CARTA DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO SOBRE AGENDA DE RETORNO ÀS AULAS O Artigo 205 da Constituição Federal do Brasil diz que A educação é direito de todos, dever do Estado e da família, e com ela está em consonância Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) que estabelece, em seu Art. 4º, que é dever do Estado garantir: “I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, [...]; II - universalização do ensino médio gratuito; [...] IV atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade”. A garantia legal da educação fundamental no Brasil nunca previu um cenário pandêmico como o que está em curso no ano de 2020 causado pelo vírus SarsCov-2, no entanto ainda deve ser orientadora do caminho para passarmos pela crise sanitária que se apresenta, mas aliada fundamentalmente ao Artigo 196 da mesma Constituição Federal que garante “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” Nós, profissionais da educação do município de São Paulo somos mais de 70 mil trabalhadoras e trabalhadores comprometidos com a educação escolar de mais de 1 milhão de estudantes matriculados nas 4007 escolas da capital paulista. (Retrato da Rede 2020 - Sinesp). O Censo Escolar precisa ser acrescido de dados sobre milhares de profissionais de higiene e limpeza, preparação de merenda, administração, auxiliares de vida escolar para estudantes com deficiência, estagiárias e estagiários das licenciaturas que compartilham vivências e saberes nas escolas. Com a edição do Decreto 59.283 de 16 de março de 2020, escolas públicas e privadas tiveram suas atividades presenciais suspensas, tendo a prorrogação da situação de emergência no Município de São Paulo, mantido estudantes afastados das salas de aula. Docentes passaram a cumprir sua jornada através de acesso à duas plataformas virtuais, enquanto equipes gestoras, administrativas, auxiliares técnicos educacionais, trabalhadores de limpeza não interromperam atividades presenciais, estando expostos aos riscos iminentes de contaminação. Mesmo com uma quantidade inexpressiva de testes e uma curva ascendente de contágio, por decisões políticas arbitrárias, houve a reabertura de setores de comércio e serviços. O aumento de casos e mortes na semana de 14/06 a 20/06, período próximo a 15 dias após o início da flexibilização da quarentena, coincide com o tempo de incubação do vírus e a queda do isolamento social na cidade. Os epidemiologistas apontam que, para um relaxamento das medidas sanitárias de modo seguro, seria necessária uma queda realmente forte que permanecesse por 15 dias consecutivos, gerando um gráfico descendente de contaminação; situação que até o momento não ocorreu na Cidade e no Estado de São Paulo. Segundo a OMS, para o controle da epidemia, é determinante a realização de testes em massa, no entanto, no caso de países como o Brasil, que não realizam a testagem universal, há necessidade urgente que trabalhadoras e trabalhadores dos setores essenciais e moradores de comunidades sejam prioridades na testagem. Hoje, o sistema de saúde atua sob forte pressão com a possibilidade de falta de anestésicos para intubação de pacientes, quadro que vem se agravando desde a terceira semana de junho. O presidente da Federação das Santas Casas de SP, Edson Rogatti declarou que “Se faltar [insumo de UTI], a gente vai ter que diminuir o atendimento”. Para reduzir o número de contágios a medida mais eficiente adotada em muitos outros países dos cinco continentes foi o “lockdown”, esta medida mais radical se mostrou efetiva para uma queda no número de mortes e garantia de segurança para trabalhadores e consumidores em cenários de reabertura gradual. No caso de São Paulo, a cidade epicentro da epidemia no país, o fechamento total ainda não foi realizado por pressão de setores econômicos e é em meio a esse cenário crítico, e que tende a números cada vez piores, que se aponta uma possibilidade de volta às aulas. Dados evidenciam o risco de retorno às aulas, como por exemplo, um estudo apontou: colocar 20 crianças numa sala de aula implica em 808 contatos cruzados em dois dias. Em países como a França, mesmo com o controle do número de casos, houve a reabertura precipitada das escolas, a partir da qual foi observada a expansão da doença em toda a sociedade. O ambiente com rotatividade de alunos precisa ser constantemente descontaminado o que não é possível com as reduzidas equipes de limpeza que atuam nas escolas. Ou seja, a escola não é um local seguro em meio a expansão da doença, nem para funcionários muito menos para os alunos e suas famílias. De maneira unilateral e autoritária o governo municipal anuncia o calendário e o protocolo de volta às aulas, desconsiderando as entidades representativas dos profissionais da educação que atuarão na linha de frente desse atendimento. Diante da conjuntura de pressão pela reabertura, com ausência de uma renda básica emergencial, impossibilidade do isolamento social, demissão durante a pandemia, receio de desemprego, trabalho informal sem proteção, as pessoas são obrigadas a retornar a seus trabalhos arriscando suas vidas e de seus familiares. Como respaldo para a falsa ideia de normalidade, com o retorno das atividades econômicas, de maneira leviana e cruel a escola é colocada como peça fundamental para cuidado das crianças, mesmo sendo um local com grande potencial de contaminação. Nós, servidoras e servidores públicos da educação de São Paulo, somos solidárias com as famílias da classe trabalhadora, mas entendemos que a necessidade econômica não pode se sobrepor à garantia da vida. Todos os direitos sociais precisam estar garantidos, em qualquer tempo, sobretudo como salvaguarda em tempos de crise sanitária. De todas as omissões diante da pandemia de Covid-19, essa engrenagem, na qual se coloca o retorno às aulas, passa a consolidar o caráter genocida do Estado Brasileiro. PARA RETORNO ÀS AULAS EXIGIMOS
1. Comprovação da queda persistente do número de casos e mortes, para o início dos protocolos de retorno às aulas, com respaldo da comunidade científica. 2. Prorrogação do decreto de afastamento dos profissionais do grupo de risco do trabalho presencial enquanto durar