Alternativa Energética de Mínimo Impacto à Usina Hidrelétrica de Belo Monte

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Alternativa Energética de Mínimo Impacto à Usina Hidrelétrica de Belo Monte:

avaliação de alternativas* Daniel Jorge Habib ** Este documento propõe a avaliação de alternativas tecnológicas à Usina Hidrelétrica de Belo Monte, de acordo com o disposto na Resolução CONAMA 001/1896, arts. 1º, I, II, III, IV e V; 5º, I, 6º, II; e 9º, II, IV, V, VI e VIII; onde determina os procedimentos para diagnóstico, identificação e avaliação de alternativas tecnológicas de menor impacto ambiental, bem como na Constituição Federal, no artigo 22, onde estabelece o princípio de precaução, e no artigo 225, onde estabelece o princípio de prevenção, corroborado pela Política Nacional de Meio Ambiente, Lei 6.938/81, art. 2º. As concessões de obras para geração de energia elétrica no Brasil seguem a Lei 9.074/95, onde consta: Art. 5º São objeto de concessão, mediante licitação: (...) I - o aproveitamento de potenciais hidráulicos de potência superior a 1.000 kW e a implantação de usinas termelétricas de potência superior a 5.000 kW, destinados a execução de serviço público; (...) Art. 8o O aproveitamento de potenciais hidráulicos, iguais ou inferiores a 1.000 kW, e a implantação de usinas termelétricas de potência igual ou inferior a 5.000 kW, estão dispensadas de concessão, permissão ou autorização, devendo apenas ser comunicados ao poder concedente.

Assim, considerando o estado da arte da geração de energia elétrica a partir de diversas fontes denominadas genericamente de alternativas, este documento pretende trazer à discussão formas diferenciadas de produção da mesma quantidade de energia, a menores custos e impactos ambientais, sociais, culturais, econômicos, políticos e históricos. Para efeito de análise consideraremos uma alternativa à Hidrelétrica de Belo Monte quanto à geração de energia: a termelétrica de fonte solar, chamada de fototermelétrica ou heliotérmica. *

Versão para discussão e avaliação. Este documento tem como objetivo de servir como fundamento para discussão de alternativas tecnológicas à construção de barragens e outras obras de geração energética altamente impactantes. Como é um documento para avaliação e discussão, pede-se não divulgá-lo como um resultado final, pois necessita ser discutido com outros especialistas, organizações e movimentos para avaliação dos dados e discussão das informações nele contidas. Pede-se encarecidamente que todos os prováveis erros e equívocos encontrados de cálculos, dados e conclusões sejam identificados e comunicados para que sejam corrigidos. ** Consultor em agroecologia e tecnologias apropriadas, e ministra cursos e palestras em responsabilidade socioambiental e educação para sustentabilidade. Fez mestrado em agroecologia pela Universidade de Córdoba na Espanha e é doutorando em agroecologia pela mesma Universidade; é filósofo formado pela Universidade Federal do Paraná, e publicitário pela Escola Técnica de Comunicação.


Ao considerar esta alternativa de fonte energética, solar, consideramos o total de emissões de gases após a construção como relativamente nulo, uma vez que não existe queima nem despejo de gases de efeito estufa ou de outros gêneros, diferentemente do que ocorre com combustíveis fósseis ou com a energia de biomassa como carvão vegetal, óleo, lenha e derivados, e do que ocorre com as áreas inundadas de floresta em barragens de hidrelétricas, que liberam enormes quantidades de gases de efeito estufa, como metano e óxido nitroso 1 . Para analisar comparativamente duas fontes diferentes de energia, devemos considerar primeiramente a quantidade total de energia a ser gerada em ambos os casos, e a partir daí considerar os diferentes impactos de todas as alternativas. A Usina Hidrelétrica de Belo Monte está projetada para gerar 11.181 MW (MegaWatt) de potência elétrica. Portanto, consideraremos este valor para efeito de cálculo das duas alternativas. A área inundada da barragem Kararaô é de 440 km2 2 , muitas vezes divulgada como a única barragem, sendo que para controle de vazão prevê-se outra barragem a montante (rio acima), chamada de barragem de Babaquara, com área prevista para inundação de 6.140 3 km2. Assim, somando as duas áreas de inundação, o espelho d’água total é de 6.580 km2, o mesmo que 658.000 hectares ou 6,58 bilhões de metros quadrados. Desta forma, temos uma geração de eletricidade de 11.181 MW, com uma área inundada de 6,58 bilhões de m2. Ou seja, o projeto da Usina Hidrelétrica de Belo Monte propõe a geração de 1 MegaWatt para cada 1.699.240 m2, ou 169,9 hectares inundados. O custo total estimado em projeto pelas empreiteiras que ganharam a licitação no consórcio é de R$ 25,8 bilhões 4 . Considerando porém o ocorrido com diferentes exemplos, em especial a Usina Hidrelétrica de Jirau, que teve uma elevação nos custos de projeto em 50% 5 , o valor de construção de Belo Monte subiria para R$ 38,7 bilhões, o mesmo que 71 milhões de salários mínimos. Assim, temos um custo projetado de R$ 3,46 milhões por MegaWatt, com área inundada de 1.699.240 m2 por MegaWatt. Um custo financeiro significativo, com uma área inundada significativa. Vamos tomar esses dados como referência. A tecnologia fototermelétrica ou heliotérmica é uma fonte de geração de energia elétrica que utiliza a luz do sol (energia luminosa) e a converte em calor. Esse calor, que é uma forma de energia chamada energia térmica, é por sua vez convertido em eletricidade, da mesma forma que em uma usina termelétrica, da seguinte forma: 1- O sol emite luz 2- A luz solar é recebida pelo planeta, em uma quantidade variável de energia dependendo do lugar, cuja unidade é expressa em kwh/m2.dia (quilowatt.hora por metro quadrado em um dia de 24 horas). 3- Essa luz é recebida por espelhos, que a refletem para um tubo onde a luz é convertida em calor. 4- O calor recebido pelo tubo é transferido para um líquido, que por sua vez movimenta uma turbina, assim como nas termelétricas convencionais. 5- A turbina movimenta um gerador de energia elétrica.


Assim, nessa tecnologia o que importa é a quantidade de energia recebida por m2 no local onde é instalada, e a quantidade de energia que se pretende gerar. Tomando como referência o total de energia projetado para a Usina de Belo Monte, que é de 11.181 MW, basta vermos a quantidade de energia recebida em 1m2 na região de Altamira, que é de 4,19 kwh/m2.dia, e fazemos a conta. 4,19kwh/m2.dia significam 4,19kwh/m2 em um dia de 24 horas, correspondente a uma potência de 0,175kw/m2. Os sistemas fototermelétricos atuais contam com uma eficiência média comercial de 24 % 6 , podendo chegar a 31,25% 7 . Uma eficiência de 24% significa que 24% da energia total recebida pelo sol será convertida em energia elétrica. Assim, para uma radiação incidente de 4,19 kwh/m2.dia, a 24% de eficiência, temos uma geração de 1,01 kwh/m2.dia, ou 41,9 W/m2. Isso é correspondente a 41,9 W/m2 = 41,9 MW/km2. Vimos que o projeto da Usina de Belo Monte prevê a inundação de 1.699.240 m2/MW instalado. Comparando com a área necessária para a mesma quantidade de energia, a geração fototermelétrica ou heliotérmica necessitaria de 266,85km2, 4,06% da área total. Entretanto, os projetos de uma fototermelétrica ou heliotérmica são extremamente diferentes: - não há necessidade de barramento, e portanto não há inundações; - não há necessidade de desapropriação de terras; - em lugar de se fazer uma grande usina próxima de uma queda d’água, as plantas de geração podem ser instaladas muito próximas do local onde a energia será utilizada; - não necessitam linhas de transmissão, pois as plantas de geração são instaladas próximas do local onde serão utilizadas; - o tamanho de uma usina fototermelétrica pode ser realmente muito grande ou em escala humana. Desde milhares de hectares até alguns metros quadrados, que podem ser instalados sobre o telhado de uma casa, em um terreno vazio, nas margens de rios, de ferrovias ou rodovias como a transamazônica, sobre edifícios e telhados de indústrias etc; - geram mais empregos localmente na construção, instalação e manutenção; - tem custo de instalação e manutenção significativamente menores: - para manutenção; R$ 54,00/MWh 8 contra R$ 78,00MWh 9 , 30,8% menor, ou seja, R$ 5,29 bilhões ao ano contra R$ 7,64 bilhões, R$ 2,35 bilhões mais barato por ano; - para instalação R$ 2,98/W 10 contra R$ 3,46/W 11 , 14,05% menor, ou seja, R$ 33, 26 bilhões contra R$ 38,7 bilhões, uma economia real de R$ 5,43 bilhões na instalação.


Abaixo um diagrama comparativo dos impactos e custos de Belo Monte e da geração de eletricidade em usinas fototermelétricas ou heliotérmicas. Aspecto considerado Área Inundada km2 Área Inundada hectares Área Inundada m2 Custo Total de Implantação Custo de Implantação por MW Custo de Manutenção por MWh Área ocupada por MW Geração por Área MW/km2

Projeto de Belo Monte 6.580 658.000 6,58 bilhões 38,7 bilhões

Usina Fototermelétrica 266,7 26.685 266.,8 milhões 33,26 bilhões

R$ 3.461.229,00

R$ 2.975.000,00

R$ 78,00

R$ 54,00

58,85 hectares

2,39 hectares

1,69

41,9

Diferença 4,06%, ou 24,7 vezes 86% ou R$ 5,43 bilhões 69,2% ou R$ 2,35 bilhões por ano 4,06% ou 631.315 hectares a menos 25 vezes ou 6.313 km2 a menos

Nulo ou próximo de 0% Perdas com transmissão

linhas

Controle da Usina

de

De 7% a 40%

Centralizado – apenas 1 usina

Não há necessidade de linhas de transmissão Distribuído – múltiplas usinas

-

-

As conclusões mais imediatas que podemos ressaltar são: Considerando o disposto na Constituição Federal nos artigos 22 e 225, na Política Nacional de Meio Ambiente Lei 6.938/81, e na Resolução CONAMA 001/1986, que estabelece a obrigatoriedade de indicação alternativas tecnológicas de mínimo impacto a grandes obras, caberia discutir e avaliar qualitativamente e quantitativamente: - os dados presentes no RIMA apresentado ao projeto da Usina Hidrelétrica de Belo Monte; - a consideração por parte do governo federal e suas instâncias dos poderes executivo, legislativo e judiciário, de outros fatores tecnológicos além daqueles disponíveis quanto às obras de engenharia conhecidas e dominadas pelas grandes empreiteiras de hidrelétricas; - o reconhecimento de que devem ser evitados os danos ambientais, sociais, culturais, econômicos, políticos e históricos diagnosticados e conhecidos decorrentes da construção da Hidrelétrica de Belo Monte, e que, havendo outras alternativas tecnológicas de mínimo impacto, estas devem ser preferidas, sobretudo quando apresentarem vantagens em diversos aspectos; - a necessidade de aporte de recursos, benefícios, subsídios, isenções e demais formas de políticas públicas para o desenvolvimento científico e tecnológico de medidas de mínimo impacto quanto às diversas alternativas de geração de energia elétrica, em especial a geração fototermelétrica ou heliotérmica considerada neste documento; - os inúmeros pedidos e solicitações formais e informais da população, da sociedade civil, do setor produtivo e de diferentes instâncias governamentais e paragovernamentais quanto à revisão e reconsideração do projeto da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, corroboradas inclusive por requerimento formal da Organização dos Estados Americanos ao governo brasileiro quanto à paralisação das obras da Usina


- com base nos princípios de legalidade e legitimidade que norteiam o Estado Democrático de Direito Brasileiro, cumpre considerar os distintos elementos que compõe este e todos os demais documentos que pautam a necessidade de maior discussão pública e principalmente, maior transparência por parte do Poder Público Federal quanto aos reais benefícios e impactos negativos inerentes à Usina Hidrelétrica de Belo Monte projetada, e ponderar sobre a necessidade de substituição da matriz hidrelétrica por outra fonte, sendo aqui recomendada a construção de plantas de geração fototermelétricas.

Referências e Fontes 1

SANTOS, M. A. ; ROSA, L ; SIKAR, B. M. ; Sikar, E. ; SANTOS, E. O. ; Bentes Junior., A. M. P., . Emissões de Gases de Efeito Estufa por Reservatórios de Hidrelétricas. Oecologia Brasiliensis (Impresso), v. 12, p. 141154, 2008. 2 Fearnside, Philip. Barragens na Amazônia: Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu. Manaus, INPA. 2005. Disponível em: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/mss%20and%20in%20press/Belo%20Monte%20dec%20making-port-2.pdf 3 Fearnside, Philip. Barragens na Amazônia: Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu. Manaus, INPA. 2005. Disponível em: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/mss%20and%20in%20press/Belo%20Monte%20dec%20making-port-2.pdf 4 Portal Energia Hoje.11/03/2011. Acessado em 21/03/2011. Disponível em: http://www.energiahoje.com.br/online/eletrica/hidro/2011/03/11/427853/belo-monte-pode-custar-menos.html 5 Portal Amazônia. Acessado em 21/03.2011. Disponível em: http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=379562 apud http://ef.amazonia.org.br/ 6 Brasil. Agência Nacional de Energia Elétrica- Atlas de Energia Elétrica - 2a. Edição, Capítulo 3: Energia Solar (pg. 34). Disponível em: http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/pdf/03-Energia_Solar%283%29.pdf 7 Os dados informados para eficiência referem-se à eficiência da conversão de energia luminosa do sol em energia elétrica para ser distribuída. Os valores mínimos considerados são de 14%. O rendimento máximo divulgado até o momento é de 31,25%, conforme os experimentos realizados pelo laboratório Sandia, nos Estados Unidos. Disponível em: http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=batidorecorde-mundial-de-eficiencia-na-conversao-energia-solar-eletricidade 8 CHESF. Projeto Geração Solar Termoelétrica com Concentradores no Semi Árido do NE do Brasil (Aneel). Workshop Sobre Usinas Solar Termoelétricas Recife , 08/Jun/2010. Disponível em: http://www.eletricidadesolar.com.br/administrador/arquivos_link/9bd435c09afc7b228d156071989373fa775.pdf 9 Portal Bom Dia. Acessado em: 21/03/2010. Disponível em: http://www.redebomdia.com.br/Noticias/Pol%C3%ADtica/22704/Aneel+deve+homologar+nesta+tercafeira+o+leilao+de+Belo+Monte 10 CEPEL-Eletrobrás- Energias e Desenvolvimento do Nordeste Brasileiro: energias solar e eólica. (pg. 28) Confea: Salvador. 2008. Disponível em: http://mybelojardim.com/energia-solar/ 11 Vide notas 4 e 5. Considerando o valor de 38,7 bilhões pela geração projetada de 11.181, temos o valor de R$ 3.461.228/MW, correspondente a R$ 3,46/W instalado.


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