REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #429

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ALGARVE INFORMATIVO 13 de abril, 2024 #429 «SOPRO DE LIBERDADE» | «PEDRA DOCE - POÉTICA DE CORA CORALINA» | «ANÓNIMOS DE ABRIL» FESTA DO BASQUETEBOL JUVENIL | FESTA DAS TOCHAS FLORIDAS | MERCADO MUNICIPAL DE MESSINES ALBUFEIRA APRESENTA ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO, PROMOÇÃO E CAPTAÇÃO DE NOVOS TURISTAS NO CINETEATRO LOULETANO

ÍNDICE

Festa do Basquetebol Juvenil em Albufeira (pág. 22)

Mercado Municipal de São Bartolomeu de Messines foi requalificado (pág. 30)

Albufeira apresentou Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas (pág. 38)

Exposição «Sopro de Liberdade» (pág. 46)

Festa das Tochas Floridas em São Brás de Alportel (pág. 54)

«Bantu» de Victor Hugo Pontes no Cineteatro Louletano (pág. 72)

«Pedra Doce - Poética de Cora Coralina» no Cineteatro Louletano (pág. 90)

«Anónimos de Abril» no Teatro Municipal de Portimão (pág. 102)

OPINIÃO

Ana Isabel Soares (pág. 108)

Lina Messias (pág. 110)

Sílvia Quinteiro (pág. 112)

Júlio Ferreira (pág. 114)

Festa do Basquetebol Juvenil continua a marcar desporto nacional

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina e Federação Portuguesa de Basquetebol e 3 a 7 de abril, as atenções do desporto juvenil nacional estiveram centradas em Albufeira por ocasião da 16.ª Festa do Basquetebol Juvenil, o maior evento desta faixa etária que acontece em Portugal. Foram, de facto, largas centenas de jogadores, treinadores, dirigentes, juízes e adeptos que passaram a semana a acompanhar a elite do basquetebol jovem, nomeadamente, os sub14 e sub16, femininos e masculinos.

As finais realizadas na manhã do dia 7, domingo, foram acompanhadas de perto pelas principais figuras federativas e institucionais, casos de Manuel Fernandes, presidente da Federação Portuguesa de Basquetebol, José Carlos Rolo, presidente da Câmara Municipal de Albufeira, Custódio Moreno, diretor regional do Instituto Português do Desporto e Juventude do Algarve, e Nuno Manaia, diretor técnico nacional da Federação Portuguesa de Basquetebol, e todos destacaram o trabalho de

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colaboração necessário para organizar e acolher um evento desta magnitude.

Quem também elogiou o evento foram os representantes das associações que saíram vencedoras, com Manuel Albano (presidente) e Paulo Neta (diretor técnico regional) da AB Porto, e Rogério Mota (presidente) e Mário Nascimento (diretor técnico regional) da

AB Lisboa a realçarem ainda a importância deste momento competitivo para a evolução da modalidade. Recordese que a AB Porto sagrou-se campeã em sub16 femininos e sub14 masculinos, ao derrotar, nos dois escalões, a AB Lisboa. Já a AB Lisboa superiorizou-se nos sub16 masculinos e nos sub14 femininos, ao vencer, em ambos escalões, a AB Aveiro.

Mercado Municipal de São

Bartolomeu de Messines requalificado com o apoio de fundos europeus

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina obra de requalificação do Mercado Municipal de São Bartolomeu de Messines foi inaugurada, no dia 28 de março, depois de uma intervenção levada a cabo pelo Município de Silves com o propósito de dinamizar a economia local. Integrado no Plano de Ação de Desenvolvimento de

Recursos Endógenos (PADRE), o investimento total foi de 1,7 milhões euros, beneficiando do apoio do CRESC Algarve 2020 no montante de 680 mil euros, com a placa inaugural a ser descerrada pela Presidente da Câmara Municipal de Silves, Rosa Palma, pelo Vogal Executivo da Comissão Diretiva do Algarve 2030, Aquiles Marreiros, e pela Presidente da Junta de Freguesia de São Bartolomeu de Messines, Carla Benedito.

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A obra contemplou uma intervenção de grande envergadura nas instalações existentes, nomeadamente no que respeita à requalificação integral dos espaços interiores e exteriores do edifício, a renovação integral das infraestruturas (redes de abastecimento de água e saneamento, instalações

elétricas, telecomunicações e rede viária envolvente), reorganização funcional do espaço com relocalização das bancadas de venda, requalificação do pavimento, do telhado, das esplanadas, bem como a pedonalização e requalificação da Rua Dr. José Ventura Duarte e da Rua José Rodrigues Martins, possibilitando apenas o acesso automóvel para cargas e

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descargas e o reforço da dinâmica do comércio local na envolvente. A intervenção teve a preocupação de salvaguardar a traça arquitetónica do edifício e o respeito pela memória do mercado, em simultâneo com a introdução de elementos contemporâneos, respondendo às exigências legais nos campos da

segurança, mobilidade e à necessidade de modernização das condições de trabalho, adicionando novas valências.

Na ocasião, Rosa Palma manifestou a vontade de que, para além da sua atividade tradicional de venda ao consumidor final, o requalificado Mercado ganhe mais valências e dinâmicas, “que seja espaço de convívio e confraternização entre as pessoas” “Trabalhamos afincadamente para que as coisas aconteçam, Silves é um município que concretiza projetos de qualidade com o apoio dos fundos comunitários e queremos requalificar também os mercados de Armação de Pêra e Pera”, frisou a edil silvense.

O Mercado Municipal de São Bartolomeu de Messines integra a Rede Regional de Mercados Municipais, projeto que visa o desenvolvimento de ações de dinamização direcionadas à revitalização do comércio, produtores locais, reforço da identificação dos consumidores com as produções locais e regionais e com a importância do consumir local. Esta rede é dinamizada pela Vicentina – Associação para o Desenvolvimento do Sudoeste, que desenvolve o Programa de Animação e Comunicação, em vários mercados locais algarvios .

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Albufeira apresentou Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina Salão Nobre da Câmara Municipal de Albufeira assistiu, no dia 9 de abril, à apresentação da Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas para Albufeira, um trabalho realizado pelo IPDT – Instituto de Planeamento e Desenvolvimento do Turismo para ajudar a que Albufeira se consolide como o melhor destino de «Sol e Mar» de Portugal. A estratégia resulta de um trabalho apurado de análise do território, das dinâmicas do mercado turístico, dos desafios e oportunidades

atuais e futuras, bem como de um extenso processo de auscultação dos atores do destino, nomeadamente, agentes económicos, comunidade local, operadores turísticos internacionais, associações e entidades do sector. “A atividade turística deve ser diversificada no tempo para atenuar a sazonalidade, que, felizmente, está menos vincada, mas também do próprio produto turístico, com mais realidades e experiências disponíveis para quem nos visita. É um trabalho que deve ser feito por todos e estes documentos não estão

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fechados, há espaço para adaptações consoante o mundo vai evoluindo”, referiu, no início da sessão, José Carlos Rolo, presidente da Câmara Municipal de Albufeira.

Com 44 mil habitantes e uma localização estratégica no Algarve, a cerca de 30 minutos do Aeroporto de Faro, Albufeira é um destino turístico de «Sol e Mar», único, experiente, com mais de 60 anos de história. Reconhecida a nível mundial, Albufeira concentra a maior oferta premium do Algarve, e registou, em 2023, 7.78 milhões de dormidas que geraram 486 milhões de euros de proveitos totais.

De acordo com o estudo realizado, os stakeholders reconhecem que o turismo é estruturante para a dinâmica económica e social e que Albufeira é um destino seguro, com uma oferta de qualidade e recursos de excelência mundial. Contudo, alertam que se enfrentam desafios que se refletem na imagem global do destino e

na satisfação dos residentes e agentes económicos, pelo que reforçam a oportunidade e a necessidade de Albufeira seguir um novo caminho. Entre os desafios identificados contam-se uma elevada perceção de destino massificado e associado à animação noturna, a falta de associação da marca «Albufeira» à oferta turística global, a elevada taxa de sazonalidade, o encerramento dos negócios, o mercado de trabalho volátil, a forte dependência do Reino Unido, mercados de grande potencial com taxas de penetração muito baixas, maior concentração em Albufeira e Olhos de Água, pressão turística em zonas com capacidades de carga comprometidas e algum descontentamento associado ao turismo, pois nem todos reconhecem os seus benefícios.

Posto isto, são objetivos desta estratégia que Albufeira seja o melhor destino turístico em Portugal, com uma oferta de qualidade superior em toda a cadeia de valor do turismo; seja o destino turístico de eleição dos europeus, para

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short ou long-breaks de Sol e Mar, com temperaturas amenas todo o ano; seja reconhecida internacionalmente pelas praias e por uma oferta diferenciada de atividades turísticas; seja um destino de referência na animação noturna em Portugal, com ambientes diferenciados para responder às motivações dos diferentes segmentos de mercado; seja o destino nacional com maior capacidade para formar e reter os melhores profissionais do setor do turismo; seja um agente ativo e mobilizador na implementação de medidas de combate às alterações climáticas por via da proteção dos recursos naturais; e mantenha um fluxo bidirecional de comunicação/informação/sensibilização, entre município, residentes, empresários e operadores turísticos, no processo de desenvolvimento e gestão do destino. Há igualmente seis objetivos estratégicos definidos tendo por base o horizonte temporal 2030, nomeadamente:

reverter/desmistificar a imagem generalizada de Albufeira enquanto destino turístico massificado; organizar a oferta em clusters turísticos, indo ao encontro do perfil dos visitantes que cada um tem potencial para atrair; criar as condições de mercado que permitam que cada cluster turístico possa manter-se dinâmico durante todo o ano; reduzir a dependência do mercado britânico, aumentando a taxa de captação de mercados com potencial de crescimento; gerar valor económico e social através do turismo, com a fixação de residentes e desenvolvimento e retenção de recursos humanos qualificados; e elevar Albufeira a referência internacional enquanto destino turístico sustentável.

O modelo de desenvolvimento turístico preconizado na estratégia tem por base duas dimensões interdependentes – a Qualificação da Infraestrutura do Destino e a Qualificação da Oferta e Promoção

Turística – que serão abordadas de forma integrada, estabelecendo uma articulação estratégica entre os setores público e privado, numa lógica de compromisso colaborativo. Depois, há oito ativos diferenciadores a enfatizar:

Albufeira é um destino maduro, com décadas de experiência, com uma notoriedade nacional e internacional muita alargada e com uma elevada capacidade de fidelização; ali encontra-se a maior concentração de alojamentos 5 estrelas do Algarve e uma vasta oferta de restaurantes com conceitos de qualidade superior; Albufeira tem das melhores praias do mundo, que, reconhecidamente, combinam a beleza natural com condições balneares de excelência; do interior ao Atlântico, existe um património cultural e natural com particularidades únicas que distinguem o destino no seio da oferta regional e nacional; a animação noturna faz parte do ADN de Albufeira e ali encontram-se alguns dos melhores e dos mais procurados spots da noite algarvia, com programações para vários gostos; independentemente da estação do ano, o Sol e as temperaturas amenas fazem parte da imagem de marca do Algarve e, neste caso particular, de Albufeira; há uma ampla oferta de atividades náuticas, desportivas e culturais, que contam com o apoio de empresas e profissionais muito experientes, fator essencial de garantia de segurança; Albufeira é feito de movida, mas também é de evasão, relaxamento e convívio, sendo um destino family friendly na verdadeira aceção da palavra, onde os visitantes são muito bem-vindos e bem-acolhidos.

O «Sol e Mar» continuará a ser o principal produto de aposta, numa perspetiva evolutiva para uma cultura multiproduto de onde pontificam a animação noturna, o desporto, o meeting industry, o wellness, a cultura, a gastronomia e vinhos, a natureza e o sector náutico. A ideia depois é focar esforços naqueles que procuram destinos de sol e praia de qualidade reconhecida, de alto valor acrescentado, seguros, com temperaturas quentes/amenas durante todo o ano (superiores aos seus países de residência), que valorizam e procuram experiências e atividades além da praia, que são sensíveis às culturas locais e que valorizam a preservação dos recursos naturais dos locais que visitam. Por oposição, Albufeira não deseja turistas

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cujos perfis fragilizem o posicionamento definido e coloquem em causa a imagem global do destino e o bem-estar dos residentes, designadamente, aqueles que procuram destinos low-cost para estadias curtas (menos de três noites), com a única motivação de diversão, sem fins culturais, pouco sensíveis à vida local e à interação com residentes.

A estratégia de mercados visa, assim, alcançar um posicionamento nacional e internacional que faça jus à vocação turística de Albufeira, e que desperte o lado emocional associado à viagem, sob o mote «Albufeira, part of your life», porque quem visita Albufeira regressa inúmeras vezes, porque Albufeira faz parte da história de várias gerações,

porque em Albufeira recarregam-se energias, em suma, porque é fácil apaixonar-se por Albufeira. “São mais de 60 anos de destino turístico, de histórias marcantes de várias famílias e amigos, que se renovam e revigoram a cada visita. Albufeira não se esgota. É um destino que cria uma relação emocional e que evolui com os seus visitantes, os seus residentes e os seus agentes económicos”, sumariza a equipa responsável pela elaboração da Estratégia de Desenvolvimento, Promoção e Captação de Novos Turistas para Albufeira .

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Exposição «Sopro de Liberdade» recorda albufeirenses detidos durante o Estado Novo

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina os primeiros anos de ditadura, Albufeira viu muitos dos seus homens e mulheres serem levados para interrogatórios, por suspeitas de se rebelarem contra as ideias de António de Oliveira Salazar. Os anos de 1933-1935 registaram o maior número de detenções, crivadas pelo Decreto-Lei 23203 de 6 de novembro de 1933. Depois, todos os anos as prisões de Aljube, Caxias, Peniche e até o «campo de concentração» do Trafal receberam

albufeirenses. Só no ano de 1952 foram detidos 22 conterrâneos. É de tudo isto que trata a exposição «Sopro de Liberdade», patente, até dia 4 de maio, na Galeria Municipal João Bailote, em Albufeira.

Da autoria do Município de Albufeira, a mostra pode ser visitada de segundafeira a sábado, das 9h30 às 12h30 e das 13h30 às 17h30, e está dividida por três secções: «Testemunhos de Abril», composta por personalidades de Albufeira; «Presos políticos –Albufeirenses na prisão durante o Estado

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Novo»; e «Cartazes de Abril nas ruas de Albufeira». O destaque vai para a secção dos 54 albufeirenses, cinco dos quais mulheres, que foram detidos por serem voz e pensamento contra um regime de opressão.

A Prisão de Caxias, a Cadeia do Aljube e o Forte de Peniche foram o destino destes homens e mulheres, mas um deles, José Simão, padeiro de Albufeira, foi detido por posse de um revolver de 9mm, em Almodôvar (1/5/1949) e foi condenado a quatro anos de degredo no Tarrafal. Outro desses presos políticos foi Joaquim Vinhas Cabrita, proprietário da fábrica de frutos secos «Concentradora», que foi preso em Vilar Formoso e enviado inicialmente para a cadeia do Aljube. Foi, entretanto, transferido para o Hospital de São José, onde aguardou até ter sido libertado. Esteve detido de 23 de

fevereiro a 31 de dezembro de 1938. Joaquim Vinhas Cabrita veio a tornar-se num dos grandes mentores do Turismo em Albufeira, tendo sido o fundador do Hotel Sol e Mar.

Todos estes presos políticos têm notas biográficas a ler atentamente, nomeadamente Vítor Cabrita Neto, que em novembro de 1997 foi convidado para Secretário de Estado do Turismo, cargo que ocupou até abril de 2002, nos XIII e XIV Governos Constitucionais de António Guterres, entre outros cargos políticos e diplomáticos. Natural da Guia, foi capturado quando ainda era um estudante, pelo Posto de Vilar Formoso para averiguações, tendo sido depois transferido pela PIDE para o Depósito de Presos de Caxias, onde permaneceu apenas dois dias, de 17 a 19 de julho de 1963 .

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Tapetes Floridos voltaram a colorir as ruas de São Brás de Alportel no Domingo de Páscoa

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina e Jorge Gomes

Festa das Tochas Floridas regressou, no Domingo de Páscoa, 31 de março, com os seus tradicionais tapetes de flores com 1 quilómetro de extensão a cobrirem o chão por onde passou a singular Procissão de Aleluia de São Brás de Alportel.

Depois de uma maratona ao longo da semana na apanha das flores e na sua preparação, um desafio que é lançado

todos os anos à população, na madrugada de domingo, pela noite fora, e com a chuva a não dar tréguas, muitos foram os voluntários envolvidos na árdua tarefa de preparar os tapetes floridos. Já com o S. Pedro a ajudar, a Igreja Matriz acolheu, por volta das 10h30, a eucaristia da Ressurreição que precedeu a tão aguardada Procissão de Aleluia, em honra de Jesus Ressuscitado, que motiva várias gerações de homens são-brasenses a envergar as bonitas e originais tochas de flores enquanto entoam o tradicional refrão «Ressuscitou como disse! Aleluia! Aleluia! Aleluia!».

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A Festa das Tochas Floridas voltou a ser um evento acessível, com o Município de São Brás de Alportel, a SAN – Saúde Integrativa e a Casa de Repouso e Saúde de São Brás a adaptarem um espaço do recinto por onde passa a Procissão de

acompanhamento e reservando áreas de estacionamento para dar melhores condições às pessoas com mobilidade condicionada que participam e assistem a este evento. Mais uma iniciativa integrada no projeto «São Brás Acessível para todos» que se repetiu em 2024, nesta grandiosa festa que voltou a atrair ao coração da Serra do Caldeirão várias gerações de sãobrasenses, residentes ou espalhados pelos quatro cantos do mundo, para além de milhares de turistas estrangeiros que, de há uma década para cá, já se habituaram a rumar ao Algarve para assistir à Festa das Tochas Floridas.

«BANTU» DE VICTOR DESLUMBROU CINETEATRO

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

VICTOR HUGO PONTES CINETEATRO LOULETANO

Cineteatro

Louletano foi palco, no dia 22 de março, de «Bantu», espetáculo que teve origem num convite endereçado a Victor Hugo Pontes pelos Estúdios Victor Córdon e pelo Camões – Centro Cultural Português em Maputo para o desenvolvimento de uma nova criação de dança com intérpretes moçambicanos e portugueses. Os Estúdios Victor Córdon e o Camões –Maputo são parceiros numa programação conjunta para três temporadas, que visa criar pontes entre os dois países Portugal e promover a circulação e internacionalização da dança, e «Bantu»

é um dos produtos desta união de esforços.

«Bantu» designa uma família de línguas faladas na África subsariana, é identidade e é comunidade, mas é também mais do que uma ocorrência linguística. Pode ser uma linguagem própria que sobreviveu às línguas europeias impostas; um mecanismo identitário; um signo vedado ao colonizador; uma forma de comunicação, plena de códigos culturais, históricos, religiosos e políticos; a materialização efémera de um longo encontro. “A palavra acolhe tudo o que queremos ou imaginamos que o espetáculo seja. O que «Bantu» será, contudo, depende dos olhos

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de quem vê. Este é também um lugar que desejamos ocupar: um lugar diferente para cada um dos corpos que o habita, partilhado nas feridas que rasga, titubeante no trilho que percorre; um lugar exuberante na celebração da comunidade reunida em palco”, explica o conceituado coreógrafo.

A interpretação esteve a cargo de Dinis

Abudo Quilavei, Dinis Duarte, Francisco Freire, José Jalane, Maria Emília Ferreira, Marta Cardoso e Osvaldo Passirivo, numa produção da Nome Próprio, estrutura residente no Teatro Campo Alegre, no âmbito do programa «Teatro em Campo Aberto», e que tem o apoio da República Portuguesa – Cultura / Direcção-Geral das Artes .

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COMPANHIA DE BALLET DE NITERÓI TROUXE POÉTICA DE CORA CORALINA»

Texto: Daniel Pina| Fotografia: Jorge Gomes

BALLET DA CIDADE «PEDRA DOCE –CORALINA» A LOULÉ

edra Doce – Poética de Cora Coralina» é um espetáculo da Companhia de Ballet da Cidade de Niterói que fala da simplicidade na poesia e vida de Cora Coralina e que o RHI –Revolution, Hope, Imagination trouxe até ao Cineteatro Louletano, em Loulé, no dia 19 de março. O diretor artístico Fran Mello concebeu o espetáculo procurando relacionar a escrita de Cora, os seus ímpetos e necessidades em escrever, com a dos corpos dos bailarinos ao ler (ou ouvir) seus poemas. Toda a coreografia foi concebida pelos próprios bailarinos, influenciados pelos poemas de Cora.

Por se autointitular doceira, o nome «Pedra Doce» remete para o açúcar utilizado para glacear as frutas que, após

dias a secar ao sol, viravam pedras deliciosas. Na plateia, o público é contagiado pelo aroma do doce de coco feito em cena, sendo que a dramaturgia do espetáculo é conduzida pela coreógrafa Ana Vitória Freire com o intuito de replicar a vida simples de Cora, mas reconhecendo sempre o seu potencial de mulher à frente do seu tempo.

A Companhia de Ballet da Cidade de Niterói nasceu a 1 de março de 1992 e foi a sexta companhia pública oficial fundada no Brasil. No seu extenso repertório possui aproximadamente 35 espetáculos de elevado reconhecimento no meio artístico e o grupo já se apresentou em mais de 70 cidades brasileiras e no estrangeiro, nomeadamente Alemanha, Uruguai, Estados Unidos da América e Portugal

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ANÓNIMOS DE ABRIL NO TEMPO EM PORTIMÃO

Texto: Ricardo Coelho| Fotografia: Ricardo Coelho

ABRIL LEMBRADOS PORTIMÃO

om a sala completamente lotada, o TEMPO –Teatro Municipal de Portimão recebeu, no dia 16 de março, no ano em que se celebram os 50 anos do 25 de Abril, um evento que lembra de forma única e original vários «heróis» da Revolução dos Cravos. Albina Fernandes, Belmira Gonçalves, Luís e Herculana Carvalho, João Arruda, Jorge Alves e Aurora Rodrigues são nomes que continuam desconhecidos para a grande parte do

nosso povo, e são alguns dos invocados ligados à resistência contra o Estado Novo e ao 25 de Abril que servem de mote ao espetáculo «Anónimos de Abril».

Rogério Charraz, José Fialho Gouveia, Joana Alegre e João Afonso são as caras e as vozes do espetáculo que conta a história cantada de desconhecidos que ajudaram à revolução do 25 de Abril. Para além das canções inéditas, ouviram-se «Venham Mais Cinco» e «Grândola Vila Morena», que enriqueceram ainda mais esta celebração da liberdade e que tornou o momento final grandioso e épico .

Nonagésima quarta tabuinha«Com base em

histórias verídicas»

Ana Isabel Soares (Professora)

emorei mais de um ano a ler A Eliminação, relato do cineasta

Rithy Panh redigido por ele e pelo escritor Christophe Bataille. Lio muito devagar, só poucas páginas por dia – às vezes nem uma completa. Só conseguia lê-lo no começo do dia, apanhando-me quase desprevenida, ou nos momentos em que a clareza das ideias e a força do espírito se preparam para ser distraídas e entregar-se à perda – mas que, por isso mesmo, se aguçam. A violência descrita é demasiado crua, a sua narração igualmente cruel, sem condescendência: Pahn é hoje um cineasta respeitado. Vive e trabalha em França, onde se refugiou depois de ter perdido toda a família, ainda jovem adolescente, durante o regime de Pol Pot no Cambodja. O que conta em A Eliminação não tem apenas o desenho do conflito político, de um regime ou de uma ideologia: centra-se nos dias e nos atos de sobrevivência, na angústia e na indiferença. A autobiografia (lembranças adultas já distanciadas dos doze primeiros anos de vida) intercala – ou é intercalada – a fixação de uma entrevista que Pahn realizou ao diretor do campo de extermínio S21. Duch, um dos responsáveis por atrocidades cometidas em nome do regime, ganha voz e humanidade (a voz que Rithy Pahn reconhece não ter sido um direito das vítimas daquelas brutalidades): o que leio é às vezes o riso de um monstro, às vezes o silêncio de um homem; as frases vazias de

um burocrata que obedece cegamente a uma ideia de regime ou as perguntas devolvidas ao entrevistador, em desafio inteligente e estudado. Não saí incólume deste livro, que me custou ler, mas que agradeço ter sido escrito.

Em contrapartida, a experiência de ouvir Paula Neves e Maria João (a «John») a descrever as histórias de «true crime» no podcast «Parecia Tão Boa Pessoa» consegue levar-me às lágrimas. Também não é coisa que seja capaz de ouvir depois do cair da noite – mas a abordagem que ambas fazem dos casos (horrendos) descritos é de ligeireza e coloca-me no conforto do som daquelas duas pessoas, entre o divertida e o indignada, menos vezes assustada, e a aceitar a incredulidade de saber que existem, existem mesmo seres «humanos» terríveis que, por circunstâncias mais ou menos explicáveis (narrá-las não implica que sejam justificação, de facto), perdem qualquer réstia de empatia e deixam de reconhecer em si mesmos a semelhança com os outros.

Os instantes em que permito ao cérebro absorver os relatos de terror, do incompreensível tenho de os acompanhar com torradas, chá, queijo fresco, um dia ou outro uma compota demasiado doce –preciso de me permitir a convivência impossível entre o horror e o conforto, se quero aceitar o confronto com aquilo que sempre me parece uma impossibilidade .

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Foto: Vasco Célio

Velhos são os trapos

Lina Messias (Especialista em Feng Shui)

uvi esta expressão vezes sem conta em tom de reprimenda sempre que, em tenra idade, apelidava alguém de velho!

Meio século e praticamente duas gerações depois, a forma como envelhecemos e encaramos a velhice mudou de forma profunda; quando eu nasci, os meus avós eram mais novos que eu enquanto escrevo este artigo, mas quando olho as fotos nos álbuns de família, as diferenças são imensas.

No tempo em que pouco ou nada se falava e havia de dietas, cremes, procedimentos estéticos e muitos outros «anti aging» ou «slow aging», a aparência acusava muito mais a idade, mas a forma de tratar e olhar para os mais velhos era sem dúvida com um maior respeito e até veneração por quem tinha mais anos e experiência de vida.

Historicamente, em muitas sociedades, os mais velhos eram respeitados, consultados e reverenciados pela sua sabedoria e experiência. Na cultura celta, os anciãos eram consultados nas questões mais importantes, tanto individuais quanto comunitárias. As suas opiniões e decisões eram altamente valorizadas, e eles desempenhavam um

papel central na resolução de disputas e na tomada de decisões que afetavam a comunidade como um todo. Muitas vezes eram os anciãos celtas que ocupavam as posições de liderança formal dentro das tribos e que estavam encarregues de garantir a coesão social e o bem-estar da comunidade e eram reverenciados como guardiões da tradição, da sabedoria e da comunidade, com o papel fundamental na preservação da identidade cultural celta e na orientação das futuras gerações. Noutras culturas antigas, como a grega e romana, os idosos também desempenhavam papéis importantes como conselheiros e líderes comunitários, partilhando conhecimento com a devida autoridade como mestres e sábios.

Em muitas culturas tradicionais, os mais velhos frequentemente viviam com as suas famílias e eram cuidados pelos membros mais jovens, que reconheciam a sua importância na transmissão de conhecimentos e valores.

Cheguei à dita idade em que, como muitos, tenho que assumir o papel de «pais» dos nossos pais, e por razões várias apercebi-me de uma realidade que me deixa desolada. Segundo uma estimativa do Ministério da Saúde, por ano, ocorrem cerca de 100 a 150 situações de abandono de idosos nos hospitais portugueses e, segundo um estudo da Organização Internacional do

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Trabalho, Portugal é dos países da Europa onde as pessoas idosas mais são abandonadas.

Estes dados são um «murro no estomago» e um verdadeiro desafio para a nossa sociedade! Esperar por medidas que melhorem esta realidade pode levar décadas ou mesmo gerações… há factores sociais, culturais e financeiros que influenciam estas estatísticas e acredito que cada um de nós tem a responsabilidade de reverter esta tendência.

Realmente, velhos são os trapos, envelhecer o corpo é um sinal natural da passagem do tempo, mas dar vida à alma é possível até ao último dia da nossa existência; é o tédio dos dias que nos envelhece e o acordar sem sentido de propósito; o que nos envelhece é não ter ninguém a quem chamar de amigo, não ter um jardim ou horta para cuidar ou uma causa para lutar e perder a vontade de estudar.

O que nos envelhece é não ter ninguém para partilhar o vinho e a VIDA .

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Vamos fazer uma autópsia!

Sílvia Quinteiro (Professora)

hegado o momento de decidir qual a área a seguir no 9.º ano, optei por Desporto. O motivo dessa escolha não podia ser mais próprio da idade. Era sabido que todos os rapazes giros do Liceu estavam nessas turmas. E como as escolhas bem fundamentadas tendem a dar bons resultados, foi um ano lastimoso. Eu não tinha a mínima vocação. A turma era terrível. Os professores andavam ali em sofrimento. E os rapazes? Coitaditos… como as raparigas. Pernas e braços assimétricos, acne, vozes de cana rachada. Acontece que há realmente males que vêm por bem e, no ano seguinte, a escolha teve outros fundamentos. Sempre gostei de ler. Gostava de Inglês. Queria muito aprender Alemão. E, ainda que o objetivo fosse conseguir ler a Bravo, sempre era melhor do que o que me levou ao Desporto. Juntando a isto uma relação tumultuosa com os números, a matrícula na área das Letras estava decidida.

Uma mudança radical. Alunos muito empenhados. Professores motivados. Guardo de todos boas memórias. Mas há sempre alguém que sobressai mesmo entre os excelentes. No meu caso, destacou-se uma professora de Português. Pequenina. Os dentes da frente ligeiramente encavalitados, a formar um V. Cabelo pintado de um

castanho discreto, como a saia direita, os camiseiros abotoados até ao queixo e os casacos de malha que usava quase como uma farda. E não lhe olhassem ao tamanho nem à idade. Estava à beira da aposentação e não era para brincadeiras. Surgia no corredor e ficávamos de imediato em sentido. Entrávamos ordeiramente na sala. A única em que havia lugares marcados. Por ordem alfabética. A mesma que usava para nos chamar a ler, um a um, em todas as aulas. Uma disciplina militar. Tinha expressões faciais inesquecíveis. Quando uma resposta a impressionava, dirigia-nos um sorriso leve, sereno. De quem sabe que cumpriu a sua missão e se ilumina por dentro. Já quando alguém se procurava evidenciar, não continha um sorriso de desdém. Lançava-o do alto do estrado. Fulminante. Quase tão fatal quanto o único comentário que lhe suscitava o nosso desfile de roupinhas trazidas dos Porfírios: – Isso é moda?

As aulas não podiam ser mais tradicionais. Sem fogo-de-artifício. Sem «modernices». Apenas uma professora. Uma obra. Os alunos. O tempo corria quando nos levava pelos textos, pelas histórias, pelas relações que estabelecia entre palavras com séculos e as nossas vidas.

Pouco se distraía da matéria. E, talvez também por isso, os raros apartes são memoráveis. Contava-nos que na Serra da

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Estrela, onde tinha nascido e crescido, a missa era dada em Latim. Assim, as pessoas sentiam-se mais pequenas e encolhiam-se com medo, explicava. Dizia não entender quem cumpria promessas e se martirizava em nome de qualquer religião. Que todos nascíamos com uma cruz pesada para carregar, não era necessário mais. Contava-nos que quando era estudante se ensinava literatura dividindo orações. Segundo ela, a intenção era desviar a atenção do significado dos textos. Evitar que os alunos pensassem. Quanto mais ignorante o povo, melhor se espezinha. E afirmava de olhos bem abertos: Eu quero que pensem! Que pensem! Estão a ouvir?

Como ficaria dececionada a professora se voltasse hoje. Se visse o regresso da autópsia a muitas salas de aula. A literatura em cima da mesa, gelada, a ser

esventrada apenas para se concluir que ali jaz uma “oração subordinada adjetiva relativa restritiva” ou uma “oração coordenada disjuntiva sindética”. E os jovens que deviam ser ensinados a pensar, a ter prazer na leitura, a descobrir porque é que aqueles textos lhes interessam, ocupados a dissecar o corpo morto, estranho e repugnante. A colocar amostras na lamela. A observar ao microscópio o pormenorzinho, enquanto os cangalheiros aguardam, encandeados pela luz do retroprojetor que mostrará as soluções ditadas por uma qualquer editora.

E vem-me cada vez mais à cabeça a frase com que a professora se despedia das suas turmas no final do 11.º ano: Cada um de vocês vai seguir um caminho. Seja a lavar pratos, seja numa sala de operações, tenham brio. Sejam os melhores .

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Os tristes passos do Pedro…

Júlio Ferreira (Inconformado encartado)

om dia «donas de casa»! Antes de lerem mais este artigo, não se esqueçam de comunicar ao vosso marido que já cumpriram todos os vossos papéis como mulheres recatadas de uma família com valores tradicionais.

“Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades de Estado. Os estados socialistas, os estados capitalistas e o estado a que chegámos. Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos”. Salgueiro Maia (25 de Abril de 1974)

Cinquenta anos depois destas palavras e infelizmente o nosso País caminha para uma ditadurazeca encapotada, às mãos de alguns labregos salazarecos e rebarbados, a cheirar a naftalina. Quem não percebeu que, neste momento, a guerra na política portuguesa é só uma, a liderança da direita, e que o Chega tem como único e principal objetivo diminuir e substituir o PSD, é, diria com pena, bastante burro. Quem sugere qualquer tipo de entendimento, ou é burro ou é pior, quer mesmo que o PSD seja devorado num buraco negro de estupidez e maldade. O pior é que é um ex-primeiro ministro de Portugal, eleito pelo… PSD a fazê-lo, ressuscitando ódios, ideias machistas e xenófobas tresandando a mofo com o objetivo de ocupar os lugares

de Montenegro no partido ou o de Marcelo na Presidência.

Há poucas pessoas em Portugal que, quando aparecem em público ou emitem opinião, têm a capacidade de colocar o País a falar ou a discutir, Pedro Passos Coelho é uma delas! A mim tem outra capacidade, confirmar que estava certo (e já lá vão 13 anos), em abandonar o PSD. Nunca o fiz publicamente, mas aqui o digo o que é do conhecimento geral, foi por ele que voltei à política, e foi por ele que me demiti do PSD no espaço de poucos anos. Depois de ter pensado que podia mudar o Mundo e de ter encarado a dura e triste realidade da política portuguesa de tachos e tachinhos, casei, tive filhos e isso ajudou ao meu afastamento da política ativa e da qual não senti saudades. Essa travessia do deserto, terminaria num celebre almoço em Sagres com Pedro Passos Coelho e os seus amigos algarvios (onde eu me incluía). Tinha vindo em segredo pedir ajuda para a sua candidatura ao PSD e posteriormente a primeiro ministro. A imagem que eu tinha deste homem era a melhor, uma relação que vinha desde os anos 80, nos tempos da JSD. Partilhamos algumas histórias, muitos momentos e convívios como as da Praia da Rocha, numa celebre «Páscoa Laranja». Fui, a seu pedido, mandatário em Portimão e semanas depois estávamos em Quarteira a comemorar a sua eleição e eu voltava à política pelas suas mãos. Foi o princípio

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do fim de uma ilusão e esperança num homem.

Quando o Pedro chegou a primeiro ministro em 2011, a minha esperança era enorme, mas a tarefa não se afigurava fácil. Com o tempo veio a desilusão, não só para mim, como para milhões de portugueses. Nunca esquecerei esses tempos e o facto de todos sabermos e sentirmos que ele estava a fazer mais do que o necessário, mais do que era exigido e, com isso, a prejudicar os seus compatriotas. Bastava para isso seguir as exigências da Troika (que eram muitas), mas não era preciso convocar as sete pragas do Egipto. A minha desilusão face a estas e outras situações, como ao seu autismo e cegueira aos amigos mais próximos face à realidade, levou a que eu batesse a porta com estrondo. Como era meu «amigo» escrevi-lhe uma carta explicando as razões pelas quais abandonava o partido e porque tinha deixado de acreditar nele. Pelas piores razões, ficara a conhecê-lo melhor. Coisa boa, o saber não ocupa lugar. Aquele não era o Pedro Passos Coelho que eu conheci, aquele não era, como nunca mais foi, o PSD de Sá Carneiro.

Neste pais maldisposto e desiludido (no qual tantas e tantas vezes me incluo), sem respostas credíveis para tantos problemas, um partido como o PSD, que tem inscritos nos seus princípios o

humanismo, o personalismo, a tolerância, o direito à diferença, a autodeterminação da pessoa humana, a igualdade de oportunidades, não se pode sentir nem pode ser representado por opiniões que andem absolutamente arredadas destes princípios, de visões que, mais do que desajustadas temporalmente, são sobretudo desajustadas face à visão de sociedade inclusiva, integracionista, respeitadora das diferenças, numa palavra, humanista. A liberdade de expressão que obviamente todas as pessoas têm para defender esta visão de sociedade em defesa da «Família Tradicional» mais não fazem do que um ataque encapotado aos mais básicos direitos das pessoas. Os conservadores não querem defender valores. Antes, querem impô-los, fazer deles regra e impedir a concretização de tudo aquilo que abominam. No fundo, é apenas ódio. Eu dou apenas um exemplo: Um dos

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senhores que consta no livro é o Professor Paulo Otero da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Este «senhor» há pouco tempo chocou os alunos na cadeira de Direito Constitucional II e deixou perplexas várias pessoas, e entre elas, outros juristas, quando colocou uma pergunta sobre a constitucionalidade comparando o casamento gay ao casamento entre pessoas e animais.

Neste seu caminho para as eleições presidenciais imediatamente apoiado pela extrema direita convém perguntar ao Pedro o que mudou de 2010 para 2024? No jornal «I» o Pedro há 14 anos (19/01/2014) escrevia: “A homossexualidade ou a heterossexualidade não tem de ser o critério para adoção. Quando avaliamos as condições em que determinada pessoa deve poder adotar, o critério não é saber qual é a sua orientação sexual”.

Passados 50 anos da libertadora revolução, algumas das pessoas deste país continuam, como a hipócrita PIDE, a «cultivar a família e os bons costumes» enquanto espancavam, impediam de dormir, despiam e humilhavam milhares de homens e mulheres indefesos. Esta perceção do ridículo que algumas «figuras da sociedade portuguesa» continuam a alimentar é preocupante porque me faz ter a perfeita consciência que, por mais anos que passem, Portugal será sempre (infelizmente) uma metáfora fácil do ridículo tacanho e mesquinho. As leis neste país tiveram sempre aquela arbitrariedade imbecil e subjetiva do legislador, o mesmo gajo que há 40 anos

proibia que se namorasse na rua, que as pessoas se pudessem divorciar, que as mulheres casadas pudessem trabalhar, ter passaporte e viajar para o estrangeiro, que pudéssemos ler certo livro ou ouvir certa música, esse legislador estreptococo conseguiu criar uma prole de descendentes que hoje continuam a legislar, a opinar nas televisões, no mesmo registo de estupidez subjetiva. Mas acho que ainda não perceberam que foi o 25 de Abril lhes deu a liberdade para o fazer, assim como eu para os criticar, nesta coisa a quem pomposamente chamamos de «artigo de opinião». O meu medo é que isso acabe, até porque (como ficou provado ultimamente), o fascismo e algumas das suas ideias não desapareceram com o 25 de abril. Foi apenas retirado do poder. Naquela manhã de 74, Portugal não acordou sem fascistas. Eles andam aí, como sempre andaram, a diferença é que perderam a vergonha, não é Pedro? Alguns políticos continuam na sua encenação a dizer o que o povo gosta e quer ouvir. Que ainda adoram Fátima e Futebol… o fado nem por isso. Mas qual será nesta altura, o terceiro F?

Para mim, a escolha é fácil. Até porque poucas coisas são gratificantemente libertadoras como um bom insulto aplicado no momento certo. Tem o efeito de uma ventania forte num dia nublado: deixa-nos o céu azul e solarengo. Limpanos a alma. Que venha de lá esse grande e prolongado F… .

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