dossier sobre recursos endógenos para energia
descarbonização à boleia do biogás O biogás e a sua utilização para a produção de biometano e metano sintético são ainda muito pouco desenvolvidos em Portugal. No entanto, possui um enorme potencial, podendo desempenhar um papel chave na fomentação da economia circular, bem como da redução de emissões, sobretudo num dos setores mais difíceis de descarbonizar, o da mobilidade. Nuno Afonso Moreira (nmoreira@dourogassgps.pt) Paulo Preto dos Santos (paulo.santos@dourogasrenovavel.pt) Joaquim Marques (joaquim.marques@dourogasrenovavel.pt)
Hoje em dia é universalmente aceite que as alterações climáticas são consideradas como uma das maiores ameaças para a humanidade. Por esta razão foram criados tratados como o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris, que visam a indicação de normas para a redução de emissões de gases com efeito de estufa (GEE). Em Portugal, estes objetivos estão representados no Plano Nacional de Energia e Clima 20202030 (PNEC 2030), que tem como principais metas a redução das emissões entre 45% e 55% em relação a valores de 2005, um aumento da eficiência energética para 35%, a incorporação de fontes de energia renovável no consumo final de energia de 47%, valor que deverá ser de 20% nos transportes, sendo que 15% das interligações deverão ser elétricas.
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Numa primeira iteração relativamente à melhor forma de alcançar uma transição energética bem-sucedida, a eletrificação total da sociedade foi encarada como sendo o caminho a seguir. No entanto, é atualmente reconhecida a dificuldade de descarbonizar setores da sociedade como a indústria ou a mobilidade pesada, utilizando apenas a eletricidade. Atualmente, as infraestruturas de gás são o principal mecanismo de fornecimento de energia aos consumidores em diversos países europeus, incluindo Portugal, sob a forma de gás natural, pelo que uma valorização deste ativo deve igualmente ser uma prioridade. Juntando estas duas componentes, os gases descarbonizados, como o hidrogénio verde ou o biometano, surgiram precisamente como uma resposta bastante eficaz a estas questões.
Neste sentido, a aposta no biometano, um gás renovável que possui caraterísticas bastante semelhantes ao gás natural fóssil, torna-se particularmente relevante. Hoje em dia, o método mais utilizado para a sua produção é através da purificação de biogás, uma mistura de gases composto por cerca de 60% de metano (CH4) e 40% de dióxido de carbono (CO2), podendo conter pequenas quantidades de outros gases como sulfureto de hidrogénio ou oxigénio. Através da purificação do metano do biogás, isto é, removendo os outros componentes até este gás possuir uma concentração de CH4 superior a 90%, estamos na presença de um gás natural renovável, o biometano. O biogás possui um grande potencial na atual transformação para uma sociedade que cada vez mais fará uso do conceito de economia circular, visto que é maioritariamente produzido através da digestão anaeróbia, utilizando resíduos para a sua produção, podendo assim estes últimos tornarem-se uma matéria-prima valiosa. Atualmente, o biometano, nomeadamente quando produzido através da purificação de biogás, é visto como um dos gases descarbonizados com maior potencial para o futuro a nível mundial. Em termos europeus, a produção de biogás e biometano já é uma realidade. De acordo com dados divulgados pela Associação Europeia para o Biogás, o número de unidades industriais de produção de biogás na Europa em 2019 foi de 18 943, e de biometano de 725. Em 2011, estes valores eram de 10 508 e 187, respetivamente. Apesar deste aumento significativo, a produção destes gases está ainda bastante longe do seu real potencial. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), a atual produção anual de biogás e biometano é de cerca de 35 milhões de toneladas de óleo equivalente (Mtoe). No entanto, este valor é bastante inferior ao potencial estimado para a produção de biogás, 570 Mtoe, e biometano, 730 Mtoe. De acordo