Condições do Saneamento Básico das Comunidades Tradicionais de Aracaju e São Cristóvão
realização
CHÃO Assessoria Técnica Popular
autores
Amanda Brenda Santos Macedo
Augusto Cruz Barreto
Isabela Pinheiro Bomfim
coautores
Associação Comunitaria dos Moradores do Loteamento Senhor do Bonfim (ACMLSB
Rosana Silva Santana de Jesus (Liderança de Arame 1)
Prof° Dr. José Jailton Marques (DEAM - UFS)
design e ilustração
Emilly Arielle Santos Silva
fotografia
Adriano Gardênio Santos de Jesus
Amanda Brenda Santos Macedo
Isabela Pinheiro Bonfim
Mariana Isla Vargas de Oliveira
Osmir Marinho Bezerra Filho
apoio
Habitat Para a Humanidade Brasil
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Sergipe (SINDISAN)
IBSN
Nº 978-65-983296-0-0
Amanda Brenda Santos Macedo
Augusto Cruz Barreto
Isabela Pinheiro Bomfim
Condições do Saneamento Básico das Comunidades Tradicionais de Aracaju e São Cristóvão
Aracaju, 2024
sumário apresentação introdução 06 06 O Dossiê Territórios Tradicionais e Populares do Dossiê O que é saneamento básico? Um panorama do saneamento em Aracaju e São Cristóvão Águas produtivas 06 07 07 09 15 Quem é a CHÃO? 06
como está e como queremos nossa comunidade
Abastecimento de água
Coleta e tratamento de esgoto sanitário
Coleta e destinação de resíduos sólidos
Drenagem de águas pluviais
Águas produtivas
planos populares e o saneamento das comunidades
metodologia
18 16 36 40 Loteamento
do Bonfim Arame
considerações finais
Senhor
I
Primeiro contato Oficinas de construção Análises das condições dos serviços 18 22 28 30 31 33 34 16 16 17
introdução apresentação
O DOSSIÊ QUEM É A CHÃO?
A Chão Assessoria Técnica Popular é uma Organização da Sociedade Civil (OSC), sem fins lucrativos, formalizada desde 2022, que atua em Sergipe em defesa do direito à cidade e à moradia através da assessoria técnica popular em conjunto com comunidades vulneráveis socialmente e ambientalmente. O coletivo, formado em sua maioria por profissionais de arquitetura e urbanismo, engenharia ambiental e geografia, parte de uma abordagem interdisciplinar (em consonância com os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) e conjunta com associações comunitárias, coletivos urbanos, comunidades não organizadas, movimentos sociais da cidade, do campo, das águas e dos mangues. Sendo assim, a Chão Assessoria tem buscado fortalecer tecnicamente os territórios tradicionais e populares em pautas fundamentais para a garantia integral do direito à cidade, a partir da identificação de problemáticas e construção de estratégias contextualizadas à realidade de cada comunidade.
O Dossiê das Águas constitui-se como um instrumento de fortalecimento às reivindicações das comunidades tradicionais assentadas no Loteamento Senhor do Bonfim e na comunidade de Arame I, relativas ao acesso às águas necessárias para a constituição do saneamento em territórios tradicionais e populares.
O objetivo central da produção desse Dossiê é impulsionar a atuação comunitária em rede no âmbito das pautas urbanas e ambientais, com foco na defesa dos direitos dos povos e comunidades tradicionais buscando alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável de números 3, 6, 11 e 14, uma vez que espera-se que os frutos desse Dossiê Popular contribuam para a construção de cidades socialmente viáveis, ambientalmente sustentáveis e com pleno acesso à água e ao saneamento. Nesse sentido, esse documento foi construído coletivamente com as comunidades citadas acima, a partir de intervenções pedagógicas apoiadas no método popular freiriano para facilitar as discussões e ouvir o que a comunidade tem a dizer sobre o seu passado, presente e o futuro que almejam para os seus territórios.
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TERRITÓRIOS
TRADICIONAIS E POPULARES DO DOSSIÊ
Além de territórios populares, as comunidades do Loteamento Senhor do Bonfim (em Aracaju, Sergipe) e do povoado Arame I (em São Cristóvão, Sergipe) também são comunidades tradicionais que resistem e carregam consigo saberes, histórias e tradições. Nesse viés, aquelas e aqueles que residem nesses territórios conservam consigo a capacidade de conviver em harmonia com os processos naturais do meio ambiente, se não fosse a ação do planejamento estatal cooptado pelos interesses privados. Pois, historicamente, os povos e as comunidades tradicionais (PCT’s) são manejadores habilidosos da biodiversidade já que os modos de vida construídos e apropriados tanto materialmente quanto culturalmente estão diretamente associados ao manejo da água, da terra, dos minerais e de outras diversas formas de vida.
As culturas tradicionais estão associadas a modos de produção que antecedem a existência da sociedade marcada pelo capital, ou seja, modos de vida próprios de sociedades em que o trabalho ainda não se tornou mercadoria, em que a dependência do mercado já existe enquanto construção social, mas não representa uma totalidade. Nesses territórios a organização popular é o carro chefe da casa, fazendo-se essencial diante da falta de políticas públicas que
objetivem promover melhorias dignas na vida das famílias. Tanto a comunidade do Loteamento Senhor do Bonfim quanto a comunidade de Arame I estão compreendidas na abrangência dos impactos da exploração de petróleo na Bacia Alagoas/Sergipe e seguem numa luta permanente para serem compensados pela Petrobrás.
Sendo assim, faz-se fundamental que as lutas dos povos que historicamente resistem e vivem à luz de saberes ancestrais nas periferias e franjas urbanas, sejam cada vez mais conhecidas tanto pelos seus desafios quanto por suas potencialidades de auto organização, enquanto um mecanismo de denúncia as violências de classe e de proteção das identidades coletivas e tradicionais que movimentam esses territórios.
O QUE É SANEAMENTO BÁSICO?
Para iniciarmos o debate deste dossiê, primeiro é preciso entender o que é o saneamento básico. Para isso, recorremos a Lei 14.026 de 2020, o Novo Marco Legal do Saneamento, que define Saneamento Básico como o conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de: abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejos de resíduos sólidos, drenagem e manejo de águas pluviais urbanas. Por esta definição, temos que o saneamento básico é fundamental para
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o desenvolvimento socioeconômico de uma região, uma vez que, está envolvido em atividades humanas de toda ordem, desde as básicas a manutenção da vida, como beber água e acesso a higiene, até as mais diversas decorrente da complexidade da sociedade moderna capitalista com elevados padrões de consumo, que geram imensas quantidades de todo tipo de resíduos que degradam o ambiente.
Devido à sua importância e complexidade, o saneamento básico é norteado e regulado por um conjunto de leis de todas esferas do Estado Brasileiro, como também normas e portarias de órgãos públicos, que tratam desde diretrizes para implementação de planos de saneamento, até a definição dos parâmetros de qualidade dos serviços. Dentro do que foi pensado neste dossiê, tratamos com maior foco do Plano Nacional de Saneamento Básico (PNSB) e do Novo Marco do Saneamento, Lei 11.445 de 2007 e Lei 14.026 de 2020, respectivamente, as principais leis a nível nacional do saneamento. A primeira representou um primeiro marco nas políticas públicas no saneamento do país, modernizando e trazendo diversos conceitos e instrumentos legais de gestão e operação para esses serviços. Já a segunda tornou-se um novo marco, já que faz uma série de alterações em princípios, metas e instrumentos de gestão e financeiros em outras legislações, inclusive no PNSB. Portanto, para entender melhor o que é saneamento básico é preciso
apresentar um pouco melhor essas legislações.
Começando pelos princípios do Plano Nacional de Saneamento, que foram modificados pelo Novo Marco do Saneamento, temos como um princípio fundamental a universalização do acesso e efetiva prestação dos serviços, que se trata de garantir gradativamente a todos os domicílios ocupados o acesso ao saneamento básico. Bem complementado pelos princípios da garantia aos serviços de segurança, qualidade, regularidade e continuidade e o de integralidade que presa pela articulação das partes de cada um dos serviços de forma a garantir que todas as necessidades da população. Esse conjunto de princípios são fundamentais para entender e agir quanto à situação encontrada nas comunidades tradicionais apresentadas neste dossiê, que enfrentam lutas em busca da garantia a um saneamento básico de qualidade, que possa proporcionar uma vida digna às pessoas que vivem nesses territórios. Para além dos princípios, é preciso fazer um apanhado das metas estabelecidas pela Lei 14.026 de 2020, sendo a universalização do acesso ao saneamento básico a principal meta a ser alcançada por todo o país até 2033. Um prazo não tão distante e que se coloca como um desafio para o Estado Brasileiro, que não tem um
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bom histórico quanto a essa temática, portanto, é preciso uma mudança radical partindo das bases populares, que possa reivindicar uma tomada acelerada desse processo, partindo de grandes investimentos de todas esferas públicas.
Partindo de esferas mais gerais para a de implementação e operação, o Plano de Saneamento Básico é um instrumento criado pelas prefeituras para definir as prioridades de investimento, determina soluções para serviços, enfim, é quem orquestra o plano no município, tendo por base legal a Lei 11.445 de 2007. O Art. 51 do Plano Nacional de Saneamento Básico, garante a possibilidade da ampla participação popular no processo de elaboração e revisão dos planos de saneamento básico, com audiências e consultas públicas, como também dos órgãos colegiados municipais, estaduais e federais. Assim, os Plano de Saneamento são importantes instrumentos que devem ser disputados pelos movimentos sociais, sindicatos,comunidades organizadas, entre outras formas de organização popular em busca de garantir que o saneamento básico será prioridade dentro do orçamento municipal e que siga os interesses do povo, garantindo acesso a água, esgotamento sanitário e a um ambiente equilibrado, saudável e seguro.
Por fim, um último importante destaque a ser feito é que um dos objetivos da Política Nacional de Saneamento Básico é proporcionar condições adequadas de salubridade
ambiental para povos e comunidades tradicionais, como descrito em seu Art. 49 inciso III. Deve ser então obrigação do Estado Brasileiro, em todas suas esferas, buscar formas de garantir que os PCT’s tenham acesso aos serviços de saneamento, mas não apenas isso, como também garantir que atenda suas características socioculturais, respeitando suas tradições e modos de vida. Esse objetivo está de acordo com aquilo que garante o Decreto 6.040 de fevereiro de 2007, que estabelece a Política Nacional de Desenvolvimento dos Socioambientais de Povos e Comunidades Tradicionais. Tanto o Barrosinho como Arame I têm os direitos ao acesso aos serviços de saneamento de qualidade descumpridos, ferindo o que é garantido por essas leis, os quais são o foco central da denúncia apresentada neste Dossiê.
UM PANORAMA DO SANEAMENTO EM ARACAJU E SÃO CRISTOVÃO
Apresentado o que é saneamento básico, os princípios norteadores da Política Nacional de Saneamento Básico e do Novo Marco do Saneamento, junto a suas metas para a universalização, podemos é partir para ter uma visão geral do atual estado desses serviços, no Brasil, em Sergipe e nos municípios de São Cristóvão e Aracaju, para que possamos entender o contexto em que estão inseridas as comunidades de Arame 1 e Barrosinho. Os dados utilizados neste panorama são os do Sistema Nacional de Informações do
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Saneamento (SNIS), que desde 2021, são informados à Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) pelos prestadores de serviços de saneamento anualmente. Os dados apresentados são os publicados no SNIS de 2022, uma vez que os dados de 2023 ainda não foram enviados ao sistema pelas prestadoras dos serviços, DESO e SAAE São Cristóvão, até o momento da escrita deste documento em fevereiro de 2024.
Dentre todos os serviços de saneamento básico, o abastecimento de água é o que está mais próximo de alcançar um acesso universal em todo o país. Essa tendência nacional é acompanhada em Sergipe, Aracaju encontra-se com 98,87% dos domicílios abastecidos, já
São Cristóvão conta o abastecimento de toda população, segundo dados do SNIS apresentados na Tabela 1.
Sendo o mais essencial à reprodução da vida, o acesso à água tem uma clara prioridade para alcançar a universalização, contudo o maior desafio que está posto nesse serviço é a garantia de regularidade e qualidade, bem como a redução de perdas. Em Sergipe temos a maior perda de água dentro das apresentadas na Tabela 1, com 57,6% de perda de toda água que é tratada, seguida de perto por São Cristóvão 55,97%, já Aracaju está com uma perda menor de 44,76%, mas em todos os casos as perdas são bastante superiores à média nacional de 37,78%.
TABELA 1 | INDICADORES DO SERVIÇO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA
FINANCEIROS
¹ Percentual da água que é produzida e é macromedida, tem alguma forma de medição na rede de distribuição.
² Indisponível : A população urbana residente não foi publicada pelo IBGE no censo de 2022.
Fonte: Elaborada pelos autores com base no SNIS, 2022.
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Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe Tarifa de água (R$/m³) 6,58 4,52 6,01 5,09 Tarifa água/esgoto (R$/m³) 6,01 4,14 5,70 4,56 Despesa por m³ (R$/m³) 7,4 6,14 6,39 4,39 Suficiência de caixa (%) ¹ 108,41 17,81 107,82 109,27 Perdas faturamento (%) 32,44 46,75 42,36 32,62 Perdas distribuição (%) 44,76 55,97 57,6 37,78 Perdas lineares (m³/dia*km) 42,47 24,45 32,58 23,97 Atendimento total (%) 98,87 100 91,62 84,92 Atendimento Urbano (%) 98,87 Indisponível² Indisponível² Indisponível² Consumo per capita (l/hab.*dia) 133,57 87,88 109,39 148,19 Consumo economia (m³/mês*econ.) 8,86 7,56 9,06 11,12 Perdas ligação (l/lig.*dia) 326,37 406,18 462,78 337,71 Brasil PERDAS DE ÁGUA CONSUMO ATENDIMENTO TABELA 4 | INDICADORES DO SERVIÇO DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS
Isso demonstra a precariedade dos sistemas de distribuição da água tratada, representando grandes perdas de um recurso tão valioso a vida e custoso de ser tratado e distribuído, tanto que um dos princípios norteadores do Plano de Saneamento Nacional é a de Redução de Perdas (Lei 14.026/2020, Art. 7, Inciso XIII), o que exige uma prioridade de investimento na manutenção e melhoria da rede de distribuição. Quando se trata de coleta e tratamento de esgoto, temos uma redução drástica do alcance do atendimento se comparado ao abastecimento de água em todos os casos apresentados na Tabela 2. Em São Cristóvão, apenas 32,4% das unidades residenciais têm esgoto coletado, uma cobertura muito pequena, já em Aracaju temos um cenário melhor, com 72,7% de conexões. Ao se considerar o tratamento, todo esgoto coletado em Aracaju e São Cristóvão é tratado, pelo que é tinformado pela DESO à ANA, sendo que, pelas estimativas, isso representa
TABELA 3 | INDICADORES DO SERVIÇO DE COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
72,7% de todo esgoto gerado em Aracaju e 32,4% em São Cristóvão.
Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe
FINANCEIROS
Despesa per capita (*) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível
O estado atual do serviço de coleta e tratamento de esgoto é muito preocupante em todo o Brasil, em especial no Nordeste onde apenas 41,2% dos lares têm conexão com a rede de esgoto, o que resulta em graves consequências como a poluição de rios e suas regiões de influência como mangues e brejos. Em São Cristóvão os indicadores apresentados na Tabela 2, demonstram uma situação ainda pior que a média brasileira. Em Aracaju, apesar de uma maior cobertura, em valores totais o esgoto não tratado tem um volume muito maior, dado o tamanho da população de mais de 600 mil habitantes. Isso tem um claro resultado que é o estado degradado apresentado pelos rios de Aracaju, que apesar de ser banhada por diversos rios, tem a maior parte do seu abastecimento feita com águas trazidas do rio São Francisco que tem maior qualidade e muitas vezes é usada na diluição para
ATENDIMENTO
Fonte: Elaborada pelos autores com base no SNIS, 2022.
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Despesa RSU/prefeit. (%) 6,43 5,13 4,62 3,46 Autossuficiência (%) - 1,35 8,28 53,81 Custo de coleta (R$/t) 186,13 56,87 189,57 193,48 Custo variação (R$/km) 157,77 - 103,57 135,771 Cobertura total (%) 100 90,08 89,48 90,39 Cobertura Urbana (%) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa coletada total (kg/hab.*dia) 1,31 1,25 82,47 81,64 Massa coletada urbana (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa RDO coletada (kg/hab.*dia) 0,97 0,60 0,90 0,81 Massa coletada reciclável (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa recuperada (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Cobertura porta a porta (%) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Taxa de recuperação (%) 0,68 - 1,32 2,37 Brasil
COBERTURA OPERACIONAIS
Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe Tarifa de esgoto (R$/m³) 5,07 2,74 4,99 4,56 Tarifa água/esgoto (R$/m³) 6,01 4,14 5,70 4,56 Coleta esgoto (%) 72,73 32,4 38,17 60,73 Extensão rede (m/lig) 3,59 4,99 5,3 10,08 Atendimento total (%) 73,28 28,06 34,71 56 Atendimento Urbano (%) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Coletado tratado (%) 100 100 82,47 81,64 Tratamento / Consumo (%) 72,73 32,40 38,14 52,23 Brasil
TABELA 2 | INDICADORES DO SERVIÇO DE COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO FINANCEIROS
OPERACIONAIS
TRATAMENTO DE ESGOTO
alcançar melhores parâmetros de qualidade.
Em se tratando da coleta e destinação dos resíduos sólidos, temos um cenário melhor quanto a abrangência do atendimento nos dois municípios, tem todos os resíduos domésticos coletados em Aracaju e 90,1% em São Cristóvão. Entre as residências não atendidas estão parte da comunidade de Arame I e a comunidade de Ilha Grande, que também é uma comunidade tradicional de pesca artesanal, localizada em uma ilha estuarina no rio Vaza Barris. Por se tratar de uma ilha, para garantir uma destinação adequada dos resíduos sólidos é preciso disponibilizar uma forma de transportar pelo rio os
resíduos recolhidos, serviço esse que a prefeitura não disponibiliza, tendo como justificativa a falta de cláusulas para esse serviço em seu contrato com a prestadora de serviço de coleta de resíduos. Em ambos os casos citados, os comunitários optam pela queima de lixo, por falta de destinação mais adequada, o que gera impactos negativos à comunidade, pela poluição do ar, a falta de solução para os resíduos da queima, fora outra série de riscos à saúde envolvidos.
Já sobre a destinação, os resíduos de Aracaju e São Cristóvão são todos destinados ao aterro sanitário operado pela empresa Orizon Valoração de Resíduos, que fica localizado no
TABELA 3 | INDICADORES DO SERVIÇO DE COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
FINANCEIROS
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Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe Despesa per capita (*) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Despesa RSU/prefeit. (%) 6,43 5,13 4,62 3,46 Autossuficiência (%) - 1,35 8,28 53,81 Custo de coleta (R$/t) 186,13 56,87 189,57 193,48 Custo variação (R$/km) 157,77 - 103,57 135,771 Cobertura total (%) 100 90,08 89,48 90,39 Cobertura Urbana (%) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa coletada total (kg/hab.*dia) 1,31 1,25 82,47 81,64 Massa coletada urbana (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa RDO coletada (kg/hab.*dia) 0,97 0,60 0,90 0,81 Massa coletada reciclável (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Massa recuperada (kg/hab.*dia) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Cobertura porta a porta (%) Indisponível Indisponível Indisponível Indisponível Taxa de recuperação (%) 0,68 - 1,32 2,37 Brasil COBERTURA OPERACIONAIS Fonte: Elaborada pelos autores com base no SNIS, 2022.
município de Rosário do Catete, 39 km distante da capital sergipana. É importante destacar que esse mesmo aterro sanitário foi interditado por diversas ações judiciais da Procuradoria-Geral do Município de Aracaju junto ao Tribunal de Justiça de Sergipe, motivadas por denúncias da Administração Estadual de Meio
Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe
TABELA 1 | INDICADORES DO SERVIÇO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA FINANCEIROS
um investimento público maciço no fortalecimento dessas instituições, assim como nas próprias empresas estatais que prestam o serviço.
Ambiente sobre irregularidades no funcionamento do aterro (PORTAL GE, 2023). O funcionamento de todo o sistema de coleta de resíduos sólidos foi interrompido por alguns dias, causando transtornos em toda região metropolitana, tendo como resultado mudanças na prestadora do serviço e uma série de exigências quanto à regulação da operação a serem cumpridas. Esse caso demonstra a importância de uma forte atuação dos órgãos ambientais do estado e municípios na fiscalização dos serviços de saneamento. É necessário
¹ Percentual da água que é produzida e é macromedida, tem alguma forma de medição na rede de distribuição.
² Indisponível : A população urbana residente não foi publicada pelo IBGE no censo de 2022.
Quanto à drenagem e manejo de águas pluviais, uma das principais questões a se observar neste dossiê é a relação com o risco, tanto de deslisamento de terra como de inundação ou alagamento, uma vez que esses eventos acontecem quando fortes ou prolongadas chuvas encontram morros, várzeas, beiras de rios e mangues habitados de forma precária, como é o caso de muitas comunidades tradicionais e não é diferente em Arame I. A drenagem e manejo dessas águas das chuvas toma então um papel fundamental na minimização dos riscos, acompanhada de estudos e investimentos sérios em segurança e recuperação dos ambientes, em conjunto com melhorias habitacionais e de infraestrutura nos
DE RISCO
Fonte: Elaborada pelos autores com base no SNIS, 2022.
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Tarifa de água (R$/m³) 6,58 4,52 6,01 5,09 Tarifa água/esgoto (R$/m³) 6,01 4,14 5,70 4,56 Despesa por m³ (R$/m³) 7,4 6,14 6,39 4,39 Suficiência de caixa (%) ¹ 108,41 17,81 107,82 109,27 Perdas faturamento (%) 32,44 46,75 42,36 32,62 Perdas distribuição (%) 44,76 55,97 57,6 37,78 Perdas lineares (m³/dia*km) 42,47 24,45 32,58 23,97 Atendimento total (%) 98,87 100 91,62 84,92 Atendimento Urbano (%) 98,87 Indisponível² Indisponível² Indisponível² Consumo per capita (l/hab.*dia) 133,57 87,88 109,39 148,19 Consumo economia (m³/mês*econ.) 8,86 7,56 9,06 11,12 Perdas ligação (l/lig.*dia) 326,37 406,18 462,78 337,71 Brasil
PERDAS
DE ÁGUA CONSUMO ATENDIMENTO
GERAIS Indicadores Aracaju São Cristovão Sergipe Área URB/TOT (%) 100,00 5,90 27,10 11,30 Densidade urbana (dom./ha) 11,00 10,00 1,00 0,70 Taxa pavimenta. (%) 86,90 51,80 62,90 68,80 Canais subterrâneos (%) 23,00 29,30 4,10 24,80 Parques lineares (%) - - 20,60 3,10 Canais abertos (%) 1,80 - 58,20 19,70 Canais fechados (%) 0,00 - 28,90 8,20 Domicílios em risco (%) Indisponível 45,60 3,20 4,30 População realocada (pes./10^5hab.) 6,43 - 53,00 406,00 Reservatórios (m³/km²) 313,70 - 2823,94 9852,27 Captações (und./km²) 140,00 26,00 6,00 10,00 Brasil INFRAESTRUTURA GESTÃO
TABELA 4 | INDICADORES DO SERVIÇO DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS
locais expostos a esse risco.
Os desastres causados por inundações e deslizamentos de terra resultam de uma produção do espaço urbano capitalista, que tanto degrada e desrespeita a natureza, como força as populações mais empobrecidas a habitar de forma precária ambientes de risco. Aracaju é um belo exemplo de como a especulação imobiliária atuou e atua desta forma para aumentar seus lucros. Como consequência disso, a cidade tem graves problemas com inundações e alagamentos em períodos chuvosos.
Um agravante é a grande quantidade de canais de drenagem construídos para canalização sobre leitos de rios, que indevidamente recebem grandes quantidades de esgoto e resíduos sólidos diariamente, intensificando a poluição dos rios e prejudicando o sistema de drenagem urbana.
Partindo para uma análise dos dados apresentados na Tabela 4, podemos observar uma grave situação, pois 45,6% dos domicílios de São Cristóvão estão sob algum tipo de risco. Este fato se explica pela geomorfologia da região ser de
relevo ondulado a fortemente ondulado, tendo assim muitas residências em risco a movimentações de terra, o que se configura como um desafio à gestão municipal para lidar com uma realidade tão preocupante. Já em Aracaju, o dado encontra-se indisponível, fato que demonstra despreparo em relação às ações preventivas e emergenciais, principalmente quando se considera o histórico de grandes perdas materiais para o povo trabalhador da capital sergipana e a intensificação dos efeitos das mudanças climáticas na cidade.
ÁGUAS PRODUTIVAS ÁGUAS DE PRODUÇÃO PARA PESCA E AGRICULTURA
As comunidades de Arame 1 e Barrosinho são comunidades tradicionais de pescadores e pescadoras artesanais, que têm pela essência de seus modos de vida uma relação profunda com as águas, seja o rio, a lagoa, o mangue ou o mar. Portanto, para tratarmos do acesso ao saneamento básico como um todo, é preciso falar do acesso e usos das águas do mangue e do rio. Isto pois, ao observar o III objetivo da Política Nacional de Saneamento Básico, que é garantir um ambiente salubre para os povos e comunidades tradicionais, respeitando seus costumes e tradições, ter um mangue e rio saudável e livre é também parte dos objetivos do saneamento. Portanto, este dossiê não se resume a uma análise dos serviços de saneamento, mas sim um dossiê das águas das comunidades tradicionais. Partindo desse lugar, as águas produtivas são as águas fundamentais para as atividades de coleta e produção de alimentos, como as águas do mangue - que são fundamentais para a subsistência para as famílias que vivem da mariscagem, e as águas dos rios - que são essenciais para as famílias que dependem da agricultura familiar e da pesca artesanal. Portanto, não há como pensar uma proposta de saneamento justa para a comunidade sem considerar os impactos que a
Figura 01: Criança da comunidade Arame I brincando às margens do rio Panteão Foto: Mariana Isla, 2024.
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carcinicultura produz na qualidade das águas do rio da comunidade de Arame I, e sobretudo, no cuidado das águas que são indispensáveis para a preservação do modo de vida dos povos e comunidades tradicionais.
metodologia
Neste capítulo dedicamos um pouco de tempo para falar da metodologia que foi usada para construção do Dossiê das Águas, como foi construído junto às comunidades do Barrosinho e Arame I.
A Chão, enquanto assessoria técnica, se identifica como Popular devido a sua fundamentação nos métodos populares, construídos pelos movimentos sociais e comunitários, povos tradicionais e diversas organizações desenvolveram em suas lutas pela terra, por habitação e em defesa de seus modos de vida e territórios, criando assim, um rico acúmulo político e técnico-científico. Também dialogamos com aqueles que construíram grandes contribuições teóricas à luta popular como Paulo Freire sua teoria da pedagogia e educação, Ranulfo Peloso e seus ensinamentos sobre trabalho de base e Frederico Loureiro e a educação ambiental crítica. É a partir desses saberes que buscamos construir nossa forma de trabalhar, que apresentamos um pouco aqui.
PRIMEIRO CONTATO
O primeiro contato que tivemos com as comunidades para a construção deste dossiê, foi um diálogo com as lideranças comunitárias de Arame 1 e Barrosinho, acerca das temáticas que queríamos
OFICINAS DE CONSTRUÇÃO
As oficinas de construção do Dossiê foram pensadas tendo dois encontros, sendo o primeiro o de construção da avaliação onde o objetivo era determinar os problemas, suas origens e como afetam os comunitários. Já o segundo encontro foi pensado como um momento de devolutiva a comunidade, apresentando a síntese construída nesse documento, como forma de referendar o trabalho e também contribuir pro processo de apropriação dessa ferramenta para a luta pela universalização do saneamento.
A primeira visita foi realizada com base em duas metodologias, sendo a primeira a Árvore de Problemas, uma metodologia popular utilizada na facilitação da construção de planejamentos populares, na qual se reflete sobre a origem e história da comunidade nas raízes da árvores, os problemas atuais em seu tronco e, por fim, nas folhas e frutos, é pensado aquilo que os comunitários querem para ter uma melhor vida em seu território. Essa metodologia foi utilizada a fim de construir junto à comunidade tratar neste projeto e qual a nossa proposta de construção conjunta. Um roteiro semiestruturado foi utilizado para nos guiar na conversa, de forma a poder entender a situação dos serviços de saneamento na comunidade, que serviu de base para os primeiros estudos e preparo das oficinas de construção do Dossiê.
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a primeira etapa do diagnóstico dos serviços de saneamento, bem como pensar um conjunto de reivindicações apresentadas nos capítulos seguintes. Para a segunda etapa das oficinas foi pensada a construção do mapeamento dos problemas levantados, com bases nas metodologias de cartografia social, construindo uma síntese espacializada dos relatos e denúncias feitas pela comunidade.
Já no segundo encontro com a comunidade teve como objetivo realizar uma devolutiva do trabalho produzido a partir da primeira reunião, bem como realizar um alinhamento estratégico sobre as reivindicações e articulações a serem construídas a partir deste Dossiê.
ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DOS SERVIÇOS
A análise e sistematização produzida pela equipe técnica da Chão parte de uma análise qualitativa que se utilizou da observação, entrevista semiestruturada, registros fotográficos, árvore de problemas e cartografia social. A análise dos serviços foi baseada em alguns critérios básicos, como: se é oferecido, qual a qualidade, se funciona com regularidade, entre outras questões abordadas nas oficinas. Também foram apontadas irregularidades e reflexões perante as normas, legislações, políticas públicas e planos governamentais. Para construção dos mapas foram utilizados os dados geográficos do IBGE e imagens de satélite do Google. Assim, foi possível desenvolver o diagnóstico apresentado no capítulo seguinte.
Figura 02, 03, 04 e 05: Registros de metodologias utilizadas nas oficinas de construção do dossiê nas comunidades Fotos: Mariana Isla, 2024.
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como está e como queremos nossa comunidade “ ”
Neste capítulo apresentaremos as comunidades tradicionais deste dossiê. Serão contextualizadas as comunidades do Loteamento Senhor do Bonfim e do Povoado Arame I, a partir da análise dos serviços de saneamento construída em conjunto com os moradores, compreendendo os problemas que os afetam e o que necessitam para suas comunidades. Para melhor compreensão utilizaremos fotografias e mapas resultantes das oficinas de construção do dossiê. Também serão apresentados quadros com a síntese do que foi avaliado sobre os serviços de saneamento para que, a partir deles, possamos fazer algumas considerações sobre o estado desses serviços e impactos na vida dessas comunidades.
LOTEAMENTO SENHOR DO BONFIM
A comunidade do Loteamento Senhor do Bonfim fica localizada no bairro Farolândia, zona sul de Aracaju, que
Foto: Isabela Pinheiro, 2021
pode ser visto no mapa da Figura 6. Localizada no sul da Farolândia, bairro ocupado em sua maior parte pela classe média de Aracaju, a comunidade possui uma dinâmica urbana própria de um bairro periférico da capital, como pode ser visto no mapa da Figura 7. Popularmente conhecida como Barrosinho, nome atribuído a ocupação inicial do Loteamento que foi realizada por famílias que viviam somente da pesca artesanal, a comunidade possui até hoje heranças de sua história de resistência. O território enfrenta atualmente os desafios de conservar a sua cultura comunitária tradicional, por conta da pressão do capital que tem promovido uma expulsão silenciosa e bastante violenta de todos os moradores do Loteamento Senhor do Bonfim, por meio da falta de perspectivas de trabalho, pelo aumento do custo de vida na localidade e pela supressão dos
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modos de vida tradicionais devido a poluição dos rios e desmatamento das áreas de restinga e manguezal.
Atualmente, a comunidade encontrase totalmente urbanizada, tendo sido seus arredores completamente tomado pela ação do setor imobiliário, em destaque a construtora Celi com o projeto do residencial Garden Village, destacado no mapa de síntese, na Figura 2. Isso causou um grande impacto na comunidade, que perdeu suas áreas de pesca e mariscagem e se encontra cercada pelas sufocantes ruas da especulação imobiliária da capital sergipana.
A Associação Comunitária dos Moradores do Loteamento Senhor do Bonfim (ACMLSB) foi criada em meados dos anos 2000 e formalizada em 2008, com o objetivo de suprir as necessidades da comunidade. Atualmente, a ACMLSB possui 227 associadas(os), em sua
maioria mulheres, a maior parte delas negras e com uma idade acima dos 30 anos, geralmente são chefes de família, mães e avós, ocupando subempregos ou aposentadas. A Comunidade, que ainda carece de serviços básicos e infraestrutura (na região faltam escolas, posto de saúde e outros equipamentos públicos), tem recebido, desde 2021, assessoria técnica especializada, com ações voltadas à estruturação organizativa dos processos de trabalho da instituição, à captação de recursos e à formação política junto à equipe diretiva (Marques et al., 2022).
Os conflitos quanto ao acesso às águas e ao saneamento na comunidade são históricos, já que seu início foi fruto de uma ocupação urbana por moradia. No Loteamento Senhor do Bonfim, somente em 2017 a comunidade teve acesso à água encanada e em 2021 a rede de esgoto. No entanto, as moradoras e moradores do loteamento só tiveram acesso às águas depois de muita luta,. Em setembro de 2021, foi preciso que as mulheres da comunidade se auto organizassem, através da associação de moradores e com suporte de assessores técnicos populares, para ocupar a sede da Deso, a companhia de abastecimento e saneamento de Sergipe. Na ocasião elas se juntaram para reivindicar a desobstrução da tubulação da rede de esgoto e ligação da estação elevatória, a fim de que suas casas deixassem de ficar alagadas com o retorno das águas cinzas, situação que atormentou a comunidade por dois anos causando danos materiais e Figura 06: Comunidade do Loteamento Senhor do Bonfim
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MAPA SÍNTESE | DIAGNÓSTICO
DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BARROSINHO, ARACAJU-SE
acometendo drasticamente a saúde de suas moradora/es.
Como mostra a Figura 8, as mulheres da comunidade tiveram sucesso ao se organizarem para pressionar a DESO para que os serviços de esgoto fossem ativados. Porém, atualmente um novo problema surge novamente no sistema de coleta de esgoto, o que volta a causar transtornos na comunidade (Figura 9). Além disso, a concessionária vem realizando cobranças abusivas de taxas de esgoto para as famílias do Loteamento Senhor do Bonfim. Mesmo ciente de que trata-se de uma comunidade vulnerável socialmente e ambientalmente a DESO se recusa a aplicar a tarifa social comunitária, burocratizando o processo de solicitação da tarifa social para que os territórios populares não tenham acesso a esse direito. Ademais, de acordo com relatos da comunidade, a água ofertada pela DESO na comunidade é
de baixa qualidade, pois quando não vem com cheiro de cloro possui um odor semelhante ao odor produzido por fossas sépticas, o que pode se configurar em contaminação da água pela água do lençol freático, o qual, por sua vez, pode estar recebendo esgotos por infiltração.
Atualmente, a comunidade do Loteamento do Senhor do Bonfim junto da Associação comunitária luta por regularização fundiária e para que o território seja enquadrado como ZEISZona Especial de Interesse Social no Plano Diretor, a fim de que as moradoras e moradores possam ter seus direitos sociais assegurados enquanto um território popular. Nesse sentido, a luta da comunidade pela criação da Tarifa Social Comunitária perpassa diretamente pela luta por direito à cidade uma vez que a comunidade busca seu reconhecimento enquanto uma área de interesse social visando a desburocratização dos processos que dão acesso a esses direitos como, as isenções e descontos em taxas de serviço urbano, bem como acesso a equipamentos urbanos.
Foto: Acervo da Associação Comunitária dos Moradores do Loteamento Senhor do Bonfim, 2021.
Foto: Isabela Pinheiro, 2021
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Figura 08: Manifestação das Mulheres do Loteamento Senhor do Bonfim na frente da DESO
Figura 09: Desobstrução da tubulação da rede de coleta de esgoto
POVOADO ARAME I
A menos de 3 km da Praça São Francisco, Patrimônio da Humanidade pela UNESCO localizada no centro histórico de São Cristóvão, Arame I fica às margens da Estrada Rita Cacete, tendo apenas uma rua com um pouco mais de 1 km de comprimento e que começa e retorna a estrada, como pode ser visto no mapa da Figura 11. Do alto da comunidade é possível ver uma paisagem cheia de colinas e morros típicos de São Cristóvão, cobertos com pastagens e vegetação nativas (Figura 10), bem como é possível ver o apicum e as entradas para o mangue, que fica ao sul da comunidade na parte inferior do mapa de síntese. Mais à esquerda do mesmo mapa, temos o acesso ao rio Panteão, o rio que margeia a comunidade e com quem as pessoas têm profunda relação.
Na comunidade os espaços de uso comum são poucos, apenas a igreja evangélica em construção e espaços improvisados nas áreas externas das próprias residências para reuniões e cultos religiosos. Em Arame I não há praças e a escola de ensino fundamental que fica no alto da comunidade está desativada, não existem serviços públicos disponíveis como creche, também desativada, posto de saúde, ponto de ônibus coberto, muito menos infraestruturas básicas como pavimentação da rua, sistema de microdrenagem ou de coleta de esgoto. O trecho da rua destacado no
Figura 10: Comunidade Arame I
Foto: Amanda Macedo, 2024.
mapa síntese, além de ser marcado por buracos e crateras, está passando por um processo erosivo que está estreitando a largura da via. O acúmulo de tantas precariedades demonstra um total abandono do poder público quanto a comunidade, cuja moradora mais antiga relata que chegou no local há mais de 70 anos, quando ainda possuía 11 anos de idade..
Tradicionalmente ocupada por pescadores e marisqueiras, a comunidade de Arame I sofre com
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a falta de acessibilidade em níveis estruturais uma vez que o território não possui um sistema de drenagem, tampouco calçamento e suas ruas margeiam encostas. Além disso, o acesso à água potável encontra-se ameaçado, pois um dos terrenos em que a comunidade busca água para beber em baldes é privado e poderá ser fechado.
Segundo relatado pelas moradoras e moradores do território periurbano, a água que chega em suas residências
fornecida pelo Sistema Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) provavelmente não é potável, pois possui uma coloração que varia entre tons esbranquiçados/ amarelados e geralmente só está disponível nas torneiras durante as madrugadas. Dessa forma, para obter a água de beber, as pessoas de Arame I vão até uma propriedade privada, ou se dirigem até a fonte Nossa Senhora dos Pobres, que mata a sede das famílias que não conseguem se deslocar com baldes para captar a melhor “água de
MAPA SÍNTESE | DIAGNÓSTICO
DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO
ARAME I, SÃO CRISTÓVÃO-SE
beber” da comunidade que, segundo as pessoas do lugar, fica no terreno privado (Figura 12).
Apesar de ser uma cidade rica em águas, as comunidades localizadas às margens do Centro Histórico da Cidade Mãe de Sergipe ainda sofrem com a crise hídrica. Outra preocupação que se cruza com o acesso à primeira água (água de beber) é a falta dos demais elementos que constituem o saneamento básico, como a ausência de uma rede de esgoto, de calçamento, de drenagem das águas pluviais, assim como também não há coleta de resíduos sólidos que passe por dentro da comunidade (Figura 13). Ocasionando uma série de problemáticas urbanas que têm impactado diretamente a saúde da população, pois uma vez que os lençóis freáticos da região estão mais próximos à superfície também
Figura 12: Fonte Nossa Senhora dos Pobres
Foto: Mariana Isla, 2024
estão mais suscetíveis à contaminação, assim como também em dias de chuva o acesso a comunidade fica comprometido, inviabilizando o tráfego de todos os tipos de automóveis.
De acordo com moradores de Arame I, o esgoto é direcionado para a rua e para a maré, poluindo as áreas ambientais que ainda são utilizadas para a prática da pesca artesanal por pescadores e marisqueiras que moram nesse território tradicional. Além disso, como boa parte da população vive da mariscagem, há um acúmulo de resíduos de mariscos imenso na comunidade que precisa ser removido, dada a impossibilidade da passagem do caminhão do lixo pelo território em razão das vias estreitas e esburacadas.
Devido à desintegração e consequentemente à segregação de Arame I da malha urbana de São
Figura 13: Condições de Saneamento da comunidade Arame I
Foto: Mariana Isla, 2024
Cristóvão, as pessoas que dali fazem sua morada sentem diariamente os impactos da ausência de políticas públicas voltadas para saneamento e habitação. Assim sendo, como o caminhão da coleta não consegue adentrar na comunidade para buscar os resíduos sólidos, diante das péssimas condições de acesso da comunidade, uma vez que a mesma não é pavimentada, é possível encontrar diversos pontos de acúmulo de cascas de mariscos que são descartadas após o processo da catação como mostra na imagem seguinte (Figura 14).
Para além do que já foi mencionado, a comunidade encampa uma luta para ser integrada à malha urbanizada de São Cristóvão, uma vez que ela está conectada com uma das principais vias do município que é a estrada de Rita Cacete que dá acesso direto ao perímetro histórico e possui uma dinâmica urbana voltada para a cidade de São Cristóvão. Dada a proximidade
com o centro da cidade e a falta de infraestrutura e equipamentos públicos, as pessoas que moram no território se deslocam constantemente para os bairros centrais. Apesar da urbanização passar pela frente da comunidade chegando em comunidades mais distantes e a mesma ser assentada numa região que possui encostas, a comunidade de Arame I foi excluída pelo último Plano de Habitação Municipal elaborado no ano de 2023, deixando de fora uma comunidade tradicional que deveria ser priorizada devido aos riscos e conflitos que nela incidem.
Nesse viés, Arame I não possui espaços de lazer, nem posto de saúde, a única escola que tinha na comunidade foi desativada, o transporte escolar não adentra a comunidade para pegar as crianças sendo necessário que os pais levem seus filhos até a estrada Rita Cacete para que assim eles possam ir à escola em outra comunidade. Às vezes costumam acontecer apagões,
O estudo, o trabalho e a vida é ali na maré. Onde a gente tirava o marisco nao tem mais. O mangue tá morrendo.
conforme apontado por moradores. Além disso, as correspondências de cobrança de energia não são postas nas residências, mas presas nos arames das cercas.
Sendo assim, para além das diversas problemáticas relatadas, a liderança local destacou um rio que existe na comunidade, que no momento encontra-se impróprio para banho e para pesca porque suas águas estão poluídas em razão da falta de pontos de coleta de resíduos sólidos associada a ausência de educação ambiental na comunidade. Segundo a comunitária, apesar do rio estar poluído, com o suporte do poder público atuando em conjunto com a comunidade ele pode
Figura 14: Resíduos sólidos domésticos e da atividade de mariscagem na comunidade
Figura 15: Rosana, líder comunitária, relata sobre o interesse popular na revitalização do rio Panteão
Fotos: Mariana Isla, 2024
facilmente passar por um processo de revitalização para que suas águas sejam despoluídas e o espaço seja utilizado para o lazer das famílias de Arame I, bem como para a geração de renda a partir do fomento ao turismo de base comunitária.
Portanto, é importante atestar que as moradoras e moradores de Arame I sabem o que querem para o seu território, bem como têm desenvolvido estratégias de sobrevivência que precisam ser reconhecidas e melhoradas pelo estado. As águas destinadas ao consumo humano, por exemplo, necessitam apenas de um tratamento que pode ser realizado na própria comunidade a partir da construção de um microssistema de tratamento e distribuição que pode ser gerido pela comunidade e mantido financeiramente pelo estado, fruto de uma estratégia de gestão ambiental
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“ ”
de saneamento compartilhada. As estratégias de gestão ambiental compartilhadas são fundamentais para garantir o protagonismo popular na tomada de decisões, para que seja possível realizar um desenvolvimento sustentável e ambientalmente justo para todas e todos que ali residem e trabalham.
ABASTECIMENTO DE ÁGUA
Como apresentamos no panorama dos serviços de saneamento, o serviço de abastecimento de água é um dos que possui maior cobertura, o que se reflete
QUADRO 1: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA NAS COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO.
Oferta do serviço
Quem é responsável
aqui com ambas as comunidades sendo atendidas. Contudo, em nenhuma das duas a água que chega às casas é de boa qualidade segundo o relato dos moradores das comunidades, como descrito no Quadro 1. Além da baixa qualidade da água ofertada, a comunidade de Arame I tem um grave problema na regularidade do abastecimento, com interrupções nos horários de pico de consumo, o que indica uma insuficiência na quantidade de água distribuída à comunidade e ou a falta de um reservatório local, que regularize a distribuição ao longo do dia evitando esse problema.
QUADRO SÍNTESE 1 | ABASTECIMENTO DE ÁGUA
Arame I Barrosinho
O serviço é ofertado
O serviço é ofertado
SAAE São Cristóvão DESO
Infraestrutura Água captada em Colônia Miranda e distribuída em Arame I
Integrada a rede de abastecimento de Aracaju
Oferta
Quem
Qualidade do serviço
Regularidade da oferta
Cobrança pelo serviço
Alternativa comunitária
Água ofertada à comunidade é imprópria para o consumo, moradores reclamam de aspecto barroso e cheiro estranho. Utilizada apenas para serviços de limpeza.
Serviço é interrompido pelo menos duas vezes ao dia em horários de pico de uso como começo da manhã e fim da tarde.
Não há cobrança, casas não possuem hidrômetros
Uso de dois chafarizes nas entradas da comunidade, que são mantidos pelos próprios moradores, podem ser vistos na Figura 1. A qualidade da água do chafariz comunitário não é tão boa, pelo que relatam os moradores, mas é utilizada para consumo.
A qualidade do serviço de abastecimento de água fornecido é irregular. Apesar de ser usada para consumo, moradores reclamam da quantidade de cloro presente na água, sendo perceptível cheiro, cor e sabor da água, bem como pode apresentar aspecto barrento em alguns momentos.
O abastecimento de água é regular, com interrupções sendo ocasionais
Cobrança feita normalmente
Devido a estabilidade do serviço a comunidade não se utiliza de métodos alternativos para abastecimento de água
Quadro 1: Síntese da caracterização do serviço de abastecimento de água nas comunidades de Arame I e Barrosinho. Fonte: Autores, 2024.
Oferta serviço Quem responsável
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Infraestrutura QUADRO QUADRO 2: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO NAS COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO. QUADRO SÍNTESE 2 | COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO
Infraestrutura Qualidade comunitária
Dos dois chafarizes utilizados pela comunitários de Arame I como primeira água, um está em área comum e é de uso comum, outro está em terreno particular, mas de livre uso, que podem ser vistos nas Figura 12 e 16, respectivamente . O chafariz em área particular possui uma qualidade de água mineral, sendo utilizado como a melhor alternativa para consumo, contudo por se tratar de uma área privada o acesso pode ser negado caso por qualquer motivo o proprietário tenha. Isso causa uma insegurança quanto à garantia de acesso à água para a comunidade, uma grave ameaça à reprodução de sua vida diária. Já o chafariz de uso comum tem uma água de qualidade inferior, ainda assim é utilizado para consumo pela comunidade. Seu uso pode ser uma alternativa para o abastecimento adequado para os moradores de Arame
Figura 16: Fonte em terreno particular.
Foto: Mariana Isla, 2024
I, caso algumas melhorias estruturais sejam implementadas, como fazer uma nova perfuração ou adequação da atual em busca de um manancial subterrâneo de melhor qualidade, bem como a construção de um sistema de abastecimento adequado às demandas da comunidade.
Um caso destacado pelos comunitários de Arame I em nossas visitas, foi a recente cobrança feita de tarifas de água de anos anteriores a alguns moradores, mesmo que não ocorram cobranças pela falta de hidrômetros nas casas. As cobranças foram feitas pela responsável pelo abastecimento de água no município de São Cristóvão a SAAE, Serviço Autônomo de Água e Esgoto municipal, são de mais de dois anos atrás. Os moradores questionam a tarifa recebida e já buscaram questionar a empresa prestadora para a retirada da cobrança.
Oferta do serviço
Quem é responsável
COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO SANITÁRIO QUADRO
O serviço é ofertado
SAAE São Cristóvão
O serviço é ofertado
Qualidade do serviço
Como pode ser observado no Quadro 2, em nenhuma das duas comunidades o serviço de coleta e tratamento de esgoto é efetivamente prestado. Implementada junto ao processo de urbanização da comunidade do Barrosinho, o sistema de coleta de esgoto nunca operou corretamente, devido a problemas no seu sistema de elevação, o que impossibilita de transportar o esgoto gerado na comunidade para o sistema de coleta geral do município. O que decorre disso é o acúmulo de esgoto na comunidade que já causou extravasamento no ponto mais baixo da comunidade, bem como causou retorno do esgoto para as casas em períodos de chuvas intensas. Apesar de não operar, os moradores da comunidade são cobrados pela taxa de
Infraestrutura Água captada em Colônia Miranda e distribuída em Arame I
Água ofertada à comunidade é imprópria para o consumo, moradores reclamam de aspecto barroso e cheiro estranho. Utilizada apenas para serviços de limpeza.
Regularidade da oferta
Cobrança pelo serviço
Alternativa comunitária
Serviço é interrompido pelo menos duas vezes ao dia em horários de pico de uso como começo da manhã e fim da tarde.
Não há cobrança, casas não possuem hidrômetros
Uso de dois chafarizes nas entradas da comunidade, que são mantidos pelos próprios moradores, podem ser vistos na Figura 1. A qualidade da água do chafariz comunitário não é tão boa, pelo que relatam os moradores, mas é utilizada para consumo.
Figura 17: Tanque de lavar roupa destinando águas cinzas diretamente em via pública. Foto: Mariana Isla, 2024
QUADRO 2: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO NAS COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO.
QUADRO SÍNTESE 2 | COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO
Arame I Barrosinho
Oferta do serviço O serviço não é ofertado
Quem é responsável
Infraestrutura
Qualidade do serviço
Cobrança pelo serviço
Alternativa comunitária
DESO
Inexistente
Não se aplica
Não se aplica
Solução individual, com uso de fossas rudimentares ou sépticas para esgoto sanitário e águas produzidas (limpeza da casa, cozinha e higiene) despejada direto na rua
Inoperante
DESO
Integrada a rede de coleta e tratamento de Aracaju, contudo apresenta falhas estruturais que impedem seu funcionamento. Obras estão sendo feitas, mas desde a instalação da rede em 2018 nunca operou de forma adequada
Inoperante
Cobrança feita normalmente
Moradores ainda utilizam fossas para poder destinar o esgoto sanitário, devido a inoperância da rede de coleta
Quadro 2: Síntese da caracterização do serviço de coleta e tratamento de esgoto nas comunidades de Arame I e Barrosinho. Fonte: Autores, 2024.
Oferta serviço
Quem responsável
Infraestrutura
Qualidade serviço
Regularidade da Destinação
Alternativa comunitária QUADRO
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1 | ABASTECIMENTO DE ÁGUA
I Barrosinho
SÍNTESE
Arame
Oferta Quem Infraestrutura Qualidade comunitária
Arame I Barrosinho
esgoto, o que gera revolta, pois o preço cobrado é elevado para as condições financeiras dos moradores, além do fato de se constituir em uma prática abusiva pelo fato de o serviço não ser operante.
Oferta do serviço O serviço não é ofertado O serviço é ofertado
Quem é responsável
Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminfra)
Empresa Municipal de Serviços Urbanos (EMSURB)
Infraestrutura Inexistente Sistema de microdrenagem instalado
Qualidade do serviço
Alternativa comunitária
Já em Arame I não existe um sistema de coleta de esgoto. Assim, os moradores utilizam soluções individuais como a fossa séptica ou rudimentar para o esgoto sanitário, já as águas cinzas são despejadas direto na via pública, Figura 17. Em ambos os casos, seja pela ausência ou pela inoperância, a falta de uma devida destinação do
esgoto doméstico implica em uma série de riscos à saúde da comunidade, bem como à contaminação do ambiente, o que é agravado no caso de Arame I pela possibilidade de contaminação das águas subterrâneas que são usadas para consumo pela comunidade.
Não se aplica
Não existe nenhuma estratégia ou alternativa para a comunidade a esse serviço, em casos de chuvas intensas ou prolongadas a comunidade fica ilhada até as águas baixarem
COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
Funcionamento regular, apenas um ponto apresenta alagamentos em períodos chuvosos, mas não causa grandes transtornos a comunidade
Não existem estratégias ou alternativas, a comunidade não enfrenta tantos problemas com alagamentos
QUADRO 3: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS
COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO.
Pelo que foi discutido com a comunidade do Barrosinho, não existem mais problemas com o serviço de coleta de resíduos, desde
QUADRO SÍNTESE 3 | COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
Arame I Barrosinho
Oferta do serviço
Quem é responsável
Infraestrutura
Qualidade do serviço
O serviço é ofertado
Secretária Municipal de Infraestrutura (Seminfra), sendo o serviço de coleta e disposição em aterro sanitário, prestado por empresas privadas
Não existem equipamentos de armazenamento temporário na comunidade, além dos individuais feitos por moradores, e a coleta é feita por caminhão compactador de lixo
O serviço não é prestado a toda comunidade, sendo restrito a apenas dois trechos da comunidade como pode ser visto na Figura 1
O serviço é ofertado
Empresa Municipal de Serviços Urbanos (EMSURB) sendo o serviço de coleta e disposição em aterro sanitário, prestado por empresas privadas
Não existem equipamentos de armazenamento temporário na comunidade, além dos individuais feitos por moradores, e a coleta é feita por caminhão compactador de lixo
O serviço é prestado de forma adequada
Regularidade da oferta Duas vezes por semana Três vezes por semana
Destinação final
Alternativa comunitária
Aterro Sanitário em Rosário do Catete
Os e as comunitárias acumulam os resíduos domésticos nos pontos da comunidade onde o caminhão consegui coletar. Diante disso, alguns moradores optam por queimar os resíduos em casa. Para além do resíduo doméstico, também é gerado em grande quantidade resíduos das atividades de pesca e mariscagem artesanal, para os quais não existem alternativas de destinação disponíveis pelo poder público. Esses resíduos têm sido dispostos às margens da comunidade, ou utilizado na cobertura de buracos na rua, Figura 5.
Aterro Sanitário em Rosário do Catete
Devido a estabilidade do serviço a comunidade não se utiliza de métodos alternativos para lidar com resíduos sólidos
Quadro 3: Síntese da caracterização do serviço de coleta e destinação de resíduos sólidos nas comunidades de Arame I e Barrosinho. Fonte: Autores, 2024.
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abastecimento abastecimento
de ser reclamam água, da aspecto
DE tratamento de feitas, 2018 para devido a
SÍNTESE 4 | DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS
QUADRO
o processo de urbanização. Já em Arame I, a insuficiência do sistema de coleta de resíduos sólidos os expõe a intempéries e animais, se tornando foco de propagação de doenças como a dengue, ou no caso das queimas, um foco de poluição atmosférica que produz poluentes de alto risco à saúde. A justificativa dada pela prestadora do serviço é a impossibilidade de o
caminhão compactador acessar a rua em questão, devido à instabilidade e precariedade da via, que é desgastada por processos erosivos e está bastante estreita e instável. No ano de 2023, um caminhão compactador ficou preso em um buraco na mesma rua, necessitando de um grande mobilização de máquinas para retirada do local. O fato ocorrido justifica a falta de coleta dos resíduos,
mas expõe ainda mais a situação de precariedade da vida da comunidade
Figura 18.
A mariscagem tem como parte final do processo de trabalho o beneficiamento do marisco, com catagem e limpeza, que gera conchas como resíduos.
Arame I é uma comunidade em que vivem muitas marisqueiras, que por consequência do seu trabalho geram uma grande quantidade de resíduos da mariscagem, portanto, se justifica a necessidade de pensar uma destinação mais adequada a esses resíduos. As conchas dos mariscos têm sido muito utilizadas em artesanatos e até em construções por diversas comunidades de pescadores e pescadoras pelo Brasil, confeccionando biojoias, roupas e outros artesanatos. As mulheres da comunidade desejam trabalhar com esse tipo de artesanato e veem como uma possibilidade de desenvolvimento de renda e desenvolvimento da organização comunitária a partir de um trabalho coletivo.
DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS
Como apresentado no Quadro 4, a comunidade do Barrosinho não tem muitos problemas causados por chuvas fortes, apesar de se encontrar em uma área densamente urbanizada, construída em cima de lagoas e mangues. Apenas um ponto costuma alagar em períodos chuvosos, pelo que relatam os moradores. Isso pode indicar um bom funcionamento do sistema de drenagem no processo de urbanização do loteamento, caracterizando-se como uma grande exceção no contexto da cidade de Aracaju.
Apesar de Arame I não se encontrar em área urbana de São Cristóvão, segundo a definição de seu Plano Diretor, e portanto não está inclusa dentro dos serviços de drenagem e manejo de
Figura 18: Acúmulo de resíduos sólidos no caminho de acesso ao rio Panteão Foto: Mariana Isla, 2024.
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águas pluviais pelas definições das leis, a comunidade enfrenta problemas sérios com períodos chuvosos que impõe uma necessidade que deve ser atendida. Devido se encontrar na encosta de um morro e seguir pela parte baixa que vai até o apicum, durante chuvas intensas ou de longa duração, alagamentos causam transtornos nas rotinas dos moradores impedindo sua entrada e saída da comunidade, como pode ser observado nas áreas marcadas no mapa da Figura 7. Além disso, vários processos erosivos podem ser vistos nas vias da comunidade, o que indica a existência de risco de acidente envolvendo movimentação de terra. Por isso, é extremamente necessário a construção de um eficiente sistema de drenagem e medidas de segurança para habitações em morros em Arame
I. Esse caso de risco de alagamento e deslizamento é um problema de todo o município, devido seu relevo
típico. A prefeitura tem investido e buscado recursos nesse sentido, mas é importante exigir maiores esforços para garantir o desenvolvimento desse projeto e sua ampliação para além da zona urbana.
ÁGUAS PRODUTIVAS
QUADRO 4: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS E URBANAS NAS COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO.
Em Arame I, as águas que a comunidade realiza suas atividades são o rio Panteão e o mangue ao sul da comunidade. Em ambos temos uma série de problemas quanto ao acesso e a degradação do ambiente, o que fere completamente os direitos básicos dos povos e comunidades tradicionais preconizados pelo Decreto 6.040/2007, ameaçando a garantia da sobrevivência no território. O rio Panteão encontrase visivelmente degradado decorrente de uma alteração de sua calha natural, feito por proprietário da fazenda que cerca a comunidade, resultou em estagnação da água no trecho em
QUADRO SÍNTESE 4 | DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS
Arame I Barrosinho
Oferta do serviço O serviço não é ofertado O serviço é ofertado
Quem é responsável
Infraestrutura
Qualidade do serviço
Alternativa comunitária
Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminfra)
Inexistente
Não se aplica
Não existe nenhuma estratégia ou alternativa para a comunidade a esse serviço, em casos de chuvas intensas ou prolongadas a comunidade fica ilhada até as águas baixarem
Empresa Municipal de Serviços Urbanos (EMSURB)
Sistema de microdrenagem instalado
Funcionamento regular, apenas um ponto apresenta alagamentos em períodos chuvosos, mas não causa grandes transtornos a comunidade
Não existem estratégias ou alternativas, a comunidade não enfrenta tantos problemas com alagamentos
QUADRO 3: SÍNTESE DA CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO DE COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NAS COMUNIDADES DE ARAME I E BARROSINHO.
Quadro 4: Síntese da caracterização do serviço de drenagem de águas pluviais e urbanas nas comunidades de Arame I e Barrosinho. Fonte: Autores, 2024.
QUADRO SÍNTESE 3 | COLETA E DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
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ÁGUA abastecimento
abastecimento de ser reclamam água, da aspecto
que a comunidade tem acesso que toma um aspecto pantanoso. Além disso, os moradores relatam um caso passado onde uma granja, instalada no alto ao norte da comunidade, que despejava seus efluentes em natura no rio Panteão, o que agravou o estado do rio. Por fim, ainda foi relatado a suspeita da presença de caramujo no acesso ao rio, o que pode representar exposição a transmissores de do parasita da esquistossomose.
O estado atual do rio foi apontado como um dos principais problemas pela comunidade. A água do rio costumava ser mineral, era fonte de renda com os peixes, espaço de lazer para toda comunidade, motivo de orgulho dos moradores do Arame I. Esse sentimento de tristeza e revolta motiva os moradores a buscarem meios de mover órgãos responsáveis por essa degradação, bem como implementar um projeto de recuperação do rio, que seja acompanhado da construção de uma área de lazer nas margens do rio, um espaço que faz muita falta à comunidade.
Já os mangues ao sul da comunidade enfrentam os avanços da carcinicultura, como é visível no mapa de síntese da Figura 7. Essa prática extremamente predatória e destruidora tem crescido no município de São Cristóvão, de forma que quase todas as áreas de mariscagem que a comunidade tinha acesso foram tomadas ou tiveram seu acesso restrito pelos tanques de criação de camarão. As marisqueiras de Arame
I relatam que tem que ir cada vez mais
distante para conseguir catar o marisco, como também têm sido pego cada vez menos.
No Barrosinho, o acesso às águas produtivas é praticamente inexistente; os lagos e lagoas em que a comunidade costumava pescar foram aterrados para avanço da especulação imobiliária; o acesso ao rio Poxim e seu elevado grau de poluição faz a pesca no rio e mangue ser insustentável. Este processo resultou em uma proletarização dos pescadores, que foram submetidos a uma lógica de subempregos ou ao trabalho informal, com péssimas remunerações e condições de trabalho. Apesar desta perda irreparável, a luta da comunidade segue em fortalecer sua resistência e permanência no território. Organizada através da Associação Comunitária dos Moradores do Loteamento Senhor do Bonfim, a comunidade tem atuado para garantir acesso aos serviços e políticas públicas, sendo através dessa movimentação que alcançaram diversas conquistas como as relatadas neste documento.
Quanto ao acesso e à qualidade da água do rio Poxim, a associação tem buscado incidir no Plano de Manejo do Parque Ecológico do rio Poxim, que, apresentado em 2022, não incluiu os pescadores e pescadoras tradicionais dentro dos usos. Partindo de denúncias contra essas exclusão, a associação construiu todo um estudo mostrando que a pesca artesanal não só permanece no rio, como também pede socorro, devido ao estado das águas e do mangue.
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Os Planos Populares são instrumentos de ação que têm como propósito ampliar a participação popular e promover o monitoramento dos objetivos sociais das políticas públicas através do fortalecimento do controle social no âmbito do planejamento urbano e regional. Tendo como ponto de partida que o Estado não é o único agente social capaz de planejar o espaço e as atividades que nele ocorrem, os planos populares buscam fortalecer as vozes que sustentam várias lutas no diaa-dia, por meio de alianças populares em torno de reivindicações por direitos, como: ações de mobilização, propostas sociotécnicas e dos mais diversos tipos de incidências técnicas na disputa por políticas públicas e direitos muitas vezes já garantidos em nossos marcos institucionais e legais.
A aproximação das comunidades com a assessoria técnica em Sergipe também é resultado do avanço de uma urbanização predatória sobre os povos e comunidades tradicionais dentro do antigo/atual modelo de gestão territorial por toda Região Metropolitana de Aracaju. Isso acontece
Foto: Mariana Isla, 2024
planos populares e o saneamento básico
devido à inexistência de uma legislação atualizada e que centralize os interesses populares, a exemplo do Plano Diretor de Aracaju que é o mesmo desde 2000 e, consequentemente, de uma política pública que esteja a serviço do povo diante da segregação urbana provocada pelo triunfo dos interesses privados, que tem expulsado os povos e comunidades tradicionais dos seus locais de trabalho e moradia, criando novos assentamentos populares vulneráveis carentes de diversos
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acessos sendo um deles à regularização fundiária; além de contribuir com a destruição de áreas ambientalmente sensíveis à ocupação humana, muitas vezes fonte de trabalho e geração de renda das comunidades tradicionais e tão importantes para a manutenção do meio ambiente.
Ambas as comunidades são vítimas desses processos, possuem semelhanças quanto ao seu histórico de existência e resistência dentro de uma conjuntura de desenvolvimento
urbano que desconsidera os seus direitos e modos de vida. Sendo assim, a mediação e mitigação de conflitos por terra e socioambientais estão no ponto central dos trabalhos da assessoria técnica popular junto às comunidades tradicionais de Sergipe.
No que se refere à questão da água, segundo o Movimento de Atingidos por Barragens (2020), o Brasil é o território mais propício para a disputa pelo controle mundial da água, tendo em vista que é o país que possui maior quantidade de água potável do planeta. Temos mais de 27 aquíferos, que somam mais de 112 bilhões de metros cúbicos de água. Além disso, temos o setor de saneamento totalmente público, correspondendo a mais de 20 de companhias estaduais, 57 milhões de ligações residenciais, 630 mil km de redes de água instaladas, 300 mil km de redes de esgotamento, 220 mil trabalhadores e um movimento de R$110 bilhões por ano.
Diante desse contexto, nos últimos anos de políticas de arrocho financeiro, nomeadas de políticas de austeridade fiscal, foi possível acompanhar o Figura 19: Primeira Oficina de Construção do Dossiê em Arame I
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avanço do mercado sob o controle da água e dos serviços de saneamento como um todo, principalmente a partir da aprovação do Novo Marco do Saneamento que trouxe mudanças no modelo que prestigiava a execução de serviços pelas companhias estatais sem concorrência, através da celebração de contratos de programa com os respectivos municípios. A aprovação dessa lei deu início a uma onda privatista no setor de saneamento do país, para que posteriormente a estrutura pública de saneamento seja vendida e reinserida enquanto prestadora de serviço, captando a mesma demanda, mas operando enquanto um agente privado.
De acordo com o Observatório do Marco Legal do Saneamento, o texto aprovado determina a abertura de licitação, com a participação de empresas públicas e privadas, de modo a priorizar serviços de abastecimento de água e
QUADRO
esgotamento sanitário ao passo que enfraquece a abordagem de gestão integrada dos quatro componentes do saneamento básico prevista na lei anterior. Além disso, não foi incorporado na lei que abastecimento de água potável e esgotamento sanitário são Direitos Humanos. Por isso, incluí-los na legislação nacional de saneamento seria uma forma de regulamentar em nível nacional a resolução da ONU da qual o Brasil é signatário, no qual a água é compreendida enquanto um direito inalienável e não um recurso a ser capitalizado.
Outro aspecto chave do Marco Legal do Saneamento aprovado em 2020 é a perda de força expressiva do controle social dos serviços, uma vez que, esse controle passa a ser regional e não mais municipal como era no antigo Marco do Saneamento. Para além da desarticulação local, o Novo Marco Legal do Saneamento não trouxe avanços
PAC PARA PROJETOS DE UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO À AGUA NO ESTADO DE SERGIPE
Município Empreendimento Subeixo Eixo Classe Modalidade
Água para todos
Água para todos
Água para todos
Água para todos
Cidades Sustentáveis e Resilientes
Abastecimento de água
Abastecimento de água Aracaju
Infraestrutura Hídrica
Ampliação do SAA, construção da Adutoda e da ETA da barragem do Rio Poxim
Ampliação do Sistema Integrado da Adutora do Agreste
Retomada, conclusão e novas obras
Retomada, conclusão e novas obras Itabaiana
3º Ramal da Adutora São Francisco - 94km
Infraestrutura HídricaAdutoras e canais
Esgotamento Sanitário
Adutoras e canais -
Todos os municípios sergipanos
Canal do Xingó - 300km
Concessão de saneamento básico
Estudo de concessãoesgotamento sanitário
Obra Obra Projeto Projeto Estudo
Fonte: Gov.br/casacivil,2024.
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5 | DESTINAÇÃO DOS RECURSOS DO
em termos de instituição de conselhos, mecanismos de participação social e há um vácuo nesse momento de implementação das regionalizações, conforme informa o Observatório do Marco Legal do Saneamento.
Em Sergipe, um dos principais impactos após a aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento foi a intensificação das movimentações para a venda da DESO (Companhia de Saneamento de Sergipe), assim como vem ocorrendo em todas as regiões do Brasil. Segundo a Mangue Jornalismo, estudos realizados pela Fundação Instituto de Administração (FIA) associada à Universidade de São Paulo (USP) demonstram com transparência que o governo do estado de Sergipe quer passar para o setor privado uma empresa pública que mesmo precarizada possui um superávit de R$ 40 milhões e ficar apenas com a fração deficitária que corresponde aos serviços de esgotamento, que precisará que o estado injete 200 milhões por ano para poder equilibrar as contas da empresa.
Dando continuidade à contextualização sobre as políticas públicas de acesso à água em Sergipe, segundo informações do portal da Casa Civil (2023) o Governo Federal tem investido R$ 136,6 bilhões em obras para o estado de Sergipe com recurso do Programa de Aceleração (PAC), sendo a quarta maior fatia do país e o estado do Nordeste que receberá mais recursos. No conjunto de obras do programa, consta como as mais expressivas para Sergipe: a duplicação da BR-101 - Sul e Norte com o objetivo
de melhorar o tráfego de cargas e fortalecer o mercado imobiliário com a criação de novas localizações em áreas pouco adensadas; o gasoduto do Projeto Sergipe Águas Profundas que impactará as comunidades tradicionais do estado correndo o risco de não compensá-las sob o argumento de que a exploração em águas profundas não gera impactos para a pesca artesanal enquanto populações tradicionais dizem o contrário e moradias do Minha
Casa, Minha Vida.
De acordo com o site da Casa Civil, os investimentos do PAC voltados para a ampliação do acesso das águas, obras emplacadas pela gestão estadual estão direcionadas para o abastecimento em regiões onde o acesso à água potável já foi universalizado e ampliação da infraestrutura hídrica em cidades de médio porte do semiárido do estado, serviços esses que possivelmente podem ser concedidos pelo executivo e legislativo do estado à iniciativa privada por 35 anos. Por fim, a última fatia do bolo do orçamento destinado às águas de Sergipe ficou com a elaboração de um estudo que tem como objetivo a concessão também do esgotamento sanitário nos municípios de Sergipe por 35 anos, concessão essa que Sindicatos, a universidade, movimentos sociais, organizações sociais e conselhos têm chamado de Privatização.
Dado o exposto, urge a necessidade dos Planos e Dossiês Populares para auxiliar a compreender onde os recursos públicos estão sendo aplicados, assim como para pautar as demandas das
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comunidades mais vulneráveis e que estão expostas ao racismo ambiental, sobretudo em se tratando dos direitos dos povos e comunidades tradicionais regulamentados através do Decreto 6040/2007, no qual institui a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Além disso, o próprio estado brasileiro por meio da atual gestão do governo federal parte do entendimento que os povos e comunidades tradicionais devem ser um dos públicos prioritários das políticas públicas, haja visto que esses têm encabeçado os critérios determinados para o direcionamento das políticas públicas.
Figura 20 e 22: Oficina de devolutiva do Dossiê das Águas no Barrosinho
Fotos: Amanda Macedo; Adriano Gardênio
Figura 21 e 23: Oficina de devolutiva do Dossiê das Águas em Arame I
Fotos: Osmir Marinho
considerações finais
Tendo apresentado um debate sobre o que é e quais as condições do saneamento básico em no Brasil, em Sergipe e em sua antiga e atual capital, São Cristóvão e Aracaju, e em especial as comunidades tradicionais de pescadores e pescadoras artesanais Arame I e Barrosinho, seguimos para a conclusão deste Dossiê. Ao apresentar uma série de denúncias sobre a situação precária em que são prestados os serviços do saneamento a essas comunidades, este trabalho se propõe a contribuir na organização e qualificação das lutas destes sujeitos por acesso a um saneamento básico que garanta condições para a reprodução dos seus modos de vida tradicionais, profundamente relacionados ao mangue e ao rio.
Sobre o estado dos serviços de saneamento básico
Diante de todos os elementos apresentados neste dossiê, podemos afirmar que as comunidades de Arame I e Barrosinho são sistematicamente desassistidas quanto ao saneamento básico pelas prefeituras de São Cristóvão e Aracaju. Seja pela ausência ou precariedade dos serviços como em Arame I, seja pela falta de qualidade e inoperância como ocorre no Loteamento Senhor do Bonfim, o histórico e estado atual apresentados aqui demonstra como as comunidades tradicionais não são prioridades para as gestões municipais. Para além de denunciar essa realidade, esse dossiê faz um chamamento à luta popular e à luta das comunidades tradicionais, pois esta é a única forma de construir uma possibilidade de mudança.
Privatização da DESO e dos serviços de saneamento no Brasil
Não somente a defesa da DESO como empresa pública, mas também a defesa de maiores investimentos para a companhia em recursos humanos, técnicos e financeiros, bem como a necessária ampliação e democratização de seus espaços de tomadas de decisão, com ampla participação popular, são pontos primordiais na luta pelo saneamento básico e preservação das águas no estado de Sergipe.
Os ruídos de comunicação acerca de que a DESO não atende às necessidades do povo sergipano quanto aos serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto são utilizados pelos governantes privatistas como argumento para entregar uma companhia lucrativa à iniciativa privada, a qual está habituada a se apropriar de empresas saneadas
e operantes. Contudo, é ainda mais claro que a privatização é uma ameaça a todo povo sergipano, que pode enfrentar problemas ainda mais graves quanto ao fornecimento desses serviços, já que a lógica empresarial aplicada a uma empresa que presta serviços básicos e fundamentais à vida, deturpa seu objetivo, que passa a ser unicamente o lucro. Essa subversão de princípios põe em risco aqueles que não são prioridades, que não são lucrativos, em suma, comunidades que devido a seu estado de vulnerabilidade, não possuem condições de arcar com as tarifas. Isso, em especial, afeta as comunidades tradicionais, como é o caso das comunidades do Loteamento
Senhor do Bonfim e Arame I.
Articulação e reivindicações do Dossiê das Águas
Por fim, temos como síntese do processo construído com as comunidades neste Dossiê um conjunto de reivindicações das comunidades de Arame I e Barrosinho, que tratam tantos dos serviços de saneamento em suas comunidades, como também de outras demandas relacionadas ao acesso a infraestruturas e serviços públicos. Essa organização inicial de um conjunto de desejos para melhoria de suas comunidades podem servir como instrumento para de suas lutas, bem como ponto de partida para a construção de planos populares que possam promover um maior controle social sobre o planejamento urbano e regional.
reivindicações do Barrosinho
Adequação e melhoria nos serviços de saneamento prestados à comunidade;
Garantia de uma tarifa social comunitária para os serviços de água e esgoto;
Revitalização dos mangues e rios de Aracaju.
nossas águas não são mercadoria
reivindicações de Arame I
Construção e adequação da infraestrutura e prestação dos serviços de saneamento básico de boa qualidade e a preço popular;
Revitalização do rio Panteão e construção de praça para lazer da comunidade em suas margens;
Reativação da escola municipal e que atenda crianças e adultos;
Construção de creche, posto de saúde e pontos de ônibus na comunidade, pavimentação e calçamento das vias públicas;
Construção de projeto para garantia de condições adequadas para o trabalho das marisqueiras e que permita, além da produção do marisco, a produção de artesanatos com as conchas.
Mecanismos de participação e representação popular
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referências
INSTITUTO ÁGUA E SANEAMENTO. Entenda o Marco Legal: 10 pontos para você entender a lei. [S. l.], s/n. Disponível em: https://marcolegal. aguaesaneamento.org.br/entenda-o-marco-legal/. Acesso em: 7 fev. 2024.
MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS. A Privatização Da Água Faz Mal Ao Brasil: Análise Explica Consequências Do Novo Marco Regulatório Do Saneamento. Movimento Dos Atingidos Por Barragem, Minas Gerais, P. 1, 2 Set. 2020. Disponível Em: Https://Mab.Org.
Br/2020/09/02/A-Privatizacao-Da-Agua-Faz-Mal-AoBrasil-Confira-O-Artigo/. Acesso Em: 7 Fev. 2024.
CASA CIVIL (Brasil). Governo Federal. Mapas de Obras por Estados: O Novo PAC vai investir R$ 1,7 trilhão em todos os estados do Brasil, sendo R$ 1,4 trilhão até 2026 e R$ 0,3 trilhão após 2026. Disponível em: https://www.gov.br/casacivil/pt-br/ novopac/mapas-de-obras-por-estados. Acesso em: 24 fev. 2024.
GÓES, Chistian. Vereadores de Aracaju podem impedir a privatização da água e da Deso. Lei Orgânica da capital proíbe que saneamento seja feito por empresas privadas. Aracaju, 2023. Disponível em: https://manguejornalismo. org/vereadores-de-aracaju-podem-impedir-aprivatizacao-da-agua-e-da-deso-lei-organica-dacapital-proibe-que-saneamento-seja-feito-porempresas-privadas/. Acesso em: 24 fev. 2024.
PORTAL G1 (Sergipe). TJSE interdita aterro sanitário que recebe resíduos sólidos produzidos em Aracaju. Mangue Jornalismo, [S. l.], p. 1, 27 mar. 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/se/ sergipe/noticia/2023/03/27/tjse-interdita-aterrosanitario-que-recebe-residuos-solidos-produzidosem-aracaju.ghtml. Acesso em: 23 mar. 2024.
PREFEITURA DE ARACAJU (Sergipe). PGM pede retomada das atividades no aterro sanitário de Rosário do Catete por 90 dias. Prefeitura Municipal de Aracaju, [S. l.], p. 1, 23 mar. 2023. Disponível em: https://www.aracaju.se.gov.br/noticias/99597/ pgm_pede_retomada_das_atividades_no_aterro_ sanitario_de_rosario_do_catete_por_90_dias.html. Acesso em: 23 mar. 2024
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