editorial
Amadeu Borges Diretor
Quando, no final de 2021, escrevi sobre as incertezas que o início de um novo ano traz consigo, não esperava que o panorama fosse o que agora estamos a viver. Referia-me, na altura, apenas aos preços da energia. Continuando, com este tema temos a oportunidade de verificar que todos os motivos, mesmo aqueles que não deveriam ser, são suficientes para que os preços da energia aumentem de forma descontrolada, obrigando o estado a tomar medidas que envolvem a diminuição do volume financeiro que arrecada. O início da guerra na Ucrânia foi suficiente para colocar todos os países da Europa a pensar em alternativas, muito provavelmente arrastando, por mais uns anos, as metas da descarbonização. Em Portugal, muitas vozes se ouviram para o retomar da produção de eletricidade baseada em carvão, reativando as centrais térmicas fechadas há uns meses atrás. Afastada esta ideia pelo novo governo, muitos outros países da Europa mantiveram a produção de eletricidade baseada
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só através da diminuição da dependência energética será possível contrariar as atuais situações de crise e de pobreza energética em carvão e o nuclear ganhou uma força significativa pela taxonomia “verde” onde se pretende incluir e que se traduz num sistema europeu de classificação das atividades económicas sustentáveis que contribuam para a redução de gases com efeito de estufa. Para perceber melhor o que se passa e o porquê da divergência de pensamento sobre o nuclear entre a França e a Alemanha, será interessante analisar a matriz energética de cada um destes países. Estamos no fim da época de aquecimento e em breve o gás natural russo não fará falta tão significativa à Europa. Quando chegarmos ao próximo inverno, será que os novos compromissos de abastecimento vão garantir preços cómodos? Aguarda-se, com receios redobrados, porque, de momento, ainda nada se nota. Nós, por tugueses, vamos lamentando o aumento dos preços da energia, mas cruzamos os braços ao vermos algumas medidas que em muito pouco ou nada ajudam no orçamento familiar. Olhamos para a energia como
um bem com preço que é um mal necessário e lá pagamos. Não precisamos de medidas que decorrem do “calor do momento”. Precisamos de medidas assertivas e urgentes para diminuir a dependência energética, que não sejam apenas a promessa política para daqui a uns anos. Na publicação Energia em Números, Edição 2021 do Observatório da Energia, DGEG e ADENE, lê-se: Em 2019, A dependência energética de Portugal foi de 74,2%, menos 1,7 p.p. em relação ao ano anterior e menos 7 p.p. face a 2009. Na União Europeia, Portugal foi o 8.º país com a maior dependência energética e 16 p.p. acima da média UE-28 que foi de 57,8%. Muitas foram as vozes que nas duas últimas décadas chamaram à atenção para este problema. O tempo passou e a dependência energética continuou. É urgente tomar medidas que resultem em números absolutos facilmente percetíveis e que sejam igualmente percetíveis as vantagens para o país e para os portugueses. Tudo isto não passa de uma lapalissada. Todos nós sabemos desta necessidade. Era verdade e continua verdade. Já não precisamos de mais evidencias para provar a vulnerabilidade energética de Portugal. O que acontecerá no próximo inverno se os preços da energia continuarem a aumentar? Até que ponto este aumento descontrolado dos preços da energia associado à pobreza e à pobreza energética, não irá conduzir a catástrofes? Acabou o tempo para as promessas que serão concretizadas quando a agenda o permitir. Os nossos recursos endógenos valorizáveis em energia continuam por aproveitar (incluindo o aumento da eficiência energética). Com consciência de que os nossos recursos são limitados, deixo aqui o meu apelo. É necessário, mais que nunca, colocar o país em primeiro lugar e concertação política para a diminuição da dependência energética e erradicação da pobreza energética, antes que muitas luzes se comecem a apagar.