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Vivência quaresmal: jejuar, dar esmola e rezar

Todos os anos, com a finalidade de nos preparar para a Páscoa do Senhor, sinal sacramental da nossa conversão, vivemos um período litúrgico de 40 dias. O Tempo Quaresmal, por meio da autenticidade dos gestos, traz sentido e nos liberta de um ritualismo vazio. Almejamos um Deus salvador e libertador: “Foi para a verdadeira liberdade que Cristo vos libertou” (Gl 5,1), e recebemos como maior sacrifício a morte de Jesus. Com essa certeza, temos um Cristo que vem ao nosso encontro, nos oferecendo o seu coração de irmão e a sua mão protetora e misericordiosa.

Os bispos da Arquidiocese de Braga, Portugal, escrevem: “Amados irmãos e irmãs, a Quaresma apresenta-se diante de nós com uma tenda desprovida de cobertura, como que despojada de qualquer amor, desabitada pelas fragilidades humanas, tantas vezes pelo pecado que insiste em despir-nos. Aparentemente há nessa tenda despida um vazio de Deus, como que se Deus nunca nos tivesse visitado”. Nós batizados, somos convidados a revestir essa tenda, tornando-a um espaço de missão e experiência fraterna.

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A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) propõe pela 60ª vez, desde 1964, a Campanha da Fraternidade, uma expressão de conversão, comunhão e partilha. Nesse ano de 2023 a Campanha tem como tema “Fraternidade e Fome” e o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16). O Papa Francisco nos pede para não cedermos à cultura da indiferença, não existindo vida em plenitude onde falta alimento básico para vida digna. A fome afronta diretamente a Doutrina Social da Igreja (DSI), uma vez que, os bens criados por Deus têm uma destinação universal e não privada. Assim, usar as riquezas de forma exclusiva e egoísta, esquecendo-se dos irmãos, não é compatível com a fé cristã.

Através do Evangelho, Jesus Cristo nos traz uma grande mensagem com o milagre da multiplicação dos pães, quando uma multidão o segue até o deserto. “Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão. Encheu-se de compaixão por eles e curou os que estavam enfermos” (Mt 14,14). Essa passagem mostra-nos que Cristo praticava o amor e partilha em favor dos necessitados, quando os discípulos dizem para Ele: “Este lugar é deserto e a hora já está adiantada. Despede as multidões, para que possamos ir aos povoados comprar comida” (Mt 14,15). Eles fecham os olhos para as necessidades do povo, tratando-as com indiferença, porém, Jesus repreende os discípulos e os compromete:

“Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16). Dessa forma, também são responsáveis pela necessidade do próximo. Quantas vezes não agimos como os discípulos? Tratamos com indiferença aquilo que carece nossos irmãos e deixamos de cumprir o verdadeiro sentido de comunidade cristã.

Nosso país, é um grande produtor de alimento e ao nos depararmos em grandes centros, até mesmo em nossa cidade, observamos diversos irmãos procurando comida em lixeiras e pedindo esmola para se alimentarem. Diante disso, enfrentamos um problema social e coletivo, portanto não podemos lavar nossas mãos, também somos responsáveis pela fome e miséria. É fundamental que sejamos como Jesus, que viu a multidão e compadeceu-se com suas necessidades, não podemos ser cegos perante as necessidades que assolam nossa sociedade. Através do Evangelho, somos convidados a ver nossos irmãos e a sairmos da nossa bolha.

“Enfrentamos um problema social e coletivo, portanto não podemos lavar nossas mãos, também somos responsáveis pela fome e miséria. É fundamental que sejamos como Jesus, que viu a multidão e compadeceu-se com suas necessidades, não podemos ser cegos perante as necessidades que assolam nossa sociedade. Através do Evangelho, somos convidados a ver nossos irmãos e a sairmos da nossa bolha”.

A importância desse Evangelho é mostrar-nos que a Igreja tem direito e dever de lidar com temas sociais como a fome. Já mencionado no Texto-base da Campanha, nos encontramos em uma sociedade na qual o ser humano não tem apenas fome do alimento que nutre, também tem fome de: justiça, relações justas que promovem a sobrevivência; cidadania, ser respeitado e tendo seus direitos e participação garantidos; beleza, contemplar a arte, a música, uma simples paisagem natural; sentido, para entender os acontecimentos da sua própria vida e da humanidade e conseguir direcionar suas ações; e de transcendência, não se contentando somente com a sua natureza, desejando algo a mais, o infinito, buscando-o através de Deus.

Logo, o tempo Quaresmal nos provoca a analisar todos os acontecimentos que levaram Jesus à morte de Cruz, além de, nos instigar a transformar as diversas realidades existenciais. Somos chamados para a vivência sinodal “comunhão, participação e missão”. É necessário que, como cristãos, nos desafiemos a superar tantas indiferenças. Também somos convidados a continuar a missão de Jesus, sermos discípulos em busca de diálogo e fraternidade. Que possamos caminhar juntos em busca da plenitude.

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