Em defesa da fábrica/museu: discurso da jornada de 18 de julho 2004

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Silvenses e amigos da Fábrica/Museu que aqui se deslocaram, alguns de bem longe, que eu sei. Obrigado! Muito obrigado pela vossa presença! Esta fábrica já centenária assistiu no passado a muitas lutas. Por melhores salários, por melhores condições de trabalho, enfim, por variadas razões. Os silvenses, designadamente os corticeiros, eram unidos e reconhecidos pelo seu carácter combativo e reivindicativo. Comemoraram-se, solenemente, há poucos dias os 80 anos sobre uma dessas datas: o 22 de Junho de 1924. Esta Fábrica conhece hoje mais uma jornada de luta, agora pela sua própria sobrevivência. Esta fábrica que deu trabalho aos nossos pais e avós, trouxe riqueza e prestígio à cidade no tempo da indústria corticeira, é uma parte da nossa memória colectiva. É património desta cidade como é o castelo, a Cruz de Portugal e outros monumentos de que todos se orgulham. E tem esse estatuto de monumento, por lei, já que é “imóvel de interesse concelhio”. É, também, um dos últimos vestígios desse passado não muito distante e que alguns aqui ainda viveram. Um passado que o Museu da Cortiça veio honrar, celebrar e guardar para as gerações futuras. O valor deste espaço/museu foi internacionalmente reconhecido em 2001. Foi então “melhor museu industrial europeu”, entre centenas de outros por toda a Europa. A nossa história, o nosso património tecnológico e o trabalho de recuperação arquitectónica, mas não só, aqui realizado tiveram reconhecimento. Milhares de pessoas visitaram este espaço entre 1999 e 2009. Em 2001 o museu recebeu 103 000 visitas! Foi um dos museus mais visitados de Portugal. Hoje, a Fábrica/Museu após a falência do projecto Fábrica do Inglês está em perigo. O seu edifício passou a pertencer, após o leilão do passado mês de Maio, à Caixa Geral de Depósitos, o espólio do Museu da Cortiça ao Grupo Nogueira. Sobre este edifício, exemplar único de uma fábrica de cortiça do séc. XIX, correm interesses imobiliários por parte do seu dono: a construção de um supermercado; sobre o museu, interesses pouco claros, incompreensíveis de momento, mais ainda quando fomos todos surpreendidos pela aquisição do espólio por este grupo, dedicado à distribuição alimentar, contra a própria Câmara Municipal de Silves que se preparara para adquiri-lo e disso tinha feito divulgação pública.


Num caso e no outro, para além das incertezas que rodeiam o seu futuro, existem sérias preocupações de conservação. O edifício continua entregue, sem grandes cuidados, às mãos de quem comprou o seu recheio à leiloeira; claro, já houve abusos; o museu, está em parte destelhado desde o tornado e entra água numa zona muito sensível. No seu interior amontoam-se agora peças e máquinas vindas do resto do complexo. Um museu não pode estar assim! São estas algumas das nossas preocupações e que estão na base deste nosso encontro. A cidade de Silves quer saber, o país quer saber, todos aqueles que se preocupam com a herança histórica e cultural guardada por este espaço e museu querem saber o que os proprietários entendem fazer com estes valores de que são fiéis depositários. E o que os políticos, nossos representantes irão decidir. As coisas não podem continuar assim. É urgente uma solução que devolva à cidade e ao usufruto de todos o espaço da Fábrica e o seu Museu. Os Museus e o Património Cultural não estão à venda! A nossa memória colectiva não é mercadoria! Silves 18 de Julho de 2014


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