suínos apresentam amplo destaque para a região Sul. Em relação aos frangos é importante notar que, apesar do surgimento de novas áreas produtoras nos estados do Centro-Oeste brasileiro, a produção ainda continua altamente concentrada no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A tabela 5 mostra que os três principais estados produtores de carne de frango no Brasil respondiam em 2005 por 54% da produção anual total (era 56% em 2002); incluindo São Paulo, essa porcentagem sobe para quase 69% (a mesma participação registrada em 2002); por sua vez, Goiás e Mato Grosso do Sul – nova região produtora, juntamente com o Mato Grosso – respondiam juntos por apenas 6,7% da produção nacional (participação pouco maior que a de Minas Gerais). Note-se que, entre 2002 e 2005, os produtores de carne de frango de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul perderam participação, ao passo que os produtores do Paraná e de São Paulo ganharam maior participação na produção nacional. Quando considerada a produção nacional de suínos também são os estados do Sul os principais produtores, sendo que neste caso Minas Gerais supera São Paulo e passa a responder pela quarta maior produção estadual. Juntos, os três principais estados respondiam em 2006 por quase 59% da produção nacional; acrescentando Minas Gerais, essa porcentagem passava para cerca de 70%; por sua vez, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul eram responsáveis por 14% da produção total. Se compararmos a posição relativa dos quatro principais estados produtores em relação a sua posição em 2002, podemos notar que neste caso aumentou um pouco a concentração, já que naquele ano Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais foram responsáveis por 68% da produção nacional, conforme pode ser observado na Tabela 6. TABELA 5 - PARTICIPAÇÃO DE ESTADOS SELECIONADOS NA PRODUÇÃO ANUAL DE CARNE DE FRANGO NO BRASIL Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul São Paulo Minas Gerais Goiás Mato Grosso do Sul BRASIL

2002 20,8 19,0 16,1 13,2 6,3 3,0 3,1 100

2003 21,9 17,5 16,2 12,6 6,3 3,7 3,0 100

2004 22,7 17,6 15,0 13,3 6,4 3,8 2,9 100

2005 22,8 16,8 14,8 14,4 6,1 3,9 2,8 100

Fonte: ABIPECS – Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (www.abipecs.com.br). Elaboração: Secretaria de Política Agrícola / MAPA.

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TABELA 6 - PARTICIPAÇÃO DE ESTADOS SELECIONADOS NA PRODUÇÃO ANUAL DE CARNE SUÍNA NO BRASIL Santa Catarina Rio Grande do Sul Paraná Minas Gerais São Paulo Goiás Mato Grosso do Sul Mato Grosso BRASIL

2002 24,0 16,1 17,3 11,1 7,2 4,1 4,6 3,1 100

2003 23,8 16,6 17,1 9,8 7,3 4,8 5,0 3,5 100

2004 24,1 16,5 16,3 9,6 7,3 5,2 5,1 3,6 100

2005 24,3 17,0 16,3 10,5 7,1 5,6 5,4 3,5 100

2004 24,1 16,5 16,3 9,6 7,3 5,2 5,1 3,6 100

Fonte: Abipecs, SIPS. Sindicarne - PR, Sindicarne - SC, Abcs, Embrapa. - (1) Estimativa.

Mudanças recentes no processo produtivo Diversos são os fatores responsáveis pelo crescimento da produtividade observado na produção de carne de aves e de suínos. A seguir, buscamos apresentar os mais relevantes, mas sem a preocupação de hierarquizá-los segundo o grau de importância. Ressalte-se que é possível notar a presença de várias similaridades na produção de aves e suínos e no processo de reestruturação econômica dos dois segmentos. Primeiro, é preciso chamar atenção para o melhoramento genético observado desde os anos 90, com o qual foi possível desenvolver animais com quantidade maior de carnes nobres e menos gordura, bem como foi conquistada uma maior homogeneidade tanto no peso do animal quanto no tempo de engorda dos mesmos. Paralelamente, as rações ganharam lugar de destaque no processo de P&D nos dois segmentos. Nos dois casos – frangos e suínos – foram desenvolvidas rações específicas para cada fase do processo de criação, isto é as rações passaram a conter a concentração adequada dos nutrientes necessários ao desenvolvimento do animal naquela etapa de sua vida. Deste modo, a quantidade de ração necessária à produção de cada animal caiu sensivelmente no período. A preocupação com a sanidade das granjas e dos abatedouros também merece destaque, uma vez que medidas sanitárias acabaram por diminuir a incidência de doenças, o que resultou tanto na elevação do número de animais que chegam vivos na época do abate quanto no ganho de peso destes animais, permitindo assim que o tempo necessário para a engorda fosse reduzido. Em terceiro lugar, convém chamar atenção para a introdução de processos mecanizados e automatizados nos processos produtivos. Nas granjas de engorda foram implantados sistemas automatizados de controle de temperatura ambiente, assim como de provimento de ração e de água. Nos abatedouros a automatização passou a determinar o ritmo da produção – além da separação entre carne e osso, foram introduzidas máquinas para fazer o depenamento e a desvisceração, assim como em alguns setores de embalagem. Outro aspecto que pode ter contribuído para a elevação da produtividade no setor de aves e suínos, no Brasil, é o intenso processo de concentração do capital que aconteceu no decorrer dos anos 90. Este movimento foi marcado pela entrada ou expansão de empresas estrangeiras no setor de aves e suínos no Brasil. As presenças do Grupo Macri da Argentina, da italiana Parmalat, do Grupo Bunge e do francês Grupo Duox110 contribuíram para fazer

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avançar a reestruturação notada no setor. É necessário destacar que as mudanças em termos de estrutura de mercado não ocorreram apenas pela entrada de empresas estrangeiras no mercado doméstico, mas também em razão das respostas ou iniciativas das principais empresas nacionais do setor. Também a título de ilustração vale lembrar a constituição da BRF Trading Company111, em 2001, a constituição pela Perdigão do Projeto Buriti em Rio Verde, além da oferta pública de aquisição de 100% das ações da Perdigão iniciada pela Sadia em julho de 2006. A tendência de concentração pode ser comprovada a partir dos dados apresentados por Garcia (2004). Em 1987, as cinco maiores empresas do setor eram responsáveis por 32,7% do abate de frangos no Brasil; em 2002 as cinco empresas de maior porte respondiam por 40,6% do total. Ainda que este nível de concentração não possa caracterizar o setor como um setor altamente oligopolizado, é preciso reconhecer que este grau de monopolização é suficiente para conferir às empresas líderes alguns ganhos de monopólio, especialmente quando considerado o mercado de derivados de frango, onde provavelmente a concentração de mercado cresce. O mercado interno é caracterizado por elevada disputa. Aparentemente existem dois padrões básicos de concorrência neste ramo da indústria. O primeiro, entre as empresas líderes (especialmente entre a Sadia e a Perdigão), baseia-se na diferenciação de produtos, ou melhor, na diversificação voltada para produtos de alto valor agregado (cortes temperados, embutidos e pratos congelados) e em expressivos investimentos em marca. O segundo se refere aos produtos padronizados, como o frango inteiro resfriado ou congelado, do qual participam, além das empresas líderes, também os demais abatedouros de pequeno porte. Neste mercado, as exigências de qualidade são menores, existe baixa diferenciação entre as marcas, as barreiras para entrada são baixas e a competição está baseada em preço. A integração entre os elos da cadeia produtiva As transformações pelas quais passam os setores de produção de aves e suínos no Brasil não se restringem à mudança do controle acionário ou a maior amplitude do mercado nacional e/ou internacional. A forma de integração dos elos da cadeia produtiva assumiu importância fundamental, como veremos em seguida. A partir dos anos 90, em meio ao processo de modernização da agricultura e da concomitante expansão da agroindústria no Brasil, a produção de frangos e suínos deu um grande salto do ponto de vista organizacional. No caso do frango, a criação comercial passou a se dar principalmente com base no “modelo de integração” (Lima Nogueira, 2003). Este modelo é caracterizado: a) pela grande proporção de pequenos produtores no processo produtivo; b) pela exigência – da parte da integradora – de uso de mão-de-obra familiar no processo produtivo integrado, com a conseqüente geração de emprego e renda para os membros da família; c) pelo grande número de contratos presentes no sistema; d) pela exigência da integradora em relação à diversificação das atividades da propriedade, estimulando principalmente a O Grupo Macri adquiriu a Chapecó e o frigorífico Prenda, a Parmalat adquiriu o Frigorífico Batavia (que no segundo trimestre de 2006 foi assumida pela Perdigão), a Ceval foi comprada pelo Grupo Bunge e os franceses do Grupo Duox compraram a Frangosul. 111 A BRF Trading Company resultou de uma parceria entre a Sadia e a Perdigão para atuar exclusivamente nos mercados internacionais onde as duas empresas não tinham posição consolidada. 110

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Educação Integral dos Trabalhadores

produção de matérias-primas utilizadas na produção da ração utilizada na propriedade integrada; e) pela dependência de assistência técnica da integrada em relação à integradora; f) além da alta dependência financeira e tecnológica dos integrados. Também caracterizava o modelo de integração o tamanho menor dos aviários; a baixa capacidade de organização dos produtores, além do baixo nível de automação (Fernandes Filho e Queiroz, 2002). Ainda que o modelo de produção apresentado acima tenha conferido ao setor um elevado índice de crescimento, a implantação do projeto Buriti pela Perdigão marcou o início de um novo modelo de integração que tende a sobrepor-se ao anterior. Suas principais características são: a) automação das granjas de engorda (de aves e suínos); b) alto volume de animais confinados por granja/produtor integrado; c) redução significativa do número de produtores integrados em cada planta industrial; d) produtores integrados de porte médio ou grande, por conta da exigência de que os integrados possuam uma maior capacidade de alavancar financiamento para com isso poder atender a necessidade de maiores investimentos; e) uso predominante de mão-de-obra assalariada nos aviários. Note-se que o novo modelo difere do anterior no que se refere ao tipo de produtor integrado: no modelo tradicional, primeiro o pequeno proprietário utiliza a mão-de-obra familiar; no novo modelo, o que predomina é a propriedade de maior porte, que utiliza a mão-de-obra assalariada no manejo do frango/suíno (o proprietário se dedica exclusivamente ao gerenciamento do negócio). Se no modelo anterior a base técnica da produção era bastante heterogênea, no modelo que se consolida a base técnica é bastante parecida em todos os integrados e demanda investimentos de maior monta, já que o processo de automação foi inserido tanto no trato quanto na climatização das hospedagens. Ainda que esta iniciativa da Perdigão não tenha conseguido substituir na totalidade os pequenos integrados, já é possível notar que se trata de uma tendência que tende a se consolidar com o passar dos anos. Em seu relatório anual de 2006 a Sadia revela que a partir do ano de 2007 investirá R$ 1,5 bilhão no complexo industrial de Lucas do Rio Verde (MT), sendo que do montante total previsto a empresa investirá R$ 800 milhões e um grupo de 132 produtores investirá os R$ 700 milhões restantes. Isto significa que em média (além da posse da terra) cada produtor deverá investir R$ 5,3 milhões. Não é preciso insistir na tese de que este modelo inviabiliza a permanência dos pequenos proprietários no mercado de produção de frangos de corte e criação/engorda de suínos. BOX 1 DESCRIÇÃO DO PROCESSO PRODUTIVO DE UMA GRANDE EMPRESA DO SETOR * A Perdigão organiza sua produção de frangos da seguinte forma: 1. No início do ciclo de produção das aves, compram ovos para incubação e pintos da Cobb do Brasil, uma afiliada da Cobb Vantress. Enviam esses pintos para suas granjas de avós nas quais seus ovos ficam incubados e as matrizes são produzidas. Em 2005, mantiveram uma produção média de matrizes de aproximadamente três milhões que produzem ovos incubáveis. Além disso, compram uma pequena porcentagem de matrizes de outro fornecedor. As matrizes produzem ovos incubáveis, dos quais nascem os pintos de um dia utilizados na produção de aves. Em 2005, produziu 546,7 milhões de pintos incluindo frangos, aves especiais (chester, peru), perdizes e codornas. Incubam esses ovos em seus 13 incubatórios. 2. Enviam os pintos de um dia, que continuam sendo de sua propriedade, para produtores integrados (ou seja, produtores terceirizados), cujas operações são integradas ao processo de produção da empresa. As fazendas operadas por esses integrados variam no tamanho e são próximas às unidades de abate. Esses integrados são

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos) responsáveis por gerenciar e cuidar do crescimento das aves em seus aviários, sob a supervisão de veterinários da empresa. O pagamento dos integrados é baseado no índice de desempenho determinado conforme a mortalidade das aves, a proporção entre a quantidade ingerida de ração e a carne produzida e destina-se a cobrir os custos de produção e proporcionar lucros líquidos. * Quanto à produção de carne de suínos, a Perdigão opera da seguinte maneira: 1. Produz a maioria dos suínos que utiliza em seus produtos. Adicionalmente, compra um determinado volume dos produtores locais. O restante das necessidades de carnes de suínos é comprado no mercado spot. 2. Para produzir suínos, em geral a empresa compra leitões dos integrados próximos às suas instalações de produção que criam os leitões até alcançarem um peso específico. Os produtores de leitões compram matrizes suínas de produtores como Agroceres, Dalland, DanBred, Agropecuária Imbuial e Agropecuária ou compram os leitões dos fazendeiros que possuem matrizes. A empresa transfere esses leitões para integrados separados que criam os suínos até alcançarem o peso do abate. Depois desta fase, transporta os suínos destes integrados para suas instalações de abate. A Perdigão tem acordos com um total aproximado de 1.500 integrados, incluindo os produtores de leitões e criadores de suínos. Monitora a produção de suínos por esses integrados e fornece suporte de seus veterinários. 3. Os produtores locais dos quais compramos uma parte de suas necessidades de suínos também estão próximos de suas instalações de produção, mas não têm contratos de parceria com a Companhia. Em geral, esses produtores criam os suínos desde o nascimento até alcançarem o peso do abate e recebem suporte técnico limitado. A empresa compra os suínos criados por esses produtores locais de acordo com contratos. Abate os suínos criados por seus integrados, comprados dos produtores locais ou no mercado spot, em cinco abatedouros de suínos. A Perdigão fornece suporte técnico aos integrados durante todo o processo de produção. Tem contratos de parceria com aproximadamente 4.400 integrados de aves. Muitos destes integrados também produzem e vendem milho que é utilizado pela Perdigão para produzir ração animal. Fonte: Perdigão (2006)

Com base nos dados da PNAD de 2005, pode-se perceber que em Santa Catarina (80%), no Paraná (62%), no Mato Grosso (60%), no Mato Grosso do Sul (57%) e no Rio Grande do Sul (44%), os produtores se comprometem previamente com um comprador. Estas informações servem para demonstrar a importância do processo de integração na produção de frangos e suínos no Brasil. Garcia (2004) e Garcia & Ferreira Filho (2005), considerando dados coletados em uma pesquisa com 229 avicultores dos principais estados produtores no país, buscaram estudar os ganhos de escala nas propriedades de hospedagem de frango de corte. Comparando as realidades regionais, constata-se o predomínio de produtores com pequenas propriedades e menor capacidade produtiva no Sul do país e Minas Gerais e produtores com propriedades maiores e níveis de produção mais elevados nos estados do Centro-Oeste brasileiro. Nas regiões Oeste do Paraná e no Triângulo Mineiro (regiões tradicionais produtoras de soja e milho) estão os produtores com maiores áreas de terra e com as maiores capacidades de alojamento de aves da região tradicional. No Centro-Oeste, os produtores visitados no Estado do Mato Grosso do Sul são os que apresentam menores áreas de terra e menores extratos de capacidade de produção de frangos de corte, enquanto os produtores do Estado de Goiás são os que apresentam os maiores extratos de capacidade de produção da região. Os cálculos apresentados pelos autores demonstraram que um aviário com aproximadamente 3.500 m2 de área de hospedagem terá seu custo médio relativamente menor, sendo que a partir deste tamanho o produtor passará a incorrer em “deseconomias de escala”. Foi demonstrado que nas propriedades das regiões tradicionais a quantidade de aves confinadas é, em geral, bastante inferior à quantidade ótima observada nos resultados, enquanto na região de Lucas do Rio Verde existe a presença de propriedades com tamanho

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bastante superior aos observados como ótimos. Estes resultados demonstram que o objetivo da Sadia e da Perdigão de diminuir o número de integrados por unidade industrial encontrou na exigência de economias de escala um limitador. Por outro lado, o estudo também conseguiu demonstrar que as unidades produtoras do Sul do país podem passar por um processo de grande reestruturação, resultando ali numa sensível diminuição do número de integrados. É possível que a longa experiência na criação de frangos e suínos consiga minimizar a desvantagem dos produtores do Sul, quando comparados aos produtores das novas regiões. No entanto, é importante ressaltar que se trata de uma vantagem passageira, uma vez que os novos produtores incorporarão rapidamente o know-how disponibilizado pelas integradoras. A proximidade dos portos pode ser considerada outra vantagem dos produtores tradicionais em relação aos das novas regiões produtoras (GO, MS e MT), porque boa parte da produção destina-se aos mercados externos, diminuindo assim os custos de transporte. BOX 2 Particularidade da produção de carne de frangos e de suínos no Centro-Oeste Ao examinar a produção de aves e suínos, Saboya (2001) destaca que 91% dos grandes abatedouros presentes no centro-oeste brasileiro haviam se instalado na região no decorrer da década de 1990. Na década atual, outros grandes investimentos vêm sendo realizados, em especial no sudeste do estado de Goiás, o que indica que a nova distribuição espacial da produção de frangos e suínos no Brasil pode estar se modificando. Na ocasião da pesquisa, o autor entrevistou 46 abatedouros de aves e suínos instalados na região centro-oeste. Saboya demonstrou que 100% das empresas cujo negócio está relacionado à expansão de uma empresa cuja origem não é o Centro-Oeste foram instaladas na década de 1990. Em relação ao tamanho dos abatedouros, a pesquisa de Saboya concluiu que 40% são grandes (acima de 48.000 aves/dia ou acima de 400 animais/dia), 30% de porte médio e outros 30% pequenos abatedouros (até 9.600 aves/dia ou até 80 animais/dia). Chamou atenção a elevada percentagem de pequenos abatedouros que produzem a partir do processo de integração, 62,5%. Em relação à região de origem, notou-se que 75% dos pequenos frigoríficos apresentavam proprietários oriundos da própria região centro-oeste, ao passo que entre os médios e grandes 63% dos proprietários eram de outra região que não a Centro-Oeste. Esta informação é relevante se considerarmos que uma eventual ampliação da participação do centro-oeste na produção nacional pode trazer dificuldades aos pequenos abatedouros das regiões tradicionais, uma vez que sua capacidade de deslocamento em direção a nova fronteira produtora é diminuta se comparada à dos maiores frigoríficos. Isto não implicaria necessariamente no fechamento de unidades industriais de menor porte na região sul-sudeste, mas certamente limitaria sua capacidade de crescimento em relação à produção nacional. É importante destacar que, neste processo de realocação da produção, 73% das empresas consultadas tinham como meta essencial do projeto minimizar os custos de abastecimento de milho. Entretanto, também cabe destacar que o surgimento do negócio de produção de carnes de aves e suínos na região centro-oeste não foi acompanhado pela diminuição da produção nos estados tradicionais. A importância desta constatação diz respeito ao fato de que não se trata de um processo migratório, mas sim de uma estratégia de expansão que considera a nova fronteira agrícola em suas possibilidades de produção. Em outras palavras, não houve ameaça real, ainda, a permanência da estrutura produtiva presente no Sul do país.

É possível notar grande semelhança entre o setor de suínos e o setor avícola. A produção por meio do sistema de integração aparece como principal forma nos dois segmentos, no entanto na suinocultura a parcela de produtores independentes parece ser mais expressiva que a observada na avicultura. Segundo Miele (2006), a presença de um número considerável de produtores112 permite que o mercado possa ser caracterizado como sendo um“oligo112

Ao todo, 112 empresas e cooperativas abateram suínos sob o Sistema de Inspeção Federal – SIF em 2004. As empresas que estão sob este sistema de inspeção respondem pela totalidade do volume exportado.

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pólio competitivo”. Em 2004, as cinco maiores empresas responderam por apenas 36% do total de animais abatidos e responderam por 74% das exportações. A elevada concorrência nos mercados interno e externo acaba fazendo com que a cadeia de suínos esteja numa constante busca por elevação da produtividade. Por conta disto, percebe-se uma constante evolução na genética, nas técnicas de manejo, no cuidado sanitário, no abate e no processamento. Estas transformações organizacionais e tecnológicas acabam por inserir no processo de produção novas necessidades de formação profissional – guardadas as particularidades de cada setor, como será visto em seguida.

Especialização dos produtores e novas demandas de qualificação profissional Todas estas modificações na produção contribuíram para consolidar outra transformação que atingiu o setor de aves e suínos no último período: a especialização da produção. No setor de aves, nota-se a presença de (a) estabelecimentos especializados na produção de avós113; (b) outros na produção de pintinhos de um dia; (c) os tradicionais estabelecimentos integrados, a quem cabe a tarefa da engorda; e (d) os abatedouros. Os produtores de pintinhos de um dia fornecem aos abatedouros, que por sua vez destinam estes pintinhos aos integrados, onde são engordados. Geralmente, os abatedouros também fornecem as rações utilizadas pelos integrados durante o período de engorda das aves. No caso dos suínos, o processo é bastante semelhante. Além da presença de empresas especializadas na produção de matrizes, a produção de carne suína conta ainda com os produtores especializados na produção de leitões, que permanecem na propriedade desde o nascimento até atingirem o peso de 19 a 22 kg. A partir desta etapa a engorda é continuada por um produtor especializado neste negócio. Este compra os leitões de 19 a 22 kg e os mantém até atingirem peso entre 90 e 110 kg, quando finalmente serão destinados ao abate. Esta segmentação/especialização da produção contribuiu para o surgimento de uma demanda por trabalhadores mais qualificados, até então não observada no setor. Em entrevista concedida pelo presidente do Sindiavipar (Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Paraná), Domingos Martins, ficou evidente que uma das dificuldades encontradas pelo setor diz respeito à contratação de trabalhadores com algumas características específicas, uma vez que o setor tem sido alvo de constante avanço tecnológico. Note-se que o Estado do Paraná tem se consolidado na liderança da avicultura brasileira, sendo auto-suficiente mesmo na produção de pintos de um dia (produto em que também é fornecedor para os estados de São Paulo e Santa Catarina). Nos últimos dez anos, a avicultura de corte brasileira tem transitado de um conceito original onde o baixo investimento na construção de barracões era um dos principais atrativos; para um conceito onde a busca pela maior produtividade exige que o produtor engorde seus frangos “num hotel cinco estrelas”. Em 1995, podia-se engordar dez frangos por m2 no inverno e oito frangos por m2 no verão. Com a adoção de maior tecnologia na climatização dos galpões, Martins afirma que hoje se confinam 16 frangos/m2 durante 113

São consideradas “avós” as aves que botam os ovos destinados exclusivamente à produção de matrizes. As matrizes, por sua vez, são as que produzem os ovos que sustentam a produção dos pintinhos de um dia, que são engordados pelos estabelecimentos integrados aos abatedouros.

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todo o ano. Este salto somente foi possível a partir da adoção de novas tecnologias, onde a climatização dos barracões, a quantidade e temperatura da água disponível aos frangos, bem como a distribuição de ração nos comedouros, são permanentemente monitoradas por um sistema de computador. Esta modificação no processo de engorda passou a demandar ao mercado de trabalho técnicos capazes de monitorar todo este sistema, bem como zootécnicos especializados em avicultura. O Sindiavipar argumenta que a desativação das granjas modelo – antes presentes nos Colégios Agrícolas do Paraná – foi prejudicial ao setor, uma vez que cessou no Estado a formação de técnicos agrícolas com algum conhecimento no manejo de aves. O presidente do sindicato também chamou atenção ao fato de que os cursos de formação de Médicos Veterinários não estimulam a especialização de seus graduandos em avicultura. Deste modo, também se constata a carência deste tipo de profissional no mercado. É importante destacar que as dificuldades encontradas pelo setor avícola em suprir algumas de suas demandas em relação à contratação de trabalhadores têm se acentuado também porque a região tradicional buscou adaptar-se às tecnologias pioneiramente utilizadas na expansão para o Centro-Oeste. É provável que, se os métodos de produção e manejo do frango nas regiões tradicionais não tivessem sido alterados, a participação da produção do Centro-Oeste teria crescido em relação à produção nacional. Neste sentido, o Programa de Desenvolvimento do Agronegócio (PRODEAGRO) e o Programa de Desenvolvimento Cooperativo para Agregação de Valor à Produção Agropecuária (PRODECOOP) – ambos do BNDES – tiveram papel de grande importância. Vale ressaltar que o sistema de hospedagem do frango nas regiões tradicionais é composto por um grande número de pequenos produtores, proprietários de pequenas propriedades e com maiores limitações em relação à realização de investimentos de maior monta com capital próprio. A adequação dos programas às necessidades destes proprietários permitiu implantar o processo de modernização, que garantiu a continuidade do crescimento da atividade nas regiões Sul e Sudeste do país. De acordo com o relatado por dirigentes de alguns sindicatos de trabalhadores do setor nas regiões tradicionais, as empresas líderes têm adotado uma política que privilegia o crescimento dos aviários. Segundo os trabalhadores, os pequenos produtores que não se dispõem a aumentar a escala de produção em suas propriedades – tanto pela adoção de novas tecnologias quanto pela construção de um maior número de barracões – sofrem retaliações da empresa integradora, o que faz com que muitos acabem deixando o setor. Este posicionamento das grandes integradoras no Sul do país em alguma medida reflete a política por elas adotas nos estados da região Centro-Oeste do país. A título de ilustração, um presidente de sindicato de trabalhadores cita a experiência vivida por um proprietário de um aviário, segundo o relato, há dois anos (época em que o aviário foi montado), após 31 dias de engorda114, o aviário tinha uma receita bruta de R$ 4,3 mil, produzindo 13.800 aves em 900 m2 de construção; hoje, mantidos números relativos à 114

No caso, o abate acontece com 31 dias porque 100% produção da unidade industrial da integradora se destina ao atendimento do mercado externo, especificamente para países que demandam aves de menor peso.

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produção115 o aviário viu sua receita bruta cair para algo em torno de R$ 2,6 mil. Acrescente-se que a atuação das empresas líderes teve impacto sobre o nível da ocupação nos segmentos de criação, seja de frangos ou de suínos, mas têm exercido pouca influência direta sobre a gestão do trabalho entre os produtores. As mudanças mais significativas na gestão dos “recursos humanos”se concentram no abate e no processamento das carnes, como será visto a seguir.

Intensificação no ritmo de trabalho e dificuldades na contratação de trabalhadores Para completar a exposição que vem sendo feita, deve-se mencionar que as alterações ocorridas no setor implicaram prejuízos para os trabalhadores – em especial, do segmento de abate e processamento de carnes –, uma vez que as condições de trabalho se tornaram ainda mais predatórias, acarretando um aumento das queixas de doenças profissionais causadas por estresse. Em primeiro lugar, é importante destacar que foi relatada uma maior dificuldade em relação à contratação de mão-de-obra nos abatedouros, cuja causa não diz respeito à falta de qualificação profissional, mas sim à preferência dos trabalhadores por outras ocupações menos agressivas. Em algumas localidades, tais empresas têm dificuldade em recrutar funcionários. As condições de trabalho bastante desgastantes e os salários pouco atrativos ajudam a explicar, também, a elevada rotatividade da mão-de-obra observada no setor. Um elemento que deve ser destacado na análise das condições de trabalho é o ambiente“hostil”em que trabalham os funcionários da produção: em geral os frigoríficos são edificações fechadas, sem janelas e climatizadas – temperatura entre 10ºC e 12oC. Possivelmente, um ambiente frio e úmido propicia grande desconforto às pessoas que nele permanecem muitas horas por dia. A “linha de produção”em sua forma mais clássica é adotada massivamente nos abatedouros de frango. Esta forma de organização da produção impede que o trabalhador determine seu ritmo de produção, sendo impedido de deslocar-se de seu posto de trabalho até mesmo para utilizar o sanitário, a não ser dentro das regras determinadas pela empresa. Segundo o gerente de Recursos Humanos de um importante abatedouro paranaense, notase que os trabalhadores têm preferido buscar ocupações em indústrias onde o processo de produção não restringe tanto a possibilidade de locomoção e descanso. Todos os dirigentes sindicais consultados chamaram atenção a uma questão diretamente decorrente da anterior. Diz respeito à intensificação do ritmo da produção. A título de ilustração, pode-se relatar um caso ocorrido numa unidade industrial de uma das principais empresas do mercado nacional. A seção de embalagem – final da linha de produção – antes trabalhava com 60 funcionários, que ensacavam 4.000 frangos/hora. A produção aumentou para 9.600 frangos/hora e o número de funcionários passou para 88. Ou

115

Importante destacar que o aviário citado está entre os que têm um elevado índice de produtividade na unidade industrial a que pertencem o que acaba por lhe conferir uma remuneração acima daquela observada nos aviários menos produtivos. Trata-se de aviário onde a automatização é pouco utilizada, estando restrita apenas ao monitoramento da temperatura interna do ambiente e ao acionamento do sistema de aquecimento.

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seja, se anteriormente um funcionário embalava em média 66 frangos/hora, a intensificação do ritmo da produção exige que o mesmo funcionário dê conta de 109 peças/hora. É importante ressaltar que esta elevação no ritmo da produção não foi observada somente no setor de embalagem, mas ao longo de todo o processo produtivo116. Em decorrência do ritmo bastante acelerado do trabalho o número de trabalhadores com doenças ocupacionais – em especial L.E.R. ou D.O.R.T. – tem preocupado tanto os sindicatos de trabalhadores quanto as empresas. Foi observado que a forma como os abatedouros têm enfrentado este problema varia conforme a empresa. Numa das experiências observadas, o frigorífico obteve um avanço considerável na redução de casos, o que acabou tendo como reflexo uma queda significativa em seu nível de rotatividade da mão-de-obra ligada à produção117. A empresa contratou uma fisioterapeuta que trata dos trabalhadores já lesionados e desenvolve junto aos demais funcionários um programa preventivo que envolve, dentre outras coisas, a realização de seções de ginástica laboral. A empresa conta ainda com o trabalho de duas Assistentes Sociais que dão acompanhamento personalizado às famílias de trabalhadores lesionados, ou mesmo às famílias de trabalhadores que estejam passando por uma situação momentânea que requeira a atenção de um profissional desta área. Segundo o relatado, estas medidas tiveram impacto direto na elevação da auto-estima dos funcionários e trouxeram significativa melhora ao ambiente de trabalho. Em contrapartida, foi mencionada a experiência ocorrida na unidade citada acima no exemplo da seção de embalagem. O aumento do ritmo da produção contribuiu para que os casos de manifestação de doenças ocupacionais aumentassem. Ainda que esta unidade também conte com os serviços de uma fisioterapeuta, as seções de ginástica laboral não têm acompanhamento desta profissional, o que pode ter contribuído para que exercícios feitos incorretamente não tragam os resultados esperados. A unidade também conta com a presença de uma Assistente Social, entretanto – segundo relatado por dirigente do sindicato que representa os funcionários da empresa –, tanto o trabalho de fisioterapia quanto o de assistência social não estão presentes no cotidiano da fábrica e menos ainda nas casas dos trabalhadores. Relatou-se ainda haver um tratamento bastante diferenciado, sendo mais favorável aos funcionários que estão melhor posicionados na hierarquia da empresa. Neste caso, a unidade tem tido dificuldade em contratar trabalhadores da cidade onde está sediada tendo freqüentemente recorrido à contratação de trabalhadores oriundos de cidades vizinhas. Isto se deve em grande parte ao fato de os trabalhadores da cidade insistirem em buscar ocupações em outros setores. Esta motivação decorre da política implantada pela empresa em relação aos trabalhadores que manifestam a ocorrência de doenças ocupacionais. Segundo relatos, a empresa acata apenas aos laudos do médico do trabalho contratado por ela. São recorrentes as situações em que um médico diagnostica a doença ocupacional e recomenda o afastamento do trabalho, mas, ao ser consultado, o Embora alguns abatedouros menores ainda não tenham automatizado sua linha de produção, esta é uma tendência clara, uma vez que os grandes, a maioria dos médios e vários pequenos abatedouros já o fizeram. 117 Neste caso, a experiência relatada pela empresa foi posteriormente reafirmada pelo sindicato dos trabalhadores que atua na região. A empresa abate atualmente 240.000 aves/dia, deve ampliar sensivelmente sua produção no curto prazo e atende ao mercado interno e externo. A rotatividade caiu para um nível considerado baixo para o setor, mas ainda se encontra entre 2% e 3% ao mês (índice relativamente elevado). 116

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profissional contratado pela empresa recomenda apenas o afastamento do trabalhador da função, o que é feito de imediato, e pode-se manter o trabalhador no processo produtivo até demiti-lo alguns meses depois. Obviamente, o relato destas duas experiências não é suficiente para caracterizar o que ocorre no setor. No entanto, nas entrevistas realizadas para esta pesquisa, pode-se notar que a incidência de casos de doenças ocupacionais tem se tornado uma constante e que este fenômeno tem sido tratado de forma às vezes muito distinta. Segundo Siderlei Oliveira, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação, o setor avícola é, dentre todos os setores em que a CUT atua, o que apresenta maior incidência de doenças laborais. Outro aspecto que merece ser mencionado é a necessidade de mudança no comportamento dos trabalhadores do segmento de abate e processamento de carnes, que muitas vezes é imposta de forma autoritária. O gerente de RH citado anteriormente deixou evidente a preocupação da empresa paranaense em atender às exigências sanitárias dos compradores externos. O entrevistado falou sobre as dificuldades que o abatedouro enfrenta para conscientizar os trabalhadores da produção sobre o motivo da adoção de procedimentos sanitários tão rígidos. Os problemas mais comuns dizem respeito ao cumprimento das exigências quanto a permanente higienização das mãos e botas a cada vez que se adentra no ambiente de produção. Alguns trabalhadores também se sentem constrangidos por serem obrigados a se despirem no vestiário do abatedouro antes de colocar seus uniformes de trabalho – muitos argumentam que gostariam de vestir o uniforme por sobre sua roupa pessoal. Outro procedimento de difícil entendimento dos trabalhadores diz respeito à divisão espacial do refeitório, uma vez que os trabalhadores de uniformes brancos não podem sentar-se junto com os trabalhadores de uniformes coloridos118. A existência destes problemas foi confirmada por todos os dirigentes de sindicatos de trabalhadores consultados, o que indica serem problemas comuns aos abatedouros que procuram se adequar às novas exigências do mercado. Também indica que há pouco diálogo. E, se a política de gestão do trabalho das empresas do setor não é objeto de negociação coletiva, o sindicato não é envolvido pela empresa numa ação de conscientização da necessidade de adequação do comportamento dos funcionários. Acrescente-se que, de acordo com o gerente de Recursos Humanos do abatedouro citado, a implantação de cursos de Boas Práticas de Fabricação (BPF) seria de grande valia para a Indústria de Alimentos, uma vez que cursos como estes buscam demonstrar para os trabalhadores que estes procedimentos – ainda que dificultem o relacionamento com seus pares no ambiente de trabalho – são necessários para que os riscos de contaminação das carnes por bactérias sejam reduzidos a um nível tolerado pelos organismos fiscalizadores. Em suma, entre as principais inovações observadas no período recente nos abatedouros brasileiros estão, de um lado, aquelas relacionadas à implantação de medidas e procedimentos que visam atender às exigências sanitárias dos compradores internacionais; de outro, aquelas relacionadas ao constante esforço para elevar a produtividade. Os reflexos destas 118

Nos abatedouros, as cores dos uniformes servem para identificar a função do trabalhador na empresa (produção, manutenção, higienização ou ainda limpeza e serviços gerais). Numa explicação grosseira, costuma-se dizer que os trabalhadores de branco executam o serviço “limpo” e os coloridos as tarefas “sujas”.

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transformações sobre os trabalhadores são notórios. Em muitos casos, por conta das exigências sanitárias, os trabalhadores acabaram perdendo parte de sua privacidade, uma vez que sua higiene pessoal é permanentemente monitorada a partir do momento que adentra as dependências da empresa. Até mesmo suas relações no ambiente de trabalho passaram a ficar restritas aos colegas que atuam no mesmo setor, já que trabalhadores da “área limpa” não podem relacionar-se com os trabalhadores das“áreas sujas”. Mas, a queixa mais contundente refere-se às conseqüências da busca permanente pelo aumento de produtividade, principalmente a partir da implantação da nórea119, que acabou por subjugar fortemente os trabalhadores da produção. A intensificação do ritmo da produção, a partir da adoção deste equipamento, fez crescer de forma acelerada a ocorrência de doenças ocupacionais, gerando problemas que muitas empresas tentam contornar sem levar em conta a representação sindical. Nestas condições adversas, não é de estranhar que muitos trabalhadores destas localidades prefiram procurar emprego em outro setor de atividade.

Emprego, salários e perfil dos empregados Nesta seção, buscamos identificar variações recentes no volume de emprego, na distribuição salarial e em algumas características das ocupações ligadas diretamente à produção e abate de aves e suínos no Brasil. Convém esclarecer que a análise se baseia em duas fontes de informação: a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) do IBGE e a Relação Anual de Informação Social (RAIS) do MTE. Em relação à PNAD, cujas informações se baseiam na declaração prestada pelo trabalhador, foram considerados os anos de 1996, 2002 e 2005, sendo selecionados os estabelecimentos em que a atividade principal fosse a criação de aves ou a criação de suínos (porém, os micro-dados de 1996 só permitem analisar a“criação de aves”, pois não consta a “criação de suínos”). A PNAD permite mapear um conjunto mais amplo de ocupados no setor, mas não há informação sobre o abate de aves ou de suínos. Quanto aos dados da RAIS, cujas informações se baseiam na declaração prestada pelo empregador, foram selecionados os anos de 1996, 1999, 2002 e 2005 para estabelecimentos cuja atividade principal fosse a criação de aves, a criação de suínos e o abate de aves. Devese registrar a ausência do “abate de suínos”. Note-se que a RAIS enfoca o segmento formal do mercado de trabalho, isto é, apenas o emprego com registro em carteira e em estabelecimentos minimamente organizados. O primeiro comentário a fazer diz respeito à desproporção entre ocupados na criação de aves e de suínos, uma vez que um segmento tinha quase dez vezes mais pessoas economicamente ocupadas do que o outro. De acordo com as Tabelas 7 a/b, em 2005, havia quase 2 milhões de pessoas ocupadas nestas atividades. Mas, a imensa maioria (82%) era composta por trabalhadores que criavam aves ou porcos para consumo próprio. Portanto, de acordo com a PNAD, excluindo estes ocupados, os trabalhadores envolvidos na criação de aves (enquanto atividade destinada ao mercado) somavam quase 241 mil pessoas, ao passo que o número envolvido na criação de suínos girava em torno de 108 mil pessoas. Acrescente-se, 119

Espécie de correia (esteira) em que o frango é pendurado e por meio da qual ele percorre todo o processo de produção.

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ainda, que o número de trabalhadores submetidos a uma relação de emprego em cada segmento estava em torno de 84 mil e 31,5 mil pessoas, respectivamente. E que 10% dos empregados tinham vínculo temporário com o estabelecimento, seja na criação de aves ou de suínos, em 2005. Quando se examina a variação da ocupação ao longo do tempo, nota-se que houve uma redução do número de empregados na criação de aves durante a segunda metade da década passada e uma recuperação na década atual120. A categoria “conta própria”, por sua vez, registrou aumento nos dois períodos, passando a apresentar um número superior ao de empregados. Também chama a atenção a forte redução do número de trabalhadores sem remuneração entre 1996-2002 e depois sua recuperação parcial entre 2002-2005. E pode ser mencionada a elevação mais recente de empregadores. Mas, sem dúvida, a variação quantitativamente mais expressiva refere-se à expansão dos ocupados na produção para consumo próprio (o aumento recente abarcou 110 mil pessoas). TABELA 7A - POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES Empregado Permanente Empregado Temporário Conta Própria Empregador Trabalhador não remunerado Produção para próprio consumo Total

1996 74.173 4.336 51.083 6.674 110.176 1.473.534 1.719.976

2002 62.448 6.207 65.135 5.215 28.570 1.438.910 1.606.485

2005 75.795 8.197 92.217 9.158 55.564 1.548.255 1.789.186

Fonte: IBGE – PNAD, anos selecionados

TABELA 7B - POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE SUÍNOS Empregado Permanente Empregado Temporário Conta Própria Empregador Trabalhador não remunerado Produção para próprio consumo Total

2002 31.047 1.637 30.878 1.139 53.919 30.117 148.737

2005 28.659 2.883 39.488 3.338 75.717 33.751 183.836

Fonte: IBGE – PNAD, anos selecionados

No caso da criação de suínos, a PNAD só permite análise a partir de 2002. Cabe aqui apenas comentar que o aumento do número de ocupados no segmento durante a primeira metade da década atual, não esteve associado com aumento na relação de emprego e sim quanto ao número de trabalhadores por conta própria e não remunerados, assim como de empregadores. E ressalve-se que, neste segmento, a expansão dos ocupados na produção para consumo próprio não teve grande impacto. 120

Este movimento acompanha o desempenho econômico da agropecuária brasileira voltada para a exportação. Uma análise da evolução geral da ocupação no setor agrícola durante a década de 1990 e na década atual pode ser encontrada em Proni, Mesquita, Garrido, Gonçalves e Silva (2005).

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TABELA 8 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES* Minas Gerais São Paulo Rio Grande Sul Santa Catarina Paraná Mato Grosso Goiás Mato Grosso Sul Outros Estados Total

1996 30.118 32.989 19.585 28.238 22.017 6.198 7.260 6.675 93.362 246.442

2002 17.853 16.130 12.211 20.609 24.032 1.983 4.342 6.551 63.864 167.575

2005 29.276 22.517 17.813 15.229 12.453 12.252 9.455 6.791 115.145 240.931

Fonte: IBGE-PNAD, anos selecionados. - * Nota: excluídos os ocupados na produção para consumo próprio

TABELA 9 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE SUÍNOS* Paraná Rio Grande do Sul Minas Gerais São Paulo Santa Catarina Mato Grosso Goiás Mato Grosso do Sul Outros Estados Total

2002 12.568 24.221 12.714 10.992 7.442 1.982 4.678 4.053 16.168 94.818

2005 17.005 16.075 15.124 10.428 7.616 3.644 2.703 1.542 33.982 108.119

Fonte: IBGE – PNAD, anos selecionados - * excluídos os ocupados na produção para consumo próprio

Outro aspecto importante diz respeito à distribuição regional dos ocupados nestas atividades. Nas Tabelas 8 e 9, foram selecionados alguns estados que se destacam na criação de frangos e de suínos, no Brasil, mas foram excluídos os ocupados na produção para consumo próprio. Chama atenção a redução de ocupados na criação de aves ocorrida entre 1996 e 2005 em Santa Catarina, São Paulo e Paraná, assim como o aumento registrado entre 2002 e 2005 em Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul. Por sua vez, entre os ocupados na criação de suínos também foram registradas variações distintas entre os estados onde se encontram os principais produtores nacionais. Entre 2002 e 2005, aumentou a ocupação no Paraná, Minas Gerais e Mato Grosso, mas houve redução significativa no Rio Grande do Sul e no Mato Grosso do Sul. Infelizmente, a PNAD não permite analisar a situação dos ocupados em estabelecimentos que tenham como atividade principal o abate de aves ou de suínos. Para obter um mapeamento mais completo da ocupação no setor é preciso utilizar a RAIS. Contudo, a RAIS informa apenas a situação dos empregados com contrato de trabalho registrado. Deve-se esclarecer, além disso, que o número de empregados apontado pelas duas fontes de informação não coincidem, uma vez que nas atividades de criação há grande incidência de trabalhadores sem o registro na carteira de trabalho.

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De acordo com a RAIS, no Brasil, em 2005 havia pelo menos 85 mil pessoas formalmente empregadas na criação de aves e pouco mais de 151 mil empregadas no abate de aves (ou seja, quase o dobro). Por sua vez, eram 16 mil na criação de suínos (não há registro sobre o abate de suínos). Nota-se que a expansão do emprego na criação de aves ocorreu de forma mais acentuada após 2002 (Tabela 10); o mesmo pode ser dito em relação à criação de suínos (Tabela 11). No caso dos abatedouros de frangos (Tabela 12), o forte aumento do emprego formal começou na virada da década: o número de empregados mais do que dobrou entre 1999 e 2005 (80 mil novos registros em carteira).121 Segundo relato de um pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, para cada emprego criado na indústria pode-se considerar ao menos outro posto de trabalho gerado no campo. Porém, é difícil mensurar tal relação e é possível que isto ocorra em alguns estados, mas em outros não. Nas Tabelas 10, 11 e 12 podem ser vistas as diferenças entre estados selecionados na evolução do emprego formalizado nos respectivos segmentos. Destaque para a expansão do emprego na criação de aves em Santa Catarina e no Paraná, depois de 2002. Na criação de suínos, destacam-se Minas Gerais e Santa Catarina. Mas, a expansão mais notável, em termos absolutos, ocorreu nos abatedouros de frango, depois de 1999, em especial no Paraná, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. TABELA 10 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES São Paulo Minas Gerais Santa Catarina Paraná Rio Grande do Sul Goiás Mato Grosso do Sul Mato Grosso Outros Estados Total

1996 17.809 9.979 2.865 3.992 4.601 65 134 410 19.985 59.840

1999 17.611 10.582 3.654 4.537 4.228 1.708 335 404 19.961 63.020

2002 16.366 11.251 5.691 4.715 3.950 1.955 472 555 20.084 65.039

2005 20.705 11.122 9.924 8.457 4.708 2.664 754 651 25.842 84.827

Fonte: IBGE-PNAD, anos selecionados. - * Nota: excluídos os ocupados na produção para consumo próprio

TABELA 11 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE SUÍNOS Minas Gerais Santa Catarina São Paulo Rio Grande do Sul Paraná Mato Grosso Mato Grosso do Sul Goiás Outros Estados Total

1996 2.815 1.252 1.528 1.030 760 136 147 118 990 8.776

1999 3.144 1.401 1.622 1.359 699 201 184 226 1.246 10.082

2002 3.224 1.817 1.413 1.396 883 536 312 282 1.638 11.501

2005 4.424 2.696 1.893 1.815 1.587 813 454 387 2.115 16.184

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados 121

Convém esclarecer que parte do aumento ocorrido no emprego possivelmente não corresponde a novos postos de trabalho, uma vez que pode decorrer da formalização de vínculos já existentes.

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Educação Integral dos Trabalhadores

TABELA 12 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul São Paulo Minas Gerais Goiás Mato Grosso Mato Grosso do Sul Total

1996 12.606 16.524 10.711 11.563 4.664 0 750 2.050 6.002 64.870

1999 13.809 18.156 10.790 10.308 7.536 1.452 1.920 2.027 5.129 71.127

2002 21.110 22.106 16.722 13.303 11.194 5.358 2.828 2.853 6.870 102.344

2005 36.238 30.006 26.604 17.750 10.922 8.791 6.152 4.576 10.317 151.356

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Características do emprego no setor A partir da RAIS é possível ter uma idéia aproximada da estrutura empresarial no setor de aves e suínos no Brasil. Ao observarmos o tamanho das empresas – de acordo com o número de empregados – nas duas atividades de criação122 e no abate, fica claro o processo de concentração em andamento no período examinado. Em 1996, nos pequenos estabelecimentos (de 10 até 99 trabalhadores) se concentravam 50% dos empregados nas atividades de criação; em 2005, estes estabelecimentos respondiam ainda por 46% do emprego. Em compensação, até 1999 não havia registro de estabelecimentos com mais de 1000 empregados, mas em 2005 estes já respondiam por 7% do total (Tabela 13). Por sua vez, quando se observa a “etapa industrial”da produção de carnes, a tendência pela concentração do capital fica ainda mais evidente. Em 1996, a atividade de abate de aves representava 41% dos empregados em grandes estabelecimentos (aqueles com mais de 1000 empregados); em 2005, quase dois terços dos empregados registrados estavam em estabelecimentos deste tipo. Em contrapartida, houve forte redução da participação dos estabelecimentos com um quadro de funcionários entre 100 e 499 pessoas (Tabela 14). TABELA 13 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS SEGUNDO TAMANHO DO ESTABELECIMENTO Até 4 vínculos ativos De 5 a 9 vínculos ativos De 10 a 19 vínculos ativos De 20 a 49 vínculos ativos De 50 a 99 vínculos ativos De 100 a 249 vínculos ativos De 250 a 499 vínculos ativos De 500 a 999 vínculos ativos 1000 ou mais vínculos ativos Total

1996 8,0 7,7 10,6 20,1 19,7 20,6 7,4 5,8 0,0 100

1999 7,9 7,6 11,7 18,7 20,8 21,3 6,9 5,0 0,0 100

2002 8,6 8,0 11,8 18,5 18,7 19,1 8,4 3,2 3,8 100

2005 8,1 7,7 11,3 17,6 17,0 19,3 7,5 4,8 6,7 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados 122

Devido a grande semelhança observada nas atividades de criação de aves e suínos, acreditamos ser possível analisar de forma agregada o perfil dos empregados nas duas atividades. Assim, quando nos referirmos às “atividades de criação”, a partir de agora, estaremos fazendo menção aos dados agregados da criação de aves e de suínos. Quando os dados se referirem aos segmentos separadamente, faremos a devida especificação.

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

TABELA 14 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES SEGUNDO TAMANHO DO ESTABELECIMENTO Até 4 vínculos ativos De 5 a 9 vínculos ativos De 10 a 19 vínculos ativos De 20 a 49 vínculos ativos De 50 a 99 vínculos ativos De 100 a 249 vínculos ativos De 250 a 499 vínculos ativos De 500 a 999 vínculos ativos 1000 ou mais vínculos ativos Total

1996 1,0 1,0 1,2 2,5 4,1 14,3 16,9 18,0 40,9 100

1999 1,0 0,7 1,5 2,9 2,4 11,1 14,1 22,7 43,6 100

2002 0,6 0,7 0,9 2,3 3,7 8,3 12,2 19,3 52,2 100

2005 0,4 0,5 0,6 1,3 2,0 5,4 8,8 16,6 64,4 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

TABELA 15 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS SEGUNDO TIPO DE VÍNCULO Trabalhador Urbano CLT contratado p/ empresa* Trabalhador Urbano CLT contratado p/ pessoa física** Trabalhador Rural contratado p/ empresa*** Trabalhador Rural contratado p/ pessoa física**** Outros Total

1996 41,39 4,31 19,44 34,20 0,65 100,00

1999 37,86 3,29 20,96 37,37 0,53 100,00

2002 35,49 5,76 15,95 42,15 0,66 100,00

2005 31,93 5,93 16,99 44,27 0,88 100,00

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados - *Trabalhador urbano vinculado a empregador pessoa jurídica por contrato de trabalho regido pela CLT, por prazo indeterminado. - **Trabalhador urbano vinculado a empregador pessoa física por contrato de trabalho regido pela CLT, por prazo indeterminado. - ***Trabalhador rural vinculado a empregador pessoa jurídica por contrato de trabalho regido pela Lei n. 5.889/73, por prazo indeterminado. - ****Trabalhador rural vinculado a empregador pessoa física por contrato de trabalho regido pela Lei n. 5.889/73, por prazo indeterminado.

Também é importante esclarecer qual o tipo de vínculo de emprego predominante. Entre os empregados no abate de frangos, em todos os anos selecionados, 99% eram trabalhadores urbanos regidos pelo regime de CLT e contratados por pessoa jurídica e prazo indeterminado (Tabela 16). Nas atividades de criação, este tipo de vínculo não é tão freqüente: em 1996, 41,3% eram trabalhadores urbanos vinculados pelo regime de CLT contratados por pessoa jurídica e por prazo indeterminado; e em 2005, a participação deste tipo de vínculo havia caído para apenas 32% (Tabela 15). O tipo de vínculo mais freqüente na criação de aves e suínos é o que a RAIS denomina como “Trabalhador rural vinculado a empregador pessoa física por contrato de trabalho regido pela Lei n. 5.889/73, por prazo indeterminado”. Em 2005, esta categoria respondia por 44,2% dos empregos nas atividades de criação de aves e suínos. Surge aqui um aparente paradoxo, pois até agora estivemos argumentando que o setor vem passando por um processo de concentração em que a atividade cada vez mais assume uma “gestão tipicamente capitalista”. Parece-nos que este movimento deveria resultar no crescimento do volume de contratações por empregadores juridicamente instituídos, mas o que se observa pelos dados é o crescimento da participação dos trabalhadores contratados por pessoas físicas. Este fato isolado não desqualifica o argumento de que os traços de atividade tipicamente capitalista têm se intensificado no setor; apenas demonstra que o processo de modernização não fez com que as relações de trabalho se tornassem menos precárias.

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Educação Integral dos Trabalhadores

TABELA16 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES SEGUNDO TIPO DE VÍNCULO Trabalhador Urbano CLT contratado p/ empresa* Trabalhador Urbano CLT contratado p/ pessoa física** Trabalhador Rural contratado p/ empresa*** Trabalhador Rural contratado p/ pessoa física**** Outros Total

1996 99,20 0,15 0,51 0,01 0,13 100,00

1999 98,83 0,03 0,28 0,02 0,84 100,00

2002 98,95 0,06 0,15 0,06 0,77 100,00

2005 99,24 0,12 0,19 0,29 0,15 100,00

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados. - *Trabalhador urbano vinculado a empregador pessoa jurídica por contrato de trabalho regido pela CLT, por prazo indeterminado. - **Trabalhador urbano vinculado a empregador pessoa física por contrato de trabalho regido pela CLT, por prazo indeterminado. - ***Trabalhador rural vinculado a empregador pessoa jurídica por contrato de trabalho regido pela Lei n. 5.889/73, por prazo indeterminado. - ****Trabalhador rural vinculado a empregador pessoa física por contrato de trabalho regido pela Lei n. 5.889/73, por prazo indeterminado.

Outro traço dos empregos gerados neste setor é o baixo nível dos salários. A distribuição dos empregados por faixas de salário mínimo permite verificar a concentração de remunerações até 2 salários mínimos (Tabelas 17 e 18). Nas atividades de criação, apenas 5% dos trabalhadores ganhavam até 1 salário mínimo, em 2005 (salário registrado na carteira de trabalho); a participação dos que ganhavam entre 1,01 e 2 salários mínimos correspondia a 67% do total; ao passo que as faixas acima de 5 salários mínimos tinham uma participação muito pequena (3%). No caso da atividade de abate, a distribuição salarial mostra uma situação um pouco melhor: apenas 1% dos empregados dos abatedouros ganhavam até 1 salário mínimo; 52% recebiam entre 1,01 e 2 salários mínimos; 33% estavam na faixa entre 2,01 e 3 salários mínimos; e 4,5% recebiam acima de 5 salários mínimos, em 2005. A variação na distribuição salarial durante o período reflete, em parte, a oscilação no poder de compra do salário mínimo nominal – entre dezembro de 1996 e dezembro de 1999, em valores corrigidos pelo INPC, o salário mínimo real se elevou muito pouco (4,8%), mas entre dezembro de 1999 e dezembro de 2005, a valorização foi de 35,6%. Nas atividades de criação, a mudança perceptível ocorreu após 1999, quando se elevou a participação dos empregados entre 1,01 e 2 salários mínimos e diminuiu o peso das faixas imediatamente superiores. Na atividade de abate, a variação foi ainda maior: empregados que recebiam no máximo 2 salários mínimos representavam apenas 12% do total, em 1996, passando para 19% em 1999, alcançando 45% em 2002 e atingindo a participação correspondente a 53% do total, em 2005. Por outro lado, a participação dos empregados que recebiam entre 2,01 e 4 salários mínimos se reduziu de 67% em 1996 para 40% em 2005. É possível que tenha havido uma ação dos abatedouros no sentido de pagar salários mais baixos aos novos contratados. Em relação à jornada de trabalho, devemos esclarecer que tanto nas atividades de criação quando no abate a situação não se alterou durante o período analisado: praticamente 99% dos empregados com registro em carteira têm jornada de trabalho contratual de 44 horas semanais. Ou seja, variações na distribuição por faixas salariais não são explicadas por redução ou elevação da jornada de trabalho. Quando olhamos para o tempo médio do vínculo de emprego, observamos que houve variações relevantes. Os dados da RAIS demonstram que 27% dos trabalhadores

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

registrados dos abatedouros tinham menos de 12 meses no estabelecimento em 1996, proporção que aumentou significativamente no período, alcançando 38% em 2002 e ficando em 36% em 2005; por sua vez, a participação dos empregados na faixa entre um ano e menos de três anos no estabelecimento reduziu, entre 1996 e 1999, de 36% para 25,5% e depois aumentou para 30% em 2002; por fim, o peso dos empregados na faixa de três anos ou mais aumentou de 37,5% para 43% entre 1996 e 1999, depois reduziu para 32% em 2002, ficando em 34% em 2005 (Tabela 20). Sem dúvida, a expansão do emprego, na década atual, teve efeitos sobre esta distribuição. Mas, a redução expressiva na proporção dos que permanecem mais de três anos no emprego, no segmento de abate de aves, também parece confirmar as declarações de que a intensificação no ritmo de trabalho aumentou o desgaste dos trabalhadores e fez crescer a rotatividade no emprego. TABELA 17 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS SEGUNDO FAIXA SALARIAL Até 0,5 salário mínimo De 0,51 a 1,00 salário mínimo De 1,01 a 1,50 salários mínimos De 1,51 a 2,00 salários mínimos De 2,01 a 3,00 salários mínimos De 3,01 a 4,00 salários mínimos De 4,01 a 5,00 salários mínimos De 5,01 a 7,00 salários mínimos De 7,01 a 10,00 salários mínimos De 10,01 a 15,00 salários mínimos De 15,01 a 20,00 salários mínimos Mais de 20,00 salários mínimos Ignorado Total

1996 0,1 6,4 30,0 19,2 23,7 9,7 3,9 3,3 1,7 0,9 0,3 0,5 0,4 100

1999 0,0 5,9 29,7 20,7 25,8 8,3 3,4 2,8 1,6 0,8 0,3 0,5 0,2 100

2002 0,1 6,4 37,7 24,6 20,2 5,0 2,2 1,7 1,1 0,6 0,2 0,2 0,1 100

2005 0,1 5,2 41,6 25,8 17,4 4,6 1,7 1,5 0,9 0,4 0,1 0,1 0,5 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

TABELA 18 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES SEGUNDO FAIXA SALARIAL Até 0,5 salário mínimo De 0,51 a 1,00 salário mínimo De 1,01 a 1,50 salários mínimos De 1,51 a 2,00 salários mínimos De 2,01 a 3,00 salários mínimos De 3,01 a 4,00 salários mínimos De 4,01 a 5,00 salários mínimos De 5,01 a 7,00 salários mínimos De 7,01 a 10,00 salários mínimos De 10,01 a 15,00 salários mínimos De 15,01 a 20,00 salários mínimos Mais de 20,00 salários mínimos Ignorado Total

1996 0,0 0,9 3,9 7,1 38,4 28,3 8,3 5,9 3,3 1,8 1,0 0,7 0,3 100

1999 0,0 0,9 5,7 12,4 50,0 16,6 4,9 4,0 2,4 1,5 0,6 0,5 0,4 100

2002 0,1 1,0 9,8 33,8 38,1 8,2 2,9 2,6 1,6 0,9 0,3 0,4 0,2 100

2005 0,1 0,9 14,2 37,7 33,3 6,4 2,4 2,1 1,3 0,7 0,2 0,2 0,6 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

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Educação Integral dos Trabalhadores

TABELA 19 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS SEGUNDO TEMPO DE VÍNCULO NO EMPREGO Ate 2,9 meses De 3,0 a 5,9 meses De 6,0 a 11,9 meses De 12,0 a 23,9 meses De 24,0 a 35,9 meses De 36,0 a 59,9 meses De 60,0 a 119,9 meses 120 meses ou mais Ignorado Total

1996 9,3 8,6 15,0 22,4 12,3 12,8 14,6 4,9 0,0 100

1999 7,5 8,0 14,3 18,4 13,5 15,9 15,5 6,8 0,0 100

2002 8,5 7,9 15,5 20,7 12,2 12,8 15,9 6,6 0,0 100

2005 10,5 9,7 16,8 19,3 10,3 13,4 12,8 7,2 0,0 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

TABELA 20 - DISTRIBUIÇÃO DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES SEGUNDO TEMPO DE VINCULO NO EMPREGO Ate 2,9 meses De 3,0 a 5,9 meses De 6,0 a 11,9 meses De 12,0 a 23,9 meses De 24,0 a 35,9 meses De 36,0 a 59,9 meses De 60,0 a 119,9 meses 120 meses ou mais Ignorado Total

1996 8,2 6,8 12,0 24,2 11,5 11,4 17,9 8,2 0,0 100

1999 9,2 7,9 14,3 14,8 10,7 17,7 16,0 9,4 0,0 100

2002 17,1 7,3 13,6 18,7 11,6 10,4 13,5 7,9 0,0 100

2005 11,6 9,2 15,1 19,4 10,9 13,4 11,7 8,7 0,0 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Nas atividades de criação, também ocorreram variações relevantes na distribuição dos empregados de acordo com o tempo de vínculo junto ao estabelecimento. Em 1996, havia uma distribuição equilibrada: um terço tinha menos de um ano no emprego, outro terço tinha entre um ano e menos de três anos, e outro terço tinha três anos ou mais. Entre 1999 e 2005, a variação foi expressiva: os empregados com menos de um ano tiveram sua participação aumentada de 30% para 37%, ao passo que o peso dos empregados da faixa de três anos ou mais se reduziu de 38% para 33% (Tabela 19). Características pessoais dos empregados no setor De acordo com a RAIS, nas atividades de criação (aves ou suínos), os homens ocupavam pouco menos de 80% dos postos de trabalho, em todos os anos selecionados, ao passo que as mulheres representavam apenas um quinto do total (Tabela 21). Por sua vez, a distribuição dos empregados por gênero tinha um perfil bastante distinto quando observamos o abate de aves: neste caso, em 1996 as mulheres já ocupavam 33% das vagas e em 2005 passaram a ocupar 40% dos postos de trabalho com registro em carteira nos abatedouros (Tabela 22).

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

TABELA 21 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL SEJA CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS SEGUNDO GÊNERO 1996 78,9 21,1 100

Masculino Feminino Total

1999 79,6 20,4 100

2002 79,7 20,3 100

2005 77,9 22,1 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

TABELA 22 - OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES SEGUNDO GÊNERO 1996 66,8 33,2 100

Masculino Feminino Total

1999 68,2 31,8 100

2002 66,2 33,8 100

2005 59,7 40,3 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

No que diz respeito às faixas de escolaridade, foi possível notar que no setor como um todo houve uma progressiva e significativa melhoria na distribuição dos empregados de acordo com o grau de instrução. Nas atividades de criação, houve forte queda na participação dos trabalhadores sem instrução ou que tinham até a 4ª série completa (de 59,5% para 35% entre 1996 e 2005), enquanto a proporção dos que tinham completado pelo menos o Ensino Fundamental ou conseguiram concluir o Ensino Médio cresceu de forma expressiva (de 17% para 40%), conforme indica a Tabela 23. E a proporção dos que freqüentaram o ensino superior continua muito baixa. TABELA 23 - FAIXAS DE ESCOLARIDADE DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS Analfabeto 4ª série incompleta 4ª série completa 8ª série incompleta 8ª série completa 2º grau incompleto 2º grau completo Superior incompleto Superior completo Ignorado Total

1996 5,7 23,5 31,3 19,3 8,7 3,5 5,0 0,8 1,5 0,7 100

1999 4,5 20,2 27,3 22,2 11,0 5,1 7,1 0,9 1,7 0,1 100

2002 3,3 17,0 22,9 22,0 14,8 7,7 10,0 0,9 1,5 0,0 100

2005 2,2 13,0 19,8 22,0 18,0 9,0 13,1 1,1 1,7 0,0 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Nos abatedouros, uma queda significativa deu-se entre os que não tinham estudado ou que não tinham concluído ao menos a 4ª série (de 45% em 1996 para 21,5% em 2005), tendo sido observado crescimento na participação dos que tinham pelo menos o primeiro grau completo ou tinham concluído o Ensino Médio (de 24% para 55%). A proporção dos que freqüentaram o ensino superior era um pouco maior, mas a elevação aqui foi pouco expressiva (de 3% para 4%) – Tabela 24. Chama atenção, em especial, a maior proporção de empregados com o 2º grau

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Educação Integral dos Trabalhadores

completo: nas atividades de criação, apenas 5% dos trabalhadores tinham concluído o Ensino Médio, em 1996, tendo aumentado para 13% em 2005; na atividade de abate de aves, em 1996, apenas 6,5% dos empregados tinham 2º grau completo, aumentando para 23% em 2005. Sem dúvida, a elevação dos níveis de escolaridade dos ocupados no setor pode facilitar a obtenção de ganhos de produtividade e contribuir para um melhor desempenho econômico do setor, mas a melhoria da escolaridade não foi acompanhada de elevação dos salários. Ou seja, a maior parte dos empregos existentes nas granjas e abatedouros não requer trabalhadores com maior grau de instrução. TABELA 24 - FAIXAS DE ESCOLARIDADE DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES Analfabeto 4ª série incompleta 4ª série completa 8ª série incompleta 8ª série completa 2º grau incompleto 2º grau completo Superior incompleto Superior completo Ignorado Total

1996 2,4 13,0 29,6 28,1 10,9 6,5 6,4 1,2 1,9 0,0 100

1999 1,6 8,0 21,2 27,7 14,8 10,7 12,7 1,4 1,9 0,0 100

2002 0,7 5,7 15,2 25,7 18,9 12,3 18,0 1,6 1,9 0,0 100

2005 0,4 4,5 12,1 23,7 18,6 13,1 23,3 2,0 2,3 0,0 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Em relação à distribuição etária da mão-de-obra, não houve mudanças expressivas no período. Contudo, é importante destacar que foi reduzida a utilização de trabalhadores menores de 17 anos, tanto nas atividades de criação como na de abate (Tabelas 25 e 26). Note-se que nos estabelecimentos de criação de frangos e de suínos o emprego de adolescentes tinha uma freqüência maior do que nos abatedouros; e que é também na criação que se percebia uma proporção maior de trabalhadores com idade entre 50 e 64 anos. Por outro lado, chama atenção a proporção de empregados com menos de 25 anos nas atividades de abate; de fato, cresceu o peso dos que estavam na faixa de idade entre 18 e 24 anos (de 31% para 35%, entre 1996 e 2005). E note-se que a proporção de empregados adultos com menos de 30 anos de idade alcançava 44% do total nas atividades de criação e 57% nos abatedouros. TABELA 25 - FAIXAS ETÁRIAS DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES OU SUÍNOS Ate 17 anos 18 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 64 anos 65 ou mais Ignorado Total Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

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1996 6,4 26,1 17,8 27,3 14,6 7,2 0,4 0,2 100

1999 3,5 26,3 18,4 28,5 15,7 7,1 0,4 0,0 100

2002 2,0 26,3 18,9 29,0 16,4 7,1 0,4 0,0 100

2005 1,9 25,2 18,6 29,2 17,5 7,3 0,3 0,0 100


Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

TABELA 26 - FAIXAS ETÁRIAS DOS OCUPADOS EM ESTABELECIMENTOS EM QUE A ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES 1996 1,7 30,8 22,2 29,9 11,7 3,5 0,1 0,0 100

Ate 17 anos 18 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 64 anos 65 ou mais Ignorado Total

1999 0,7 33,6 22,2 29,6 11,0 2,8 0,1 0,0 100

2002 0,4 34,5 21,8 28,9 11,6 2,7 0,1 0,0 100

2005 0,3 35,2 22,0 27,4 12,4 2,6 0,0 0,0 100

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Principais ocupações no setor Para concluir esta seção, falta identificar quais as principais atividades exercidas pelos trabalhadores deste setor de atividade econômica. Note-se que a distribuição dos empregados de acordo com as principais famílias ocupacionais pode sofrer variações ao longo do tempo em razão da forma de classificação de tais atividades. De qualquer modo, as informações da RAIS permitem mapear algumas tendências gerais nos três segmentos em foco. Observando as Tabelas 27 e 28, podemos perceber que tanto na criação de aves quanto na criação de suínos as principais atividades são desenvolvidas por trabalhadores que não necessitam de ampla qualificação para o exercício destas funções. Na suinocultura, dois terços dos empregados registrados exerciam algum tipo de ocupação agrícola e um terço exercia outro tipo de ocupação (entre as quais aparece citada apenas a de Motorista de Veículo de Carga), em 2005. Por sua vez, na avicultura havia uma proporção um pouco menor de trabalhadores agrícolas, ainda que majoritária (57,5%), e apareciam outras famílias ocupacionais com alguma representatividade (entre as quais se destacavam Magarefes, Motoristas, Escriturários e Alimentadores de Linhas de Produção). Mesmo com o processo de automatização dos criatórios, a melhoria dos níveis de sanidade e o aprimoramento das técnicas de manejo dos animais, a maioria dos trabalhadores que ingressou no setor precisava apenas saber ler e ter um mínimo de conhecimento de matemática básica para exercer as principais tarefas presentes no processo de criação de aves e suínos. TABELA 27 - OCUPAÇÕES MAIS REPRESENTATIVAS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE SUÍNOS Trabalhadores na pecuária de animais de médio porte Trabalhadores agropecuários em geral Trabalhadores na pecuária de animais de grande porte Trabalhadores na avicultura e cunicultura Motoristas de veículos de cargas em geral Outras ocupações Total

1996 41,0 19,5 2,9 1,7 2,7 32,2 100,0

1999 41,6 18,0 2,8 2,2 2,7 32,7 100,0

2002 39,2 18,5 2,1 2,3 2,8 35,1 100,0

2005 38,4 19,5 6,6 2,4 2,3 30,9 100,0

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

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Educação Integral dos Trabalhadores

TABELA 28 - OCUPAÇÕES MAIS REPRESENTATIVAS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É A CRIAÇÃO DE AVES Trabalhadores na avicultura e cunicultura Trabalhadores agropecuários em geral Alimentadores de linhas de produção Motoristas de veículos de cargas em geral Escriturários em geral, agentes, assistentes e aux. adm. Magarefes e afins Outras ocupações Total

1996 51,9 6,3 4,7 4,5 2,6 1,4 28,5 100,0

1999 49,5 6,4 6,0 4,3 3,0 1,9 29,0 100,0

2002 45,4 7,0 7,4 4,0 2,5 2,8 30,9 100,0

2005 50,9 6,5 2,8 3,2 2,7 6,6 27,3 100,0

Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

Hoje, o tamanho médio dos produtores integrados nas regiões tradicionais acaba por exigir um grande esforço no sentido de limitar os custos com pessoal, já que a renda mensal bruta do produtor é bastante modesta. Assim, um mesmo trabalhador desempenha várias funções. Obviamente, nas propriedades de maior porte não há este fator limitador; ao contrário, nestes casos a propriedade é bastante dependente do trabalho assalariado e há uma maior especialização de funções. Caso o processo de aumento na escala da produção continue, é provável que oportunidades de trabalho para empregados com mais qualificação se apresentem com maior freqüência ainda nesta etapa do processo produtivo. Quando observamos a etapa seguinte do processo de produção – o abate – a ocupação predominante é a de Magarefe (Tabela 29). Uma das principais tarefas deste profissional é o corte dos animais. Nas entrevistas realizadas junto a alguns abatedouros, percebermos que inúmeras são as especificidades dos cortes, podendo variar de acordo com as preferências dos compradores – especialmente quando a produção destina-se ao mercado externo – ou mesmo conforme o porte dos animais. É importante considerar que houve um significativo aumento no número de empregados registrados nesta ocupação, entre 2002 e 2005 (de 30,3 mil para 94,5 mil trabalhadores). Ou seja, mais que triplicou o número de empregados que desempenham esta função nos abatedouros de frangos e outras aves, o que sugere uma demanda muito clara de qualificação profissional nesta vertente do mercado de trabalho, em particular nas regiões do país mais dinâmicas no segmento de aves e mesmo de suínos. TABELA 29 - OCUPAÇÕES MAIS REPRESENTATIVAS EM ESTABELECIMENTOS CUJA ATIVIDADE PRINCIPAL É O ABATE DE AVES Magarefes e afins Alimentadores de linhas de produção Escriturários em geral, agentes, assistentes e aux. adm. Trabalhadores na avicultura e cunicultura Trab. na fabricação e conservação de alimentos Técnicos de controle da produção Mecânicos de manutenção de máquinas industriais Operadores de máquinas a vapor e utilidades Almoxarifes e armazenadores Motoristas de veículos de cargas em geral Outras ocupações Total Fonte: MTE – RAIS, anos selecionados

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1996 41,9 10,1 2,7 4,6 12,5 0,6 1,4 1,4 1,7 2,3 20,8 100,0

1999 29,6 9,3 2,2 1,8 15,5 1,0 1,5 20,3 1,4 1,6 15,6 100,0

2002 29,7 13,2 2,3 2,7 15,9 1,0 1,4 16,8 1,4 1,3 14,3 100,0

2005 62,4 12,5 2,7 1,5 1,4 1,3 1,2 1,1 1,1 0,9 14,0 100,0


Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

Além disso, a execução de algumas funções importantes nos abatedouros exige certa qualificação específica. A automatização do processo produtivo acabou por requerer dentro dos frigoríficos a presença de Mecânicos de Manutenção de Máquinas Industriais, de Operadores de Máquinas a Vapor (caldeiraria), de Almoxarifes, de Técnicos de Controle de Produção, dentre outros. Em alguns casos, a realização de cursos específicos de qualificação profissional poderia contribuir para aumentar a produtividade e, talvez, para reduzir a elevada rotatividade nos postos de trabalho.

Conclusão O setor de aves e suínos no Brasil tem passado por um processo de evolução constante, nos últimos anos. A melhoria das técnicas de manejo, o aprimoramento genético, a automatização, o aperfeiçoamento na produção de rações e o cuidado com as condições sanitárias, em conjunto, acabaram por conferir ao setor níveis mais elevados de produtividade e de competitividade, permitindo que o Brasil conquistasse importantes parcelas do mercado externo, tendo se tornado o principal país exportador do segmento avícola.Ao mesmo tempo, o setor foi responsável pela geração direta e indireta de um número expressivo de novos postos de trabalho. Constatou-se, contudo, que o salto de competitividade não se deve somente à evolução técnico-organizacional, uma vez que a automatização e o novo modelo de integração da cadeia produtiva vieram acompanhados também da intensificação do ritmo de trabalho, que implicou em maior precariedade das condições de trabalho e crescimento vertiginoso das doenças laborais. Para examinar melhor o grau de precariedade dos empregos nos diferentes segmentos do setor, a seguir procuramos oferecer um quadro sintético de algumas características mais relevantes (Tabelas 30, 31 e 32), destacando as particularidades encontradas nos principais estados produtores. Na criação de suínos (Tabela 30), o ordenamento dos estados respeita o ranking da produção nacional (Tabela 6). Em relação ao perfil dos empregados, os três estados do Sul não apresentam diferenças muito expressivas entre si. Não obstante, vale a pena mencionar alguns destaques. O salário médio pago aos empregados era maior no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul e menor em Minas Gerais (como referência de comparação, considerese que o salário mínimo em dezembro de 2005 era de R$ 300). A idade média era um pouco maior em São Paulo e um pouco mais baixa no Mato Grosso. A maior participação de mulheres estava em Santa Catarina e a menor em Minas Gerais. Quanto ao grau de instrução, os empregados em estabelecimentos de Mato Grosso são os que apresentavam os melhores indicadores, ao passo em que a pior situação correspondia aos de Minas Gerais. Finalmente, chama atenção a proporção de empregados em estabelecimentos de médio porte no Mato Grosso, enquanto nos demais estados predominavam os estabelecimentos com até 99 empregados. Também na Tabela 31 o ordenamento dos estados respeita o ranking da produção nacional (Tabela 5). Em relação ao perfil dos empregados na criação de aves, verificou-se diferenças expressivas entre os três estados do Sul, assim como entre os três estados do

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Educação Integral dos Trabalhadores

Centro-Oeste e entre os dois do Sudeste. A seguir, mencionamos alguns indicadores que se destacam. As maiores remunerações médias estavam no Mato Grosso e no Rio Grande do Sul e as menores em Goiás e Minas Gerais. A idade média era um pouco maior no Rio Grande do Sul e um pouco mais baixa no Mato Grosso. A maior participação de mulheres estava em Santa Catarina e a menor no Mato Grosso do Sul. Quanto ao grau de instrução, é visível que não se exigia um grau de instrução básico da grande maioria dos empregados e que os mais escolarizados estavam em Mato Grosso, ao passo que a menor porcentagem com Ensino Fundamental completo estava em Minas Gerais. E chama atenção o fato de Santa Catarina apresentar mais da metade dos empregados em estabelecimentos de grande porte (contra um quinto no Paraná), enquanto no Rio Grande do Sul predominavam os estabelecimentos com até 99 empregados. TABELA 30 - INDICADORES DO EMPREGO NA CRIAÇÃO DE SUÍNOS EM 2005 BRASIL E ESTADOS SELECIONADOS Unidade da Federação PR SC RS MG SP GO MS MT BR

Salário Médio R$ 572,81 R$ 577,21 R$ 598,50 R$ 483,23 R$ 628,53 R$ 576,64 R$ 689,35 R$ 719,42 R$ 554,98

Idade Média (anos) 34 34 34 34 35 31 32 29 33

Masc.

sexo % Fem.

84,9 78,8 85,6 92,3 82,3 79,6 86,3 89,1 86,0

15,1 21,2 14,4 7,8 17,7 20,4 13,7 11,0 14,0

8ª Série Compl. 24,3 20,0 21,8 14,5 18,1 33,8 33,7 34,8 20,7

Grau de Inst. % 2º Grau Sup. Compl. Compl. 16,1 14,0 14,0 8,6 9,0 7,5 5,7 21,8 11,7

1,2 1,8 0,7 1,5 3,4 0,8 2,9 2,3 1,6

Até 99

Tam. Estab. % 100 a 1000 999 ou Mais 0,0 3,7 7,7 8,0 6,3 0,0 0,0 59,4 7,4

100,0 96,3 92,3 92,0 93,7 100,0 100,0 40,6 92,6

0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0

Fonte: MTE-RAIS 2005

TABELA 31 - INDICADORES DO EMPREGO NA CRIAÇÃO DE AVES EM 2005 BRASIL E ESTADOS SELECIONADOS Unidade da Federação PR SC RS SP MG GO MS MT BR

Salário Médio R$ 645,67 R$ 658,48 R$ 723,34 R$ 609,81 R$ 528,70 R$ 496,43 R$ 574,11 R$ 753,01 R$ 561,22

Idade Média (anos) 32 31 34 32 33 31 31 29 32

Masc.

sexo % Fem.

74,6 62,1 68,5 70,9 75,7 73,3 84,4 78,2 76,4

25,4 37,9 31,5 29,1 24,3 26,7 15,7 21,8 23,7

8ª Série Compl. 22,7 17,3 17,7 19,7 13,2 18,7 25,2 22,3 17,5

Grau de Inst. % 2º Grau Sup. Compl. Compl. 16,3 17,1 12,9 14,6 8,9 12,1 11,9 25,2 13,4

2,0 2,5 1,7 2,3 1,0 0,9 1,6 5,5 1,7

Até 99

38,3 32,8 88,3 66,8 49,8 47,4 83,7 47,6 55,8

Tam. Estab. % 100 a 1000 999 ou Mais 42,4 15,9 11,7 33,2 50,2 52,6 16,3 52,4 36,3

19,3 51,3 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 7,9

Fonte: MTE-RAIS 2005

No caso do perfil dos empregados em estabelecimentos de abate de aves (Tabela 32), também é possível perceber diferenças significativas entre os estados selecionados. Os maiores salários médios estavam no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, ao passo que Minas

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TABELA 32 - INDICADORES DO EMPREGO NO ABATE DE AVES EM 2005 BRASIL E ESTADOS SELECIONADOS Unidade da Federação PR SC RS SP MG GO MS MT BR

Salário Médio R$ 662,31 R$ 757,95 R$ 800,96 R$ 733,94 R$ 553,53 R$ 660,14 R$ 648,37 R$ 659,35 R$ 697,64

Idade Média (anos) 30 29 31 30 30 27 28 28 30

Masc.

sexo % Fem.

60,5 52,1 51,1 65,4 67,7 70,5 61,9 69,1 59,7

39,5 47,9 48,9 34,6 32,3 29,5 38,1 30,9 40,4

8ª Série Compl. 17,2 22,2 17,8 21,2 14,4 17,5 13,2 20,6 18,6

Grau de Inst. % 2º Grau Sup. Compl. Compl. 27,8 25,6 17,5 20,4 20,8 26,3 19,6 26,9 23,3

2,6 3,2 2,1 1,9 1,3 1,4 2,2 2,3 2,3

Até 99

1,6 2,7 4,1 7,6 10,6 3,8 2,8 1,4 4,8

Tam. Estab. % 100 a 1000 999 ou Mais 20,9 11,3 31,5 69,8 50,1 17,1 27,8 48,3 30,8

77,5 86,0 64,4 22,6 39,3 79,1 69,4 50,3 64,4

Fonte: MTE-RAIS 2005

Gerais mais uma vez se estacava negativamente. Nos abatedouros a idade média era um pouco menor do que nas atividades de criação, sendo um pouco mais elevada no Rio Grande do Sul e um pouco mais baixa em Goiás. Em relação ao peso das mulheres na distribuição, o destaque ficou por conta de Rio Grande do Sul e Santa Catarina, onde praticamente metade dos empregados era do sexo feminino. Por sua vez, é importante observar que uma grande parcela dos empregados não possuía sequer o Ensino Fundamental completo mesmo nos estados onde este segmento era melhor estruturado – informação importante para o planejamento de cursos de qualificação profissional que venham a ser oferecidos nestas regiões. Por fim, chama atenção a proporção de empregados registrados que se concentravam em estabelecimentos de grande porte no segmento de abate de aves, em especial em Santa Catarina, Goiás e no Paraná, ao passo que é muito pequena a participação dos estabelecimentos com até 99 empregados, mesmo em Minas Gerais. Quanto à demanda de mão-de-obra, as projeções apontam na direção de uma continuidade na geração de empregos, em particular nos abatedouros. De acordo com o estudo Projeções do Agronegócio, elaborado pela assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o setor de carnes deve apresentar alto dinamismo no próximo decênio, embora crescendo apoiado em taxas médias mais modestas. O estudo do Ministério prevê que a produção de carnes de suínos deverá crescer a uma taxa de 2,1% ao ano entre 2006 e 2016; e que a produção de carne de frango crescerá no mesmo período a uma taxa de 4,1% ao ano. No caso do frango, a previsão é que as exportações cresçam a uma taxa de 2,6% a.a., enquanto em relação às carnes de suínos o Ministério prevê que as exportações crescerão, em média, 2% ao ano. Como qualquer projeção, o Ministério considera que este desempenho dependerá da conjugação de uma série de fatores. Dentre as principais incertezas atuais que podem afetar o desempenho projetado para o agronegócio estão: o crescimento econômico abaixo do esperado; medidas protecionistas dos países desenvolvidos; a falta de investimento em infra-estrutura no país e atrasos na introdução de inovações tecnológicas.123 Portanto, pode-se considerar que a ocupação nas duas atividades continuará a crescer positivamente nos próximos anos. Mas, é preciso avaliar a qualidade dos empregos que serão gerados.

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Educação Integral dos Trabalhadores

É oportuno lembrar que, em muitos casos, os abatedouros têm precisado buscar trabalhadores em cidades circunvizinhas, já que o elevado número de doenças ocupacionais tem muitas vezes afugentado trabalhadores do setor. Por outro lado, observou-se, ainda, que o aumento na escala da produção é uma tendência não apenas nos abatedouros, uma vez que atinge também as propriedades de engorda de animais. Buscamos destacar que a persistência deste movimento pode resultar num maior número de trabalhadores empregados formalmente, mas que sua contrapartida pode ser a diminuição do número de ocupados no setor, isto porque muitos agricultores familiares que hoje auferem sua renda por intermédio da criação de aves ou suínos acabariam sendo expulsos deste mercado. Ao examinar as principais atividades desenvolvidas pelos ocupados no setor, pudemos perceber que a demanda por qualificação de trabalhadores é baixa no processo de criação (mas, há carência de profissionais altamente qualificados em certas ocupações). No processo de abate, buscamos destacar quais seriam as qualificações necessárias aos trabalhadores que desenvolvem as principais atividades do abatedouro. Embora seja difícil treinar o Magarefe para o exercício da função fora do processo de produção, é importante destacar que ele, assim como todos os trabalhadores do setor, devem receber instruções sobre questões sanitárias, sendo recomendável a realização de cursos sobre Boas Práticas de Fabricação (os quais poderiam ser ministrados aos trabalhadores do setor e a possíveis candidatos). Vale notar ainda, que cursos deste tipo poderiam ser úteis não apenas aos trabalhadores dos segmentos de aves e suínos, mas para vários segmentos da agroindústria. Também é oportuno ressaltar que há neste amplo setor de atividade uma grande parcela de trabalhadores por conta própria e de trabalhadores sem remuneração. Se somarmos a estas duas categorias os trabalhadores sem carteira, teremos um conjunto 3,5 vezes superior ao dos trabalhadores com carteira. No Brasil, este dado assume grande relevância quando consideramos que a estrutura de proteção social existente é em grande medida vinculada à inserção do indivíduo no mercado de trabalho formal – ou seja, ao registro em carteira. Quando o trabalhador permanece na informalidade, não tem acesso a programas de proteção social como o seguro-desemprego e o auxílio-doença, assim como fica desprotegido quando ocorrem acidentes de trabalho ou mesmo quando precisa se aposentar precocemente. Por isso, além da necessidade de conscientizar melhor os trabalhadores com relação à gravidade de algumas doenças ocupacionais no País, em particular a LER/DORT, é preciso alertá-los quanto à importância de ter o contrato de trabalho registrado em carteira e fazer valer os seus direitos. Finalmente, o mais importante, é preciso conscientizar os trabalhadores deste setor de atividade, em especial nas regiões mais dinâmicas, de que é possível obter melhores condições de trabalho e remuneração por meio de canais legítimos de negociação coletiva. E é preciso demandar do Estado, em particular do Governo Federal e dos governos estaduais, ações efetivas no campo das políticas públicas de emprego, voltadas tanto para a geração de novos postos de trabalho como para a melhoria das condições de trabalho. Neste sentido, o maior desafio dos programas públicos de qualificação profissional é abranger ações que ajudem a transformar para melhor a realidade dos trabalhadores beneficiados por tais programas. 123

É possível, de acordo com a opinião de especialistas, que a suinocultura receba grande impulso, a partir de 2009, quando está prevista a interdição da criação de suínos na União Européia, em razão de problemas ambientais. Assim, a demanda de carne de suínos e derivados para exportação deve aumentar bastante e o crescimento do segmento pode ser bem maior do que as previsões iniciais fazem crer.

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

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Educação Integral dos Trabalhadores

Educação Profissional no Setor Agropecuário: Aves e Suínos • Sebastião Lopes Neto • Alexandre Custódio Pinto

O

setor econômico de produção de aves e suínos está inserido na área agropecuária, considerando-se, inclusive a agroindústria e também a produção familiar. Por se tratar de setor vasto e de grande diversidade entre regiões, selecionamos para análise preliminar as seguintes instituições de Educação Profissional Técnica de Nível Médio: Escola Família Agrícola de Caculé / BA; Escola Agrotécnica Federal de Ceres / MT; Cetevel Centro Educacional Cascavel Ltda / PR.; Escola de Trabalho e Produção de Itaituba / PA. A Escola Família Agrícola de Caculé está localizada em Caculé, BA, entidade privada filantrópica, ministra a Habilitação Profissional de Nível Técnico em Agropecuária, a Qualificação Profissional de Nível Técnico em Produção Vegetal e a Qualificação Profissional de Nível Técnico em Produção Animal. O curso destina-se a jovens do meio rural, de 14 a 28 anos, filhos de agricultores e diaristas da região que tenham concluído o Ensino Fundamental, pois o curso é integrado ao Ensino Médio. As cargas horárias são as seguintes: CARGA HORÁRIA DAS HABILITAÇÕES E QUALIFICAÇÕES 1. Habilitação : Carga Horária: Estágio 1.1 Qualificação : Carga Horária: 1.2 Qualificação : Carga Horária:

Habilitação Profissional de Nível Técnico em Agropecuária 1200 horas 108 horas (Carga horária do estágio) Qualificação Profissional de Nível Técnico em Produção Vegetal 240 horas Qualificação Profissional de Nível Técnico em Produção Animal 240 horas

Tem como característica possibilitar o estudo sem que os educandos necessitem deixar a família e o mundo do trabalho do qual já participam. Tem por objetivo a “preparação básica e a cidadania do educando, (...) a formação ética, o desenvolvimento da autonomia, a compreensão dos fundamentos científicos - tecnológicos dos processos produtivos.” De acordo com o Decreto 2208/97, objetiva desenvolver as competências para o mundo do trabalho, descrita de modo genérico como “propiciar a formação de profissionais, aptos a exercerem atividades específicas no trabalho com escolaridade correspondente ao nível médio”, sem o apontamento de competências limitadas e operacionais, mas com a preocupação de resgatar a escolaridade do jovem agricultor, promovendo o saber científico e tecnológico. O perfil do profissional concluinte, até mesmo porque o curso está integrado ao Ensino Médio, não se limita a buscar competências para o trabalho, antes visa desenvolver os:

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

... conhecimentos das formas contemporâneas de linguagens; domínio dos conhecimentos de filosofia e de sociologia necessários ao exercício da cidadania; capacidade de contribuir para a preservação e respeito da cultura camponesa; responsabilidade para com o desenvolvimento sustentável e solidário; amor à terra, às plantas e aos animais; domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna; conhecimento sobre a conjuntura social, política, econômica, e cultural do meio rural.

O plano de curso apresenta a intencionalidade de propiciar práticas de ensino-aprendizagem para o exercício da cidadania plena, uma “sólida formação ética e humanística”, cientes da necessidade de uma agricultura sustentável como meio indispensável para a rentabilidade agropecuária, com conhecimento técnico e versátil para lidar com os problemas produtivos da área, entre outras. Sem, contudo, esquecer de desenvolver competências e habilidades e atitudes práticas com conhecimento e respeito pela cadeia produtiva. O plano de curso descreve um curso com duração de quatro anos, seguindo a “Pedagogia da Alternância”com metodologia da ação-reflexão-ação pensada para manter o aluno no curso sem desvinculá-lo do ambiente familiar e da produção, visto que lhe é essencial para sobrevivência, “respeitando a necessidade que as famílias de produtores e trabalhadores rurais sentem do trabalho do jovem em casa, por não afastá-los do seu meio e por acreditar que a escola deva valorizar a experiência do dia-dia e do trabalho e da família”. O plano não descreve módulos ou etapas, nem o conteúdo a ser desenvolvido em cada um. Não apresenta descrição de qualquer acervo bibliográfico. O corpo docente é “formado por profissionais graduados sendo (um biólogo, um historiador, uma geógrafa, uma licenciada em letras). A EFA contará ainda com o apoio de um veterinário, um agrônomo, um técnico e um professor de inglês”. O plano apenas cita a divisão por sessões, mas é difícil a compreensão quanto à operacionalidade das mesmas, pois apenas subscreve que o “ano letivo é dividido em 10 sessões assim distribuídas: 1º quadrimestre (1ª, 2ª, 3ª e 4ª) sessões; 2º trimestre (5ª, 6ª e 7ª) sessões; 3º trimestre (8ª, 9ª e 10ª) sessões. Reserva-se a 11ª sessão para recuperação final.” A Escola Agrotécnica Federal de Ceres está localizada na região de Ceres, MT, constituindo região com produção agrícola intensa. Ministra a habilitação de Técnico em Zootecnia, a qualificação em Avicultura, a qualificação em Suinocultura, a qualificação em Criação Alternativa, a qualificação em Aqüicultura, e a qualificação em Bovinocultura. O curso técnico destina-se aos egressos concluintes do Ensino Médio. As cargas horárias são as seguintes: CARGAS HORÁRIAS DAS HABILITAÇÕES E QUALIFICAÇÕES 1. Habilitação: Área: Carga Horária: Estágio: 2. Qualificação 1: Área: Carga Horária: 3. Qualificação 2: Área: Carga Horária: 4. Qualificação 3: Área: Carga Horária:

Técnico em Zootecnia Agropecuária 1.200 horas 160 horas Qualificado em Avicultura Agropecuária 240 horas Qualificado em Suinocultura Agropecuária 240 horas Qualificado em Criação Alternativas Agropecuária 240 horas

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Educação Integral dos Trabalhadores 5. Qualificação 4: Área: Carga Horária: 6. Qualificação 5: Área: Carga Horária:

Qualificado em Aqüicultura Agropecuária 240 horas Qualificado em Bovinocultura Agropecuária 240 horas

Assim como os outros setores econômicos abordados anteriormente, o plano de curso apresenta uma vinculação ao desenvolvimento de competências e habilidades operacionais para o ambiente produtivo, em cujo escopo está a formação de supervisores técnicos para grande produção agropecuária. Evidenciado no conceito utilizado para avaliação: “CNC – Competência Não Construída; CEC – Competência em construção; CC – Competência Construída.” Os módulos curriculares são enquadrados em esferas técnicas e produtivas e as descrições quanto ao que será desenvolvido em cada um deles se limita a detalhar as competências, habilidades e bases tecnológicas. Não há um único módulo sobre temática nãotécnica ou humanística. O acervo bibliográfico é estritamente técnico e conta com apenas um exemplar em sua grande maioria. O corpo docente apresenta formação técnica-acadêmica com especialização ligada à área de produção correspondente. É necessário perguntar por que um curso de Educação Profissional Técnica de Nível Médio que está dentro de uma perspectiva da produção animal intensiva, direcionada a jovens egressos do Ensino Médio não traz em seu acervo bibliográfico uma obra literária como, por exemplo, A santa Joana dos matadouros de Bertolt Brecht? Entre diversas outras que poderiam ser estudadas na direção do educando se inteirar das diversas contradições presentes no cotidiano produtivo que irá vivenciar depois de formado. O Cetevel Centro Educacional Cascavel Ltda. está localizado em Cascavel, PR, região que concentra grandes empresas de abate de frango, responsável por 38% da produção do Estado. Ministra habilitação de Técnico em Avicultura com carga horária de 1.220 horas e 244 horas de estágio. É destinado a estudantes egressos do Ensino Médio ou que cursem o 3º ano. O curso tem forte articulação com o setor produtivo e a produção industrializada. Direcionada a trabalhar competências e capacitar operacionalmente o estudante a supervisionar a produção em toda a sua amplitude, o curso é dividido em módulos, onde apenas as disciplinas Psicologia Aplicada (carga horária de 40 horas) e Segurança do Trabalho Aplicada (40 horas também) escapam ligeiramente do enfoque da tecnicidade da produção de frango em grande escala. O corpo docente tem formação acadêmica compatível com a disciplina ministrada. O acervo bibliográfico descrito é pequeno e restrito. A Escola de Trabalho e Produção de Itaituba, PA, está localizada em Itaituba, entidade privada que ministra a Habilitação Técnica em Agropecuária, qualificação em Avicultor, Apicultor, Suinocultor e Bovinocultor. O curso é destinado aos egressos do Ensino Médio ou estudantes que estejam cursando a 3ª série. As cargas horárias são as que seguem:

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Setor Econômico da Agropecuária (Aves e Suínos)

CARGA HORÁRIA DA HABILITAÇÃO E QUALIFICAÇÕES Habilitação: Carga Horária Estágio Qualificação: Carga Horária: Estágio: Qualificação: Carga Horária: Estágio: Qualificação: Carga Horária: Estágio: Qualificação: Carga Horária Estágio

Técnico em pecuária 1320 horas 240 horas AVICULTOR 280 horas 60 horas APICULTOR 280 horas 60 horas SUINOCULTOR 280 horas 60 horas BOVINOCULTOR 280 horas 60 horas

O plano de curso segue a mesma linha dos demais analisados, ou seja, é centrado nas competências e habilidades requeridas pela operacionalidade produtiva, sem qualquer interface com as questões humanas que fazem parte do universo da agropecuária. Não há qualquer componente curricular que não se restrinja à produção. O acervo bibliográfico limita-se a livros técnicos. Não há descrição do corpo do docente, apenas informa-se a formação acadêmica requerida para cada disciplina.

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Revisão LUCIANA SERENO Diagramação DLC - EDITORA DE JORNAIS E REVISTAS LTDA Capa NSA COMUNICAÇÃO

Título EDUCAÇÃO INTEGRAL DOS TRABALHADORES Setores Econômicos Químico: Plásticos, Telecomunicações, Construção Civil e Agropecuário: Aves e Suínos

Formato: 23 x 16 Mancha: 20 x 12 Tipologia: Palatino Light, FranklinGothCdlTC Papel: Papel off-set 90g/m2(miolo), cartão supremo 250g/m2(capa) Matriz: Fotolito Digital Tiragem: 3000 1ª edição: Junho/2007


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