COP26. E agora?

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COP26. E agora?

Teresa Ponce de Leão Presidente do LNEG Tel.: + 351 210 924 600/1 info@lneg.pt www.lneg.pt

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O fim da COP26 aconteceu com 24 horas de atraso. A frustração inicial, após a elaboração conjunta das conclusões e da análise às sucessivas indefinições, avanços e recuos e um impasse aparentemente inultrapassável, face ao Acordo de Paris, emergiu com algum entusiasmo. Na declaração final, aparentemente, foi possível mitigar a aparente frustração. Diz quem lá esteve que as negociações acabaram por decorrer num espírito de maior esperança do que o que transpareceu para o exterior ao longo da semana. Aparentemente, valeu a pena esperar 24 horas. A sombra que permanentemente pairou sobre a conferência era a ilustração da consciência comum de que o mundo está a falhar no objetivo de limitar o aquecimento global em 1,5 oC até 2050, em comparação com a era pré-industrial. Muitos governos, porque não podem ou não querem, continuam a ignorar a realidade científica e a falhar na tomada de medidas de longo prazo, difíceis e que obrigam ao despojar de interesses condicionados pelos ciclos eleitorais. O ciclo do clima é de longo-prazo e o político de curto-prazo e muitas vezes os governos esquecem a necessidade de tomada de decisões baseadas na avaliação e quantificação dos impactos dos projectos e orientadas para a protecção das populações vulneráveis às consequências das alterações climáticas. Na Conferência de Glasgow a evidência científica foi, talvez pela primeira vez, a chama das discussões perante a dura realidade de que os objectivos de Paris não estão a ser atingidos e o Mundo se encontra cada vez mais vulnerável. Os inúmeros exemplos de catástrofes que culminaram este ano com dois exemplos recentes, incêndio no Colorado e cheias nos Açores, são a demonstração desta realidade.Tem vindo a ficar claramente evidente a incontornável necessidade de acelerar a redução de emissões através de acções de-comissionamento faseado do uso do carvão, da redução paulatina dos subsídios aos combustíveis fósseis e da aposta em investimentos verdes. Os factos científicos demonstram-nos que (1) se olharmos para a evolução global desde a perspectiva da temperatura,

que não deveria subir acima dos 1,5 °C até 2050, verificamos que a média, em 2020, cifrou-se em 1,1 ‑ 1,3 °C mais quente que em níveis pré-industriais, e que este valor cresce 0,1 - 0,3 °C a cada década. Perante isto, se nada mudar no querer mudar, a melhor estimativa face aos compromissos de Paris é atingir 2,7 °C de aquecimento em 2100 e (2) se olharmos para a evolução na perspetiva das toneladas de emissões poluentes a evitar, verifica-se que no período pré-Glasgow, existe um desvio entre 23 e 27 biliões de toneladas de emissões para a redução necessária até 2030 tendo por base as promessas dos países, as designadas National Determined Contributions (NDC). Como conclusão fica em falta reduzir aproximadamente 17-20 biliões de toneladas de CO2 para atingir o objectivo dos 1,5 °C (ver Figura 2).

Figura 1 Evolução da temperatura global de acordo com as promessas (Fonte: The CAT Thermometer).

* Climate Action Tracker – consórcio independente de organizações de cientistas que seguem e analisam as acções dos governos para o Clima.

Figura 2 Evolução das emissões de acordo com as promessas (Fonte: The Economist).

Prevê-se que no pós-Glasgow, as novas NDC contribuam para uma redução do aquecimento global previsto apenas em mais 0,3 °C e em termos de emissões apenas se reduz o desvio em 4biliões de toneladas, de acordo com o Climate Action Tracker*1 (Figura 1). As promessas na COP relativamente ao metano, carvão, veículos eléctricos e floresta contribuem com mais uma redução de 2 biliões de toneladas. No passado recente temos vindo a assistir à promessa de vários países de atingir emissões zero em 2050. A este propósito é justo realçar que Portugal foi o primeiro país do mundo a fazê-lo em 2016 na COP22 em Marraquexe. Reduzir 17biliões de toneladas de gases de feito estufa até 2030 corresponde a 45% de redução de emissões em comparação com níveis de 2010. Mesmo assim, os cientistas do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) admitem haver apenas 50% de probabilidade de limitar o aumento da temperatura global em 1,5 ºC em 2050. Talvez a mais importante resolução saída de Glasgow foi o de convencer os governos a reforçar os planos nacionais


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