Portugal, um país em pobreza energética

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editorial

Portugal, um paĂ­s em pobreza energĂŠtica

Amadeu Borges Diretor

Estranha-se, ainda mais, se tivermos em conta os inúmeros sucessos das políticas energÊticas que têm conduzido Portugal aos lugares cimeiros da produção renovåvel de energia, sempre aliada à redução das emissþes com efeito de estufa. Como Ê comum dizer-se nestas alturas, não bate a bota com a perdigota. )WXEQSW RS ½REP HE WIKYRHE HqGEHE HIWXI novo sÊculo, e com mais de 30 anos de fundos da Comunidade Europeia, parece que continuamos a não saber o que fazer. Apenas três países do leste da Europa (EslovÊnia, Hungria e Bulgåria) apresentam pior �ndice de Pobreza EnergÊtica que Portugal, em 25.º lugar neste índice (www.openexp.eu/european-energy-poverty-index-eepi, em dezembro de 2019). Sem querer entrar em comparaçþes, Espanha, com um clima semelhante ao de Portugal, surge na 12ª posição do �ndice Europeu de Pobreza EnergÊtica. Muitas razþes poderiam ser apontadas, mas sem dúvida, e tendo em conta os fatores que contribuem para o �ndice de Pobreza EnergÊtica, são destacadas as despesas com a fatura energÊtica como parte do orçamento domÊstico, a incapacidade de manter a casa quente no inverno, a incapacidade de manter a casa fresca no verão e residência em habitação com telhado que apresente fugas (www.openexp.eu/european-energy-poverty-index-eepiem dezembro de 2019). Olhando para estes fatores de forma pragmåtica, tudo se resume à incapacidade de investimento dos por tugueses para contrariar a WMXYEpnS ZIVM½GEHE EXVEZqW HSW GIVXM½GEHSW IRIVgÊticos emitidos pela ADENE, que se traduzem IQ HEW LEFMXEp~IW GSQ GPEWWM½GEpnS ' SY MRJIVMSV & q E GPEWWM½GEpnS QuRMQE PIKEP TEVE habitaçþes novas). Ora, esta incapacidade advÊm dos baixos rendimentos e do peso que a fatura da energia pode assumir no orçamento mensal das famílias se estas pretenderem garantir o necessårio conforto tÊrmico no interior das suas habitaçþes. Como consequência, as famílias evitam o consumo de energia para aquecer ou arrefecer as 2

Estando Portugal fortemente empenhado e comprometido com as metas europeias para um abasXIGMQIRXS ½jZIP HI IRIVKME QERXIRHS SW TVIpSW EGIWWuZIMW IWXVERLE WI E FEREPM^EpnS HE I\TVIWWnS pobreza energÊtica a que se tem assistido nos últimos meses.

habitaçþes, convergindo para situaçþes em que o estado de saúde pode ser afetado de forma QYMXS WMKRM½GEXMZE 7IVj RIGIWWjVMS UYI SW HIGMsores políticos tenham em conta as estimativas da Organização Mundial de Saúde que atribuem 100 000 mortes prematuras por ano na Europa devido às condiçþes inadequadas das habitaçþes, devido à incapacidade de garantia de conforto tÊrmico no inverno, humidade e outras patologias associadas às baixas temperaturas e à humidade (www.euro.who.int, em dezembro de 2019). Restarå saber quantas destas mortes prematuras, por exposição ao frio na habitação, ocorrerão em Portugal. % QIPLSVME HE I½GMsRGME IRIVKqXMGE HEW LEFMtaçþes, só possível com investimento, farå com que a fatura da energia diminua. Torna-se necessårio e urgente um programa para a melhoria da I½GMsRGME IRIVKqXMGE I UYI WINE EGIWWuZIP E XSHEW EW JEQuPMEW GYNE LEFMXEpnS TSWWYE YQE GPEWWM½GEção energÊtica inferior a B-. Só assim serå possível garantir conforto tÊrmico ao mesmo tempo UYI WI GSRWSQI IRIVKME HI JSVQE QEMW I½GMIRXI Todos sairão a ganhar, diminuindo a pobreza e a intensidade energÊtica de Portugal. Serå igualmente relevante a redução do peso de taxas e impostos associados ao preço pago pela energia nas habitaçþes. Portugal tenta contrariar a situação atravÊs da tarifa social da eletricidade e do gås natural, introduzindo descontos nas faturas dos utilizadores economicamente mais vulneråveis. Mas isto RnS WIVj WY½GMIRXI HIZIRHS GSQIpEV TSV WIV questionado o limiar a partir do qual um utilizador de energia deixa de ser economicamente vulneråvel. Não poderå ser esquecido que os baixos rendimentos e a incapacidade de investimento para E QIPLSVME HE I½GMsRGME IRIVKqXMGE REW LEFMXEçþes conduzem a situaçþes de desespero, principalmente no inverno, levando os portugueses a adotar comportamentos e a adquirir equiTEQIRXSW TSYGS I½GMIRXIW QYMXEW ZI^IW GSPScando a saúde em risco e a gastarem mais do que seria expectåvel.

% QIPLSVME HE I½GMsRGME IRIVKqXMGE das habitaçþes, só possível com investimento, farå com que a fatura da energia diminua.

A Rede Europeia de Ação Climåtica (CAN-Europe) defende que Por tugal precisa de QYHERpEW QYMXS WMKRM½GEXMZEW TVMRGMTEPQIRXI RS UYI HM^ VIWTIMXS k )½GMsRGME )RIVKqXMGE HEW habitaçþes. A CAN-Europe refere que o Plano Nacional de Energia e Clima, apresentado por PorXYKEP HIZIVME HI½RMV QIHMHEW TEVE E QIPLSVME do conforto tÊrmico e para a redução da fatura energÊtica. Refere ainda que as medidas previstas ao nível do setor da construção civil são insu½GMIRXIW TEVE UYI I\MWXE YQE IJIXMZE VIHYpnS RS consumo de energia. Por último, faz ainda uma forte crítica no que diz respeito às emissþes com efeito de estufa associadas aos transportes, responsåveis por 25% das emissþes nacionais, não WIRHS HI½RMHEW ZIVHEHIMVEW WSPYp~IW HI XVERWMção energÊtica, nem tão pouco, outras apostas, alternativas ao setor rodoviårio, a par do que se ZIVM½GE IQ SYXVSW TEuWIW IYVSTIYW Apesar de tudo, Portugal mantÊm duas ambiçþes importantes - a redução das emissþes globais para 37,8 milhþes de toneladas por ano de CO2 equivalente e o aumento para 47% de energia renovåvel para 2030. No entanto, nenhuma meta para a diminuição da pobreza energÊtica Ê apontada. Parece que Portugal continuarå a contribuir de forma empenhada para uma Europa descarbonizada, esquecendo, no entanto, que os cidadãos portugueses são, tambÊm, europeus e que estes deveriam ter acesso ES QIWQS GSRJSVXS XqVQMGS UYI WI ZIVM½GE REW habitaçþes dos países com um �ndice de Pobreza EnergÊtica mais baixo. Curiosamente, Ê com estes países (SuÊcia, Finlândia e Dinamarca) que Portugal se compara ao objetivo de alcançar emissþes líquidas nulas atÊ 2045.


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