Revista Inscrita nº 14

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tudos sobre Aborto (GEA), composto por várias entidades da área da saúde e dos direitos humanos. Uma pergunta que fica é: o que fez com que representantes do Conjunto CFESS-CRESS tomassem uma decisão dessa magnitude? Entende-se que alguns aspectos tratados no decorrer desse debate foram importantes. E estão destacados a seguir:

9 - Para a Organização Mundial da Saúde (OMS) e para a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), a gravidez começa quando do início da implantação e, em média, no 14° dia começa a se formar o embrião. E é em torno da décima semana (ou décima segunda semana) que se forma o Sistema Nervoso Central, que determina a possibilidade de dor. É a partir da vigésima terceira semana (ou vigésima quarta) que o feto pode passar a ter viabilidade fora do corpo da mulher, ainda assim, na maioria dos casos em situação que necessita de cuidados intensivos – com a necessidade de tratamento em centro especializado e recursos humanos habilitados – e com risco de sequelas irremediáveis. Por isso a OMS e a FIGO definem que a gestação que termina até a 22ª semana de gestação, quando o peso do feto gira em torno de 500 gramas, é um aborto (Faúndes e Berzelatto, 2004. Silva, 2005).

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• O debate foi amplo no Conjunto CFESS-CRESS, com respeito e escuta das diferentes opiniões sobre o tema, longe da falsa polarização entre ser contra ou a favor do aborto. Ninguém é favorável, simplesmente, ao aborto. Entende-se que esse é um último recurso, não se trata de um método contraceptivo. Mas o fato é que, mesmo proibido por normas legais e pela maioria das hierarquias das religiões, muitas mulheres se submetem a esses riscos. Somente essas mulheres sabem avaliar, verdadeiramente, a importância que a interrupção da gravidez tem, naquele momento, em suas vidas; • São vários os motivos que podem levar uma mulher a abortar. A desigualdade de classe é uma das questões determinantes, uma vez que a criminalização do aborto atinge mais as mulheres pobres. Afinal, aquelas pertencentes a outros estratos sociais podem recorrer ao aborto em clínicas particulares, com garantia de qualidade no atendimento. Também é recorrente a rejeição do mercado de trabalho por causa da gravidez, pois inexistem equipamentos suficientes como creches e berçários que assegurem a responsabilidade do Estado e da sociedade com a compatiblização entre a maternidade e o desenvolvimento profissional das mulheres. Outra causa bastante recorrente ao abortamento é o abandono dos companheiros, que desaparecem diante de uma gravidez não planejada. Cau-

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sa esta que reflete o modelo patriarcal de dominação masculina, o qual exime os homens de sua corresponsabilidade na prevenção da gravidez indesejada e/ou não planejada e da paternidade responsável; O reconhecimento de que o aborto constitui um grave problema de saúde pública, considerando os dados de pesquisas já ilustradas nesse artigo; O reconhecimento por parte da categoria de que, independentemente da legislação que criminaliza o aborto, assistentes sociais atendem cotidianamente a mulheres que vivenciam o aborto. Tais relatos são comuns nos diferentes espaços sócio-ocupacionais onde atua a categoria. Os/as profissionais de serviço social da área de saúde, especialmente nas emergências das unidades hospitalares, têm ciência de que a mulher que procura esses serviços em processo de abortamento, seja provocado ou não, em geral é vítima de preconceitos e, muitas vezes, atendida de forma discriminatória; A compreensão da reprodução humana em sua totalidade, como resultado de um ato de escolha consciente, livre e responsável, permite compreender a decisão por um abortamento como uma decisão moralmente aceitável, tanto quanto aquela de manter a gravidez. Dessa forma, partimos do entendimento de que a gestação é um processo com diferentes fases. E de que o debate sobre ‘vida humana’ pertence mais ao campo religioso do que possui amparo científico. Para a ciência, feto e recém-nascido/a são distintos, pois a gravidez é um processo9; O reconhecimento de que a maternidade é uma atividade humana e não uma mera contingência biológica, portanto, necessita ser um ato desejável, consciente e livre, e não uma obrigação, um destino; A defesa da laicidade do Estado e das suas políticas sociais, inclusive garantidas na Constituição Federal de 1988;

N ú mero 1 4 • C onselho F ederal de S ervi ç o S ocial


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