dossier sobre recursos endógenos para energia
projeto CHARCLEAN: valorização de biomassa através da produção de carvão vegetal A produção de carvão vegetal pode desempenhar um papel importante no contexto atual de prevenção de incêndios rurais e recuperação de áreas ardidas, uma vez que concorre para o desenvolvimento de soluções de proximidade e sinergias com outras tecnologias de valorização de biomassa. Daniel Neves, Luís Ruivo, Félix Charvet, Arlindo Matos, Luís Tarelho, José Silva, Teresa Nunes e Cátia Gonçalves Departamento de Ambiente e Ordenamento (DAO) & CESAM, Universidade de Aveiro
Introdução A biomassa desempenha um papel importante no abastecimento energético das sociedades, sobretudo quando existem recursos florestais disponíveis. Nos últimos anos, tem-se assistido também a um interesse crescente pela valorização de biomassa no contexto de roteiros para a neutralidade carbónica, circularidade da economia, e da produção de biocombustíveis e bioprodutos avançados. A problemática dos incêndios florestais, em particular no sul da Europa, veio fomentar o referido interesse. Efetivamente, a biomassa associada aos incêndios florestais – nas vertentes de prevenção e recuperação de áreas ardidas – junta-se à biomassa residual oriunda de atividades regulares ligadas à gestão florestal, agricultura, controlo de espécies invasoras, entre outras. O resultado tem sido uma crescente quantidade, variedade e dispersão da biomassa no território, para não referir a biomassa abandonada, que lança desafios acrescidos para a sua gestão/valorização. A valorização energética de biomassa em Portugal baseia-se principalmente em tecnologias de combustão. Um dos projetos pioneiros foi a central termoelétrica de Mortágua, com uma caldeira com capacidade para transformar mais de 100 kton/ano de resíduos florestais em electricidade [1]. Posteriormente, a dinâmica do setor da eletricidade renovável conduziu à construção de novas centrais, em regime de produção dedicada ou cogeração, levando a que a bioeletricidade represente hoje cerca de um décimo do total de eletricidade renovável produzida no país [2]. Existe também um mercado consolidado de pequenas unidades de combustão (tipicamente, de 0.01 a 1 MWth) para aquecimento de espaços e/ou processos. Além da
combustão, outra tecnologia bem conhecida é a densificação para a produção de pellets, existindo várias unidades de produção no país. Por outro lado, as tecnologias de gasificação, pirólise e destilação aparecem como pouco relevantes (ou mediáticas). A este respeito, suscita curiosidade o facto de existirem regiões no país onde estas tecnologias pouco conhecidas são usadas para a produção de carvão vegetal (pirólise de biomassa) de forma especialmente ativa. Por exemplo, é possível observar uma quantidade relevante de instalações de carbonização em operação na zona de Coruche. Segundo a comunicação social regional [3], um único carvoeiro pode operar dezenas de fornos e processar largas toneladas de biomassa por mês. Isto sugere que as atividades de produção de carvão vegetal podem ter uma dimensão considerável e que a quantidade de biomassa carbonizada a nível nacional pode ser significativa. Porquê a produção de carvão vegetal? Em Portugal, conclui-se que são limitadas as referências à utilização da tecnologia de carbonização (pirólise) para a valorização de biomassa residual. Contudo, especialmente no atual quadro de risco de incêndio florestal, é possível avançar várias razões para abordar o tema, nomeadamente:
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