Molinari

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1 4 d e ag o s to a 1 1 d e o u t u b ro d e 2 0 1 5 C A I X A C u lt u r a l B r a s Ă­ l i a



A CAIXA é uma empresa pública brasileira que prima pelo respeito à diversidade e mantém comitês internos atuantes para promover entre os seus empregados campanhas, programas e ações voltados para disseminar idéias, conhecimentos e atitudes de respeito e tolerância à diversidade de gênero, raça, orientação sexual e todas as demais diferenças que caracterizam a sociedade. A CAIXA, uma das principais patrocinadoras da arte e cultura brasileiras, destina anualmente mais de R$ 80 milhões de seu orçamento para o patrocínio a projetos culturais em espaços próprios e espaços de terceiros, com mais ênfase para exposições de artes visuais, peças de teatro, espetáculos de dança, shows musicais, festivais de teatro e dança em todo o território nacional, e artesanato brasileiro. Os projetos patrocinados são selecionados via edital público, uma opção da CAIXA para tornar mais democrática e acessível a participação de produtores e artistas de todas as unidades da federação, e mais transparente para a sociedade o investimento dos recursos da empresa em patrocínio. Com a exposição Molinari: o vidro veneziano no Brasil, a CAIXA Cultural apresenta ao público brasiliense uma coleção de vasos, esculturas e objetos de decoração criados pelos irmãos Antonio Carlos e Paulo Molinari, pioneiros na arte de esculpir em vidro. Dois mestres vidreiros que foram aprendizes de Aldo Bonora, italiano que trouxe a técnica do vidro veneziano para terras brasileiras na década de 1950, e que imprimem sua criatividade e talento na criação de novas formas e no uso das cores em suas obras. Desta maneira, a CAIXA contribui para promover e difundir a cultura nacional e retribui à sociedade brasileira a confiança e o apoio recebidos ao longo de seus 154 anos de atuação no país, e de efetiva parceira no desenvolvimento das nossas cidades. Para a CAIXA, a vida pede mais que um banco. Pede investimento e participação efetiva no presente, compromisso com o futuro do país e criatividade para conquistar os melhores resultados para o povo brasileiro.

CAIXA is a Brazilian state-owned company that stands out in its respect to diversity, keeping internal committees with employees and carrying out campaigns, programs and actions aimed at disseminating ideas, information and a respectful and tolerant attitude towards diversity of gender, color, sexual orientation and all the other differences embedded in a plural society. CAIXA is one of the main sponsors of Brazilian arts and culture, and invests over 80 million reais annually in cultural projects, presented either in its own venues or elsewhere, with an emphasis on exhibitions of visual arts, theater plays, musical concerts, as well as theater and dance festivals all over the country, and Brazilian handicraft. Projects are selected on a competitive and public process, an option CAIXA has made not only to democratize access by producers and artists from the whole country, but also to give transparency to the use of the company’s funds. With the exhibition Molinari: o vidro veneziano no Brasil (Molinari: the Venetian glass in Brazil), CAIXA Cultural introduces to the audience of Brasília a collection of vases, sculptures and decorative objects created by the Molinari brothers, Antonio Carlos and Paulo Molinari, pioneers in the art of sculpting in glass. Two master glassmakers, who were apprentices to Aldo Bonora, an Italian who introduced the Venetian glass technique in Brazil in the 1950’s, and who infuse their creativity and talent in the creation of new forms and in the use of collors in their works. With this project, CAIXA contributes to promote and disseminate the Brazilian culture, as means of retribution to the Brazilian society for the trust and support granted to CAIXA over its 154-year long history of presence in the country and effective partnership in the development of our cities. For CAIXA, life asks for more than just a bank: it asks for investment and participation in the present, commitment to the future of the country and creativity to achieve the best results for the Brazilian people.

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL CAIXA ECONÔMICA FEDERAL


Entre a tradição e a identidade: de Murano às Minas Gerais Tradição é palavra de origem latina, a qual deu forma a trado, equipamento empregado na agricultura para “arrastar” a terra e dela retirar coisas indesejadas. A raiz da palavra significa exatamente isso: arrastar – daí, tradição ser aquilo que “arrastamos como herança”, aquilo que trazemos como cultura pretérita (e cultura é outra palavra, também de origem latina, que valeria por si uma investigação que iluminaria muito; mas aqui não há espaço). O trabalho dos irmãos Antonio Carlos e Paulo Molinari se encontra exatamente na confluência da tradição com a identidade. A arte, a qual aprenderam ainda meninos com o veneziano Aldo Bonora, é milenar e comporta todos os elementos da tradição e da cultura: é modo de fazer; é técnica; é método; implica continuidade e permanência, mas também aprimoramento, invenção, transformação, novos significados e usos. Por isso, cultura e tradição se encontram num campo onde permanências e criações dialogam e permitem que nós tenhamos o que chamar de passado, memória, história, mas também de presente, transformação, futuro. Suas obras possuem ainda uma outra dimensão, dada pela “identidade”, conceito/palavra também profundo e pleno de caminhos. No nosso caso nos ateremos a um: a identidade como elemento distintivo, aquilo que nos define (ou a um grupo), ainda que comporte uma imensa plasticidade.


As obras dos irmãos Molinari – cuja exposição inédita a Caixa Cultural, mais uma vez generosa e com senso de importância, recebe agora - reúnem justamente duas características que lhes garantiram a notoriedade como mestres vidreiros e figuras cujas obras são reconhecidas mundo afora: tradição e identidade.Tradição, pois arrastam uma longa história do vidro; identidade, pois imprimiram nessa tradição marcas que são únicas, que são distintivas, que são fundamentadas em suas histórias e experiências. A mim seria impossível imaginar as obras descoladas de seus artistas, e esses de suas histórias e espaços. Sempre que vejo as curvas de suas obras – que desafiam a ideia de fragilidade absoluta do cristal – me volta à mente a paisagem das Minas Gerais, também toda sinuosa. Também vejo nas cores de seus cristais as cores das Minas, desde um entardecer até os vários verdes dos campos. Tradição, inovação, cultura e identidade: palavras que ajudam a entender a arte dos irmãos Molinari, mas que jamais esgotariam a beleza das obras e a experiência de estar diante delas.

Rodrigo Silva Coordenador Geral


Between tradition and identity: from Murano to Minas Gerais

The word “tradition” has a Latin root, shared with the word trado (rake), a tool used in agriculture to “drag” the earth and remove from it unwanted things. Their root means just that: to drag - hence, tradition means that which we “drag as inheritance”, which we bring as preterit culture (culture, by the way, is another Latin word that deserves itself an investigation – which would be very enlightening, but for which there is no room at this time). The work of the brothers Antonio and Carlos Paulo Molinari is situated exactly at the confluence of tradition with identity. The art, which they learnt as children with the Venetian master Aldo Bonora, is ancient and contains all the elements of tradition and culture: it is a knowhow; it is a technique; it is a method; it implies continuity and permanence, but it also implies improvement, invention, transformation, new meanings and uses. Therefore, culture and tradition are in a field where continuity and creation dialogue and allow us to have not only something to call “past”, “memory”, “history”, but also something to call “present”, “transformation”, “future”. Their works have another dimension, given by “identity” concept/word, also profound and full of paths. In our case, we will keep to one of them: the identity as a distinctive element, that which defines us (or a group), while still carrying an enormous plasticity.

The works of the Molinari Brothers – exhibited for the first time by Caixa Cultural, an institution whose choices reveal generosity and sense of importance – combine tradition and identity, two features that made their worldly reputation as master glassmaker and brought international recognition to their works. Tradition, because they drag a long history of glass; identity, as they print in this tradition features that are unique, that are distinctive, that are based on their stories and experiences. It is impossible for me to imagine the artworks detached of their artists, and the artists detached of their stories and spaces. Whenever I see the curves of the Molinari works - which challenge the idea of ​​absolute fragility of the crystal -, they bring back to my mind the landscape of Minas Gerais, all sinuous as well. The colors of their crystals also remind me of the colors of Minas Gerais – from the sunsets to the many shades of green in its fields. Tradition, innovation, culture and identity: words that help us to understand the art of the Molinari Brothers, but that can never deplete its beauty and the experience of being in front of their works.

Rodr igo Silva General Coordinator


Duas vidas dedicadas ao vidro A longa história do vidro se entrelaça com a do próprio homem. Isso porque falar na origem e desenvolvimento da arte vidreira é revisitar épocas distantes em que viveram fenícios, assírios, egípcios, romanos e outros povos que os livros escolares costumam chamar de “civilizações antigas”. Material originalmente encontrado na natureza – a obsidiana formada pelos vulcões é exemplo dos mais conhecidos –, o vidro começou a ser produzido por mãos humanas por volta de 5.000 a.C., periodização um tanto imprecisa que ainda divide opiniões entre especialistas. Inicialmente o vidro parece ter servido a desígnios práticos, dando forma a jarros, garrafas, vasos e instrumentos de corte. Em pouco tempo, contudo, passou a se prestar a usos diversos, inclusive para a confecção de joias, adornos sagrados e objetos de decoração. Essa fluidez que vai do utilitário ao artístico é uma característica do vidro no decorrer da história, constituindo uma incessante releitura de temas tradicionais mediante novas técnicas e descobertas. Muito tempo transcorreu até que o vidro chegasse a Veneza e, mais especificamente, a Murano, ilha pertencente ao complexo insular veneziano e que durante o fim da Idade Média transformou-se num dos mais prestigiados centros vidreiros da Europa. Seu diferencial estava na modelagem manual do vidro ainda incandescente, na exímia qualidade das peças sopradas por meio de tubos metálicos e na tonalidade viva das cores atingidas. Tudo feito de maneira artesanal e sem o auxílio de formas ou moldes. Por gerações e mais gerações guardada a sete chaves, a técnica do vidro veneziano se espraiou mundo afora com o paulatino enfraquecimento político e econômico de Veneza. No Brasil ela demoraria a se consolidar, devendo muito a Aldo Bonora, italiano que na década de 1950 se fixou em Poços de Caldas, Minas Gerais, e ali implantou uma fábrica de vidro.


É quando entram em cena os irmãos Antonio Carlos e Paulo Molinari. Ainda meninos tornaram-se aprendizes do mestre Bonora, que lhes ensinou os segredos do vidro da sua terra natal. O trabalho de anos a fio, que já passa de meio século, converteu os pequenos discípulos em verdadeiros mestres vidreiros. Estes se valeram da tradição veneziana para criar novas formas e cores, residindo aí um esforço contínuo para resignificar a arte do vidro e fazer dela, a um só tempo, meio e fim da inesgotável imaginação dos irmãos Molinari. Leonardo da Vinci afirma em seu Tratado da Pintura, conjunto de manuscritos do princípio do século XVI, que cada ser vivo se caracteriza por uma linha ondulante que lhe é única, cabendo à arte desnudar esse enigmático serpentear. Observadas as obras de Antonio Carlos e Paulo Molinari, marcadamente curvilíneas e sinuosas, a impressão que fica é a de que eles transportam para o vidro alguma essência perdida, quem sabe escondida entre as montanhas do sul de Minas Gerais. Embora pesadas, as peças transmitem leveza ímpar, conferindo ao vidro uma peculiar sensação de movimento em que cor e forma se fundem e confundem. Contando com cerca de 70 obras entre vasos, garrafas, esculturas e objetos de decoração, a exposição “Molinari: o vidro veneziano no Brasil” convida o grande público a entrar em contato com parte da produção de dois pioneiros do vidro veneziano em terras brasileiras. A trajetória do vidro prossegue com mais esse capítulo, especialmente brasileiro e que ainda está longe de terminar. Carlos Eduardo França de Oliveira Curador


Two lives dedicated to glasswork The long history of glass intertwines with that of mankind. This is because to speak of the origin and development of glass art is to revisit distant times in which there lived Phoenicians, Assyrians, Egyptians, Romans and other people that textbooks usually call “ancient civilizations”. A material originally found in nature – the obsidian formed by volcanoes is the best known example -, human hands began to produce glass around 5000 BC, a periodization rather inaccurate, so that there is no consensus among experts on it yet. At first, the glass seems to have served practical purposes, forming jars, bottles, vases and cutting instruments. Before long, new uses emerged, including the manufacture of jewelry, sacred ornaments and decorative items. This fluidity – that goes from the artistic to the utilitarian – is a feature of glass throughout history, providing a constant reinterpretation of traditional themes with new techniques and discoveries. A long time elapsed before glass came to Venice and, more specifically, to the Venetian island of Murano, which became one of the most prestigious glassware centers in Europe during the late Middle Age. Murano’s differentials were the manual modeling of glass while still incandescent, the superb quality of the pieces blown through metal tubes, and the vivid colors obtained in the process -- all done by hand and without the aid of forms or molds. The Venetian glass technique was kept secret for generations, but it spread worldwide as Venice’s economic and political power waned. Its consolidation in Brazil took a long time and owed greatly to Aldo Bonora, an Italian who in the 1950s settled in Poços de Caldas, Minas Gerais, and there created a glass factory.

This is when the brothers Antonio and Carlos Paulo Molinari came on the scene. While they were still boys, they became apprentices to master Bonora, who taught them the secrets of glass from his homeland. More than half a century of working with glass converted the small disciples in true master glassmakers. They took inspiration from the Venetian tradition to create new shapes and colors, in a continuous effort to give new meanings to the glass art and to make it, at the same time, a means and an end to the inexhaustible imagination of the Molinari brothers. In his Treatise of Painting, set of manuscripts of the early sixteenth century, Leonardo da Vinci said that every living being is characterized by an undulating line of its own, and that it is art’s role to unveil such enigmatic snake. The works of Antonio Carlos and Paulo Molinari, markedly curved and sinuous, give the impression that the brothers infuse to the glass some lost essence, perhaps hidden in the mountains of southern Minas Gerais. Although heavy, the pieces convey a unique lightness, giving the glass a peculiar sense of movement in which color and form merge and confuse. Portraying around 70 works ranging from vases and bottles to sculptures and decorative objects, the exhibition «Molinari: Venetian glass in Brazil» invites the general public to get in touch with a part of the production of two pioneers of Venetian glass in Brazil. The glass saga continues with this new chapter, so markedly Brazilian and still far from over. Carlos Eduardo França de Oliveira Curator















Um pouco sobre a história do vidro “Tome 60 partes de areia, 180 partes de cinzas de algas marinhas e cinco partes de cal. Assim você obterá o vidro” Receita pertencente à antiga biblioteca do rei assírio Assurbanipal (669-626 a.C.), em escrita cuneiforme.

Embora a arte da vidraria acompanhe boa parcela da história da humanidade, o vidro nem sempre foi fabricado pelas mãos do homem. Vidros in natura ainda podem ser encontrados em rochas fundidas a temperaturas elevadas e, logo em seguida, solidificadas com rapidez. Materiais como a obsidiana – comum em áreas de erupção vulcânica – possibilitaram aos nossos ancestrais confeccionarem ferramentas de corte para caça, uso doméstico e defesa. Já bem mais tarde, o caráter multiuso dessas formações naturais, aliado à sua relativa escassez, tornou o vidro um artigo disputado entre povos da Antiguidade, não à toa que alguns o considerassem um material precioso. É difícil datar com exatidão a origem do vidro feito pelo homem. Segundo Plínio, naturalista romano autor de Naturalis Historia, obra do século I d.C, as primeiras amostras foram obtidas acidentalmente pelos fenícios cerca de 5000 a.C. Ao desembarcarem na Síria, os fenícios supostamente improvisaram fogões utilizando blocos de salitre sobre a areia. Após certo tempo de queima, observou-se que uma substância líquida e brilhante escorria e se solidificava rapidamente. Estava formado o vidro. Mito ou verdade, o fato é que, apesar do vidro ser conhecido pelos fenícios e nas planícies férteis da Mesopotâmia, foi especialmente no Egito, a partir de 3.500 a.C, que a arte da vidraria seria aperfeiçoada e difundida na Antiguidade. No Egito, por exemplo, experimentou-se a junção do vidro com a cerâmica. Areias ricas em cálcio e ferro, combinadas com carbonato de sódio, formavam coberturas vitrificadas nas peças de cerâmica.

Credita-se aos egípcios, também, as primeiras tentativas de adicionar compostos de cobre e cobalto com o intuito de obter tonalidades azuladas nos vidros. Vasos de diferentes formatos – inclusive zoomórficos – eram comercializados para fora do vale do Nilo, do Mediterrâneo ao Oriente Médio. Muito tempo se passou até que por volta de 100 d.C., na região da Babilônia, aprimorou-se a sopragem do vidro, técnica já conhecida pelos egípcios. A sopragem consistia na utilização de um tubo de ferro longo e com abertura interna que dava ao vidreiro a possibilidade de coletar a massa de vidro fundido no forno e, pela outra extremidade, soprar o ar, originando peças ocas. Outras inovações floresceram nesse período e complexificaram a arte do vidro. O uso de moldes de madeira permitiu a produção de peças padronizadas; já a introdução do óxido de manganês deu condições para que os primeiros vidros totalmente incolores fossem produzidos na Alexandria. Na Roma Antiga, procedimentos foram desenvolvidos a ponto de o vidro ser utilizado como joia, tamanha a perfeição com que os mestres vidreiros conseguiam imitar pedras preciosas. A queda do Império Romano não apagaria o desenvolvimento do vidro. Durante a Idade Média difundiu-se o vitral, técnica que agrupava pequenas peças de vidro polido por meio de tiras de chumbo, sobretudo em janelas. Largamente empregada no interior de igrejas e catedrais, os vitrais adentraram a Idade Moderna como símbolos de bom gosto e distinção social, não sendo fortuita sua utilização em palácios e residências dos setores mais abastados das famílias nobres europeias. O vidro cristal, surgido no século XVII, foi uma das principais inovações do universo vidreiro na Modernidade. Enquanto o vidro tradicional era basicamente composto de sílica (areia), óxido de sódio e óxido de cálcio, o cristal possuía apenas a sílica e o óxido do chumbo, substância que oferecia mais brilho e peso ao produto. A região da Boêmia, situada na atual República Tcheca, ficaria conhecida pela fabricação de cristais extremamente translúcidos e brilhantes.


Murano, a ilha de vidro Datam dos últimos anos do século X os primeiros registros sobre a existência de produtores de vidro em Veneza, um dos principais centros comerciais europeus entre fins da Idade Média e início da Idade Moderna. A proliferação das manufaturas de vidro ali foi tal que, ao final do século XIII, o Grande Conselho de Veneza decidiu remover da cidade os fornos de vidro por motivos de segurança, de modo que a maioria dos mestres vidreiros se transferiu para Murano, ilha situada a menos de um quilômetro do centro veneziano. Foi em Murano que o vidro de Veneza atingiu seu apogeu e ganhou renome dentro e fora da Europa. Durante os séculos XIV e XV, a pequena ilha mediterrânea exportou desde cálices, taças, objetos de decoração, espelhos, lustres e lamparinas a imitações de pedras preciosas. O vidro ali produzido notabilizava-se pelos soprados de extraordinária qualidade, pela modelagem manual do vidro incandescente e pelos esmaltes coloridos, além do lattimo opaco (vidro leitoso) e do reticello (vidro rendado). O sucesso de Murano e o receio de que a técnica fosse copiada fizeram com que a administração de Veneza aprovasse sucessivas leis que impediam a saída de mestres vidreiros da região ou barravam a incorporação de mão de obra estrangeira na produção de vidro. Aos poucos, entretanto, a técnica começou a ser imitada em outros pontos do continente europeu, gerando o que se convencionou chamar de vidro à la façon deVenise – “ao estilo de Veneza”.

Evolução permanente Os séculos XVIII, XIX e XX trouxeram importantes inovações em termos de produção e aplicação do vidro que acabaram popularizando-o e transformando-o em um material de produção intensiva. Confecção de espelhos planos, uso de matérias-primas sintéticas, vidros com propriedades controladas, desenvolvimento de novos fornos, construção dos primeiros instrumentos ópticos, descoberta da fibra óptica de sílica: o universo do vidro, em constante mutação, se vê progressivamente inserido na vida humana. Mas, como diz o norte-americano Robert Doremus, especialista em vidro, a vulgarização desse material, por maior que seja, não desmanchará o encanto que ainda persiste no vidro artesanal, capaz de trazer à luz verdadeiras obras de arte.

Bibliografia sugerida ALVES, Oswaldo Luiz; GIMENEZ, Iara de Fátima; MAZALI, Italo Odone. Vidros. Cadernos temáticos – Química Nova Escola. Edição especial, fev. 2001. DOREMUS, Robert. Glass Science. Michigan: Wiley, 1994. SHELBY, James E. Introduction to Glass Science and Technology. Cambridge: The Royal Society of Chemistry, 1997. MACFARLANE, Alan; MARTIN, Gerry. Glass: a world history. Chicago: University of Chicago Press, 2002.



A brief history of glass “Take 60 parts of sand, 180 parts of seaweed ashes and 5 parts of whitewash.You will obtain glass “ Recipe found in the ancient library of the Assyrian king Ashurbanipal (669-626 BC), in cuneiforme writing.

Although the art of glassmaking walks hand in hand with a good part of mankind’s own history, glass was not always made by human hands. Glass in natura can still be found in rocks melted at high temperatures and then immediately solidified. Materials like obsidian – common in areas of volcanic eruption - allowed our ancestors to build cutting tools for hunting, household and defense. Much later on, the multipurpose character of these natural formations, combined with their relative scarcity, led the glass to become a sought-after article in ancient civilizations, and not by chance some considered it to be a precious material. It is hard to date precisely the origin of man-made glass. According to Pliny, the Roman naturalist author of Naturalis Historia (a first century AD work), the Phoenicians obtained the first samples by accident around 5000 BC. At their arrival in Syria, the Phoenicians supposedly improvised stoves using saltpeter blocks on sand. After a burning time, it was observed that a liquid and glossy substance flowed and solidified quickly. Glass was then formed. Myth or truth, the fact is that even though glass was known by Phoenicians and in the fertile plains of Mesopotamia, it was especially in Egypt, from 3500 BC on, that the art of glassmaking was improved and widespread in the ancient era. The first attempt to join glass and ceramic, for instance, took place in Egypt. Sands rich in calcium and

iron, combined with sodium carbonate, yielded a vitrified cover for ceramic pieces. It is also believed that Egyptians were the first to experiment with adding copper and cobalt compounds in order to obtain bluish tones in glasses. Vases of different formats - including zoomorphic - were sold out of the Nile valley, from the Mediterranean to the Middle East. The blowing of glass, a technique already known by the Egyptians, saw a relevant improvement only after a long time, around 100 AD, in the region of Babylon. The blowing consisted in the use of a long iron tube with an inner opening which gave the glassmaker the possibility of collecting the mass of molten glass in the furnace, blowing the air at the other end and yielding hollow parts. Further innovation flourished during this period and increased the complexity of the art of glassmaking. The use of wooden molds allowed the production of standardized pieces; the introduction of manganese oxide paved the way for the production of the first completely colorless glasses in Alexandria. In ancient Rome, procedures evolved to the point that glass started to be used as jewelry, such was the perfection with which the master glassmaker could mimic gemstones. The fall of the Roman Empire did not deter the development of glass. During the Middle Ages, stained glass – a technique that grouped small pieces of polished glass with lead strips – became widespread, especially in windows. Widely used inside churches and cathedrals, stained glass entered the Modern Age as a symbol of good taste and social distinction; not by chance, it was used in palaces and residences of the most affluent sectors of European noble families. The crystal glass emerged in the seventeenth century as one of the main innovations of the glass universe in Modernity. While traditional glass was basically composed of silica (sand), sodium oxide and calcium oxide, crystal had only silica and lead oxide, a substance that offered more brightness and weight to the product. The region of Bohemia, located in present-day Czech Republic, would become known for manufacturing extremely translucent and shiny crystals.


Murano, the glass island The first records of the existence of glass manufacturers in Venice, a leading European trade center from late Middle Ages to the early modern period, date back to the end of the tenth century. The proliferation of glass manufacturing in that region was such that, at the end of the thirteenth century, the Great Council of Venice decided to remove the glass furnaces from the city for safety reasons, so that most of the glass masters moved to Murano, an island located less than a kilometer from the Venetian center. In Murano, glass reached its peak and made a name in and outside Europe. During the fourteenth and fifteenth centuries, the small Mediterranean island exported from chalices, bowls, decorative objects, mirrors, chandeliers and lamps, to emulated precious stones. The local product was renowned for the superb quality of its blown glass, for the manual modeling of incandescent glass and for the colorful glaze, in addition to the opaque lattimo (milky glass) and the reticello (lacy glass). The success of Murano and the fear of copies led the administration of Venice to approve successive laws that prevented the glass masters from leaving the region or barred foreign labor in glass production. Gradually, however, the technique began to be imitated elsewhere in Europe, generating the so-called glass à la façon deVenise - “the style of Venice.”

Permanent evolution The eighteenth, nineteenth and twentieth centuries brought important innovations in terms of production and application of glass, which ended up popularizing it and turning it into an intensive production material. Manufacture of flat mirrors, use of synthetic raw materials, glasses with controlled properties, development of new furnaces, construction of the first optical instruments, discovery of silica optical fiber: the ever-changing universe of glass becomes progressively intertwined with human life. But as said by the American Robert Doremus, a specialist in glass, the popularization of this material, however great, will not reduce the charm that still persists in handmade glass, which can bring to light true works of art.

Suggested reading ALVES, Oswaldo Luiz; GIMENEZ, Iara de Fátima; MAZALI, Italo Odone. Vidros. Cadernos temáticos – Química Nova Escola. Edição especial, fev. 2001. DOREMUS, Robert. Glass Science. Michigan: Wiley, 1994. SHELBY, James E. Introduction to Glass Science and Technology. Cambridge: The Royal Society of Chemistry, 1997. MACFARLANE, Alan; MARTIN, Gerry. Glass: a world history. Chicago: University of Chicago Press, 2002.
















Antonio Carlos e Paulo Molinari Nascidos em Poços de Caldas, no sul de Minas Gerais, Antonio Carlos e Paulo Molinari conheceram o vidro ainda crianças. Em 1955, então com 11 e 8 anos, tornaram-se aprendizes do mestre vidreiro Aldo Bonora, italiano recém-instalado na cidade de Poços de Caldas. O longo aprendizado transformou os discípulos em mestres. Em 1962, juntamente com o pai, Antonio Molinari, e irmãos – Wilson, Marcos, Cristina, Nívia e João –, Antonio Carlos e Paulo criaram a Cristais São Marcos, empresa especializada em vidros artesanais do tipo Murano. A relevância da obra dos irmãos Molinari tem sido reconhecida nacional e internacionalmente por meio de homenagens e condecorações. Em 2005, expuseram seu trabalho na sede da Embaixada do Brasil em Roma, no Palazzo Pamphili. No mesmo ano foram convidados para expor em Veneza, também na Itália, ratificando sua importância no mundo do vidro artesanal. ****


Antonio Carlos and Paulo Molinari Born in Poços de Caldas, in southern Minas Gerais, Antonio Carlos and Paulo Molinari were still children when they entered the world of glass. In 1955, then 11 and 8 years old, they became apprentices to Venetian master glassmaker Aldo Bonora, who had recently moved to Poços de Caldas. The long apprenticeship transformed the disciples into masters. In 1962, along with their father, Antonio Molinari, and their siblings - Wilson, Marcos, Cristina, Nívia and João - Antonio Carlos and Paulo created the Cristais São Marcos, which specializes in handmade Murano-type glass. The Molinari Brothers have received tributes and distinctions locally and internationally, acknowledging the relevance of their work. In 2005, their work was exhibited at the Brazilian Embassy in Rome, at Palazzo Pamphili. In the same year they were invited to exhibit in Venice, also in Italy, corroborating their importance in the world of handmade glass.


Presidenta da República | Dilma Rousseff Catalogação na Publicação (CIP) Ficha Catalográfica feita pelo autor Silva, Rodrigo, 1976Molinari: o vidro veneziano no Brasil / Rodrigo da Silva (Coord.), Carlos Eduardo França de Oliveira.-[1.ed] – São Paulo: Conceito Humanidades, 2015 160p.:il.; 22cm Inclui bibliografia e índice ISBN: 978-85-67842-24-0

Ministro da Fazendo | Joaquim Levy Presidenta da Caixa Econômica Federal | Miriam Belc hior

S581c

1.Arte.2.Vidro soprado.3.Artes decorativas.4.Brasil – Obras ilustradas. I Rodrigo Silva II Título CDD B748 CDU 73

FICHA TÉCNICA DO PROJETO Coordenação Geral e produção executiva | Rodrigo Silva Curadoria | Carlos Eduardo França de Oliveira Obras | Antonio Carlos Molinari e Paulo Molinari Expog rafia | Br uno Car valho e Rodrigo Silva Traduções | Adriana Dupita Projeto g ráfico e design | Camila Winger ter Assessoria de imprensa | Adriana Monteiro – Ofício das Letras Fotos | Marco Lopes Vídeo | Marco Lopes Montagem | Br uno Lopes, Marco Lopes, Edmilson Pereira, Marco Aurélio da Silva. Agradecimentos À toda equipe da Cristais São Marcos, em especial a Tadeu, Christian e Paulo Henrique, por não haverem medido esforços que viabilizassem este projeto.



Distribuição gratuita. gratuita. Comercialização Comercialização Proibida. Proibida. Distribuição

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