REVISTA ALGARVE INFORMATIVO #418

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ALGARVE INFORMATIVO 20 de janeiro, 2024

«O MEU AMIGO H» NO CINETEATRO LOULETANO 1

GRUPO FOLCLÓRICO DE FARO | ACTA DESVENDA PROGRAMAÇÃO DO TEATRO LETHES #418 ALGARVE INFORMATIVO 25.ª MOSTRA DOS ARTISTAS DO CONCELHO DE VILA DO BISPO | LURA | PADERNE MEDIEVAL


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ÍNDICE Loulé inaugura Balcão Energia (pág. 14) Albufeira vai ser capital da dança desportiva (pág. 20) Paderne Medieval (pág. 26) Grupo Folclórico de Faro (pág. 34) ACTA desvenda programação do Teatro Lethes (pág. 48) «O Meu Amigo H» no Cineteatro Louletano (pág. 62) Lura no Cineteatro Louletano (pág. 80) 25.ª Mostra dos Artistas do Concelho de Vila do Bispo (pág. 96)

OPINIÃO Paulo Cunha (pág. 110) Ana Isabel Soares (pág. 112) Fábio Jesuíno (pág. 114) Dora Gago (pág. 116) Sílvia Quinteiro (pág. 118) Lina Messias (pág. 120)

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Balcão Energia vai apoiar munícipes de Loulé a poupar na fatura e a melhorar o conforto térmico e o ambiente Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina icou disponível, no dia 11 de janeiro, no Espaço Cidadão em Loulé, o «Loulé Energia», que coloca ao serviço dos munícipes deste concelho a prestação de informações e apoio sobre eficiência ALGARVE INFORMATIVO #418

energética. O Balcão pretende promover a consciencialização sobre a importância da eficiência energética, mas também oferecer orientação face a soluções existentes de apoios para os cidadãos e empresas que procurem reduzir o seu impacto ambiental, melhorar o seu 14


conforto térmico e, em simultâneo, pagar menos na sua fatura energética. Este serviço constituiu mais uma valência do Espaço Cidadão, prestando informações sobre práticas eficientes para o uso de energia, tecnologias renováveis e informação de apoio à elaboração de candidaturas a programas de financiamento sobre eficiência energética. “Ao visitar o Balcão, os

munícipes contam com a orientação personalizada de três técnicas que receberam formação ministrada pela AREAL – Agência Regional de Energia e Ambiente do Algarve. Através de uma parceria estabelecida, esta entidade, agora localizada num dos torreões do Mercado Municipal de Loulé, será

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facilitadora técnica e fará, uma vez por semana, atendimento a quem estiver interessado, por exemplo, em efetuar uma candidatura aos mecanismos financeiros de apoio, como é o caso do «Vale Eficiência» do Fundo Ambiental”, explicou o vereador Carlos Carmo. Numa fase posterior, qualquer munícipe que queira fazer intervenções na sua habitação terá também aconselhamento técnico, para ser mais eficiente ao nível da energia que consome e em termos do conforto técnico. Esta iniciativa enquadra-se na política municipal de ação climática do Município de Loulé, nomeadamente ao nível da mitigação, como frisou a chefe de Divisão de Ação Climática e Economia Circular, Lídia Terra. “O combate às alterações

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climáticas tem que ser premente, e este serviço é completamente alinhado com o desígnio de diminuição das emissões de CO2, através de um apoio prestado ao munícipe relacionado com o combate à pobreza energética”, indicou. Para fazer face à complexidade das candidaturas, este serviço reúne ainda todas as condições para ajudar o cidadão a superar as dificuldades encontradas, como esclareceu Amélia Carmo, coordenadora do Espaço Cidadão.

“Apesar de já termos serviços relacionados com a Energia, através do protocolo celebrado com a AMA – Agência de Modernização Administrativa, achámos que aqui era o local ideal para acolher este Balcão. Até porque temos, em média, 30 atendimentos por dia neste espaço. O objetivo agora é sensibilizar as pessoas e informar que há este serviço”, adiantou. António Mortal, responsável da AREAL, agência que existe há 24 anos na região, falou da “boa colaboração” que tem tido ao longo dos anos com o Município de Loulé e acrescentou: “Só

conseguimos poupar energia e reduzir emissões, ou seja, todo o desiderato que o país tem, se isto passar para os cidadãos. É importante que o cidadão tenha informação, porque ele é que faz a ALGARVE INFORMATIVO #418

diferença”, notou. Já o presidente da Autarquia de Loulé, Vítor Aleixo, destacou a parceria com a AREAL e o seu know-how que ajudará ao aconselhamento na redução da fatura energética, mas também a alcançar o grande desígnio da União Europeia. “Os

cidadãos têm que ser ajudados a fazerem pequenas alterações em casa para gastarem muito menos energia. Pagam menos na fatura e, 16


em casa, no Inverno, estão confortáveis, e no Verão também estão mais frescos. Muitas vezes a maior dificuldade do cidadão é preencher os formulários de candidatura e esta organização está aqui para ajudar as pessoas”, reiterou. No final da sessão, o autarca manifestou ainda um desejo: “Gostava que muita 17

gente em Loulé que vive em casas frias – o que traz muitos problemas – possa aproveitar as oportunidades e mude janelas ou aplique revestimentos no exterior dos apartamentos para haver maior conforto térmico no interior. Gostava que Loulé fosse um município à frente no país na utilização dessa oportunidade” . ALGARVE INFORMATIVO #418


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Albufeira vai ser a capital da dança desportiva Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina lbufeira vai ser palco, no dia 27 de janeiro, da primeira jornada da Taça de Portugal, bem como do Campeonato Nacional de Sub-21 de Danças Latinas e Standard, numa organização da Federação Portuguesa de Dança Desportiva e do Futebol Clube de Ferreiras com o apoio da Câmara Municipal de Albufeira. No Pavilhão ALGARVE INFORMATIVO #418

Municipal de Albufeira são esperados cerca de 200 atletas, sendo que, no Campeonato Nacional de Sub-21, podem participar jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 20 anos. Na ocasião serão apurados os campeões nacionais deste escalão nas disciplinas de latinas e standard, nas categorias de iniciados, intermédios e open. Também no dia 27 de janeiro, após as provas, será realizada pela primeira vez a Gala dos Campeões do Circuito Nacional da época 20


anterior, com distinções entregues aos atletas de solo, pares e grupos. Serão igualmente homenageados os pares da seleção nacional. No dia 28 de janeiro, domingo, terá lugar, no mesmo local, o 1.º Training Camp da época, um momento de formação que permitirá aos participantes maximizar a sua deslocação com a possibilidade de aumentar os seus conhecimentos. Arranca, deste modo, da melhor forma, o ano em Albufeira em termos desportivos, com José Carlos Rolo a enfatizar o relevo destes eventos para a candidatura a Cidade Europeia do Desporto em 2026, assim como para combater a tradicional sazonalidade do turismo algarvio. “Trazer estas provas

durante a época baixa é de extraordinária importância, porque atraem visitantes de outros pontos do país e, inclusive, do estrangeiro, mas também porque ajudam a impulsionar estas modalidades no concelho. Temos muitos clubes e associações desportivas que merecem o nosso reconhecimento porque fazem do melhor que temos em Portugal”, enalteceu o presidente da Câmara Municipal de Albufeira. De Albufeira vão sair os campeões nacionais que vão representar Portugal no Campeonato do Mundo Sub-21, com Armando Baptista, vice-presidente da Federação Portuguesa de Danças Desportivas, a lembrar que muitos atletas, treinadores, dirigentes e familiares se vão deslocar à capital do 21

turismo algarvio durante um fim-desemana que será recheado de atividades.

“Albufeira vai ser a capital da dança em Portugal, com cerca de 100 pares divididos por várias categorias e idades, dos 6 aos 70 anos, porque dançar é um prazer contínuo. As danças de salão mudaram de nome para danças desportivas para se puderem tornar modalidades dos Jogos Olímpicos e são bastante populares em diversos países europeus, daí fazer sentido organizar este evento em Albufeira”, explicou o dirigente. Estarão, por isso, em Albufeira, os melhores atletas portugueses da valsa inglesa, tango, quickstep, slow foxtrot, valsa vianense, chá-chá-chá, samba, rumba, paso doble e jive, pelo que fazia todo o sentido, para a Federação, levar a cabo também a Gala dos Campeões. Finalmente, o training camp dá a possibilidade aos atletas de terem aulas com professores de gabarito internacional. “É uma forma também

dos atletas socializarem e daqueles que ainda não conseguem alcançar resultados de topo treinarem ao lado dos melhores”, realça António Baptista, lembrando ainda que Portugal conquistou a medalha de bronze no Campeonato de Latinas de Juventude de 2023. “Ver a bandeira nacional

erguida entre 57 países é sempre um grande orgulho e estamos ALGARVE INFORMATIVO #418


muitos esperançados nesta nova geração e nas oportunidades criadas pelas autarquias e pelos clubes e associações desportivas. São homens e mulheres que fazem milhares de quilómetros com os seus atletas, com o apoio financeiro e logístico das câmaras municipais”, salientou o vicepresidente da Federação, que poderá, inclusive, candidatar-se à organização de uma prova internacional a ter lugar em Albufeira no corrente ano. O Futebol Clube de Ferreiras é o clube mais antigo e representativo do Algarve nas danças desportivas, antigas danças de salão, com o presidente da direção, António Colaço, a confirmar os muitos ALGARVE INFORMATIVO #418

quilómetros percorridos pelos atletas algarvios para competirem nas principais provas nacionais, que normalmente se disputam de Setúbal e Lisboa para cima.

“Estamos a tentar que a dança desportiva desça mais até ao Algarve, até porque o Ferreiras celebra, em 2024, 25 anos a dançar, com os seus altos e baixos. Atravessamos um momento positivo com bastantes atletas e o evento vai ajudar a divulgar ainda mais esta modalidade”, acredita António Colaço, aproveitando para agradecer o apoio da Autarquia de Albufeira no dia-a-dia do clube. A sessão de apresentação do Campeonato Nacional Sub-21, da Taça de Portugal e da Gala dos Campeões 22


terminou com as palavras de Cristiano Cabrita, vice-presidente da Câmara Municipal de Albufeira, que reiterou a importância destes acontecimentos para a economia local durante a época baixa do turismo algarvio e para a projeção da marca «Albufeira» a nível nacional e internacional. “Entre dezembro e

março temos diversos eventos desportivos, campeonatos nacionais, provas internacionais, de modo a que a candidatura de Albufeira a Cidade Europeia do Desporto seja forte e enalteça toda a nossa comunidade. Tudo

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isto é sinónimo da qualidade do trabalho dos atletas, treinadores e dirigentes do concelho e, neste edifício branco, não fazemos mais do que auxiliar o seu trabalho diário. É meritório o sacrifício que é feito, no dia-a-dia, pelos atletas e suas famílias para praticarem desporto de competição e, sem estes dirigentes, provavelmente também não teríamos estes eventos”, frisou o vereador com o pelouro do Desporto .

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Paderne viajou no tempo até à época medieval durante quatro dias Texto: Daniel Pina| Fotografia: Rui Gregório/Município de Albufeira aderne, recentemente classificada «Aldeia de Portugal», viajou no tempo durante quatro dias, com a iniciativa «Paderne Medieval» que teve lugar de 29 de dezembro a 1 de janeiro. Dança, música, encenações alusivas à época, comidas e bebidas, artes e ofícios, torneios de armas a cavalo e um cortejo histórico que retratou a cerimónia da entrega da Carta de Doação do Castelo ALGARVE INFORMATIVO #418

de Paderne por D. Dinis à Ordem de Avis, levaram os visitantes a experienciarem como era a vida quotidiana de uma aldeia no século XIV. “O Paderne Medieval

já é uma tradição nesta época do ano e um momento muito importante para a promoção de Albufeira, nomeadamente para o interior do concelho”, considera o presidente da Câmara Municipal de Albufeira, José Carlos Rolo . 26


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«CORRIDINHO DE MEM HISTÓRIA DO GRUPO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Luís Santos/José Barros/Grupo Folclórico de Faro

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MÓRIAS» CONTA A FOLCLÓRICO DE FARO

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oi lançado, no dia 12 de janeiro, «Corridinho de Memórias | Grupo Folclórico de Faro – Mais de 90 Anos a Dançar!», obra que pretende contar a história do mais antigo grupo de folclore do Algarve e um dos mais antigos do país, cujas origens remontam ao início dos anos 30. Nesta publicação, coordenada por Amabélio Pereira, juntaram-se à história do Grupo dezenas de testemunhos recolhidos junto de diversas personalidades e de atuais e antigos elementos, num livro que conta também com diversas fotos, ilustrações e recortes de imprensa alusivos às diferentes épocas e fases da longa vida do Grupo, assim como com uma galeria fotográfica com retratos captados por Luís Santos. O mais ancestral dos grupos de folclore do Algarve foi formado, em Faro, por Serafim Carmona, no início dos anos 30, e ALGARVE INFORMATIVO #418

teve como principal impulsionador Henrique Bernardo Ramos, grande figura do folclore algarvio que o liderou durante quase 40 anos. Começou por se chamar Rancho Regional Algarvio ou, simplesmente, Rancho do Algarve, por ser o único na região. Na época, o Corridinho era já considerado a expressão máxima das danças populares algarvias, a par dos Bailes de Roda e do característico «Baile Mandado». E, de facto, atingiu grande fama o virtuosismo dos seus tocadores e a habilidade dos bailadores nas «escovinhas» e «sapateados». Na sua génese estiveram muitos dos grandes acordeonistas que marcaram uma época, nomes como José Ferreiro Pai, António Madeirinha, José Massena Fialho (o «Céguinho da Luz»), José Padeiro, Armindo Barbosa, José Granja, Marum, entre muitos outros. As habilidades dos bailadores nas «escovinhas» e «sapateados» fizeram escola em todo o Algarve, com 36


«Pechalhá», «Rabinete», Miguel dos Santos, Leal, «Galinho», Carminho e os irmãos Fantasia a marcarem uma época na arte de dançar o corridinho. As «Noites Algarvias» lotaram o Coliseu dos Recreios em Lisboa nos anos 40 e 50, mas também não faltaram revezes e até paragens, devido aos anos mais duros da emigração que levaram muitos dos seus elementos para fora do país. Nos anos 60, o Grupo voltou a brilhar ao lado da saudosa Orquestra Típica de Faro

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e iniciou uma ativa participação na animação turística do Algarve. Nos anos 80 e 90, sob a direção de Fernando Fantasia, pisou os palcos de muitos dos mais importantes festivais de folclore organizados um pouco por todo o mundo e desde então nunca mais parou de representar o país nos quatro cantos do planeta. Por tudo isto, o Grupo Folclórico de Faro é uma referência obrigatória no panorama do folclore algarvio, sendo membro da Federação do Folclore Português, filiado no Inatel e um dos

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fundadores da Associação de Folclore e Etnografia do Algarve. Enquanto organizador do FolkFaro, é também membro do CIOFF Portugal – Conselho Internacional dos Organizadores de Festivais de Folclore e Artes Tradicionais, integrando igualmente os seus órgãos sociais. ALGARVE INFORMATIVO #418

Atualmente, o Grupo Folclórico de Faro possui quatro secções que abrangem cerca de 100 elementos: o grupo de dança adulto que interpreta, desde 1930, os característicos corridinhos, bailes de roda e baile mandado, numa tradição que se transmite de geração em geração; o 38


grupo infantil que permite aos mais pequenos recriar em palco as brincadeiras, as cantigas e as danças dos tempos dos seus avós, assegurando a continuidade do grupo com a formação de novos bailadores; o Cancioneiro, grupo de cantares populares e tradicionais que procura mostrar um 39

pouco da diversidade das raízes musicais do Algarve; e a escola de acordeão, que pretende dar um contributo para a formação de novos tocadores do instrumento-rei do Algarve. Para além de apresentações por todo o país, o Grupo tem vindo a participar em inúmeros festivais internacionais de folclore, tendo já efetuado deslocações a Espanha, França, Marrocos, Canadá, EUA, Itália, Brasil, Turquia, Suíça, México, Hungria, República Checa, Chipre, Grécia, Rússia, Eslovénia, Bélgica, Polónia, Argentina, Uruguai e Croácia. Participou em diversos trabalhos e publicações de carácter etnográfico, em desfiles e exposições de trajes e em várias edições discográficas. Considerado como uma verdadeira instituição da capital algarvia, o Grupo ALGARVE INFORMATIVO #418


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Folclórico de Faro foi distinguido pela Câmara Municipal de Faro, em 2002, com a Medalha de Ouro da Cidade. Em 2014 recebeu a Medalha e o Diploma de Mérito atribuídos pela União das Freguesias de Faro e, em 2015, recebeu o Prémio Figuras, atribuído pelo Teatro Municipal de Faro, pela realização do FolkFaro – Folclore Internacional Cidade de Faro. Em 2017, com a atribuição ao Grupo, pelo Município de Faro, do piso superior do edifício histórico do Solar do CapitãoMor, concretizou-se uma aspiração antiga do Grupo: a inauguração da sua Sede Social. Já em 2021 foi inaugurado um monumento de homenagem ao Grupo Folclórico de Faro, intitulado «O Corridinho», da autoria do escultor Carlos de Oliveira Correia, numa das novas rotundas da cidade. Uma riquíssima história, já se percebeu, que agora está perpetuada na forma de um livro, “uma necessidade que era sentida há já vários anos”, reconhece Amabélio Pereira. 41

“Produzimos uma primeira brochura em 1994, na sequência de um trabalho efetuado pelo Francisco Lameira, que foi a primeira pessoa a fazer alguma pesquisa sobre a história do Grupo e que foi publicada nos Anais do Município de Faro. Seguiu-se uma exposição em 1995 e, nessa altura, falou-se pela primeira vez na possibilidade de escrevermos um livro. Mas é daqueles projetos que vai sendo sempre adiado”, recorda o vice-presidente da direção do Grupo Folclórico de Faro.

Um passado riquíssimo e um futuro assegurado pelas novas gerações A inauguração da sede social do Grupo foi o momento decisivo para se pensar mais seriamente no livro e Amabélio ALGARVE INFORMATIVO #418


Pereira lançou mãos ao trabalho, com o ano de 2020 no horizonte, mas os planos foram adiados pela pandemia. “Ficou

toda a gente recolhida em casa, o livro ficou em stand-by, mas, ao invés de deixarmos cair o projeto, aproveitamos para o repensar. Decidimos que não deveria ser apenas a visão de quem o ia escrever, que seria mais bonito se incluísse as perspetivas de mais pessoas, e assim surgiu uma segunda parte da obra com cerca de 50 testemunhos”, descreve o entrevistado. “Falamos com o João Leal, o decano do jornalismo algarvio; com a Alexandra Rodrigues Gonçalves, porque foi a primeira vez que a Direção ALGARVE INFORMATIVO #418

Regional de Cultura do Algarve olhou para o folclore e para a cultura popular com «olhos de ver»; com o falecido Brito Figueira, que era responsável pela Sumol nos anos 60 e foi através dele que o folclore começou a ser apresentado nas unidades hoteleiras da região; com a Helena Louro, a madrinha do FolkFaro, entre outros”. A história do Grupo Folclórico de Faro estava bem documentada, mas estes testemunhos contribuíram, de facto, com novas perspetivas e uma visão multidimensional da importância desta instituição da cultura popular do Algarve. Porque, infelizmente, durante muito tempo se olhou para o folclore como um 42


parente pobre da cultura.

“Imaginemos que, por algum motivo, o Grupo se ia desfazer, perdia-se todo este historial. É bom que este conhecimento fique registado para a posteridade”, defende Amabélio Pereira, que não nega que o Grupo passou por uma série de transformações, como seria natural, ao longo de quase um século de existência.

“Houve evoluções e paragens, se calhar até alguns retrocessos e períodos de marcar o passo, mas os últimos 30 anos foram, sem dúvida, marcantes. De certeza que os fundadores do Grupo não imaginavam que, um dia, iriam organizar um festival internacional com a dimensão do FolkFaro. Hoje, viajamos por todo o mundo, trazemos colegas de todo o 43

mundo ao nosso evento, e nada disto estaria na cabeça de quem começou esta caminhada. Aliás, no início, nem tínhamos nome, eramos um grupo de tocadores de harmónio e pares dançantes do corridinho”, recorda, com um sorriso. Primeira foi a diversão, depois foi aumentando a responsabilidade, o nível de exigência, porque o Grupo Folclórico de Faro sempre foi rico em grandes tocadores e bailadores. “Essa

habilidade foi-se aperfeiçoando, a diversão deu lugar à técnica e à arte, o que nos granjeou um lugar central na história da região”, indica Amabélio Pereira, lembrando ainda que todos os elementos do grupo têm as suas próprias atividades profissionais ou são estudantes, o que torna ainda mais meritório este trajeto. “Só depois de ALGARVE INFORMATIVO #418


sairmos do trabalho ou da escola é que vestimos a pele de entusiastas do folclore e o dia só tem 24 horas. Não temos ninguém que faça isto a tempo inteiro, mas temos uma excelente equipa e, quando não vai um, vai outro. Somos uma direção de sete elementos, cada um com a sua área de responsabilidade e todos bastante ativos. É muita gente a trabalhar para o mesmo objetivo”, enaltece o coordenador do livro. De ir aos bailaricos sem qualquer responsabilidade, somente pela diversão, passou-se a atuar na hotelaria, a ser embaixadores da cultura popular, e depois apareceram os grandes palcos, as principais salas de espetáculos, os festivais internacionais, e tudo isso implica um espírito de enorme ALGARVE INFORMATIVO #418

profissionalismo, mas não só. “Cada

vez há mais estudo e investigação na nossa atividade. Antes, não havia a preocupação de se retratar algo do passado, era simplesmente diversão. Agora, sentimos a responsabilidade de salvaguardar a nossa cultura, as nossas tradições. Mas não somos um museu estático, a festa está sempre presente”, explica Amabélio Pereira, considerando que isso é fundamental para se cativar as novas gerações. “Se hoje temos o grupo

que temos, é porque foi feito um excelente trabalho, a partir de 2002, pelo Grupo Infantil, e antes disso com o projeto «Folclore nas Escolas». Esse viveiro é fundamental, porque incute logo, desde pequenos, a noção de 44


defesa do património, o gosto em dançar o corridinho e representar a nossa terra”. A pandemia abanou um pouco a estrutura, mas o Grupo Folclórico de Faro retomou rapidamente a sua velocidade de cruzeiro, 2024 arrancou da melhor forma com a publicação de «Corridinho de Memórias | Grupo Folclórico de Faro – Mais de 90 Anos a Dançar!» e mais projetos estão na calha, logo a começar por mais uma edição do FolkFaro e do Encontro de Folclore Cidade de Faro.

“Estamos crentes que, depois de nós, a próxima geração vai levar o Grupo ainda mais para a frente, até porque já estão a ocupar lugares de responsabilidade”, conclui Amabélio Pereira . 45

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TEATRO LETHES DEU A CONHE PARA O PRIMEIRO QUADRIM Texto: Daniel Pina| Fotografia: ACTA

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ECER A SUA PROGRAMAÇÃO MESTRE DE 2024

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ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve apresentou, no dia 13 de janeiro, a programação do Teatro Lethes para os primeiros quatro meses de 2024 e, ainda que limitados em alguns recursos, esta mantém o habitual padrão de qualidade e de relação com as diversas sensibilidades da comunidade que visita esta sala de espetáculos da capital algarvia. Nas novidades, há a destacar o acolhimento, pela primeira vez, da conceituada Companhia do Chapitô, ao passo que, na dança, atua Rocio Molina, grande inovadora do flamenco, e haverá uma residência artística com a Curiosoaplauso. No âmbito do Teatro Físico, de assinalar uma coprodução com o JAT, e prossegue a parceria com a ALGARVE INFORMATIVO #418

Orquestra do Algarve, para além de duas criações da ACTA sobre o tema do 25 de Abril. No dia 25 de janeiro, a Karlik Danza Teatro de Cáceres traz até Faro «El Pozo de Los Mil Demonios». “Todos nós que vivemos na Terra surgimos do barro, por isso, o nosso cântaro é como a nossa alma e devemos ter a certeza de que está sempre cheio para não secarmos”. Jacinta, a protagonista da história, ouvirá estas palavras da sua avó e, após o roubo do seu cântaro, terá que iniciar uma jornada de aprendizagem para se descobrir, superando obstáculos e dificuldades e assumindo a responsabilidade de salvar a si própria e a nós da seca. Uma jornada para também nos fazer participantes no reconhecimento da natureza como parte do nosso ser. 50


A 1 de fevereiro, a Orquestra do Algarve apresenta «Da Inglaterra para Portugal», um programa de concerto em forma de cruzamento. Por um lado, a criatividade dos britânicos Frank Bridge e Peter Warlock, ambos revisitando outras paragens musicais: um tema irlandês e velhas danças italianas. Por outro lado, Joly Braga Santos, o compositor que transpôs para música as paisagens lusas, com o seu segundo quarteto de cordas, obra de rara beleza e que merece sem dúvida audições mais frequentes. A 9 de fevereiro, inserido no 7.º Festival Internacional de Guitarra de Faro, pr0movido pela Associação de Guitarra do Algarve, sobe ao palco do Teatro Lethes o Duo Sírius, composto pelos talentosos guitarristas portugueses Diogo João e Márcio Silva, que conquistaram diversos prémios em 51

prestigiosos concursos, tanto nacionais quanto internacionais. Além disso, o público poderá desfrutar de um espetáculo incrível de música e dança intitulado «Cuarteto el Tango com Baile». A 17 de fevereiro atua Jean Christian Houde et le Quatuor des Reves Enfouis, coletivo luso-canadiano que une a indie folk à música erudita de forma harmoniosa. Jean-Christian Houde encontrou a sua paixão pela sonoridade folk tradicional canadiana na sua cidade natal, Quebec, e acrescentou elementos modernos, mantendo-se fiel às raízes de sua região. Isso aconteceu quando conheceu um grupo de talentosos músicos algarvios, designadamente, Sara Cymbron e João Castro nos violinos, Nuno Soares na viola e Ana Louisa no violoncelo, com quem quase de imediato estabeleceu uma química musical única. ALGARVE INFORMATIVO #418


O fado chega ao Teatro Lethes no dia 18 de fevereiro com «Valentim & (Outros) Amigos», da responsabilidade do experiente e conceituado músico Valentim Filipe. Poucos dias depois, a 23 de fevereiro, é a vez da Companhia Portuguesa de Bailado Contemporâneo apresentar «Apperception Plotline + Outono para Graça + Almada E TUDO!». «Apperception Plotline» explora a interação entre o olhar e o ver convidando à reflexão sobre o que nos prende a atenção. «Outono para Graça» é um comovente dueto originalmente criado para Graça Barroso em 1976, revisitado em 2018 em homenagem à grande bailarina, o eterno amor de Vasco Wellenkamp. «Almada E TUDO!» é uma coreografia inspirada no Manifesto AntiDantas de Almada Negreiros, trazendo à vida as palavras de Mário Viegas.

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A 29 de fevereiro regressa a Orquestra do Algarve com «Música a oito vozes». De todos os compositoresprodígio, Mendelssohn foi sem dúvida aquele que atingiu a maturidade mais cedo. Prova disso é o seu Octeto para cordas, obra máxima da literatura de música de câmara de todos os tempos, que o compositor escreveu com apenas 16 anos de idade. Neste concerto, apresenta-se esta música grandiosa, num programa que é complementado pela muito original e surpreendente música do contemporâneo Paul Trapkus, compositor norte-americano que se tem dedicado sobretudo à escrita para ensembles de cordas. A obra Sounds IV faz parte de um conjunto de peças para octeto e será a sua estreia em Portugal. No dia 2 de março, a Companhia do Chapitô leva a cena «Júlio César». Inspirados no imaginário popular das 52


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representações de Roma e da figura notável que foi Júlio César, explorando inconsistências históricas e tomando liberdades no tratamento de factos documentados, a desconsagração de outro monstro histórico. Se era ele um tirano que merecia morrer ou um herói brutalmente assassinado por ALGARVE INFORMATIVO #418

conspiradores, venha o Diabo e escolha. Aqui não há heróis nem vilões, há circunstâncias e gente ardilosa que faz pela vida. Também há gente menos ardilosa que faz o que lhes mandam. E gente virtuosa que faz o que tem de ser feito. Arrasamos todos por igual. Entre a reconstituição Histórica, o documentário 54


e a paródia, sai mais uma criação original da Companhia do Chapitô. Uma semana depois, a 9 de março, eis o flamenco com «Impulso Rocío Molina». Há um pequeno território, ou talvez seja um instante, onde o ato criativo é nativo, límpido e selvagem. Onde a mente não começou a perguntar, nem o ego a temer, nem a expectativa a acomodar nos ombros. Um tempo livre, intimidante por não ser domesticado, por ser apenas impulsão, energia sem nome, dramaturgia com apenas um nó, comunhão pagã de corpo a corpo, dança sem juramento. Rocío Molina abraça o pulsar, compartilhando sua fragilidade com o público nos singulares encontros chamados Impulsos, que oscilam entre a improvisação e a pesquisa artística.

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António Fonseca apresenta, a 14 de março, «Os Lusíadas como nunca os ouviu», um recital/aula/conferência dirigido aos alunos. Os Lusíadas conta a história da primeira viagem de Lisboa à Índia, feita há mais de 500 anos, por menos de duas centenas de portugueses, comandados por Vasco da Gama. Uma aventura empolgante capaz de nos fazer rir e comover pelas suas ressonâncias na nossa história individual e coletiva. Uma história verídica, reinventada por Camões, que reaviva alguns momentos mais significativos e dramáticos da História de Portugal. No dia 16 de março chega um habitual do Lethes, o Teatro das Beiras, desta vez com “A grande imprecação diante das

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muralhas da cidade». Fan Chun-Ting, mulher do pescador Hsueh Li, dirige-se à grande muralha de uma eventual China longínqua e perdida na memória do tempo para reclamar o marido, recrutado contra sua vontade para engrossar as fileiras dos exércitos do imperador. A muralha diverte-se com tamanha ousadia e propõe um jogo. Se a mulher identificar e provar que um dos soldados é o marido, poderá partir levando o homem consigo. Se o jogo nada provar, o soldado será morto e a mulher expulsa para além do rio. De 21 a 23 de março, a Scianema leva ao Teatro Lethes o Festival de Cinema Ambiental, dedicado ao oceano e à sua conservação. Cada edição é composta por uma seleção de documentários focados no mar, nos seus habitats e habitantes, e nas ameaças que estes enfrentam, com o intuito de inspirar e consciencializar sobre o nosso papel no grande planeta azul e promover 57

discussões abertas sobre cada tema apresentado. No Dia Mundial do Teatro, 27 de março, o Teatro Lethes acolhe «Viagem ao centro da Terra» pela Mákina de Cena. Otto Lidenbrock, professor de mineralogia excêntrico e autoritário, descobre um manuscrito antigo, escrito em rúnico. Axel, o seu devoto sobrinho, consegue decifrar a mensagem e vê-se arrastado para a maior aventura da sua vida. mal sabem eles que esta descoberta os levará até à Islândia onde, através da cratera de um vulcão, poderão descer até ao centro da terra. Inspirados no clássico de Júlio Verne, três adultos brincam com objetos, desdobrando-se em personagens e cenários, como quem mergulha na história de um livro, ao ponto de não se distinguir manipulado de manipulador. O teatro prossegue, a 11 de abril, com «Mary para Mary» da Companhia A Barraca. Mary Wollstonecraft (1759-1797), ALGARVE INFORMATIVO #418


pioneira do pensamento feminista, num tempo em que a própria ideia de igualdade era inadmissível, encontra-se gravemente doente após o parto, sofrendo de uma febre puerperal aguda. No delírio da febre, acredita estar dando uma conferência. O seu único público é a filha recém-nascida que virá a ser a aclamada escritora Mary Shelley, autora de um dos clássicos da literatura mundial: Frankenstein. Neste espetáculo Wollstonecraft diz à sua filha e a quantas mulheres e homens a escutarem: “Não permitas nunca que te façam comer o pão amargo da dependência. Luta, luta para seres tu própria. E não temas nunca o que os outros possam pensar”. De 23 a 28 de abril há Ensaios Abertos com «Diálogo do Penitente e do Arrependido» pela ACTA, que com este projeto aborda um método de trabalho em que o público assistente, ao mesmo tempo que é informado dos aspetos ALGARVE INFORMATIVO #418

dramatúrgicos inerentes à trama e os discute, é convocado a participar no estabelecimento final da narrativa dramática e da própria encenação. Em causa está o reencontro de um ex-Pide com o militante político que ele torturou: um protagonista improvável que se arrasta numa via-sacra de remorsos e um perdedor desencantado em constante negação de si próprio. Pode um torturador arrepender-se? Pode um torturado perdoar? A par da programação, o Projecto Incorpora de Filipa Rodrigues continua a ministrar aulas de dança contemporânea, teatro e criação coreográfica, Elsa Palmeira é responsável por aulas de ballet e dança contemporânea para crianças e a Panapaná dá aulas de expressão dramática, pelo que não faltam motivos para frequentar o Teatro Lethes ao longo de 2024 . 58


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«O MEU AMIGO H» DO CINETEATRO LO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

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» SUBIU AO PALCO OULETANO

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Cineteatro Louletano levou a cena, no dia 12 de janeiro, uma coprodução que envolve igualmente o Centro Cultural Vila Flor, de Guimarães, o Teatro José Lúcio da Silva, em Leiria, a Culturgest e a Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão. «O Meu Amigo H» tem origem no texto de Yukio Mishima, com adaptação de Albano Jerónimo, Cláudia Lucas Chéu e Ricardo Braun e que conta com Albano Jerónimo num dos papéis, a par de Pedro Lacerda, Rodrigo Tomás e Ruben Gomes. «O Meu Amigo H» é uma peça intensa sobre o poder, a manipulação, a brutalidade do ser humano e a corrupção. Depois de ser eleito líder do país e ter neutralizado todas as forças que se lhe opunham, H. tem a possibilidade de ALGARVE INFORMATIVO #418

aumentar ainda mais o seu poder, pois o Presidente atual está às portas da morte e, com o apoio das Forças Armadas, H. pode suceder-lhe. Mas dentro do Partido há quem veja as Forças Armadas como uma relíquia do passado, uma instituição reacionária, corrupta e anquilosada. O futuro do país para o capitão do exército de arruaceiros, o número dois do Partido, velho amigo de H., depende da força do seu exército pessoal e não das Forças Armadas. O seu exército de três milhões de homens tornou-se a verdadeira força armada do país e H. teme o descontrolo deste exército, um grupo de arruaceiros e bêbados que controlam o país pelo terror. Teme-o também porque, caso se associe a ele, o exército pode fazê-lo cair. Ao mesmo tempo, o intelectual do Partido, próximo dos trabalhadores e das estruturas sindicais, pode ser também um perigo para H.. 64


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A solução, para satisfazer as chefias das Forças Armadas e os industriais que o financiam (entre os quais está o magnata do ferro, defensor das Forças Armadas e da guerra que o enriquece), é acabar com ambos esses perigos, ou seja, matá-los. Na Noite das Facas Longas, o militar, o intelectual sindicalista e centenas de outros membros do Partido foram assassinados, o exército foi extinto e a situação controlada. “O resto já sabemos ou já o esquecemos?”. A questão levantada por Mishima, sobre os corredores do poder, nesta peça tão calculista, pode hoje ser colocada desta forma: o que pode um Regime fazer quando aqueles de quem precisou, aqueles que manipularam as massas em seu favor, se tornam incómodos? O Regime não sobrevive sem a multidão, é certo, mas tem lugar para intermediários ou precisa de ser ele, no fim de contas, a controlá-la? . ALGARVE INFORMATIVO #418

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LURA APRESENTOU NO CINETEATRO LO Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

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U «MULTICOLOR» OULETANO

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o dia 13 de janeiro, o Cineteatro Louletano recebeu a visita de uma das cantoras caboverdianas mais requisitadas da atualidade, Lura, com o seu «Theater Sessions», concebido para uma tour europeia de teatros que arrancou a 2 de outubro em Paris, passou pelo Centro Cultural de Belém em Lisboa e chegou agora a Loulé. Este novo espetáculo de Lura inclui canções emblemáticas da sua carreira, ALGARVE INFORMATIVO #418

homenagem a artistas que admira e ainda temas de «Multicolor», o seu mais recente álbum, lançado no final do Verão de 2023 através da editora francesa Kuroneko. E o público algarvio teve oportunidade de descobrir abordagens diferentes à sonoridade desta enorme artista, livre de fronteiras estilísticas e geográficas, mas com identidade e origens bem firmadas. Porque «Theater Sessions» é uma celebração da cultura lusófona, pela inconfundível voz de uma cantora cujo coração balança entre Portugal e Cabo Verde, unindo as duas culturas através da música . 82


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25.ª MOSTRA DE ARTIS VILA DO BISPO PATENTE Texto: Daniel Pina| Fotografia: Daniel Pina

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STAS DO CONCELHO DE E ATÉ 29 DE FEVEREIRO

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oi inaugurada, no dia 14 de janeiro, no Centro de Interpretação de Vila do Bispo, a 25.ª Mostra de Artistas do Concelho de Vila do Bispo. A exposição apresenta trabalhos de 72 artistas locais onde são exploradas diversas temáticas, técnicas e suportes, nomeadamente na área da pintura, desenho, fotografia, linhas e pontos tradicionais, filme, impressão, artes decorativas, escultura, instalação e linogravura, num total de 10 dimensões artísticas, umas mais contemporâneas, outras mais artesanais, mas todas plenas de autenticidade. Na pintura estão presentes trabalhos de Anabela Mateus, Dinis Nunes, Élia Sobral ALGARVE INFORMATIVO #418

Henriques, Fernando Varela, Isabelle Rousseau, José Eduardo Ribeiro, Jo Alice Braswell, Maria Dulce Margarido, Ramona Hartlieber, Vilma Vicente, Maria Leonor Salazar e João Nunes Correia; no desenho participa Vítor Cláudio Fragoso; na fotografia, Margot Köllges, Rolf Henkel e Viveka Feder; nas linhas e pontos tradicionais, Anabela Conceição, Angelina Fragoso, Aurora Alves Marreiros, Bibiana Paula dos Reis, Dina Rosado, Elisabeth Thiessen, Gracinda Pedro, Judite Marreiros, Juliet da Silva, Lisete Marques, Maria Amelia Sequeira, Maria Francisca de Oliveira, Maria Francisca Rodrigues, Maria Graciete Batista, Maria Rita Guilherme, Marisole Buff, Natália do Rio, Tatiana Palma, Ana Paula de Oliveira e Maria José Lopes; no filme, Beatriz Cardoso & Patrícia Leal, na 98


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impressão, Daniela da Silva Ferreira; nas artes decorativas, Carlos Alberto Figueiras, Emílio José Ribeiro, José Manuel Estácio, Maria Joaquina Cartaxo, Maria Lopes Encarnação, Maria Lucinda Ferro, Marília Amélio, Martin Normann Denkel, Samuel Inês, Vicente Luz da Encarnação, Teresa Silvestre, Maria Paula Correia, Margarida Encarnação, Maria Júlia Cintra, Maria Fernanda Dias, Isaura Pinheiro, Maria Camila Marreiros, Maria de Fátima Clímaco, Olinda Prata, Ana Júlia Louçã, Maria José Beles, Piadade Novais e Dália Lopes; na

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escultura, Joaquim Valério Reis, Helena de Medeiros, Tineke Smit, José Luís Gomes, Mário Soares e Mário Miranda; na instalação, João Paulo V. Correia, Manuela Caneco & Bertrand, Nuno Araújo e Sven Neubauer; na linogravura, Maria Grigorienvna Nekh. A iniciativa promovida pela autarquia pretende contribuir para a divulgação e promoção dos trabalhos criativos realizados pelos artistas do concelho e estará patente ao público até 29 de fevereiro .

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«La Famiglia» Paulo Cunha (Professor) endo estado de férias com a família em Milão, a maioria das refeições, naturalmente, foram efetuadas nalguns dos múltiplos e variados estabelecimentos de restauração da cidade. Como não poderia deixar de ser, privilegiámos os restaurantes especializados na comida italiana. Não houve, por isso, muitos pratos de massa e de pizza que não tivéssemos experimentado e degustado. Houve um restaurante, no entanto, que se destacou dos outros, não tanto pela qualidade da comida (que a tinha!) mas pelo trato, profissionalismo e afabilidade dos funcionários com quem tivemos o prazer de contactar. Depois de muito calcorrearmos as apinhadas ruelas de Navigli para tentar descobrir um restaurante o menos turístico possível, não muito longe descobrimos um onde os cânticos e vivas na língua materna indiciavam haver uma qualquer comemoração de aniversário. Logo à entrada, o forno de lenha presenteava e espalhava pelo amplo espaço o aroma a pão acabado de fazer. Cativou-nos o sorriso franco e as boasvindas dadas num italiano melodioso e respeitoso pela (viemos a saber) gerente/dona do estabelecimento. Depois de termos combinado a língua de comunicação e de menu (o inglês), ALGARVE INFORMATIVO #418

encomendámos o repasto a um solícito e simpático funcionário. Sabendo da tradição vitivinícola de Itália, quisemos acompanhar a refeição com um vinho da região da Lombardia. Depois de escolhido um tinto que aparentava uma boa relação preço/qualidade, o funcionário alertou-nos que o vinho possuía características frisantes. Tendo reparado na minha expressão facial, imediatamente se ofereceu para recomendar um vinho da sua região natal, a Sicília. Ao contrário do que seria de esperar, trouxe um que não estava na carta de vinhos, exatamente pelo mesmo preço, não se aproveitando de sermos turistas para assim inflacionar a refeição. O jantar fluiu e a deferência e a simpatia com que o mesmo tratava os clientes, a maioria autóctones, mereceu da nossa parte a melhor atenção. Tendo-se, inclusive, oferecido para registar o momento em fotografia, naturalmente expressei-lhe a minha satisfação pelo decorrer da refeição, referindo a diferença com o que tínhamos vivenciado quanto ao entendimento nos dias anteriores. Perentória e orgulhosamente, respondeu-me num italiano carregado e pleno de significado: “Siamo tutti una famiglia!”. Sendo a comemoração do vigésimo quarto ano de namoro com a minha mulher, foi com agrado que, para além do serviço de mesa pago à parte, merecidamente, gratifiquei o 110


Foto: Daniel Santos

profissionalismo, a entrega e a simpatia duma família que através dos «comes e bebes» dignifica a cultura de um país. No fundo, é esse o meu conceito de família: um coletivo de pessoas que para além de terem ancestrais comuns, laços de parentesco, afinidade ou adoção, agem em conformidade, desempenhando um papel crucial na formação e desenvolvimento dos indivíduos e proporcionando apoio emocional, social e económico sempre que necessário. 111

Para além das famílias poderem variar culturalmente e extravasarem o conceito de família de sangue, as relações familiares podem ser complexas e multifacetadas, envolvendo várias dinâmicas comportamentais. É importante salientar que o conceito de família está em constante evolução, refletindo mudanças nas estruturas familiares e nas normas sociais. A compreensão e a valorização da família variam amplamente ao redor do mundo, por isso, tendo estado na Itália a degustar um «rosso» siciliano, lembrei-me dos pilares desta região autónoma tão comummente associada ao berço da máfia (cosa nostra): a centralidade da família, a grande extensão familiar, as tradições e celebrações familiares, o respeito pelos anciãos, a culinária e reuniões em torno da mesa, a solidariedade familiar, as tradições religiosas e a honorabilidade e reputação familiar. No fundo, são estes os alicerces de vida daqueles que prezam e defendem a família como um garante de bem-estar, paz, prosperidade e felicidade. Garantidamente, são esses os meus valores. Daí sentir que, para além do sangue, tenho várias famílias. E vós, achais e sentis o mesmo? . ALGARVE INFORMATIVO #418


Nonagésima tabuinha - Grand Rex (II) Ana Isabel Soares (Professora) (Continuação da crónica 89.) a hora exata não me recordo – seria a meio da tarde, era dia pleno (era Primavera). Desde logo, surpreendeume e alegrou-me que ainda houvesse bilhetes; assim que entrei para a sessão, ao ver a dimensão da sala, boquiaberta, imaginei que a lotação seria de um ou dois milhares de espectadores. Não me lembro de ter aguardado muito tempo fora da sala; lá dentro, sim, ficaram-me na ideia os bons minutos (15?, 20?, mais?) que a plateia esperou pelo começo: primeiro, com os anúncios publicitários e, finalmente, com o filme propriamente dito. Sentada no meio daquela plateia gigantesca, sentiame como num estádio de futebol (espaço a que não estou acostumada) em dia de grande final; mas, ao contrário do que imaginava ser a sensação de comunidade num jogo (ocupando lugares do lado de apoiantes que se imaginam ser do mesmo clube), ali tinha a ideia – demasiado errada, claro, mas absurdamente persistente – de ser eu a única fã do filme. Só eu tinha tido a ideia de ali ir, disso – clemência… – não tinha a mínima dúvida. Até estava disposta a aceitar a ideia de que cada uma das outras pessoas da sala se sentisse assim, mas não havia corpo único, pensamento comum, ou ligação entre cada um dos que se sentavam na sala maior do Grand Rex naquela tarde. ALGARVE INFORMATIVO #418

Que ali estivessem ver o mesmo filme que eu entrei para ver parecia ser uma simples coincidência: ninguém olhava para ninguém e aquela mole de gente pareciame só um conjunto desconjuntado. Não é assim que a experiência da sala de cinema funciona (ou costumava funcionar...)? A sala maior do Grand Rex, inaugurado em 1932 e desde 1981 um dos monumentos históricos classificados em França, ocupa 2 mil metros quadrados; tem lugar para mais de 3 mil espectadores (3 mil e 300 é o número oficial). Com a moda dos multiplexes (e antes da invasão do vídeo caseiro), foram inauguradas no edifício do Rex mais três salas em 1974, que dez anos depois passaram a sete e, a partir de 1990, a oito. Mas estas novas salas foram sendo acrescentadas à sala grande, construídas a partir de reformulações de antigos camarins e espaços de ensaio. A grande ficou intocada e quando lá entrei, no começo deste século, era eu mais umas 3 mil almas – pelo menos, eu não diria que as cadeiras vazias fossem mais de duas ou três centenas. O meu lugar era um pouco abaixo de meio: escolhera uma zona que não fosse nem demasiado longe (não vejo bem) nem demasiado perto do écran (para conseguir captar toda a imagem sem ter de me encostar para trás ou girar a cabeça). O pior foi que, quando entrei e me sentei (a meio de uma fila que aos meus olhos era interminável, e seguindo 112


Foto: Vasco Célio

em pequenos choques com outros espectadores, entretanto sentados – quase tudo homens, lembro-me de ter reparado nisso), passavam na tela anúncios publicitários que nem que me curvasse completamente para trás conseguia ver em toda a extensão da tela. Maldisse-me a sorte, pensando que, dali, não seria capaz de abarcar as grandes paisagens das Filipinas-Vietname que Coppola transformou em obra-prima. Sentia-me, na mesma medida, em êxtase e frustração. O êxtase era devido àquela oportunidade imprevista de ver um dos meus filmes favoritos (numa versão nova que viria a confirmar-se um outro filme, igualmente genial), para mais sem saber que o veria numa das salas mais extraordinárias onde jamais estive. A frustração vinha daquele lugar preciso: apesar de ter, desde onde estava até à 113

tela, umas 30 filas (pelo menos) à minha frente, era incapaz de ver confortavelmente toda a imagem. Assim pensava eu – pois, mal terminou a publicidade abriu-se a cortina sobre a tela e, muito mais à frente, acertadas as margens do enquadramento, surgiu o verdadeiro écran: chama-se, apropriadamente, «Le Grand Large» e é ainda hoje a maior tela de cinema de França: eleva-se a 12 metros sobre uma base de 25 metros. Muito confortavelmente sentada, agora reconfortada, conseguia abranger a imagem de um extremo ao outro. Mas a maior surpresa estava ainda por chegar. (Continua na próxima semana, tende paciência) .

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Valorizar e desenvolver as regiões do interior: uma prioridade para Portugal Fábio Jesuíno (Empresário) s regiões do interior são essenciais para o crescimento sustentável e duradouro de Portugal. A sua valorização e desenvolvimento são fundamentais para garantir o equilíbrio territorial e a coesão social, bem como para promover o desenvolvimento económico e social do país. Em Portugal, a concentração populacional é elevada, com metade da população a residir em dois grandes centros urbanos, Lisboa e Porto, que representam apenas 5 por cento do território. Nos últimos 10 anos, esse desequilíbrio aumentou, com os municípios do interior a perderem população em favor dos situados no litoral. Nos últimos anos, os governos têm promovido uma política de coesão territorial para valorizar o interior do país. Essas medidas incluem incentivos para atrair investimentos empresariais, como a fixação de empresas, o aumento da produção, a promoção do empreendedorismo e a atração de talento qualificado. Os municípios do interior também têm desenvolvido iniciativas próprias de valorização e desenvolvimento, desde a promoção da cultura e do turismo, até a atração de ALGARVE INFORMATIVO #418

empresas e investimentos. Mesmo com orçamentos limitados, esses municípios têm conseguido bons resultados. As regiões do interior têm um grande potencial, que deve ser valorizado. A qualidade de vida é um dos seus principais destaques, proporcionada pela qualidade ambiental, maior mobilidade, um melhor equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Outros fatores importantes são o custo de vida mais baixo, mais segurança, educação com mais qualidade e uma maior socialização. A valorização e o desenvolvimento das regiões do interior passam pela criação de condições tecnológicas e de acessibilidades. A cobertura de internet é um fator fundamental na atualidade, sendo uma lacuna que inviabiliza a fixação de pessoas no interior. A melhoria da cobertura móvel através de incentivos para a instalação de antenas é uma solução para este problema. As acessibilidades são outro desafio, sendo fundamental a criação de novas estradas e melhorias das existentes, bem como a aposta na ferrovia, como forma sustentável de transporte. A coesão territorial é um fator determinante para o desenvolvimento sustentável . 114


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A chegada: no dorso do dragão Dora Gago (Professora) hega-se a Macau, a chamada «Las Vegas do Oriente», depois de 27 horas de viagem, uns emplastros nas costas, curvada devido a fortes dores que começaram a habitar o corpo na véspera. Curvada sob o peso do futuro, da incerteza, da dor teimosa, das malas. Noite avançada, fim dos festejos do Ano Novo Chinês, conhecidos por implicarem a maior movimentação de pessoas do planeta. Chego montada no dorso do Dragão. Procuro, receosa, alguma torre onde possa ficar cativa, mas o que vejo é o turbilhão de gente, de malas. Ao contrário do bafo quente das visitas anteriores, desta vez é a humidade fria que me lambe a pele, que se me cola aos ossos. Um frio que, contrariamente ao que é normal, se prolongará até Abril, agasalhado por nuvens de aço. Também ainda não sei que em fins de Março verei uma nesga de céu azul durante meia hora e ficarei pasmada a olhar para cima, até essa pequena fresta ser devorada pela boca cinzenta das nuvens. Saberei que também a solidão é feita de um aço frio, afiado, que ceifa os dias como se fossem searas. No átrio do terminal reina o caos, não há sequer tapete rolante. As malas chegam empilhadas em contentores e uma massa de gente atira-se contra elas, ALGARVE INFORMATIVO #418

como enxame a árvore florida. Afasto-me da confusão para não ser esborrachada pelos passageiros sedentos das suas bagagens, num apurado sentido de civismo que faz empurrar, espezinhar, como se o «outro» fosse transparente. No meio da turba, reconheço um rapaz muito alto, vindo no meu voo e suponho que a minha mala talvez esteja perto das dele. Tomo-o como minha bússola e resulta. Resgatada a pesada mala, rastejo para mais de uma hora na fila para o táxi, dissolvida no meio de uma multidão. Entretanto, a adrenalina (ou a naftalina, como disse um dia um certo jogador de futebol) a subir, com a incerteza, o receio de não ser entendida pelo taxista. Trago o nome da Universidade escrito em caracteres chineses, o mapa assinalado, a foto, enfim, que mais poderia trazer? Como sempre, ninguém à minha espera. Desta vez, vou ficar alojada num apartamento na Universidade. Perguntome se à uma da madrugada conseguirei encontrar e comunicar com o mítico segurança incumbido de me dar a chave. Bem podia apanhar boleia no dorso do tal Dragão, sempre poupava tempo. Chega a minha vez, os desenhos, os caracteres e fotografias resultam. O táxi deixa-me na Universidade, junto a uma escadaria, mas sem qualquer vestígio da cabine do tal guarda. Ainda peço indicações a uns rapazes, provavelmente estudantes, com quem tento comunicar em inglês, sem resultado, depois por gestos. Eles, muito 116


gesticulo, tentando falar todas as línguas aprendidas e imaginadas, na esperança de lhe acender a luz do entendimento. De repente, caído do céu, talvez à boleia do dito Dragão, aparece o secretário do departamento de Português, que pede a chave e me acompanha ao apartamento.

desconfiados com o meu desesperado teatro, terão percebido tudo ao contrário e indicam-me que suba a escadaria – proeza notável, após mais de um dia de viagem, muitas horas sem dormir, dores nas costas e… uma mala com mais de 25 quilos. A parte positiva é que, do ponto mais alto, consigo ver a tal cabine onde se aloja o guarda, na parte de baixo. Deslizo pela escada, novamente com a «naftalina» no auge, desta vez a tentar prever como comunicar com o guarda, explicar-lhe que quero a chave de um apartamento. Quantas ocidentais estranhas lhe irão pedir uma chave às duas da madrugada? Em desespero, 117

Desta vez, não há sequer nenhuma couve, nem alface com as quais possa lutar de fachis em riste. Mas há uma chaleira e pacotes de chá. Encho-a de água, acendo o fogão. Vou para o quarto enviar mensagens para dar sinais de vida à família, aos amigos mais próximos. De súbito, ouço buzinar e penso que talvez sejam ainda as comemorações ou algum protesto. Mas... de madrugada? Enfim, são hábitos. A buzina continua, cada vez mais estridente, numa histeria descontrolada com cheiro a queimado. Corro para a cozinha. A chaleira envolta numa nuvem de fumo negro arde, como se o meu amigo Dragão tivesse ali entrado, fazendo das dele. Nem por um momento me ocorreu que as chaleiras apitam quando a água ferve, nem que o buzinão podia acontecer ali, junto a mim, dentro do apartamento. E perguntei-me: quantas vezes procuramos lá fora as causas ou as soluções para os problemas que, afinal, se desenrolam apenas dentro de nós, das nossas próprias «cozinhas» interiores? . ALGARVE INFORMATIVO #418


Balanços e balanças Sílvia Quinteiro (Professora) hegados os últimos dias do ano, fiz, como é hábito, um balanço dos últimos 12 meses. A organização é fundamental nestas coisas, por isso criei duas pastas: «Para lembrar» e «Para esquecer». Na pasta das memórias positivas arquivei, entre outros, os melhores momentos; as gargalhadas; os projetos bem sucedidos; as viagens; as excelentes leituras e os grandes concertos; o cão que se juntou à família. A pasta daquilo que deixo para trás guarda as tristezas; as lágrimas; as mágoas; as ideias menos brilhantes; as pessoas que seria bom nunca ter conhecido e, até mesmo, alguns eletrodomésticos que teimaram em infernizar-me a vida. Mas o que interessa é que está tudo organizado. Tudo arrumado nas respetivas pastas e o ciclo fechado. Entrou o novo ano. Terminadas as férias de Natal, há que enfrentar a rotina. Janeiro. O longo e penoso janeiro. Um deserto cinzento e sem fim à vista. Regresso ao trabalho com a leveza de quem adormeceu depois do almoço, mal acomodado, num sofá minúsculo, e acorda já de noite sem saber onde está. Desembrulho-me aos poucos. Tem de ser.

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Luzes, sacos de presentes, laços coloridos, jantares a escorrer gordura, arroz doce, filhoses e empanadilhas; açúcar disfarçado de lampreia… Já passou. Hoje, entro às 8h30. Roupa escolhida em cima da cama. Banho. À saída, o sempre temido e adiado encontro com as consequências dos excessos da época. Subo a medo. Exagerada, esta balança! Muito exagerada! Mudo de posição. Pé direito mais para a frente. Pé esquerdo mais para o lado. Talvez unindo os pés? Atando o cabelo? Igual! Desço. Volto a subir. Volto a descer e volto a subir. Não sai dali. Maldito feitiozinho! Percebo que só me resta uma solução. Recupero na minha mente a pasta «Para esquecer», abro-a e resgato uma senhora que ali coloquei por usar a frase: “⎼ Existe a minha verdade e a tua verdade!”. Também a ela, quando colocada perante factos que negavam a sua vontade, não houve acrobacia que lhe valesse. Dobrouse, desdobrou-se, fez o pino, quase desatarraxava a cabeça e nada. Restoulhe a saída que neste momento de desespero me parece uma extraordinária tábua de salvação. Ah, como a compreendo agora! Olho para a balança com ar desafiador. Volto a subir. Espero um pouco. Pode ser que ainda vá ao lugar. Nada. Não cede nem em 100 118


gramas. Inflexível. Insolente. Olho-a de cima para baixo e atiro-lhe: “⎼ Existe a minha verdade e a tua verdade!”. Aguenta-se. Não está aberta ao diálogo. Retiro-me indignada com a petulância da maquineta. Empurro-a com o pé para debaixo de um armário. Fica ali a refletir até as nossas verdades se alinharem. Há que acelerar. O relógio é tão indomável quanto a balança. Dirijo-me ao quarto. Enfio o vestido e tento apertar o fecho. Em vão. Novo vestido e mais um fecho que teima em não subir. Metade do guarda-fatos está solidário com a balança. O resto tem elásticos. É a sorte.

pequeno-almoço sem pão e sem manteiga. Bebo um copo de água para ajudar a deglutir os factos e devolvo a tal senhora à respetiva pasta. É definitivamente para esquecer. Perante os factos, não há contorcionismo que faça valer o que gostaríamos que fosse verdade. Enfiada como posso num vestido amplo, uns brincos vistosos a afastar o olhar das ancas onde se acumulam as evidências, agarro as chaves e preparome para sair. Abro a porta e mudo de ideias. Volto rapidamente atrás. Dirijome à minha inimiga e retiro-lhe as pilhas. Posso até não ter razão, mas tenho a última palavra .

Engulo «a minha verdade» com um 119

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O pão nosso de cada dia Lina Messias (Especialista em Feng Shui) ilha, neta, bisneta, trineta e tetraneta de alentejanos, cresci com todas as tradições que fazem parte desta identidade cultural. Uma delas é o pão! Nas histórias contadas pelos meus avós, percebi a importância que o pão assumiu na sobrevivência de gerações em que a escassez era «normal». Histórias de jornas de trabalho no campo «de sol a sol», intervaladas por duas refeições: o jantar (agora almoço) e a merenda. As refeições eram levadas para o campo e o pão era o elemento obrigatório e atrevo-me a dizer, sagrado. Recordo-me de ouvir falar de açordas só com alhos e coentros, migas de azeite e alho, tibornas, e pão com conduto (queijo, chouriço e outros). A escassez tornou este povo extraordinariamente criativo na hora de confecionar as suas refeições e, ainda hoje este produto faz parte da ementa de qualquer restaurante com comida alentejana, desde a tasca do Sr. Manel, ao espaço mais requintado e exclusivo. Na minha infância e adolescência todas as refeições tinham pão. Tudo o que era feito numa panela, era acompanhado pelas «sopas» desse caldo. Todos os pequenos almoços e todos os lanches ALGARVE INFORMATIVO #418

eram compostos por pão. Todos os domingos acordava com o cheiro das fatias douradas. No Verão todas as semanas havia um gaspacho, no Inverno todas as semanas havia uma açorda! Sempre conheci a minha avó e a minha mãe a pedirem perdão a Deus quando, muito raramente, era preciso jogar ao lixo um pouco de pão, tal era a importância que este produto tinha. A história do pão remonta a mais de 10 mil anos atrás, quando os seres humanos fizeram a transição da vida nómada para a agricultura sedentária. A descoberta acidental da fermentação, essencial para a produção de pão, transformou simples grãos numa fonte de alimento mais duradoura, nutritiva e fácil de transportar. Essa revolução alimentar permitiu que as comunidades crescessem e se estabelecessem de maneira mais eficiente, criando as bases para as civilizações antigas. Em diversas culturas, o pão assumiu significados simbólicos e rituais. Na tradição cristã, por exemplo, o pão é central na Eucaristia, representando o corpo de Cristo. No Antigo Egito, o pão era considerado tão vital que até mesmo os trabalhadores construtores das pirâmides recebiam cotas diárias como parte da sua remuneração. Esses exemplos ilustram como o pão transcende a sua função alimentar, 120


desempenhando papéis fundamentais na espiritualidade e na organização social.

está distorcido e afastado da sua mais bela essência.

Além do seu impacto cultural e económico, o pão também influenciou a saúde e nutrição das populações ao longo da história. A falta de pão, por outro lado, historicamente esteve ligada a períodos de escassez, fome e descontentamento social.

O que devia ser feito com uma boa farinha, água, uma pitada de sal, a fermentação adequada e muito AMOR, agora tem tantos aditivos em forma de «E`s» e outros ingredientes que em nada honram a sua simplicidade e sacralidade.

Como boa «descendente» destas tradições, custa-me assistir a este crescente movimento que trata o pão como nosso «inimigo»! Dietas sugeridas onde o pão é proibido, famílias inteiras que o aboliram das suas casas, mil e uma derivações do verdadeiro pão que enchem as prateleiras dos supermercados. O elemento sagrado tão importante na história da humanidade, 121

Se vier à minha casa partilhar uma refeição, não espere encontrar pão de cenoura, de malte, de alfarroba, de sementes, de forma, de batata, de nozes¸ de abóbora, de leite, de chocolate ou de aveia. Aqui comem-se torradas de pão com manteiga das vacas felizes, aqui come-se pão quente com queijo e enchidos alentejanos, aqui há pão que se molha no caldo do guisado, aqui come-se PÃO! . ALGARVE INFORMATIVO #418


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DIRETOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina (danielpina@sapo.pt) CPJ 3924 Telefone: 919 266 930 EDITOR: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 67, 8135-157 Almancil SEDE DA REDAÇÃO: Rua Estrada de Faro, Vivenda Tomizé, N.º 67, 8135-157 Almancil Email: algarveinformativo@sapo.pt Web: www.algarveinformativo.blogspot.pt PROPRIETÁRIO: Daniel Alexandre Tavares Curto dos Reis e Pina Contribuinte N.º 211192279 Registado na Entidade Reguladora para a Comunicação Social com o nº 126782 PERIODICIDADE: Semanal CONCEÇÃO GRÁFICA E PAGINAÇÃO: Daniel Pina FOTO DE CAPA: Daniel Pina A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista regional generalista, pluralista, independente e vocacionada para a divulgação das boas práticas e histórias positivas que têm lugar na região do Algarve. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista independente de quaisquer poderes políticos, económicos, sociais, religiosos ou culturais, defendendo esse espírito de independência também em relação aos seus próprios anunciantes e colaboradores. A ALGARVE INFORMATIVO promove o acesso livre dos seus leitores à informação e defende ativamente a liberdade de expressão. A ALGARVE INFORMATIVO defende igualmente as causas da cidadania, das liberdades fundamentais e da democracia, de um ambiente saudável e sustentável, da língua portuguesa, do incitamento à participação da sociedade civil na resolução dos problemas da comunidade, concedendo voz a todas as correntes, nunca perdendo nem renunciando à capacidade de crítica. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelos princípios da deontologia dos jornalistas e da ética profissional, pelo que afirma que quaisquer leis limitadoras da liberdade de expressão terão sempre a firme oposição desta revista e dos seus profissionais. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista feita por jornalistas profissionais e não um simples recetáculo de notas de imprensa e informações oficiais, optando preferencialmente por entrevistas e reportagens da sua própria responsabilidade, mesmo que, para tal, incorra em custos acrescidos de produção dos seus conteúdos. A ALGARVE INFORMATIVO rege-se pelo princípio da objetividade e da independência no que diz respeito aos seus conteúdos noticiosos em todos os suportes. As suas notícias narram, relacionam e analisam os factos, para cujo apuramento serão ouvidas as diversas partes envolvidas. A ALGARVE INFORMATIVO é uma revista tolerante e aberta a todas as opiniões, embora se reserve o direito de não publicar opiniões que considere ofensivas. A opinião publicada será sempre assinada por quem a produz, sejam jornalistas da Algarve Informativo ou colunistas externos. ALGARVE INFORMATIVO #418

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