Jornal Contexto - Edição 49 (Maio/2016)

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JORNAL

CON TEXTO

Ano 13 /Maio de 2016 Jornal Laboratório Produdizo por Alunos de Jornalismo da Universidade Federal de Sergipe Departamento de Comunicação Social (DCOS)

www.issuu.com/contexto-ufs

AMOR E DEDICAÇÃO MANTÉM VIVA A TRADIÇÃO JUNINA NO CAMINHO DO SÃO JOÃO MUITAS DIFICULDADES SÃO ENCONTRADAS PELAS QUADRILHAS JUNINAS Pág.12

lEIA TAMBÉM: Ações inclusivas na UFS Pág. 6 Creches no Rosa Elze: restrições na oferta Pág. 8 Turismo em SE: publicidade para driblar crise Pág. 10


Contextando

EDITORIAL A edição 49 do Jornal Contexto está consolidada, de modo que a equipe conseguiu manter a transformação vislumbrada desde a edição 45 – salvo as edições especiais de lá para cá. Igualmente consolidada, mediante um processo ainda duvidoso do ponto de vista legal, é o afastamento da presidente Dilma Rousseff/PT. A crise econômica e política – sem dúvida de caráter histórico-mundial, visto que todos os países de economia capitalista estão em recessão – passou a ser a figura real que determinará e condicionará projetos políticos na superestrutura da sociedade – cultura, esporte, saúde, educação e, etc. Nesse sentido, os cortes nos orçamentos das diferentes pastas (além da redução de Ministérios, determinação do presidente Michel Temer/PMDB) constitui na realidade uma necessidade a fim de evitar um colapso social no Brasil e em quaisquer países; ou seja, os planos de austeridades – que significa aplicar certo rigor no controle dos gastos (que, em geral, são conhecidos por cortes, principalmente nas áreas sociais, tais como educação e saúde) – vem a ser atualmente a política adotada pelos países que foram (e serão) afetados pela crise. Praticamente todos os debates desenvolvidos nas reportagens nesta edição do JC/DCOS de certo modo diz respeito à conjuntura atual de cortes de gastos, ainda que a equipe não tenha deliberado que haveria uma relação estrita entre as reportagens e a crise. Esta edição traz algumas reportagens que dialogarão diretamente com os dois meses seguintes. Em junho, por todo o estado, teremos os eventos da cultura junina; e por se tratar de um período importante para a população sergipana, temos duas reportagens as quais desenvolvem algumas manifestações do período. Em julho, a Universidade Federal de Sergipe (UFS) completa 48 anos e dedicamos a atenção para esse evento na forma de uma reportagem que abre a edição - as comemorações começam nesse mês, de 24 a 30 de maio. Você, caro leitor, poderá conferir também reportagens sobre as quais demandam determinada preocupação social, a saber, a inclusão social e as creches. Além de outros trabalhos de reportagens sobre o turismo (em crise), esporte (sobre a Associação Desportiva Confiança/ADC) e literatura. Boa leitura!

EXPEDIENTe Universidade Federal de Sergipe Campus Prof. José Aloísio de Campos Av. Marechal Rondon, s/n, Sao Cristóvão- SE Reitor: Prof. Dr. Angelo Roberto Antoniolli Vice-Reitor: Prof. Dr. André Maurício Conceição de Souza Diretora do CECH: Prof. Dra. Iara Maria Campelo Lima Jornal Laboratórial do Curso de Jornalismo Núcleo de jornalismo: Prof. Dra. Greice Schneider Fone: 2105-6919/21056921 Email: dcos.ufs@gmail.com Coordenação Editorial: Prof. Dra.. Michele da Silva Tavares (DRT- 1195/SE) Equipe Contexto - Edição 49: Chefe de Redação: Cláudia Santana e Nathália Gomes Projeto Gráfico: Cláudia Santana, Nathália Gomes, Lucivânia Santos, Jamile Oliveira. Arte da Capa: Nathália Gomes e Cláudia Santana Revisão: Taís Cristina, Adréia Fontes, Mariana Correia e Marcos Pereira Reportagem: Antônio Golçalves , Andréia Fotes, Cláudia Santana, Francielle Santos, Lucivânia Santos, Mariana Correia, Marcos Pereira, Nathália Gomes, Taís Cristina, Josafá Bonifácio. Fotografia: Cláudia Santana, Táis Cristina, Mariana Correia, Nathália Gomes Diagramação: Cláudia Santana, Lucivânia Santos, Nathália Gomes, Jamile Oliveira.

Os habitantes da terra do fogo

33 FOTO: JOÃO HENRIQUE

Opinião

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Revolta da Certidão

POr: rodirgo de Macêdo

Quem mora em comunidades periféricas conhece as dificuldades, em muitos aspectos, que são enfrentados pelos seus respectivos moradores. O bairro Santa Maria, que carrega no colo e nas costas o estereotipo de comunidade mais violenta de Aracaju e sobre o qual, nos últimos 10 anos, não se falou em projeto político algum, a fim de transformar a realidade social do local, é comumente conhecida como uma das grandes periferias da capital – rivalizando, no que toca à complexidade social, com a zona norte O Santa Maria hoje, estruturalmente, constitui uma série de conjuntos: Marivan Sul, Paraíso Sul, Padre Pedro, 17 de Março e etc. E nos últimos anos vem sendo uma área de algumas ocupações que as autoridades – políticos e polícia, principalmente – costumam chamar de invasões. Mas o Santa Maria constitui uma periferia com uma determinada particularidade em sua configuração geográfica; assim como a zona norte, o Santa Maria é uma comunidade muito bem escondida, alheia à uma determinada parcela da população – a classe média alta e a burguesia. Escondida principalmente dos turistas. Para além dos estereótipos, pouco se conhece deste bairro. A não ser pela televisão. Com pouca e péssima urbanização, sistema de ônibus insuficiente, táxi comunitário operando irregularmente, parte da população abaixo da linha de pobreza, tráfico de drogas e violência, muitos desconhecem a complexidade social do Santa. E para variar temos um Complexo Penitenciário, o que implica uma movimentação constante de militares e vigilantes. Logo, uma atmosfera de insegurança. É realmente um lugar complexo. Mas tal complexidade, que é real, decorre da omissão dos nosso representantes políticos cujas promessas de campanha praticamente nenhuma é cumprida completamente. Percebe-se pouca luz no bairro; e mais ainda no semblante dos moradores. Em determinados pontos, aguardar um coletivo é o mesmo que aguardar um pivete disposto a assalta-lo. Aqui, como em muitas outras periferias, ou você entrega o que tem enquanto objeto material – seja lá o que for – ou entrega a alma. (Na primeira semana de abril, em uma rua paralela a que moro, em uma manhã de sábado, um trabalhador resistiu ao assalto; este decidiu entregar a alma.)

Mas o Santa Maria de modo algum, obviamente, não é só relatos de crimes, tragédias e derrotas. Em meio a agitação social diurna, é facilmente possível encontrar crianças brincando, carroceiros e catadores de materiais recicláveis trabalhando, operários, moradores reformando suas respectivas casas, duplas de evangélicos em pontos estratégicos tentando, com a palavra de Deus (e a deles) trazer luz à vida dos moradores, estudantes universitários, e uma série de atividades sem as quais o Santa não seria o que é hoje: um complexo de particularidades sociais, econômicas e materiais. Uma comunidade esquecida e desconhecida – talvez a versão moderna de alguns elementos da Antiguidade. – Ou será que um espectro pré-histórico ronda o complexo bairro Santa Maria? Quando me propus a escrever este texto, de imediato fui tomado por uma sensação de não saber o que precisamente relatar. Exatamente quando tomei por encerrada esta crônica, deliberei que era necessário comemorar, e então liguei para uma hamburgueria localizada na Hermes Fontes, no bairro São José: - Boa noite. Eu queria um x-bacon e um suco de mangaba sem leite. Após alguns segundos – certamente o tempo necessário para anotar o meu pedido -, o meu interlocutor-atendente perguntou, com certa gentileza: - Para onde, amigo? - Santa Maria – respondi, pausadamente. - Não fazemos entrega neste horário para este bairro. - Valeu, camarada. Desliguei o celular e fui tomado completamente de um riso irônico por um longo tempo, que se estendeu desde o encerramento da ligação até o início dos preparativos do que veio a ser um jantar incomum. Sem internet (a primeira versão deste texto foi escrito à mão) e sem energia elétrica - sem luz, portanto! – fiz uma pipoca. Uma noite à luz de vela. Ao deitar, algum camarada resolveu me homenagear – pelo fato de ter terminado o texto, suponho com três tiros em algum local próximo à casa que moro, na Rua da Paz.

Por: Pedro Bomba, poeta sergipano

Q

uando do alguém aparece e propõe: escreva um texto sobre a cena cultural. - Eu pondero: não tinha coisa mais simples não? Isso é algo impraticável. É como se proferissem: cruze pelado a Avenida Beira Mar com a boca lambrecada de batom vermelho, salto alto, torando as veias da garganta de tanto berrar: Revolta da Certidão! Os loucos chegaram! Revolta da certidão! Deixem suas casas e prédios. Venham testemunhar a merda que fazem! Não sei se já escutou alguém proclamar, a Revolta da Certidão calhou na profundeza interiorana de Sergipe. Até hoje, têm indivíduos que defendem a existência de seguidores espalhados pelo Estado. Tive informações através de um jornal de cultura e do governo. O cabeçalho ostentava o território. “Santa Teimosa ataca em praça de guerra: Revolta da Certidão causa vexame coletivo no município de São Padrinho”. Na reportagem de abril de 1923, assinada pelo jornalista de guerra Joel Ligeira, por volta das quatro da manhã de um sábado, residentes da Comunidade de Santa Teimosa deslocaram-se para a sede do município de São Padrinho, localizado a 340 km de Aracaju. A peregrinação perdurou tempo suficiente para os primeiros canhões de luz solar aquecerem e demarcarem a posição dos atores no palco de guerra, havendo como camarote, a frontaria da Prefeitura. A primeira fileira de centenas de moradores subiram a ladeira da Rua Central, empunhando tochas de fogo e as bocas meladas de lama vermelha. Em seguida, a segunda ala, compostas por jovens. Todos eles corriam em cima de uma espécie de pernas de pau. O terror era trazido pela chegada da multidão. Os moradores da sede morriam de medo e repugnância, mas não perdiam a oportunidade de difundir o fenótipo cunhado pelo próprio Prefeito. É gente que não tem quem favoreça e proteja, diziam. Gente que não tem título nem designação. Que não tem padrinho. As mulheres, todas elas, crianças, matriarcas e

Quero a vida boa e a tranqüila prosa / Pois ninguém mais agüenta tanto sofrimento / Queremos o que é nosso sem lamento / Que viver é o direito que temos nessa vida / Se não entregar a riqueza dessa gente sofrida.”

adolescentes, ascendiam organizadas em forma de V, tocando graúdas percussões feitas de madeira de sucupira. Quando, na frente da Prefeitura, a multidão juntou-se em blocos, todos ficaram nus. Ao sinal seco dos batuques, os insurgidos ofereceram as costas para a casa de domínio e cantaram em versos de lanças: Prefeito não quero seu nome / Não quero sua ajuda e nem favores / Só quero o som dos tambores / Das guerreiras de Santa Teimosa / Quero a vida boa e a tranqüila prosa / Pois ninguém mais agüenta tanto sofrimento / Queremos o que é nosso sem lamento / Que viver é o direito que temos nessa vida / Se não entregar a riqueza dessa gente sofrida / Vai ter bosta cobrindo toda praça do Apadrinhamento. Cometeram do manifesto causo legítimo. O prefeito camuflou-se dentro do prédio e dez cadetes tomaram posição na entrada barrando as portas. O secretário de comunicação, da janela do andar de cima, comunicou, aos 2240 habitantes de Santa Teimosa, que o prefeito não poderia atende-los, devido a uma afluência extraordinária com o governador. Não deu outra. Com passadouros ensaiados, toda multidão arrancou das bolsas de combate assentadas no chão, um pedaço de papel, comprovante de certidão de registro. Acontece que o prefeito havia pré-feito uma ação de retirada de carteira de identidade na semana anterior e todos os moradores de Teimosa, sem exceção, foram registrados com o sobrenome de Emeu. Paulinho Emeu, não apresentara escrúpulos ao batizar todos sob sua proteção. Maria Emeu. Gilmar Emeu. Judite Emeu. Segundo Joel Ligeira, cinco miúdas que moravam na barriga das mães foram registradas igualmente com o sobrenome. O fato casou extrema revolta. Quando o secretário emudeceu, os moradores agacharam-se, deitando suas certidões no chão e num berro de artilharia estrondou o coro: “Já!”. Nesse tempo, conforme descreveu Joel – que acompanhou à comunidade por dois meses e participou da revolta como “repórtermorador”- após o brado repercutido, agravou as metralhadoras de peidos e bostas e toda comunidade, em sincronia, cagou nas certidões. Foram mais de dois mil corpos de munições fabricados ali, em praça pública. Depois do espetáculo da orquestra das maquinarias orgânicas, os embrulhos foram distribuídos em posses e

lançados, certeiramente, nas vidraças, acessos, divisórias e calçadas. No primeiro cadete alcançado, os outros nove saíram com pernas de foguete. Não tinha quem permanecesse. A população insurgida adentrou na Prefeitura e lambrecou tudo. Depois partiram ao som dos batuques das companheiras de Teimosa. O prefeito, num ataque do coração, deixou o prédio carregado numa maca. A ocorrência agravou quando, ao subir na ambulância, leu as passagens na frontaria da Prefeitura. Cague nos sobrenomes! Revolta da Certidão! Retornaremos sempre que preciso for! Adoro as metáforas excessivas. Por assim descrever, o amplo território da cena cultural de Sergipe pode, nessa história, existir como a Praça do Apadrinhamento. Sem políticas culturais concretas. Somente com boas vontades e bons mocismos, além de meia dúzia de padrinhos dispostos a abraçar os desvalidos e sem qualificações. Os moradores da sede do munícipio são os que, de certa forma, fazem de tudo para rubricar os legados nominais e viverem nos arredores dos passos do Prefeito, seja ele qual for, o que é pior. O resto são os habitantes de Santa Teimosa, que vivem como algumas centenas de artistas, músicos, músicas, poetas, jornalistas e ocupações culturais alastradas pelo Estado que, de alguma forma, lutam escrevendo a narrativa do agora e invalidando os legados dos sobrenomes . O prefeito é o domínio pré-feito em qualquer cargo. E a merda é a esperança e a transformação. Se me demandassem para avaliar a cena cultural de Sergipe, calharia um jeito de desviar o tema e fantasiar uma história com tambores dando sentido a vexames. Geraria uma curta confusão de onde surge a verdade ou a mentira de episódios, só para causar dualidade acerca da cena cultural e dar vazão ao constrangimento dos padrinhos e apadrinhados, cagando, enfim, nos seus sobrenomes.

Se me demandassem para avaliar a cena cultural de Sergipe, calharia um jeito de desviar o tema e fantasiar uma história com tambores dando sentido a vexames.”


UFS

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UFS

UFS comemora 48 anos em meio a altos e baixos A Universidade Federal de Sergipe, ao mesmo tempo em que enfrenta problemas em relação à infraestrutura, é berço de programas e projetos importantes para a comunidade interna e externa FOTO E REPORTAGEM: FRANCIELLE SANTOS francielle1937@hotmail.com

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Universidade Federal de Sergipe completa 48 anos no dia 15 de maio. A instituição foi criada em 1968 e é a única universidade pública do estado de Sergipe. Ao longo dos seus 48 anos, contribui para a formação de grandes profissionais e possui um legado importante para sociedade sergipana. A sua expansão se deu através de inúmeros avanços, entre eles está a construção de campi no interior, nas cidades de Itabaiana, Lagarto, Laranjeiras e Nossa Senhora da Glória. É uma universidade jovem comparada a outras existentes, mas com uma grande história. Atualmente possui 30 mil alunos, onde oferece 113 cursos de graduação, 47 cursos de mestrado, 13 de doutorado e 9 cursos de especialização, nas áreas de ciências humanas, letras e artes; de tecnologia, ciências exatas e da natureza; de ciências biológicas e ciências da saúde. Além dos cursos presenciais, também oferece graduação à distância (EaD) com os cursos: administração pública, ciências biológicas, física, geografia, história, letras, matemática, química e mais um de especialização sobre mídias na educação. Estes cursos contam com 14 polos de apoio nos municípios de São Cristóvão, Arauá, Brejo Grande, Carira, Estância, Japaratuba, Colônia 13- Lagarto, Laranjeiras, Nossa Senhora da Glória, Poço Verde, Porto da Folha, Propriá e São Domingos. A UFS caminha a passos largos para atender a todos da comunidade acadêmica de forma justa. Um dos avanços dos últimos anos foi a climatização das didáticas e a construção de mais uma, totalizando sete. No que diz respeito a infraestrutura, foram construídos, em 2013, mais de 38 mil metros quadrados com uma verba no valor de R$ 32 milhões. Segundo a cartilha “UFS em números (2013 e 2014), durante estes dois anos, no Campus de São Cristóvão foram utilizados aproximadamente R$ 28 milhões em obras, e o restante nos outros campi. Para a adequação e ampliação do Prédio do Restaurante Universitário – RESUN, foram gastos aproximadamente R$ 1 milhão e duzentos mil. Para a ampliação e adequação do Laboratório Flavor do Nucta, foi investido RS 555 mil. A construção do Departamento de Medicina Veterinária teve um investimento de R$ 1 milhão e trezentos e oitenta mil. Já na construção do prédio do Departamento de Matemática foi gasto R$ 1 milhão e quinhentos mil. A reforma das instalações elétricas dos Departamentos do CCET e CCBS e a reforma e adequação das Didáticas

Didática 7. Construção da didática 7

I, II, III, IV, V e VI, tiveram um montante de aproximadamente R$ 19 milhões. Na reforma e ampliação da Biblioteca central - BICEN foi gasto R$ 4 milhões e na construção do Campus de Lagarto e da biblioteca R$ 8 milhões. A estudante Ana Carla Xavier, 25, que estuda o 9° período do curso de engenharia de produção, não vê tantas melhorias na universidade. “A única melhoria que me recordo foi a climatização das salas de aula”. No entanto, ela identifica avanços no Restaurante universitário. “Se comparado ao antigo Resun, houve uma melhoria na estrutura e no funcionamento”. A aluna Tárcia Rafaella Bezerra, 18, 2° período do curso de Relações Internacionais, critica a infraestrutura da universidade. “Acredito que a universidade necessita melhorar em vários aspectos, principalmente em sua estrutura física, desde os banheiros até a ampliação do restaurante universitário e na segurança dos alunos”. Ela ressalta ainda que a universidade tem avançado em alguns aspectos, mas essas melhoras ainda precisam se estender para outras áreas. “Muitos dos nossos direitos são negligenciados, tanto pelos governantes quanto pela coordenação da universidade; imagino que os nossos direitos deveriam ao menos começar pelo passe livre no transporte, defende”. Serviços/ Extensão O crescimento da UFS é concretizado por várias coisas, entre elas os avanços do ensi-

no, com a pesquisa e a extensão. Prova disto foi o salto no Índice de Qualificação Docente (IQD), que saiu de 3,31 em 2006, para 4,29 em 2014 (numa escala de 1 a 5). O conhecimento científico é apoiado por mais de 76 mil títulos, entre livros e periódicos, disponíveis nas bibliotecas dos Campi para consulta de todos os integrantes da comunidade acadêmica. Além disso, são disponíveis para que o aluno obtenha conhecimento e possa cumprir com sua graduação de maneira justa. Apesar de a biblioteca estar bastante desatualizada, com livros e periódicos muito antigos, a comunidade acadêmica não possui outras opções. A UFS e a comunidade tem uma grande ligação, principalmente através do Hospital Universitário – HU, que se destacou no país por ser referência em combate a microcefalia. O hospital se comprometeu a dar assistência às crianças com diagnóstico de microcefalia. No ano de 2013, o HU realizou 99,5 mil consultas ambulatoriais, 337,6 mil exames, 18,3 mil atendimentos odontológicos e manteve internadas mais de 2 mil pessoas. A assistência estudantil, por sua vez, realizou 9,7 mil orientações e 498 atendimentos psicoterápicos, e concedeu 599 bolsas-trabalho e 792 bolsas-residência. Outro avanço importante para a comunidade acadêmica, segundo o portal UFS, foi a assinatura, no dia 23 do mês de março, de quatro termos de cooperação, que visam integrar e articular o ensino superior público com os serviços de atenção à saúde. Entre eles está a

implantação de uma base do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU no campus, para atender a UFS e adjacências, através de uma parceria com a Secretaria de Estado da Saúde - SES. Há também um termo de compromisso que permitirá que estudantes regularmente matriculados na UFS, sejam eles da área da saúde, ou não, realizem estágios curriculares na SES. Outro destaque é o lançamento da segunda etapa da campanha de conscientização “Acerte no lixo.” Segundo o portal UFS, o Núcleo de Gestão Ambiental da Universidade Federal de Sergipe - NGA/UFS, em parceria com a Agência Officina e o Núcleo de Editoração e Audiovisual - Neav, está promovendo a segunda etapa da campanha “Acerte no lixo”. A iniciativa visa conscientizar a comunidade acadêmica quanto à coleta seletiva de lixo, ressaltando a importância do reaproveitamento dos resíduos sólidos. A primeira etapa da campanha, lançada no ano passado, deu ênfase a divisão dos resíduos recicláveis e não recicláveis. São os lixeiros com a sua devida identificação, “recicláveis e não recicláveis”, que estão em todos os corredores da universidade, visando a conscientização de todos que fazem a comunidade acadêmica. Nesta segunda etapa, o alvo são os poluentes, por isso caixotes duplos de madeira para coleta de cartuchos/tonners e pilhas/baterias, foram colocados por toda universidade para o descarte de material poluente. Um projeto de extensão que ganhou grande visibilidade e 1° lugar na categoria “Ciências da Saúde”, e foi considerado o melhor projeto de extensão da UFS no ano de 2015, é o projeto do Departamento de Educação Física, intitulado “UFS CROSS TRAINING”, que foi apresentado pelo aluno Eduardo Rodrigo Oliveira Rocha, com orientação do professor Marzo Edir da Silva Grigoletto. É um projeto de ati-

vidade física que atende a alunos e a comunidade em geral, visando manter a qualidade de vida dos envolvidos. Sua prática é bastante inovadora e seus exercícios são voltados para a atividade funcional. Problemas/ Entraves Um problema bastante recorrente é o atraso das bolsas dos alunos, como auxilio moradia, auxílio alimentação, auxílio transporte, auxílio apoio pedagógico e auxílio inclusão. Estas bolsas são resultado de um programa do Governo Federal e as verbas são repassadas pelo Ministério da Educação – MEC. Devido o atraso, muitos alunos passam até três meses sem o receber, e isso é muito complicado, já que muitos dependem dessa bolsa para se manter, sendo que maioria são do interior e de outros estados. Com o atraso no pagamento das bolsas e sem dinheiro para pagar o aluguel, alguns estudantes são despejados, outros optam por trancar o período por falta de dinheiro para pagar o transporte. No mês de fevereiro, os alunos ocuparam a reitoria e alguns dos assuntos em pauta foram o atraso, o aumento dos auxílios e a isenção do Resun para todos os bolsistas. Durante a ocupação da reitoria, os alunos conseguiram que todas as bolsas, inclusive as atrasadas, fossem pagas. Foram mais de três dias de ocupação, que trouxeram muitos benefícios para todos. Sempre que a reitoria é ocupada os alunos conseguem avanços importantes. Outro problema que vem assustando a comunidade estudantil é a violência no Campus e nos seus entornos, além disso, começou a ocorrer assaltos e arrastões dentro da própria universidade. Os alunos não contam com nenhum tipo de segurança, a segurança que existe no recinto é exclusivamente para o patrimônio. Como continuar a frequentar uma universidade que não oferece segurança aos seus alunos e funcionários?

Atividades de pesquisa - UFS Quantidade

Total de alunos bolsistas de iniciação cientifíca

1.019

Bolsas de iniciação científica VOLUNTÁRIOS Total de alunos bolsistas de iniciação ao desenvolvimento tecnológico e inovação Bolsas de inovação tecnológica CNPq Bolsas de inovaçãptecnológica FAPITEC Bolsas de inovação tecnológica UFS Bolsas de inovação voluntária Congresso de Iniciação Científica Docentes envolvidos na iniciação científica Grupo de Pesquisa Científica CNPq Projeto de Iniciação Científica em andamento

227 52 270 470 112 37 20 40 15 735 463 258 617

Assistência Estudantil

Atendimento Psiquiátrico Bolsas trabalho Bolsas de Residência Contatos e oriêntações com residêntes Entrevistas Visitas domiciliares

O Diretório Central Estudantil – DCE, representando os estudantes, compareceu ao Ministério Público Federal para protocolar um oficio, afim de que sejam tomadas as devidas providências. A situação cada dia que passa se torna mais complicada, pois estão todos a mercê dos marginais; os arrastões acontecem em qualquer lugar e principalmente a noite; as medidas necessárias já foram tomadas, mas o medo continua. O reitor da Universidade Federal de Sergipe, Ângelo Roberto Antoniolli, estando ciente dos fatos ocorridos, já se reuniu com o secretário de Estado da Segurança Pública, delegado João Batista, para discutir a questão. A Secretaria de Segurança Pública de Sergipe – SSP se comprometeu a tentar viabilizar o reforço da atuação da Polícia Militar nas imediações do campus. Um novo encontro foi agendado, com a presença de representantes da Polícia Federal e Polícia Militar, a fim de traçar estratégias para a melhoria da segurança nas partes interna e externa do campus São Cristóvão. As providências necessárias já foram tomadas, resta saber e observar como se vai dar o andamento dessas medidas. Se realmente vão funcionar e como vão funcionar. A estudante Eliaci Santos Carvalho, 24, do 8º período de Nutrição, enfatiza que é inadmissível que ocorra assaltos dentro da instituição. “Diante do tamanho da universidade, é necessário segurança em toda sua extensão. E já que os responsáveis pela universidade não estão a fim de contratar mais seguranças, que seja colocado um posto policial dentro dela. Acho que um sistema de segurança que identifique todos que entrarem na UFS também é necessário. Não que vai impedir o acesso, já que a universidade é de todos, mas pelo menos um meio de identificação de quem entra e sai do Campus.”

Arte: Ascom UFs

Especificação Bolsas de iniciação científica CNPq Bolsas de iniciação científica FAPITEC Bolsas de iniciação científica COPES

55

498 599 798 9.737 1.530 167

Fontes: COPES/ados e CODAE/PROEST(dezembro/2013)


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AÇÕES INCLUSIVAS AUXILIAM BOLSISTAS E ALUNOS COM DEFICIÊNCIA Programa de Ações Inclusivas atende a dois públicos: os estudantes com alguma deficiência e os bolsistas remunerados pelo serviço que prestam na assistência dos alunos favorecidos pelo programa. FOTO E REPORTAGEM: LUCIVÂNIA DOS SANTOS luh.sts23@gmail.com

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assarelas estreitas, chão esburacado sem rampas e piso tátil, didáticas sem plataformas, assim era a Universidade Federal de Sergipe (UFS), praticamente sem acessibilidade. Alunos deficientes que ingressavam na instituição sofriam com as dificuldades, sem ter auxílio para locomoção, execução das atividades acadêmicas, entre outras tarefas. Elisângela Corcínio, 36 anos, cadeirante, está cursando Letras Português e Espanhol. Ela conta que entrou na universidade em 2011 e a estrutura era péssima. “A acessibilidade era horrível. Não tínhamos fácil acesso às didáticas, havia muitos buracos entre uma e outra.” Esses obstáculos inclusive, foram motivos de desistência de outros alunos. Segundo a estudante, um senhor cadeirante do mesmo curso, cansado de tantas quedas, deixou a instituição e retomou ao curso há pouco tempo. Para amenizar o cenário de desassistência, recentemente foi criado o setor de Divisão de Ações Inclusivas – (DAIN), da Coordenação de Assistência e Integração do Estudante – (Codae). Este é um dos responsáveis pelo Auxílio Inclusão e Pedagógico, principalmente dos assuntos referentes aos alunos que possuem algum tipo de deficiência, já que faz parte do Programa de Ações Inclusivas (Praincluir) da universidade e do Programa Incluir do Ministério da Educação (MEC), que desde 2007, tem por objetivo apoiar as Pessoas com Deficiência (PcD) que chegam as universidades federais. Afinal, o que é e como é feito este auxílio? Muitos fazem esta pergunta. É através de um edital lançado pela Pró- Reitoria de Assuntos Estudantis (Proest), que os alunos interessados se inscrevem e são selecionados de acordo com a situação financeira de cada um. Com uma remuneração de R$ 400 reais, o auxílio chama bastante atenção daqueles que não tem condições de trabalhar fora e estudar. Um exemplo é Thais Karen, que está no 4º período do curso de geografia. Ela revela que não sabia ao certo de que se tratava o auxílio, mas ficou interessada na renda extra. “Como eu era do interior, precisava de dinheiro e tinha umas horas vagas, resolvi fazer minha inscrição na bolsa. Mandei os documentos pelo Sigaa e consegui”. Ela não foi a única, Ana Carla Xavier, 25, cursa Engenharia de Produção e afirma que também se inscreveu sem saber muito bem do que se tratava. “Quando fiquei sabendo gostei.” Dos 200 universitários com algum tipo de deficiência, apenas 35 são assistidos: destes, 23 possuem deficiência auditiva e são auxiliados por intérpretes; os outros 22, que possuem outro tipo de deficiência, também recebem assistência. Nem todos entraram pelo sistema de cotas. De acordo com a coordenadora, houve um que entrou pelo sistema de ampla concorrência. Segundo Ana Priscila dos Santos Alves, Técnica em Assuntos Educacionais, o número de bolsistas que fazem parte do programa são cerca de 65. “Eram 70, mas algumas pessoas pediram desligamento por terem que optar por projetos de pesquisa ou então mudança de Estado”. O aluno bolsista do programa Auxílio Inclusão tem como atribuição prestar apoio acadêmico aos alunos com deficiência durante oito horas sema-

Bolsista. Aleanderson com o bolsista Murilo ajudando-o.

nais, auxiliando na leitura do material de estudo (como no caso dos alunos cegos ou de baixa visão), na locomoção daqueles que utilizam cadeiras de rodas, na escrita das atividades em sala de aula, para quem tem deficiência motora, entre outras ações. O programa beneficia não só os alunos que têm necessidades especiais, mas também aqueles que precisam de renda para poder continuar se mantendo na universidade, como é o caso da estudante do sexto período de Serviço Social, Francielle Paz, 24. “É graças ao auxílio inclusão que consigo manter minha permanência dentro da faculdade”. Em contrapartida, o bolsista pode perder o auxílio caso não exercer suas funções, por exemplo: se não cumprir o horário, se faltar com frequência, se atrasar muito. Caso isso ocorra eles começam a receber advertências verbais e escritas, se mesmo assim continuar a não cumprir os critérios do auxílio, são encaminhados para o desligamento sem chances de voltar. A necessidade do conhecimento Antes de iniciar o acompanhamento à PcD, os alunos passam por um treinamento. Eles fazem o Curso Básico de Acessibilidade e Orientação Inclusiva, com duração de uma semana e com professores qualificados. Nesse curso, eles aprendem o que é inclusão, com aulas teóricas e práticas, mostrando quais os tipos de deficiências, para que saibam melhor como se comportar diante de alguns fatos. Eles também fazem alguns testes para sentirem os estigmas do dia a dia da PcD, Participam de palestras, ouvem os relatos de alguns deficientes em sua vida cotidiana e o depoimento de pais ou parentes sobre acontecimentos e vivências. “Eu nunca tinha tido contato com surdos, deficientes visuais, ou cadeirantes. Não sabia como me deslocar, conversar, nem o que eles precisavam,” argumenta Thaís.

Segundo Karen, o treinamento que a DAIN oferece para os bolsistas é muito importante, porque a pessoa passa a ter ideia do que vai fazer e do que o aluno assistido necessita. “A principal noção que precisa ter é que o aluno está na sua mão, ele depende de você.” De acordo com o professor do curso e intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras), José Ferreira Filho, o curso nasceu com o intuito de redimir algumas dúvidas e impasses entre bolsistas e alunos assistidos, além de fornecer também um pouco de conhecimento e delimitar as funções ou papel de ambas as partes. “Como por exemplo, delimitar o papel do bolsista, como se portar e interagir diante de cada deficiência, pois muito mais que lidar com a deficiência, você está lidando com o ser humano e colega, uma vez que todos são alunos, a diferença está no desempenho de cada um.” Horários para os acompanhamentos Como não pode haver choque de horário, a coordenadora Susana de Oliveira Santana, relata que na primeira etapa é feita uma triagem. Se a aluna bolsista estuda pela manhã, ela só terá disponibilidade a tarde ou à noite para acompanhar o estudante. “A gente tenta fazer um horário que atenda a necessidade do aluno que precisa e que não prejudique o aluno que vai acompanhar.” Desse modo, o aluno assistido tem vários bolsistas para acompanhá-lo durante toda a semana. A segunda etapa de seleção é feita através do perfil: qual bolsista vai se identificar mais acompanhando o aluno cego, ou que tem deficiência psicomotora, para ver quem vai se adequar mais a situação. Em alguns casos, há alunos que copiam em sala de aula, então é selecionado quem tem a letra mais acessível para o aluno entender. A escolha é independente do curso de cada um. Desse modo, o bolsista vê assuntos de diversas áreas. Karen declara que gostou pelo fato de

ter a oportunidade de aprender outras coisas. “Eu acompanhava uma menina que tinha muita aula de espanhol, então aprendi a falar em espanhol. Acompanhei uma pessoa de jornalismo e entendi um pouco de jornalismo”. O bolsista que não acompanha aluno em sala de aula fica na sala do Incluir a disposição, para apoiar alguém que precise, substituir o colega que faltou, ou até mesmo fazer digitalização de livros para que os deficientes visuais ou cegos possam estudar através do programa DosVox. O bolsista na vida acadêmica da PcD A vida de ninguém é fácil, mas, quando há pessoas dispostas a ajudar a derrubar as barreiras, fica menos complicado. Neste sentido, os bolsistas são de grande importância para os deficientes. Tatiana dos Santos, 31, com deficiência motora, sentiu falta de apoio no início do curso de Comunicação Social. “Era muito difícil. Por causa da minha dificuldade e por não ter uma pessoa para poder me auxiliar, acabei perdendo duas disciplinas no primeiro período e uma no segundo, porque eu tinha muita dificuldade de acompanhar o professor.” Em 2013, a universidade foi mudando e a chegada de mais bolsistas para auxiliar as PcD facilitou a inserção no ambiente universitário. “Melhorou bastante depois que começou o acompanhamento, eu não perdi nenhuma disciplina,” conta Tatiana. Ou seja, se não fosse o auxílio deles, muitos ou desistiriam do curso ou precisariam do apoio de algum parente para ajudá-lo. A relação do bolsista e do aluno assistido é tranquila. A troca de experiência os aproxima bastante. Ana Carla relata que sempre os viu como batalhadores e acha impressionante como eles vivem de uma maneira que nós nem imaginamos, e quando se imagina acha que não suportaria. “Eles passam para nós que não é bem assim.” Thaís revela que via as PcD como pessoas que precisavam ser ajudadas, mas quando teve a oportunidade de trabalhar com eles, percebeu que na verdade eles não precisam de ajuda. “Eles são bem independentes.” Claro que existem muitas dificuldades visíveis. Para um cego, por exemplo, há muitos empecilhos que o impede de andar tranquilamente em qualquer lugar. Um cadeirante também enfrenta muitas dificuldades, principalmente nos transportes públicos. Mas eles não fazem disso o fim do mundo. Muitas vezes, aluno e acompanhante acabam criando um elo de amizade, principalmente quando o auxílio dura todo o período e, em alguns casos, a assistência continua mesmo com o fim da bolsa. Segundo Karen, mesmo que ela não tenha mais a obrigação de acompanhar aquele aluno, ela se preocupa com ele, devido a amizade que construíram. “Acabo ajudando o aluno, dando uma força, por amizade e não apenas por obrigação.” Aleanderson Augusto Rodrigues, 37, está no 4º período do curso de Geografia, porém, está solicitando transferência Comunicação Social – Habilitação em jornalismo. Ele é deficiente visual e declara ter uma boa relação com todos que o acompanharam, desde o primeiro período até agora não teve problema com nenhum bolsista. “Tem uma bolsista que está comigo há dois anos. Graças a Deus”, conta. Acessibilidade além da estrutura física Até hoje é notável a carência de acessibilidade em diversas partes do Campus; o piso tátil, por exemplo, ao invés de ajudar ao deficiente visual ou cego a se orientar por onde ir, acaba atrapalhando, pelo fato de ser emborrachado e mal aplicado. Essa mal aplicação faz com que o piso solte, criando uma espécie de “orelha”, que atrapalha a todos, principalmente aqueles que precisam dele.

Outra reclamação em comum entre as PcD e pessoas da DAIN é a questão do mau comportamento de alguns professores. Conforme relatos de Aleanderson, no primeiro período houve um sério problema com uma professora. “Ela levava os gráficos e não fazia descrição deles. Eu nunca fui de faltar aula, mas a partir desse dia eu não assisti uma aula dela.” Ele não foi o único, infelizmente. Outro caso que chamou bastante atenção ocorreu com o intérprete de Libras da UFS, Irami Billa Silva, que auxilia um aluno surdo que cursa Engenharia da Computação. Ele foi convocado pelo professor a sair da sala de aula, porque segundo ele, o intérprete estava atrapalhando a aula, já que os outros alunos estavam prestando atenção aos sinais que ele fazia e isso estava incomodando-o. Ao explicar o que estava acontecendo, o aluno se posicionou dizendo que precisava do intérprete. Nesse caso, quem estava sendo auxiliado era o próprio docente, sendo que o interprete era a voz do professor. Após várias tentativas de adequação para não “atrapalhar”, o mesmo interprete foi novamente interrompido, porque o professor queria que ele fizesse os sinais de modo silencioso, sendo que alguns fazem pequenos barulhos. “Pacientemente me virei e questionei se ele conhecia a Libras. Ele disse que não, mas que eu sinalizasse de modo diferente. Diante disso, me posicionei enquanto profissional e disse: ‘eu não fico aqui dizendo o que o senhor tem que fazer, também não admito que me diga como tenho que trabalhar. Ou o senhor vai me permitir interpretar ou eu me retiro da sala de aula’,” relata. Neste caso, Irami conta que o professor sentiu-se encurralado, até porque os outros alunos já estavam saturados de tudo aquilo que estava acontecendo. Após esse fato, o aluno foi ao departamento fazer notificação de tudo que havia ocorrido no primeiro dia de aula. Depois disso, o professor apresentou uma melhora significativa, a ponto de elogiar o aluno que era acompanhado pelo intérprete, por nunca ter faltado. Entretanto, no final do período, o intérprete foi chamado pelo professor, que revelou acreditar que o aluno não estava entendendo toda a matéria, uma vez que o conteúdo era difícil e se tratava de matéria filosófica e que ele tinha a certeza que a Libras não tinha condições nem material vocálico suficiente para isso. “Eu garanti ao professor que tudo que foi dito foi sinalizado, se houve alguma falta de clareza na sinalização é porque também houve uma falta de clareza na fala dele. A título de exemplo, eu disse que ele fala apressado, de uma forma muito abrupta e aglomerada”. Reconhecendo seu erro, o professor pediu desculpas e, no final do período, o aluno tirou nota máxima na

elaboração de um projeto de pesquisa.

Aparentemente tudo isso aconteceu inicialmente porque ele não acreditava na capacidade do intérprete e principalmente do aluno. Ao questionar se professores recebiam algum tipo de treinamento para saber lidar com os alunos com algum tipo de deficiência, a coordenadora Susana revela que existe um projeto onde a Pró-reitoria de Graduação (Prograd) está tomando a frente desde 2015. “A gente tem apoiado para fornecer as informações necessárias para abraçar esse projeto e já com essa finalidade de capacitar os professores com formação permanente sobre a inclusão no ensino superior e ele tem a finalidade de está atualizando os professores sobre como lidar com aluno com deficiência, quais as especificidades, recursos que podem ser utilizados.” De acordo com a coordenadora, o projeto é também para mostrar como a inclusão pode ser feita de forma satisfatória, para evitar tantas barreiras atitudinais que tem acontecido. “Acho que hoje, o maior problema, em qualquer instituição de ensi-

77 no, é a barreira atitudinal: o susto, a resistência que muitos professores têm em ensinar alunos com deficiência. Então as instituições têm que se preparar, dando esse suporte aos professores, como eles podem estar atuando em sala de aula ou fora.” Porém, é bom lembrar que nem todos professores têm esse jeito grosseiro. Há aqueles que já chegam perguntando o que o aluno precisa. Aleanderson fala sobre isso. “Ao mesmo tempo em que tive uma professora que agiu dessa forma, tive outra que sinceramente, igual a ela na UFS ainda não encontrei. Foi a professora Ana Maria. Quando ela chegou à sala que me viu, veio conversar comigo por um bom tempo. Ela mesma se colocou a disposição de vim buscar material em braile, correu atrás, conseguiu o material e tudo ao decorrer das primeiras semanas de aula”, pondera o aluno. Os avanços na inclusão da UFS Apesar de faltar muita coisa para a Universidade ser a melhor em questão de inclusão e acessibilidade, a UFS é uma das que vem avançando bastante. Ana Priscila diz que não é a universidade modelo, mas que não deixa a desejar, “Têm muitas universidades que estão engatinhando na inclusão.” No mês de março, a UFS recebeu a visita de uma consultora da UNESCO, que trabalha na Secretaria da Educação Especial (Seesp) do MEC. Segundo Susana, a consultora vem visitando as Instituições de Ensino Superior (IES) do País, ela ficou responsável pelas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Já foram visitadas mais de 50% das IES e a UFS foi a que recebeu mais elogios nas questões de estrutura física. Em comparação a outras instituições, está mais avançada como no que diz respeito às rampas de acesso e às plataformas elevatórias. “Teve universidades que ela nem viu piso tátil, instituições que são referências em outras coisas.” Outro elogio da supervisora foi com relação ao número de intérpretes de Libras, pois há universidades que ainda não tem. Embora hoje haja equipamentos eletrônicos, como computadores adaptados, impressoras em Braille, softwares, entre outros materiais e equipamentos que são importantes para incluir a PcD, ainda faltam bastantes coisas. Ana Priscila revela que apesar de já estarem pagos, alguns equipamentos até o momento não chegaram, como, por exemplo, os gravadores para o uso do aluno cego. Outros equipamentos foram pedidos, mas até então não conseguiram, como no caso da impressora 3D. Apesar das dificuldades, todos os envolvidos no projeto fazem o trabalho com muita dedicação, para oferecer melhores condições às PcD. A coordenadora Susana enfatiza que é uma grande satisfação atuar nesse setor, apesar dos desafios. “Você se sente desafiado a superar aquele obstáculo em favor dos alunos. As vezes, coisas tão pequenas fazem uma enorme diferença na acessibilidade.” Assim como a coordenadora, o aluno assistido pelo auxílio, Aleanderson, conta que o setor é muito importante para a PcD e acha que a reitoria deveria dar um suporte maior a DAIN, porque a universidade é gigantesca para o número de pessoas com deficiência. “Deveria fazer um investimento maior nessas pessoas que apoiam”. Isso é para que outros alunos não venham a desistir de seus sonhos de ingressar numa universidade federal.

Dica de leitura (inclusiva): Conheça as terminologias aplicadas às Pessoas com Deficiência (PcD) no Guia Mídia e Direitos Humanos, disponível no site do Coletivo Intervozes. (www.intervozes.org.br/direitoshumanos)


Comunidade

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Restrição na oferta de creches no Rosa Elze afeta moradores Insuficiência de opções na rede privada e imbróglios na rede pública para implantação e manutenção das creches restringe assistência a crianças do bairro. FOTO E REPORTAGEM: MARIANA PIMENTEL maricorreiaufs@gmail.com

Oficina. Alunos da rede privada do bairro realizam oficina com crianças da Creche Maria de Lourdes

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las trabalham, pesquisam, estudam. São mães e isso não as condicionam a abrir mão das atribuições pessoais e profissionais que tinham antes da maternidade. Muitas vezes, também existe a escolha por estender o período de cuidado integral ao bebê. Bagunça, mil e uma tarefas (muitas vezes mal distribuídas entre os pais), atenção constante e redobrada, medos e anseios. Esta é uma rasteira tentativa de definir o que é ser mãe. É carinho, cuidado, amor, claro que sim. Mas, é também ouvir e perceber uma série de julgamentos que a sociedade, abrangente como só ela, faz sem se importar com a escolha da mulher. É preciso dar voz ao que ninguém se interessa em escutar. Maio é o mês em que se comemora o dia das mães, mas a data é propícia para se questionar: Até quando seremos respeitadas em nossas particularidades? Ela desce a ladeira segurando seu filho pela mão. Conversando, o menino segue muito tranquilo, habituado com a rotina. Em um trecho da calçada cheia de lama e cercada de água da chuva da noite anterior, sua mãe o pega pelo braço e atravessa a avenida para não correr o risco de escorregarem. Joselaine Carvalho, doutoranda em química pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), leva seu filho de três anos ao colégio onde estuda há aproximadamente dois anos. Logo no início do mestrado em química na UFS, Joselaine engravidou. Todos se perguntavam como ela daria conta dos estudos, da gestação e da maternidade. Mas ela seguiu adiante. Morando próximo a universidade, frequentou as aulas até os oito meses e meio

da gestação, finalizando o período letivo. Seu filho chegou e ela, entre os tantos desafios que surgiram, viu sua licença maternidade chegando ao fim enquanto ainda não havia uma alternativa. Com quem ela poderia deixar seu filho no horário das aulas? Essa dúvida teve trégua por um período de oito meses, onde após o fim da licença ela conheceu Suely, uma mulher que cuidava de crianças em sua própria residência. Mas perto do bebê completar um ano de vida, Suely desistiu do serviço e Joselaine precisou encontrar outra opção para seu filho. Começou a pesquisar opções pelo bairro, cogitando contratar uma babá, pois não encontrava hoteizinhos nem mesmo no Eduardo Gomes, conjunto habitacional com maior variedade de estabelecimentos. E, foi procurando por uma babá, que ela descobriu o Hotelzinho e Colégio Magia do ABC, onde seu filho estuda até os dias atuais. Joselaine iniciou os estudos referentes ao doutorado no final de março e a partir de então, estendeu integralmente a permanência de seu filho na escola. Ela é apenas um exemplo entre tantas histórias de mães, pais, filhos e peregrinações. Um local de confiança? Um prédio amarelo de dois andares no final da rua. Esse é o Colégio Magia do Abc, que existe há cerca de cinco anos e em seu prédio atual está funcionando há três. Avaliando o preço dos hoteizinhos referentes ao turno parcial, essa é umas das opções do bairro que mais se encaixa ao valor de R$200 reais oferecido pelo auxílio creche, bolsa de

assistência estudantil da UFS. Erisângela de Jesus, proprietária da instituição, comenta que no início eram apenas cerca de 12 crianças. Aos poucos, a demanda foi crescendo e ela percebeu a necessidade de oferecer um ambiente com maior capacidade de alunos. Hoje a escola atende desde o hotelzinho em período integral até o 5º ano. São muitos os desafios para a manutenção de um serviço que merece muita dedicação e cuidado. Erisângela afirma que além do carinho e dedicação com a educação, existem as questões ligadas às exigências da vigilância sanitária por exemplo, que demandam toda atenção voltada até mesmo para a construção do ambiente. “É preciso ter atenção para a cozinha. As refeições não são preparadas aqui, pois o botijão não pode ficar aqui dentro, ele fica voltado para minha casa pois moro vizinho à escola. Antes de tudo também sou mãe e não vou oferecer aos filhos dos outros o que não quero para o meu, que também estuda e faz as refeições aqui na escola”, explica Erisângela. Lethícia Correia é estudante do 6º período de Licenciatura em História e recebe o auxílio creche da UFS. Ela trabalha no turno da manhã e deixa seu filho na Escola de educação infantil Adorai, no loteamento Tijuquinha, no bairro Rosa Elze. Durante a noite, o pai assume os cuidados da criança enquanto ela vai para a Universidade. O valor do auxílio garante a mensalidade porque a instituição aceita apenas crianças maiores de dois anos, idade em que geralmente o valor é menor. Para as famílias que não possuem condição de pagar pelo serviço, a única opção de instituição pública do bairro tem uma realidade muito diferente. A Creche Municipal Maria de Lourdes, fundada em 1992, passou por reformas estruturais decisivas para oferecer melhores condições de saúde e higiene para as crianças. Jeane Marquise, gestora da creche desde 2011, disse que foram feitos revestimentos com pisos e azulejos, pois antes disso o chão era apenas de cimento. As crianças tomavam banho com água fria armazenada há dias em caixas d’água e apenas para os bebês menores a água era esquentada. O espaço da creche possui capacidade para 50 crianças, mas o número de funcionários só consegue dar conta de 30. Por ano, apenas cerca de 10 vagas são liberadas, pois as crianças permanecem na creche até os 3 anos e só depois disso são transferidas para escolas de educação infantil. A creche não tinha brinquedos para oferecer as crianças e sabendo disso, alunos do curso de administração da UFS arrecadaram brinquedos, fraldas e material escolar para doação à creche. Existem meses em que alguns funcioná-

rios tiram parte dos salários para ajudar a pagar as despesas.“A verba que recebemos para garantir produtos de limpeza e manutenção de material escolar não chega nem ao valor de R$2000 reais recebido apenas uma vez por ano”, afirma Jeane. Enilene Paixão, diretora pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de São Cristovão, diz que os gastos direcionados para a Creche são relacionados à merenda escolar e a manutenção dos profissionais que atuam na instituição. Ao ser questionada sobre o baixo número de alunos matriculados devido a falta de profissionais, ela afirma que, para os alunos com faixa etária entre 0 e 2 anos, os cuidados não precisam ficar sob a responsabilidade de um professor e sim de uma equipe de funcionários que consiga garantir a tarefa. “Já foram transferidos alguns executores (pessoal de apoio) para exercer a função de cuidadores e garantir que mais crianças de até 2 anos possam frequentar a creche.” Porém as crianças nessa faixa etária precisam de maior assistência e atenção e não é apropriado que um profissional de apoio, responsável e remunerado para garantir a limpeza da creche, exerça dupla função. Além do que a atenção prioritária aos alunos fica comprometida com a responsabilidade no exercício da profissão. Além disso, os executores podem apresentar em seu fardamento resíduos de material de limpeza nocivos à saúde das crianças. A diretora comenta que é preciso enviar um projeto para a câmara solicitando permissão para abertura de concurso público ou processo seletivo para garantir cuidadores e demais funcionários. “Já avaliamos junto ao secretário de educação que para suprir a necessidade do Rosa Elze seriam necessárias até mesmo mais duas creches, pois o bairro concentra um grande número de habitantes”, declara Enilene.

A luta é maior De acordo com dados fornecidos pelo Serviço Social da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PROEST), atualmente 44 estudantes são beneficiados pelo auxílio creche, sendo 43 mulheres e um homem. Os profissionais da PROEST avaliaram que muitas vagas permaneciam ociosas, devido a não comprovação dos documentos exigidos para o processo de seleção. Assim, a equipe de assistentes sociais encaminhou essas questões ao Conselho Superior e conseguiu aprovar a Resolução 08/2016/CONSU, que passou a garantir o direito dos candidatos em solicitar o auxílio em qualquer tempo, sem precisar esperar a abertura do edital de vagas. Também é preciso entender a creche como um direito da criança. Matheus Pacheco, estudante de pedagogia, integra o coletivo Pedagogia da Resistência e participou da ocupação de reitoria em março deste ano, organizada por estudantes bolsistas da UFS. Uma das reivindicações para a desocupação da reitoria foi o termo de comprometimento para a criação de uma creche na UFS. O termo foi assinado pelo reitor e representantes da ocupação e de entidades estudantis e sindicais. Matheus relembra que ao trazer em questão a pauta da creche, as pessoas logo relacionam o assunto ao movimento de mulheres, pelo fato de que estas são as mais beneficiadas por ainda serem a maioria na responsabilidade do cuidado dos filhos. “Mas, por exemplo, não é falado nos direitos das crianças ou do uso da autonomia universitária para estender políticas públicas a quem sempre foi renegada. Lembro que a creche não foi a única vitória, também conseguimos pautar a ampliação do Colégio de Aplicação ( CODAP) para as séries iniciais (1º ao 5º ano), diz. Fábio dos Santos é assistente social da PROEST e atua no Sindicato dos Trabalhadores Técnico- Administrativos em Educação da UFS (SINTUFS) e relata que uma das conquistas da greve de 2015, que teve duração de 133 dias, foi o aumento do auxilio creche (assistência pré-escolar). O salto foi de R$66,00 para R$321,00, além do aumento de outros benefícios referentes à saúde e alimentação. Ainda na greve de 2015, o SINTUFS organizou o dia de luta pela Creche, realizado no hall da reitoria e mobilizou estudantes e trabalhadores a trazerem seus filhos para cobrar junto à administração da universidade a construção de uma creche (ou núcleo de educação infantil). Fábio afirma que a principal atividade seria a atualização do projeto de implantação do Núcleo de educação infantil, (pois há alguns anos atrás o Departamento de Educação apresentou à Pró Reitoria de Extensão a proposta de criação deste Núcleo na UFS) para reapresentação à gestão administrativa da UFS e, neste sentido, discutir e definir os meios para sua construção e manutenção. “É preciso aprovar a cessão de terreno pela própria UFS para construção, o estabelecimento de parceria junto à prefeitura municipal de São Cristóvão, para acessar os recursos financeiros do Programa Proinfância do Governo Federal (para construção de creches nos municípios), a definição quanto à sua gestão financeira e administrativa (qual a parte que caberia ao município, aos sindicatos, à UFS, às Pró-reitorias de assistência estudantil, Recursos Humanos e Extensão, e aos departamentos que a utilizariam como espaço de ensino, pesquisa e extensão para formação acadêmica)”, aponta Fábio.

Não é falado nos direitos das crianças ou do uso da autonomia universitária para estender políticas públicas a quem sempre foi renegada.”

Divisão de tarefas Além de todas as dificuldades no acesso ao direito da creche, existem uma série de preconceitos com as mães que estudam e trabalham, diminuindo o profissionalismo da mulher, que algumas vezes passa por restrições. Aline Belém, mãe de um menino de três anos e nove meses, psicoterapeuta e professora universitária, conseguiu se dedicar a amamentação prolongada e adiar a necessidade de um hotelzinho para seu filho, pois toda a família e uma babá conseguiram alternar a responsabilidade do cuidado da criança. Para a grande maioria que não possui essa oportunidade, Aline comenta que o desmame precoce é quase certo em muitos casos. “Há uma áurea que paira sobre o universo acadêmico no que se refere à mulher que é mãe, como se ela fosse “menos profissional”, afinal, perde aula quando o filho tem febre, babá falta, etc. E esta questão é complexa, pois envolve o papel do pai, que culturalmente não é quem perde trabalho para cuidar da febre do filho, por exemplo. Então neste caso, deixaríamos de tratar este tema como um problema que se deve exclusivamente à interrupção do contato mãe-bebê. Passado o período de amamentação, a política institucional deveria voltar-se para o contato entre pais e filhos de maneira geral”, ressalta. Aline acredita que todas as ações que envolvem as atribuições maternas e paternas precisam de um longo processo de conscientização institucional e cultural, para que efetivamente as mães possam sair de seus postos de trabalho e estudo para amamentar, sem serem assediadas ou diminuídas profissionalmente por isto, o que é bastante comum.

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Sergipe

Sergipe apostaempublicidadeparadriblar crise e atrair turistas no São João Governos estadual e municipal lançam campanhas publicitárias na Bahia e Rio/SP com o objetivo de trazer turistas para a cidade durante os festejos juninos.

FOTO: ANDRÉIA REIS

MARCOS PEREIRA marcospereira.jor@gmail.com

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epois do verão, o São João é a época do ano em que o estado de Sergipe mais recebe turistas. Por um lado,visitantes que buscam o encanto da festa tipicamente nordestina, as noites dançantes ao pé da fogueira, bandeirolas coloridas e as comidas e bebidas que alimentam e aquecem as noites frias de junho. Por outro, turistas que procuram tranquilidade, belas paisagens e fogem da agitação das grandes metrópoles. Aracaju se destaca no Nordeste com uma das maiores festas juninas da região. O Forró Caju reúne milhares de pessoas em vários dias de festa na praça dos mercados centrais, com atrações musicais nacionais e locais, quadrilhas e apresentações de grupos culturais. Além do Forró Caju, outra festa bastante procurada na capital é o Arraial do Povo, que acontece na orla de Atalaia. No principal ponto turístico de Aracaju,o barulho das ondas do mar dá lugar ao tradicional forró pé-de-serra, e o caranguejo, ao milho e o mungunzá. Na Zona Norte, a Rua de São João abre os festejos juninos da cidade com um tradicional arraial que reúne turistas e moradores. No interior, destacam-se os festejos das cidades de Capela, que tem a festa do mastro e o São Pedro mais tradicional do estado e acontece no fim de junho. Em Nossa Senhora do Socorro, o Forró Siri é o principal evento do mês junino. Em Estância, o tradicional barco de fogo alegra e colore as noites da cidade da região sul do estado. Por outro lado, Sergipe é conhecido como um reduto para os amantes da natureza e da tranquilidade. Com um litoral privilegiado com praias quentes e dunas branquinhas, o estado ainda é cortado por vários rios, como o São Francisco e o Vaza-Barris. Uma das opções é o passeio pelo cânion de Xingó, lugar que serviu de cenário para telenovelas. Além de museus e cidades históricas que guardam um pouquinho da história do Brasil. Esses são os destinos mais procurados por baianos, cariocas e paulistas. Com os festejos juninos chegando, a preocupação do governo, prefeituras e empresários é com a crise financeira. Com a desaceleração da economia e alta do dólar, as viagens internacionais e nacionais sofreram impacto significativo. Com isso, a divulgação de Sergipe em outros estados é a principal estratégia adotada para driblar a crise. Segundo o consultor da Secretaria Municipal da Indústria, Comércio e Turismo de Aracaju (Semict), Fábio Andrade, a divulgação dos festejos juninos em âmbito nacional e regional já acontece desde o início do ano. “Nós fizemos

Cânion de Xngó. Para turistas que desejam um passeio relaxante pelas águas do Velho Chico, o Cânion de Xingó é a atração mais procurada.

uma divulgação com muita antecedência e buscamos segmentar. Exibimos uma reportagem de oito páginas em uma revista de turismo para a terceira idade em São Paulo, já que o público idoso é forte em Aracaju e é um público que viaja bastante e que tem um poder aquisitivo mais elevado, além de a nossa cidade ser bem reconhecida pela acessibilidade”, explica. Além da revista, Aracaju ganhou no mês de março destaque no Jornal Folha de São Paulo e no Programa da Sabrina, na Record. “Aracaju começa a se profissionalizar no turismo e colhe os frutos disso”, diz Fábio. Investimento estadual O secretário de Estado do Turismo e do Esporte, Adilson Júnior, pontuou dificuldades previstas para 2016, já que não houve liberação de recursos pelo Ministério do Turismo. Com recursos próprios, o grande investimento da secretaria para atrair turistas ao estado é por meio de divulgação. Entre as ações, está a realização do evento “Expedição Sergipe”, percorrendo bares e restaurantes de Salvador e Feira de Santana (BA) e Maceió (AL). A Bahia foi escolhida como ponto de partida por ser o principal emissor de turistas para Sergipe, movimentando em torno de 50% de toda a economia do setor. Nesses locais são realizadas apresentações de trio de forró pé-de-serra, distribuições de brindes e abordagem dos clientes para entrega de material de divulgação, além da realização

de uma “Noite Sergipana”. Também são feitas divulgações através de outdoors em Salvador, veiculação de spots em rádios da capital baiana e reforço das mídias digitais, sempre com enfoque no slogan “Sergipe, viva essa experiência!” A divulgação teve início em março e deve se estender até o fim do primeiro semestre. O secretário fez um balanço do ano de 2015 e diz que, apesar das dificuldades, foi um ano de muitos avanços no turismo sergipano. “Só em 2015 foram capacitados cerca de 2.000 representantes de agências de viagem sobre o destino Sergipe e outras 400 pessoas para atender a crescente demanda por profissionais no mercado turístico local”. O secretário ainda destacou a decisão do Governo do Estado, através de gestões realizadas pelas Secretarias de Estado do Turismo e do Esporte (Setesp) e da Fazenda (Sefaz), em reduzir a alíquota sobre o querosene de aviação (QAV) elevou o número de voos de 18 para 24, representando 128 frequências semanais entre Aracaju e os principais polos emissores de turistas do Brasil. A cidade que respira São João Os turistas que chegarem a Aracaju no início do mês de junho serão recebidos em ritmo de forró. Um trio pé-de-serra e dançarinos farão a recepção dos turistas no aeroporto da cidade. Outra atração que já é tradicional é a marinete do forró, um ônibus estilo jardineira, colorido e enfeitado com símbolos da cidade e que

já existe há 16 anos. O ônibus é animado por um trio pé-de-serra e dançarinos que ensinam os passageiros a dançar, além de um guia turístico. A marinete, que em seu trajeto percorre os principais pontos turísticos de Aracaju, tem uma parada no mirante do bairro 13 de julho, onde a Fundação Cidade de Aracaju (Funcaju) faz uma exposição sobre a culinária junina. A Semict, em parceria com a CDL, também a partir de primeiro de junho, colocará forró e quadrilha no calçadão do centro comercial e nos mercados centrais para fomentar o comércio. Outra atração apreciada pelos turistas é o Projeto Por do Sol, na orla de mesmo nome, no Mosqueiro, Zona de Expansão da capital, que promove feirinhas de artesanato e atrações musicais e artísticas. Permanente, o projeto completou dois anos de existência em abril e a temática junina é trabalhada o ano inteiro. “O que fez Aracaju ganhar da Fundação Getúlio Vargas, Ministério do Turismo e Sebrae Nacional o título de cidade que mais evoluiu nas questões culturais no país é que aqui se tem as condições de ter uma vivência da nossa cultura o ano inteiro”, explica Fábio Andrade. Além do Projeto Por do Sol aos sábados, os turistas podem fazer as travessias de catamarã ou lancha da orla para as ilhas. Do Natal para o ano novo (2015/16), 6.000 pessoas fizeram a travessia, segundo dados da secretaria. As atrações turísticas da capital sergipana fazem com que ela se diferencia das suas principais concorrentes, como explica Fábio Andrade. “O diferencial de Aracaju das concorrentes é que quem vai para Campina Grande ou Caruaru têm os festejos juninos à noite e pelo dia não tem o que fazer. Já em Aracaju, além de curtir o forró à noite, o turista tem durante o dia a opção de visitar a orla, o Museu da Gente Sergipana, o Centro Histórico, o Centro Cultural Aracaju”. Ocupação hoteleira O setor turístico movimenta 54 seguimentos, desde taxistas a restaurantes e todos eles foram afetados pela crise. O setor de hotéis foi um dos que mais sofreu o impacto. Segundo o consultor de turismo da prefeitura de Aracaju, Fábio Andrade, a crise afeta principalmente o setor corporativo. Um hotel, que em épocas festivas tinha reservados 25 apartamentos/dia para a Petrobrás, hoje só tem dois. Outra perda aconteceu com a mudança da diretoria do G Barbosa de Sergipe para a Bahia, pois todas as reuniões com fornecedores acontecia nos hotéis de Aracaju, assim como a hospedagem dos mesmos. Devido a essas perdas, os planos do setor hoteleiro é trabalhar o turismo sol e praia, que é o turismo de lazer. Ainda segundo o secretário, Aracaju receberá mil novos leitos em 2016, entre eles, bandeiras internacionais como Holiday e o grupo Comfort, o que proporciona uma melhor estrutura na recepção dos turistas. Viagens em tempos de crise O empresário Eduardo Santorini é sócio de uma agência de viagens em Aracaju. Ele conta que a procura por viagens ao exterior caíram em tono de 60% devido à alta do dólar. “Como

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Sergipe

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Cultura. O Encontro Nordestino de Cultura acontece durante o Arraiá do Povo, na Orla de Atalaia

Apresentação. Dança Peneirô Xerém se apresenta no Restaurante Cariri, na Passarela do Carangueijo

estamos em meio a uma crise política e econômica, o setor de serviços é um dos primeiros que sofre a queda no faturamento. Pois viajar, muitas vezes, é considerado luxo, principalmente no mercado brasileiro, onde hospedagem e transporte custam caros”, explica. O público da Santorini Viagens é formado por pessoas de classe média alta, geralmente funcionários públicos. Além de viagens nacionais e internacionais, a agência também aposta em passeios para o interior do estado. “Vendemos muito para Xingó (hospedagem e passeios). Já Mangue Seco e Brejo Grande, vendemos os passeios chamados de “bate e volta”, que passa o dia no local, conhece, aproveita as belezas locais, mas volta para dormir em Aracaju. Passeios para São Cristóvão, Laranjeiras e Parque dos Falcões, os passageiros preferem ir por conta própria”, explica. Eduardo explica que a crise financeira que afeta o país inteiro também chegou forte a Sergipe. “Sentimos que o setor turístico brasileiro sofreu uma queda considerável. Passagens aéreas tiveram um aumento em torno de 30%

e consequentemente a procura por viagem diminuiu. Sergipe não está fora deste contexto. Um exemplo é baixa ocupação dos hotéis, que em muitos períodos a ocupação está em torno dos 45%”. Outro fator que dificulta o acesso de turistas ao estado é o reduzido número de voos direto para Aracaju, tendo em vista que a cidade possui voos apenas partindo de São Paulo, Rio de Janeiro, Maceió, Salvador, Brasília e Recife. Turistas de outros estados precisam fazer conexões, o que torna a viagem mais longa e mais cara. Uma das opções para os turistas é comprar pacotes de viagem. Partindo de São Paulo, um pacote com 7 diárias em um hotel 3 estrelas, incluindo café da manhã, sai a partir de R$ 978,00. Partindo da capital federal, o mesmo serviço não sai por menos de R$ 1.058. À partir de primeiro de junho, a cidade ganhará dois voos extras para atender as demandas do período de festejo junino: a Gol abrirá um voo a mais para São Paulo e outro para o Rio de Janeiro.


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amor e dedicação mantém viva a tradição junina Bem antes do mês de junho as quadrilhas já estão fazendo o caminho do São João mas a falta de financiamento torna o percurso muito mais árduo. Fotos e reportagem: Cláudia Santana claudiaj.santana@hotmail.com

Detalhes. Para damas e cavalheiros as roupas são repletas de detalhes

Alegria. Juntos eles enchem de brilho e alegria o São João

A

s bandeirinhas que cruzam toda a extenão da praça dançam com o soprar do vento, colorindo o céu num cair de noite de junho. No chão, o espaço cercado é preenchido por casais com roupas coloridas, cheias de brilho e volume. O forró já começou e ouvimos passos firmes e ritmados, expressões em uníssono que se sobressaem ao som da sanfona. Mais do que maquiagens bem feitas cada rosto exibe um sorriso. A cada comando do marcador começa uma nova parte da coreografia: cavalheiros à direita damas ao centro, chapeis se movimentam, saias agitam-se com rapidez e graciosidade. Cada um com seu par, se inicia uma explosão de cores, brilhos, ritmos e alegria que envolve a plateia. A quadrilha está dançando e é oficialmente São João. Mas, muito antes que as fogueiras estejam queimando e que as bandeirinhas enfeitem o céu já é possível ouvir, vindo de um grande salão, a música começando e lá dentro, em pares, pessoas estão dançando. Ainda não há grande produção e nem plateia, mas a alegria que toma conta do lugar e os passos que vão sendo executados não deixam dúvidas, a quadrilha já está ensaiando. Algumas iniciam os ensaios cinco, oito ou até nove meses antes do mês de junho. É praticamente uma gestação onde mês a mês vão se desenvolvendo o tema, o cenário, as roupas, os passos e escolhidas as músicas. Além de muito tempo de ensaio também é necessário um grande investimento para que quando o cronômetro inicie sua contagem tudo esteja pronto e sincronizado, ou mesmo para dançar na quermesse do bairro ou em apresentações nas esco-

las. Não é só dançar, tem que interpretar também. É criado todo um contexto que vai muito além do casamento caipira e do caminho da roça. Há uma exigência cada vez maior para que as quadrilhas se profissionalizem, sobretudo, para participar e ser classificadas nos concursos. As quadrilhas que fazem grandes apresentações, quadrilhas estilizadas, gastam em média de 40 a 65 mil reais juntando todos os detalhes, como a confecção de roupas, acessórios, sapatos, gastos com transporte, banda. Manter uma quadrilha junina requer muita dedicação, força de vontade e o principal, amor pela tradição. Da quadrille para quadrilha junina As quadrilhas juninas são uma das maiores manifestações culturais da região nordeste e uma das tradições mais antigas nas festas juninas no Brasil, mas antes de chegarem ao arraial elas ocupavam os salões palacianos da Europa. O historiador da secretaria da cultura de Itabaiana, Wanderlei Menezes, destaca que há uma disputa entre pesquisadores folclóricos, estudiosos, sociólogos e antropólogos sobre em qual lugar da Europa surgiu primeiro a dança, se na Inglaterra ou na França. No entanto, Wanderlei diz que se aceita que foi na Inglaterra, pois, existiam danças rurais de origem célticas e nórdicas ligadas ao ciclo da colheita em agradecimento à fertilidade. Depois é que essa dança inglesa chega à França e desembarca na elite. “França e Inglaterra no século XIII, XIV e um pouquinho do século XV, estiveram em guerras. E na guerra há contato entre povos distintos. Então a nobreza fran-

cesa deu um ressignificado àquela dança e se torna uma dança palaciana, da aristocracia,” explica ele. A quadrille francesa era composta por quatro casais, com ritmo marcado ao som do piano e roupas dignas de príncipes e princesas. Ela começou a ser encenada dentro do ambiente da nobreza francesa e como a França, sobretudo naquela época, foi um grande polo irradiador de cultura, a dança se espalha por toda a Europa e chega a Portugal. A corte portuguesa tem grande influência da cultura e hábitos franceses. Quando a família real portuguesa vem para o Brasil trás todo o refinamento da corte. É a vez do nosso país receber a quadrille que também será, por enquanto, uma dança dos grandes salões, a principal a abrir os bailes da nobreza. A grande questão que desafia os pesquisadores, de acordo com o historiador é como essa dança se popularizou e se tornou tão forte, principalmente no nordeste. Até a década de 1970 o Brasil era um país tipicamente rural, mesmo a elite era ligada as zonas rurais. “Eu acredito que essa população ‘caipira’, de pessoas que moram na zona rural, vão tentar imitar e trazer a imitação dessa dança para o seu contexto social”, afirma Wanderlei entusiasmado em contar a história. Quando a quadrilha chega ao ambiente rural ela é adaptada e ganha novos aspectos. Ainda é possível notar a presença de termos franceses tais como “anarriê”, “alavantu”, “balancê”, mas agora, ela é dançada por um número maior de casais, ganha uma relação com eventos religiosos e a religiosidade. Por exemplo, torna-se presente nas celebrações das festas de casamento e é mais presente no

período em que a igreja católica celebra seus santos juninos, Santo Antônio, São João e São Pedro. No nordeste, destaca o historiador, ela ganha características ainda mais regionais. A presença de personagens como Lampião e Maria Bonita, a rainha do milho (representando à época da colheita, e o agradecimento à fertilidade), as roupas são simples e até remendadas. É marcante o uso do triângulo, zabumba, sanfona e a influência de Luiz Gonzaga. Avançando mais nessa linha do tempo, no cenário atual é possível afirmar, de acordo com Wanderlei, que a quadrilha foi um dos grupos culturais que melhor se adaptou e resistiu ao passar do tempo. “A quadrilha passou por uma ressignificação cultural muito grande. Hoje as quadrilhas juninas se profissionalizaram, elas se organizam em grupos com uma liderança, um calendário de atividades durante todo ano,” conclui ele enfatizando que não há uma retomada as origens francesas, pois na história “há caminhos sem volta”, mas uma modernização, um olha para frente. A caminho do São João É setembro de 2015 e, em Aracaju, no bairro Inácio Barbosa começam oficialmente os ensaios da junina Xodó da Vila. Um mês depois, a 58 km dali, em Itabaiana a Balança Mais Não Cai também co-

meça seus ensaios. Junto com esses ensaios para o São João de 2016 já começa também a ser desenvolvido o tema que será abordado. Etelvan dos Santos, quadrilheiro da Xodó da Vila e presidente da Associação das Quadrilhas Juninas de Sergipe (Asquajuse) explica que os ensaios começam cedo não apenas para uma boa apresentação em junho, mas para que uma quadrilha esteja apta para dançar em qualquer época do ano. “Em 2015, a gente dançou até dezembro, nem acabamos de dançar e já foi emendando ensaio com apresentação,” conta Elivania Santos, marcadora da quadrilha Balança Mais Não Cai. Nas primeiras fases do ensaio são escolhidas as músicas e as coreografias, depois vão sendo ensaiados passo a passo. A dança é dividida em duas partes, pela dança da quadrilha em si e a parte da história a ser contada que remete ao tema escolhido. Os primeiros ensaios são realizados com roupas normais e sem a presença da banda, no enorme galpão onde a junina Itabaianense repassa sua coreografia uma menina fica sentada ao lado de um aparelho de som e ao fim de cada música a marcadora assinala se pode ir para a próxima. Depois que os passos já estão assimilados pelos componentes chega a hora de ensaiar com as roupas próprias da quadrilha para que os quadrilheiros já acostumem com o peso (no caso dos vestidos

das mulheres) e como serão os movimentos com elas. O fundador da quadrilha Balança Mais Não Cai, Salomão dos Santos relata que no ano passado gastou cinco mil reais só com o sanfoneiro e que a cada ano esse valor aumenta. O que evita que ele gaste mais com músicos é que ele próprio canta e seu neto, filho e cunhado tocam. Seu Salomão tem 73 anos e é casado com Josefa Valdenilde Ferreira Santos, ou apenas Dona Nide como gosta de ser chamada. Há 34 arraiais atrás criaram juntos no município de Itabaiana, uma quadrilha junina para manter viva a tradição. Na época eles juntaram os quatro filhos, ainda garotos, com outras crianças do bairro e assim começava os primeiros passos da Balança mais não cai que ano após ano encantava os vizinhos. Não demorou muito para que os adolescentes e adultos também quisessem dançar e dois anos depois da quadrilha mirim, em 1984, surge a quadrilha de adultos. Dona Nide lembra que no início “não tinha tanto chamego”, os vestidos eram feitos de tecido de chita, colocava-se remendos nas calças dos meninos, chapéu de palha e nos pés todos usavam sandálias de couro. Nos últimos anos esta simplicidade a que Dona Nide se refere sai de cena e o estilo das quadrilhas se moderniza, vestidos luxuosos com várias camadas, feitos de tecidos como cetim, organza, oxford e muitos, muitos aviamentos (fitas, lantejoulas, rendas), que na opinião de Elivania, ou apenas Vania como todos a conhecem, é o que dá o brilho e o acabamento da quadrilha. No ano passado a Balança mais não cai, gastou 40 mil reais e para esse ano a marcadora afirma que o orçamento chega a 60 mil. Para arrecadar esse valor ou pelo menos grande parte dele, os donos das quadrilhas que são quem arcam com todas as despesas, realizam eventos e contam com patrocínios. A prefeitura, por exemplo, contribuiu com seis mil reais no ano passado. “Nunca precisei ir duas ou três vezes lá pedir e não tem o problema de partidos porque a quadrilha é patrimônio da cidade. A quadrilha não é nem de A nem de B é da cidade” assegura a marcadora. Os quadrilheiros realizam alguns eventos como feijoadas beneficentes, alugam as roupas das últimas apresentações, conta com ajuda financeira de comerciantes e as maiores contribuições são feitas pela empresa Ethos Incorporadora e por Michel, presidente da Associação Itabaianense dos Universitários (AIU). “Tem esse menino que parece que ele ama muito a cultura, ele diz todo ano, mande o roteiro. [O que] vocês vão fazer é pagar só a diária dos motoristas, porque se não fosse isso ai que era pior ainda a gente fretar o ônibus,” não hesita em dizer Dona Nide. A junina Britense Calcinha Preta, quando se apre-

Apresentação. Todos em sua posição, começa a apresentação.


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14 sentava também realizava alguns eventos como bailes e bingos, contava com a colaboração da população e em alguns anos quando não era arrecadado o necessário os próprios dançarinos tiravam do bolso o dinheiro para pagar o transporte e partes do figurino. Em alguns anos o grupo contou com contribuição da prefeitura e foi patrocinada por ela em 2000 e 2001. Já a Xodó da Vila, acredita que esse ano o orçamento chegará a 90 mil reais só com a quadrilha de adultos. Assim como as outras o grupo promove bingos, rifas e outros eventos e conta com contribuição da prefeitura, com exceção do ano passado. Eles dividem os custos da seguinte forma, cada quadrilheiro é responsável financeiramente por seu figurino e a quadrilha fica responsável pelo trio, transporte e cenário. Dessa forma, as quadrilhas não só mantem viva uma tradição, mas também movimentam o mercado. “A quadrilha emprega no mínimo cinco músicos, quatro costureiras e em média são oito mil reais gastos com tecido e 12 mil de aviamentos” detalha o quadrilheiro Etelvan. Isso sem contar que um bom trio custa em média de 25 a 30 mil reais e as acompanhará, no caso de algumas quadrilhas, em finais de semana, feriado e o período junino. Além da quermesse As quadrilhas em Sergipe, por algumas discordâncias, são divididas em dois grupos distintos. A liga das quadrilhas juninas de Sergipe (Liquajuse) e a Asquajuse, cada uma possui sua documentação e seus associados. A Asquajuse tem como propósito fomentar as quadrilhas juninas, fazer com que elas sejam como uma empresa, independentes. O presidente da Asquajuse, Etelvan, propõe, por exemplo, que elas possam desenvolver produtos próprios e assim tenham condições de se sustentar. Um total de 31 quadrilhas, tanto do interior quanto da capital fazem parte da associação. São 26 quadrilhas de adultos, quatro mirins, e uma de idosos sendo que apenas as de adultos participam de concursos. As outras duas participam apenas de apresentações e realizam aberturas de eventos. Os associados possuem uma ficha de filiação, participam de reuniões e contribuem com uma mensalidade. Assim podem participar do concurso estadual de quadrilhas da Asquajuse, realizado em parceria com a TV Sergipe, onde o vencedor irá disputar outros dois concursos, o nordestino e o brasileiro. E também do Levanta Poeira, concurso realizado pela TV Sergipe, em que a quadrilha campeã representará o estado no concurso regional da Rede Globo Nordeste. Na fase estadual desse concurso participam 20 quadrilhas juninas e para estar entre essas 20 é necessário disputar um grupo de acesso. Este processo se assemelha aos das escolas de samba, se uma quadrilha quer participar desse concurso tem

que estar sempre entre as melhores. Outros concursos importantes e tradicionais no estado são: o da Rua de São João, o do espaço cultural Gonzagão, realizado pela Secretaria de Estado da Cultura (Secult) e o concurso de quadrilhas do Jubiabá. O xodó do bairro Fruto de um conjunto de funcionários e da persistência e paixão pela tradição de Etelvan, a quadrilha junina Xodó da Vila já faz o caminho da roça há 24 anos. “Reunimos um grande número de pessoas entre funcionários, da antiga Vila Romana e moradores do conjunto jardim esperança e dançávamos na Rua de São João, festas da empresa. Quando a empresa acabou ninguém quis continuar então eu transferi a quadrilha pra cá”, lembra ele com um misto na voz de nostalgia e animação. Agora a Xodó da Vila conta com uma média de 60 integrantes na quadrilha de adultos, que são moradores do conjunto jardim esperança e também de outros bairros de Aracaju, e nas apresentações desse ano pode chegar a 80 componentes. Possui sua quadrilha mirim, da qual fazem parte 40 crianças, e uma quadrilha de idosos. O quadrilheiro acredita que as juninas vão além das apresentações do período junino e da tradição cultural. Com admiração e um leve sorriso se formando no rosto ele cita seu marcador, Eloy Filho, que costuma dizer que a Xodó da Vila não faz apenas o trabalho de quadrilha junina, mas que a quadrilha faz o trabalho e tem o poder, de transformar uma comunidade. Esse ano eles irão falar sobre o artesão Vitalino Pereira dos Santos, mestre Vitalino o Deus do barro. Os figurinos já começaram a sair do papel, o trio já tem composição e própria para o tema. Na apresentação a expectativa é de passar para o público quem era mestre Vitalino e a sua atuação por todo o nordeste, sem esquecer de fazer o que a quadrilha faz de melhor que é dançar o xote, xaxado, e baião. De geração para geração A Balança mais não cai é como uma herança de família vai passando de pai para filho, nesse caso de pai para filha. Vania é filha de Salomão, que fundou a quadrilha em 1982 e nesse tempo ela, ainda menina, já dançava na versão mirim da quadrilha que era marcada pela mãe, Dona Nide. Hoje, quem comanda a quadrilha que também cresceu e coleciona incontáveis troféus é ela, e é “a única marcadora mulher do Brasil”, orgulha-se em dizer. Praticamente toda a família é quadrilheira, a filha, a sobrinha, o sobrinho e o marido dançam junto com ela. O filho, irmão e cunhado tocam e o pai, atualmente, canta. São 14 pares de cada lado, num total de 56 pessoas que dançam e em média 70 pessoas integram

Dama no comando. Marcadora da Balança Mais Não Cai

Cultura a quadrilha, contando com as que participarão da apresentação. Para fazer parte da Balança Mais Não Cai é preciso apenas dançar, com convicção e entusiasmo Vânia afirma que até que não sabe dançar aprende. Não há uma idade mínima para dançar, tendo porte físico já está habilitado. “Tendo tipo pode começar, minha filha começou a dançar com 12 anos,” afirma ela e apontando para a sobrinha que passa pelo salão continua: “Ela ia começar, mas tem um tamanho pequeno e ela só tem nove anos”. E nós duas exclamamos: “Ah!”, mesmo assim a menina pediu: “Titia, me bote que eu aguento!”. O problema atualmente é conseguir gente da cidade para dançar, mesmo a maioria dos integrantes sendo da cidade serrana a quadrilha é composta por pessoas de outros lugares, como dos municípios de Ribeirópolis e Aracaju. Esse ano a junina promete ousar e levar a quadrilha e o público para o país das maravilhas trará como tema “Num mundo mágico de tramas e ilusões o chapeleiro maluco convida a Alice para o país do São João”. As roupas, cenários e todo o contexto da apresentação ainda são segredo, revelados apenas no dia do concurso. Nesses 34 anos, a quadrilha coleciona incontáveis troféus. Para Seu Salomão, o que dá mais orgulho é o do primeiro lugar do “Levanta Poeira”, conquistado em 2006, onde a quadrilha foi representar Sergipe a nível regional. Com uma expressão muito feliz, Vania fala dessa experiência e das surpresas que teve ao chegar lá. “A gente ganhou um dinheiro da TV Sergipe, mas não deu pra pagar o ônibus. Ai tivemos que pedir o ônibus e ganhamos dos políticos da cidade para representar Sergipe. E quando chegou lá a dificuldade maior não foi nem a financeira, foi de ver a estrutura do concurso, de ver a estrutura das outras quadrilhas. Na época que ganhamos só tinha dez pares de cada lado, vinte meninas e vinte meninos, mas quando você vai com a cara e com a coragem você entra no arraial e chama a atenção de todo mundo, foi o que aconteceu com a gente”. Lá um dos fatos que mais surpreendeu a todos foi ver uma mulher à frente da quadrilha. “Estava todo mundo se apresentando com carro alegórico com muita coisa, parecia uma escola de samba, eu sei é que a gente se encolheu na parede e pensei: ai meu Deus, o que a gente veio fazer aqui. Num mundo que não era nosso em uma arena que era esse quarteirão todinho, parecendo time de futebol e o povo todo gritando. Mas ai quando a gente entrou que eu comecei a aquecer a quadrilha, porque a gente fica numa arena separada para aquecer a quadrilha, ai quando eu comecei a falar no microfone foi que chamou a atenção do locutor, por ser uma mulher. Sei que quando a gente entrou só foi aplauso e saímos de lá bem aplaudidos,” relembra ela feliz e satisfeita por saber que todos deram seu melhor. Algo curioso é o nome da quadrilha, que não trás nenhum aspecto regional ou junino como muitas outras. “Existia no Rio de Janeiro um prédio que tinha esse nome ‘balança mais não cai’ e tinha um programa do Jô Soares que era em frente desse prédio. Eu como sempre fui ligado a ouvir rádio e essas coisas, ai, achei por bem de fazer uma interpretação, balança mais não cai porque a gente dançando tem que dançar mais não pode cair. Não mudemos mais porque ficou registrado assim,” explica Seu Salomão. Balançando um pouco aqui e ali por causa dos gastos ele já pensou em desistir, mas o coração de pai não deixa. “Todo ano eu digo que não quero mais, mas quando vejo, ela [Vania] já tá arrumando um monte de coisa” diz ele lançando um olhar de ternura para a onde a quadrilha está ensaiando. Pergunto a Vania qual o motivo de enfrentar todas as dificuldades para continuar dançando e, com os olhos marejados e um sorriso no rosto, ela diz que é por amor: “Eu costumo dizer que a quadrilha é o ar que eu respiro, é um amor incondicional e sem a quadrilha eu não sou ninguém. É o sangue que corre nas minhas veias”.

A quadrilha se despede José Carlos Santos, mais conhecido na cidade como professor Zé Carlos, além de transmitir aos seus alunos conhecimentos sobre fatos que compõe a história também fez história, manteve sua própria quadrilha por 22 anos. A quadrilha Calcinha Preta que ganhou esse nome apenas em 2011 para homenagear a banda de forró Calcinha Preta, da qual ele tornou-se fã. A vontade de ter sua própria quadrilha surgiu quando ele teve que sair de sua cidade, Campo do Brito, e foi morar na capital aracajuana. “Comecei a frequentar os concursos de quadrilhas, principalmente na Rua de São João e ao assistir quadrilhas como Século XX, Chapéu de Couro, Assum Preto e aquela que me fez gostar de dançar quadrilha a Unidos em Asa Branca e o seu marcador o prof. Eloy, o que me motivou a traçar como meta se um dia retornasse a morar em Campo do Brito fundaria uma quadrilha,” recorda ele. E, no décimo terceiro dia do segundo mês do ano de 1989, José Carlos funda originalmente a Quadrilha Rala-Rala. Inicialmente seu desejo era que os jovens dançassem para que a tradição junina não morresse. A quadrilha começa a dançar com 32 participantes e ao longo dos anos aumentou e variou de 40 para 50 quadrilheiros. O pré-requisito para quem quisesse integrar o grupo era um só: gostar de dançar. Com exceção de alguns concursos, como o Levanta Poeira, que exigem como idade mínima dos participantes 16 anos. Fora isso, o marcador garante que para dançar não tem idade. Durante sua existência a quadrilha participava de no mínimo oito concursos por ano, levando o primeiro lugar em muitos deles. Muitas vezes foram convidados para apresentações fora do Estado, porém por falta de recursos não chegaram a ir. Além da parte financeira uma das dificuldades que ele ressalta, assim como Vania, é a dificuldade de encontrar pessoas que queiram dançar. Por causa da falta de recursos 22 casamentos caipiras depois a quadrilha fez suas últimas apresentações em 2011. “Muitas vezes criávamos um tema e tínhamos que mudar por não ter a verba” ele explica, quando pergunto se ele pensa em retomar as apresentações com a quadrilha ele responde que se “entrar um político [na administração municipal] que valorize a tradição e os grupos com certeza voltaria”. Outra quadrilha do município que durou um ano foi a Gaviões do Agreste e, segundo a quadrilheira, Cláudia Xavier, acabou por falta de recursos. Sandro de Jesus, assessor de comunicação de Campo do Brito, diz que a prefeitura poderia apoiar as quadrilhas se fosse proposto um projeto cultural. Ele menciona alguns fatos que enfraqueceram as quadrilhas Britense, como a falta de interesse dos jovens para participar de movimentos culturais. E que as quadrilhas da ci-

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dade tomaram uma grande proporção e acabaram se voltando muito para grandes concursos e a prefeitura não tem condições de arcar com grandes valores para ajudá-las. “O foco da quadrilha junina tem que ser a cultura,” opina ele. É notável que com o passar dos anos o número de quadrilhas juninas está diminuindo e dois motivos parecem ser cruciais para isso. O primeiro, em comum entre todos que estão envolvidos com a cultura, é que cada vez um número menor de jovens tem interesse em dançar. O presidente da Asquajuse conta que antes em cada comunidade existiam duas ou três quadrilhas e hoje muitos bairros não tem se quer uma. Dividindo a capital apenas entre a zona norte e a zona sul, para exemplificar esse fato, temos na primeira: Pioneiros da Roça, Século XX, Flor Nordestina, Rosa Dourada, Apaga Fogueia e Forró do Maranhão. E na segunda: Xodó da Vila, Assa Branca, Unidos em Asa Branca e Assum Preto. E o segundo motivo é o custo e a dificuldade que uma quadrilha enfrenta para conseguir patrocínio, principalmente as que não são registradas. “Se você for registrado vai lá na prefeitura e mostra a nota, qual seu CNPJ? Qual sua certidão negativa? Lei de utilidade pública? Ai você entrega tudo ai não tem pra onde correr,” exemplifica Etelvan reforçando que é preciso que as quadrilhas se profissionalizem. Entretando, isso caracteriza um problema para as quadrilhas mais antigas que não tem essa consciência da necessidade “oficializar-se”. Mas muitas ou poucas quadrilhas juninas, pulando fogueiras no arraial ou numa chuva de aplausos em estádios lotados, enquanto o céu estiver em festa numa noite de São João e ouvir-se xote, xaxado e baião no salão sempre existirá alguém queentregará seu coração paraesta tradição.

Família. Uma família junina

Sincronia. Sorrir, cantar, cada elemento, gesto ou expressão tem que estar em sincronia

A quadrilha é o ar que eu respiro, é um amor incondicional e sem a quadrilha eu não sou ninguém. É o sangue que corre nas minhas veias.” Elegância. Graciosidade e elegância antes, durante e depois da dança


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CHEGANÇA SANTA CRUZ, TRADIÇÃO QUE NÃO DEVE SER ESQUECIDA A chegança Santa Cruz possui 69 anos e é o grupo cultural mais antigo de Itabaiana. Porém, ultimamente, está enfrentando muitos obstáculos para manter­-se viva na história da cidade serrana. fotos e reportagem: TAÍS CRISTINA taiscristina.ufs@gmail.com

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amos depressa, vamos embarcar. Vamos depressa, vamos viajar. O navio está no porto, não podemos demorar!” É com essa cantoria que convidamos você leitor a conhecer a Chegança Santa Cruz, grupo cultural mais antigo de Itabaiana, no agreste de Sergipe, comandado pelo Capitão‐piloto Zé da Biné, que desde seus 15 anos dedica sua vida à Chegança e a manter viva a cultura da cidade. “Embarca, embarca, embarca logo, embarca depressa, que a hora é essa. Tocou o apito já, tocou o apito. Embarca depressa, que a hora é essa.” “Eu aprendi a gostar da Chegança como se gosta de um filho.” É dessa maneira que o senhor José Serafim de Menezes, o “Zé da Biné”, fundador da Chegança Santa Cruz, define com os olhos cheios de alegria, nos seus 84 anos de vida, o que sente pelo grupo folclórico fundado por ele, no dia 10 de abril de 1947 e ainda em atuação. Diferente de quando começou com os seus 15 anos de idade, hoje Zé da Biné já não tem a mesma saúde e vitalidade, mas isso não o impede de participar das apresentações do grupo. Sentado em uma cadeira de rodas, o Capitão‐piloto comanda com felicidade e honra a representação das lutas com espadas que ocorriam entre mouros e cristãos em embarcações da marinha. O grupo possui atualmente 24 integrantes, que interpretam os seguintes personagens: capitão‐piloto, capitão‐patrão, capitão‐tenente, contra‐mestre, general, calafatinhos, padre, cabo, primeiro‐embaixador, segundo‐embaixador, rei, rainha, princesa, médico, cozinheiro e pandeiristas. “Nós já estamos cientes, que vamos partir

para a guerra. Deixando a nossa, querida terra.” Junto a essa cantoria, o som dos pandeiros faz TIM, TUM, TUM, TIM, TUM, TUM, e emociona quem assiste as apresentações. Dá para notar também o amor e o comprometimento dos integrantes pelo grupo, é de arrepiar a emoção que eles transmitem. São pessoas de olhares cansados, que expiram simplicidade. Muitos nunca nem estudaram sobre as lutas marinhas entre mouros e cristãos, mas interpretam e cantam fielmente as cantorias como se estivessem realmente lutando em alto mar. Sobre esses olhares cansados, um deles me chamou a atenção. Jonas, um senhor de 68 anos de idade, aposentado, mostra no olhar que já batalhou muito na vida. Ele é um dos membros mais antigos do grupo (e um dos mais animados também). Começou na Chegança aos 25 anos e hoje interpreta o contra‐mestre. Jonas também é o braço direito do Capitão‐piloto Zé da Biné, quando este está adoentado, Jonas assume o comando da Chegança nas apresentações. “A Chegança é um folclore muito antigo, de responsabilidade, muita educação e moral. Ela é muito importante para mim.” Foi isso que Jonas falou, um tanto embaraçado e sem saber direito o que responder, quando perguntei sobre a importância do grupo para ele. Na verdade, a resposta de seu Jonas estava no olhar, no brilho dos seus olhos deu para notar o seu amor pela Chegança. Uma parte legal dessa história é que ela passa de pai para filho, de geração para geração. Além de filhos e netos de Zé da Biné participarem, filhos e netos de outros integrantes mais antigos também participam. Um deles é Valter, de 48 anos, filho do contra‐mestre Jonas, citado acima. Valter cresceu no gru-

po ao lado do seu pai, começou a participar aos 12 anos de idade e hoje seu filho de apenas cinco anos também já participa. ‐ Por que a Chegança é importante para você, Valter?, questiono. ‐Porque com ela eu sei que existe folclore e cultura na nossa cidade. É uma coisa que conheci na infância e me lembra bons tempos. Enquanto eu tiver vida eu vou continuar participando e trazendo meus filhos também.” Seu Zé da Biné fala com orgulho e sorriso no rosto sobre as premiações e as apresentações que já fez junto a Chegança. Além de se apresentar no próprio município de Itabaiana e em outros municípios sergipanos, como por exemplo, no Encontro Cultural de Laranjeiras e no Museu da Gente Sergipana, em Aracaju, a Chegança também já fez apresentações em São Paulo e em Valência, na Espanha, onde ganhou um prêmio no I Congresso Internacional de Embaixadas e Embaixadores. “Eu amo a Chegança e quero levar ela e a cultura do meu município para outros lugares, com ela eu aprendi muitas coisas. Quando eu não puder mais comandar, meus filhos ficarão no meu lugar”, conta ele com muito orgulho. Zé da Biné já foi homenageado em um evento que ocorreu em Itabaiana no ano passado. Os organizadores da Bienal do livro homenagearam o Capitão‐piloto e fundador da hegança Santa Cruz, com uma estátua em uma das avenidas principais do município, eternizando seu nome na cultura e na história de Itabaiana. Em março deste ano, a Chegança participou do concurso que elegeu as Sete Maravilhas de Itabaiana. Na disputa estavam 30 candidatas, entre belezas naturais, manifestações culturais e patrimônios do município.

O grupo de Zé da Biné não foi escolhido como uma das Sete Maravilhas, mas o concurso tornou a Chegança ainda mais conhecida no estado. No dia 10 de abril a Chegança Santa Cruz comemorou 69 anos em grande estilo. Uma das filhas de Zé da Biné, atualmente responsável pelo grupo, organizou o evento I Festival Cultural Biné, onde além da Chegança, vários outros grupos culturais do município e de outras partes de Sergipe se apresentaram. E sabe quem estava lá no meio da festa? Seu Zé da Biné! Com um sorriso no rosto e os olhos cheios de felicidade, o Capitão‐piloto estava no comando da Chegança que ele mesmo fundou. A Chegança, a cultura e os desafios Uma das filhas de Zé da Biné, a jovem Giselma Menezes, é quem atualmente é responsável pela Chegança. É ela também quem encara os problemas e as dificuldades que o grupo enfrenta. Pois é. Apesar de histórias de amor e dedicação pelo grupo, este enfrenta muitos desafios. Segundo ela, uma das maiores dificuldades está atrelada a parte financeira. “Nós não recebemos investimentos nem por parte do município nem por parte do Estado. Todos os gastos com figurino, instrumentos e apresentações são arcados por nós. Quando quebra algum instrumento, por exemplo, somos nós que temos que pagar.” Ainda segundo Giselma, o grupo já tentou patrocínio com a prefeitura do município de Itabaiana, mas não obteve êxito. A filha do Capitão‐piloto conta um acontecimento triste envolvendo a Chegança. “Como não recebemos investimentos, nós ainda não temos sede para guardar os materiais, instrumentos e ensaiar, fazemos tudo aqui em casa mesmo. No ano passado houve uma chuva forte que molhou o armário onde tudo estava guardado, por pouco não perdemos tudo.” Outro fato triste ocorreu no ano de 2010. A Chegança Santa Cruz foi convidada a fazer uma apresentação internacional na Espanha, no I Congresso Internacional de Embaixadas e Embaixadores, porém só foi conseguido por parte da secretaria de cultura do município um edital para o Ministério da Cultura pagar a viagem de quatro integrantes. Esses quatro integrantes foram, representaram a Chegança e ainda ganharam um prêmio. Apesar de tudo

e mesmo não estando completa, a Chegança fez bonito e voltou para casa com um troféu na bagagem.De acordo com o historiador Wanderlei Menezes, da secretaria de cultura de Itabaiana, o município não contribui financeiramente e de maneira regular com o grupo por dois motivos: o primeiro é que a secretaria de cultura municipal ainda é desestruturada, não possui liberdade financeira para investir nas manifestações culturais da cidade. O segundo é que a Chegança não é legalizada, ou seja, não é uma entidade, não possui CNPJ, nem sede e isso dificulta a criação de convênios para o repasse financeiro. Porém o município contribui de maneira irregular. “Quando a Chegança faz apresentações em Itabaiana os integrantes recebem cachê.” Wanderlei também contou que através da secretaria de cultura o grupo já conseguiu enviar muitos editais para o Ministério da Cultura em busca de benefícios. Para ele, se o grupo se organizar como entidade ficará mais fácil conseguir investimentos. “Os grupos culturais de Itabaiana como um todo ainda são um pouco amadores. Se eles se organizarem em entidades e associações facilitará muito para conseguir recursos financeiros e apoio empresarial”, diz. Sobre isso, Giselma afirmou que ela e o restante do grupo estão tentando conseguir uma sede para a Chegança, para quando estiver com uma sede fixa tornar‐se uma entidade legalizada. Ainda segundo Wanderlei, Itabaiana tem um certo preconceito com manifestações culturais, principalmente os mais jovens. “Muitas pessoas criticam quem participa e até chama de doido e isso faz com que para muitos seja vergonhoso participar de um grupo cultural.” No caso da Chegança, por exemplo, 95% dos integrantes são pessoas acima dos 50 anos. Há quem tenha vergonha, porém há quem goste e se orgulhe de participar da cultura de um povo. Essa foi a história de Zé da Biné, de Jonas, de Valter, de Giselma. Essa foi a história da Chegança Santa Cruz, grupo cultural mais antigo de Itabaiana, que apesar das dificuldades e desafios, está “forte‐fixe” na luta para manter viva a cultura e a tradição da cidade serrana. “Embarca, embarca, embarca logo, embarca depressa, que a hora é essa. Tocou o apito já, tocou o apito. Embarca depressa, que a hora é essa.”

Apresentação. Alguns momentos durante a apresentação da Chegança Santana Cruz

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Navio. Representação do navio da Chegança Santa Cruz

Mestres. O Capitão-piloto Zé da Biné, ao lado do Contra-mestre Jonas


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Movimento Literário: a literatura sergipana está realmente se movendo? Literatura sergipana permanece viva e fluida através de rodas de leitura e eventos literários. Entretanto, há falta de investimentos e divulgação midiática. Fotos e reportagem: Nathália Gomes nathgomeslima@gmail.com

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m um pequeno auditório de uma biblioteca pública, Roseneide Santana se reúne toda terceira terça­feira do mês em rodas de leitura, com objetivo de estimular a literatura, principalmente a sergipana. Entre muitas dificuldades e depreciações que surgem sobre o trabalho, lá está ela, como uma “agente da leitura” que assumiu um compromisso em levar arte para as pessoas como uma missão de vida. Além dessas rodas de leitura e oficinas que acontecem periodicamente há anos, surgem também em Sergipe novas modalidades de eventos literários, a exemplo da Bienal do Livro de Itabaiana e da Feira da Leitura e do Livro de Sergipe (Flise). Com grande porte, tais eventos apresentam a produção literária do estado e fomentam o acesso à leitura. Lá, os participantes podem conversar com escritores, conhecer novas obras e adquirir aquelas que desejam e além disso os escritores podem divulgar seus trabalhos. Tanto as programações literárias cotidianas quanto esses eventos passam por obstáculos e muitos deles são causados pela falta de investimento, de políticas públicas de incentivo à leitura eficientes, pouca divulgação da mídia e pelo próprio desinteresse da população na literatura. A leitura como hábito As rodas de leitura acontecem desde 2008. Começaram nas bibliotecas públicas e têm se espalhado por escolas de Aracaju e do interior do Estado. O projeto que começou com os escritores Antônio Carlos Viana, Gizelda Moraes e Maruze Reis, hoje tem Roseneide Santana (que faz parte do Conselho Nacional de Políticas Públicas Para a Cultura e foi recém­eleita como conselheira no Colegiado do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca) como uma de suas principais representantes. Entre leituras de textos de autores sergipanos e conversas sobre os mesmos, pode surgir em um participante atento a vontade de buscar conhecer mais àquelas obras e talvez se tornar um futuro escritor. Para Roseneide, o projeto não é só um momento de lazer, mas um local de aprendizagem. “Nós temos hoje no Estado de Sergipe renomados escritores, como é o caso de Jeová Santana, do Ronaldson, do Josailton Lima e Araripe Coutinho, que faleceu há quase um ano. Todos esses grandes escritores que hoje já receberam vários prêmios por aquilo que escreveram, deram depoimentos que passaram por essas oficinas da Maruze Reis, da Iara Vieira, do Antônio

Leitura. Roda de leitura no auditório da biblioteca Epifânio Dória na presença de escritores e leitores Carlos Viana. Eles passaram por esse aprendizado”, diz Roseneide. Os frutos são gratificantes porém o processo, principalmente para quem organiza, é árduo e os resultados vêm a passos lentos. Para Roseneide, um dos principais obstáculos em atrair a sociedade para essas rodas é a falta de divulgação da mídia sergipana. “Muita gente da imprensa que reconhece a importância da arte e da leitura, na verdade não faz a sua parte em fazer divulgação e mostrar pessoas que participaram desses movimentos. A divulgação, quando não é negativa, não existe. Há uma total indiferença dos meios de comunicação aqui de Sergipe”, conta. Roseneide ainda faz uma comparação com outras cidades, como por exemplo, em Paraty, cidade do Estado do Rio de Janeiro, onde a literatura é muito valorizada pelos meios de comunicação. Há suplementos literários, escolas que trabalham diretamente com a literatura e fazem divulgações dos textos de alunos e eventos nos jornais. Quando ocorre um evento, os meios de comunicação estão em peso para divulgá­lo. Isso ajuda a sociedade a entender que leitura é algo importante e a incentiva a buscá­la através das formas disponíveis. Atrelado a este problema, está o interesse em divulgar apenas eventos que tenham popularidade e caráter mercantilista. “Eu posso lhe dizer que talvez eu nunca tenha dado uma entrevista para

um jornal aqui do Estado, nem para uma televisão. Às vezes a Aperipê vem aqui filmar nossos eventos, um compromisso social da rádio e da televisão em vir aqui filmar, mas geralmente jornais não se interessam por eventos como esse. Eles só se interessam por eventos que são grandes”, critica. Existe ainda, por parte dos poderes governamentais, uma falha nas políticas públicas de incentivo à leitura. Roseneide fala sobre o apoio da Secretaria de Cultura na questão de infraestrutura, ou seja, são fornecidos os espaços e as pessoas para trabalharem, a exemplo da própria biblioteca, porém ainda está muito enraizada a ideia da literatura ser trabalhada como algo eventual e não do cotidiano. “É preciso que haja políticas de incentivo à leitura principalmente do livro que está perto de você. Não há hoje mais o problema da acessibilidade, pois o Governo Federal compra muito livro e manda muito livros paras escolas, mas escola não é local de leitura, porque você vai lá só para cumprir sua jornada de aula”, conta Roseneide. Em sua futura gestão como Conselheira no Colegiado do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca, ela diz que tentará contribuir para que políticas públicas de incentivo à leitura se efetivem, como a necessidade de levar textos para as escolas, levar autores e gincanas de leitura. “São dois dilemas para se resolver: os

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meios de comunicação dar mais importância aos projetos de incentivo e, por outro lado, as políticas públicas serem mais efetivas mesmo, não ser uma coisa de evento. A gente quer que leitura seja algo do cotidiano, não algo factual”. A leitura como evento Um dos exemplos de eventos literários de grande porte que tem acontecido a cada dois anos é a Bienal do Livro de Itabaiana, que já conta com três edições realizadas. Geralmente com quatro ou cinco dias de evento, a Bienal não conta só com participações de escritores, estandes e lançamentos de livros, mas também há apresentação de curtas e grupos folclóricos. Robério Santos, professor de Espanhol, jornalista e idealizador da Bienal de Itabaiana, conta os desafios de fazer um evento desta magnitude: “Organizar um evento já não é tarefa fácil, quanto mais um que se enquadre nos desprazeres da sociedade. Ler não é a atividade de entretenimento predileta do brasileiro. Os desafios sempre são os mesmos: pouco dinheiro, intrigas políticas, falta de leitores e vários outros fatores. Precisamos nos fortalecer e fazer a literatura sergipana crescer”, avalia Robério. O professor também cita a pouca parceria entre Governo e esses tipos de eventos, que muitas vezes não são visados pelos poderes governamentais devido ao pouco retorno eleitoral. “Talvez a logística entre Leitura X Votos não seja muito favorável, pois político pensa em retorno eleitoral e não em construção de uma sociedade mais inteligente,” critica. Ainda assim a Bienal é realizada, através da parceria com empresários e tem gerado frutos à produção literária sergipana. As pessoas se mobilizam para participar da Bienal, tanto aqueles que querem conhecer mais da literatura sergipana e nacional, quanto escritores que querem divulgar suas obras. Desde que tem se envolvido com movimentos literários, Robério sempre vê surgirem pessoas querendo publicar livros, porém não é fácil devido à inviabilidade financeira de se publicar uma obra. Ele conta que só na história de Itabaiana são 200 obras publicadas e uns 60 escritores, sendo que ele mesmo já lançou 12 livros e editou seis de outros escritores. Escritores e o movimento literário Lançar uma obra literária não é tarefa fácil. Entretanto, as dificuldades não param por aí. Depois de publicado, surge a missão de divulgação do livro para fazer com que o mesmo caia na graça dos leitores. Participar de movimentos literários como os já citados, tem sido uma boa oportunidade para que antigos e novos escritores possamdivulgar seu trabalho. É o que conta Taylane Cruz, escritora de seu primeiro livro chamado “Aula de dança e outros contos”. Ao usar como exemplo a sua participação na Bienal do Livro de Itabaiana e outros eventos literários, ela relata a importância des-

Sergipanos. Movimentos literários estimulam a valorização de obras de renomados sergipanos e trazem à tona novos nomes ses momentos para o cenário literário e para quem exerce o trabalho de escritor, como uma oportunidade para festejar a literatura. “É um espaço fundamental para o autor sergipano, principalmente autores independentes, iniciantes”. Estes eventos têm se mostrado uma ótima oportunidade para trazer ao grande público a cena literária em Sergipe, entretanto é necessário lembrar que, eles por si só, não são os únicos responsáveis por aflorarem a literatura no Estado. É o que ressalta Taylane, ao afirmar que eventos literários, em si, não formam leitores. “Eles servem como ponto de encontro e como uma vitrine, mas acredito que é na escola que se formam os leitores” reforça. Neste grupo de escritores iniciantes, encaixa­se o Braian Thomas, 19 anos, autor do livro chamado “Manchado”, uma obra de autoajuda que retrata um acontecimento pessoal. O jovem e estreante escritor afirma a importância de movimentos literários para autores sergipanos. “Eventos desse tipo não apenas incentivam a leitura e levam esse conteúdo a um público maior como também encorajam os escritores atuais e os que estão para surgir”, conta. Francisco Passos Santos, mais conhecido como Chiquinho do Além Mar, é cordelista, músico e professor de inglês e tem uma ampla produção no mundo dos cordéis e poesia, além de diversos livros já publicados. O mais recente, “A história de Sergipe contada em versos”, narra através do estilo de cordel, a história de Sergipe, desde a chegada dos portugueses até a 2a Guerra Mundial em 1942. Chiquinho, já muito experiente no universo literário sergipano, reforça a fala de tantos outros escritores sobre poder participar de eventos literários. “É de fundamental importância para nós escritores, porque nos possibilita um contato direto com o leitor”. Ele vê como positiva sua participação na Bienal e em outros eventos, pois além da interação direta com o público, ele pode participar de palestras e recitais.

Arte: Cláudia Santana

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agricultura familiar: sergipe atinge topo da produtividade de arroz do país Mecanização da produção impulsiona rizicultura no Estado, mas não emancipa produtores. Fotos e reportagem: Josafá neto netojosafa@gmail.com

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ma sexta-feira qualquer. Sete da manhã. O ronco do trator se confundiu com o som da natureza. Quase tropeçando em meio à fuga de marimbondos, Walter se segurou na cerca de madeira e acenou. Por trás do cumprimento com a mão calejada, ele revelou ali que a precisão dos dedos foi trocada pela pujança das máquinas. Essa realidade começou a mudar há cerca de uma década e alterou a rotina de centenas de famílias na região do Baixo São Francisco. Walter Pereira Araújo, 48 anos, é um dos 750 agricultores que vivem do cultivo do arroz no perímetro irrigado do Betume, às margens do Velho Chico, no município de Ilha das Flores, no leste de Sergipe. Ele preside atualmente a Associação de Rizicultores do povoado Serrão. A comunidade que resiste ao tempo e ainda mantém os traços de vilarejo tem aproximadamente dois mil moradores, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Antigamente a gente plantava no dedo e fazia a sementeira. Depois a ruma de mulher ia plantando a semente no dedo. Agora um lote de quatro hectares, com cinco homens trabalhando, a gente planta o arroz todo em um dia. Antes, tinha que ser 50 pessoas por dia durante 15 dias para conseguir fazer a plantação. Já chegou uma época de passar até um mês para conseguir plantar. Hoje você prepara o lote em um dia e joga a semente,” afirma o agricultor. Com a mecanização da produção ao longo dos últimos dez anos, Walter viu a média do custo da plantação diminuir cerca de 70% e a produtividade saltar de cinco para até nove toneladas por hectare ao fim de cada safra. Essa mudança no uso da tecnologia não apenas ascendeu o papel da agricultura familiar no cultivo do arroz como também colocou Sergipe na rota nacional do cereal. A analista técnica da Embrapa, Márcia Gonzaga, explica que a mecanização da agricultura familiar aumentou a velocidade no plantio e o aproveitamento da lavoura. “Além de manter o pequeno produtor na atividade rural, você contribui para preservação das matas e a reutilização do solo,” diz a especialista. Nos últimos cinco anos, a produção de arroz cresceu 47% no Estado e bateu o recorde brasileiro de produtividade, segundo a Companhia de Desenvolvimento dos Vale do São Francisco e Parnaíba (Codevasf). Enquanto a média nacional é de 5,4 toneladas por hectare, Sergipe colheu quase nove toneladas na última safra. Esses dados são da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A produção mecanizada valorizou também a comercialização do cereal e abriu caminhos no mercado. Na última safra, por exemplo, o quilo do arroz chegou a ser negociado a 0,70 centavos. Um crescimento de 39% em relação

Cultivo. Uso da máquina colheitadeira acelera produção, mas afasta mão de obra da lavoura.

ao valor de safras anteriores. O destino de 90% da produção, segundo a Codevasf, se concentra em fábricas do Nordeste, como Alagoas, Ceará, Pernambuco. Na contra mão do progresso na lavoura, o agricultor Carlos Alberto de Freitas, 52 anos, admite que a mão de obra está cada vez mais escassa na região ribeirinha. Isso, segundo ele, por causa do uso das máquinas. “Acontece que os jovens não querem mais trabalhar na lama de arroz. Lá em casa mesmo, meu filho não quer nem botar o pé na lama. Só quer saber do trator. Hoje só trabalha na terra quem planta mesmo, no caso é o dono da terra,” narra o produtor. Ele é um dos 30 sócios da Associação de Rizicultores do Serrão. O Betume Com uma área irrigável de 2.860 hectares, o perímetro do Betume engloba, além de Ilha das Flores, as cidades ribeirinhas de Neópolis e Pacatuba. Sendo que 80% dessa área se destina à rizicultura. O projeto é gerenciado pela Codevasf, através do Distrito de Irrigação do Betume, com a proposta de oferecer serviços de manutenção e assistência técnica e extensão rural aos produtores, sobretudo com as estações de irrigação e drenagem no perímetro. Há mais de duas décadas, a rotina do operador de estação Edson Batista dos Santos, 62

anos, se divide entre a calmaria das águas do Velho Chico e o barulho das seis bombas de irrigação e drenagem no povoado Serrão. “São nove estações dessas no perímetro todo. Esse sistema funciona há mais de 30 anos na região. As bombas puxam a água do rio para plantação. E depois que a água acumula no dreno, as bombas puxam de volta para o rio,” explica. Apesar do investimento de R$ 102 milhões desde 2013 na rizicultura no Baixo São Francisco, através do programa Mais Irrigação do Ministério da Integração, os agricultores apontam falhas no serviço que prejudicam o cultivo do cereal. Já no final da última colheita, que se estendeu do início de julho do ano passado ao fim de março desse ano, uma praga e a quebra de bombas comprometeram cerca de 10% da produção no Betume. Isso, de acordo com o rizicultor Carlos Alberto, se agravou com a falta de assistência técnica e extensão rural para orientar os agricultores no uso de técnicas na lavoura. “Houve um corte na assistência técnica. O técnico agrícola é importante porque ele mostra os defensivos que vamos passar no arroz para evitar uma praga, por exemplo. Tivemos só três técnicos no ano passado que foram contratados e pagos pelo Distrito de Irrigação do Betume. E outra: também precisamos deles por causa dos laudos técnicos para enviar aos bancos para tentar o financiamento. Estamos

com essa dificuldade na região. É um apelo,” disse. Hoje, por causa de uma dívida de R$ 527.439,77 da Codevasf junto à empresa que presta o serviço de energia elétrica na área, o fornecimento de energia nos perímetros irrigados do Estado está funcionando através de uma liminar na Justiça Federal. No último mês de janeiro, o juiz da 3ª Vara em Sergipe, Edmilson Silva Pimenta, impediu que a Energisa cortasse a eletricidade nas áreas do Betume, Propriá, Jacaré-Curituba e Pimdoba em virtude do débito. Na liminar, o magistrado argumentou que a suspensão do serviço prejudicaria a coletividade, uma vez que centenas de famílias dependem das estações de irrigação e drenagem como agricultura de subsistência. Além disso, o juiz federal ponderou que a dívida não pertence aos produtores e o corte na eletricidade dos perímetros afetaria diretamente a economia dos municípios. Inquieto, o agricultor Carlos Alberto saltou do pranchão de madeira e esbravejou em tom de preocupação sobre o futuro da próxima safra. "Nós irrigantes estamos preocupados com isso, porque a qualquer momento a Energisa pode derrubar essa liminar e derrubar a nossa energia. Sem isso, as bombas não funcionam, nem irriga, nem drena a nossa terra. Dependemos disso. O que pode prejudicar a safra que vai começar em julho,” afirma. No meio do caminho.. O leilão de terras virou uma pedra para os rizicultores. O drama que persegue Walter Araújo e mais 30 agricultores da região se arrasta há mais de cinco anos. Após contrair um empréstimo individual de sete mil reais no Banco do Nordeste, os produtores levaram um calote da usina que se comprometeu, mas não comprou o arroz. Hoje, a dívida já passa de R$ 30 mil por agricultor. Com o impasse, o banco conseguiu uma liminar para penhorar as terras na Justiça. Porém, uma nova decisão judicial suspendeu o leilão das propriedades rurais. "Vendemos nossa produção para uma usina, que deu um calote. Ficamos com a dívida no banco e a gente não consegue renegociar mais o valor. A Associação distribuiu todo o nosso arroz na época. Agora não conseguimos pagar por causa dos juros," esclarece o presidente da Associação do Serrão. Isso só aumentou a inquietude de Carlos Alberto. Abriu os braços. Sentou-se ao chão. Mas logo levantou. Tirou o boné, pediu a palavra por alguns minutos e começou a narrar o porquê daquela angústia. Segundo ele, sem o financiamento dos bancos, o produtor se torna um alvo do “atravessador,” que financia a plantação com o compromisso de compra-la por um preço inferior. “Esse empréstimo é para fazer a manutenção da plantação. Assim a gente se livra dos empresários na hora de vender a produção, porque não pegamos dinheiro com os empresários para fazer o plantio. Se não, o agricultor fica na mão dele. Hoje, só o Banco do Brasil libera esse crédito,” completa o rizicultor. E enquanto não começa o plantio da próxima safra, Walter e Carlos Alberto mais uma vez tentam organizar as famílias do Serrão. Dessa vez, por uma causa religiosa: a tradicional Noite dos Motoqueiros na Festa de Santo Antônio.

Estimativa. Walter Araújo pretende colher mais de nove toneladas de arroz na próxima safra.

Já chegou uma época de passar até um mês para conseguir plantar. Hoje você prepara o lote em um dia e joga a semente.” (Walter Araújo)

Estimativa de produtividade* de arroz em Sergipe: 2015: 10,5 2014: 9,9 2013: 7,4 2012: 8,7 2011: 8,5 *Média de produção por hectare (Fonte: Codevasf)

Produtividade. Carlos Alberto lamenta ação de atravessadores e burocracia para investimentos.

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Economia brasileira é tema de debate na UFS Professor em política de desenvolvimento discute questões gerais sobre economia brasileira foto e reportagem: Antônio Gonçalves goncalvesaa@gmail.com Jornal Contexto - Muitos governadores e prefeitos do Brasil vêm reclamando que os repasses feitos pelo Governo Federal estão diminuindo. Até onde isso é verdade? WN - Nós estamos passando por uma crise. Aquela crise de 2008, finalmente tomou forma agora em 2013, e continua até agora, nesse sentido, o problema não é a economia, o problema não é o poder, mas é de novo a questão federativa. Se tivesse bem claro qual é a atribuição, a responsabilidade de cada ente de governo, como é que ele vai arrecadar e como vai dispor desse dinheiro, poderíamos ter outra situação, não precisava enfrentar o problema da redistribuição partindo do governo federal, dos critérios do governo federal, não precisava depender da situação da economia como um todo para poder definir a situação financeira do governo local. Portanto, essas alternativas não foram encontradas, temos que redesenhar esse pacto federativo para que governos dos estados e dos municípios tenham alternativas de financiamento.

professor wágner nóbrega

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pós a entrega das declarações de rendimentos dos contribuintes brasileiros, no final de Abril de 2016, muitas questões vêm à tona com relação à carga tributária do Brasil. Por um lado, os contribuintes insatisfeitos com o pagamento dos impostos, e por outro, os governos em suas diferentes instâncias, necessitando suprir suas funções básicas como arrecadar, distribuir e alocar recursos. Diante da temática apresentada, conversamos com Wagner Nóbrega, doutor em política de desenvolvimento pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor do departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), desde 1997, com o objetivo de tentar elucidar e desmistificar alguns conceitos econômicos não conhecidos pela maioria da população. Jornal Contexto - Os contribuintes brasileiros entregaram suas declarações de rendimentos referentes ao ano de 2015, mas alguns de fato não têm pleno entendimento do que se trata. Então, o que é o imposto de renda? Wagner Nóbrega - O imposto de renda é parte necessária de qualquer governo, de qualquer país, para o financiamento das políticas sociais. É basicamente a contrapartida para aqueles que contribuem e de disseminação de benefícios sociais para aqueles que não podem contribuir. Assim, com ele, o governo faz o seu papel de redistribuição e de política social. Jornal Contexto - Esse imposto é justo? WN - A medida de justiça é sempre algo que se deve discutir no conjunto do nível PIB e do nível de atividade de cada economia. Num país como o nosso existe ainda uma renda que pode crescer muito,

nossa produtividade comparada com outros países é muito baixa. Nessa situação o governo tem um papel fundamental, ele tem estruturas a construir, tem educação, tem justiça para melhorar, tem uma série de coisas que precisam de mais investimentos, então nessa fase é esperado que o governo realmente seja o responsável por impor uma carga tributária maior. Ao contrário do que se fala, um país rico tem uma contrapartida alta porque as pessoas ganham bem e elas têm um atendimento social bom, então a carga tributária deve ser alta, mas nos países como o nosso, chamados em desenvolvimento, o governo tem que atuar mais firme porque é o momento em que ele está estruturando a política social. Infelizmente nessas fases são necessários mais recursos, consequentemente à carga tributária tem outro sentido, mas ela também é alta. Jornal Contexto - O Governo Federal é o responsável pela arrecadação de alguns impostos no Brasil e redistribuir para os estados e municípios. O que você acha desse processo? WN - O pacto federativo no Brasil sempre foi muito complicado, acredito que quem conhece ou lembra da história recente do país sabe que sempre tivemos dificuldades na relação entre governo e município, governo de estado e governo federal. A Constituição de 1988 reformou muito isso e fez com voltássemos a ser um país mais municipalista, ou seja, menos presença do governo central do que era no período do governo militar, mas ainda ficamos com uma indefinição muito grande sobre os recursos de quem arrecada, como distribui e quem tem as obrigações. Nesse sentido é que precisamos de uma reforma federativa urgente para que possamos fazer e pensar em uma reforma tributária, porque primeiro você tem que ter as atribuições e responsabilidades bem definidas de cada ente federativo.

Jornal Contexto - Em economia não se pode comparar os desiguais em hipótese alguma, não há como você comparar um país com outro pelas suas especificidades. É senso comum no Brasil que se cobra muito imposto e que é muito alto. O que o senhor diz a esse respeito em relação a outros países? WN - “Respirou fundo” – Eu digo que outros países passaram por experiências muito mais demoradas, longas historicamente, não quer dizer que eles sejam melhores, talvez eles tenham sofrido mais para encontrar o caminho do que nós, ou demoraram mais e têm muito mais história do que nós. A nossa história não é só curta em termos de fundação do país, é também em mudanças democráticas. Nós tivemos regimes totalitários duas vezes no país e tivemos que reconstruir o caminho da democracia por duas vezes, então isso muda os sentidos dos resultados. É uma avaliação não só econômica, mas é uma avaliação dos percursos que mudam o sistema e mudam o destino da economia. Jornal Contexto - Podemos copiar? WN - Em relação aos países considerados centrais, Europa e Estados Unidos, eles funcionam melhor porque aprenderam funcionar melhor, nós estamos no caminho do aprendizado. Eu sou extremamente otimista e sei que nós temos que passar por sofrimentos, infelizmente nós estamos numa crise política e econômica e não temos outra saída a não ser sentir as dores dessa crise. Eu espero que essas dores nos ensinem, assim como aconteceu nos Estados Unidos e na Europa. Jornal Contexto - Então, consequentemente, quando nós passarmos por isso a participação do contribuinte no recolhimento de impostos será maior? WN - Pode ser que sim. Se for, espero que a máquina seja melhor desenhada, com resultados sociais mais objetivos, mais claros, que redundem também em mais emprego, aumente a produtividade, o povo mais capacitado, dominando melhor suas ferramentas, seus conhecimentos e também gere uma renda maior.

Jornal Contexto - Os estados pequenos recebem percentualmente transferências líquidas maiores. O problema não está no ICMS? WN - A questão está na base da arrecadação, para os estados menores o ICMS não é. O estado de Sergipe pode arrecadar bem próximo das transferências, atualmente com a crise ele quase se equipara com as transferências, mas o ICMS é um instrumento político, por isso temos que pensar: É um instrumento técnico? É suficiente? Pode-se avançar na arrecadação dele com expansão da base de tributação? Uma fiscalização mais rígida resolve? Então, enquanto instrumento técnico ele pode ser sim uma alternativa viável porque está aí, mas enquanto instrumento político, enquanto houver guerra fiscal, mesmo que proibida por lei, tem que se pensar se realmente essa coisa é válida dentro da estrutura federativa. Jornal Contexto - O ICMS não é injusto para os mais pobres? WN - O ICMS é pago quando a pessoa faz a compra final da mercadoria, porque nos processos anteriores quem fornece e repassa a mercadoria da fábrica até o consumidor final vai repassando imposto até o último consumidor, todos eles se creditam do ICMS na hora da venda e às vezes antecipadamente, então o intermediário não tem prejuízo nesse negócio, ele repassa para o preço final, quem paga é o consumidor final. Então o imposto sobre o consumo, como no caso do ICMS, é neutro em relação à produção e as relações econômicas anteriores a venda final. Portanto, quem consome mais vai pagar mais, não quer dizer que seja injusto com os mais pobres, quer dizer que os mais pobres têm a mesma carga de ICMS paga pelo rico. No produto mais caro, ele vai pagar proporcionalmente a sua riqueza, nesse caso ele não é injusto com os mais pobres. Agora, uma política social que pode funcionar é a isenção do ICMS para as classes mais pobres, mas tem que ter claro que está incentivando o consumo dos menos favorecidos, isso não necessariamente melhora a vida deles, porque se o mais pobre está passando necessidade e quer comprar um celular é uma opção dele.

aluguel tem que manter essa despesa durante o tempo em que ele mora nessa casa e devolvê-la. A riqueza é uma fonte de economia no sentido comum, vulgar, e isso de fato o pobre não tem. É quando nós falamos de justiça de fluxo e justiça de estoque que é a riqueza. Existe uma faixa da população que não é tributada, porém a alíquota máxima do IR vai até 27,5%. Jornal Contexto - Esse teto não é alcançado por nenhum contribuinte. Isso não é injusto? WN - De fato nós temos injustiça quando você define um teto para pagar IR, mas você tem uma injustiça maior em relação à riqueza. Quando é que você vai desonerar o pobre de novos gastos se ele não tem riqueza, não precisa falar de rico, mas a classe média que tem uma casa, uma poupança, um negócio que pode evitar uma despesa já está desonerada pelo seu estoque, então o fluxo dele é para ficar com a renda livre para outra coisa, já o pobre não, ele não tem saída, precisa gastar em consumo ou gastar em necessidades, então a injustiça é mais clara em relação à riqueza e essa não é atacada. Jornal Contexto - Existem obrigações em nossa Constituição com a saúde e educação determinadas em percentuais da receita corrente líquida. Algumas categorias de trabalhadores tentam vincular seus vencimentos à Constituição e existe uma discussão de vincular 10% do PIB para a educação. Qual a sua opinião? WN - Não tem nenhum sentido econômico, nem sentido social você fixar na Constituição o que quer que seja. Primeiro porque a dinâmica do investimento de cada setor é proporcional aquilo que se cria de

23 23 benefício em cada momento, se você melhora a educação em 10%, provavelmente essa educação vai criar condições dela própria se melhorar. Uma vez criada à estrutura porque repetir uma situação que foi dimensionada para um momento mais precário, mais dependente. Nós temos que avançar no sentido de que em termo lógico se espera que os investimentos feitos em cada período sejam eficientes e que os investimentos sucessivos sejam marginalmente menores, essa logica seria geral e grosseira, mas é claro que isso tem a ver com a realidade, não podemos à priori definir quanto é que cada setor da sociedade, a exemplo da saúde e da educação, vai precisar. A política de saúde se for de emergência, então vamos precisar gastar mais, porque se investe em tratamentos de traumas e cirurgias, provavelmente não está cuidando do básico, da alimentação, da vacinação, etc. Consequentemente os gastos vão ter que aumentar. Portanto, não tem nem como fixar em 10%, e a cada ano vai precisar de mais recursos por falta de parâmetros, isso depende da situação, do desenho da sociedade em cada momento. Jornal Contexto - A economia é cíclica. O Brasil sai da crise este ano ainda? WN - Não acredito, não tenho a menor previsão na minha limitação de que a economia saia dessa situação ou chegue a taxas positivas de crescimento num horizonte de dois anos.

IR – Imposto de Renda ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços PIB – produto Interno Bruto

Jornal Contexto - O mais pobre paga mais porque consome toda a sua renda, já quem ganha mais não gasta tudo. Percentualmente existe uma grande discrepância? WN - No conjunto dos impostos, por exemplo, o IR numa certa faixa de renda é isento, então os mais pobres não pagam, já os mais ricos pagam. O que se pode ver no conjunto da sociedade é que os mais ricos não são tributados na totalidade de sua renda, porque a riqueza no Brasil praticamente não é tributada. No consumo pode existir de um pobre pagar ICMS tanto quanto o mais rico, ou pagar mais porque consume mais, isso em relação a sua renda. O rico não consome toda a renda, por outro lado o IR que o rico paga não incide para boa faixa dos pobres, então no conjunto do sistema tributário isso de certa forma se compensa. Jornal Contexto - Não temos o imposto sobre grandes fortunas. Pode-se dizer então que a riqueza no Brasil é beneficiada? WN - Entramos em outra questão que não é necessariamente o tributo, estamos falando de fluxo, de renda, tudo que é novo é fluxo, aquilo que eu ganhei durante o ano, aquilo que ganhei quando eu produzi ou algo que vendi, no caso do proprietário, do empresário que por trás desse fluxo tem uma riqueza. Você sabe que até hoje pago aluguel? Por quê? Porque eu não tenho uma riqueza anterior, eu não comprei uma casa, quem compra uma casa já tem a economia do aluguel, não é verdade? Embora tenha a despesa da manutenção da casa, porém quem paga

Fonte - Secretaria do Tesouro Nacional (STN)


Esporte

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Participação em campeonatos nacionais gera visibilidade e renda ao Confiança Copa do Brasil, Série C e Copa do Nordeste trazem investimento ao clube sergipano e garantem calendário até o segundo semestre do ano. ANDRÉIA FONTES andreia.fontes@hotmail.com

A paixão da torcida azulina A torcida do Confiança é o maior patrimônio do clube. Desde o surgimento do “time do povo”, seus fiéis adeptos representam a massa azulina. O trabalho monográfico realizado por Emily Lima e Thais Guedes, intitulado “SER X CON: O Grande Derby Sergipano” mostra ricos detalhes dessa história azulina. A Associação Desportiva Confiança (A.D.C.) foi fundada em 1936, inicialmente por jovens idea-

Ao longo de sua história, alguns jogadores que passaram pelo clube ajudaram a construir equipes memoráveis. O inesquecível time de 1962, a década de 1970 e o prestígio nacional, apenas demonstraram que o gigante operário veio para ficar, assim como a força da torcida proletária, a maior entre as conquistas do gigante da capital. José Dória, filho de pai torcedor do Itabaiana, acompanham o Confiança com FOTO: ANDRÉIA FONTES

O

Jogos. Arena Batistão, palco dos jogos da A.D.C.

Atividade. Jogador Leandro Kível em atividade

os azulinos, como preferência de compra dos ingressos, descontos nas lojas oficiais, valor do ingresso reduzido, sorteios em participação de partidas e outros. Para agregar novos torcedores, são realizadas visitas às escolas e publicidade, por meio de uma agência contratada, além dos resultados nas competições, que contribui para atrair novos torcedores. Artilheiro em busca de destaque Para o atleta é mais motivante jogar em um clube que disputa campeonatos com visibilidade maior. Atuações de destaque representam a chance de aparecer na mídia e entrar na lista de contratações de outras equipes. “Se chegaram propostas de outros clubes que não disputam essas competições nacionais, o jogador pensa bem se vai ser bom para sua carreira ou não”, declarou Leandro Kível, centroavante do Confiança. A repercussão dessas partidas pode ser decisiva para a carreira do jogador, por isso, estar motivado e com as condições físicas e psicológicas ideais é o principal passo para um melhor desempenho. “A motivação na minha opinião tem que ser em tudo que se faz. Na minha profissão dou meu máximo porque gosto do que faço, independentemente do campeonato a ser disputado”, ponderou o atleta. Ao chegarem propostas de outros clubes, a disputa desses campeonatos faz com que o jogador pense melhor sobre sua saída ou permanência.

listas que viram nas modalidades voleibol e basquete uma oportunidade de inserção na prática esportiva. Um dos seus fundadores, Joaquim Sabino Ribeiro, que leva o nome do estádio do clube, proprietário da Fábrica Confiança, era detentor de um grande terreno no Bairro Industrial. Eis que no dia do trabalho, em 1º de maio de 1936 surge uma das maiores forças do esporte sergipano. Em meio ao país do futebol, faltava algo para que a A.D.C se tornasse gigante. Assim, em 1949 é criado o departamento de futebol do clube. Então, surge o “Dragão” do bairro Industrial, o time que “já nasceu grande”, formado por operários da fábrica que levava seu nome, o clube das cores azul e branca. O primeiro título veio em 1951. No campeonato de 1955, após a Federação Sergipana de Futebol (FSF) instituir que os dois jogos da final contra o Sergipe seriam no Estádio Adolpho Rollemberg, o Dragão resolveu desfiliar-se da entidade e em seguida acabou com o clube. Mas quando uma instituição ganha conotação não poderia acabar assim. Um movimento grandioso é formado e as passeatas tomam conta da capital sergipana, nas quais o fundador Joaquim Ribeiro pronunciou em meio aos manifestantes a seguinte frase: “Como é para o bem de todos e felicidade maior do Confiança, o Confiança fica e a Fábrica sai, porque o Confiança não pertence mais à Fábrica, o Confiança agora é do povo”.

frequência há 30 anos, seu único time. Seu José não é sócio torcedor, mas afirma ajudar o time na medida em que frequenta os jogos. Quando o time azulino manda jogos fora de seus domínios, a principal dificuldade se remete à questão de transporte e de mobilidade desses torcedores. “Hoje tá perigoso viajar, então a gente prefere escutar no rádio ou ver na televisão quando é transmitido”, pontuou o

torcedor. A necessidade de fazer investimentos, contratando jogadores de qualidade para disputar com mais força contra as outras equipes, foi outra questão colocada em pauta pelo azulino. Samuel Melo, 50, acompanha todos os jogos do clube proletário. Torcedor do Confiança, Flamengo e Santa Cruz, a relação de amor pelo “Dragão” começou aos 13 anos de idade. Levado ao estádio de futebol pelo pai, torcedor do arquirrival Sergipe, o lado azul foi o que despertou sua paixão. O sócio torcedor é consumidor de produtos oficiais do clube, como meio de ajudar seu time do coração, mas citou a dificuldade de transporte para os jogos do interior como o maior desafio. “O sergipano gosta de futebol. A questão agora é só questão de patrocinadores. Patrocinadores fortes podem nos levar a uma série A”, afirmou. Gabriela, 25, torcedora do Confiança e Vasco, tem uma relação recente com o time proletário. O jogo entre Confiança e Flamengo foi o primeiro no calendário da jovem sergipana no ano de 2016, fato que se atribui à importância da participação azulina no segundo campeonato nacional mais importante do país. A maior dificuldade apontada está atrelada à falta de incentivo financeiro para o futebol local. “O clube não motiva o torcedor a ir ao estádio. Falta ser divulgado, olharem mais para o futebol sergipano”, ressaltou a torcedora azulina. Símbolo do clube, ao torcedor azulino resta acompanhar o time nas competições que disputa, motivação que cresce à medida que esses campeonatos trazem representatividade para o estado. O sucesso nesses jogos prolonga o calendário, patrocínios, contratações, sócio torcedor, espectadores, mas acima de tudo, revigora a alma do torcedor sergipano, que não diferentemente do brasileiro, respira futebol. FOTO: ANDRÉIA FONTES

TV, patrocínios, borderôs, programa sócio torcedor e negociação de atletas”, explica o presidente do clube, Luiz Roberto Santana. Para ele, a ausência nos campeonatos regionais e nacionais representa uma grande perda econômica para os clubes. “Fora das competições a equipe não teve esse tipo de arrecadação e, além disso, por conta da visibilidade tem dificuldade com patrocínio e com o programa sócio torcedor”, ressaltou. O principal produto que ajuda a divulgar o clube é a participação em competições, pois há o fortalecimento da marca e do calendário, tendo a transmissão de TV como o carro-chefe. Atualmente, o clube possui uma média de 2.000 sócio torcedores, programa que possibilita benefícios para FOTO: BRUNO ALBUQUERQUE

futebol é o carro-chefe dos esportes no Brasil. A prática do esporte está concentrada, principalmente, no eixo Sul - Sudeste, que concentra os principais clubes do país, como também os principais veículos de comunicação que fazem a cobertura dos campeonatos. Por outro lado, num estado com futebol sem grande representatividade nacional, como é o caso de Sergipe, o título estadual permite a participação do campeão e vice-campeão em competições de boa expressão, como a Copa do Brasil, a Copa do Nordeste e as séries de acesso às divisões de elite nacionais. Isso significa um grande feito para os times, pois a participação nestas competições propicia patrocínios mais rentáveis, melhores públicos e visibilidade considerável nos meios midiáticos. Nos últimos dois anos, a Associação Desportiva Confiança (A.D.C) conquistou o título estadual e tornou sua presença recorrente, fato que corrobora para que, a cada ano, o clube se torne forte candidato a sagrar-se vencedor, tendo em vista que melhores condições econômicas repercutem nas contratações e formações de equipes mais competitivas. Em Sergipe, as competições de futebol começam em fevereiro, estendendo-se até meados de maio. Para os times que participam dos campeonatos nacionais, o segundo semestre tem o calendário preenchido até novembro. Por outro lado, as equipes que disputam apenas o estadual geralmente desfazem o time como opção para não comprometer os cofres do clube. Os meses de novembro e dezembro costumam ser aproveitados para contratações e início de pré-temporada. Nesse período, acontecem treinos e a apresentação do elenco que disputa o campeonato sergipano no início do ano. Considerando essa dinâmica, a participação do Confiança nas competições de visibilidade nacional afeta a economia do clube positivamente e gera seu fortalecimento. Sem esses campeonatos, o clube funciona apenas até o mês de maio. Com eles, o calendário se estende até o final do ano. A Copa do Brasil e a Copa do Nordeste têm cota fixa de TV, maior fonte de arrecadação dos clubes brasileiros, e todas as despesas são pagas pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Na Série C, todas as despesas são pagas e a arrecadação fica restrita a patrocínios do clube e borderô (renda) das partidas. “O que move a economia do clube é a cota de

25 25

Torcedor. À direita, Samuel Melo, torcedor apaixonado pelo Dragão.


notas

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Ao Mestre, com carinho... “M

esmo com pouco tempo, apenas um período, Michele foi a professora que mais me incentivou a escrever sobre temas que gosto. Além disso, tornou-se um grande espelho para mim. Quando crescer, quero ser igual à Michele!”

“O

brigada por ter sido fiel a sua vocação e ter feito desse amor pelo ensinar jornalismo, exemplo pra mim. Que a luz divina te acompanhe e te guie por onde quer que fores e que você possa alcançar todos os teus sonhos!”

“T

enho como meta como futura jornalista, chegar o mais perto possível de Michele como profissional. É espelho para quem quer refletir com seriedade, profissionalismo e sensibilidade nessa área de grandes histórias e verdades. Obrigada!”

Taís Cristina

“O

brigado, Michele, pela doçura e incentivo em descobrir novos horizontes na escrita do jornalismo! O pouco tempo que fui seu aluno vai ficar marcado, pode acreditar!”

Ana Lúcia

Gustavo Monteiro

Ellen Cristina

“A

caminhada na universidade é desgastante e pode desestimular já nos primeiros anos. Felizmente, a gente encontra quem consiga nos ajudar a ressignificar nosso trabalho e se somar à luta diária que é enfrentar um sistema de educação problemático. Michele é uma dessas pessoas e poucos docentes que fazem questão de manter o brilho nos olhos de cada aluno, mesmo diante de limitações, condições precárias e de uma profissão, na maioria das vezes, ingrata. Ademais, a qualidade que eu mais admiro em Michele é a capacidade que ela tem de compartilhar os próprios sonhos e torná-los os nossos”

Matheus Brito

S

er professor qualquer um pode ser, mas ter o dom de ser professor é para poucos. Mais que passar conteúdos é transmitir experiências, lições de vida. Lecionar é algo lindo e que com certeza precisa ser mais valorizado. Quando se é professor universitário mais que transmitir tudo isso, precisa-se passar os valores, um “gostinho” de mercado de trabalho para os futuros profissionais que ali estão. Quando se é professor universitário se trabalha com os sonhos dos alunos que estão ali cheios de expectativas para a futura vida profissional. A Universidade é cheia de obstáculos e aliados a esses estão também os desafios da nossa futura profissão. Para nós, os desafios da vida jornalística, que sentimos na pela a cada disciplina laboratorial. Mas, quando nos deparamos em sala com um professor que nos motiva, nos incentiva (até nas broncas) é mais fácil vencer esses obstáculos.

or ter me dado a liberdade de escrever sobre o que eu realmente gosto; por me causar um super susto e pausar a aula por minha causa para corrigir um erro ‘perdoável’, pois ainda não é Impresso II; por fazer eu me apaixonar por escrever com um pouco mais de profundidade, obrigada! Professora qualquer uma pode ser, mas educadora engloba valores que ditam o caráter e forma gente do bem. E poucos têm esse dom.”

Nathália Gomes

“-Mas, professora e se não der certo?” “-Tente, o não você já tem, vá atrás do sim!”

Michele, em nome daqueles que receberam seus ensinamentos, receba o nosso carinho e o nosso muito obrigado!

Andréia Fontes

“E

u só tenho a agradecer muito a professora Michele por todos os seus ensinamentos! Seu jeito encantador de ensinar me fez amar ainda mais essa linda e complicada profissão!”

Lucivânia Santos

“P

Victor Siqueira

or onde quer que eu vá, lembrarei da professora que me ensinou a ser mais humana em minha futura profissão. Michele é sinônimo de profissionalismo aliado ao companherismo - ela anda lado a lado com cada aluno, instruindo, corrigindo e sendo exemplo. Desejo toda sorte de benção sobre sua vida!”

Você que chegou até a última folha deste jornal passou por várias histórias - não apenas as que estão escritas - mas as histórias implícitas da construção de cada reportagem, de cada página, de cada elemento. Essa é um pouquinho da nossa história e para que ela pudesse se tornar real nós tivemos a frente um exemplo de profissional. Michele Tavares, que motivou, inspirou, nos fez acreditar no jornalismo, acreditar em dias melhores, acreditar que somos capazes... acreditar nos nossos sonhos.

“P

rofessora, gostaria de dizer que sou muito grato a você, por ter passado, a mim e à nossa turma, o seu conhecimento de forma branda e eficiente. As discussões em sala e seu método de ensino irão me influenciar nas escolhas profissionais e na minha postura ética como jornalista. Muito obrigado! .”

“P

Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus.” (Mateus 5:16)”

“B

ons mestres servem como exemplo, nos incentivam a enxergar além da caixa, a ir mais além e, de certa forma, nos permite descobrirmos um pouco mais sobre nós mesmos. Obrigada Michele por enriquecer a minha vida acadêmica com seus ensinamentos e por servir como um exemplo para mim. Sucesso!”

Yasmin de Freitas

“M

ais que professora, Michele foi amiga da turma. Não só estando perto quando necessário, mas puxando orelha quando preciso, alertando os perigos das decisões quando tomadas, incentivando quando notava em nós o desejo em investir. Tudo isso feito daquele jeito fofinho e particular dela, e assim foi ganhando espaço não só no meu, mas no coração da turma inteira.”

Yago Andrade

“N

ão sei por que você se foi, quantas saudades eu senti e de tristezas vou viver e aquele adeus não pude dar...” Seriam tantas canções, mas o que posso dizer é que “... foi com você que eu aprendi a respeitar os outros. Legal ter você aqui um amigo em que eu posso acreditar” Tão nova, tão humana, tão profissional. Nem ela mesmo acredita em quem se tornou, as palavras do pequeno príncipe caem bem nesse momento “você é responsável por tudo aquilo que cativas”. Uma professora que não doutrina, mas que orienta e tenta arrancar de seus alunos o que eles têm de melhor. Sinta-se abraçada por todos que fazem o DCOS.

“M

ichelle, em tão pouco tempo você conseguiu tanta coisa, inclusive, nos despertar novamente o amor pela profissão. Gratidão, e que o Eterno Espírito do Bem guie sua caminhada, abrindo seus caminhos para a luz, a paz, o amor e o sucesso!.”

Marcos Pereira

Silas Brito

“S

ó quero que tenha plena certeza da sua importância nas nossas vidas acadêmicas. Você foi o diferencial que precisávamos para continuar essa caminhada. Obrigada pela paciência, pela amizade, pelas aulas e pela magnífica orientação. De sua aluna mais louca,

Camilla Araújo


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