25 Anos do CMS/POA

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1992-2017 25 anos de lutas e realizacoes no exercicio do controle social do SUS

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1992-2017 25 anos de lutas e realizacoes no exercicio do controle social do SUS


Comissão Executiva Editorial Márcia Regina Cardoso Torres Gabriel Calazans Baptista Letícia Stanczyk Projeto Gráfico, Capa e Miolo Betina Domingues Katia Camargo de Oliveira

Diagramação Betina Domingues Katia Camargo de Oliveira Arte da Capa Betina Domingues Katia Camargo de Oliveira

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO-CIP C755 Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre: 25 anos de lutas e realizações no exercício do controle social no SUS / organizadores Gabriel Calazans Baptista ... [et al.] ; realização Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre. – 1.ed. – Porto Alegre : Rede UNIDA, 2018. 88 p. : il. ISBN: 978-85-54329-10-5 DOI: 10.18310/9788554329105 1.Controle social. 2. Participação social. 3. Conselho Municipal de Saúde (Porto Alegre). 4. Educação permanente – Saúde. 5. Sistema Único de Saúde. 6. Relato de experiência. I. Baptista, Gabriel Calazans. II. Alencar, Heloisa H. R. de. III. Lucas, Loreni. IV. Altamirano, Marisa Martins. V. Conselho Municipal de Saúde (Porto Alegre). CDU: 614 NLM: WA100 Bibliotecária responsável: Jacira Gil Bernardes – CRB 10/463


COORDENAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE PORTO ALEGRE NÚCLEO DE COORDENAÇÃO: Coordenadora: Mirtha da Rosa Zenker Segmento: Trabalhador em saúde Associação dos Terapeutas Ocupacionais do Rio Grande do Sul Vice-coordenadora: Djanira Corrêa da Conceição Segmento: Usuário Conselho Distrital de Saúde Restinga Coordenadores Adjuntos: João Alne Schamann Farias Segmento: Usuário Conselho Distrital de Saúde Partenon Liane Terezinha de Araújo de Oliveira Segmento: Usuário Conselho Distrital de Saúde Centro Jandira Rohers Santana Segmento: Trabalhador em saúde Conselho Distrital de Saúde Partenon Roger dos Santos Rosa Segmento: Prestador de serviços Associação Brasileira de Hospitais Universitários e de Ensino Erno Harzheim Segmento: Governo Secretaria Municipal de Saúde Organizadores: Gabriel Calazans Baptista Heloisa H. R. de Alencar Loreni Lucas Marisa Martins Altamirano ENDEREÇOS & CONTATOS: Endereço: Av. João Pessoa 325 90040-000 – PORTO ALEGRE – RS Fone: (51) 3289.2847 – (51) 3289.2848 Fax: (51) 3228.0203 E-mail: cms@sms.prefpoa.com.br Site: www2.portoalegre.rs.gov.br/cms


COORDENAÇÃO NACIONAL DA REDE UNIDA Coordenador Nacional: Túlio Batista Franco Coordenação Editorial Editor-Chefe: Alcindo Antônio Ferla Editores Associados: Ricardo Burg Ceccim, Cristian Fabiano Guimarães, Márcia Fernanda Mello Mendes Conselho Editorial: Adriane Pires Batiston – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil Alcindo Antônio Ferla – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Ana Lúcia Abrahão da Silva - Universidade Federal Fluminense, Brasil Àngel Martínez-Hernáez – Universitat Rovira i Virgili, Espanha Angelo Stefanini – Università di Bologna, Itália Ardigó Martino – Università di Bologna, Itália Berta Paz Lorido – Universitat de les Illes Balears, Espanha Celia Beatriz Iriart – University of New Mexico, Estados Unidos da América Débora Cristina Bertussi - Universidade São Caetano do Sul, Brasil Denise Bueno – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Denise Antunes de Azambuja Zocche – Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil Dora Lúcia Leidens Corrêa de Oliveira – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Emerson Elias Merhy – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil Felipe Proenço de Oliveira – Universidade Federal da Paraíba, Brasil Francisca Valda Silva de Oliveira – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil Izabella Barison Matos – Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil Hêider Aurélio Pinto – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil João Henrique Lara do Amaral – Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil José Ivo dos Santos Pedrosa - Universidade Federal do Piauí, Brasil Júlio César Schweickardt – Fundação Oswaldo Cruz/Amazonas, Brasil Laura Camargo Macruz Feuerwerker – Universidade de São Paulo, Brasil Laura Serrant-Green – University of Wolverhampton, Inglaterra Leonardo Federico – Universidad Nacional de Lanús, Argentina Lisiane Böer Possa – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Liliana Santos – Universidade Federal da Bahia, Brasil Luciano Bezerra Gomes – Universidade Federal da Paraíba, Brasil Mara Lisiane dos Santos – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil Maria Augusta Nicoli – Agenzia Sanitaria e Sociale Regionale, Itália Márcia Regina Cardoso Torres – Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Brasil Marco Akerman – Universidade de São Paulo, Brasil Maria das Graças Alves Pereira - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre , Brasil Maria Luiza Jaeger – Associação Brasileira da Rede UNIDA, Brasil Maria Rocineide Ferreira da Silva – Universidade Estadual do Ceará, Brasil Osvaldo Peralta Bonetti - Ministério da Saúde, Brasil Odete Messa Torres – Universidade federal do Pampa, Brasil Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira – Universidade Federal do Pará, Brasil Renan Albuquerque Rodrigues – Universidade Federal do Amazonas/Parintins, Brasil Ricardo Burg Ceccim – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil Ricardo Luiz Narciso Moebus - Escola de Medicina da Universidade Federal de Ouro Preto, Brasil Rodrigo Tobias de Sousa Lima – Fundação Oswaldo Cruz/Amazonas, Brasil Rossana Staevie Baduy – Universidade Estadual de Londrina, Brasil Simone Edi Chaves – Ideia e Método, Brasil Sueli Terezinha Goi Barrios – Ministério da Saúde, Brasil Túlio Batista Franco – Universidade Federal Fluminense, Brasil Vanderléia Laodete Pulga – Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil Vera Lucia Kodjaoglanian – Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul, Brasil Vera Maria Rocha – Associação Brasileira da Rede UNIDA, Brasil


ÍNDICE APRESENTAÇÃO ...........................................................................................................7 CONSELHEIROS DE SAÚDE DO BRASIL, UNI-VOS! PELO SUS! PELO DIREITO HUMANO À SAÚDE! .....................................................................................................9 OS ESPAÇOS DE CONTROLE SOCIAL COMO POSSIBILIDADE DE FORMAÇÃO E O PAPEL ESTRATÉGICO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE ...............................................................32 Comissão de Educação Permanente, Espaços de Formação e o Movimento em Defesa do SUS ..............................................................................................36 I MOSTRA DO CONTROLE SOCIAL DE PORTO ALEGRE - EXPERIÊNCIAS EXITOSAS CONTADAS EM OFICINAS LITERÁRIAS .........................................................................43 US Santo Alfredo ................................................................................................47 US Chácara da Fumaça .......................................................................................51 US Nossa Senhora Aparecida .............................................................................54 US Morro Santana ..............................................................................................56 US Vila Gaúcha ...................................................................................................58 US Santa Tereza ..................................................................................................64 CDS Humaitá, Navegantes e Ilhas .......................................................................66 CG Hospital Nossa Senhora Conceição ...............................................................73 CG Pronto Atendimento Lomba do Pinheiro ......................................................78 PRÊMIO DESTAQUE EM SAÚDE – O SUS QUE FUNCIONA ............................................81 HOMENAGENS PÓSTUMAS ........................................................................................87

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APRESENTAÇÃO A participação social no território da saúde em Porto Alegre vem sendo contada através de muitas mãos e vozes há mais de 30 anos. Uma dessas vozes é a do Conselho Municipal de Saúde, que completa 25 anos, uma trajetória de lutas e conquistas em defesa da saúde de todos. A edição periódica desta história, que teve início aos 10 anos, se seguiu de mais dois volumes, na comemoração dos 15 e 20 anos respectivamente. O primeiro volume relatou o início desta caminhada, marcada por tempos difíceis da história brasileira, onde a luta por democracia e garantia de direitos, travada por muitos homens e mulheres, em todos os campos da vida social, lavraram o terreno fértil para uma das maiores conquistas sociais do nosso tempo: o direito à saúde como direito à vida. Em nossa cidade, esses valorosos militantes assumiram o compromisso político de construir um SUS para todos, com equidade, integralidade e participação social. O segundo volume contou a realização das Conferências de Saúde, resgatando a riqueza dos debates e propostas originadas nestes fóruns de participação social, que contribuem para o direcionamento das prioridades em saúde para Porto Alegre. O terceiro volume fez o relato das principais ações e conquistas pelo direito universal à saúde, e contou, para isso, com a participação protagonista de pessoas que vivenciaram estes momentos e se dispuseram a oferecer à nossa memória, os seus depoimentos e reflexões, contribuindo para o registro analítico de nossa trajetória. Este quarto volume pretende dar visibilidade às experiências exitosas de organização dos espaços de controle social que, em nossa cidade, se constituem numa rede descentralizada, local e regionalmente, e que tem, na perspectiva estratégica da educação permanente, potencializado a participação e o controle social no SUS. Desta forma, o 7


texto de abertura deste volume foi escrito por Valdevir Both, filósofo e educador popular, convidado a proferir a palestra magna de abertura da 6ª Conferência Municipal de Saúde, realizada em 2015, e que tem, através de sua atuação junto ao CEAP (Centro de Educação e Assessoramento Popular), assessorado e contribuído para o processo formativo da Comissão de Educação Permanente do CMS, cuja atuação também está registrada no texto que complementa a parte introdutória deste volume. Para a escrita dos relatos que compõem o capítulo central deste livro foi utilizada metodologia participativa, em formato de oficinas, cuja descrição encontrase na introdução do referido capítulo. A opção por este conteúdo, na comemoração de 25 anos do CMS, tem por objetivo apresentar o resultado do investimento na formação de educadores para o controle social, na perspectiva da educação popular, como estratégia de fomento da participação dos usuários, trabalhadores e gestores do SUS nas instâncias descentralizadas do CMS, ampliando a sua capacidade efetiva de exercer o controle, fiscalização e avaliação das ações e dos resultados da gestão em saúde na cidade. A metodologia aplicada para a escrita dos relatos também buscou dar voz e vida aos atores implicados na tarefa militante de defesa do SUS e do direito à Vida, proporcionando encontros e trocas de experiências, saberes, sabores e afetos que comemoram e celebram a história do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre.

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CONSELHEIROS DE SAÚDE DO BRASIL, UNI-VOS! PELO SUS! PELO DIREITO HUMANO À SAÚDE! Rumo a 15ª Conferência Nacional da Saúde Valdevir Both¹ "Somente os que forem capazes de encarnar a utopia serão aptos para o combate decisivo, o que pretende recuperar o quanto de humanidade já tivermos perdido” Ernesto Sábato, Antes del fin, 1998.

O título deste escrito é inspirado num chamado muito famoso, um pouco esquecido nos últimos tempos. Na origem dizia: “trabalhadores do mundo, uni-vos”! Pesquisei muito, mas não encontrei seu autor. Cheguei apenas a algumas pistas. Parece que foi dita por um Sr. barbudo, no séc. XIX, quando se avançava largamente a implementação da sociedade capitalista. Opa! Capitalismo? O que é isso? Também não consegui encontrar uma definição para essa palavra. Folhei diversos relatórios recentes de reuniões e conferências de saúde, mas pouco encontrei! Talvez tenha procurado no lugar errado, afinal, o que a saúde teria a ver com algo chamado capitalismo? No caminho dessa busca, pedi ajuda aos livros de história e encontrei um significado: “o capitalismo é um sistema societal centrado na acumulação de capital nas mãos de poucos às custas da exploração máxima do trabalho de muitos”. Confesso que essa definição não me convenceu, afinal, aprendi com o Fukuyama que o capitalismo é o sistema mais avançado que a humanidade já construiu até aqui e que nele todos podemos ser muito felizes, basta querermos, basta esforço pessoal. No marco de preparação da 15ª Conferência Nacional da Saúde no Brasil, um primeiro exercício político-pedagógico interessante poderia se constituir em saber quem era o autor dessa frase e o que queria dizer com ela. Além disso, conversar com os amigos sobre o que é o capitalismo, a concentração de renda e riqueza às custas da exploração do trabalho alheio.

¹Doutorando em filosofia, educador popular no CEAP e professor no IFIBE.

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Na esteira desses questionamentos, poderia resultar importante perguntarse nas nossas rodas de conversa, se essas realidades ainda existem ou não nos dias de hoje e qual a sua relação com a saúde. Mesmo com dúvidas sobre o sentido que fazem essas perguntas para muitos/as no atual contexto do debate da saúde, as ponho, certo de que poderão ser acolhidas. Na aurora do século XXI fomos acordados pela crise econômica mundial, uma velha conhecida que apareceu com “estilo novo”. Nos assustamos, pois seu “modelito” inovador, agora financeirizado, só aumentou a sua fealdade, que sempre lhe foi e continua sendo característica. Mas a intensidade do susto foi aumentada pelo alto grau de imprevisibilidade desta presença! Afinal, as “agências de classificação de risco” descartavam por completo essa visita horripilante quando a poucos dias, antes do grande “estouro” em 2008, classificavam os títulos imobiliários americanos, que iniciaram a crise, de AAA (a maior nota possível). Estas agências, criadas pelos grandes capitalistas, julgam empresas e governos e indicam quais deles têm saúde financeira e merecem crédito. Essas agências, as mesmas que desvalorizaram a maior produtora de petróleo do mundo, a Petrobrás, afugentando investimentos, foram as que supervalorizaram os títulos altamente apodrecidos nos Estados Unidos. Estranho, não? A crise econômica mundial, “iniciada” em 2008 nos EUA, aparentemente diferente, mas a rigor muito semelhante às crises anteriores, está produzindo um efeito catastrófico de drenagem de recursos públicos para a rapinagem financeira privada. Dados comprobatórios não faltam. Em 2008, o Senado dos Estados Unidos votou a favor de um pacote de módicos 700 bilhões de dólares, dinheiro público para salvar o sistema financeiro de Wall Street. No mesmo ano, alguns países europeus (França, Áustria, Alemanha, Países Baixos e Itália) repassaram ao sistema financeiro (diga-se, a alguns bancos) a bagatela de 1,17 trilhão de euros, dinheiro pertencente ao povo. Mas bah tchê! Algum conselheiro de saúde, integrante de alguma Comissão de Finanças, Orçamento, etc, poderia me ajudar a traduzir esses valores em reais e ver o que poderíamos fazer com essa 10


essa grana? Seria possível pagar quantos kg de churrasco no sul? Quantas moquecas capixabas poderiam ser saboreadas? Quantos pães de queijo em Minas? tapiocas, tacacás...? E quantas equipes de saúde da família, unidades básicas, Upas, etc? (por favor, não me deixem só, me ajudem nesse cálculo, aguardo retorno)! Causa espanto quando representantes do “andar de cima” fazem críticas às políticas públicas como o Bolsa Família em função do seu suposto caráter “assistencialista”. Quem afinal vive mamando na teta do Estado? Soa estranho também o conselho clássico dos liberais capitalistas, como Milton Friedman, quando sugerem que políticas públicas universais como saúde e educação têm um alto custo à sociedade, ao ponto de se tornarem impagáveis, e desenvolverem a preguiça e a inércia nos “pobres”. Essas mesmas vozes, que têm seus representantes em toda parte, simplesmente calam quando quantitativos astronômicos de recursos salvam bancos. Especialmente a estes reitero: gastar dinheiro com o sistema financeiro capitalista gera duas consequências nefastas: a) assistencialismo, no sentido ruim do termo, sempre tão condenado por eles, visto que estão tão dependentes do Estado, do dinheiro público, que não conseguem viver sem essa mão amiga; b) preguiça e inércia, pois, como vivem basicamente às custas dos títulos da dívida pública, que geram alta lucratividade, o investimento no desenvolvimento produtivo se torna menos atrativo, produzindo disposição à preguiça nos grandes empresários e, como imediata consequência, uma inércia econômica. Não por acaso temos visto baixo crescimento econômico ou recessão em muitos países nos últimos tempos, mesmo tendo investido fortunas de dinheiro público. Insisto: continuar com essa política cria nos ricos, hoje proprietários do sistema financeiro, do qual a maioria dos Estados e “democracias contemporâneas” se tornaram escravos, “assistencialismo”, preguiça e inércia. Diretamente proporcional a esse “assalto legal” aos cofres públicos é a continuidade e alargamento da concentração da renda e riqueza no mundo. Thomas Piketty, renomado economista francês, mostrou recentemente (2013) a habilidade do capitalismo em concentrar a riqueza 11


nas mãos de poucos, mesmo em tempos de crise. A ONG britânica Oxfam International, divulgou um relatório em janeiro de 2015 estimando que, a continuar o atual ritmo da concentração de riqueza no mundo, em 2016 1% dos mais ricos terão maior riqueza que 99% da população. Outro dia, enquanto tomava uma taça de vinho durante a noite, jogado no sofá da sala, cansado depois de um dia longo de trabalho, ouvi um discurso de um economista formado em Harvard alertando para a necessidade de todos os setores da sociedade fazerem sacrifícios nesse momento de “crise”. Como saboreava um vinho, devo ter escutado mal e não devo ter entendido. Afinal, como um especialista, formado em Harvard, não saberia que os ricos ficaram muito mais ricos nos últimos anos, exatamente porque a palavra sacrifício lhes é desconhecida? Mas se a economia anda “devagar, quase parando”, parada em muitos países, se os ricos continuam concentrando e enriquecendo como nunca, e se o dinheiro não cai das árvores, como isso é possível? Algum conselheiro ou conselheira de saúde pode explicar quem paga essa conta? Ora, a explicação está numa receita que não é nova, embora seus ingredientes sim! Essa lógica é sustentada pela exploração do trabalho humano, ou seja, do trabalho das mulheres e homens que labutam diariamente em todos os cantos do planeta. Obviamente que a engrenagem do capitalismo contemporâneo é muito mais complexa que em tempos idos (obviamente não vivemos mais no séc. XIX), mas para a nossa finalidade aqui, é suficiente afirmar o que é, e sempre foi, a essência do capitalismo: ele rouba o trabalho das pessoas. O capitalista financeirizado preguiçoso, que depende do “assistencialismo estatal” e nos leva reiteradamente a ciclos de inércia econômica, não deixou de depender da “mais-valia” (Opa! O que será a mais-valia?). Pelo contrário, como o dinheiro não é produzido pelas árvores, como eu imaginava quando criança, os capitalistas continuam dependendo de energia humana viva (braços, corpos, “mentes criativas”, etc) tanto para produzir como para consumir. Seu desafio é amplificar a exploração dessa energia, do trabalho! 12


Altíssimas taxas de desemprego pelo mundo (poucas vezes vistas em países ricos) e a destruição das políticas sociais universais são as consequências mais imediatas e brutais, quando a prioridade é o ajuste fiscal (traduzindo: concentração de renda e riqueza nas mãos de poucos às custas da exploração de muitos) ao invés da proteção social dos trabalhadores. Causa perplexidade que países com sistemas de proteção social consolidados por décadas, de uma hora para outra, adotem reformas que destroem conquistas históricas, que são a expressão concreta da luta dos povos por seus direitos. Ainda que esses sistemas de proteção tenham sido implementados somente em alguns países durante o século XX, e tenham convivido perfeitamente com o capitalismo, destruí-los significa um duro golpe nos direitos sociais, sempre tão estranhos a esse mesmo sistema capitalista. Desde quando a crise econômica “iniciou” em 2008, ganharam força um conjunto de discursos e práticas que requentam um passado anterior à Declaração Universal dos Direitos Humanos. Se em 1948 (com todos os limites intrínsecos ao processo de construção da referida Declaração) pactuamos termos mínimos (não máximos) da nossa convivência social, curiosamente isso está sendo visto hoje como inviável financeiramente e injusto socialmente. Em 1948, desgraçados pela guerra, pactuamos que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade” (Art. 1º). E não paramos por aí. Tínhamos o firme propósito de construir a paz mundial, embalados pela crença de que ela somente seria possível se houvesse justiça social. Disso resultou, entre outros tantos direitos proclamados, que “toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país” (Art. 22º). O texto deixou algumas lacunas, mas novamente fiquemos com o essencial para o nosso objetivo aqui: que todas e todos (e não somente alguns) têm o direito a ter 13


direitos e que, entre eles, figura a segurança social. O que anda na pauta por aí, nos debates do Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (BM), G20, Organização Mundial da Saúde, etc., já não é mais a busca de estratégias cooperativas internacionais para que a segurança social seja universalizada no mundo, conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos. O que se afirma de forma explícita é que esse caminho seria impossível em função do alto custo financeiro aos Estados e injusto socialmente, afinal, como o orçamento é escasso, deve ser focado nos mais pobres. E claro, nesse “pacote ideológico”, embutem na população outra “verdade” mentirosa, a de que o Estado é por natureza ineficiente e corrupto. Nascem daí os chamados “pisos de proteção social”, que englobam ações e serviços básicos ou mínimos aos mais pobres, desprovidos das condições econômicas para os custearem. Com os demais, que não se enquadram na categoria “pobre”, o Estado não deve se preocupar, restando a estes comprarem a sua “proteção” social no mercado. Fiquei sabendo outro dia que essa proposta está tendo muita simpatia das grandes instituições financeiras do mundo (os capitalistas financeiros), pois pode significar a criação de um novo mercado muito lucrativo, inclusive com linhas de crédito com o objetivo de financiar o tratamento de câncer, a compra de vacinas, o pagamento por um parto ou o transplante de um órgão. “Genial”! Já estão estudando formas de subsídio público para essas propostas. Quando soube do fato, tive um sonho durante a noite. Nele me apaixonei por uma linda mulher, de fazer inveja à Mona Lisa. Ao me aproximar, fitei seus lindos olhos e sussurrei: “quero seu coração pra mim”! Imediatamente me respondeu: “impossível meu anjo, não posso lhe dar o que não me pertence. Estou viva graças a um transplante financiado pelo banco. Durante os próximos 15 anos, meu coração estará penhorado”. Com os olhos lacrimejados, sentenciou: “se o queres para ti, deves negociá-lo com o banco”. Acordei do pesadelo e estava me dirigindo a uma agência bancária para liquidar o empréstimo dela através de um novo financiamento. 14


A tradução dos “pisos de proteção social” para a área da saúde é a adoção e implementação da chamada “cobertura universal de saúde” (atenção: não é sistema universal de saúde), que propõe serviços mínimos aos mais pobres. O que se esconde, ou nem tanto, por trás destas propostas, é a violação do princípio elementar da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotado em nossa Constituição, que é a nossa condição de igualdade (realço aqui a igualdade no sentido que lembra Boaventura de Souza Santos, que é preciso defender a igualdade quando a diferença nos inferioriza e defender a diferença quando a igualdade nos descaracteriza). Diferente do que propunha a Declaração, o que está em curso é a “inferiorização” da maior parte dos homens e mulheres da sua condição de sujeito de direitos, em específico aqui, do direito à proteção social. Mas, o que é mais preocupante é que estas propostas estão sendo levadas a efeito em nome da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos. Senão vejamos o que diz o Relatório “Piso de Proteção Social para uma Globalização Equitativa e Inclusiva” do Grupo Consultivo constituído pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) com a colaboração da Organização Mundial da Saúde (OMS): “a noção de Piso de Proteção Social está ancorada no princípio fundamental de justiça social e no direito universal de todos à seguridade social e a um padrão de vida digno. As disposições estabelecidas no marco conceitual do Piso referem-se a uma série de direitos constantes na Declaração Universal de Direitos Humanos”. Genial, não se tratasse novamente de um “golpe semântico”, pois no texto em questão a noção de direitos humanos é empregada de forma imprópria para justificar uma proposta que implode com o seu significado histórico mais caro. Esse processo anda a passos largos em todo mundo. Com maior ou menor intensidade, a atual reacomodação capitalista mundial está provocando a perda de direitos de milhões e milhões de pessoas, exigindo alta carga de sacrifício humano e significando para muitos a perda do direito mais elementar que é a vida. Mesmo que a razão para a morte de 700 pessoas, que viajavam num navio pesqueiro em condições sub-humanas da 15


Líbia para a Itália em abril de 2015, não seja única, como ignorar o fato de que esses seres humanos fugiam de uma situação de extrema pobreza absoluta? A respeito, me lembro da noite em que foi veiculada pela TV a notícia de que os países ricos estavam reunidos para discutir o problema. O consenso a que chegaram foi de que era preciso destruir as embarcações que realizam o tráfico humano, aumentar a fiscalização e qualificar as operações de salvamento em caso de acidentes. Meu filho de dez anos, na sua ingenuidade de criança, interrogou-me: “pai, mas e as milhares de pessoas famintas que estão aguardando na costa da Líbia, como vão conseguir fugir para a Europa em busca de comida com essas medidas?” Juro que tive a impressão de que nascemos inteligentes e nos tornamos imbecis quando atingimos a “maioridade” (Kant que me perdoe)! Em terras brasileiras, mesmo que com um grau de dificuldade maior, o capitalismo, e os efeitos da sua crise iniciada em 2008, não deixaram de mostrar os seus rastros. Os capitalistas financeiros, usando de todos os mecanismos possíveis, buscaram ao máximo capturar o Estado (o que não significa advogar a tese de que o Estado é apenas “vítima do sistema”). Por isso, se por um lado o país adotou várias políticas sociais importantes na última década (ancoradas e permitidas pela decisão política do governo federal por um determinado modelo de desenvolvimento), divergindo, em muitos casos, do receituário neoliberal de plantão, também é verdade que o país ainda não conseguiu realizar e consolidar algumas mudanças profundas e que impactam estruturalmente na proteção social do povo brasileiro. Nossa taxa de juros, altíssima, diga-se de passagem, continua garantindo altas fatias de lucro aos financistas. Dados apontam que em 2014, os cinco maiores bancos do país lucraram mais de 60 bilhões de reais. Isso representou um aumento de mais de 14% se comparado com 2013. Além disso, seu patrimônio cresceu mais de 18% nos últimos 12 meses (atingindo 370 bilhões). Parafraseando minha vó: meeeeeeu Jesus! (Obs: ela recorria a essa expressão, e com ênfases diferentes na letra “e”, em casos muito excepcionais, quando o nível de espanto era elevado). Estranho que esse crescimento se dê num cenário em que todos deveriam fazer “sacrifícios”. A 16


alta taxa de juros, sempre elogiada pelos capitalistas financeiros preguiçosos, tem sido posta como importante remédio para combatermos a inflação e atrair dinheiro, especialmente dos “investidores estrangeiros”, para custear o “projeto brasileiro”. No entanto, quanto maior o juro, maior o rendimento com os títulos da dívida pública. Na Argentina, os fundos investidores em papeis da dívida foram chamados recentemente de “fundos abutres”. Porquê será? Essa captura do Estado pelo sistema capitalista financeiro tem comprometido mais de 40% do orçamento da União com os juros, amortização e renegociação da dívida pública. Ainda que se reconheça como importantes avanços dos últimos anos o fato da “desdolarização” da dívida pública (isso significa maior governabilidade do Estado sobre a dívida, administrando-a a partir da taxa de juros interna-Selic e dependendo menos da variação externa do câmbio), e a sua diminuição se comparada com o PIB, esse império financeiro é inaceitável. É público e notório que o montante de mais de 40% do orçamento da União, destinado a “rapinagem”, impede um projeto de desenvolvimento que tenha como princípio a justiça social. Dados do orçamento federal, executado em 2014, dão conta de que gastamos 45,11% com juros e amortização da dívida pública. Esse percentual representa 978 bilhões de reais, quase um trilhão. Significa 11 vezes mais do que foi gasto com saúde. Um aumento também em relação a 2013, quando gastamos 40,30% com a dívida pública. Meeeeeeeeeeeeeeeeeeeu Jesus! Mas os capitalistas não se contentam somente com os títulos da dívida por aqui. Interessa a eles, sobremaneira, outras “áreas férteis” na produção de dólares. O petróleo é o mais cobiçado. Afinal, se em nossa “terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”, tem também o óleo do pré-sal, que às petrolíferas privadas interessará! Estimativas indicam que as reservas do pré-sal seriam algo em torno de 70 a 80 bilhões de barris. Isso representa algo em torno de 9 trilhões de dólares. Traduzindo para a nossa moeda, nada menos que 22 trilhões de reais. Isso é dinheiro que pertence ao povo. Pediria novamente a ajuda aos conselheiros bons em cálculo: se fôssemos dividir 17


222 trilhões de reais por 200 milhões de brasileiros, quanto daria para cada um? Prevendo essa quantidade de barris, o governo brasileiro criou um novo marco regulatório da exploração do petróleo no Brasil. A mudança de legislação data de 2010, quando era presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e estabelece o “regime de partilha” para o petróleo do pré-sal. Com ele, a propriedade é exclusiva do Estado e as empresas, quando exploram, recebem pelos custos da exploração e mais uma parcela do lucro sobre o campo (tecnicamente são chamados de “custo em óleo” e “óleo excedente”). Essa lei abriu caminho para que fosse aprovada em 2013, já no governo da presidenta Dilma Rousseff, a lei que destina 75% dos royalties do petróleo e 50% do Fundo Social do Pré-sal para a educação, e 25% para a saúde. Não é demais lembrar que este modelo é bem diferente daquele criado em 1995, quando o presidente era Fernando Henrique Cardoso, que permitiu às concessionárias exploradoras dos campos (grandes empresas privadas multinacionais) a posse do petróleo extraído por elas no que era chamado de “regime de concessão”. Ele propiciou às empresas o domínio sobre o “ouro negro” que, por direito constitucional pertence igualmente a todos os brasileiros. Durante a vigência do mesmo as empresas pagavam somente um quantitativo x ao Estado, mas não partilhavam o produto extraído. Na média, um valor baixíssimo diante da quantidade de barris que exploram. Esse novo marco legal foi criticado por uns, elogiado por outros e atacado odiosamente por terceiros. Os primeiros argumentaram que a nova lei era um avanço, mas que as empresas privadas ainda teriam muito lucro com o “regime de partilha”. Os segundos reconheceram que o novo marco legal significava o acordo “possível” à época para que o monopólio do présal voltasse ao Estado, mesmo que esse dependesse de empresas para a sua exploração. Ambos, porém, partem do mesmo princípio, a dizer, de que o petróleo, que é uma das maiores riquezas brasileiras, pertence ao povo e não à iniciativa privada (alguns poucos capitalistas). Os que pertencem ao terceiro grupo, coordenados por fortes grupos econômicos, aliados às empresas petrolíferas estrangeiras e aos meios de comunicação no Brasil (a 18


Rede Globo é a principal), reagiram com extrema violência à lei de 2010. Para fazê-lo, requentaram velhos argumentos, através dos quais parece terem convencido parcela grande da população. Venderam a “verdade” mentirosa de que o estado brasileiro estaria afugentando os investimentos das empresas petrolíferas do Brasil, e estando ele (o Estado) descapitalizado para tal empreitada, não sobraria outra consequência à falência do modelo adotado. Essa posição foi fortemente corroborada em 2014, por outro princípio liberal capitalista já citado acima, o de que o Estado não funciona e é corrupto por natureza. A prova estaria na “Operação Lava Jato” da polícia federal, que revelou sérios problemas de corrupção na Petrobrás. Uma das principais vozes desse grupo, Reinaldo Azevedo, da Revista Veja, chegou a sentenciar no final de janeiro de 2015: “Dilma só tem uma saída honrada e honrosa: anunciar a privatização da Petrobras depois da desratização. Mas não fará isso, é claro! Enterrará a estatal e o país”. Reinaldo Azevedo sintetiza qual é o real objetivo de um pequeno grupo de capitalistas bilionários nacionais e internacionais: privatizar uma das nossas maiores riquezas. Veja, com essa fala de Reinaldo Azevedo, que nada mais é que a expressão dos capitalistas reacionários, preguiçosos e “assistencialistas” em terra brasileiras, não se põe como objetivo acabar com a corrupção, bandeira histórica dos defensores do SUS no Brasil. Usa desse argumento, como em outros momentos da história, somente para buscar privatizar o que é do povo. Isso sim é corrupção! Se quisessem acabar com a corrupção, os grandes meios de comunicação estariam dando a mesma ênfase a escândalos de corrupção ainda maiores, descobertos recentemente. Falamos aqui do caso “HSBC” e “Operação Zelotes”. No caso do HSBC, estima-se que 8.667 correntistas brasileiros, diga-se de passagem, muito ricos, tinham escondido (oficialmente fala-se depositado) na filial suíça do HSBC em 2006 e 2007, mais de 20 bilhões de reais. Tudo isso para não pagar imposto. Esse grupo de mais de seis mil brasileiros, que reclama dos altos impostos no país, sonegou um montante quase igual ao orçamento previsto para o Bolsa Família em 2015, e que atende mais de 14 milhões de famílias.Com a operação Zelotes, descobriu-se que grandes empresas brasi 19


leiras, incluídas aí empresas de comunicação, as mesmas que ecoam os males da corrupção do Estado brasileiro, subornaram e compraram conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), ligado ao Ministério da Fazenda. Estas empresas, para não pagarem as dívidas aplicadas pela Receita Federal, pagavam propina para que os conselheiros (muitos indicados pelas próprias empresas) interviessem no sentido de anular ou diminuir essas multas ao máximo. Minha avó chamava essa prática de roubo. Nessa “brincadeira”, estima-se que foi sonegado um montante superior a 19 bilhões de reais. Num comparativo rápido, três vezes mais do que consumiu supostamente a corrupção na Petrobrás (6 bilhões). O Banco Santander é acusado de anular débitos que superam 3 bilhões de reais (o fato indignou a sogra de um primo meu, fazendo com que tirasse todo o dinheiro depositado nessa instituição). O Grupo Gerdau, segundo as investigações, é acusado de anular 1,2 bilhão em dívidas. Recentemente ouvi um discurso do presidente do Conselho do Grupo Gerdau que dizia: “existem diversas maneiras de transformar nosso mundo num lugar melhor para se viver. Não existe nenhuma receita mágica ou fórmula secreta”. Numa democracia é preciso dar o direito de inocência a todos os cidadãos até que se prove o contrário. Mas, se as denúncias sobre o CARF se confirmarem, existem sim fórmulas secretas que tornam o mundo dos ricos um lugar “melhor” de se viver. Porque a grande mídia não toca nos casos HSBC e Operação Zelotes, que implicam valores próximos a 40 bilhões de reais? Atenção: 40 bilhões é quase a metade do investimento anual em saúde por parte da União! A hipótese é simples: não querem acabar com a corrupção no Brasil, até porque, são elas próprias, enquanto grandes empresas capitalistas, as envolvidas nos maiores escândalos de corrupção no país. O Grupo de comunicação RBS, afiliado da Rede Globo no Sul do país, é suspeito de pagar 15 milhões de reais em propina para se livrar de um débito fiscal de 150 milhões no CARF. Portanto, repito: quando falam diuturnamente da corrupção na Petrobrás é para privatizá-la, nada mais! Aliás, estes grandes grupos de comunicação sabem muito bem que a corrupção está na alma 20


do capitalismo, e em sendo elas próprias grandes empresas, ou seu negócio dependendo do apoio publicitário das empresas capitalistas, a corrupção não lhe é estranha. Ignácio Rangel já dizia: “A corrupção é o creme do capitalismo. Não se desesperem, isso é sinal de que o capitalismo está se expandindo”. O tema da concentração dos meios de comunicação no Brasil mereceria uma atenção muito maior do que atualmente a sociedade e conselheiros de saúde lhe atribuem. Não é aceitável que somente a opinião de dez famílias brasileiras, que controlam os grandes meios de comunicação, entrem em praticamente todos os lares brasileiros, todos os dias. Se o fato por si só já viola a legislação que proíbe a concentração no país, isso se agrava ainda mais quando levado em conta o tratamento dado por eles às políticas públicas. Quem milita no campo da saúde pública sabe o que é conviver diariamente com noticiários tendenciosos que se destinam a desconstruir uma das maiores conquistas do povo brasileiro que é o SUS. O que se pretende não são críticas construtivas, sempre muito salutares para avançarmos no sistema. Em muitos dos casos, a mensagem subliminar que é passada é: “o SUS não funciona e nunca vai funcionar. Tenha um plano privado de saúde.” Portanto, a grande imprensa, quando se comporta assim, faz mal à saúde pública, ao interesse público. Ao se comportar assim, não informa, mas, interessadamente, desinforma. A grande imprensa brasileira, pela sua parcialidade, tende a imbecilizar as pessoas e tirar-lhes o senso crítico. Ela produz o que Vandana Shiva, uma grande filósofa feminista indiana chamava de “monocultura da mente”. Da mesma forma como a monocultura agrícola faz mal à saúde, pois expulsa a biodiversidade, a monocultura da mente acaba com a diversidade dos olhares sobre o mundo. Da mesma forma como os responsáveis pela monocultura agrícola tendem ao esconderijo (é assim que interpreto o PL 4148/2008, aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 28 de abril de 2015, que dispensa as indústrias de informarem no rótulo a origem transgênica) os responsáveis da monocultura da mente escondem que são ou estão a serviço de grupos sociais do “andar de cima”. Da mesma forma como as monoculturas agríco21


las tendem a intoxicar o meio ambiente, pela alta carga de agrotóxicos (e não defensivos, como querem nos fazer crer), a monocultura da mente intoxica as nossas relações sociais. Essa poluição tem contribuído para criar e disseminar o ódio das pessoas à política, às instituições (partidos, por exemplo), aos políticos, às políticas públicas centradas na efetivação de direitos. Outro dia, um ex-ministro da saúde, foi hostilizado publicamente num restaurante em São Paulo, em virtude de ter sido o responsável por implementar o programa “Mais Médicos”. Meeeu Jesus! Onde está o “crime” de uma política pública que tende a ampliar o acesso de milhões de pessoas a um médico e que é aprovada por mais de 80% dos usuários? Críticas são sempre bem vindas e não podemos nos furtar delas em qualquer circunstância; no entanto, a forma como foi feita (um momento privado do ex-ministro) é completamente condenável, da mesma forma como o seu conteúdo, que amplia a desinformação e prejudica o avanço do SUS. Atitudes como estas tendem a ser colhidas num “solo odioso”. A fala do cidadão no restaurante provoca desinformação e despolitização por diversos temas citados. Interessa-nos tão somente a parte do discurso em que cita o tema dos impostos. Atenção conselheiros: este tema deve nos interessar! Tem se tornado normal no Brasil a repetição de um discurso plantado pelas grandes elites capitalistas, que todos nós brasileiros e brasileiras pagamos muito imposto. É repetido aos quatro ventos que esse é um dos maiores males do país, ao ponto do pagamento do imposto se tornar uma ação otária – são instalados “impostômetros” nas praças. E a quem é responsável por cobrá-lo, no caso o Estado, imputem-lhe o sinônimo de ladrão. Esse tema, de tanto circular na grande imprensa, tem ganhado as nossas mentes (monoculturadas), nossos corações e ido para as ruas: “sonegar é legítima defesa”, dizia um cartaz em uma das mobilizações a poucos meses – ainda bem que já estão sendo instalados “sonegômetros”. Esse discurso é perigoso para os nossos direitos, para a saúde, por dois motivos: primeiro, não existe política pública universal de qualidade em nenhum lugar do mundo, e não terá em Marte quando formos prá lá, sem uma cobrança equivalente de impostos; segundo, não é verdade que todos 22


os brasileiros pagam muito imposto. Quem paga muito imposto no Brasil é o povo assalariado, que ganha menos, que é a maioria da população. Vamos aos dados que mostram esse “festival de injustiças tributárias”, geralmente escondido pela grande mídia no Brasil. Os que recebem até dois salários mínimos contribuem com 54% da sua renda para o pagamento de tributos. Os que recebem acima de trinta salários mínimos, com 29%. Além disso, não podemos esquecer que ainda somos um país machista e racista. Dados recentes mostram que a população mais pobre é formada por 68,06% de negros e 31,94% de brancos. Destes, 45,66% são homens e 54,34% de mulheres. Do outro lado da pirâmide, a população mais rica é formada por 83,72% de brancos e 16,28% de negros. Destes, 62,05% são homens e 31,05% mulheres. Logo, como concluiu um importante estudo do INESC, se os mais pobres pagam mais imposto, proporcional à sua renda, negros e mulheres são os mais penalizados. De novo! Isso acontece principalmente porque nossa carga tributária é chamada de “regressiva”, fazendo com que uma quantia grande do imposto recaia sobre os bens e serviços consumidos pela maioria dos brasileiros. Estima-se que quase a metade da carga tributária venha do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços ICMS) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Uma injustiça flagrante, que só aumenta quando consideramos que quem ganha um salário mínimo no Brasil e o Jorge Paulo Lemann (maior bilionário brasileiro, dono da Ambev e que reiteradamente reclama que paga muito imposto) pagam o mesmo percentual de imposto quando abastecem os seus respectivos veículos automotores ou compram um kg de feijão. Mas isso ainda não é tudo! Me contou um amigo de uma vizinha, que vige no Brasil uma normativa que isenta de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) as embarcações de luxo como lanchas, jatos particulares, jet skis e helicópteros. Eu não acreditei! Afinal, como acreditar que um jogador de futebol muito rico no Brasil aliás, muitos jogadores e ex-jogadores muito ricos no Brasil costumam reclamar e ir para a rua contra os altos impostos) não tenha pago IPVA sobre a sua luxuosa lancha de mais de 15 milhões de reais que exibiu recentemente, enquanto o 23


irmão da minha vó, que é assalariado, tenha pago o respectivo imposto sobre o seu carrinho popular? Mesmo não acreditando muito nesse amigo da minha vizinha, seria interessante que os conselheiros de saúde checassem se essa informação é verdadeira ou não (esse amigo da minha vizinha tem umas “sacadas” impressionantes: há alguns meses, da sacada do seu apartamento, zombava de um artista muito famoso que marchava contra a corrupção trajando uma camiseta da CBF). É por essas e outras que ricos do Brasil, que muito reclamam, pagam muito pouco imposto por aqui. O percentual sobre o patrimônio é pífio, de modo que a sua contribuição para o bolo final da arrecadação alcança míseros 3,5%. Nos Estados Unidos é acima dos 12%. Outro dado que ajuda a perceber a injustiça tributária no Brasil é a taxação do capital. Se na França é de 38,5%, no Canadá 31%, na Alemanha 26,4%, nos EUA 21,2% e na Turquia 17,5% (pelo que me consta, nenhum destes países é socialista ou comunista), no Brasil é 0,00%. Meeeeeu Jesus! Como não pautar na conferência municipal, estadual ou nacional o imposto sobre as grandes fortunas (IGF), previsto na Constituição? Alguns dados indicam que, taxando em 1% os endinheirados que têm um quantitativo acima de um milhão, teríamos em torno de 100 bilhões por ano. Nada seria mais justo, afinal, como lembra bem Rawls (que é um liberal americano e não um comunista cubano) a tributação deve ser um mecanismo de realização dos direitos e da igualdade numa sociedade e não de manutenção de privilégios ou acirramento da desigualdade social. É por isso que “me dá nos nervos” (lembrando da minha avó) quando ouço por aí, nas conferências e conselhos de saúde pelo Brasil, ou nas rodas de chimarrão no meu querido RS, que o Brasil ou os brasileiros pagam muito imposto. Esse discurso é uma cilada e um grande gol contra o SUS e os nossos direitos. Se dermos eco a ele, vamos embarcar na agenda atual dos grandes capitalistas que querem pagar ainda menos do que já pagam atualmente no Brasil e fortalecer o discurso da “sonegação legítima”. Nossa tese deve ser outra: os pobres, negros, mulheres, assalariados, etc, pagam muito imposto e os ricos pagam pouco. Logo, a agenda será diminuir a carga ao primeiro 24


grupo e aumentar para o segundo. Seria lindo um auditório de conferência de saúde tomado por faixas e cartazes com os dizeres: “IGF já” ou “os militantes do SUS advertem: a taxação do capital financeiro faz bem à saúde pública”. Mas a fome dos capitalistas não pára por aí. Cada vez mais esfomeados, andam ampliando seus negócios para áreas como a saúde a um ritmo cada vez mais acelerado. Se atentarmos para as cifras da indústria farmacêutica mundial, veremos que, em 2008, faturou mais de 500 bilhões de dólares. Em 2011 o lucro passou para mais de 700 bilhões de dólares. E as cifras não param de crescer. O Brasil figura como um dos grandes consumidores de remédios. No primeiro trimestre de 2015, de acordo com a própria Interfarma, as vendas de medicamentos no varejo no Brasil aumentaram 12%, superando os 10 bilhões de reais. Confirmo isso na cidade onde moro, dado que os vendedores de remédios abrem uma farmácia nova a cada semana. Como a saúde agradeceria se fossem padarias ou livrarias! Mas não, nossas ruas estão cada vez mais habitadas por farmácias. Outro dia uma conselheira muito atenta, participando de um curso de formação, me indagou: sonhei que ficarei bilionária; se isso se confirmar, e eu te contratar como assessor de investimentos, qual seria a sua sugestão para esse dinheiro ser rentável hoje e no futuro? Sem pestanejar, retruquei: compre um banco ou um laboratório farmacêutico! Se a opção fosse o laboratório, acrescentei que deveria ter um grande gasto em marketing (em média os laboratórios gastam o dobro em marketing do que em pesquisa) e um bom discurso humanitário, até para justificar as isenções tributárias. No entanto, alertei de que não deveria se voltar para os problemas de saúde dos mais pobres, especialmente países africanos. Isso rende pouco. O ano era 2014 e a minha resposta foi corroborada pelo alerta dado pela diretora-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margareth Chan, que naquele ano criticou duramente a indústria farmacêutica em função do terrível surto de ebola em países paupérrimos da África. Enquanto o número de mortes por causa do ebola se aproximava dos 5 mil, ela alertava: "historicamente o ebola foi confinado a países africanos mais pobres. O incentivo de pesquisa e 25


desenvolvimento é praticamente inexistente. Uma indústria com fins lucrativos não investe em produtos para mercados que não podem pagar”. Se a indústria biomédica atual retorna altas fatias de lucro e promete ser ainda mais promissora no futuro próximo, ela tende a deslegitimar o discurso dos direitos sociais e da construção de Sistemas Universais de Saúde como o SUS no Brasil. Mesmo que ela se utilize do preceito constitucional da universalidade da saúde quando lhe convém, como no caso da judicialização criminosa de tratamentos e medicamentos (e com isso não afirmo que a judicialização da saúde seja um problema em si, até porque direitos exigem um sistema judiciário autônomo e atuante. Mas, o que está em questão aqui é a utilização do sistema judiciário como instrumento de lucratividade irresponsável, como mostrado há pouco tempo na imprensa brasileira). Para quem faz da saúde um negócio lucrativo, interessa que o SUS no Brasil não funcione. Quanto mais gente na fila, melhor; para isso, quanto maior o sub-financiamento, melhor. Aqui vale o ditado popular “quanto pior, melhor!”. Em muitos casos, esse sofrimento humano rende boas manchetes nos veículos de comunicação, não como crítica para melhorar o sistema, o que seria muito importante, mas para disseminar junto à população uma cultura liberal individualista de que os sistemas públicos universais, que partem do pressuposto dos direitos humanos, são inviáveis. No entanto, o SUS, muito embora tenha problemas que precisam ser enfrentados com urgência, tem qualidades inestimáveis e a opção acertada da sociedade brasileira por um sistema universal de saúde na década de 1980 já faz dele um dos seus maiores patrimônios. Mas essas qualidades tendem a ser escondidas pela imprensa e muitos prestadores e profissionais. Acompanho, por exemplo, muitas campanhas de doação de órgãos, e que são importantes para a ampliação dos transplantes. Mas poucas divulgam o fato de que a maior parte dos transplantes é feita pelo SUS. Vejo pouco sobre o eficiente sistema de vacinação brasileiro. Quase nada sobre o papel da vigilância do SUS. Pouco sobre o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) como parte integrante do SUS. A respeito, outro dia um conselheiro de saúde sugeriu, numa conferência 26


municipal de saúde, que o SUS deveria ter um serviço de atendimento móvel de urgência como o SAMU. Sua proposta era justificada diante do rápido atendimento prestado pelo SAMU à família, funcionários e os próprios apresentadores de televisão muito ricos do Brasil, que caíram de avião. Essas qualidades do SUS são deixadas no anonimato. Esta dupla estratégia, de ataque ao SUS e esconder as suas ações induzem as pessoas a terem um plano privado de saúde. Nunca é demais lembrar que o lucro dos planos de saúde em 2013 foi de 111 bilhões de reais. Meeeeeu Jesus! Se comparado ao lucro no período de 2003 a 2011, o crescimento foi próximo a 200%. A estratégia de deslegitimar e desconstruir o SUS não é de hoje. Ela vem desde o momento que o aprovamos a “duras penas” na Constituição. Desde o início, o formato da relação público-privado que adotamos na Constituição em 1988 tem se mostrado contraditório ao direito à saúde. No entanto, o que ocorre de novo nesse momento no Brasil é o tamanho da ofensiva que está sendo levada a cabo por certos setores e forças políticas para desconstruir o SUS e outras conquistas que têm tudo a ver com a seguridade social e a saúde. É assustador a quantidade de projetos de lei que estão entrando na pauta do Congresso Nacional e que violam direitos. Capitaneado pelo seu presidente Eduardo Cunha, a Câmara Federal não tem medido esforços nesse sentido. Ainda em abril, cumprindo sua promessa de campanha para a presidência da Câmara, Eduardo Cunha pôs a votação, e aprovou, o Projeto de Lei-PL 4330. Esse projeto permite que os trabalhadores da atividade-fim de uma empresa não sejam mais contratados diretamente por ela, mas por uma empresa terceirizada que terá como finalidade o lucro. O tamanho do prejuízo ao trabalhador já pode ser calculado pelos dados disponíveis: o trabalhador terceirizado ganha 27,1% a menos do que o contratado diretamente. A cada 10 acidentes de trabalho, 8 acontecem com o terceirizado. De cada 5 mortes no trabalho, 4 ocorrem com os trabalhadores terceirizados. Por isso, diferente do que os 230 deputados defendem, que votaram sim ao projeto, essa proposta não visa regulamentar os hoje 12 milhões terceirizados da atividade-meio, mas, 27


flexibilizar os direitos de 33 milhões de contratados diretamente. Pergunto a você conselheiro: esse projeto tem alguma relação com o tema da saúde? Seria o caso de termos uma faixa nas Conferências de Saúde com os dizeres: “a terceirização dos direitos dos trabalhadores faz mal a saúde”! O segundo projeto que anda a uma velocidade nunca antes vista, é o que reduz a maioridade penal. Há poucos dias foi aprovada, após uma manobra autoritária de Eduardo Cunha, em primeiro turno no plenário da Câmara, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. A aprovação desta matéria preocupa por demais os conselheiros de saúde, especialmente os jovens, que conhecem o lastimável sistema carcerário brasileiro e sabem que quem lá está são majoritariamente negros e pobres. Sabem também, que esse projeto é péssimo para esses jovens e a sociedade em geral se atentarmos para os altos índices de transmissão da AIDS dentro dos presídios brasileiros. A taxa de infecção é 60 vezes superior à taxa na população total do país. Portanto, as chances de infectação por AIDS da juventude brasileira aumentarão consideravelmente. No calor dos debates, houve deputado citando a pena de morte indonesiana como modelo eficiente de redução dos crimes envolvendo o tráfico de drogas. Insinuava ele o quê: algum projeto logo aí na frente de pena de morte aqui no Brasil? Reitero: essa aprovação tem alguma relação com a saúde? Alguma sugestão de faixa aqui? Mas a “onda reacionária” solta por aí, tem também uma proposta que pode decretar o fim do SUS como sistema universal de saúde no Brasil. É meus amigos conselheiros, é nesse estágio que nos encontramos. A PEC n. 451/2014, se aprovada, obrigará as empresas com mais de 30 trabalhadores a pagarem plano de saúde privados a todos os empregados. Eduardo e sua turma, comprometidos com os planos privados de saúde, tem como único objetivo fortalecer a saúde privada e destruir nosso SUS. E tem conselheiro que está achando que essa proposta será um avanço ao país. Outros conselheiros não estão preocupados com a proposta. A todos digo: vigiai! Afinal, a onda contra os direitos se fortaleceu nos últimos tempos e os 28


financiadores das campanhas estão “cobrando a conta”. Já foi demonstrado que Eduardo Cunha foi um dos maiores recebedores de recursos de empresas privadas de saúde no último pleito eleitoral. Estas empresas distribuíram 52 milhões de reais para 131 candidaturas, de 23 partidos políticos. Cunha recebeu só da Saúde Bradesco 250 mil reais. É por isso que propôs uma Emenda a Constituição em 2014, que anistiava as multas dos planos de saúde em 2 bilhões de reais. Ainda bem que ela foi rejeitada pela Presidenta da República. Na mesma perspectiva, engavetou a CPI contra os planos de saúde quando assumiu a presidência. Será por isso que em maio último a Câmara aprovou o financiamento privado de campanha? Está provado que a conta cobrada pelas empresas, quando financiam candidaturas, é alta, o que justificaria mais dois cartazes ao fundo dos auditórios das nossas conferências: “o financiamento privado de campanhas faz mal a saúde”; “queremos uma reforma política de verdade”! O que está em jogo, com o projeto de obrigatoriedade das empresas pagarem planos de saúde, é o direito à saúde dos brasileiros. Isso vai desobrigar o Estado a fortalecer e qualificar o SUS para todos. Por outro lado, será a oportunidade de ouro dos planos privados de saúde de expandirem os seus negócios no Brasil. Será também a oportunidade ímpar, dentre outras já existentes, para as empresas e o capital estrangeiro atuarem na assistência à saúde no Brasil, visto que agora, por conta da Lei n. 13.097/2015, esse investimento lhe foi permitido. Essa Lei, que altera a redação do art. 23 da Lei n. 8080, foi incluída pelo Congresso Nacional, quando da apreciação da MP n. 656, e sancionada pela Presidenta da República em janeiro de 2015. Num contexto biopolítico, em que os corpos e mentes se traduzem cada vez mais em “mercadoria estratégica” para investimentos do capital, é de extrema importância reafirmarmos a supremacia do direito à saúde como mecanismo de enfrentamento da exploração contemporânea. É desta constatação e princípio que decorre a defesa intransigente do SUS como sistema universal e gratuito. Defender com “unhas e dentes” a continuidade do SUS no processo da 15ª Conferência Nacional da Saúde no Brasil não 29


significa ignorar os mais diferentes problemas e limites que carrega consigo. Significa, acima de tudo, manter aceso um projeto civilizacional e de país que respeite e promova a dignidade humana. Defender o SUS significa ter como horizonte uma saúde pública de qualidade para cuidar bem das pessoas, um direito inalienável do povo brasileiro! Defender o SUS significa contribuir na luta para que a proteção social se afirme cada vez mais como direito humano em nosso país. É manter erguida a bandeira de William Beveridge (Obs: ele não era comunista, bolivariano, etc! Conhecer ou retomar as suas reflexões seria uma tarefa muito importante para os defensores dos sistemas universais de saúde e seguridade social), que acreditava ser tarefa de todo governo a luta contra a escassez, a doença, a ignorância, a miséria e a ociosidade. Beveridge nunca propôs a ruptura do regime econômico capitalista, de modo inclusive que a sua proposta tornou-se uma alternativa para continuá-lo. No entanto, num momento em que o capitalismo ataca os direitos humanos e a democracia como poucas vezes se viu, defender o Estado de bem-estar social pode significar uma ação “revolucionária”. Se essas provocações fazem algum sentido, talvez o desafio maior da 15ª Conferência Nacional da Saúde seja defender a continuidade da UNIVERSALIDADE E GRATUIDADE do SUS. De novo: isso não significa dizer que ele não precise de avanços estruturais. No entanto, o que está em questão com os ataques que vem sofrendo nos dias atuais é o seu “objetivo fundacional”, sem o qual, perderá sua identidade. A amplitude desse desafio nos remete ao espírito da 8ª Conferência Nacional da Saúde (1986). Naquela oportunidade, os delegados estavam menos preocupados em aprovar mil propostas e talvez mais centrados num propósito político mais amplo que o país demandava naquele período. Seus delegados também não tinham tanta preocupação que os termos da sua proposta, ou que o seu Município ou o seu Estado fossem contemplados e citados na redação do relatório final. Mais do que apenas participar da Etapa Nacional tinham um compromisso enorme de multiplicar as discussões em pequenas reuniões na esfera local, nas quais eram envolvidas uma multiplicidade sem fim de entidades, grupos, organizações e movimentos. 30


Esse processo foi criando um envolvimento social e um “acúmulo político” necessário para que fosse possível a aprovação do SUS na 8ª Conferência Nacional da Saúde e, alguns anos depois, na Constituição de 1988. O espírito da 8ª Conferência Nacional de Saúde pode exigir de nós conselheiros, lideranças sociais, movimentos e entidades sociais, a “reinvenção político-metodológica” das Conferências. Nesta direção, a realização das conferências livres propostas pelo Conselho Nacional de Saúde é bem vinda como contributo à mobilização nas diferentes etapas. Para além delas, outras propostas poderiam ser muito oportunas no processo da 15ª, a exemplo de uma “marcha em defesa do SUS”, de uma visita pessoal aos senadores e deputados, de audiências com o poder judiciário, etc. Talvez devamos “recuperar” com mais força a mobilização e a pressão social na defesa do SUS e da Seguridade Social, do direito humano à saúde. Apontar um desafio central para a 15ª Conferência pode soar estranho ou até anti-democrático para um período em que já aprendemos que não existem temas e assuntos permitidos ou proibidos, lutas e sujeitos mais importantes que outros. Uma democracia viva se faz fazendo e deve ser capaz de contemplar a diversidade no seu mais amplo sentido. Mas também é possível que essa rica “teia social” brasileira construa diálogos e pontes no sentido de reconhecer agendas comuns e urgentes nesse momento histórico. Portanto, CONSELHEIROS DE SAÚDE DO BRASIL, UNI-VOS! PELO SUS! PELO DIREITO HUMANO À SAÚDE!

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OS ESPAÇOS DE CONTROLE SOCIAL COMO POSSIBILIDADE DE FORMAÇÃO E O PAPEL ESTRATÉGICO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE Frederico Viana Machado¹ Gabriel Calazans Baptista² Heloisa Helena R. de Alencar³

A Política Nacional de Formação e Desenvolvimento para o SUS, deliberada e aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde em setembro de 2003 sob o título “Caminhos para a Educação Permanente em Saúde” foi formalizada, após pactuação na Comissão Intergestores Tripartite – CIT, na Portaria GM/MS nº 198, de 13 de fevereiro de 2004. Esta portaria instituiu a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, uma estratégia do SUS para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor, sinalizando um plano de ações abrangente do que terminou conceituado por Ceccim e Feuerwerker4como o Quadrilátero da Educação na Área da Saúde: formação integrada à gestão, à atenção e ao controle social dessa política setorial. Essa política buscou responder a uma demanda do campo da saúde, ¹ Psicólogo, Mestre e Doutor em Psicologia pela UFMG, professor do Bacharelado e do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva da UFRGS. Coordenador do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Criança e do Laboratório de Políticas Públicas, Ações Coletivas e Saúde. Atua na Rede Governo Colaborativo em Saúde e é Membro da Comissão de Educação Permanente do CMS/POA). ² Psicólogo, mestrando do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva da UFRGS. Atua na Rede Governo Colaborativo em Saúde e é membro da Comissão de Educação Permanente do CMS/POA). ³ Médica sanitarista, mestre em Saúde Coletiva pela UFRGS, membro da Comissão de Educação Permanente e Assessora Técnica do CMS/POA. CECCIM, Ricardo Burg e FEUERWERKER, Laura. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Physis – Revista de Saúde Coletiva, v. 14, n.1, 2004, p. 41- 65.

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que dialoga diretamente com o da educação: formação profissional em saúde alinhada às exigências que a mudança no modelo tecnoassistencial vigente desde a instituição do SUS impõe. Destaque-se que é um esforço a ser enfrentado de forma intersetorial, fomentando mudanças curriculares nos cursos de formação profissional tanto de nível universitário como técnico, mas também de estruturas abertas e adequadas à formação e desenvolvimento dos trabalhadores na rede SUS, que passa a ter também a tarefa de se tornar uma rede-escola. O desafio intersetorial está configurado no próprio princípio fundamental da Política proposta, onde a Educação Permanente em Saúde é compreendida como a “aprendizagem no trabalho, onde o aprender e ensinar se incorporam ao quotidiano das organizações e ao trabalho” . Em Porto Alegre a implantação dessa Política de Educação Permanente vem sendo acompanhada de perto pelo Conselho Municipal de Saúde e pode-se dizer que o exemplo de Porto Alegre tem sido considerado, pelos órgãos federais que coordenam essa política, um bom exemplo de ação integrada entre as Instituições de Ensino, a gestão local do SUS, o conjunto dos serviços de saúde e o controle social municipal. A participação do Conselho Municipal de Saúde, especialmente através de sua rede descentralizada (Conselhos Distritais e Locais de Saúde), tem conseguido sensibilizar, atuar e influir nas definições dos projetos de extensão e formação desenvolvidos na rede de saúde, bem como o tema do controle social passou a ser formalmente inserido nos currículos e debates acadêmicos dos diversos cursos da área da saúde. Um exemplo concreto foi a introdução de uma disciplina de 30 horas no plano de ensino da Residência Integrada Multidisciplinar em Saúde da Criança desenvolvida no Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, em parceria com a UFRGS. Esta disciplina é composta por aulas expositivas teóricas e incursões dos residentes nas atividades e reuniões dos conselhos de saúde. BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 198, de 13 de fevereiro de 2004. Institui a política nacional de educação permanente em saúde como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004.

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Disciplinas semelhantes também estão presentes em outros programas de residência, cursos de especialização e, até mesmo, nos cursos de graduação, como por exemplo, o Bacharelado em Saúde Coletiva da UFRGS. A partir desse processo de integração, o próprio CMS/POA tem sido procurado como campo de experiência tanto para alunos de graduação, como de pós-graduação. O tema do controle social e o espaço do Conselho de Saúde têm sido objeto de pesquisa, aprendizagem e experiência profissional. Já foi campo de estágio de Residência, de pesquisa cooperada com profissionais de saúde da Itália, objeto de dissertações de mestrado e teses de doutorado, de alunos do campo específico da saúde, mas também de políticas públicas. Recentemente, o Laboratório de Políticas Públicas e Ações Coletivas da UFRGS em parceria com o Conselho Municipal de Saúde, por meio da Comissão de Educação Permanente iniciaram uma pesquisa sobre os Conselhos Locais de Saúde de Porto Alegre. Tudo isto indica a relevância da participação e do controle social para a qualificação dos serviços de saúde e a diversidade de atores interessados em aprofundar e/ou compreender seus aspectos sociais e políticos. A participação social é uma marca da gestão pública no Brasil após a Constituição de 1988, a partir da qual se instaura um modelo híbrido de democracia representativa e democracia participativa na condução do processo político brasileiro. A partir de 2003, o Governo Federal passou a investir ainda mais em mecanismos de participação e consulta popular, que se tornaram parte de uma estratégia para aprimorar a gestão e ampliar a democratização do Estado . Em junho de 2003, o Ministério da Saúde cria a Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa para fomentar a participação e ampliar os espaços de relação com a sociedade. Em dezembro do mesmo ano, a 12ª Conferência Nacional de Saúde, com o intuito de aprofundar a participação social, aponta Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011. (Disponível em www.secretariageral.gov.br);

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a necessidade de se investir nos Conselhos Locais de Saúde (CLS), somandose à Resolução do CNS nº 333 de novembro de 2003 (substituída pela Res 453/2012), que regulamenta os CLS e considera que “o processo bemsucedido de descentralização da saúde promoveu o surgimento de Conselhos Regionais, Conselhos Locais, Conselhos Distritais de Saúde”. Os CLS foram tomados como uma aposta para desburocratizar, ampliar e renovar as possibilidades de relação com o usuário no campo da saúde, como parte de um conjunto de iniciativas de democratização do Estado e aprimoramento da gestão de políticas públicas. A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), especificamente, incorpora a participação dos usuários como um dos princípios fundamentais para a sua estruturação. Acredita-se que a existência de fóruns participativos na atenção básica com a presença de usuários, possibilita a qualificação dos serviços e a permeabilidade destes às demandas e necessidades da comunidade. Na cidade de Porto Alegre, paralelamente ao aumento dos investimentos em atenção básica, a partir de 2010 nota-se a aposta na ampliação e fortalecimento dos CLS nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Os planos municipais de saúde de 2010/2013 e 2014/2017 citam os CLS como necessários para a ampliação da gestão participativa, estabelecendo meta e indicador, prevendo “constituir Conselhos Locais de Saúde, Conselhos Gestores e Câmaras Técnicas em 50% dos serviços de saúde”. Dessa forma, a Comissão de Educação Permanente do CMS/POA tem se ocupado de implementar ações de educação permanente e educação popular, por meio das experiências de participação desenvolvidas em diversos territórios junto aos Conselhos Locais de Saúde, que têm se mostrado espaços importantes para a mobilização e articulação das comunidades.

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Comissão de Educação Permanente, Espaços de Formação e o Movimento em Defesa do SUS A participação social não está voltada apenas para o controle do Estado e dos governantes, ou ainda, para a comunidade que se engaja em ações coletivas de necessidade pública, tais como as campanhas contra a dengue e outros empreendimentos que exigem a mobilização da população. A participação social significa também a sociabilidade, o vínculo e a experimentação para novas possibilidades de existirmos coletivamente, o que, muitas vezes, se relaciona ao enfrentamento político e a criação de estratégias de luta. Na saúde, isto implica em aprendermos coletivamente, em ato, integrando saberes, culturas e formas de nos comunicarmos. Os espaços de participação integram um amplo conjunto de pessoas, tais como acadêmicos (lecionando, estudando ou pesquisando), trabalhadores nos serviços (aprimorando as formas de cuidado e demandando melhores condições de trabalho), gestores comprometidos (buscando avanços nas políticas públicas), ativistas de movimentos sociais e, principalmente, os usuários, que de alguma forma somos todos, mas que devem contemplar a diversidade da realidade social em que vive cada um. Esta composição é a grande beleza da participação social, pois nos ensina sobre a sociedade e sobre nós mesmos, ao buscarmos aprender juntos a superar nossas contradições, conviver e articular nossas diferenças. Não é uma tarefa fácil... Neste contexto, a Comissão de Educação Permanente do CMS/POA vem trabalhando para aprofundar e qualificar a participação e o controle social. Nas reuniões deste grupo, por acreditarmos que a mudança é permanente e que ela pode ser para melhor, temos aprendido que todos somos um pouco pesquisadores, alunos, professores, ativistas, gestores e trabalhadores: cidadãs e cidadãos comprometidos com o SUS e com a democracia. Ao longo do ano de 2016 vivemos um processo muito intenso neste grupo e que culminou na construção do Movimento em Defesa do SUS. 36


O ano de 2016 foi especialmente marcado por protestos de direita e de esquerda que polarizaram a sociedade brasileira em um processo que culminou com o dramático impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Além do impeachment, presenciamos com consternação fatos como a aprovação da “PEC 55”, que compreendíamos como parte de uma estratégia de governo que traria muitos prejuízos para a saúde, sobretudo para aqueles que mais precisam do SUS. Na Comissão de Educação Permanente, ao longo deste processo, intensificamos nossas discussões sobre a necessidade de mobilização das comunidades e sobre a importância de articularmos os diferentes movimentos e frentes de luta da saúde em um movimento unificado que pudesse denunciar e pressionar contra retrocessos no campo da saúde. Assim, a partir de um espaço institucional de participação, que é o CMS, chamamos uma reunião ampliada no dia 30 de maio de 2016, para a qual convidamos todos os interessados em lutar pela saúde e pela democracia. O auditório do CMS estava lotado, com representantes de sindicatos, de movimentos sociais, ativistas, estudantes e trabalhadores da saúde. A primeira ação que construímos foi um ato em defesa do SUS e contra a aprovação daquela que concordávamos ser a “PEC da morte”. Com recursos dos próprios participantes, imprimimos folders e um manifesto, que foram elaborados coletivamente. O ato se deu no dia 02 de junho, com oficina de cartazes pela manhã e concentração em frente ao Hospital de Pronto Socorro no Largo Leopoldo Hertzl, às 15 horas. Durante o ato distribuímos panfletos nas sinaleiras, conversamos com os transeuntes e, às 17 horas, partimos em marcha até a esquina democrática com faixas e cartazes, sempre buscando conversar com a população sobre as consequências da PEC para a saúde. Outros atos semelhantes foram organizados em seguida, nas imediações do Hospital Conceição, da Santa Casa e no terminal da Av. Bento Gonçalves. Buscamos nos organizar para participar das marchas pelo Movimento Fora Temer reunidos em um “bloco da saúde”, levando nossos “pirulitos” e cartazes. Também organizamos diversos “abraços” aos serviços de saúde 37


(US Vila Floresta, CAPSi Harmonia, US Belém Velho, US Conceição, Consultório na Rua GHC, Escola GHC, Geração POA, US Guarujá, US Jd Leopoldina, PACS, SAMU, Hospital Sanatório Partenon, US Santa Tereza, US Santo Alfredo, SRT Nova Vida, US Osmar Freitas, US Vila Cruzeiro, US Vila Gaúcha, Hospital Conceição, SMS), fazendo eco a um movimento nacional mais amplo – AbraSUS. Em roda, em diversos atos, nosso colega Brígido Ribas leu o Manifesto: Declaração de Amor ao SUS, e muitos puderam se manifestar sobre os acontecimentos políticos contra os quais estávamos lutando, aportando suas experiências pessoais, trocando informações e ideias para avançarmos. Nestas ações, mesmo em tempos tão individualistas e reacionários, é fantástico observarmos como o SUS ainda é capaz de gerar sentimentos de pertencimento e união, que faz parte da identidade de muitos cidadãos, o que nos motiva a seguir defendendo uma saúde pública de qualidade. É emocionante fazer parte de um grupo que grita junto a plenos pulmões: viva o SUS! A despeito das diferenças na conjuntura política de hoje, vemos que problemas como os anseios privatistas, o subfinanciamento, o burocratismo e o engessamento estatal que sempre foram pontos de tensão para o aprimoramento do SUS, estão mais fortes que nunca e seguem demandando enfrentamento político. Em uma das assembleias do movimento estiveram presentes outras iniciativas de agregação, como o Fórum Sanitarista Gaúcho, e pactuamos um movimento de articulação chamado #ocupasusrs. Foram feitas camisetas do #ocupasusrs, novas reuniões, discussões, debates e integrantes deste coletivo realizaram uma peça de teatro e outras intervenções artísticas para conscientizar e sensibilizar a população contra as ameaças aos direitos sociais e os interesses políticos em disputa. O termo “ocupação” se renova como estratégia de luta em um contexto no qual têm sido ocupadas escolas, universidades e órgãos governamentais, dentre outros espaços significativos para o interesse público. Interessante ressaltarmos que a estratégia não é nova. No volume anterior desta série, duas ocupações importantes estão citadas na luta pelo 38


SUS em Porto Alegre: a do Postão, em 1988; e a do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, em 1991. Assim, as Ocupações, como estratégia de luta, desde 1988, estão presentes na gramática política da luta pela saúde na cidade. É interessante notarmos como o termo "invasão" já aparecia nas reportagens da época, como forma de desqualificar estas formas de protesto da população. O contraste entre ocupar/invadir tensiona os sentidos acerca do que é público e do que é privado, no cerne da politica, como forma de repensar a sociedade e como a construímos coletivamente. "A alegria, garra e muita vibração”, ontem e hoje, são aspectos existenciais e indentitários da participação e dos processos grupais envolvidos. As pessoas se divertem, se empolgam e se emocionam, e isto não é incompatível com a luta política. A luta política também é feita de afetos, afetada, e é com estas festas que abrimos frestas na dureza do cotidiano para enfrentar os retrocessos e buscar mudanças sociais e institucionais. As renovadas formas de ocupação têm mostrado a complexidade do fazer político, a importância de renovarmos nossas estratégias de luta e enfrentarmos nossas contradições e as dificuldades para articularmos nossas demandas e ideologias em movimentos menos fragmentados, sem que percam o contato com a diversidade das formas de viver e pensar que se produzem no cotidiano dos diferentes espaços sociais. Neste sentido, uma ação conjunta importante em que estivemos envolvidos foi a organização da Festa Junina do SUS, realizada no Largo Glênio Peres, no dia 24 de junho de 2016, que contou com jogos bem humorados e com teor político, como a pescaria e o “bocão” com fotos de políticos envolvidos nos ataques aos direitos sociais. Rimos, dançamos, brincamos e demos nosso recado no microfone, e aproveitamos para distribuir materiais e conversar com quem passou por lá. A criatividade política é o grande desafio! Seguimos, em tempos de vertiginosa informação, com nossos cartazes, manifestos, passeatas, ocupações, pra fazer valer leis e regras e para desafiá-las quando forem injustas. Fomos criando junto, coletivamente e o espaço da Comissão de Educação Permanente foi fundamental. 39


Descrevemos aqui apenas algumas das ações que foram realizadas em 2016 e que trouxeram força e empolgação para não nos desmobilizarmos e seguirmos acreditando em melhorias sociais. É claro que este caminho esteve atravessado por dificuldades e por muitas derrotas: teve golpe, teve PEC, Temer não caiu fora, etc. Entretanto, conhecemos o percurso da luta pela saúde e sabemos das dificuldades para as construções coletivas de longo prazo. São empreendimentos que requerem muito trabalho e uma forte capacidade de organização para integrar amplos setores da sociedade. O desafio é ainda maior no momento atual, marcado pela crescente especialização e fragmentação dos processos de trabalho, que afetam nossas identidades, proliferando mais as nossas diferenças do que nossos espaços de igualdade, nossas comunidades, secundarizando o que temos em comum. Os tempos nos deixam perplexos, ainda mais quando nos damos conta de que nossas mazelas são globais, como aprendemos com os visitantes internacionais, sobretudo italianos, que vieram participar de atividades da Comissão de Educação Permanente e dos Conselhos Locais de Saúde. A globalidade da luta nos remete a nossa condição humana, condição de sermos humanos em um mundo no qual as coisas parecem ganhar autonomia. As tecnologias nos empoderam frente a realidade, mas dificultam nossos projetos coletivos mais amplos. Na Comissão de Educação Permanente queremos desconstruir o discurso desencantado de que é um equívoco nos guiarmos por utopias, de que não podemos sonhar, de que devemos nos conformar com as regras do jogo e não questioná-las. Em outras palavras, queremos desconstruir a ideia de que a política pode ser reduzida à gestão, como se o Estado fosse uma empresa nos moldes capitalistas. Queremos defender a ideia de que alguns valores, sobretudo a saúde, não são mercadorias. Isto nos faz lembrar que a participação nos conselhos não é apenas uma questão de fiscalizar e aprovar processos burocráticos, mas são também espaços de construção, são lugares para organizar a população e articular diferenças multiplicando afetos e construir ações coletivas que 40


extrapolem estes espaços institucionais. As ações que construímos pretendem fazer parte da formação cidadã, em escolas de democracia que, em ato, assim como a Educação Permanente, se faz com os saberes de todas as pessoas e comunidades envolvidas, sobretudo aquelas que historicamente têm sua voz abafada e deturpada pelos meios de comunicação. Dar voz para as experiências que a mídia esconde e que atualmente são deturpadas em seus conteúdos e práticas por um senso comum reacionário que simplifica as demandas sociais e naturaliza as relações de opressão. Por esta razão, essas vozes são fundamentais para a compreensão do processo histórico que atravessa nossas instituições e construções coletivas. Assim, na Comissão de Educação Permanente, estamos retomando a noção de participação, não como elemento externo que irá apenas avaliar e legitimar os fluxos burocráticos e as diretrizes estabelecidas, mas sim, como construção coletiva inseparável das políticas públicas e do exercício da cidadania.

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I MOSTRA DO CONTROLE SOCIAL DE PORTO ALEGRE EXPERIÊNCIAS EXITOSAS CONTADAS EM OFICINAS LITERÁRIAS

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No dia 9 de abril de 2016, por ocasião da comemoração do Dia Mundial da Saúde, o CMS realizou, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, a I Mostra do Controle Social de Porto Alegre, evento que ocorreu no Largo Glênio Peres durante todo o dia. Para a Mostra foram inscritas e apresentadas 10 experiências exitosas que têm o protagonismo dos espaços descentralizados de controle social – Conselhos Locais, Conselhos Gestores e Conselhos Distritais de Saúde. O objetivo principal foi dar visibilidade a esse “movimento” que é coletivo, criativo, afirmativo e construtor de cidadania. Ao mesmo tempo tinha o objetivo de difundir e divulgar para o público em geral a diretriz da participação social como fundamento estruturador do Sistema Único de Saúde. Esse evento foi avaliado como muito positivo pelo conjunto de pessoas que dele participaram, e motivou, pelo seu conteúdo e significado, a inclusão dessas experiências no capítulo central desse livro. Para o relato das experiências foram organizadas oficinas literárias, cuja metodologia implicou a produção da escrita pelos próprios envolvidos na experiência, a partir de suas vivências e compreensão singular dos fatos. Contou-se, para o desenvolvimento dessa metodologia, com grupo de pesquisadores e apoiadores vinculados à Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.

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Sobre a metodologia desenvolvida, dentro dos princípios que fundamentam a educação popular, objetivou-se, primeiramente, desconstruir a ideia de escrita como atributo intelectual formal, isto é, afirmar a potencialidade criativa individual e coletiva, através de dinâmicas lúdicas que ensejaram o brincar com as palavras e expressões, construindo coletivamente textos que permitiam traduzir sentimentos, ideias, conceitos. A partir dos exercícios lúdicos, se trabalhou com temas norteadores para o relato, que tinham como propósito provocar a reflexão sobre os objetivos, particularidades e resultados das experiências. Esse momento foi primeiramente exercitado em grupos, onde se misturaram os participantes de diferentes experiências, e onde se debateu apenas uma delas, para a experimentação dos demais, permitindo que, num momento posterior, cada grupo pudesse se debruçar sobre o seu próprio relato.

Momento inicial de exercícios lúdicos com palavras

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As questões norteadoras trabalhadas nos grupos foram:  O que é inovador na experiência? (o que mobilizou, qual foi o marco

que iniciou o processo);  Qual a formação e habilidades dos envolvidos no processo?  Qual a mudança nos processos de trabalho ou impacto na comunidade / políticas?  Qual a avaliação/reflexão feita sobre o processo?

Facilitadores das oficinas: Francyne da Silva Silva , Frederico Machado, Gabriel Calazans Baptista, Heloisa H. R. de Alencar, Jéssica Brandt da Silva, Loreni Lucas, Marisa Martins Altamirano e Mirtha da Rosa Zenker.

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GRUPOS DE PROMOÇÃO DE SAÚDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O FORTALECIMENTO DO CONTROLE SOCIAL A Unidade de Saúde (US) Santo Alfredo, vinculada à Gerência Distrital Partenon/Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, municipalizada em 2009, passou à Equipe de Saúde da Família em 2011, e é uma Unidade de Saúde com equipe multidisciplinar, que recebe alunos e residentes da área da saúde. Em 2011 foi constituído o Conselho Local de Saúde, atendendo à legislação, propositivo, consultivo e deliberativo, com a finalidade de exercer a participação e o controle social pelos usuários, buscando estratégias, propostas e planejamento, o acompanhamento, fiscalização e avaliação dos serviços prestados pela US Santo Alfredo, além da articulação entre comunidade, demais instâncias de participação e gestores da saúde.

Equipe e usuários da US Santo Alfredo

No mesmo ano foi formado o primeiro grupo de usuários, cujo nome foi escolhido pelos próprios membros como Hiperdia, se transformando em grupo Hiperdia Renovação, para trocas de experiência em saúde e qualidade de vida de hipertensos e diabéticos. 47


O grupo Hiperdia foi ideia de trabalho de alguns trabalhadores que já tinham essa experiência prévia. Convidaram os usuários e fizeram folhetinhos para distribuir aos pacientes nas consultas médicas. Mais tarde, o grupo cresceu tanto que precisou ser transferido para outro local da comunidade, pelas dinâmicas que eram utilizadas. Conseguiram com o Centro Infanto, vinculado à Igreja Católica, apoio para a realização do grupo, que continua com bastante participação. Os participantes desenvolvem vínculos de amizades. Na unidade de saúde há um mural do grupo, que divulga as atividades e oficinas desenvolvidas e que estimula a prática. Todas as atividades são organizadas e definidas pelo grupo, o que contribui para a manutenção do interesse e participação. As atividades são registradas em fotos, que decoram o mural e produzem um sentimento de pertencimento. Uma das usuárias criou até um grupo no Facebook para divulgar as atividades do grupo. Outra estratégia de mobilização e fortalecimento, são os convites para participação em atividades fora da Unidade. Posteriormente, foram formados outros dois grupos de usuários: o de Caminhada e o grupo Qualidade de Vida, este de convivência baseado na confecção de artesanato. O grupo QV tem como peculiaridade o fato de que ocorre na casa de um casal da comunidade. Foi constituído a partir da participação de uma trabalhadora da US, que recebeu capacitação em Saúde Mental na AB. Elaborou o projeto e apresentou na US. A proposição do grupo é que pode funcionar inclusive sem a presença de um profissional de saúde, buscando a autonomia do grupo. O grupo se dedica ao artesanato, que media a conversação sobre diversos assuntos e é complementado por um momento de lanche e descontração. Todos os trabalhos artesanais feitos no grupo são utilizados para decorar a Unidade nos eventos e também para ornamentar os brindes que são oferecidos. Toda a equipe de trabalhadores e usuários fazem doaçoes de materiais para a manutenção deste grupo. O grupo ganhou autonomia e se propõe a mudar o endereço na comunidade para ampliar a experiência. O grupo da caminhada ocorre duas vezes por semana, coordenado por ACS, na quadra do colégio Murialdo. Este grupo também tornou-se referência no sentido de promoção e prevenção às doenças crônicas. 48


Evento Saúde da População Negra

A US Santo Alfredo tornou-se referência para a comunidade da região como espaço coletivo de acolhimento. A equipe de profissionais da US desenvolve seu trabalho próximo à comunidade, com quem estabeleceu fortes vínculos. Os profissionais participam dos grupos de usuários em vá rios momentos, atuando na perspectiva da autonomia destes, por meio de oficinas, oportunizando a vivência e busca da qualidade de vida. Cada grupo existente tem um profissional vinculado, sempre em concordância com todos os membros da equipe da US, inclusive da coordenação. Reconhecendo o empoderamento dos usuários como agentes de conhecimento, sabedoria e vivência, possibilitou-se a realização conjunta do projeto referente à Saúde da População Negra, em 2013, entre equipes e usuários membros dos grupos, levando temas como anemia falciforme, hipertensão arterial, cultura religiosa, pratos típicos afro-brasileiros. A partir desses temas, ocorreu o primeiro evento organizado em conjunto com a comunidade local, na sede do Guarani (time de futebol do bairro), local onde funcionará a futura instalação da US Santo Alfredo. O Conselho Local de Saúde, o Conselho Distrital de Saúde e o Conselho Muncipal de Saúde se mantém atuantes frente às negociações judiciais para a construção do novo prédio. 49


Sempre com o objetivo de estimular a participação social e a cidadania dos usuários da US, a participação dos membros dos grupos ocorre de forma ativa, na elaboração, desenvolvimento e trabalho voluntário nas atividades e eventos promovidos pela US, tais como Dia da Mulher, Bolsa Família, Outubro Rosa, Dia da Criança, Saúde da população Negra. Na US Santo Alfredo criou-se essa estratégia considerada inovadora A participação social tem sido de grande valia, mobilizando a comunidade, motivando o envolvimento de mais usuários, crescendo e tornando-se mais ativa a cada evento, tanto em termos de propostas como em ações práticas: auxilio na cozinha, brechó, organização das crianças, divulgação dos grupos da Unidade nas oficinas com bolinhas, de confecção de bonecas abayomi, doação de brindes, alimentos, brinquedos, voluntários de danças, música, pipoqueiro, brinquedos de recreação, escola infantil, escola de embelezamento, cultura africana. O sucesso desse trabalho é possível por meio da mobilização da equipe de profissionais, do Conselho Local de Saúde e dos usuários. Este trabalho vem se destacando ao olhar da comunidade, reforçando o vínculo equipe da US e comunidade. Levando em consideração que o desafio sempre foi a motivação para a presença dos usuários nas reuniões do Conselho Local de Saúde, tal experiência torna-se exitosa, visto que, atualmente utiliza-se dos espaços dos grupos de usuários e de suas atividades para motivar e sensibilizar a participação de mais usuários no controle social e desta forma fortalecer as ações do Conselho Local de Saúde da US Santo Alfredo. Responsáveis pelo relato: Jandira Rohers Santana Helena Rodrigues

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AÇÃO DO CONSELHO LOCAL CHÁCARA DA FUMAÇA O Conselho Local de Saúde (CLS) da US Chácara da Fumaça, antigamente chamado Conselho Gestor, vem funcionando desde seu primeiro ano de atividades, em 1995. De lá, até hoje, vários foram os protagonistas de sua história, vários trabalhadores, gestores e usuários que deixaram sua contribuição junto a esta instância de participação e controle social. No intuito de manter vibrante a participação e atividade do Conselho Local da US Chácara da Fumaça, seus trabalhadores sempre fomentaram a presença dos usuários e tentaram articular diálogos com as mais diversas manifestações de lideranças existentes no território da unidade. Teve papel fundamental a articulação do médico clínico geral da unidade, o qual sempre pautou a importância de se manter o Conselho Local ativo e que sempre se relacionou de forma horizontal com todos da comunidade. Dessa forma, durante uma reunião do Conselho, houve amplo debate sobre quais formas poderiam ser implementadas para o incentivo a novos integrantes junto à sua coordenação, tendo-se em vista a iminência do período de nova eleição e a saída de participantes de longa data para assumirem outras atividades. A proposta vencedora foi a de, em primeiro lugar, realizar-se um encontro para discutir-se o que é “Controle Social em Saúde”, afinal, especulava-se que a maioria não tinha conhecimento desse tema. Para tanto, nesta reunião foram escolhidos os ativadores dessa ação: alguns i n t e g ra n t e s f i c a ra m e l e i t o s p a ra o rga n i za re m u m a a ç ã o educativa/reflexiva dialogada com a comunidade, enquanto outros foram designados para definir o local (fora da Unidade de Saúde) e dia e horário que favorecessem mais a participação de usuários do território. Dessa forma, após a definição de data e local, foi iniciada a divulgação da atividade com antecedência. Os recursos foram desde o ‘boca a boca’ durante salas de espera e términos de consultas, até a entrega de ‘mosquitinhos’ com o convite para irem participar do encontro na 51


Associação de Moradores próxima à Unidade de Saúde. Pensando-se na necessidade de maior tempo livre para os usuários, foi marcado um sábado à tarde para a realização da atividade. Chegado o dia, lá estavam presentes dois trabalhadores da US Chácara da Fumaça, uma moradora já participante do Conselho Local e outras cinco pessoas convidadas que se interessaram e vieram contribuir e conhecer mais sobre o tema proposto. A experiência foi muito positiva. Seguiram-se posteriormente outros encontros, nos quais os participantes, em maior e menor número, mobilizaram diversos assuntos de seu interesse como cidadãos, elucidaram dúvidas a respeito do papel dos conselheiros de saúde e dos conselhos, trouxeram questionamentos sobre prevenção em saúde, preocupações como a epidemia de dengue e com os mananciais de água, até mesmo sobre o que se fazer diante da crescente onda de violência no bairro. Foi a partir dessas discussões que se estabeleceu um dia de caminhada na comunidade para que juntos, trabalhadores e usuários, visitassem as casas e esclarecessem as pessoas da comunidade sobre a importância dos cuidados de prevenção a criadouros de mosquitos.

Oficina de discussão sobre controle social na saúde

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Tais encontros foram fundamentais para aproximarem mais as pessoas junto ao tema da Saúde, para que pudessem inclusive constatar que a saúde não é simplesmente a ausência de doenças, que envolve circunstâncias e momentos pessoais e também das comunidades nas quais estamos inseridos. Assim, apropriaram-se mais do papel do Controle Social e tiveram, de saída, maior motivação para se fazerem presentes nas reuniões do Conselho Local. Aproveitando esse verdadeiro “despertar”, foi aberto o período eleitoral de inscrição de chapas para o núcleo coordenador do Conselho Local da US Chácara da Fumaça. Pela primeira vez em muito tempo, se não realmente de forma inédita, tivemos a inscrição de duas chapas concorrentes. O dia do pleito foi de muita festa junto à Unidade, sem haver animosidade entre os candidatos. Ao final, a chapa vencedora fez de pronto o convite para que os demais integrantes continuassem a participar das reuniões e viessem contribuir com sua visão e motivação para mais melhorias junto aos serviços da Unidade. Pode-se constatar que a ação desenvolvida foi capaz de incrementar maior participação num primeiro momento, principalmente por aproximar trabalhadores e usuários fora da rotina de atendimento e por propor discussões mais amplas abordando a saúde de forma indireta. A atividade repercutiu na renovação do núcleo de coordenação do CLS e na troca do dia e horário dos encontros. Acreditamos que essa experiência é motivadora de novas ações para esclarecimentos e mobilização de mais atores para o Controle Social em Saúde. Responsáveis pelo relato: Arisson Rocha da Rosa Jair Gonçalves

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PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO CLS NOSSA SENHORA APARECIDA A experiência exitosa da Unidade Nossa Senhora Aparecida (USNSA) foi a grande participação da comunidade nas eleições do Conselho Local de Saúde. Essa mobilização da comunidade surpreendeu os membros da equipe de saúde e dos conselhos Distrital e Municipal. Ao refletir sobre o porquê desse envolvimento pode-se citar um pouco da história do local e das pessoas envolvidas. No entendimento dos conselheiros do CLS NSA essa experiência é fruto do processo histórico dessa comunidade, que desde sua origem tem se organizado por busca de melhorias de condições de vida e de direitos. Na década de 70 a vila foi aos poucos sendo ocupada e, na época, chamava-se “vila caiu do céu”, devido ao seu rápido surgimento. Nos anos seguintes, uma série de conquistas como a pavimentação das ruas, a regularização dos terrenos, criação de um espaço para Incubadora Popular Zona Norte, a criação da cooperativa UNIVENS e a construção de uma creche comunitária foram alcançadas com a organização da comunidade através da Associação de Moradores e participação no Orçamento Participativo. Também faz parte do processo histórico da comunidade disputas acirradas em processos eleitorais da Associação de Moradores. Em 1º de julho de 2015 foi realizada na USNSA a primeira eleição para o Conselho Local de Saúde de acordo com as diretrizes do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre. Houve duas chapas inscritas, cada uma delas com quatro representantes dos usuários e dois dos trabalhadores da Unidade de Saúde. Foi realizada ampla divulgação por parte das duas chapas. Os candidatos conversaram e informaram sobre as eleições, bem como as propostas da chapa, diretamente em visitas às casas dos moradores. O envolvimento e capacidade de comunicação foram muito importantes e determinantes para a massiva participação no processo eleitoral. No dia da eleição, compareceram 443 eleitores no horário da votação das 8h às 17horas. Percebe-se que esse volume expressivo de 54


eleitores pode ter relação com os diferentes projetos de cada uma das chapas e da necessidade dos moradores terem representantes com quem se identifiquem. Foi eleita a chapa 1. Desde então, o Conselho Local da USNSA vem realizando várias ações e discutindo temas relevantes com a equipe de saúde: o acolhimento de todos os pacientes, sem número restrito de fichas, conquista de terreno para construção de uma academia de saúde para a comunidade, entre outros. O Conselho Nossa Senhora Aparecida vem buscando envolver cada vez mais a comunidade local na discussão por melhorias tanto do ponto de vista da saúde quanto das condições de vida em geral, e trazer a expressiva participação das eleições para as decisões do dia a dia. Responsáveis pelo relato: Roberta Garcia Vanda Costa

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ATIVAÇÃO DO CONSELHO LOCAL DA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE MORRO SANTANA A Unidade Básica de Saúde Morro Santana teve seu Conselho Local constituído em 2004, onde fizeram parte da primeira gestão a Senhora Maria Luisa Gomes Barão e o Senhor João Carlos Marques da Fontoura. Por alguns anos ficou desativado o Conselho, e a proposta definida pela Secretaria da Saúde de mudança de UBS para USF fez a comunidade se unir para reativar o Conselho Local, pois só com ele se poderia lutar formalmente para que não houvesse a mudança. A comunidade não queria a transformação, porque quando a Secretaria fez a proposta, alguns membros da comunidade foram conhecer postos que haviam optado pela transformação, concluindo que não seria bom para nós. Além disso, como a população atendida é composta de muitos idosos, se estabeleceram vínculos de amizade e carinho com os médicos e enfermeiros pela antiga convivência. A comunidade não queria que esses vínculos se perdessem. A iniciativa foi da comunidade. A população procurou a Maria Elisabete Oliveira e Mirtes M. Ecker Aguiar, que são Lideres Comunitárias, entre outros lideres. O Senhor João Carlos, um dos Conselheiros mais antigos sempre convidava Elisabete para participar do Conselho, e a partir dessa motivação pessoal ela se envolveu, convidando mais usuários. A Coordenação do Posto e os trabalhadores também se envolveram. Houve então a integração nas ações entre Líderes Comunitários e os trabalhadores do Posto. Em uma reunião do Conselho Distrital de Saúde Leste, em que compareceu o Secretário Adjunto da Saúde, houve um ônibus lotado com a comunidade da região. O secretário explicou como seria a transformação do Posto de UBS para USF, e não foi aceito, foi muito bonita a manifestação, a reação maciça da comunidade. Estavam presentes lideres, representantes e a comunidade usuária da UBS Morro Santana de toda a região. O Secretário se manifestou dizendo que não desrespeitaria a vontade do povo, mas para isso acontecer deveria estar ativo o Conselho Local. 56


Desta forma então, foi feita a eleição do Conselho com uma enorme participação da comunidade, e com isso foi reativado o Conselho Local. Para reforçar a decisão da não transformação foi feito um abaixo assinado com mais de mil assinaturas e a ata, que foi entregue ao Secretário na reunião do Conselho Municipal da Saúde, na Faculdade de Economia da UFRGS. Muitas polêmicas incentivaram as pessoas a participar. Essa experiência foi possibilitada pela união e credibilidade de melhorias na Saúde. A partir disso houve maior integração nas ações, entre trabalhadores e comunidade. O Conselho Local teve papel fundamental em ações como: Inauguração da sala do aconchego mãe e bebê, implantação do acolhimento, informatização (prontuário eletrônico), semana do idoso, semana da consciência negra, ações contra a dengue nas comunidades, seminários, fóruns, oficinas, reconhecimento dos territórios, reuniões com a Gerência Distrital de Saúde, reuniões com Secretário da Saúde reivindicando as necessidades do Posto. Atualmente nos reunimos toda última segunda feira do mês no posto (Conselho Local), fazemos também a confraternização de final de ano.

Processo Eleitoral do Conselho Local e Inauguração da Sala do Aconchego Mãe-Bebê

Responsáveis pelo relato: Maria Elisabete Oliveira Mirtes M. Ecker Aguiar João Carlos M. da Fontoura Lisiane Joaquim Lília Silva Paz

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VILA GAÚCHA, UM BOM LUGAR A poesia do cotidiano – o SUS que dá certo! “Vocês que fazem parte dessa massa Que passa nos projetos do futuro É duro tanto ter que caminhar E dar muito mais do que receber E ter que demonstrar sua coragem À margem do que possa parecer E ver que toda essa engrenagem á sente a ferrugem lhe comer Êh, oô, vida de gado Povo marcado Êh, povo feliz!”

Avistar a cidade de Porto Alegre desenhada pela margem do rio Guaíba e pintada pelo sol traz beleza ao dia de uma forma que poucos cidadãos têm a oportunidade de vivenciar. Cercado a esse cenário está a Vila Gaúcha, comunidade com cerca de 2.500 habitantes, local onde é desenvolvido o Programa Comunitário do Hospital Mãe de Deus, no acesso 4, na Rua Dona Maria n. 50, no coração do Morro Santa Tereza em Porto Alegre. O líder da Associação de Moradores da Vila Gaúcha, Darci Campos dos Santos relata que a Vila Gaúcha existe há mais de 60 anos, ele conta que é morador da Vila Gaúcha há 33 anos e que fizeram um mutirão para construir o “ postinho” , com a ajuda de muitas mãos Darci ressalta que não são “invasores”, e que a luta é de todo o povo em dar visibilidade a esse lugar e lutar contra a invisibilidade, dando ênfase ao compartilhar sua experiência de luta por regularização fundiária. Presidente da Associação de Moradores há 14 anos, ele conta que as mobilizações se intensificaram após uma ação de despejo recebida em 2010, quando o então governo buscava privatizar a área e remover as famílias desse local. Segundo Darci, a luta por essa terra foi muito difícil, mas todos se uniram para mostrar a existência de pessoas nesse local, que até então eram “invisíveis”, e mesmo com todas as dificuldades ¹Zé Ramalho. Em “Admirável Gado Novo”

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conseguiram a retirada do projeto, e continuaram a luta pelo reconhecimento e avanços para a Vila Gaúcha, como asfalto nos acessos e regularização da energia elétrica. Darci conta que a luta continua pela regularizaç ão da água e esgoto, e destaca: “ Vila Gaúcha pra mim é minha vida, a Vila Gaúcha é tudo, criei nove filhos nesse lugar, a Vila Gaúcha é maravilhosa, eu vou morrer aqui!” A Unidade Básica de Saúde: “Devemos persuadir-nos que hoje não basta o que bastava tempos atrás. Tempos novos, novas realizações; novas chagas, novos remédios...”. Scalabrini

A Associação Educadora São Carlos (AESC) – Hospital Mãe de Deus (HMD), dentro da sua missão institucional e de responsabilidade social junto às comunidades que atua tem sempre seu olhar atento às populações migrantes e vulneráveis. Assim, a AESC – HMD juntou-se à Associação de Moradores da Vila Gaúcha, com a colaboração da Secretaria de Saúde e Meio Ambiente/RS, iniciando a construção do Posto de Saúde Irmã Maria Jacomina Veronese, sendo inaugurado em 15 de agosto de 1986, hoje Unidade Básica de Saúde Vila Gaúcha (USB VG). A UBS VG, composta por médico de família e comunidade, enfermeiro, técnicos de enfermagem, porteiro e higienizadora, atende demanda espontânea oriunda da área circunscrita e determinada pela Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura de Porto Alegre (SMS/PMPA), sendo responsável por um total de vinte e cinco ruas, que incluem a comunidade da Vila Gaúcha e mais uma área de classes sociais mistas (alta, média-alta, média, média-baixa). Atende-se entre 840 pacientes/mês, gerando um total de 1.500 procedimentos/mês. No âmbito do SUS no município a UBS pertence à Gerência Glória/Cruzeiro/Cristal da SMS/POA. Com horário de funcionamento das 8h às 17h de segunda a sexta-feira.

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Participação Comunitária e o Controle Social: “A gente tem que sonhar, senão as coisas não acontecem.” Oscar Niemeyer

Em 2012 a UBS deu inicio as “conversas comunitárias”, ao ar livre, no pátio ao lado da Unidade, embaixo de uma á rvore e com o convite para tomar um chimarrão e pensarmos juntos sobre o território vivido, a saúde, os saberes múltiplos a partir da vivência e realidade de quem vive as vicissitudes da vida. A partir das conversas e entendendo as reais necessidades da população e atendendo a um pedido da Gerência de Saúde sobre a importância de possuir um arranjo de controle social legalmente estruturado na UBS, constituiu-se em 22 de maio de 2013 o Conselho Local de Saúde da Vila Gaúcha. A constituição desse espaço garante a efetiva participação da população e controle social sobre a gestão do SUS na mobilização da luta por seus direitos. Em 2014 destaca-se a reivindicação e aprovação da vinda de Agentes Comunitários de Saúde que culminou na abertura de processo seletivo para o cargo. Bem como o processo de aprovação e acompanhamento da obra para as melhorias na UBS, na sala médica e sala de enfermagem. No ano de 2015 a equipe da Unidade Básica de Saúde com o apoio do CLS apresentou o relatório de atividades da UBS no Conselho Distrital GCC. O relatório é apresentado no Conselho Distrital anualmente, composto por membros (trabalhadores da gerência distrital, trabalhadores dos serviços de saúde e usuários da saúde), que avaliam as ações desenvolvidas com o público beneficiário e as experiências no Sistema Único de Saúde. O relatório da Unidade foi aprovado por unanimidade, sendo reconhecido como um serviço de referência ao atendimento humanizado. 60


Uma das experiências apresentadas no relatório foi o fortalecimento do Conselho Local de Saúde e a parceria com a Associação de Moradores da Vila Gaú cha. O presidente da Associação é co-participante no processo de ingresso dos profissionais que trabalham na Unidade, apresentando e contextualizando o território da Vila Gaúcha, através da caminhada orientada, guiada pelo presidente. Os profissionais aproximam-se da realidade, podendo ver e ouvir as demandas no campo da saúde dos moradores e por fim identificando o profissional que apresenta maior empatia com a população atendida. Além desse “ olhar sensível” , essa metodologia estimula a liderança a ser partícipe de todo o processo.

2013 – Constituição do Conselho Local de Saúde

Em abril de 2016 o CLS desafiou-se a apresentar essa experiência na I Mostra de Controle Social do Conselho Municipal de Saúde. A experiência relatada traz a importância de construir espaços coletivos a partir de ações coletivas e utilizando um dispositivo para a aproximação dos profissionais que ingressam no serviço com o território, por meio da caminhada orientada em parceria com a Associação de Moradores. A caminhada possibilita aos profissionais circularem no território e vivenciar a dinâmica de vida dos usuários aproximando-se da realidade, criando empatia e vínculo. Esse dispositivo faz com que o CLS faça parte do processo de corresponsabilidade partindo-se da premissa de uma construção coletiva: com a comunidade e não para a comunidade. “Essa experiência da caminhada para mim é muito importante por que significa que a gente existe dentro da comunidade“ destaca líder comunitário Darci, ao falar da experiência. Membro do Conselho local há três anos, ele conta que aprendemos na convivência com o outro, “a sobrevivência não se aprende na faculdade, em quatro paredes, mas sim no dia a dia, no meio da comunidade, com as pessoas que vivem ali, o que ela come, o que 61


não come, o que bebe, como vive, como não vive, como é a saúde, por isso é importante as pessoas, os médicos, enfermeiros, todos caminhem dentro da comunidade e conheçam o dia a dia, como aquela comunidade vive”. Compreende-se que a territorialização é base para o trabalho na atenção básica, para além do espaço delimitado geograficamente, mas sim pelo viés de uma abordagem territorial, que potencializa o território como “ espaço habitado”, fruto da interação entre homens, síntese de relações sociais, a partir da leitura da realidade, do espaço aonde as pessoas vivem, trabalham, cultivam suas crenças, seus saberes, suas práticas e cultura local. É a partir da vida cotidiana que se constrói a atenção e o cuidado integral, considerando as singularidades e os limites do território.

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Apresentar esse trabalho é apresentar para nós, moradores e trabalhadores, o SUS que dá certo, quando se constrói pelo coletivo. Outro reconhecimento em 2016 foi a premiação com a experiência inovadora “Um olhar ampliado à comunidade da Vila Gaúcha” na II Mostra da Atenção Básica de Porto Alegre. Essas conquistas são frutos de campo fértil que é a Vila Gaúcha, campo de semeadura de sonhos, de lutas, de construção de um sistema cada vez mais integral, humanizado e de qualidade na atenção e gestão em saúde, com a garantia de um serviço capaz de acolher o outro, com a responsabilidade de todos com as práticas adotadas, efetividade do projeto técnico assistencial, afirmação da clínica ampliada para levar a vida com saúde.

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A PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NA US SANTA TEREZA Na comunidade Santa Tereza existiam diversos focos de lixo, fato que gerava incômodo, vergonha e mal-estar. Para mudar a situação foi articulado, através do Conselho Local de Saúde (CLS), o contato com outros órgãos ligados ao setor do saneamento, compondo uma rede intersetorial. O Conselho Administrativo da Região (CAR), vinculado ao Orçamento Participativo, esteve no CLS para discutir estratégias de combate aos focos. A partir desse primeiro momento, o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) foi acionado e os focos começaram a ser transformados em mini-jardins. Ao todo, foram modificados 30 focos de lixo no território, utilizando somente pneus velhos doados e tinta.

Focos de lixo na comunidade foram transformados em jardins

Essa experiência foi inovadora por trabalhar a questão do lixo, entendendo a sua relação com a saúde. Saneamento e lixo tem relação direta com a vida de cada um de nós, logo, ao trabalharmos junto com a comunidade e os órgãos competentes essa questão, estaremos evitando várias doenças e contribuindo para a qualidade de vida das pessoas e o seu ambiente.

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Reunião intersetorial no Conselho Local de Saúde

Aos poucos a comunidade desnaturalizou a questão do lixo, ao ver as praças e mini jardins transformados, entendendo uma possibilidade de viver num ambiente mais limpo e bonito e salubre. Além disso, foram criados mecanismos de controle, como a possibilidade de denúncia daqueles que depositavam o lixo em lugares inapropriados e a possibilidade de aproximação com instituições (creches, hospitais) e bares para falar sobre a questão do lixo. Essa experiência contaminou outros bairros e comunidades em toda a cidade e possibilitou à população a chance de mudar a cultura em cada local, o que muitas vezes não pode ser feito somente com palvaras, mas através de ações concretas e articuladas que tenham impacto direto na vida de cada um. Responsável pelo relato: Orlei Maria da Silveira

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ESTIGMA, PRECONCEITO E SUAS IMPLICAÇÕES Conselho Distrital Humaitá/Navegantes/Ilhas “Este é o nosso lugar. Olha o Humaitá, Navegantes e as Ilhas Por aqui tem muitas belezas Neste imenso raio de vida De bairros e favelas Como louca gritava, eu vi uma faísca de gentileza Nossa área é de contradições, grandes construções e de injustiças É a região São cercadas por bolsões de pobreza Vamos ter dois dedos de prosa Aqui nesta região tem pessoas valorosas Isto não é frescura, mas sim a procura pela cura Não temos a consciência Mas isto é Resiliência Vocês tirem a prova Mas eu tenho certeza Grata por tanta beleza!’’¹

O Conselho Distrital de Saúde Humaitá/Navegantes/Ilhas foi instituído em 1994, a partir da divisão territorial da saúde de acordo com as regiões do Orçamento Participativo. Aderiu ao Regimento Interno Padrão em 2014. Constituiu o seu Plenário e promoveu eleição para o seu Núcleo de Coordenação em 2015. Desde então, está criando “movimento” do controle social na Região, como podemos destacar a seguir.

¹ Poema de Loreni Lucas, conselheira do CDS HNI, para mostrar e falar de toda a nossa região na visão de uma usuária que as vezes precisa gritar e também ouvir...27/05/2016

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O Conselho Local Saúde Diretor Pestana (CLS Diretor Pestana) foi convidado para um curso sobre HIV/AIDS e Controle Social por usuárias pertencentes ao Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) e à Associação de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS do RS (APVHA/RS), que também participam deste CLS. O curso foi ministrado pelo Centro de Educação e Assessoramento Popular (CEAP) em parceria com o MNCP, APVHA/RS e o Fórum ONG/Aids do Rio Grande do Sul (FOAIDS). A avaliação do referido curso se deu através da divisão de pequenos grupos para realizar projeto de multiplicação das temáticas abordadas. A escolha da oficina partiu do pressuposto que a descentralização do atendimento das pessoas com HIV/Aids para Atenção Básica não foi acompanhada de uma qualificação dos profissionais de saúde para um acolhimento adequado, que levasse em conta a diversidade das pessoas, gênero, raça/cor, classe econômica, profissão, a(as) vulnerabilidade(s) e a individualidade do sujeito e, nesse sentido, a temática da oficina tem alta relevância. E foi assim que Loreni Lucas, Silvia Aloia e Rosinea da Rosa escolheram a realização de uma oficina denominada “Estigma, Preconceito e suas Implicações” em uma reunião do Conselho Distrital Humaitá/Navegantes/Ilhas (CDS HNI), porque neste espaço estratégico se reúnem representantes de trabalhadores, gestores e usuários de todas as Unidades de Saúde dessa região. A metodologia utilizada foi em formato de exposição dialogada, onde dados epidemiológicos de HIV/AIDS, do Brasil, Rio Grande do Sul e Porto Alegre foram apresentados, assim como a experiência pessoal de integrantes do grupo, do viver com HIV/AIDS, do ser mulher, das dificuldades enfrentadas no acolhimento nos serviços de saúde e do reconhecimento de direitos. Após a exposição, abriu-se para debate, onde as facilitadoras foram lançando suposições como: “Você tem preconceito?” A maioria dos presentes responderam que não. Contudo, no decorrer do debate, ao serem provocados com questionamentos de opinião pessoal como: “se você realizasse um teste rápido com seu namorado e o dele desse positivo, o que faria?”; “Se seu filho se relacionar com uma menina com HIV, como você 67


reagiria?”; “E se eles quisessem ter filhos?”, alguns participantes começaram a apresentar subjetivamente reação como o silêncio, identificando-se que o preconceito está presente.

Não Adesão ao Tratamento

Morte Civil e Física

Estigma e Preconceito

Depressão, Isolamento e Inércia

Uso de álcool e outras drogas

Quanto ao direito afetivo, sexual e reprodutivo das mulheres com HIV/AIDS, notou-se que ainda há muito a se discutir, pois se tais direitos não são reconhecidos é muito difícil a garantia dos mesmos, o que impacta no acolhimento desse público. Em virtude da grande repercussão desta oficina houve a necessidade de mais duas reuniões do CDS HNI sobre o tema, sendo chamadas a Área Técnica da Secretaria Municipal de Saúde e a Coordenadora do Serviço de Atendimento Especializado para sanarem dúvidas, principalmente em relação aos fluxos. Os trabalhadores convidaram outros colegas, pois se sentiram acolhidos, que tiveram a chance de falar sobre o sentimento em relação à nova atividade a qual teriam que realizar: o pré e pós aconselhamento na testagem do HIV. Os Usuários também se sentiram acolhidos para contar sobre as situações de preconceitos que passaram em alguns atendimentos. 68


A avaliação das reuniões destacou a relevância das atividades desenvolvidas, pois o tema é muito impactante. Os usuários avaliaram a importância de saber como acessar a Unidade de Saúde, sobre a existência e a necessidade do sigilo e da ética quanto ao resultado da testagem, reconhecendo como um espaço seguro e de respeito às diferenças. Foi destacado o valor de ver duas mulheres vivendo com HIV/AIDS falando sobre suas mudanças corporais, afetivas, estigmas e preconceitos que sofreram e ainda sofrem, mesmo implicitamente.

Atividade sobre HIV – AIDS no CDS

Esta Oficina foi porta de entrada para outras ações e atividades, relacionada com o tema estigma e preconceito, tais como:  Roda de conversa para

fomentar o Conselho Local de Saúde em duas Unidades de Saúde: US Farrapos e US Ilha dos Marinheiros;

Roda de conversa US Farrapos

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 Reuniões em sala de espera, onde foram abordadas questões sobre

câncer de mama e sobre a saúde da população negra, também com o recorte do HIV/AIDS;

 Oficina de teatro voltada para as crianças na semana do Natal, que

abordou temas como os sentimentos e boas atitudes. Foram trabalhados temas de prevenção à dengue, sendo distribuídos brinquedos e joguinhos pedagógicos sobre o mosquito, que resultou numa outra atividade na escola de ensino fundamental;

 Realização daquela primeira oficina na Eixo Baltazar, que é outro

Distrito de Saúde, por ocasião da Semana de Prevenção a Acidentes de Trabalho – SIPAT. 70


As oficinas seguem sempre princípios norteadores, que são:  O DIÁLOGO é o encontro de sujeitos e seus conhecimentos . Ele acontece

quando cada um, de maneira respeitosa, coloca o que sabe à disposição do outro, na construção de novos saberes que partem da escuta dos outros e da valorização dos seus saberes;  AMOROSIDADE é a valorização do afeto e, na busca pela saúde, leva ao

vínculo, re-significando o cuidado em saúde. Esta prática estabelece relações de confiança e acolhimento nas práticas de cuidado na realidade de cada área de atuação.  PROBLEMATIZAÇÃO se propõe em práticas de saúde com base na

experiência, identificação das situações no cotidiano e das potencialidades para transformá-las. Valorizar o conhecimento de cada um e intervir juntos respeitando a realidade que vivemos.  COMPROMISSO COM A CONSTRUÇÃO DO PROJETO DEMOCRÁTICO E

POPULAR se dá por uma sociedade justa, solidária, democrática, igualitária, soberana e culturalmente diversa. Por lutas sociais e pelo Direito à Saúde, através do poder popular participativo organizado e solidário, pela valorização do SUS e do usuário, reafirmando a garantia universal aos direitos.  CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DO CONHECIMENTO é desenvolver

novas práticas com sonhos, esperanças e visões de propostas e superação em situação limite, de forma participativa e criativa nas conquistas de saúde. É promover processos educativos cuidando da Saúde.  EMANCIPAÇÃO é um processo coletivo e compartilhado das pessoas e

dos grupos, na superação, liberação de todas as formas de opressões, exploração , discriminação e violência, que ainda separa o que temos do que queremos. É fortalecer a coletividade e a participação do inédito viável. 71


Nossas oficinas levaram em conta tudo isto pois foi assim que construímos ou tentamos construir nossas rodas de conversa ou oficinas, através do diálogo amoroso com a comunidade, onde se conseguiu a construção compartilhada do conhecimento, o que resulta na emancipação do entendimento e de soluções coletivas, tais como: rever seus próprios estigmas e preconceitos, se enxergar na problemática do outro como ser humano. Compartilhar as experiências das populações excluídas leva a compreender o processo de aquisição do conhecimento, onde a troca de saberes populares promove a ruptura radical do modelo tradicional de escola. A Educação Popular constrói uma reflexão e daí uma nova teoria para as classes populares. Responsável pelo relato: Loreni Lucas

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A EXPERIÊNCIA DE CONTROLE SOCIAL NO AMBIENTE HOSPITALAR ‘‘Paulo Goulart e o Conselho Gestor aqui nasceram com um sorriso de menino e se tornaram um coração gigante em defesa do controle social.’’

O Conselho Gestor foi criado no GHC através da portaria nº 172, em 30 de abril de 2004, onde a Diretoria do GHC estabeleceu, em consonância com o Ministérios da Saúde, entre suas diretrizes, a “ democratização da gestão” e, assim, a sua criação é a materialização do princípio constitucional e da diretriz da gestão democrática e participativa no SUS. O Conselho Gestor é uma afirmação da cidadania e visa contribuir para a maior participação das pessoas na definição dos rumos e na consolidação do GHC 100% SUS, conforme as necessidades da população. Em 2016 o Conselho Gestor completou 12 anos no GHC, e passou por algumas mudanças em sua estrutura, pois até o ano de 2011 era um único Conselho para todo o grupo, e em 2012 ele foi dividido por Unidades Hospitalares (HNSC, HCR, HF e HCC), sendo criados 4 Conselhos Gestores. Foi definido que a representação dos trabalhadores seria feita por eleição e não mais indicação dos Sindicados, como era feita anteriormente. Agora, por um novo biênio, foi renovada a Coordenação, onde se resolveu juntar o HNSC e o HCC num único Conselho, por serem Unidades Hospitalares que atuam de forma integrada, compartilhando inclusive algumas áreas de apoio. O Conselho anterior se subdividiu ficando mais unido e resolutivo, pois com esta divisão se tornou mais fácil a fiscalização para exercer o Controle Social, com foco num único serviço, facilitando o debate sobre os problemas, mas por outro lado, diminuiu a presenç a de participantes nas suas Plenárias, pois o quantitativo de membros é menor. O Conselho do Hospital Conceição foi o ú nico que se manteve organizado e ativo quando ocorreu a divisão por Unidades Hospitalares, enquanto os demais se dispersaram. Acreditamos que isso ocorreu por conta, principalmente da representação dos usuários, pois os representantes da gestão, em cada Conselho, se faziam presentes.

¹ Homenagem dos conselheiros do Conselho Gestor do Hospital Nossa Senhora Conceição e Criança Conceição.

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A participação como conselheiro é uma decisão individual por um trabalho que é voluntário e que exige responsabilidade, compromisso, empenho e dedicação. Algumas vezes as pessoas que se apresentam para atuar como conselheiro vêem nessa representação uma oportunidade de ter vantagens pessoais, e isso acontece até com alguma frequência. Tivemos nos nossos próprios Conselhos do GHC pessoas que utilizavam o crachá de conselheiro para almoçar e jantar todos os dias no Hospital, por exemplo, ou para conseguir atendimento para si ou seus familiares com prioridade em relação aos demais, e isso a gente não concorda. No nosso Conselho existe um acordo ético, entre todos os usuários de que o nosso trabalho é pelo bem e melhoria do atendimento para todos, para o coletivo, e não permitimos que algum conselheiro use de privilégios no atendimento. A gente quer que o SUS seja bom para todos e a nossa conduta não pode ser diferente. Alguns trabalhadores também confundem o papel do Conselho trazendo para as pautas questões individuais, de problemas que devem ser levados para os sindicatos e não para o Conselho Gestor. Com esse compromisso, nosso grupo é bastante unido e participativo. A composição do atual Conselho Gestor do HNSC e do HCC é tripartite, com 50% de representantes dos usuários, 25% de representantes da gestão e 25% de representantes dos trabalhadores, ficando assim a composição: sete usuários indicados pelo Conselho Municipal de Saúde e um usuário indicado pelo Conselho Estadual de Saúde; quatro trabalhadores (três do HNSC e 1 do HCC) eleitos e quatro gestores indicados pela Direção do GHC. Nosso Conselho é um braço do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre e prestamos conta ao CMS e levamos as dificuldades para serem pautadas naquele Plenário, sempre que é necessário. A gestão é de 2 anos, onde se faz a eleição da representação dos trabalhadores, pois os representantes dos usuários e gestores são indicados. O nosso cronograma de trabalho se constitui de encontros todas as quartas feiras na Unidade Hospitalar para elaborar visitas, pautas, reuniões ordiná rias e extraordinárias. Entre as Unidades Hospitalares da cidade, este é o ú nico Conselho Gestor efetivamente atuante, o que torna esta experiência muito interessante e inovadora.

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Reunião do Conselho Gestor

Os hospitais HNSC e HCC tem uma circulação diária de cerca de 10 a 12 mil pessoas entre funcionários e usuários, e isso demanda muitos cuidados com: higienização, segurança, ambiência e atendimentos adequados e prestação de serviços dos mais complexos. E sobre todos esses temas o Conselho Gestor se debruça nas suas pautas e ações de fiscalização. O Conselho Gestor acompanha de perto todo o atendimento e serviços prestados à população e cobramos da direção providências quando detectados os problemas, onde alguns são resolvidos rapidamente e outros dependem de normativas e licitações. Nas reuniões do Conselho Gestor sempre há representantes da Direção, que tem se responsabilizado por trazer as informações, as explicações, e assim, se pode dizer que há um reconhecimento desse espaço de Controle Social dentro da estrutura hospitalar, que é grande e complexa.

Visita de fiscalização à lavanderia Hospitalar na Zona Sul

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Quando circulamos pelos Hospitais, somos identificados pelos trabalhadores, pelas chefias de setores, e nos sentimos respeitados, pois também procuramos manter um relacionamento respeitoso com a Direção e os funcionários. Várias vezes somos acionados pelos setores que tem problemas, para que levemos os assuntos para as reuniões. Assim, podemos citar algumas ações que mudaram condições ruins, e que acabaram melhorando o atendimento dos usuários e as condições dos trabalhadores. Uma dessas situações foi a visita ao Bloco Cirúrgico, onde a geladeira, que guarda materiais como medicamentos, e outros, estava em condições muito precárias e a própria chefe do setor chamou a nossa atenção para aquele detalhe. Levamos a situação para a gestão do Hospital e no dia seguinte a geladeira foi trocada. Na visita à maternidade, algumas mães que estavam hospitalizadas reclamaram dos banheiros, que eram muito ruins e do barulho que era causado pela passagem de macas que levavam as pessoas que foram a óbito para o morgue, e que transitavam pelo corredor da maternidade. Isso ocorria em virtude de que o elevador com capacidade para transportar essas macas estava situado no final deste corredor. Após esta reclamação a direção do Hospital encontrou outro percurso para que as macas chegassem até o mesmo elevador. Os banheiros receberam melhorias e a maternidade foi toda reformada, hoje sendo uma maternidade reconhecida pelo atendimento que oferece.

Visita de fiscalização a obras

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Outra ação importante ocorreu na visita aos 12 postos de saúde que são gerenciados pelo GHC, na medida em que os conselheiros do Conselho Gestor também atuam nos Conselhos Locais dessas Unidades. Nestas visitas se constatou que haviam diversas pendências e precariedades nas estruturas físicas e esta pauta foi levada ao Plenário, ocasião em que se formou um grupo de manutenção exclusivo para estas Unidades de Saúde. Detalhes sobre problemas na infraestrutura são os mais frequentes nas queixas dos usuários, com os quais sempre se conversa no momento das visitas. Nunca a queixa é sobre o atendimento em si, mas sobre a estrutura, o que se compreende, pois é um Hospital muito grande e que atende um grande número de pessoas, é difícil administrar e temos o entendimento de que para a gestão que quer fazer um bom trabalho, o Conselho Gestor é o olhar atento para os detalhes que muitas vezes são fáceis de solucionar e fazem toda a diferença. Responsáveis pelo relato: Carlos Dagoberto Mota Ávila Carlos Miguel Azevedo da Silva Gilberto Binder Ireno de Farias Maria Angélica Mello Machado Paulo Goulart dos Santos Vanilda da Silva

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FORMAÇÃO DO CONSELHO GESTOR DO PRONTO ATENDIMENTO LOMBA DO PINHEIRO A história do Pronto Atendimento Lomba do Pinheiro, é parte da história de participação social da própria comunidade. Em 1995 a comunidade começou a luta para conseguir um posto que funcionasse 24 horas, através do Orçamento Participativo. Em 1998 foi conquistada a Unidade, numa área da SMED, que foi cedida para o posto, sendo que o mesmo passou a funcionar em conjunto com o PSF Lomba do Pinheiro. Esse serviço começou a funcionar em junho de 2002, com horário reduzido, até às 22 horas, por impossibilidade, na época, de contratar o número suficiente de trabalhadores. A população da Lomba do Pinheiro, organizada, através do Conselho Distrital de Saúde e do Conselho Popular, deu seguimento à reivindicação de que o Pronto Atendimento passasse a funcionar 24 horas. A partir de abril de 2004, começou a funcionar ininterruptamente, atravé s de convênio com o Hospital São Lucas da PUC, que ficou responsável pela contratação de funcionários para o turno da noite e finais de semana. No entanto, o Serviço ainda não dispunha de aparelho de RX, sendo que os pacientes precisavam deslocar-se por meios próprios, e mais tarde, por volta do ano 2012, com o Serviço de Baixa Complexidade, inicialmente eram encaminhados para a PUC e posteriormente para o Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul (PACS). Em 2010 o serviço foi reformado e ampliado, o PSF foi remanejado para outro local. O Conselho Distrital de Saúde, por diversas vezes apontou e pontuou a falta do Serviç o de RX, nas reuniõ es do Conselho Municipal de Saúde. Em 2011, através de uma parceria da Secretaria Municipal de Saúde com o Governo do Japão, foi adquirida a aparelhagem, que ficou encaixotada dentro da Unidade, por falta de adequação do espaço físico e de capacidade da rede elétrica. A luta para a instalação do equipamento também contou com a reivindicação persistente do Conselho Distrital, que sempre pautava esse assunto nas reuniões do Plenário do Conselho Municipal de Saúde. O Raio X só foi instalado e começou a funcionar em 24/12/2013, depois que foi construída uma subestação de energia própria para o Pronto Atendimento. 78


A ideia de constituir o Conselho Gestor veio de fora, do Conselho Municipal de Saúde, não era uma demanda, um entendimento da própria comunidade. O Conselho Gestor foi criado em 2012, e , conforme estabelece o Regimento Interno, os representantes dos usuários devem ser homologados pelo Conselho Municipal de Saúde, a partir da indicação do Conselho Distrital de Saúde da Lomba do Pinheiro, na medida em que é o território preferencial de abrangência do serviço. O Conselho Gestor se empenhou duramente com o Secretário de Saúde para conseguir resolver os problemas de atendimento, que envolviam o convênio com o Hospital da PUC. Para isso foi constituído um Grupo de Trabalho, que teve o acompanhamento do Ministério Público Estadual.

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O Conselho Gestor é muito atuante e resolutivo, com reuniões mensais, na segunda quinta feira de cada mês, às 19 horas. É composto por 6 representantes dos usuários, 3 representantes da Coordenação e 3 representantes dos trabalhadores. Pode se dizer que o Serviço teve avanços significativos, e as pautas das reuniões versam sobre estes temas: reformas, melhorias no atendimento, convênio, relações dos trabalhadores com os usuários, etc. O Conselho Gestor já está na segunda gestão. Responsáveis pelo relato: Eunice Ferreira Nesioli dos Santos

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PRÊMIO DESTAQUE EM SAÚDE – O SUS QUE FUNCIONA Para dar visibilidade ao “SUS que dá certo”, o CMS teve a iniciativa de instituir o “Prêmio Destaque em Saúde”, que teve sua primeira edição em 2010, e que é outorgado a pessoas, instituições e projetos que se destacaram no âmbito do município, na defesa do direito à saúde. Esta iniciativa tem promovido a divulgação do SUS que queremos, ao mesmo tempo em que dá visibilidade ao espaço de controle social que representa o Conselho de Saúde. Tem também permitido visualizar de forma concreta as diversas frentes que caracterizam a defesa do direito à saúde, bem como a diversidade de ações que identificam as atribuições do SUS, que vão desde a vigilância em saúde, passando pela atenção propriamente dita até a formação profissional e o desenvolvimento tecnológico. A defesa incansável e intransigente do SUS como política pública de inclusão e transformação social é o principal objeto da ação do Conselho de Saúde. Esta árdua tarefa encontra na mídia dos principais meios de comunicação um dos grandes obstáculos, na medida em que a imagem “vendida” do SUS é a de um sistema excludente, ineficiente, desumano. Embora reconhecendo-se as inúmeras dificuldades que ainda existem na implementação efetiva do Sistema Único de Saúde em nosso país, já são concretas as experiências e evidências de seu sucesso enquanto política pública capaz de imprimir mudanças substantivas nos indicadores de saúde, na qualidade de vida e na condição de cidadania da maior parte da população, como bem demonstram diversos estudos e pesquisas e as indicações para o Prêmio Destaque em Saúde. A premiação ocorre na Reunião Solene de comemoração do aniversário do Conselho, desde 2010, e nestes últimos 5 anos, foram novamente agraciadas pessoas, instituições e projetos que mereceram destaque por sua atuação.

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Edição 2013: Categorias premiadas:  Comunicação e Saúde – Comitê Metropolitano de Tuberculose de        

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Porto Alegre Controle Social – Maria Angélica Mello Machado Direito à Saúde – Projeto Jurídico IMAMA Educação na Saúde – Formação de Promotores de Saúde da População Negra Gestão na Saúde – Rosane Terezinha Baltazar Saúde da Mulher – Espaço Aconchego Mãe-bebê Saúde Mental – Ana Paula de Lima e Márcio Eduardo de Brito Serviço de Saúde – USF Wenceslau Fontoura Trabalhador em Saúde – Olir Citolin


Edição 2014: Categorias premiadas:  Direito à saúde – Atuação da odontologia da Universidade Federal do        

Rio Grande do Sul Educação na Saúde – Residências Multiprofissionais – CGVS , HMIPV e HPS e Projeto Coração no Ritmo Certo Gestão na Saúde – Eliani de Lourdes Moraes Soares , Marisa Martins Altamirano e Programa Mais Médicos Inovação em Saúde – TelessaúdeRS Legislativo e Saúde – Jussara Cony Saúde da Mulher – Núcleo de Imunizações – CGVS e Programa Navegador de Pacientes Saúde Mental – CAPS ad III – Partenon e Lomba do Pinheiro Serviço de Saúde – Consultório na Rua Centro Trabalhador em Saúde – Adiel Coelho da Cunha

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Edição 2015: Categorias premiadas:  Controle Social – Maria Encarnacion Morales Ortega  Direito à Saúde – Mutirão da Saúde – Hospital Divina Providência  Educação na Saúde - Oficina de sensibilização ao profissional que atua      

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com pessoas com deficiência (PcD) – UFRGS Gestão em Saúde - Elmo Raupp Behenck Viegas Inovação em Saúde - Comitê da transmissão vertical do HIV e sífilis congênita de Porto Alegre Integralidade em saúde - Grupo de trabalho de humanização Partenon/Lomba do Pinheiro Saúde da Mulher - Projeto rede cegonha no município de Porto Alegre Serviço de Saúde - Unidade de Saúde Vila Floresta Trabalhador em Saúde - Arlete dos Passos Volino


Edição 2016: Categorias premiadas:           

Comunicação em saúde – Grupo de teatro Caras da Lomba Controle Social – Gilmar Campos Direito à Saúde - Projeto: Se essa rua fosse minha Educação na Saúde - Projeto: A fada dos dentes Gestão em Saúde - Rosana Meyer Neibert e Silvia Fernanda Martins Casagrande Inovação em Saúde - Projeto: Informatização da rede de Atenção Básica – Implantação do sistema e-SUS Integralidade em Saúde - Projeto: Grupo de ginástica Renascer – US Ponta Grossa Saúde da Mulher - Casa de apoio Viva Maria Saúde Mental - Grupo de monitoramento em saúde mental Leste – Nordeste Serviço de Saúde - Hospital Independência Trabalhador em Saúde - Maria Eronita Sirota Barbosa Paixão

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Edição 2017: Categorias premiadas:  Direito à Saúde - Liliane Dreyer da Silva Pastoriz  Educação na Saúde - Projeto Grupo Hiperdia da Unidade de Saúde

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Santo Alfredo e EducaSaúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Controle Social - Conselho Local de Saúde da Chácara da Fumaça Gestão em Saúde - Lívia Maria Fagundes Inovação em Saúde - Projeto: Álbum seriado de Crioulo Haitiano e Português/SMS Saúde da Mulher - Loreni Lucas Saúde Mental - Projeto: Gera Encontro - Geração POA Paz e Saúde - Projeto: Olimpíadas Culturais da Grande Cruzeiro Legislativo e Saúde - Projeto: Alimentos orgânicos na merenda escolar Comunicação e Saúde - Projeto: Livro Ação Comunitária pela Saúde em Porto Alegre Integralidade em Saúde - Projeto: Grupo Movimento Serviço de Saúde - Unidade de Saúde Vila Vargas Trabalhador em Saúde - Joana Olívia Fernandes


HOMENAGENS PÓSTUMAS Nosso agradecimento pelo trabalho, dedicação e coragem:

Maria Ivone Dill Paulo Goulart dos Santos Paulo Rogério da Silva Sônia Saraí Soares Sônia Moraes Mendes

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