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Tradução para a língua portuguesa © Fernando Paz, 2025
Posfácio © Ana Paula Cabrera, 2025 Imagens © Alamy, Getty Images e Acervo DarkSide
Diretor Editorial
Christiano Menezes
Diretor de Novos Negócios
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Diretor de Planejamento
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Diretor Comercial
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Editora
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Designer Assistente Jefferson Cortinove
Preparação
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Revisão Maximo Ribera
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Retina Conteúdo
Finalização Roberto Geronimo
Marketing Estratégico Ag. Mandíbula
Impressão e Acabamento Braspor
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (cip)
Leroux, Gaston, 1868-1927
O fantasma da ópera / Gaston Leroux ; tradução de Fernando Paz Rio de Janeiro: DarkSide Books, 2025 336 p : il
ISBN: 978-65-5598-499-6
Título original: Le Fantôme de l'Opéra 1 Ficção francesa I Título II Paz, Fernando
2 5 - 0 9 1 4 C D D 843
o francesa
[2025]
Todos os direitos desta edição reservados à DarkSide® Entretenimento ltda Rua General Roca, 935/504 – Tijuca 20521-071 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil www.darksidebooks.com











Daaé, o desaparecimento do visconde de Chagny e a morte de seu irmão mais velho, o conde Philippe, cujo corpo foi encontrado às margens do lago que fica debaixo da Ópera, do lado da rua Scribe. Mas nenhuma das testemunhas acreditava até então que a figura lendária do Fantasma da Ópera pudesse estar envolvida nessa terrível aventura.
A verdade custou a entrar na minha mente conturbada, numa investigação que a todo momento esbarrava em eventos que, à primeira vista, poderiam ser considerados sobrenaturais. Mais de uma vez estive prestes a abandonar essa tarefa em que me via perseguindo, sem jamais alcançar, uma imagem vã. Finalmente, obtive a prova de que meus pressentimentos não me haviam enganado, e meus esforços foram recompensados no dia em que tive a certeza de que o Fantasma da Ópera fora mais do que uma sombra.
Nesse dia, eu havia passado longas horas na companhia das Memórias de um Diretor , uma obra leve do cético Moncharmin que, durante o período em que esteve na Ópera, nada compreendeu do comportamento sombrio do fantasma, e zombou o quanto pôde, mesmo quando se tornava a primeira vítima de uma curiosa operação financeira que acontecia dentro de um “envelope mágico”.
Desesperado, eu estava saindo da biblioteca quando conheci o simpático administrador da nossa Academia Nacional, que conversava no patamar da escadaria com um velhinho animado e elegante, ao qual me apresentou alegremente. O administrador estava a par das minhas pesquisas e sabia o quanto eu tentara, em vão, descobrir o paradeiro do juiz de instrução do famoso caso Chagny, já aposentado, o sr. Faure.
Ninguém sabia o que tinha sido feito dele, se estava vivo ou morto. E eis que, voltando do Canadá, onde viveu durante 15 anos, sua primeira providência em Paris foi pedir por um assento reservado à administração da Ópera. Aquele velhinho era o próprio sr. Faure.
Passamos boa parte da noite juntos, e ele me contou todo o caso Chagny, do modo como o compreendera no passado. Por falta de provas, foi obrigado a concluir que o visconde enlouquecera e que o irmão mais velho morrera acidentalmente, mas continuava convencido de que um drama terrível tinha se estabelecido entre os dois irmãos, por causa de


Christine Daaé. Não soube me dizer que fim levou Christine ou o visconde. Claro que, quando mencionei o fantasma, ele apenas riu. Também estava a par das estranhas manifestações que pareciam comprovar a existência de um ser excepcional que tinha vindo morar em um dos recantos mais misteriosos da Ópera, e conhecia a história do “envelope”, mas não viu nisso nada que pudesse chamar sua atenção, como magistrado encarregado de investigar o caso Chagny. Ele mal ouviu o depoimento de uma testemunha que se apresentou espontaneamente, afirmando que tivera a oportunidade de conhecer o fantasma. Esse personagem — a testemunha — não era outro senão o homem que toda Paris chamou de “o Persa”, muito conhecido de todos os associados da Ópera. O juiz o havia tomado por um lunático. Imaginem se não fiquei interessadíssimo na história do persa. Quis conhecer, se ainda estivesse em tempo, aquela testemunha, preciosa e original. Com sorte, consegui encontrá-lo em seu pequeno apartamento na rua de Rivoli, de onde não saía desde aquela época, e onde morreria cinco meses depois de minha visita.
A princípio, fiquei desconfiado. Mas quando o persa me contou, com a candura de uma criança, tudo o que pessoalmente sabia sobre o fantasma, e quando me entregou em bom estado as provas de sua existência, e sobretudo a estranha correspondência de Christine Daaé, que esclarecia de um modo deslumbrante seu espantoso destino, eu não podia mais duvidar! Não! Não! O fantasma não era um mito!
Sei que alegaram que toda essa correspondência talvez não fosse autêntica, e que poderia ter sido forjada por um homem cuja imaginação havia bebido dos contos mais sedutores, mas felizmente pude ver a letra de Christine na parte externa do famoso maço de cartas e, em seguida, proceder a um estudo comparativo que pôs um fim em toda a minha hesitação.
Também investiguei o Persa e vi nele um homem honesto, incapaz de inventar uma trama para ludibriar a justiça.
E essa também é a opinião das personalidades mais eminentes envolvidas no caso Chagny, os amigos da família, a quem mostrei todos os documentos e apresentei minhas deduções. Recebi deles o mais nobre incentivo e tomo a liberdade de reproduzir, a esse respeito, algumas linhas a mim dedicadas pelo General D…

“Senhor, não posso senão incentivá-lo a publicar os resultados de suas investigações. Recordo muito bem que, algumas semanas antes do caso do desaparecimento da grande cantora Christine Daaé e do drama que deixou todo o faubourg Saint-Germain de luto, falava-se muito do fantasma no foyer de dança, e creio que o assunto só foi deixado de lado depois de ocorrido esse caso, que preocupou a todos; mas, se for possível — como creio, depois de tê-lo ouvido — explicar o drama pela ação do fantasma, peço que fale mais sobre ele. Por mais misterioso que a princípio possa parecer, é mais justificável do que a história sombria em que gente mal-intencionada desejava ver um duelo mortal entre dois irmãos que se adoraram a vida inteira…
Acredite em mim etc.”
Finalmente, com meu dossiê em mãos, percorri com outros olhos o vasto domínio do Fantasma, o monumento formidável onde instalara seu império, e tudo o que vi, tudo o que descobri, comprovava de um modo admirável os documentos do Persa, até que um achado maravilhoso coroou definitivamente meus trabalhos.
Todos se lembram de que há pouco tempo, ao escavar o porão da Ópera para enterrar as vozes gravadas dos artistas, a picareta dos operários revelou um cadáver. Logo obtive a prova de que era o cadáver do Fantasma da Ópera! E fiz o administrador tocar nele com as próprias mãos, e não me importa que os jornais digam que o que encontraram ali era uma vítima da Comuna.
Os pobres massacrados nos subterrâneos da Ópera durante a Comuna não foram enterrados daquele lado. Vou dizer onde seus esqueletos podem ser encontrados: muito longe daquela imensa cripta onde, durante o Cerco, ficava guardada toda espécie de alimentos. Cheguei a essa pista justamente enquanto procurava os restos do Fantasma da Ópera, que eu não teria encontrado sem o acaso inédito do enterro das vozes!
Mas voltaremos a falar desse cadáver e do que convém fazer dele. O importante agora é encerrar este prefácio fundamental agradecendo aos meus modestos comparsas, como o sr. comissário de polícia Mifroid

(convocado para as investigações iniciais, quando Christine Daaé desapareceu), o antigo secretário Rémy, o antigo administrador Mercier, o antigo professor de canto Gabriel e, particularmente, a baronesa de Castelot-Barbezac, que outrora fora a “pequena Meg” (e que não se envergonha disso), a estrela mais encantadora do nosso admirável corpo de baile, a primeira filha da honrada sra. Giry — antiga funcionária que morreu no camarote do Fantasma — todos foram de grande ajuda para mim, e graças a eles poderei, com o leitor, reviver nos mínimos detalhes aqueles momentos de puro amor e medo. *

* Eu seria ingrato se não agradecesse, a propósito desta história assustadora e verídica, à administração atual da Ópera, que colaborou gentilmente durante todas as minhas investigações, e em particular ao sr. Messager; e também ao muito simpático administrador sr. Gabion e ao gentil arquiteto ligado à conservação do monumento, que me emprestou sem hesitar as obras de Charles Garnier, ainda que estivesse quase certo de que eu não as devolveria. Por fim, resta-me reconhecer publicamente a generosidade do meu amigo e antigo colaborador, o sr. J. L. Croze, que me permitiu consultar sua admirável biblioteca teatral e tomar emprestadas edições únicas que muito estimava. (Exceto quando sinalizado, as notas são do autor.)












Naquela noite, em que os srs. Debienne e Poligny, diretores demissionários da Ópera, ofereciam sua última soirée de gala por ocasião de sua partida, o camarim de Sorelli, um dos principais nomes da dança, foi subitamente invadido por uma meia dúzia de moças do corpo de baile egressas do palco após terem dançado o Polieucto . Precipitaram-se em grande confusão, algumas em risos exagerados e artificiais, outras dando gritos de pavor.
Sorelli, que desejava ficar sozinha por um instante para “repassar” os agradecimentos que dali a pouco deveria proferir no foyer diante dos srs. Debienne e Poligny, irritou-se com a invasão da turba agitada. Voltou-se para as colegas, intrigada com tamanha comoção. Foi a pequena Jammes — de nariz à la Grévin, * olhos de miosótis, faces rosadas, colo de lírio — quem revelou o mistério em três palavras, com a voz trêmula, sufocada de medo:
“É o fantasma!”
E fechou a porta à chave. O camarim de Sorelli era de uma elegância comum e protocolar. O mobiliário se resumia ao indispensável: um espelho de corpo inteiro, um divã, um toucador e alguns armários. Nas paredes, algumas gravuras que pertenciam à mãe, lembrança dos tempos
* Museu de Grévin, museu de cera de Paris, fundado em 1882. (Nota do tradutor, de agora em diante N. T.)



áureos da antiga Ópera da rua Le Peletier. Retratos de Vestris, de Gardel, de Dupont, de Bigottini. Para as jovens do corpo de baile, acostumadas às salas comuns onde passavam o tempo até o toque da campainha cantando, brigando, discutindo com cabeleireiros e camareiras, e tomando tacinhas de cassis, cerveja ou mesmo rum, aquele camarim parecia um verdadeiro palácio.
Sorelli era muito supersticiosa. Ao ouvir a pequena Jammes falar do fantasma, estremeceu e disse:
“Que bobagem!”
Mas, como era a primeira a acreditar em fantasmas em geral e no da Ópera em particular, pediu logo informações.
“Você o viu?”, perguntou.
“Como a estou vendo agora!”, gemeu a pequena Jammes, que, não se aguentando mais sobre as pernas, deixou-se cair em uma cadeira.
E imediatamente a pequena Giry — olhos de ameixa, cabelos de nanquim, tez escura e a pele frágil sobre seus frágeis ossinhos — acrescentou:
“Se era ele, é muito feio!”
“Oh! Sim”, ecoou o coro de bailarinas.
E todas começaram a falar ao mesmo tempo. O fantasma havia surgido como um cavalheiro de fraque preto, irrompendo de repente diante delas no corredor, sem que soubessem de onde viera. A aparição fora tão súbita que ele parecia ter saído da parede.
“Ora!”, disse uma delas, que ainda mantinha um mínimo de sangue-frio. “Vocês veem o fantasma em toda parte.”
E era verdade que, havia alguns meses, não se falava de outra coisa na Ópera senão desse fantasma de fraque preto, que vagava como uma sombra pelos corredores, sem dirigir a palavra a ninguém e sem que ninguém ousasse lhe falar. E, tão logo fosse visto, desaparecia sem deixar rastro, sem que ninguém soubesse por onde nem como. Não fazia ruído ao caminhar, como convinha a um verdadeiro fantasma. No início, riram e zombaram daquela aparição vestida como um janota ou um agente funerário, mas a lenda do fantasma logo tomou proporções colossais entre o corpo de baile. Todas alegavam ter encontrado, de uma forma ou de outra, aquele ser sobrenatural e ter sido vítimas de seus


malefícios. As que mais debochavam eram justamente as que menos se sentiam seguras. Quando não se deixava ver, sua presença se fazia notar por acontecimentos pitorescos ou sinistros pelos quais a superstição quase geral o responsabiliza. Um acidente inesperado? Uma brincadeira cruel entre colegas do corpo de baile? Uma esponja de pó de arroz desaparecida? Tudo era culpa do fantasma, do Fantasma da Ópera!
Afinal, quem o havia visto? Há tantos homens de fraque na Ópera, e nem por isso eram fantasmas. Mas aquele fraque apresentava uma característica especial, diferente de qualquer outro. Ele cobria um esqueleto.
Pelo menos, assim diziam as moças.
E seu rosto, é claro, era uma caveira.
Aquilo tudo era sério? A verdade é que a imagem do esqueleto nascera da descrição feita por Joseph Buquet, maquinista-chefe que de fato o vira. Ele trombou — não se pode dizer “nariz com nariz”, pois o fantasma não tinha um — com o misterioso personagem na pequena escada que, perto da rampa, leva direto ao subterrâneo. Pôde vê-lo brevemente — pois o fantasma fugiu — e guardou daquela visão uma recordação indelével.
Eis o que Joseph Buquet dizia sobre o fantasma a quem se dispunha a ouvi-lo:
“É de prodigiosa magreza e seu fraque preto flutua sobre um corpo esquelético. Seus olhos são tão profundos que é difícil discernir as pupilas imóveis. Vemos apenas dois grandes buracos escuros, como nos crânios dos mortos. Sua pele, esticada sobre os ossos como uma pele de tambor, não é branca, mas de um amarelo desagradável. O nariz é tão pequeno que fica invisível de perfil e a ausência desse nariz é uma visão horrível. Três ou quatro longas mechas castanhas sobre a testa e atrás das orelhas fazem as vezes de cabelo.”
Em vão, Joseph Buquet tentou seguir aquela estranha aparição. O fantasma desapareceu como por encanto, não deixando vestígios de sua passagem.
O maquinista-chefe era um homem sério, organizado, de escassa imaginação e sóbrio. Suas palavras foram ouvidas com espanto e interesse, e logo surgiram outras pessoas garantindo ter visto a mesma aparição trajando fraque preto com rosto de caveira.
Os mais sensatos, ao ouvirem essa história, concluíram em um primeiro momento que Joseph Buquet tinha sido vítima de uma brincadeira de um de seus subordinados. Mas depois houve uma sequência tão curiosa e inexplicável de incidentes, que até os mais céticos começaram a se inquietar.
Um tenente-bombeiro é um sujeito valente! Não teme nada, muito menos o fogo! Pois bem, o tenente-bombeiro em questão,* que havia descido para uma ronda nos subterrâneos e, ao que consta, aventurou-se um pouco mais longe do que de costume, subitamente reapareceu no palco, pálido, estarrecido, trêmulo, com os olhos saltados das órbitas, e quase desmaiou nos braços da nobre mãe da pequena Jammes. E por quê? Porque vira avançar na sua direção, à altura de sua cabeça, mas sem corpo, uma cabeça em chamas! E, repito, um tenente-bombeiro não teme o fogo.
Esse tenente chamava-se Papin.
O corpo de baile ficou consternado. Primeiro, aquela cabeça em chamas não correspondia de modo algum à descrição que Joseph Buquet fizera do fantasma. Questionaram o bombeiro, interrogaram de novo omaquinista-chefe e em seguida as moças ficaram convencidas de que o fantasma tinha diversas cabeças, que trocava ao seu gosto. Naturalmente, logo imaginaram que estavam correndo um grande perigo. Se um tenente-bombeiro não hesitava em desmaiar, o corpo de baile e as ratinhas ** tinham razões bem justificadas para o pavor que as levava a apertarem o passo sempre que atravessavam o trecho escuro de um corredor mal iluminado.
Tanto que, para proteger, na medida do possível, a construção monumental acometida por tão terrível maldição, a própria Sorelli, rodeada por todas as bailarinas e seguida pela jovem trupe de mocinhas de collant

* Ouvi a história, também autêntica, da boca do sr. Pedro Gailhard, antigo diretor da Ópera.
** No original, “rats”, como são conhecidas as aprendizes de balé na Ópera de Paris, desde pelo menos 1840. Também são chamadas de “petits rats”. (N. T.)


— no dia seguinte ao da história do tenente-bombeiro —, pôs sobre a mesa do vestíbulo da portaria, ao lado do pátio da administração, uma ferradura que toda pessoa que entrasse na Ópera, não sendo espectador, deveria tocar, antes de pôr os pés no primeiro degrau da escada, sob pena de tornar-se alvo do poder oculto que havia se apoderado do edifício, do porão ao sótão!
Essa ferradura, assim como toda esta história, aliás — infelizmente! —, não foi inventada por mim, e ainda hoje pode ser vista sobre a mesa do vestíbulo, na frente da portaria, quando se entra na Ópera pelo pátio da administração.
Isso já basta para dar uma ideia do estado de espírito das senhoritas, no dia em que acompanhamos sua entrada no camarim de Sorelli.
“É o fantasma!”, gritou a pequena Jammes.
E a apreensão das bailarinas apenas cresceu. Agora, um angustiante silêncio reinava no camarim. Ouvia-se apenas o ruído das respirações ofegantes. Por fim, correndo com sinais de pavor genuíno para o canto mais afastado da parede, Jammes murmurou esta única palavra:
“Ouçam!”
Parecia de fato que havia algo roçando por trás da porta. Nenhum ruído de passos. Apenas uma seda leve arrastando-se pelas tábuas. Depois, mais nada. Sorelli tentava mostrar-se menos medrosa do que as colegas. Avançou em direção à porta e perguntou com voz neutra:
“Quem está aí?”
Mas ninguém respondeu. Então, sentindo o peso de todos os olhares, que acompanhavam seus menores gestos, fez força para adquirir coragem e disse em voz alta:
“Tem alguém atrás da porta?”
“Oh! Sim! Sim! Com certeza, tem alguém atrás da porta!”, respondeu a ameixinha seca que era Meg Giry, detendo, num gesto heroico, Sorelli pela saia de tule. “Não abra a porta! Por Deus, não abra!”
Mas Sorelli, armada de um punhal que sempre trazia consigo, ousou girar a chave e abrir a porta, enquanto as bailarinas recuavam para o banheiro e Meg Giry suspirava:
“Mamãe! Mamãe!”

Sorelli perscrutou destemida o corredor. Estava vazio. A chama bruxuleante de uma arandela, em sua redoma de vidro, lançava uma luz avermelhada e turva em meio às trevas do corredor sem conseguir dissipá-las, com a bailarina fechando rapidamente a porta com um profundo suspiro.
“Não”, ela disse, “não há ninguém!”
“Mas nós o vimos, sim!”, insistiu Jammes, voltando com passinhos medrosos para perto de Sorelli. “Ele deve estar por aí, rondando. Eu não volto para me vestir sozinha. Devíamos descer agora mesmo para a homenagem no salão e só subirmos todas juntas depois.”
Nisso, a moça tocou com devoção sua pequena figa de coral, contra o mau-olhado. E Sorelli desenhou discretamente, com a ponta rosada da unha do polegar direito, uma cruz de Santo André sobre o anel de madeira que cingia o dedo anular da mão esquerda.
“Sorelli”, escreveu um célebre cronista, “é uma bailarina alta e bela, de rosto grave e voluptuoso e de silhueta flexível como um galho de salgueiro. Dizem dela, comumente, que é ‘uma bela criatura’. Seus cabelos louros, puros como ouro, coroam uma testa aveludada, sob a qual brilham dois olhos de esmeralda. Sua cabeça oscila suavemente, como uma pluma, sobre um pescoço longo, elegante e altivo. Quando dança, há um certo movimento de quadris, indescritível, que percorre todo o seu corpo como um estremecimento de inefável langor. Quando ergue os braços e se inclina para iniciar uma pirueta, revelando o contorno do corpete, a inclinação do corpo acentua a curva dos quadris dessa mulher deslumbrante… dizem que é uma visão capaz de enlouquecer um homem.”
Em matéria de cérebro, parece que não tinha um. Mas ninguém a censurava por isso. Ela disse mais uma vez às jovens dançarinas:
“Meninas, comportem-se! Fantasma? Pode ser que ninguém tenha visto esse tal fantasma!”
“Sim! Sim! Nós vimos! Agora há pouco!”, insistiram as moças. “Era uma caveira e estava de fraque, como na noite em que apareceu para Joseph Buquet!”
“E Gabriel também viu!”, disse Jammes. “Ontem mesmo! Ontem à tarde… em plena luz do dia…”


“Gabriel, o professor de canto?”
“Sim… Ora, você não sabia?”
“E ele estava de fraque, em plena luz do dia?”
“Quem? Gabriel?”
“Não! O fantasma!”
“Claro que estava de fraque!”, afirmou Jammes. “Foi o próprio Gabriel quem me contou… Por isso o reconheceu. O que aconteceu foi o seguinte: Gabriel estava no gabinete do contrarregra quando, de repente, a porta se abriu. Foi o Persa que entrou. Você sabe que o Persa tem ‘mau olhado’.”
“Oh, sim!”, responderam em coro as pequenas dançarinas, que, assim que evocaram a imagem de Persa, fizeram um chifre com o indicador e o dedo mínimo, com o dedo médio e anular dobrados sobre a palma, sob o polegar.
“E Gabriel é supersticioso que só!”, continuou Jammes. “Mas é sempre muito educado e, quando vê o Persa, contenta-se em pôr discretamente a mão no bolso e tocar suas chaves… Pois bem, assim que a porta se abriu e o Persa entrou, Gabriel deu um salto da poltrona onde estava sentado e disparou até a fechadura do armário, para tocar em alguma coisa de ferro! No impulso, rasgou em um prego o seu paletó. No afã de sair de lá às pressas, deu com a cara no gancho de cabide e fez um galo enorme. Dando um passo para trás, arranhou o braço no biombo ao lado do piano. Tentou se apoiar no piano, mas por azar a tampa caiu sobre suas mãos e esmagou os dedos. Saiu disparado do gabinete, trôpego de pavor, e desceu a escada tão desajeitadamente que rolou de costas por todos os degraus do primeiro andar! Eu estava passando bem na hora com mamãe. Nós corremos para levantá-lo. Ele estava todo machucado e com o rosto coberto de sangue, deu até medo. Mas logo começou a sorrir e a exclamar: ‘Graças a Deus, foi por pouco!’. Então indagamos e ele nos contou o que o apavorara tanto. Porque tinha visto, atrás do Persa, o fantasma! O fantasma, com aquela caveira, como descreveu Joseph Buquet.”
Um murmúrio assustado seguiu-se a esse relato, ao término do qual Jammes chegou ofegante, tão depressa havia narrado, como se estivesse
sendo perseguida pelo próprio fantasma. Em seguida, fez-se um silêncio pesado, que a pequena Giry interrompeu a meia voz, enquanto, abalada, Sorelli lixava as unhas.
“Joseph Buquet devia ficar quieto”, disse a ameixinha.
“Por que ele ficaria?”, perguntaram.
“É a opinião da minha mãe…”, respondeu Meg em voz baixa, olhando ao redor como se tivesse medo de ser ouvida por outros, além daqueles que se encontravam no aposento.
“E por que sua mãe pensa assim?”
“Shh! Mamãe diz que o fantasma não gosta de ser perturbado!”
“E por que sua mãe disse isso?”
“Porque… porque… por nada…”
Aquelas reticências prudentes tiveram o dom de provocar a curiosidade das moças, que se reuniram ao redor da pequena Giry e suplicaram que se explicasse. Elas estavam ali, braço a braço, inclinadas em um mesmo movimento de súplica e pavor. Falavam do medo que sentiam, com um prazer agudo que as deixava geladas.
“Eu jurei não falar nada!”, disse Meg, num fôlego só.
Mas elas não deram sossego e prometeram tanto guardar segredo, que Meg, ardendo de vontade de contar o que sabia, começou, com os olhos fixos na porta…
“Então… é por causa do camarote…”
“Que camarote?”
“O camarote do fantasma!”
“O fantasma tem um camarote?” Ao saber que o fantasma tinha um camarote, as bailarinas deram vazão à alegria funesta do seu assombro. Suspiraram baixinho. Disseram:
“Oh! Meu Deus! Conte… conte…”
“Mais baixo!”, ordenou Meg. “É o camarote número cinco, no primeiro andar, vocês sabem, o camarote ao lado do proscênio, do lado esquerdo.”
“Não é possível!”
“Estou dizendo… É minha mãe quem cuida dele… Vocês juram que não vão contar nada?”
“Claro, fale!”



“Bom, é o camarote do fantasma… Faz mais de um mês que ninguém entra lá, tirando o fantasma, claro, e a administração recebeu ordens de nunca mais colocá-lo à disposição…”
“E é verdade que o fantasma vai para lá?”
“Mas é claro…”
“Alguém mais entra nele?”
“Não! O fantasma entra e não há ninguém no seu interior.”
As moças entreolharam-se. Se o fantasma entrava no seu camarote, elas deveriam vê-lo, porque trajava um fraque preto e tinha rosto de caveira. Foi o que explicaram a Meg, mas esta replicou:
“Justamente! Não dá para ver o fantasma! E ele não tem fraque nem caveira! Tudo isso que contaram sobre caveira e cabeça em chamas é tudo história! Não tem nada disso… Só dá para ouvir quando ele está no camarote. Minha mãe nunca o viu, mas ouviu. E minha mãe sabe, porque é ela quem distribui o programa para ele!”
Sorelli teve que intervir:
“Minha pequena Giry, você está zombando de nós.” Então, a pequena Giry começou a chorar.
“Eu devia ter ficado quieta… Se mamãe ficar sabendo! Mas é claro que Joseph Buquet não tinha que se intrometer no que não é da sua conta… isso vai dar azar… Minha mãe disse isso ainda ontem à noite…”
Nesse momento, ouviram passos pesados e apressados no corredor e uma voz ofegante gritar:
“Cécile! Cécile! Você está aí?”
“É a voz da minha mãe!”, disse Jammes. “O que houve?”
Ela abriu a porta. Uma senhora distinta, vestida como um soldado da Pomerânia, irrompeu no camarim e deixou-se cair com um gemido sobre a poltrona. Seus olhos rolavam, agitados, iluminando lugubremente seu rosto cor de tijolo queimado.
“Que desgraça!”, ela disse. “Que desgraça!”
“O quê? O quê?”
“Joseph Buquet… Ele, Joseph Buquet… Joseph Buquet está morto!” O camarim encheu-se de exclamações, de protestos atônitos, de pedidos de explicações assustados…

“Sim… acabaram de encontrá-lo enforcado no terceiro subsolo! Mas, o mais terrível”, prosseguiu ofegante a pobre e distinta dama, “o mais terrível é que os maquinistas que encontraram o corpo dizem que ouviram em volta do cadáver uma espécie de ruído que lembrava um canto fúnebre!”
“É o fantasma!”, deixou escapar, como que sem querer, a pequena Giry, mas logo se recompôs, levando as mãos à boca.
“Não! Não! Eu não disse nada! Eu não disse nada!”
À sua volta, todas as colegas, aterrorizadas, repetiam em voz baixa:
“Com certeza! É o fantasma!”
Sorelli estava pálida.
“Nunca vou poder expressar meus cumprimentos”, ela disse.
A mãe de Jammes deu sua opinião esvaziando uma pequena taça de licor que estava sobre a mesa: devia haver algum fantasma lá embaixo…
A verdade é que nunca souberam muito bem como Joseph Buquet morreu. A investigação, sumária, não deu nenhum resultado, além do suicídio. Em suas Memórias de um Diretor , o sr. Moncharmin, que era um dos dois diretores, sucessor dos srs. Debienne e Poligny, relata assim o incidente do enforcado:
“Um desagradável incidente atrapalhou a festinha que os srs. Debienne e Poligny estavam oferecendo para celebrar sua partida. Eu estava no gabinete da diretoria quando vi Mercier, o administrador, entrar de repente. Ele estava aterrorizado quando me disse que tinham acabado de encontrar, enforcado no terceiro subsolo do teatro, entre um painel e um cenário do Rei de Lahore , o corpo de um maquinista. Eu exclamei: ‘Vamos tirá-lo dali!’. O tempo que levei para voar escada abaixo, junto às coxias, foi o bastante para alguém fazer a corda desaparecer!”
Aí está uma coisa que o sr. Moncharmin vê com naturalidade. Um homem se enforca com uma corda, vamos soltá-lo, e a corda desaparece. Oh! O sr. Moncharmin encontrou uma explicação muito simples. Ouçam:
“Era o momento da dança, bailarinas e aprendizes tinham rapidamente tomado suas precauções contra o mau-olhado.”
Ponto. Imaginem o corpo de baile descendo pelas escadas das coxias e levando embora a corda do enforcado mais rápido do que o tempo que levo para escrever isto. Não pode ser sério. Ao contrário, quando penso

no local exato onde o corpo foi encontrado — no terceiro subsolo do palco —, imagino que poderia haver algum interesse em que a corda desaparecesse depois de cumprida sua missão. Ainda descobriremos se estou errado ou certo quando imagino isso.
A notícia sinistra propagou-se feito um raio na Ópera, onde Joseph Buquet era muito querido. Os camarins ficaram vazios, as jovens bailarinas, reunidas ao redor de Sorelli como ovelhas assustadas em volta de um pastor, seguiram por escadas e corredores mal iluminados na direção do foyer, trotando apressadas com sapatilhas cor-de-rosa.







