Jornal Contexto 51

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EDITORIAL EXPEDIENTE

Universidade Federal de Sergipe Campus Prof. José Aloísio de Campos Av. Marechal Rondon, s/n, São Cristóvão - SE Reitor: Prof Drº. Angelo Roberto Antonielli Vice-reitor: Prof. Drº. André Maurício C. Souza Pró- reitor de Graduação: Prof. Drº Jonatas Silva Meneses Diretora do CECH: Iara Maria Campelo Lima Jornal Laboratorial do curso de Jornalismo Chefe do Departamento de Comunicação Social (DCOS): Prof. Dr. Diogo Cavalcanti Velasco Núcleo de Jornalismo: Prof. Drº. Vitor José Braga Mota Gomes Telefone: (79) 2105-6919/ 2105-6923 | E-mail: dcos.ufs@gmail.com Coordenação Editorial: Prof. Drª Michele Amorim Becker Coordenação Projeto Gráfico: Prof. Drº. Vitor José Braga Mota Gomes EQUIPE EDIÇÃO 51 Gestão e editoria geral: Sheila Dias e Gustavo Monteiro Projeto gráfico e layout: Matheus Brito Reportagem: André Oliveira, Beatriz Bomfim, Cláudia Santana, Fagner Honorato, Francielle Santos, Gustavo Monteiro, Ítala Marquise, Jennifer Cristina, Julia Freitas, Lucivânia Santos, Luiz Sérgio Teles, Mirian Santos, Nathália Gomes, Rodrigo, Sheila Dias e Taís Santos. Capa e ilustrações: Saullo d’Anunciação, Tainara Paixão e Clara Dias Diagramação e preparação dos arquivos: Elisa Lemos, Dayanne Carvalho, Allan Jones, Izabel Costa, José Víctor Siqueira, Sara, Andréia Fontes, Carol Matos Fotografia: Dayanne Carvlaho, Fagner Honorato, Lucivânia Santos, Marcos Pereira, Nathália Gomes, Edição de imagens: Juliana Teixeira Revisão geral: Kamille Pérez e Rafael Amorim

Por que esse jornal é tão importante É

meio suspeito que eu, enquanto editor desse exemplar do Contexto UFS, escreva um texto com esse título, eu sei. Parece prepotência, porém, eu me explico: o que faz essa edição tão importante não é o fato de que o jornal Contexto tem muitos anos de estrada e que nele já escreveram diversas pessoas legais e competentes, ou que trabalhamos sem a estrutura sonhada quando optamos pelo curso de jornalismo no vestibular, muito menos porque sou eu o editor (isso com certeza não). O que torna esse jornal importante foi a escolha do tema central, pelo qual surgiu todas as pautas que preenchem as seguintes páginas. Fazer um jornal inteiro sobre qualidade de vida em Aracaju foi uma escolha um tanto audaciosa, mas que se justificaria apenas com uma breve retrospectiva da história da humanidade. Desde a descoberta do fogo, a invenção da roda, ou de qualquer outra coisa desse tipo, o que o homem procura é tornar a vida mais fácil, ou em palavras mais modernas, aumentar a sua “qualidade de vida”. Com Aracaju, capital do menor estado da federação, não poderia ser diferente. De onde surgiu o fato amplamente divulgado e conhecido de que a cidade era “a capital da qualidade de vida”? Isso seria um mito? Porque esse apelido deixou de fazer sentido nos últimos tempos? Esse foi o pontapé inicial. A partir dele se pensou em falar sobre segurança nos transportes, déficit habitacional e mudanças na forma de se viver, a Orla da Praia Formosa - wobra polêmica inaugurada há pouco tempo em área que deveria ser de preservação ambiental -, as propostas políticas (ou a falta delas) dos candidatos a prefeito na próxima eleição. Junto a isso tudo, ainda sobrou fôlego para pensar na acessibilidade nos transportes públicos, a valorização dos artistas locais e o uso dos espaços públicos para a prática de esportes. Houve quem fizesse uma homenagem ao professor mais antigo do curso de Jornalismo da UFS, o grande Tião, muito pela memória que ele tem da cidade de antes. Houve quem escrevesse sobre si, em forma de crônica, com o filtro do olhar de alguém de fora que chega a Aracaju. Ainda sobrou espaço para um artigo meu sobre o individualismo. Seria esse um dos fatores que causam uma ruptura na qualidade de vida tão sonhada? Escrevemos esse jornal correndo contra o tempo, como todo bom jornalista faz. Fizemos isso por amor à cidade onde a maioria de nós habita ou depende de alguma forma. Escolhemos esse tema por nos preocuparmos sinceramente com o lugar onde moramos e com o desejo de usar o nosso dom, escrever, como ferramenta de mudança! Boa leitura, Gustavo Monteiro

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OPINIÃO

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Pensar como membro de um corpo, uma revolução social Gustavo Monteiro ufs.gustavo@gmail.com

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ão é preciso nem mesmo sair de casa para perceber que o mundo, não só Aracaju, padece de diversos problemas, que poderiam muito bem ser divididos em escalas de maior ou menor alcance - é verdade. Porém, é preciso um esforço um pouco maior para perceber que mesmo os problemas vistos como menores, aqueles que atingem um pequeno grupo de pessoas, seja em número ou representatividade social, são capazes de afetar toda a sociedade. É como um pão bolorento. De início a parte afetada pelo fungo é bem pequena. Porém, quando isso acontece, dizem os estudiosos da área, as raízes dos fungos já tomaram, ainda que de forma invisível, todo o pão ou, no nosso caso, o “corpo social”. É impossível imaginar uma sociedade, de qualquer sistema político e econômico, sem a relação entre as pessoas. E relação implica em encarar o problema de todos como próprio. Talvez seria mais didático reduzir o campo de análise pelo menos dessa vez. Todos os dias, para ir à universidade, reflito muito sobre como o transporte público de Aracaju é deficiente.É fácil constatar que a insegurança cresce sem medidas, que existem muitas pessoas sem as mesmas oportunidades que nós, universitários, que os rios fedem e que o trânsito rasteja. Esses fatores são sentidos por todos (com exceção do transporte público), certo? Por que não começar a pensar em alternativas que contemplem a todos? Pensar coletivamente nada tem a ver com qualquer “ismo”, seja ele liberal ou social. Ir além do próprio umbigo é uma atitude inteligente, consciente daquilo que somos e da consequência de qualquer decisão. Somos diferentes talvez por um único motivo: nos impedir da autossuficiência. A vida seria muito chata se não precisássemos de ninguém. Você, nesse momento, deve estar se perguntando: ele concorda com tudo? Todas as relações são flores e o mundo seria sempre “paz e amor” visto por esse ângulo? Não! Eu não disse que era preciso concordar com todos. Ninguém nunca disse! É preciso, entretanto, um exercício de humildade. Saber que

cada grupo, que eu, você, nós, vós e eles, temos pontos louváveis e aspectos a melhorar, e que juntos, com a soma das experiências e pontos de vista, poderíamos chegar a soluções que contemplassem a todos. A autocrítica e a escuta recíproca nesse caso são essenciais. E é aí onde está a pedra no sapato de qualquer decisão. Buscar transporte público mais eficiente geraria muita discussão, muita realidade dura estampada na cara de quem sofre e de quem ignora. É mais fácil comprar um carro e dirigir sozinho, em um automóvel de cinco lugares. Quem não puder fazer isso, paciência! E essa mesma lógica se aplica a diversos outros problemas sociais, como o meio ambiente, a moradia, a segurança pública, a educação e a saúde, por exemplo, e se perpetua a ponto de virar “normal”, quase que inquestionável. Quer sentir na pele o que o outro vive? Comece talvez olhando no olho, dizendo “bom dia, como vai?”, esperando e ouvindo interessadamente a resposta. Se colocar no lugar do outro, que aparentemente está na outra extremidade, é perceber que no fundo, apesar de diferentes, queremos sempre as mesmas coisas: oportunidade de viver bem, de ser feliz e de ser livre. Já experimentou dar um presente a alguém de forma inesperada? Por mais que tenha custado uma parcela considerável do seu dinheiro, a felicidade da pessoa em questão fará tudo ter valido a pena. Dizem, todos sabem, que há mais alegria em dar do que em receber. Provavelmente porque, a cada nova ação de solidariedade e de respeito, esses sentimentos que movem a humanidade se multiplicam em nós. E se a máxima dos tempos de hoje é: “tempo é dinheiro”, talvez o bem mais precioso, aquilo de que todos precisam, é o nosso tempo, a nossa preocupação sincera. Sem ataques, acusações apressadas ou competições de ego. Percamos tempo com as pessoas! A recompensa disso tudo é uma sociedade mais justa, uma cidade mais habitável.

Foto: Dayanne Carvalho


POLÍTICA Qualidade de vida pra quem? O planejamento da cidade, o título de capital da qualidade de vida e a abordagem do assunto nas propostas dos candidatos a prefeito de Aracaju Sheila Dias sheila.milena.jor@gmail.com

U

ma assembleia, em 1855, elevou o povoado de Santo Antônio do Aracaju à categoria de cidade e o transformou em capital, no lugar de São Cristóvão, antiga sede da Província de Sergipe Del Rey. A pequena São Cristóvão não mais oferecia condições para ser sede administrativa e a pressão econômica do Vale do Cotinguiba - região produtora de açúcar - exigia a mudança. Era preciso urgentemente a criação de um porto que garantisse a escoação da produção. Aracaju se firmava como capital em 1865. Em 1884, surge a primeira fábrica de tecidos, marcando o início do desenvolvimento industrial. Segundo o IBGE, em junho de 1886, Aracaju tinha uma população de 1.484 habitantes, a imprensa oficial e algumas linhas de barco para o interior. Em 1900, inicia-se a pavimentação com pedras e são executadas obras de embelezamento e saneamento. As principais capitais do país sofriam reformas para a melhoria da qualidade de vida dos habitantes, enquanto Aracaju, em 1908, inaugurava o serviço de água encanada- um luxo para a época. Em 1914 é a vez dos esgotos sanitários e no mesmo ano chega a estrada de ferro. Segundo alguns historiadores, o Centro da cidade foi planejado pelo engenheiro Sebastião José Basílio Pirro, em forma de tabuleiro de xadrez. Os outros bairros apresentaram algumas dificuldades de engenharia- como podemos ver até hoje, por se tratar de uma região de pântanos, pequenos lagos e mangues. 161 anos depois Planejamento é uma boa palavra para descrever o momento atual dos aracajuanos. No próximo dia 2 de outubro, 397.228 dos 632.744 habitantes de Aracaju irão às urnas escolher um prefeito e 24 vereadores. O momento é de avaliar a proposta de governo de cada candidato para escolher os melhores representantes. Como a edição 51 do Jornal Contexto UFS está tratando do título de capital da qualidade de vida concedido à Aracaju em 2008, a intenção desta reportagem é avaliar as propostas de alguns candidatos a prefeito da cidade e quais delas têm relação direta com a melhoria da qualidade de vida do aracajuano. Mas antes de analisar as propostas, é preciso entender o termo ‘qualidade de vida’. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) brasileiro segue as mesmas três dimensões do IDH Global longevidade, educação e renda, adequando a metodologia global ao contexto brasileiro e à disponibilidade de indicadores nacionais. Segundo dados do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (2013), com informações dos Censos 1991, 2000 e 2010, Aracaju ocupa a ducentésima vigésima sétima (227°) posição no ranking do IDHM 2010. Os cinco primeiros colocados desse ranking são, respectivamente: São Caetano do Sul (SP), Águas de São Pedro (SP), Florianópolis (SC), Balneário Camboriú (SC) e Vitória (ES). Dentre as outras capitais da região nordeste, Aracaju ocupa a segunda posição, antecedido por Recife, que ocupa a ducentésima décima posição no ranking nacional, e seguido por São Luís (249°), Natal (320°), João Pessoa (320°), Salvador (383°), Fortaleza (467°), Teresina (526°) e Maceió (1266°). No entanto, a professora da Universidade Federal Fluminense, Selene C. Herculano, em seu livro ‘Qualidade de Vida e Riscos Ambientais’ (2000), diz que “as variáveis usadas pelo IDH para que se avalie o nível de desenvolvimento humano ainda não deixam perceber os níveis de qualidade de vida, por não incorporarem a dimensão ambiental: as pessoas podem ter boa escolaridade, longa expectativa de vida, acesso às riquezas geradas, mas morarem e trabalharem em locais poluídos, sujeitos a riscos, conviverem com águas sujas, respirarem poluentes e habitarem compactamente selvas de pedra deprimentes, onde as cores predominantes sejam os tons de cinza do cimento e do asfalto”. Neste mesmo livro, a professora propõe que a qualidade de vida seja definida como “a soma das condições econômicas, ambientais, científico-culturais e políticas coletivamente instruídas e postas à disposição dos indivíduos para que estes possam realizar suas potencialidades: inclui a acessibilidade à produção e ao consumo, aos meios para produzir cultura,

ciência e arte, bem como pressupõe a existência de mecanismos de comunicação, de informação, de participação e de influência nos destinos coletivos, através da gestão territorial que assegure água e ar limpos, higidez ambiental, equipamentos coletivos urbanos, alimentos saudáveis e a disponibilidade de espaços naturais amenos urbanos, bem como da preservação de ecossistemas naturais”.

cassez de dados disponíveis- das vítimas dos homicídios por armas de fogo em Sergipe, o mapa apresenta 94,6% de participação masculina. Em 2014, 848 homens e 48 mulheres foram mortos por armas de fogo. Desses, 8 tinham entre 1 e 14 anos, 550 entre 15 e 29, 317 entre 30 e 59 e 20 eram pessoas acima de 60 anos. 49,7% dos mortos eram negros.

Apesar da relativa boa colocação no ranking do IDHM 2010, em relação às outras capitais da região nordeste, e do título de capital da qualidade de vida alardeado pelo Globo Repórter em 2008, o Mapa da Violência 2016- que traz dados sobre os homicídios por armas de fogo no Brasil- coloca Aracaju dentre as seis capitais com maiores taxas de homicídios por armas de fogo em 2014, junto com Fortaleza, Maceió, São Luís, João Pessoa e Natal, todas da região nordeste, que teve o maior crescimento médio no período: 89,2%. Segundo o mapa, de 2004 até 2014, Aracaju registrou um crescimento de 46,9% dos homicídios por armas de fogo. Em Sergipe, dos 75 municípios, 8 estão entre os 150 mais violentos, isto é, 10,7%.

Partindo dos dados apresentados pelo Mapa da Violência 2016, é possível inferir que esse título de capital da qualidade de vida que os gestores municipais alardeiam não leva em consideração esses homens, jovens, negros e, em sua maioria, pobres.

Ao delinear um perfil- muito limitado, em função da es-

As promessas de campanha

Cabe a esses 397.228 eleitores avaliar as propostas dos candidatos a prefeito de Aracaju e, ao menos tentar, encontrar o que mais se preocupe com a qualidade de vida de todos os 632.744 habitantes. Ainda segundo a professora Selene C. Herculano, mensurar qualidade de vida implicaria avaliar os níveis de conhecimento e tecnologia já desenvolvidos e os mecanismos para o seu fomento; canais institucionais para participação e geração de decisões coletivas e para resolução de dissensos; mecanismos

Clara Dias

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POLÍTICA5 Sheila Dias

ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO MUNICIPAL

São Luis (249°)

Os cinco primeiros colocados desse ranking são, respectivamente: São Caetano do Sul (SP), Águas de São Pedro (SP), Florianópolis (SC), Balneário Camboriú (SC) e Vitória (ES). Dentre as outras capitais da região nordeste, Aracaju ocupa a segunda posição, antecedido por Recife, que ocupa a ducentésima décima posição no ranking nacional, e seguido por São Luís (249°), Natal (320°), João Pessoa (320°), Salvador (383°), Fortaleza (467°), Teresina (526°) e Maceió (1266°).

Fortaleza (467°) Natal (320°)

Teresina (526°)

João Pessoa (320°) Recife (210°) Maceió (1266°)

Aracaju (227°) Salvador (383°)

Vitória (5°) Águas de São Pedro (2°)

São Caetano do Sul (1°) Balneário Camboriú (4°)

Florianópolis (3°)

CON TEXTO Ranking das cidades com maior e menor IDH no país. As cidades da Região Sudeste e Sul estão entre as cinco com maior índice.

de acesso à produção (financiamento); mecanismos de acessibilidade ao consumo (distribuição de renda, de alimentos e acesso aos equipamentos coletivos – água, luz, saneamento, etc.); canais democratizados de comunicação e de informação; proporção de áreas verdes para a população urbana; proporção de áreas de biodiversidade protegidas; organismos governamentais e não-governamentais voltados para a implementação da qualidade de vida (volume de recursos financeiros e de pessoal alocados para as políticas sócio-ambientais).

síveis, terão áreas para esporte e lazer, internet banda larga, laboratórios modernos e bibliotecas. “Essa é a escola que vamos construir: moderna, plural, diversa, crítica e um espaço agradável para as interações humanas”.

de conselhos de políticas públicas de defesa das mulheres, negros, LGBT e pessoas com deficiência; investir na formação de professores e material pedagógico para combater a discriminação; defender o estado laico e a diversidade religiosa.

Tomando por base algumas premissas mensuradas pela professora, a equipe do Jornal Contexto UFS avaliou ligeiramente os planos de governo de alguns candidatos a prefeito de Aracaju.

Para a cultura, Edvaldo promete promover o multiculturalismo, fortalecer os nossos traços identitários, valorizar os nossos maneirismos, celebrar a nossa arte e os nossos artistas, fomentar a cadeia produtiva e criar condições para termos uma sólida economia criativa. No que se refere à saúde, o plano diz: “sem saúde, não há qualidade de vida. Por isso, é imperativo que Aracaju volte a ser referência nacional nessa área. Para tanto, vamos melhorar a qualidade das estruturas físicas das unidades de saúde e vamos otimizar e humanizar o atendimento ao paciente”.

Para a cultura, a professora Sônia apoia as ocupações culturais da cidade (SarauDeBaixo, Ensaio Aberto, SarauDequebrada e outros); promete criar distritos culturais – biblioteca, livraria, cinema, teatro, museu, espaço para dança e exposições; transformar o Parque Augusto Franco em um grande centro cultural; realizar festivais de música, dança e artes plásticas; lutar pela criação e apoio as emissoras de rádio e TV comunitárias; resgatar e preservar o acervo histórico da cidade.

Edvaldo Nogueira Candidato ao segundo mandato de prefeito de Aracaju pelo PC do B, na coligação ‘Pra Aracaju Ter Qualidade de Vida’, e tendo como vice Eliane Aquino (PT). Seu plano de governo, intitulado ‘Reconstruir e Avançar’ propõe fazer mais gastando menos. “Com ética e sensibilidade social, vamos fazer uso racional do dinheiro público e fazer chegar os benefícios a mais pessoas. Iremos, também, sanar as contas públicas, voltar a pagar em dia os servidores e investir em mais obras para melhorar a vida das pessoas”. Em seu plano de governo, o candidato promete que todas as crianças estarão na escola, todos os profissionais da educação terão os seus direitos assegurados, todas as escolas serão aces-

Vários outros temas são tratados no plano de governo do candidato, que também oferece uma plataforma colaborativa para que a população possa participar diretamente da administração municipal. Sônia Meire Candidata a prefeita de Aracaju pelo PSOL, na coligação ‘Lutar para transformar Aracaju’, e tem como vice Vinicius Oliveira. Seu plano de governo, intitulado de ‘Programa Anticapitalista para transformar Aracaju’, propõe enfrentar o conservadorismo do machismo, racismo e a LGBTfobia; defende a liberdade de expressão nas escolas; a criação e fortalecimento

No que se refere à saúde, o plano diz: “promover saúde é saneamento, alimentação, moradia, etc.; ampliar o PSF e NASF; concurso para todas as áreas; ser contra a privatização e os abusos dos planos privados; promover uma gestão democrática de postos e hospitais; assistência para mães/crianças com microcefalia, mulheres com câncer e grupos vulneráveis; além de promover o parto humanizado. Outros candidatos bem colocados nas primeiras pesquisas (João Alves - DEM e Valadares Filho - PSB) também foram procurados, mas, até o fechamento desta edição, não responderam aos questionamentos e/ou não disponibilizaram seus planos de governo.


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SEGURANÇA Violência contra a mulh Os números de casos na capital

por André Oliveira adremelomail@yahoo.com.br Luiz Sérgio sergio_telles_simoes@hotmail.com

A

violência contra a mulher não distingue raça, classe social ou nível cultural, e atinge mulheres de todas as idades e lugares. Caracteriza-se por um assédio, exploração sexual, estupro, tortura, violência psicológica, agressão, perseguição e feminicídio. Estima-se que uma em cada cinco mulheres brasileiras, considera já ter sofrido algum tipo de violência de parte de algum homem, conhecido ou desconhecido. No Brasil, cinco mulheres são espancadas a cada cinco minutos, sendo que o marido, namorado ou ex é o responsável por mais de 80% dos casos, segundo a pesquisa intitulada Mulheres Brasileiras no Espaço Público e Privado. A construção de um mapa da violência em 2015, pela mesma pesquisa, afirmou que o Brasil encontra-se na 5º posição no mundo, com uma taxa de 4,8 homicídios a cada 100 mil mulheres. O que impressiona nesses números é que a maioria dos homicídios femininos está relacionado à condição de gênero, ou seja, pelo simples fato de serem mulheres. Vários estados brasileiros apresentam um aumento considerável nos números de assassinatos de mulheres, e Sergipe com uma taxa de 5,1 homicídios por 100 mil, está à frente de estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Nesse cenário, a capital Aracaju se destaca entre os municípios sergipanos com os maiores índices de violência contra a mulher. Segundo dados divulgados pela Secretária de Segurança Pública de Sergipe (SSP-SE), entre janeiro de 2014 e maio de 2016, Aracaju registrou 2.622 casos de violência doméstica. Sendo que, 1592 casos foram seguidos de lesão corporal. No mesmo período, 21 mulheres foram vítimas de homicídios dolosos, isto quer dizer que foram mortas intencionalmente. Mesmo com índices alarmantes sendo constantemente divulgados por diversos setores, um estudo realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2002, constatou que cerca de 20% das mulheres agredidas fisicamente pelos maridos no Brasil, permanecem em silêncio e não falam nem mesmo para a família ou amigos. A falta de reação geralmente se dá pela pouca informação sobre seus direitos, sentimento de culpa, vergonha ou dependência econômica do agressor. Contrariando esses números, Rafaela Santos, nome fictício a pedido da vitima para preservar sua identidade, 32 anos e moradora do loteamento Marivan em Aracaju, falou com a reportagem do jornal Contexto. A dona de casa contou que participava com o esposo de uma festa organizada pelos vizinhos na rua onde mora, quando em determinado momento ele começou a assediar uma mulher também presente no local. Após o fato, ela levantou e disse que ia voltar para casa, a partir daí Rafaela foi agredida a chutes e pontapés. “Moço eu estougrávida, e mesmo assim ele me deu vários chutes na barriga. Ele não quer que eu tenha meu filho”, desabafou a mulher que a partir daquele momento, se tornava mais uma em meio as milhares de vítimas de violência doméstica em Aracaju. Felizmente, Rafaela estava disposta a não passar mais por aquele tipo de violência e denunciou o agressor à polícia. Segundo a vítima, a Polícia Militar esteve no local e prendeu o seu marido em flagrante. Porém, enquanto espera a conclusão do inquérito e uma medida protetiva, ela prefere aguardar na casa de um familiar. A delegada Renata Aboim, do Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis de Aracaju (DAGV), explicou que as denúncias de crimes de violência contra a mulher, podem ser feitas com a realização de um boletim de ocorrência pela vítima, através do disque denúncia 181, ou também nos casos de prisão em flagrante realizados pela Polícia Militar. Segundo a delegada, nos casos em que as vítimas vão até a delegacia prestar um boletim de ocorrência, pode ser feito o pedido de uma medida protetiva ao Judiciário e simultaneamente a abertura de um inquérito policial. Disse ainda, que nos casos de crimes contra a honra e ameaças, a vítima pode optar por uma audiência de mediação de conflitos. Porém, quando a denúncia envolve lesão corporal, não é possível passar por essa fase. Nesses casos, é obrigatório a instauração do procedimento e o encaminhamento para a justiça, independentemente da vontade da vítima

Além de investigar as denúncias de crimes contra a mulher, a delegacia de vulneráveis disponibiliza tratamento psicológico para as vitimas. A psicóloga Fernanda Rosa Fontes, disse que muitas mulheres chegam nervosas ao local devido ao trauma da violência doméstica. Destacou também, que elas têm bastante dificuldade para denunciar logo na primeira vez que sofrem esse tipo de violência. “É difícila vítima tomar uma atitude logo no inicio, algumas mulheres já passaram 20 anos para denunciar o agressor”, contou Fernanda Rosa. O combate à violência contra a mulher é um compromisso assumido pelo Estado brasileiro através de diversos tratados e convenções internacionais, além de ser uma das maiores preocupações da sociedade, como afirmou uma pesquisa realizada em 2013 pelo Data popular/Instituto Patrícia Galvão. Em Aracaju, a Secretária Municipal de Assistência Social, através da Coordenadoria de Políticas para Mulheres, é responsável pelo desenvolvimento de diversas ações no sentido de auxiliar as mulheres vítimas de violência. O órgão mantém uma casa abrigo, onde as mulheres permanecem por um tempo determinado, geralmente o período necessário até a prisão do agressor. O endereço da casa é mantido em sigilo pela coordenação no intuito de resguardar as vítimas. Além disso, a coordenadoria oferece serviços itinerantes. Dessa forma, um ôni-

bus se desloca por locais distantes do centro urbano, levando advogado, psicólogo e outros profissionais que prestam auxílio às vítimas de violência doméstica em Aracaju. Contudo, a partir da Constituição Federal de 1988, o Brasil adotou uma perspectiva de democracia representativa e participativa, incorporando a participação da comunidade na gestão das políticas públicas. Dentre os mecanismos de representatividade popular adotados, destacam-se os conselhos. O Conselho Municipal da Mulher de Aracaju, tem por finalidade instaurar a promoção, em âmbito municipal, de políticas públicas que visem a eliminar a discriminação e a violência contra a mulher, assegurando-lhes condições de liberdade e igualdade de direitos. Atualmente o Conselho Municipal de Direitos da Mulher de Aracaju é presidido pela advogada Adélia Moreira Pessoa. Como promotora do Ministério Publico de Sergipe, hoje aposentada, atuou em inúmeras comarcas do interior e da capital, o que propiciaram a ela uma rica experiência e um conhecimento mais profundo da realidade sergipana. “Neste período,aprendi muito. Conheci, especialmente, mais de perto, problemas que afligem profundamente a gente sofrida, especialmente a mulher. Pude ver como a teoria se dis-


SEGURANÇA 7 er aumenta em Aracaju superam os grandes centros

Foto: DAGV

em Aracaju, inclusive sendo mostrados nesta matéria, a reportagem do Contexto perguntou a Adélia Moreira, o que tem contribuído para esse cenário. Segundo ela, não só em Aracaju ou em Sergipe, mas em vários lugares, a violência contra a mulher manifesta-se como uma pandemia. O que nós observamos hoje, é que este tipo de violência deixa de ser matéria privada e adquire maior visibilidade no presente, obrigando os legisladores, estudiosos da área e formuladores de políticas públicas a debruçarem-se sobre o problema em busca de alternativas. Explicou também que a violência contra a mulher não pode ser vista como um ato isolado, mas como fenômeno históricosocial. “Não é um fato novo. Pelo contrário, é tão antigo quanto a humanidade. O novo é a visibilidade desta violência e a preocupação com o seu enfrentamento”, completou Adélia Moreira.

Gráfico Izabel Costa

Aproveitando o momento com a jurista e estudiosa do caso, a reportagem questionou a Adélia o porque de mesmo com a exposição do tema pelos diversos meios e a gravidade refletida pelos dados, grande parte da sociedade não tem levado à sério a questão. Afinal é comum ouvirmos frases do tipo, “a roupa suja é lavada em casa” ou “em briga de marido e mulher nin-

guém mete a colher”, entre outras. Adélia explicou que isso se deve também pelo fato de a juridicização do problema ser nova, ou seja, a violência doméstica era tida apenas como um fenômeno, não tinha caráter jurídico. Esse tipo de violência deixou também de ser tratada como um problema privado, especialmente a partir de 1988 com a Constituição Federal. Para se ter uma ideia, somente há dez anos, em 7 de agosto de 2006, era publicada a lei 11.340, conhecida como lei Maria da Penha. Através dela foram criados mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Continuou com a sua analise dizendo que a elaboração da lei buscou construir uma rede de proteção à mulher em situação de violência, através de políticas públicas especificas, dando maior vigor ao enfrentamento do problema. “Em suma, a lei Maria da Penha comporta três eixos principais no enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher: proteção e assistência; prevenção e educação; combate e responsabilidade”, finalizou a advogada Adélia Moreira.

B.O's

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Inquéritos

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Para Adélia Moreira, os códigos e as leis vigentes, muitas vezes não passam de vitrines de como deveriam ser, já são modelados para não serem efetivados. E para as leis se concretizarem no viver social, é preciso, especialmente, políticas públicas consistentes. “Pude compreender que precisamos ver o outro que muitas vezes está tão distante do nosso olhar, mesmo estando ao nosso lado. Que é preciso lutar por uma vida mais digna para todos sem discriminação”, completou a advogada. Além da presidência do Conselho Municipal da Mulher, Adélia Moreira também preside a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil (CDDM-OAB), criada em 2012. Dentre as finalidades da Comissão destaca-se a construção de uma pauta de enfrentamento à discriminação e violência de gênero, atuando principalmente, no combate à violência doméstica, incluindo assistência à vitima e intervenções socioterapêuticas em relação ao autor da violência. Diante dos expressivos índices de violência contra a mulher

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tancia da prática e, principalmente, como o formal se afasta do real”, destacou.

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Registros de violência contra a mulher em Aracaju de 2012 a julho de 2016 realizado pelo DAGV


SEG

SEGURANÇA

Transporte público e violência: “uma chaga em todo o Brasil” “Um fator que é claro na violência em meios de transporte é a facilidade com o que o autor do roubo ou furto tem acesso à vítima e pode se desvencilhar da situação simplesmente descendo do ônibus ou trem.” “Eu acho que nos últimos cinco anos eu pego ônibus já esperando ser assaltado ou não chegar no trabalho. Ainda não fui assaltado, mas já entrei em vários ônibus que quebraram no meio do caminho. Temos que descer e pegar outro. E torcer para não quebrar de novo. Esse transporte é horrível”, desabafa André Luís, 37 anos, trabalhador assalariado do ramo comercial, morador do Conjunto João Alves, no município de Nossa Senhora do Socorro. De acordo com dados do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário de Aracaju (Sinttra), o número de assaltos e furtos (alguns na forma de arrastões) no mês de agosto desse ano – 1.244 até o dia 24/08 – já supera o número total do ano passado, que registrou 1.201. Em maio e julho deste ano, um motorista foi esfaqueado e um cobrador, alvejado por tiros. David Jonathan Barbosa, o cobrador de 26 anos, foi imediatamente encaminhado para o Hospital de Urgência de Sergipe (HUSE), mas não resistiu. Em protesto, os rodoviários fecharam terminais e reduziram o número de ônibus em circulação. “No próximo ano vou cobrar do Ministério Público providências dessa situação. E vou cobrar do prefeito que for entrar. Porque isso não pode existir. Isso é o cúmulo”, desabafa Francisco Assis, vice-presidente do Sinttra. O bairro do Santa Maria lidera o número de assaltos e furtos e as linhas 060 (Padre Pedro/Campus) e 070 (Santa Maria/Campus) são as duas mais visadas pelos assaltantes. Em seguida, vêm algumas linhas que circulam na região do Porto Dantas, Coqueiral, Japãozinho, Santos Dummond, Bugio. Segundo Assis, “a Guarda Municipal (GM) não ajuda. A Polícia Militar (PM) no momento não está ajudando porque está em guerra com o prefeito”. Mas, o vice-presidente do Sinttra acaba revelando números diários do mês de julho, principalmente depois da morte do cobrador, cuja média apresentou

uma queda de aproximadamente 75% (em comparação ao mês anterior), e atribui esta redução à atuação da polícia. Os números apresentados pelo Sinttra são confirmados pelo porta-voz da Secretaria de Segurança Pública de Sergipe (SSP/ SE), Renato Nogueira. “Nós tivemos até as primeiras semanas de julho números muito altos. Mesmo com o planejamento muito incisivo, intensificado”, revela. “É uma chaga em todo o Brasil”. De acordo com Nogueira, em termos de números, enquanto o Sinttra trabalha notificando qualquer reclamação apresentada pelos trabalhadores rodoviários, a SSP trabalha com os Boletins de Ocorrência (BOs), e são poucas as vítimas que recorrem a este recurso. Para o porta-voz, o fato de a vítima não apresentar o Boletim de Ocorrência acaba atrapalhando o planejamento da SSP/SE, pois esta fica sem saber qual linha e bairro há uma grande e constante incidência desses crimes. “Então, é importantíssimo toda vez que se tem um crime ao patrimônio ou qualquer outro crime, que a pessoa preste o BO”, reforça. “Transportando vidas com carinho” As reclamações em relação ao transporte coletivo em Aracaju e região metropolitana partem tanto dos usuários como dos próprios trabalhadores rodoviários. Enquanto aqueles questionam, principalmente, a demora, o valor da tarifa (que, na última década, aumentou mais de 100%, muito acima da inflação) e a qualidade dos ônibus, estes questionam as longas jornadas e a falta de conforto e estrutura. O medo da violência, entretanto, é a sensação que os une. O modelo de transporte consolidado não deu certo. A decisão de conceder à iniciativa privada a exploração do setor, não ga-


SEGURANÇA SEG

rantiu questões fundamentais de um serviço público essencial e estratégico para a sociedade. Para o Movimento Não Pago (MNP) o modelo de transporte precisa, necessariamente, ser barato – a fim de garantir o direito de ir e vir da população pobre, estudantes e desempregados -, abundante e de qualidade, para que a população evite o uso de veículos individuais (que aumentou muito na última década), sobre os quais pesam as queixas em decorrência dos transtornos no trânsito. “O modelo do transporte imposto faz com que vivamos uma segregação urbana”, essa é a constatação do Movimento Não Pago (MNP). Para o MNP, o “alto valor da tarifa de ônibus e o baixo número de linhas de ônibus, principalmente nas regiões mais periféricas, durante o final de semana, só piora a situação, pois a frota é ainda mais reduzida, impedindo às pessoas os direitos básicos de lazer e cultura’. Nas eleições municipais de 2012, duas candidaturas apresentaram dois modelos diferentes de transporte coletivo, que gerou uma expectativa de mudança radical, de modo que potencialmente viria a sanar os grandes problemas reclamados pelos usuários e rodoviários. O candidato Valadares Filho (PSB) apresentou o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), enquanto o candidato João Alves Filho (DEM), que na ocasião foi eleito, apresentou o Bus Rapid Transit (BRT). Esse ano o prefeito anunciou a instalação do BRT ao apresentar dez ônibus novos – modelo sanfona – e definir vias exclusivas de ônibus, apenas pintando de azul algumas vias da capital. Enquanto MNP entende que a instalação do BRT é completamente inviável em Aracaju principalmente pela distribuição geográfica, o vice-presidente do Sinttra entende que o BRT foi um avanço para a população e a categoria dos rodoviários. De acordo com o MNP, não se resolverá o problema da mo-

bilidade urbana com a construção de novas pontes e viadutos, muito menos com o fortalecimento das leis de trânsito, uma vez que o problema não é só estrutural e técnico como também histórico, segundo o entendimento de planejamento. O Não Pago entende que é “necessário analisar o processo de planejamento que se deu a construção de Aracaju. O modelo de cidade que temos se baseia na centralização dos serviços (emprego, escola, hospitais, etc) para jogar o povo pobre para as periferias”. A violência psicológica Comumente, quando nos referimos à expressão violência em nossa sociedade, pensa-se de imediato em agressão física, como se a violência fosse um fenômeno fundamentalmente unilateral. Com efeito, é necessário entender a violência como um fenômeno complexo e multifacetado. Para a professora adjunta do Departamento de Psicologia (PDS/UFS), Zenith Dellabrida, a “violência é um problema bastante complexo e que envolve toda a dinâmica da vida pública e privada. Há vários tipos de violência, de maneira geral, dividimos em física ou psicológica”. O estudo “Políticas de Mobilidade Urbana: Uma análise do comportamento socioambiental no ônibus” realizado por Denise Freitas Brandão e orientado pela professora Dellabrida, trata basicamente de entender o desconforto no transporte público pelo fato de envolver a invasão do espaço pessoal. De acordo com a professora, o estudo entende invasão pessoal como “a aproximação e toque do seu corpo sem sua autorização”. Foi necessário investigar determinadas situações que são possíveis no interior do ônibus, e que causam determinados incômodos uma vez que se trata diretamente da tentativa e possibilidade real de “invasão ou intrusão territorial”. A identi-

ficação com o estudo é inquestionável. Tal estudo abordou desde a agressão súbita ao corpo (pisão no pé), passando pela redução do campo visual (um indivíduo atrapalhando a visão da outra) e pela afronta moral ou desaforo (ocupar antes o acento que uma pessoa pretendia ocupar), até as formas de invasão menos toleráveis ((ser atingido por um cuspe, ficar próximo a pessoa cheirando a suor). “A superlotação é o principal fator para a ocorrência da invasão ou intrusão territorial que gera tanto desconforto e expõe os usuários a situações de vulnerabilidade como assédio sexual, furtos ou roubos”, constata a professora. O serviço de transporte coletivo O “transporte coletivo urbano e intra-municipal que terá caráter essencial” (Art. 10, inc. IX, “a” da Lei Orgânica) é competência do município de Aracaju, e a concessão desse serviço público tem que passar por autorização da Câmara Municipal que, após a finalização do processo de concorrência pública, autoriza ou não o contrato. Em Aracaju e região metropolitana (Nossa Senhora do Socorro, São Cristovão e Barra dos Coqueiros), o transporte público de passageiros opera sob regime de permissão, de modo que hoje são sete empresas de ônibus em circulação, representadas pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Município de Aracaju (SETRANSP). No entanto, essa relação jurídica não significa que este serviço não opere na ilegalidade,uma vez que o exercício ainda não foi regularizado mediante um processo de licitação, que constitui o procedimento administrativo formal para a contratação de um determinado serviço.

Por Rodrigo S. Macêdo comunaju@gmail.com


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CIDADE ACESSIBILIDADE: A insatisfação de quem precisa enfrentar diariamente as barreiras nos espaços públicos

Ítala Marquise italamarquise@hotmail.com Lucivânia Santos luh.s23@outlook.com.br

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Luh Santos

onsiderada como “Cidade Espelho” na qualidade de vida por ter o maior índice de hábitos saudáveis entre os cidadãos, Aracaju deixa muito a desejar quando o quesito é planejamento urbano. A pouca acessibilidade na capital sergipana preocupa muito porque ela restringe não só às pessoas com deficiência, mas também as pessoas idosas, obesas, gestantes, com estatura muito baixa ou com mobilidade reduzida. As maiores reclamações dos cidadãos dizem respeito, sobretudo aos buracos e irregularidades nas calçadas, além dos automóveis que insistem em usar as calçadas como estacionamento. A inexpressiva presença de piso tátil e de semáforos sonoros, por exemplo, dificulta a vida dos deficientes visuais, enquanto que as rampas inapropriadas - algumas com muita inclinação e outras com a base destruída, comprometem a mobilidade dos cadeirantes, podendo inclusive provocar quedas. As maiores reclamações dos cidadãos dizem respeito, sobretudo aos buracos e irregularidades nas calçadas, além dos automóveis que insistem em usar as calçadas como estacionamento. A inexpressiva presença de piso tátil e de semáforos sonoros, por exemplo, dificulta a vida dos deficientes visuais, enquanto que as rampas inapropriadas - algumas com muita inclinação e outras com a base destruída, comprometem a mobilidade dos cadeirantes, podendo inclusive provocar quedas. Como no caso da estudante Elisângela Corcínio, 34 anos, que levou uma queda após o pneu de sua cadeira ficar preso em um buraco na calçada. “Na maioria das vezes não consigo ir a certos lugares sozinha devido ao não planejamento na parte tectônica. Creio que Aracaju e interiores não têm um preparo estrutural para que os deficientes, em geral, tenham uma melhor mobilidade”, diz. As condições dos terminais rodoviários e dos pontos de ônibus também não são favoráveis. O terminal DIA e o do Centro, na Avenida Rio Branco, são inacessíveis, pois quando possuem rampas, estão completamente destruídas. Já o último ponto localizado na Avenida Barão de Maruim, por exemplo, está com a calçada quebrada impossibilitando a passagem de cadeirantes. Para atravessar este trecho o cadeirante precisa contar com a ajuda de alguém para auxiliá-lo. A necessidade da sinalização adaptada Outro fator constante, que compõe essa problemática, é a falta de sinalização. Quase não há semáforos com sinalização sonorizada para pedestres com deficiência visual. Esse é um desfio diário para o universitário Leiz Conceição, 26, que mora no Bairro Mosqueiro, Aracaju. O estudante de Fisioterapia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) enfrenta diariamente os transportes públicos e as ruas sem muita acessibilidade, pois precisa para continuar o curso. “Eu utilizo mais a audição e fico ouvindo o barulho dos motores dos veículos para saber se estão distantes ou se não há nenhum barulho para atravessar. Ou, então, espero a boa vontade de alguém. Chego a ficar cinco ou dez minutos esperando alguém me ajudar”, conta o estudante. A dificuldade em pegar ônibus é um assunto recorrente em Aracaju, principalmente para pessoas com deficiência. Ao andarmos pela cidade podemos notar a diferença entre os bairros. A zona urbana de expansão da capital é uma das áreas com mais problemas em relação aos pontos de ônibus. Em locais como a Avenida Melício Machado é evidente as péssimas condições da estrutura. Alguns pontos de ônibus estão sem o teto solar e outros são improvisados pelos próprios moradores que estão cansados desta situação. Caso totalmente contrário das vias próximas ao bairroTreze de Julho que contém sinalização sonorizada e uma paisagem atrativa aos olhos não somente pelos prédios, mas por sua organização em relação aos pontos do transporte público. Tentamos entrar em contato com a Superintendência Mu-

Rampa semi destruída e meio encoberta pelos matos, isso pode levar as rodinhas da cadeira a enganchar e derrubar o deficiente

nicipal de Transportes e Trânsito (SMTT) e com a Secretaria de Planejamento Urbano (Seinfra), para entender os motivos de até agora não terem feito as devidas reformas nas regiões mais afetadas, mas não obtivemos retorno de ambas as partes. Promessa que não sai do papel Embora exista a promessa de instalação desses equipamentos com indicadores de tempo e sonorizadores de alerta para deficientes visuais, parece que ela não quer sair do papel. Há projetos como “Aracaju acessível” que serve como conscientização para à sociedade a respeito das diversas necessidades que os deficientes têm, mas, ainda assim, é insuficiente para supri-las. Para o presidente da Associação dos Deficientes Motores de Sergipe (ADMSE), Antônio Fonseca, a falta de acessibilidade é uma das demandas mais frequentes. A cidade não proporciona uma boa qualidade de vida às pessoas com deficiência, não por sua estrutura geográfica,“mas porque não há interesses dos respectivos gestores” em resolver essa demanda. Segundo dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Sergipe foi o oitavo estado do país com o maior percentual de pessoas portadoras de deficiência. Por aqui vivem 518.901 pessoas que declararam possuir algum tipo de deficiência, seja ela motora, visual, auditiva ou mental, em algum nível, o que representa 25,09% da população residente. É bonito, mas não está muito acessível Aracaju tem diversos lugares que são pontos turísticos e

cartões postais. Porém, os problemas em relação a acessibilidade também se tornaram um assunto corriqueiro entre moradores e turistas da capital. A Orla de Atalaia, conhecida pela beleza arquitetônica, não fornece nenhuma mobilidade para cadeirantes, como por exemplo, uma passarela que possibilitasse a chegada dessas pessoas até a beira do mar. Há outros lugares que, apesar de não estarem em conformidade com os padrões de acesso, atraem muitos visitantes deficientes. É o caso de Sílvio Rodrigues, 45 anos, usuário de muletas, que relata os principais desafios do seu cotidiano: “O que para mim pode se tornar acessível, mas somente o fato de utilizar a prótese dificulta na minha locomoção, pois tem locais que não dá para transitar devido ao péssimo estado das vias, os mais atingidos são aqueles que usam cadeiras de rodas”. No entanto, não se sente limitado, mas reconhece as necessidades do próximo. A quem procure diversão em cinemas, shopping e calçadões, como o que foi inaugurado há pouco tempo, o Calçadão da Praia Formosa, entre outros lugares. Maria Gilda Santos, 41 anos, tem mobilidade reduzida, mas gosta muito de passear pelas ruas, conhecendo e desfrutando das paisagens. Segundo dona Maria Gilda, uma das poucas opções que proporciona lazer e mantém os padrões para receber as pessoas com deficiência é o Museu da Gente Sergipana. “O espaço é excelente e cumpre com o conceito de acessibilidade para todos” afirma.


CIDADE11

Alguns dos direitos das pessoas com deficiência:

MOBILIDADE PESSOAL Os Estados tomarão medidas para assegurar às pessoas com deficiência sua mobilidade pessoal: a) Facilitando a mobilidade pessoal das pessoas com deficiência, na forma e no momento em que elas quiserem, e a custo acessível; b) Facilitando às pessoas com deficiência o acesso a tecnologias assistivas, dispositivos e ajudas técnicas de qualidade, e formas de assistência humana ou animal e de mediadores, inclusive tornando-os disponíveis a custo acessível; c) Propiciando às pessoas com deficiência e ao pessoal especializado uma capacitação em técnicas de mobilidade;45 d) Incentivando entidades que produzem ajudas técnicas de mobilidade, dispositivos e tecnologias assistivas a levarem em conta todos os aspectos relativos à mobilidade de pessoas com deficiência.

DIREITOS a) Assegurar que as entidades privadas que oferecem instalações e serviços abertos ao público ou de uso público levem em consideração todos os aspectos relativos à acessibilidade para pessoas com deficiência;

b) Proporcionar, a todos os atores envolvidos, formação em Acessibilidade

c) Acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e à comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público

Os Estados Partes também tomarão medidas apropriadas para:

a) Desenvolver, promulgar e monitorar a implementação de normas e diretrizes para a acessibilidade das instalações e dos serviços abertos ao público ou de uso público; b) Oferecer formas de assistência humana ou animal e serviços de mediadores, incluindo guias, ledores e intérpretes profissionais da língua de sinais, para facilitar o acesso aos edifícios e outras instalações abertas ao público ou de uso público; c) Promover outras formas apropriadas de assistência e apoio a pessoas com deficiência, a fim de assegurar a essas pessoas o acesso a informações; d) Promover o acesso de pessoas com deficiência a novos sistemas e tecnologias da informação e comunicação, inclusive à internet; e) Promover, desde a fase inicial, a concepção, o desenvolvimento, a produção e a disseminação de sistemas e tecnologias de informação e comunicação, a fim de que esses sistemas e tecnologias se tornem acessíveis a custo mínimo.

CULTURA, LAZER E ESPORTE Os Estados reconhecem o direito das pessoas com deficiência de participar na vida cultural, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e tomarão todas as medidas apropriadas para que as pessoas com deficiência possam: a) Ter acesso a bens culturais em formatos acessíveis; b) Ter acesso a programas de televisão, cinema, teatro e outras atividades culturais, em formatos acessíveis; c) Ter acesso a locais que ofereçam serviços ou eventos culturais, tais como teatros, museus, cinemas, bibliotecas e serviços turísticos, bem como, tanto quanto possível, ter acesso a monumentos e locais de importância cultural nacional. d) Os Estados tomarão medidas apropriadas para que as pessoas com deficiência tenham a oportunidade de desenvolver e utilizar seu potencial criativo, artístico e intelectual, não somente em benefício próprio, mas também para o enriquecimento da sociedade. Para que as pessoas com deficiência participem, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de atividades recreativas, esportivas e de lazer, os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para: a) Incentivar e promover a maior participação possível das pessoas com deficiência nas atividades esportivas comuns em todos os níveis; b) Assegurar que as pessoas com deficiência tenham acesso a locais de eventos esportivos, recreativos e turísticos;


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MEIO AMBIENTE

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Calçadão da Praia Formosa levanta discussões sobre preservação ambiental. Obra foi concluída em meio a ações judiciais e gerou diferentes opiniões Mariana Pimentel maricorreiaufs@gmail.com

O Calçadão da Praia Formosa, no bairro Treze de julho, foi inaugurado no início do segundo semestre deste ano. Orçada em cerca de R$5 milhões, as obras iniciaram em janeiro de 2015 e sua execução foi de responsabilidade da Prefeitura Municipal de Aracaju (PMA) e Empresa Municipal de Obras e Urbanização (EMURB). O Projeto, nomeado de “Defesa Litorânea da Praia 13 de Julho”, somado ao Projeto de Urbanização do local, conta com quiosques cobertos, espelho e túnel d’água, jardim vertical, área de recreação infantil e aparelhos livres para exercícios físicos. Os 20 mil metros quadrados que percorrem o trecho do Rio Sergipe passaram por mudanças em sua estrutura e a área se transformou em um dos mais novos cartões-postais da cidade. Os responsáveis pela intervenção afirmam que a obra se tornou necessária devido ao avanço do Rio Sergipe no perímetro urbano, que se tornou visível em 2013, com a formação de “sprays” de água do rio e o risco de desmoronamento da balaustrada presente em uma das vias da Avenida Beira Mar. Mas as opiniões se dividem em torno da condução da obra. O Rio Sergipe sofreu aterro de cerca de 643 metros de extensão e 23 mil metros cúbicos de volume.

Opiniões Luiz Carlos Fontes, geólogo e coordenador do Laboratório de Pesquisa GeoRioeMar, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), apresenta uma posição crítica à agilidade da condução do processo, sem garantir estudos ambientais prévios. Segundo o geólogo, o local do projeto se encontra na direção do estuário do rio Sergipe e a dinâmica das águas precisa ser analisada. “Os estudos precisam apresentar uma visão completa da situação, incluindo a influência do mar na foz do rio e a ação das marés. Além disso, em época de chuvas e maré alta, a área sofre com a falta de condições de escoamento da água e os canais de esgoto transbordam. O problema tem vários pontos que deveriam ser estudados. ” Ele pontua que talvez neste ano ainda não seja possível sentir alterações reais, pois a época de chuvas e maré alta já passou e foi mais amena. Jeane Rodrigues é gerente de um estabelecimento situado no cruzamento entre as Avenidas Beira Mar e Anísio Teixeira, onde existe um canal que é despejado no Rio Sergipe. A gerente afirma não perceber nenhuma alteração com as obras. “Trabalho aqui há 3 anos e não senti nenhuma mudança. O mal cheiro continua, mas sempre foi assim”, diz. Já de acordo com Michele Lima, que trabalha como atendente de uma farmácia vizinha há dois anos, o mal cheiro proveniente do esgoto ficou mais forte após as intervenções na área.


MEIO AMBIENTE13

Diagnósticos Eduardo Lima de Matos, secretário de Meio Ambiente de Aracaju, aponta que a obra deveria ser realizada com emergência, pois desde 2011 o muro de contenção do trecho da Avenida Beira Mar já estava comprometido. A gestão anterior, do então prefeito Edvaldo Nogueira, já havia feito um projeto de defesa litorânea que posteriormente o prefeito João Alves Filho deu continuidade. “O laudo técnico elaborado pelo engenheiro Emerson Meireles de Carvalho atestou a queda do muro de contenção, com a possibilidade de vítimas fatais”, afirma o secretário, e as obras seguiram com a permissão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe e da Justiça Federal de Sergipe. Para o Ministério Público Federal/SE e Ministério Público Estadual, as intervenções foram realizadas em área de preservação permanente, com destruição de manguezal e aterramento de diversos trechos do leito do rio Sergipe. Ainda segundo estes órgãos, esta não era a única alternativa da PMA e EMURB e que existiam outras formas de proteção da área. Alega ainda que o conjunto da obra não é de caráter de emergência e deveria caminhar sem dispensa de licenciamento ambiental, pois o local em questão se propõe ao lazer e urbanização. A PMA e a EMURB foram condenadas a elaborarem um Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), mas Eduardo Lima de Matos afirma que a Prefeitura recorreu da decisão, ao apontar que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) elaborado já apresentava as ações de compensação ambiental. Uma das ações é a nomeação oficial do Parque do Poxim, uma área de vegetação nativa com predomínio do manguezal, que será administrado pela Secretaria de Meio Ambiente de Aracaju.


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COMPORTAMENTO ARACAJU E OS OLHARES SOBRE QUALIDADE DE VIDA O Jornal Contexto foi às ruas do Centro de Aracaju e entrevistou alguns moradores sobre o que eles achavam sobre a “Capital da Qualidade de Vida”

Nathália Gomes

Nathália Gomes nathgomeslima@gmail.com

Para Marizete, deficiência em vários setores de Aracaju fazem a cidade não merecer o título de Capital da Qualidade de Vida.

O

que é qualidade de vida para você? Para muitas pessoas, qualidade de vida se resume a ter boas condições de sobrevivência, como uma renda financeira estável e ter acesso à educação, rede de saúde, de transporte e segurança bem estruturadas. Na perspectiva de muitos aracajuanos, é assim que deveria ser uma “Capital da Qualidade de Vida”.

tos imagináveis sobre qualidade de vida. Ao falar de Aracaju, especificamente, estamos nos referindo a uma capital onde as pessoas apresentaram os hábitos mais saudáveis e a prefeitura fez sua parte com políticas públicas, segundo o Ministério da Saúde. Ainda assim, o título é questionável para muitas pessoas.

Desde 2008, quando Aracaju recebeu o título nacional de “Capital da Qualidade de Vida”, muitos questionamentos surgiram contrariando o merecimento de tal nomeação. O uso exacerbado do título nas mídias e pelos grupos políticos vigentes na época causou ainda mais indignação para os moradores de Aracaju, que, segundo eles, não veem como aplicar o termo “qualidade de vida” na realidade em que vivem.

Para profissionais que lidam com o tema,qualidade de vida é algo amplo e com várias definições, a se depender da área que aborde. Tratar uma cidade como Capital da Qualidade de Vida em apenas um ponto de vista específico e fechado é não levar em consideração as várias abordagens possíveis para esse tema.

Os vários conceitos de qualidade de vida A primeira vez os sergipanos ficaram sabendo de tal título foi no dia 04 de abril de 2008, quando o programa Globo Repórter, da Rede Globo, exibiu o ranking de qualidade de vida feito pelo Ministério da Saúde, que mostrava Aracaju a frente das demais capitais brasileiras. Motivo de orgulho para alguns, principalmente para o grupo político na administração da cidade na época, o título “Aracaju, capital da qualidade de vida” foi usada à exaustão pela prefeitura. Importante notar que o título não abrange todos os quesi-

Um estudo chamado “Qualidade de vida: abordagens, conceitos e avaliação”,publicado em 2012 pela Revista Brasileira de Educação Física trata da imprecisão e subjetividade que o tema traz. “Dependendo da área de interesse, o conceito pode ser adotado como sinônimo de saúde, felicidade e satisfação pessoal, condições de vida, estilo de vida, dentre outros; e seus indicadores vão desde a renda até a satisfação com determinados aspectos da vida”, cita o estudo. Ainda de acordo com o estudo, em questões sociais, qualidade de vida seriam bons indicadores socioeconômicos. Na área médica e psicológica, estaria mais voltada para o indivíduo ter uma boa saúde e bem-estar pessoal.Enquanto que para o olhar de um único indivíduo, pode ter muitas definições, desde as citadas acimas, até como ele é visto na sociedade. Ou

seja, para entender o que é qualidade de vida, é necessário compreender e analisar, primeiramente, em que área o tema será abordado.

Qualidade de vida na perspectiva dos aracajuanos Para os moradores que vivem a realidade da capital sergipana no dia-a-dia e sabem das deficiências e dificuldades encontradas nela, o título de “Capital da Qualidade de Vida” é equívoco e imerecido.Os aracajuanos têm uma ideia bem geral de qualidade de vida, ou seja, viver minimamente bem, com saúde, moradia e com direito a serviços públicos que atendam às suas necessidades. “Viver bem”. É o que diz a Marizete Vieira, de 47 anos, quando perguntada sobre o que é qualidade de vida. Para ela, não é algo alcançado plenamente na capital sergipana. Moradora do bairro Lourival Batista, Marizete fala sobre as condições de transporte, de saúde, educação e segurança pública, que para ela são precárias. Vendedora de água de coco no Centro de Aracaju, ela aponta para as ruas, chamando atenção às vias de acesso as pessoas com necessidades especiais. “Precisar ser melhorado e muito o acesso aos deficientes”, afirma. Ela conta ainda sobre as condições do seu bairro, o Lourival Batista. “Precisa ser melhorada a rede de esgotos, que enche


Nathália Gomes

COMPORTAMENTO 15

Joselino diz que Aracaju é uma cidade boa de se viver e merece o título, porém precisam olhar mais para os bairros mais necessitados da capital.

direto, ali no Lourival. Sobre a saúde, ela fala sobre a falta de médicos. “O posto de saúde só anda em greve. Fui no Siqueira, no Cemar, para procurar atendimento para o meu filho que é diabético e não tinha médico nenhum. Isso é qualidade de vida?”, ironiza. Para Joselino Xavier, de62 anos Aracaju é um lugar bom de viver. Qualidade de vida para ele é ter trabalho, moradia, transporte, lazer, educação e saúde. Ao ser perguntado se ele sabia que Aracaju era considerada a Capital da Qualidade de Vida, ele afirma, dizendo que já havia visto propagandas sobre o título na televisão e acha merecido. Morador do bairro Santos Dumont há mais de 20 anos, ele fala que Aracaju é um bom local por gostar de seus habitantes e achar que aqui tem um bom investimento em indústrias e comércio. “Aracaju tem muita gente boa, que gosta de ajudar. É um local em beira de praia e acho atrativo para o comércio. Tem como as pessoas ganharem seu dinheiro”, diz. Entretanto, ele acha que Aracaju ainda precisa de melhorias. “O transporte e a segurança pode melhorar”. Outra ressalva feita por seu Joselino atinge diretamente os políticos. Segundo ele, é preciso que os políticos invistam em alguns bairros que precisam de mais atenção,principalmente,nas zonas mais periféricas e onde se encontram as pessoas com status econômico mais baixo. “Precisam também olhar um pouco mais para a Zona Norte; Santos Dumont, 18 do Forte, Soledade

onde tá faltando mais ajudar. A Zona Sul tá muito bonita, mas a Zona Norte não tá não”, comenta.

Precisar ser melhorado e muito o acesso aos deficientes

Um ponto de vista interessante de se abordar é o de uma pessoa que vem de uma capital de outra região do país ao vir morar em Aracaju. É o caso de Everaldo Hernandes, de 54 anos. Em Aracaju há cinco anos, trabalhando como vigia e morando no bairro Bugio, ele faz comparações com a cidade da qual é natural, Florianópolis. Para ele, qualidade de vida é viver bem, tendo saúde e alimentação. Ao vir para Aracaju pela primeira vez, ainda como turista, ele se encantou com a cidade, porém, ao instalar residência ele percebeu que a realidade era outra. “Aracaju, pelo que tem a oferecer, poderia ser uma ótima cidade. Não é como mostra na propaganda do governo na televisão. O transporte, comparado ao de cidades como de Florianópolis e Curitiba, não é bom e a passagem é cara. A saúde e a educação estão defasadas e de dois anos para cá, vejo que aumentou muito a violência aqui”, conta. Às vésperas de eleições municipais e com o título “Capital da Qualidade de Vida” sendo muito usada em campanhas como atrativo e com promessas de um futuro melhor, fica então o relato sobre a Capital da Qualidade de Vida no olhar de alguns aracajuanos. Fica também a esperança de que Aracaju venha oferecer tal qualidade, nos mais variados aspectos, à vida dos seus moradores.


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COMPORTAMENTO CASA OU APARTAMENTO: Na vida cada fase vivenciada representa momentos e necessidades diferentes. Por esse motivo, para morar em casa ou apartamento, é preciso conhecer os aspectos positivos e negativos de cada escolha Jennifer Cristina jenhjornalismo@hotmail.com Mírian Santos hello_mirian@hotmail.com

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m dos principais sonhos dos brasileiros é a casa própria. O mercado atual oferece uma ampla variedade de opções para quem deseja adquirir ou até mesmo trocar seu imóvel, mas como fazer a opção certa entre casa ou apartamento? O que se deve considerar na hora de adquirir o primeiro imóvel ou trocar um antigo? Tal escolha é pessoal e depende de muitas variáveis, tais como: segurança, localização, espaço, opções de lazer, conforto, multiuso, vagas de garagem, independência e barulho. EM UMA CASA Morar em uma casa têm vantagens que, para algumas pessoas, são imprescindíveis. Elas só se sentem “livres” o suficiente quando residem em casas, já que as regras nesse ambiente são estabelecidas por elas mesmas, diferente de um apartamento, por exemplo, em que é preciso conviver com regras impostas pelo condomínio. A casa oferece um espaço maior e a ausência de vizinhos tão próximos faz com que, quem procure por uma sensação maior de privacidade, se sinta melhor em uma casa. Outros pontos que pesam a favor da opção por uma casa é o fato de que nesse tipo de moradia, há um espaço maior para cultivar plantas ou criar animais de estimação. Além disso, a ausência de gastos como, taxas de condomínio, gasto que costuma pesar muito no bolso da família, faz da casa uma opção ainda mais desejada. Quando o quesito é segurança e, mesmo assim, a opção é morar em uma casa, uma alternativa é comprar um imóvel em um condomínio horizontal fechado. Esses espaços trazem a segurança dos apartamentos, com o espaço e a privacidade de morar em uma casa. Para Thiago Santos a opção por uma casa veio com o sonho de crescer a família. Residente em apartamento desde o seu casamento, o sonho de ter filhos, fez ele e a esposa pensarem num local maior, com mais liberdade e espaço para as crianças. “Morar em apartamento é muito restritivo para crianças, apesar de um espaço seguro e supervisionado, decidimos mudar para uma casa e ter mais liberdade. Crianças choram, gritam, berram... seria difícil lidar com isso morando num condomínio”, disse Thiago. EM UM APARTAMENTO

Antes de qualquer coisa, residir em um apartamento requer a aceitação de regras. De acordo com o corretor imobiliário, João Paulo Pimentel, as pessoas normalmente procuram facilidades. Morar perto de centros comerciais deixa a rotina mais prática já que ficarão próximas de serviços, como mercado, shoppings, escolas e o próprio trabalho. Além disso, os centros comerciais são mais atendidos por transporte público, por exemplo. A segurança é um aspecto que sempre está em primeiro plano, é inerente na hora da escolha de uma casa ou apartamento. A pessoa precisa saber se o prédio tem porteiro, se o bairro é movimentado e se é considerado seguro. “A preferência por regiões com mais possibilidades de lazer, tranquilidade e conforto no geral, são sempre as mais procuradas pelos clientes” diz João Paulo. Os próprios empreendimentos têm oferecido essas opções – é possível morar em um prédio com total segurança, guaritas de controle de acesso, cerca elétrica, sistema de câmeras e vigilância 24horas. Sendo assim, para quem mora só ou tem famílias que passam algum tempo viajando, apartamentos podem ser uma moradia mais segura. Foi exatamente essa a opção feita pela psicopedagoga, Kate Cristine. Residente em uma casa durante grande parte da sua vida, ela acaba de adquirir um apartamento. O primeiro empreendimento próprio da família foi conquistado buscando itens como segurança, localização e lazer. “Todos sonham com a casa própria. Depois de anos morando em uma casa muito grande e espaçosa resolvi optar pela comodidade de um espaço menor, seguro e bem localizado. Por isso, fiz a opção por um apartamento. Agora eu posso criar minha bebê com mais segurança e sob minha supervisão”, afirma kate. CUSTO X BENEFÍCIO A crise no crescimento econômico do país e a atual restrição ao crédito imobiliário tiveram efeito nas vendas e no lançamento de residenciais mais nobres no mercado de Aracaju, que passou a se apoiar com grande força nas vendas de unidades destinadas a padrões médio – baixo e econômico, a famosa classe “C”. De acordo com o presidente da Associação do Dirigentes das Empresas do Mercado Imobiliário de Sergipe (Ademi – SE), Mário Nunes, as novas moradias com preços na faixa de 100 a 300mil seguem com boa liquidez graças à demanda reprimida por unidades mais baratas na cidade.

ENTREVISTA JORNAL CONTEXTO: POR QUE AS PESSOAS ESCOLHEM APARTAMENTOS AO INVÉS DE CASAS? JOÃO PAULO PIMENTEL: As pessoas hoje estão mais cuidadosas na hora de escolher sua moradia. Além de buscar por boas ofertas e oportunidades, eles estão mais exigentes quanto a estrutura e serviços oferecidos. Isto é um dos motivos deles estarem priorizando cada vez mais a segurança, tranquilidade, liberdade e lazer quando o assunto é escolher qual tipo de imóvel irão viver. Neste caso, preferem migrar para os condomínios. Eu consigo observar um crescimento exponencial do número de condomínios verticais e horizontais que visam proporcionar conforto, beleza e qualidade de vida. Estes condomínios também evoluíram quanto à estrutura e ainda contam com um amplo espaço para áreas de lazer, além de um grande aparato de segurança e controle de acesso restrito por meio de portarias profissionalizadas. JORNAL CONTEXTO: QUAL O PRIMEIRO ITEM DA LISTA DE QUEM FAZ A OPÇÃO POR APARTAMENTO? SEGURANÇA? LOCALIZAÇÃO? JOÃO PAULO PIMENTEL: Veja este seria um questionamento muito relativo. Não existe uma regra ou um padrão neste caso quando se trata da aquisição de um imóvel. Tanto segurança quanto lazer sempre estão entre os primeiros itens desta lista. Quando a pessoa vai comprar seu imóvel, ela precisa pesar o que quer e necessita. JORNAL CONTEXTO: COMO VOCÊ ANALISA O MERCADO DE IMÓVEIS ATUALMENTE? A CRISE ABALOU A PROCURA? JOÃO PAULO PIMETEL: É bem verdade que o final de 2015 e os primeiros meses de 2016 foram muito difíceis, com cenários não tão otimistas. Mas, o fato é que com esta onda não tão favorável é exatamente o melhor momento para fazer bons negócios. Cabe a nos consultores imobiliários servimos como ponte de quem esta de fato precisando vender e quem está aguardando um excelente negócio. Eu adoro a frase “é na crise, que surgem as maiores e melhores oportunidades”. JORNAL CONTEXTO: O AUXÍLIO DO GOVERNO FEDERAL COM O PROGRAMA DE AJUDA COMO O “MINHA


COMPORTAMENTO 17 QUAL A MELHOR OPÇÃO?

CASA MINHA VIDA”, FACILITOU O ACESSO DE PESSOAS NA COMPRA DO PRIMEIRO EMPREENDIMENTO? JOÃO PAULO PIMENTEL: Com toda certeza que sim. O fato é que o Minha casa Minha vida criou um segmento de mercado a Classe C, que antes da criação do programa não teria como bancar um financiamento habitacional. Com a criação do programa e sua política de subsídios, este sonho e esta classe reprimida hoje é que mantem ainda o mercado aquecido. JORNAL CONTEXTO: SOBRE O MERCADO IMOBILIÁRIO TER CRESCIDO CONSIDERAVELMENTE NA REGIÃO NORTE DA CIDADE. AO QUE SE DEU ISSO? SERIA PELA LOCALIDADE QUE MANTEM OS PREÇOS MAIS BAIXOS? OU HÁ UM POTENCIAL QUE PODE SER EXPLORADO PELA PROXIMIDADE DO CENTRO DE ARACAJU? JOÃO PAULO PIMENTEL: Eu acredito em uma série de fatores, mas destacaria, principalmente, este crescimento para região norte o fato de a zona de expansão em Aracaju ainda não poder receber investimento das construtoras. Isso porque, o nosso plano diretor ainda é uma incógnita. e por este fato existe a zona norte hoje é a região onde a maioria das construtoras lançam empreendimentos que eu considero ideal para a faixa 2 e faixa 3 do programa minha casa minha vida. JORNAL CONTEXTO: QUAL A FAIXA ETÁRIA APROXIMADA DOS CLIENTES QUE PROCURAM APARTAMENTOS? JOÃO PAULO PIMENTEL: Esta pergunta é um pouco mais complexa, mas vou tentar explicar de uma forma mais sintetizada. A procura por um imóvel, na verdade, a realização do sonho de adquirir um imóvel já começa desde muito cedo. A pessoa acaba de conseguir um emprego e, normalmente, me procura para que eu possa fazer uma analise do seu perfil de renda e tentar ajudá-lo a encontrar seu apartamento. Imóveis com uma média de preço de 160 mil reais é comum uma faixa de idade entre 25 e 35 anos. Já o cliente que adquiriu o seu primeiro imóvel e agora esta buscando um apartamento maior, porque teve uma melhora na renda ou a família aumentou, por exemplo, segue uma faixa de etária entre 35 e 55 anos.

Em qual perfil você se enquadra?

CASA é para quem:

APARTAMENTO é para quem: - Quer praticidade, lugar fácil de cuidar; - Sente-se bem em ambientes menores e mais aconchegantes; - Necessita de segurança; - Quer viajar mais tranquilo; - Acha que garagem e quintal são trabalhosos de cuidar; - Curte animais de estimação, desde que sejam pequenos; - Sonha com área de lazer, academia, salão de festas.

- Quer conforto e liberdade, fazendo suas regras; - Precisa de espaço amplo, quer privacidade; - Não se sente bem vivendo “parede-parede” com seu vizinho; - Gosta de lidar com suas plantas, em espaços abertos; - Cuida pessoalmente do carro aos finais de semana; - Gosta de animais de estimação grandes; - Recebe amigos com frequência, com música e sem hora para acabar.


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CULTURA

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Desvalorização de artistas locais ainda é agravante da projeção cultural de Sergipe A falta de investimentos e a má remuneração de artistas sergipanos ainda é um dos maiores problemas enfrentados pelo cenário culturalsergipano, que apresenta grande disparidade entre o reconhecimento artístico e monetário dado à artistas nacionais Por Beatriz Bomfim beabomfim@hotmail.com Fagner Honorato fagnerhonorato@hotmail.com

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esvalorização de cultura local ou valorização exacerbada de cultura alheia? Esse é um dos principais dilemas enfrentados pelo cenário artístico sergipano, que vê grandes nomes das artes e da música sendo deixados para trás, enquanto artistas de fora ganham cada vez mais prestígio e reconhecimento em espaços que deveriam ser primordialmente deles.Com uma enorme disparidade entre o número de contratações de profissionais locais e nacionais, e principalmente uma grande diferença no valor do cachê pago a eles, tornou-se comum, e até mesmo familiar contar com a presença de artistas consagrados nacionalmente em festas e eventos produzidos no Estado, e cada vez mais raro ver o mesmo tratamento sendo dado aos artistas locais. A falta de incentivo e de investimentos nesse setor e a discriminação desses artistas são agravantes no sentido de crescimento profissional dos mesmos, que acabam aceitando propostas, muitas vezes absurdas. Esses artistas acabam aceitando propostas absurdas apenas para ter oportunidade de mostrar seu trabalho, seja recebendo um cachê muito inferior ao valor pago aos demais, ou recebendo condições absurdas para sua apresentação. Para Aglaé Fontes, os artistas sempre devem procurar melhorar o seu trabalho, pois o simples fato de ser um talento nato da terra não lhe garantirá uma boa colocação no cenário cultural local. “Eu prefiro trabalhar com um grupo que tenha suas raízes marcadas na nossa sergipanidade do que buscar coisas de fora, mas o nosso artista tem que trabalhar cada vez mais pela sua competência, porque só essa denominação de artista da terra não é suficiente para que ele tenha orgulho, isso tem que permear o comportamento da arte para que a gente não seja visto só como uma condescendência. É da terra, mas não é contratado só porque é da terra, mas porque tem qualidade”, comenta Fontes. Segundo o vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores de Sergipe (CUT/SE), Plínio Pugliesi, a desvalorização dos artistas sergipanos é uma problemática muito mais complexa, baseada em diversos pontos, que vão desde a falta de divulgação dos meios de comunicação, à alta competição entre os artistas, que disputam um espaço que deveriam,por direito, ser deles, mas que acabam sendo destinados a terceiros. “Um conjunto de circunstâncias gera desvalorização dos artistas em vários sentidos, do desprezo da cultura local até os contratos. Os meios de comunicação não divulgam, a contento, os artistas sergipanos, e estes, por sua vez, ficam sem conhecer os artistas. Não há como valorizar o que não se conhece”, explica Pugliesi. Incentivos Com o impacto da atual crise econômica, o cenário cultural sergipano acabou abrindo mais portas e cedendo mais espaço para os artistas locais, devido ao baixo custo das apresentações. Festas como Carnaval e São João, conhecidas por trazerem grandes nomes do cenário nacional, neste ano, apresentou uma agenda diferenciada, trazendo um número maior de artistas locais, que tiveram a oportunidade de se se apresentar em palcos antes destinados a artistas de grande renome nacional. Em Aracaju, a principal instituição responsável pelas produções artísticas, ligadas a atividades de representação das artes, folclore, música, cinema e outras formas de expressão da cultura popular e erudita é a Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Esportes (Funcaju), conveniada e patrocinada pela prefeitura. Em entrevista, a presidente da instituição, Aglaé D’Ávila Fontes, afirmou que atualmente as produções realizadas pela instituição são financiadas somente pela prefeitura e pelo lucro arrecadado com eventos, sem nenhum investimento de fora. Questionado sobre a existência de programas governamentais de incentivo a produções artísticas destinados à


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Eu prefiro trabalhar com um grupo que tenha suas raízes marcadas na nossa sergipanidade

músicos regionais, Plínio Pugliesi, afirmou que não existeminformações a respeito, e que de acordo com denúncias feitas pelo sindicato dos músicos (Sindimuse),os artistas que têm proximidade política são os que tem mais acesso à Secretaria da Cultura, excluindo assim o sindicato e todos os outros músicos dos espaços de discussão junto ao Governo Federal no momento de discutir a capitalização de investimentos. Vivendo da arte em Sergipe Com os altos e baixos proporcionados pelo mercado de trabalho artístico de Sergipe, tornouse cada vez mais comum ver artistas procurando outros meios de conseguir renda extra, saindo do palcos convencionais e adotando outros espaços como uma nova oportunidade. Este é o caso de cordelistas e poetas que sobem em ônibus coletivos para mostrar seu trabalho, e ali mesmo vender suas produções, ou se apresentam nos vários semáforos espalhados pela cidade.

Há também os que se reúnem em companhias e bandas, para tentar alavancar as carreiras, como foi o caso da Tânia Maria, atriz e cantora há mais de trinta anos, que viu na companhia uma oportunidade de formalizar sua ocupação. “A companhia teatral Casa da imaginação é na verdade uma empresa jurídica chamada Tampa, Tânia Maria Produções Artísticas, que foi a forma que encontrei de buscar uma formalização. Acho que as empresas e as instituições respeitam mais quando é uma pessoa jurídica, que pode fazer um serviço e passar nota fiscal”, explica Tânia.

Foto de Tania Maria por Fagner Honorato

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SAÚDE

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ACADEMIAS PÚBLICAS DA CIDADE SÃO Diversos pontos de Aracaju são equipados com aparelhos de ginástica e ciclovias,

Crédito: Ciclo Urbano A ONG Ciclo Urbano promove regularmente os “pedais culturais” Francielle Santos francielle1937@hotmail.com Marcos Pereira marcospereira.jor@globomail.com

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odo mundosabe que para ter uma boa qualidade de vida não se pode ficar parado. E em uma cidade com aproximadamente 59 km de ciclovia, parques arborizados, orla bem equipada e aparelhos de ginástica públicos espalhados por vários pontos, fazer atividade física é bem mais fácil do que se imagina. E o melhor, sem pagar nada. O novo point dos exercícios físicos em Aracaju é o recéminaugurado Calçadão da Praia Formosa, no bairro 13 de Julho. Com 20 mil metros quadrados, o novo ponto turístico da cidade, que custou cerca de 5 milhões de reais aos cofres públicos, é uma opção a mais para quem deseja largar o sedentarismo. Lá é possível fazer caminhadas, correr e fazer exercícios leves nos diversos equipamentos instalados. Tudo isso ao lado do Rio Sergipe. Ali bem perto, encontra-se o Parque Governador Augusto Franco (Sementeira), que para uns é local de paz e tranquilidade, para outros é sinônimo de movimento. Com quase 400 mil metros quadrados, o local possui quadra poliesportiva, pista de caminhada, campo de futebol e aparelhos de ginástica. Localizado entre os dois shoppings da capital, o Parque da Sementeira, totalmente arborizado, sempre é uma opção para quem quer ter uma vida saudável e estar próximo da natureza. Assim também é o Parque Governador Antônio Carlos Valadares (Cajueiros), que sempre está cheio de gente buscando saúde e boa forma. Ainda é possível encontrar aparelhos de ginástica públicos no conjunto Augusto Franco.

Orla Com 6 km de extensão, a orla da Atalaia é o principal cartão postal de Aracaju. O local é repleto de opções, tanto de dia quanto à noite. São diversos bares, restaurantes e várias opções de lazer. E é lá também a maior “academia a céu aberto” da cidade. Em toda a sua extensão, a orla é equipada com diversos

equipamentos de ginástica, quadras de tênis, de futebol e outros esportes, além de pista de patins e de uma extensa ciclovia. O estudante Hatus Lourenço, de 26 anos, é frequentador assíduo do local. Ele conta que desde que se mudou para o bairro Atalaia frequenta a orla para se exercitar. “Tem muitas opções aqui, dá pra todo mundo treinar, independente de idade ou classe social”. A personal trainer Manoela Andrade diz que, como o exercício físico é um dos principais meios de prevenir patologias, as academias públicas da cidade são de grande importância. “Essas ‘academias públicas’ estimulam a prática de atividade física, promovendo assim um hábito de vida saudável a toda população, pois é um espaço aberto e de fácil acesso a todos os grupos e classes. Pessoas que não poderiam custear uma mensalidade em academias particulares ou clubes, agora têm acesso livre e em qualquer horário”, diz. Entretanto, Andrade alerta para os riscos de fazer os exercícios sem orientação de um profissional. “Toda prática de atividade física deve ser orientada por um profissional habilitado na área. Um grande problema nessa iniciativa será esse, a prática aleatória de exercícios pode trazer muitos danos, pois pessoas leigas, que não têm conhecimento específico para tal, acaba copiando treinos de revistas, blogs e até de um amigo, sendo que cada um tem sua individualidade biológica, e o que é bom para um, pode ser perigoso para outro e assim acabar adquirindo algum tipo de lesão”, explica. Entre fazer atividades físicas em academias fechadas ou em locais públicos, a personal trainer diz que não há muita diferença. “Nos dois espaços, o indivíduo sempre terá benefícios, sendo que, dentro de uma academia, existe uma grande variedade de exercícios, devido ao maquinário específico para cada treino, e ao ar livre, o indivíduo poderá sair da rotina de ambientes fechados, realizando um treino em contato com a natureza, em diversos espaços diferentes (calçadão, praia, pra-

ças). A grande diferença é essa, o contato com o meio externo, mas nos dois ambientes, o objetivo é o mesmo, promover uma vida ativa ao indivíduo”, conclui. Ciclovias Aracaju possui aproximadamente 59 km de ciclovia. Elas tem a finalidade de ligar os extremos norte/sul, oeste/leste da cidade. Sandra Freire é funcionária pública e pedala desde criança. Ela mora no bairro Atalaia, em Aracaju, e trabalha na Universidade Federal de Sergipe (UFS), em São Cristóvão, percurso que faz, sempre que pode, de bicicleta. “Além do ‘pedal’, tenho outras atividades físicas como nadar e velejar. Como aos 58 anos temos que diminuir o ritmo, hoje só pedalo para UFS três dias por semana”. Sandra reclama das condições das ciclovias da cidade. “Aracaju é uma cidade plana que merecia estar interligada por ciclovias. São poucas e não atendem a população, além de serem mal cuidadas, esburacadas e mal sinalizadas, muitas vezes levando o ciclista ao chão”destaca. As reclamações de Sandra são as mesmas que fazem parte das pautas da ONG Ciclo Urbano, uma organização social sergipana, fundada em 2007, que tem como objetivo prioritário despertar entre os cidadãos a necessidade da utilização da bicicleta como meio de transporte. Saiury Dantas, que está à frente da organização reclama da manutenção das vias. “Durante a atual gestão da cidade não houve nenhum aumento da rede cicloviária e nem manutenção da mesma. Logo, estas vias apresentam hoje muitos buracos, rachaduras, diversos obstáculos que comprometem a segurança do ciclista e o trânsito por bicicleta”, afirma. Saiury ainda reflete a respeito de outro problema encontrado nas ciclovias: a continuidade. “Aqui na cidade há um predomínio de ciclovias nos canteiros centrais que apresentam


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CONVITE A UMA VIDA SAUDÁVEL

oferecendo uma opção para quem não pode pagar uma academia

Créditos: Ciclo Urbano

“TODA PRÁTICA DE ATIVIDADE FÍSICA DEVE SER ORIENTADA POR UM PROFISSIONAL HABILITADO NA ÁREA” alguns problemas, como a falta de conectividade entre elas em muitas das intersecções de avenidas. Exemplos: entre a ciclovia da Av. Augusto Franco e a da Av. Tancredo Neves, outro é entre essa da Tancredo e a da Heráclito Rollemberg, mais um exemplo é entre a da Av. Beira Mar e a da Av. Rotary e ainda desta entre a da Orla, e por ai vai – o que coloca o ciclista em risco nas travessias e quando segue em meio aos carros por essas avenidas, como também a dificuldade em acessar e sair da ciclovia no decorrer do trajeto”, explica. Segundo a representante da ONG, ainda há muita resistência das pessoas ao uso da bicicleta. “São inúmeras as justificativas das pessoas para escolher a bicicleta como veículo em seu dia a dia. Um dos principais motivos que ouço é o medo da violência dos veículos motorizados no trânsito e de assaltos, outro motivo muito citado é do clima da cidade ser quente”. Ciclovia na avenida Beira-Mar, no bairro Farolândia Créditos: Marcos Pereira

Escada horizontal, utilizada para exercícios de força e, ao fundo, uma quadra poliesportiva, na orla da Atalaia


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CRÔNICA

Por onde anda a qualidade da cidade? Por: Claudia Santana | claudiaj.santana@hotmail.com Quando somos turistas tendemos a prestar mais atenção no lado bom e mais bonito do lugar que estamos conhecendo. Antes de morar em Sergipe o que mais me chamava atenção eram os pontos turísticos da capital e as peculiaridades do interior. Para quem vem de fora, as feiras ao ar livre são uma atração à parte. Ir a feira, sobretudo no interior, não significa apenas comprar frutas e verduras fresquinhas. São inúmeras barracas que vão de vestuário e acessórios, até artesanatos e comidas regionais. Você pode até encontrar um moço vendendo rifa de uma novilha, com o diferencial deque a novilha em questão está ali com ele, passeando pela feira. É praticamente um shopping, mas de rua, sem grandes marcas. Ou quase. Certa vez me contaram que logo cedo quando estão armando as barracas de roupas, algumas donas de lojas chiques vão garimpar peças de melhor qualidade para revender. Interpretei essa informação como brincadeira de quem me contou. Mas, sempre quando vejo alguém com sacolas enormes e cheias saindo de uma barraca de roupas ou aquela peça parecida com a que vi na feira, na vitrine de uma loja, essa informação me vem à memória.

galinhas, Seu João de dona Zefinha professora... Até hoje, eu não sei se encontrei ou não o local certo e nem sou a melhor pessoa para dar informações tão características assim. Situações corriqueiras tornam-se um aprendizado ou desafio a cada dia. Lembro de quando pedi um real de média na padaria e a moça ficou me olhando sem saber o que eu queria. Foi só quando apontei para o cesto de pães que ela me disse que o que eu queria era pão de sal ou jacó. Alguns anos depois morando aqui, essas diferenças tornaramse triviais. O que realmente começou a chamar minha atenção foram as pequenas coisas do dia-a-dia que ocorrem na chamada “cidade da qualidade de vida”. Melhor dizendo, os pequenos detalhes que deixam a desejar essa tal “qualidade de vida”. Mal são seis e meia da manhã e o ponto de ônibus já está lotado. Os ônibus já passam piores do que sardinhas na lata. Sim, piores, porque até as sardinhas na lata dispõe de mais espaço. Muitas vezes, os motoristas nem param quando as pessoas dão sinal. O que é compreensível pois não dá para imaginar mais ninguém lá dentro.

Entre todas as diferenças culturais com que nos deparamos em um lugar que ainda não estamos habituados, as que causam maior estranheza são as diferenças no vocabulário e, voltemos para o interior sergipano, pedir informação.

Em uma dessas manhãs, um 040 que já vinha cheio, ficou superlotado após as pessoas que estavam no ponto entrarem. A última moça a entrar estava com uma bolsa grande de lado, dessas que quase toda mulher tem, e o único espaço que ela conseguiu colocar o pé

Quando recém-chegada, perguntei a uma senhora como eu faria para chegar em determinado local e ela me disse que era perto do mercado de Antônio do finado João do leite, próximo à esquina da padaria de Luiza, filha de Mariazinha de seu Zé. Praticamente todo mundo tem um “codinome” ou “é de alguém”. Joana de seu Antônio, Joaquina das

foi o último degrau do coletivo. Por mais esforços que ela fizesse não conseguiu entrar totalmente e depois de um tempo parado, o motorista fechou a porta para seguir caminho. Conforme a porta ia se fechando, a moça era colocada para dentro do ônibus. Ela e parte de sua bolsa. Sim, apenas uma metade da bolsa ficou para dentro, a outra ficou do lado de fora.

O ônibus seguiu, o vento agitando os chaveiros e o olhar apreensivo e sem muita esperança de uma entre muitas pessoas que não dispõe de qualidade de transporte na “cidade da qualidade de vida”. Só para citar uma das várias pessoas que tem que se espremer e desafiar o que dizia Isaac Newton: “dois corpos não ocupam o mesmo lugar”, para não chegarem atrasadas e garantir o emprego. Sem contar o empurra, empurra para entrar nos ônibus nos terminais, um verdadeiro “salve-se quem puder” e as várias cenas que chegam a ser assustadoras em se tratando de transporte coletivo na capital sergipana. Quem pode e escolhe ir de carro tem vantagem apenas no conforto do automóvel, porque no quesito trânsito, no horário do rush, a cidade já se iguala as grandes metrópoles. Se iguala também no quesito de correr o risco de ficar sem o estepe do carro, quando se trata daqueles modelos que são externos. Se iguala também, ou até supera, se formos pesquisar dados, no quesito violência e insegurança. Isso deveria mesmo fazer parte da qualidade de vida? E quando se trata de coisas mais simples como um” Bom dia”, “Obrigada”, “Por favor” e “Com licença”, a situação piora. Educação, de forma geral, é algo que parece estar em falta no mundo. E parece que Sergipe tem liderado esse ranking. As pessoas não tem muito o hábito de usar boa educação e gentileza para com o outro por aqui. Dificilmente ouve-se um “Bom Dia”, “Por Favor”, “Obrigada”. Será que gentileza e boa educação não deveriam ser itens essenciais nesse conceito de qualidade de vida? Pensa comigo, menos estresse faz você viver melhor, não? “Talvez apenas estejamos encontrando as pessoas erradas na rua” me disse uma colega, e é nisso que eu tento acreditar.


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CRÔNICA


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INFOGRÁFICOS

ASSÉDIOS ÀS MULHERES NO TRABALHO SÃO CRIMES INVISÍVEIS Texto: Dayanne Carvalho | dessco.jorn@gmail.com Arte: Caroline Matos, Clara Dias, Dayanne Carvalho

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os 646 casos registrados até agosto deste ano na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher, inserida na Delegacia de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV) em Aracaju, apenas dois são de assédio sexual contra mulheres em local de trabalho. Em 2015, o número foi o mesmo em um total de 1039 atendimentos realizados. Os dados apurados na delegacia, entretanto, não condizem com a realidade descrita pelas mulheres, o que constitui um dos principais obstáculos para o combate a esse tipo de violência. Os números de denúncias entram em conflito, por exemplo, com o resultado de uma pesquisa realizada pela jornalista Karin Hueck, e divulgada pelo Coletivo Think Olga, em agosto de 2013. Segundo a pesquisa, das 7762 participantes, 99,6% disseram ter sido assediadas, sendo que 33% informaram ter sofrido assédio no trabalho. A pesquisa ainda mostra que 21% das mulheres disseram que os assédios partem do colega de trabalho, 14% de cliente, 13% de superior e 9% de funcionário. As informações obtidas na delegacia ainda se chocam com outra pesquisa mais recente realizada em maio de 2015 pelo site Vagas e divulgada pela BBC Brasil. Dos 4.975 profissionais ouvidos em todas as regiões do país, 52% disseram ter sido vítimas de assédio moral ou sexual. De acordo com a pesquisa, 48,1% dos homens disseram ter sido vítimas de assédio moral, enquanto as mulheres tiveram uma porcentagem de 51,9%. Em relação ao assédio sexual, 79,9% das mulheres informaram já terem sido assediadas sexualmente, enquanto 20,1% dos homens disseram ter passado por situação semelhante. A disparidade entre os percentuais divulgados pelas pesquisas e os dados obtidos em Aracaju revela uma das dificuldades para a construção de estatísticas precisas que possam contribuir para o combate aos assédios à mulher no ambiente de trabalho. Para a delegada Renata de Abreu Aboim, da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher em Aracaju, o problema do crime que caracteriza o assédio sexual é a dificuldade em provar. “É muito difícil o juiz julgar sem uma prova, só com a palavra da suposta vítima. Eu acredito que é pela dificuldade, até porque quem assedia não assedia na frente dos outros. Ele faz isso de uma forma mais sorrateira, exatamente para não deixar rastro, e aí ela fica totalmente vulnerável”, ressalta a delegada. De acordo com Renata, a delegacia só trabalha com casos de assédio sexual devido à esfera criminal, sendo a violência doméstica o forte da assistência. “Não tem nada específico para esse atendimento. A gente faz o procedimento aqui, que consiste em ouvir a vítima, as testemunhas e o acusado, e em seguida, a gente encaminha para a Justiça. Com relação ao assédio moral, é na esfera da Justiça do Trabalho”. Sensação de inferioridade Fabiana*, 36, é uma das 13.475 empregadas domésticas cadastradas na Casa das Domésticas, onde também funciona o sindicato. Trabalhando há cerca de dez anos na profissão, ela já sofreu assédio moral por parte de alguns patrões. “Sempre há uma palavra que magoa ou acham que a gente não tem capacidade de fazer alguma coisa, falam com grosseria ou descarregam algum estresse”, destaca Fabiana. De acordo com a assistente social da Casa, Eliana Barreto, os assédios morais costumam ser mais frequentes no cotidiano das profissionais do ramo do que os sexuais. “Muitas vezes, o desgaste é todo jogado em cima do trabalhador doméstico, que às vezes é maltratado com alguma palavra ou com a desvalorização da profissão. Quando a Casa vem ter conhecimento, ela já saiu do emprego. Mas se for possível, o serviço jurídico, através do sindicato, pode acompanhar e até solucionar o caso”,

Nós deveríamos ser bem respeitadas porque trabalhamos com a intimidade das pessoas, participamos das dores, das alegrias e sofrimentos delas. Colaboramos e contribuímos para que elas também cresçam na vida. Para que possam se desenvolver, elas precisam de nós.

explica Eliana. No caso de Fabiana, a depressão surgida após um assédio moral impossibilitou que ela notificasse a Casa. Ela trabalhou durante um ano em uma residência e, segundo relatos, sua patroa era bem áspera e, com autoritarismo, costumava pedir coisas que não competiam a sua função. Em certo dia, ela não encontrou a chave do carro e perguntou várias vezes onde Fabiana tinha colocado. “Foi uma situação que eu me senti muito mal. Você se sente tão pequeno, tão inferior, tão nada porque você dá o melhor cuidando da casa de outra pessoa e do filho. Ela ficou com medo de eu roubar o carro e a filha dela ficava o dia inteiro comigo”, reflete Fabiana. Após o ocorrido, o impacto se fez presente na vida de Fabiana e na de seus três filhos. Ela não conseguia sair de casa, passou por muitas crises nervosas e chorava sem saber por quê. A recuperação aconteceu gradativamente através de tratamentos e medicamentos antidepressivos. “Nós deveríamos ser bem respeitadas porque trabalhamos com a intimidade das pessoas, participamos das dores, das alegrias e sofrimentos delas. Colaboramos e contribuímos para que elas também cresçam na vida. Para que possam se desenvolver, elas precisam de nós”, desabafa Fabiana. Mesmo que a Casa das Domésticas saiba que casos como o de Fabiana costumam acontecer, não há uma política preventiva e de atendimento fixa a essas mulheres. De acordo com Eliana, as palestras não são uma prática permanente porque as domésticas só se reúnem uma vez por semana. Contudo, as conversas acontecem ocasionalmente e quando algum caso específico é notificado. Hipersexualização do corpo feminino Lúcia, 23, trabalhou como estagiária em uma empresa especializada no ramo de pesquisas científicas. Com o passar do tempo, a seriedade no ‘bom dia’ de seu chefe se transformou em brincadeiras. Até que um dia os assédios sexuais começaram a acontecer. “Ele pediu para eu ir à sala dele para me passar umas coisas e disse que eu estava muito bonita. Eu estava usando salto nesse dia, e então ele disse: ‘Venha mais de salto, você fica mais bonita quando usa’. Passou a me elogiar e sempre que eu ia pegar algum documento na sala dele, falava isso. Teve um dia que ele pediu para eu dar uma voltinha: ‘Está muito bonita hoje, dê uma voltinha’. Assim que percebeu que eu não estava dando

entrada, ele partiu para o assédio moral”, relembra. De acordo com Lúcia, o comportamento dele era percebido por outros funcionários do setor que, juntamente com a psicóloga da empresa, a incentivaram a informar o caso para o setor de estágios. Após o relato escrito, ela fez a denúncia na ouvidoria, o processo foi aberto e ela foi chamada para depor na área jurídica. “Depois eu soube que ele perdeu o cargo de chefia, mas acabou achando um pesquisador que depôs a seu favor dizendo que eu dava em cima de todos e que, inclusive, já tinha dado em cima dele”, comenta. Segundo ela, mesmo que ele tenha perdido o cargo de chefia, a coragem para denunciar só aconteceu devido ao apoio dos colegas de trabalho. “Não contaria porque seria a palavra de uma estagiária contra a de um pesquisador, e eu sairia como ‘a safada, a que procurou’. Saí assim, de certa forma”, lamenta Lúcia. O mesmo aconteceu em sua seguinte experiência de emprego, uma empresa de treinamento comportamental. Assim como o assédio moral e o desvio de função, os assédios sexuais também faziam parte do seu trabalho. Ainda mais incisivos, eles iam desde olhares que lhe causavam desconforto até contatos físicos por meio da ‘política do abraço’, instaurada na empresa através do método coaching – que prepara os indivíduos para um melhor entendimento de todo o comportamento humano. Um dia, o abraço do chefe foi mais demorado e ela percebeu que as ações estavam mais diretas. As tentativas passaram a se evidenciar mais, principalmente quando eles estavam sozinhos na empresa. “Na segunda vez, como eu sou mais baixa e ele é alto, ele agachou e me puxou. Nessa hora, eu afastei e falei que ele estava confundindo as coisas. Ele pegou de novo pelo ombro e disse: ‘Não, não. Você vai gostar, vai ser bom para nós dois’. Pedi para que isso não se repetisse mais e fui para casa. Chorei no caminho e pensei ‘não acredito que isso está acontecendo de novo’”, relembra. Chegou ao ponto em que ela não suportou a situação e comunicou o que vinha acontecendo a sua superior, ressaltando que precisava sair da empresa. No dia seguinte, os sócios conversaram e Lúcia foi demitida pelo chefe. Ela ainda cogitou procurar o Sindicato de Secretários e Secretárias de Sergipe (Sinsese), além de tentar conseguir provas, mas desistiu quando percebeu que ninguém poderia depor a seu favor. De acordo com a presidente do Sinsese, Gileide Lessa, até o momento nenhum caso de assédio sofrido por uma profis-

Chorei no caminho e pensei ‘não acredito que isso está acontecendo de novo’.

sional de secretariado executivo foi notificado ao sindicato. “A maioria das vítimas não denuncia por não ter provas e, geralmente, o agressor não faz isso na presença de testemunhas. Ele pega um momento em que a mulher está sozinha com ele. Algumas delas, inclusive, deixam o emprego em função disso”, destaca Gileide. Assim como a Casa das Domésticas, o Sinsese também não possui uma campanha preventiva e de combate ao assédio,


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INFOGRÁFICOS Mapa de risco ilustraencurralando assédio à mulher no ambiente de trabalho Hipersexualização e desapreço: o assédio mulheres no trabalho Os dados utilizados são das pesquisas divulgadas pelo Coletivo Think Olga e pela BBC Brasil, já citadas.

A pesquisa feita por Karin constatou que 21% já sofreram assédio por parte do colega de trabalho, 14% de um cliente, 13% de um superior e 9% de um funcionário da empresa.

De acordo com uma pesquisa, realizada pelo site Vagas.com em e publicada pelo BBC Brasil em junho de 2015, 20.1% dos homens já sofreram assédio sexual no trabalho.

21%

Na mesma pesquisa, com um número discrepante, 79.9% das mulheres informaram já terem sofrido assédio sexual ambiente de trabalho.

79.9%

20.1%

48.1%

33%

51.9%

Mesmo com proporções semelhantes, 51.9% das mulheres ouvidas na pesquisa já sofreram assédio moral. Uma diferença de cerca de de 4% a mais em relação aos homens.

i Ainda de acordo com a pesquisa do site, 48.1% dos homens já sofreram assédio moral no local de trabalho.

Em pesquisa realizada pela jornalista Karin Hueck e divulgada pelo Coletivo Think Olga, em agosto de 2013, das 7762 participantes 33% afirmaram já ter sofrido assédio no trabalho.

CONTEXTO

recomendada aos sindicatos pela Cartilha de Combate ao Assédio Sexual da Central Única dos Trabalhadores (CUT). De acordo com Gileide, o Sinsese aborda o tema em eventos da área de Secretariado, mas não é sempre que o assunto é discutido. Para encarar novas experiências Lúcia se sente mais apreensiva e menos liberta, e acredita que tudo seria diferente se não tivesse passado por isso. Configuração de um assédio nas leis De acordo com a Lei nº 12250/06, promulgada em fevereiro de 2006 na Constituição Federal, o assédio moral consiste na determinação do cumprimento de tarefas incompatíveis com o cargo ocupado e de funções técnicas que exijam treinamento. Em parágrafo único, a Lei também considera como assédio moral as ações e gestos que resultem em desprezo ou humilhação ao servidor ou que o exponha a efeitos físicos ou mentais,

de modo que prejudique seu desenvolvimento pessoal e profissional. No caso da Lei nº 10.224, presente no Código Penal desde maio de 2001, o assédio sexual consiste em “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Diferentemente do assédio moral, que prevê como punição mais grave a demissão, no assédio sexual o agressor sofre pena de detenção de um a dois anos que pode ser aumentada em até um terço se a vítima for menor de 18 anos. De acordo com Márcia Cavalcanti, professora de Direito da Universidade Tiradentes, o assédio sexual se constitui pela insistência de alguém em posição privilegiada, que usa dessa vantagem para obter favores sexuais de forma que coloque a vítima em situação gravemente intimidadora. Esse assédio é caracterizado, ainda, como chantagem (quando o agente induz a vítima com promessa de benefícios) e ambiental (quando

acontece no trabalho, independente da hierarquia). Um exemplo seria um chefe propor a sua subalterna que ela ganhará um apartamento caso se relacione com ele. No caso do assédio moral, Márcia informa que é uma “conduta que traz dano à dignidade ou integridade física ou psíquica de uma pessoa, colocando em risco seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho”. Segundo ela, um exemplo do assédio moral foi o caso que aconteceu com o industrial Maxime Bonnet, que não permitia que “suas empregadas sorrissem ou levantassem a cabeça de suas máquinas de costura durante o trabalho, acarretando na perda da vontade de sorrir, autoestima, confiança, depressão e isolamento, violando direitos constitucionais da dignidade, honra e moral inerentes ao ser humano”. *Nomes fictícios para se referir às mulheres entrevistadas pelo Contexto, a fim de preservar suas identidades e a de possíveis pessoas implicadas nos relatos contados por elas à reportagem.


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INFOGRÁFICOS Divergência da variável medo entre homens e mulheres

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a população brasileira possui em média 203,2 milhões habitantes. Baseado nesse total a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) mostra que, em média, 98 milhões desses habitantes são do sexo masculino, mas que a populção do sexo feminino supera esse númeo em 6.3 mihões. Por mais que o número de muheres esteja, consideravelmente, acima do número de homens, elas fazem parte da parcela populacional que mais sofre com a insegurança e medo no espaço público. -> Veja no gráfico os dados da Pesquisa SIPS – IPEA, 2012.

-> Medo de assalto à mão armada: mulheres 72,2% | homens 50,3% -> Medo de assassinato: mulhres 71,3% | homens 51,7% -> Invasão de domicílio: mulheres 70,0% | homens 59,9% -> Agressão física nas ruas: mulheres 64,7% | homens 42,3%


ENTREVISTA

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AR ACAJU SOB A VISÃO DE UM “QUASE” AR ACAJUANO O Jornal Contexto entrevistou o professor de jornalismo Sebastião Figueiredo, que falou sobre as principais mudanças ocorridas em Aracaju desde o início dos anos 90. Por Taís Cristina tata-santos14@hotmail.com

C

abelos grisalhos, olhar que transpira sabedoria e conhecimento: assim é o professor do curso de jornalismo da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Sebastião de Sá Figueiredo. Ele nasceu no município de Aquidabã, no interior do estado, mas começou sua carreira e a consolidou na capital sergipana, onde mora desde 1991. Sebastião é casado e pai de três filhos (um já falecido). Dedicou grande parte de sua vida à comunicação e ao jornalismo, sendo inclusive o primeiro professor do curso na UFS, onde começou a trabalhar em 1993 e atua no cargo até hoje. Graduado na Universidade de Brasília (UNB) em 1976, “Tião”, como é chamado carinhosamentepor seus alunos, também já foi professor na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em Maceió, onde morou durante certo tempo. Hoje, aos 65 anos de idade e com mais de 40 anos de profissão, Tião relembra com saudosismo e felicidade os finais de semana da sua infância, passados quase sempre na sua cidade natal, onde ele e seus nove irmãos brincavam nas ruas, sujavam-se de lama e jogavam bolinhas de gude. Com as lembranças, vem a vontade de voltar para Aquidabã e buscar lá o que Aracaju não foi capaz de oferecer ao longo desses 25 anos: tranquilidade. A repórter do Jornal Contexto, Taís Cristina, conversou com Sebastião sobre as principais mudanças ocorridas em Aracaju durante os últimos 25 anos e também sobre a diferença entre viver na cidade grande e viver no interior. Confira agora a entrevista: Repórter Contexto: Quais as principais mudanças ocorridas em Aracaju desde que o senhor foi morar lá até hoje? Sebastião: Aracaju evoluiu muito. Nos anos 90 ela se resumia ao centro e ao bairro São José, chamado na época de

QUANDO VIM MORAR AQUI, A CIDADE ERA TODA FORMADA POR CASAS. HOJE NÃO, O QUE PREDOMINA SÃO OS APARTAMENTOS. ISSO DIFICULTA A INTERAÇÃO, ÀS VEZES NÃO SABEMOS NEM QUEM É O VIZINHO QUE MORA AO LADO, A RELAÇÃO ENTRE OS VIZINHOS É QUASE QUE UMA RELAÇÃO DE ELEVADOR.

“Carro quebrado”. Praticamente todo o restante da cidade era formado por mangues, inclusive, o primeiro estádio de Aracaju foi construído em cima de um mangue e por causa disso havia muitas enchentes. Também não tínhamos muitas opções de lugares para se divertir, só havia festas de rua. Além disso, não havia tanta gente de outros estados morando em Aracaju como se tem hoje, eram só os sergipanos mesmo. Repórter Contexto: O senhor acha que Aracaju oferece qualidade de vida para os seus moradores? Sebastião: Sim. Como já morei em cidades maiores, como Maceió, acho mais fácil organizar a vida aqui. Apesar de muitos problemas, Aracaju é bastante urbanizada e tem muitos lugares para a pessoa relaxar. Repórter Contexto: Quais as mudanças ocorridas na sua vida junto com as mudanças de Aracaju? Sebastião: Minha vida evoluiu junto com Aracaju. Com o crescimento da cidade, surgiram para mim mais opções de trabalho e diversão. Repórter Contexto: Qual a diferença entre morar na capital (cidade grande) e no interior? Sebastião: A vida no interior certamente é mais calma e até mais segura, é mais fácil até controlar nossas ações. Tirando o aspecto de calmaria, aqui em Sergipe não há tanta diferença entre morar na capital e no interior, até porque é um estado pequeno e dependendo da cidade, dá para ir todo dia à capital, morando no interior. Eu até penso em voltar para Aquidabã quando me aposentar. Repórter Contexto: O senhor sente-se seguro andando pelas ruas de Aracaju? Sebastião: Não me sinto seguro, até porque a medida em que a cidade cresce, a violência aumenta e com Aracaju foi assim. Lembro que quando vim morar na capital, era comum as pessoas se sentarem à frente das suas casas para conversar com os vizinhos de noite, como ocorre até hoje em alguns municípios do interior. Hoje, isso não acontece mais em Aracaju, pois as pessoas vivem com medo. Sem falar que quando vim morar aqui, a cidade era toda formada por casas. Hoje não, o que predomina são os apartamentos. Isso dificulta a interação, às vezes não sabemos nem quem é o vizinho que mora ao lado, a relação entre os vizinhos é quase que uma relação de elevador. Repórter Contexto: Qual a diferença entre a sua infância e a infância dos seus filhos? Sebastião: A infância dos meus filhos, principalmente a do mais novo, de dois anos e meio, está sendo muito diferente do que foi a minha. Primeiro, porque antigamente as famílias eram enormes. Eu mesmo tive nove irmãos, a maioria com idade próxima a minha, então eu tinha com quem brincar. Já hoje em dia as famílias são pequenas, no máximo três filhos. Meu filho passa o dia dentro de casa assistindo televisão e os brinquedos que ele tem são muito diferentes dos brinquedos que eu tive. Eu brincava mais era na rua, de jogar futebol, bolinha de gude, se sujar na lama, tudo isso em Aquidabã. Mas hoje, com tanta violência, não confio em deixar o meu filho brincar na rua, prefiro que ele brinque dentro de casa mesmo.

Professor Sebastião Figueiredo. (foto: arquivo pessoal)



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