CARTILHA DIGITAL SIMBIOSE NO PICO DOS MARINS


O grupo TrilhaZ foi idealizado no final de 2020 e envolve uma equipe interdisciplinar de professores, servidores técnico-administrativos em Educação e discentes da Universidade Federal de Itajubá, no sul do estado de Minas Gerais. A sua missão é desenvolver territórios sustentáveis e criar espaços de aprendizagem com base em quatro pilares: meio ambiente, educação, cultura e turismo sustentável. Atualmente desenvolve vários projetos de pesquisa e extensão. Entre estes projetos, consta o Projeto SIMBIOSE nos Marins, o qual será apresentado nesta cartilha, abordando os itens: caracterização ambiental e climática, estudos das estrelas e constelações, qualidade da água, a trilha de estudo e caracterização microbiológica (simbiose).
Para detalhes sobre o TrihaZ e este projeto consulte as redes sociais:
Confira, também, a apresentação do TrilhaZ, no Youtube, clicando no ícone abaixo.
O Maciço dos Marins está localizado na Serra da Mantiqueira, na divisa de São Paulo e Minas Gerais, entre os municípios de Piquete - SP, CruzeiroSP e Marmelópolis -MG.
Seu cume possui altitude de 2.422 m acima do nível do mar, sendo considerado, pelo IBGE, em 2016, o 26o maior do Brasil.
A área está dentro de uma unidade de conservação chamada Área de Proteção Ambiental Serra da Mantiqueira e, mais recentemente, em 2021, no MONA Mantiqueira Paulista.
.As coordenadas do Pico dos Marins são 22° 30' 09" S e 45° 07' 16
Para acesso ao relevo da região, confeccionou-se um mapa hipsométrico, isto é, um mapa que representa o relevo através de faixas de altitude.
Percebe-se uma nítida variação de altitude conforme se caminha até o pico, variando de 1.550 m até 2.422 m, ou seja, 872 m, aproximadamente.
Esta é a razão de um bom preparo físico antes de encarar a subida!
Outra caracterização feita envolveu a hidrografia do Maciço dos Marins, com suas redes de drenagem e nascentes.
O mapa hidrográfico apresenta possíveis pontos que merecem ser analisados, fornecendo informações importantes para os órgãos responsáveis avaliarem e, se necessário, adotarem medidas que protejam essas redes e nascentes.
Também, podemos obter informações sobre o solo da região de estudo, a partir do mapa pedológico. Para a região dos Marins, de acordo com a classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há dois tipos de solos dominantes: Latossolo Amarelo e Cambissolo Húmico. Para confirmação destes solos, estudos em campo são recomendados!
No mapa de Índice de Vegetação com Diferença Normalizada (NDVI) avaliase a densidade da vegetação através da relação entre as faixas de luz do infravermelho e vermelho captadas por imagem de satélite. Neste sentido, as florestas possuem valores próximos de 1 (em verde no mapa), enquanto solos descobertos, 0,1 (em vermelho no mapa)
O mapa de Uso e Ocupação do Solo retrata a identificação da cobertura, através de suas possíveis classificações. A partir da classificação gerada pelo projeto MapBiomas, percebe-se que, no decorrer da trilha em direção ao Pico dos Marins, o afloramento rochoso se torna predominante, reforçando a informação fornecida pelo mapa NDVI (anterior).
Deve-se salientar que tanto o mapa NDVI quanto o de Uso e Ocupação do Solo são complementares, auxiliando no entendimento de como está a superfície da área de estudo.
Para a caracterização climática, a melhor opção seria utilizar uma série histórica de estação meteorológica. Contudo, não há esse tipo de instrumento no Pico dos Marins, provavelmente pelo difícil acesso. Sendo assim, foi utilizada a quinta geração de reanálise atmosférica do European Centre for Medium-Range Weather Forecasts (ECMWF Reanalysis v5 - ERA5).
A reanálise consiste na combinação de observações históricas e estimativas globais. Os dados em questão possuem resolução espacial de 25 km e frequência horária. Foram utilizados 30 anos de dados para fazer a climatologia por estação do ano das seguintes variáveis: a) temperatura mínima, b) temperatura máxima, c) umidade, d) vento, e) precipitação.
Na figura acima, tem-se a climatologia da temperatura mínima, variável que deve ser levada em consideração na hora de realizar a trilha dos Marins. Nota-se que o inverno é a estação em que se tem as menores temperaturas. Isso ocorre devido à posição da Terra com relação ao Sol e também pela atuação de sistemas meteorológicos que favorecem a incursão de frente fria nesta região.
Nota-se que o Pico dos Marins está inserido em umas das faixas de menores temperaturas durante todo o ano. Nesse sentido, a temperatura máxima varia de 20°C a 26°C. Isso acontece por se tratar de uma região de serra, sendo a altitude um importante fator para esse cenário.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a umidade presente no ar ideal para os seres humanos é entre 50% e 60%. É possível perceber que durante todo o ano, a umidade relativa fica acima de 50% na região. Contudo, vale ressaltar que esses valores são o resultado da média dos dados. Sendo assim, é provável que em dias de inverno, após a passagem de uma frente fria, a umidade relativa do ar seja inferior a 50%.
O Pico dos Marins está localizado na região sudeste do Brasil, sendo assim está inserido no sistema de monção. Isso significa que o verão é chuvoso e o inverno é seco e é exatamente esse padrão que é observado na figura acima. Sendo assim, os maiores acumulados diários são registrados no verão, seguido pela primavera, depois o outono e, por fim, o inverno.
Na literatura, o Pico dos Marins está inserida em uma região que possui clima tropical de altitude (Cwa), no qual o verão é a estação mais quente e chuvosa e o inverno frio e seco. Nesse sentido, recomenda-se que a subida ao Pico dos Marins seja feita no final do outono e, principalmente, no inverno. Isso porque mesmo sendo estações em que a temperatura mínima pode chegar próxima a 0°C, a chance de ocorrência de chuvas e raios é bem pequena quando comparada com a primavera e verão. Para se proteger do frio, basta possuir roupas e equipamentos adequados. No entanto, mesmo que o inverno seja a melhor época para realização dessa trilha, é muito importante consultar a previsão do tempo de órgaõs oficiais antes de iniciar a trilha, pois a atmosfera é dinâmica e mesmo no inverno podem ter dias de chuva, rajadas de vento e raios.
Em uma das expedições, foi realizada a análise do céu no Pico dos Marins. O mapeamento do céu foi feito por imagens capturadas em várias exposições, de posições diferentes para melhor captação de luz das estrelas e do centro galáctico, totalizando 70 fotos em uma panorâmica.
O empilhamento foi feito no softwareSequator e a edição/montagem da panorâmica foram feitas no softwareAdobe Ligthroom, resultando na imagem acima. Para o mapeamento, foi utilizado o software de código aberto Stellaraium onde o mesmo simula o céu do Pico dos Marins.
Através dessas fotos e do mapeamento realizado, podemos notar que o céu do Pico dos Marins é considerado ideal para registro de constelações e objetos de fundo (com o equipamento adequado). No caso dessa missão, foi utilizada uma câmera Canon T6 com uma lente grande angular de 18-55bmm. A partir da imagem registrada é possivel sinalizar alguns pontos, tais como:
Além disso, é possível notar que a poluição luminosa e a poluição atmosférica, principalmente vinda do Vale do Paraíba - SP, atrapalham a observação e o registro de imagens. Seria necessária, em trabalhos posteriores, uma investigação mais minuciosa para melhor conscientização de prefeituras das cidades próximas ao Pico para preservar a atmosfera e, em consequência, a visualização do céu.
Por fim, podemos destacar que o céu do Pico dos Marins é ideal para observação e mapeamento de constelações para possíveis passeios a turismo astronômico. Tal ação contribuiria para o aprendizado e para as atividades econômicas dos guias que frequentam e trabalham no local, tornando mais um atrativo natural do local.
Em algumas expedições, foram coletadas amostras de água em 3 pontos na região Pico dos Marins para realizar análises microbiológicas de contaminação por coliformes totais e Escherichia coli(fecal) . Os pontos estão apresentados na figura abaixo.
Para realizar este estudo, foram coletadas amostras de água em frascos estéreis e encaminhadas para análise em Laboratório, dentro de caixa de isopor. Utilizou-se o método do substrato definido (Colilert), com leitura dos resultados em 24 h, por meio de alteração de cor e fluorescência em ultraviolta. Os resultados foram comparados ao padrão microbiológico de potabilidade, conforme estabelecido na Portaria MS 888/2021.
Detalhes da amostragem de água e condução da análise microbiológicos podem ser vistos abaixo.
Os resultados obtidos diante das análises de potabilidade constataram que a água no ponto de coleta 1 está com contaminação fecal, sendo considerada imprópria para consumo. O uso de pastilhas de cloro deve ser estudado já que a combinação com matéria orgânica daágua pode formar outros produtos considerados tóxicos.
Nos pontos de coleta 2 e 3 não houve contaminação fecal, sendo a água considerada própria para consume, considerando unicamente o aspecto microbiológico da Portaria de Potabilidade MS 888/2021.
A trilha de estudo se inicia no acampamento-base Refúgio dos Marins e termina no Pico dos Marins. Trata-se de uma trilha de aproximadamente 6,5 km de extensão.
Este percurso pode ser feito em 4 h e exige um bom condicionamento físico.
A trilha começa no refúgio ou base dos Marins a 1.563 m, passando primeiro por uma trecho de mata em direção ao Morro do Careca, cruzando algumas partes de uma antiga estrada de chão que levava ao morro.
O Morro do Careca está situado a 1.792 m e possui uma visão panorâmica do Pico dos Marins. É comum os grupos pararem neste local para realizar um lanche, se preparar e apreciar a vista antes da subida.
Depois de passar pelas subidas após o Morro do Careca, o próximo ponto de referência na trilha é o Portal, uma rocha dividindo o meio da passagem, no qual cabe uma pessoa por vez.
Logo após o Portal, a trilha continua subindo e toma a direção à esquerda para contornar um morro de paredes verticais intransponíveis. Nesta virada é possível ver uma rocha com formato de golfinho.
Após a trilha contornar o morro e subir por uma laje de pedra ingreme, o próximo ponto de referência é conhecido como elevador, uma parte onde é necessário subir segurando a fenda. É a única parte da trilha que seria semelhante a uma escalada, ainda assim uma pessoa, mesmo que sem muita experiência, consegue subir sem problemas.
Vencida a subida do elevador, a trilha continua em um platô rodeado por diversas formações rochosas. Este platô é uma área de baixa inclinação onde as águas que descem das nascentes se acumulam e formam o Ribeirão Passa Quatro. Nesse platô existem dois pontos de água:
• No começo da subida de outra trilha, para o Pico do Marinzinho
• No começo do ataque para o cume do Pico dos Marins
Após o platô, encontra-se a parte final da trilha, que é o ataque ao cume, feito por lajeados íngremes de rocha.
Quanto à classificação, a trilha ao Pico dos Marins é considerada de difícil acesso para turistas, com tempo médio total do percurso de 8 h.
Ao percorrer a trilha, o indivíduo estará sujeito a frio intenso, sendo desaconselhado a ida em dias chuvosos, como descargas elétricas e piso escorregadio.
A classificação do grau de dificuldade da trilha, segundo ABNT NBR 15505-2, varia de 1 a 5.
A escala da trilha de estudo variou de 3 a 5, conforme a severidade do meio, orientação do percurso, condições do terreno e grau de esforço físico.
Esta classificação exige, para uma caminhada segura, um bom condicionamento físico e a presença, na equipe, de um guia turístico conhecedor da região de estudo!
Simbiose é o nome da associação física íntima entre duas espécies, podendo ser ou não benéfica para ambas. Uma das importantes simbioses é aquela formada entre certos fungos do solo e a grande maioria das plantas terrestres chamada micorriza.
Esta relação é importante para o crescimento das plantas, já que o fungo amplia a região de absorção de água e nutrients pelas raízes, em troca de abrigo e carboidratos oriundos da fotossíntese.
Veja, no esquema abaixo, o aumento da área de absorção das raízes, quando da presença de hifas do fungo, impactando positivamente no crescimento da planta hospedeira.
Planta
O solo apresenta diversas estruturas ou propágulos de fungos que formam micorriza. Os esporos são estruturas de reprodução e resistência, os quais germinam e produzem hífas que penetram nas raízes. Internamente das raízes, o fungo produz uma estrutura chamada arbúsculo, onde ocorre a troca de água e nutrientes do fungo à planta e os carboidratos da planta ao fungo. Pode ou não formar estruturas de reserva energética como as vesículas. Com isso, é iniciada a simbiose entre plantas e fungos chamados micorrizicos arbusculares, como mostrado nas figuras abaixo.
Chega de esquemas!
Entenda agora o processo de formação da simbiose acontecendo na prática, com imagens de laboratório dos componentes envolvidos, na região do Pico dos Marins.
Veja, em imagens de microscópio, uma raiz de planta coletada na área de estudo e que foi submetida a processos de coloração para permitir visualização de estruturas de fungos micorrízicos arbusculares. arbúsculos
Esta foi a primeira vez que se estudou esta simbiose na região do Pico dos Marins, com registros importantes de imagens como as apresentadas. Comprovou-se que as plantas estudadas formam micorriza e precisam desta simbiose para sua sobrevivência nas condições de solo e clima observadas na região.
A região do Pico dos Marins é um ambiente diverso e desafiador, com muitas possibilidades de estudos integrados de ensino, pesquisa e extensão.
O presente projeto, por meio de uma equipe multidisciplinar, forneceu produtos inéditos como mapas de relevo, hidrográfico, pedologia, cobertura vegetal, uso e ocupação do solo, mapas climáticos de temperatura, umidade relativa do ar e precipitação nas diferentes estações do ano, estudos de estrelas e constelações, qualidade microbiológica da água de pontos importantes de abastecimento, classificação da trilha e a comprovação da formação de relações simbióticas entre plantas e fungos do solo.
Estes dados desvendam alguns mistérios e sensibilidade deste ambiente, e garantem material para aplicação em tomadas de decisão por gestores ambientais, enriquecimento de informações para guias turísticos e professores, além de contribuição à ciência com forte estimulo à preservação e contemplação.
Agradecimento especial ao guia Eduardo Del Ducca, que garantiu a subida e segurança de toda a equipe de trabalho nas expedições realizadas.
Este projeto de extensão foi financiado pela Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Itajubá e mostra que a relação entre ensio-pesquisa-extensão deve ser sempre priorizada quando se buscam conhecimentos amplos, diversos e integrados.
Consulte nossas redes sociais para detalhamento dos trabalhos realizados, diretamente nas expedições ao Pico dos Marins realizadas em 2022 e nos laboratórios de ensino e pesquisa da nossa universidade.
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