Mostra de Cinema "A poesia do cotidiano e das cidades"

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Sesc | Serviço Social do Comércio

A POESIA DO COTIDIANO E DAS CIDADES 09, 13, 16 e 27 de março de 2019 Centro de Cultura e Turismo Sesc Ver-o-Peso / PA



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APRESENTAÇÃO

Estamos tão mergulhados em nossas rotinas que pouco reparamos no quanto nosso cotidiano e nossa cidade estão imersos de poesia. Para superar essa dificuldade e, ao mesmo tempo, celebrar a descoberta e a reafirmação da poesia no cotidiano, trazemos quatro filmes apaixonantes e detonadores da felicidade do instante. Um dos pontos que cabe destacar é o elo de contemplação que esses filmes propõem com a vida, desconstruindo nosso olhar frente a um cotidiano no qual a velocidade engole nossas percepções e esmorece nossa capacidade crítica e sensível do mundo. Muitas vezes, a poesia nessas obras se manifesta pela concepção de tempo. Esse vínculo entre tempo e cidade é fundamental para o entendimento de como nos organizamos em sociedade, de como materializamos a nossa vida. Paterson propõe uma abordagem mais filosófica do tema. Já O sabor da vida trabalha o valor das tradições, que tendem a ser aniquiladas pelas mudanças diárias de um mundo dinâmico. Um misto de existencialismo e tensão histórica aparece em O que está por vir como reflexão do cotidiano. Em Columbus, a cidade, em especial sua arquitetura, se expressa como poesia em si: a beleza da forma, mas também a necessidade contemplativa na qual ambas estão imersas.


Enfim, falar de cidades é pensar a nossa relação com o tempo, o espaço e a história. Entretanto todas essas imbricações desembocam no homem e na sua capacidade de construir metáforas e outros simbolismos, sem deixar de envolver tudo com uma pitada de poesia.


09.03 (sábado) às 16h

PATERSON


ORIGEM: ESTADOS UNIDOS ANO DE PRODUÇÃO: 2016 DURAÇÃO: 113 MIN CLASSIFICAÇÃO: 10 ANOS DIREÇÃO: JIM JARMUSCH ELENCO: ADAM DRIVER, GOSHIFTEH FARAHANI, HELEN-JEAN ARTHUR

SINOPSE Na cidade de Paterson, em Nova Jersey, EUA, um pacato motorista (Adam Driver) torna-se um personagem conhecido por se destacar em uma arte diferente da condução de veículos: nas horas vagas, ele gosta de escrever belas poesias em seu caderninho.


BREVE REFLEXÃO Só um cineasta imprevisível como Jim Jarmusch poderia nos brindar com um filme tão criativo e inusitado. Só ele poderia juntar poesia, um motorista de ônibus (cujo nome é o mesmo da cidade onde mora), uma artista excêntrica e um cachorro tinhoso e turrão. Um filme em que a poesia conforma todo o resto, emaranhando personagens e suas ações no tempo e usando a repetição como elemento definidor da própria personalidade do nosso Paterson. Afinal, o efeito da repetição é o que movimenta pessoas e cidades, por isso a brincadeira da dualidade entre personagem e cidade. Mas Jarmusch acrescenta a isso um ardil, o da arte e seu papel como desestabilizador da vida mecânica que fundamenta as cidades. Paterson é uma obra detalhista, que aguça o espírito de observação do espectador, e que precisa ser vista com a alma, pois sua profundidade está enraizada também em cada um de nós. A poesia impregna a estrutura narrativa, assim como está posta na própria ação do personagem Paterson. A poesia que ele escreve é, antes de tudo, uma forma de sobreviver ao cotidiano repetitivo. Mas ainda há a poesia de William Carlos Williams, que retrabalha o tempo cotidiano, reforçando o coloquialismo presente no filme. Sua poesia aparece em momentos cruciais, quando a cidade é ressignificada a partir dela e também da sua relação com os personagens, em especial com o protagonista Paterson.


Jarmusch consegue comungar exemplarmente, em Paterson, a paisagem imagética e a sonora. O som no filme cria uma ambiência tal que, ao sair, temos a sensação de que conhecemos tanto o universo tátil de Paterson quanto seu espírito. Esse parece ser apenas um detalhe, mas não é, na medida em que o filme todo se estrutura pela aplicação de muitos detalhes, desde o belo e intrigante cão Marvin até a arte em preto e branco da esposa de Paterson. A graça dessa obra está nas sutilezas, nos presentes que Jarmusch pacientemente nos oferta a cada cena. Tudo parece de uma simplicidade absurda, entretanto é nesse aparente descompromisso do cotidiano que esse diretor fantástico inunda inesperadamente nossas vidas com poesia. O mundo urbano, com sua sujeira, sua aparente banalidade, é capaz sim de ser inebriado e tomado por um surto poético. E Jarmusch nos mostra tudo isso com muita delicadeza e sutileza.


13.03 (quarta) Ã s 18h

O SABOR DA VIDA


ORIGEM: FRANÇA | ALEMANHA | JAPÃO ANO DE PRODUÇÃO: 2015 DURAÇÃO: 113 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: NAOMI KAWASE ELENCO: NAGASE MASATOSHI, KIRIN KIKI, UCHIDA KYARA, MIYOKO ASADA, ETSUKO UCHIHARA

SINOPSE Sentaro (Masatoshi Nagase) dirige uma pequena padaria que serve dorayakis, bolos recheados com pasta doce de feijão vermelho. Quando uma senhora de idade, Tokue (Kirin Kiki), se oferece para ajudar na cozinha, ele relutantemente aceita. Mas Tokue prova ter mágica em suas mãos quando se trata de fazer an, um doce feito também com feijões vermelhos. Graças à sua receita secreta, o pequeno negócio logo floresce e, com o tempo, Sentaro e Tokue abrem seus corações, revelando velhas feridas.


BREVE REFLEXÃO Ao ler a sinopse de qualquer filme dirigido por Naomi Kawase, tudo leva a crer que se trata de mais um daqueles repletos de clichês que abundam nos dramas produzidos pela indústria norte-americana. Kawase não faz esse estilo; seus dramas trazem reflexões humanas profundas e como de costume há nesse O sabor da vida um clima de encantamento vindo justamente das ações cotidianas. O mais tocante desse filme é a atuação da veterana atriz Kirin Kiki. Por meio da delicadeza de sua interpretação, Kawase constrói enredos de vida em torno de uma pequena padaria, administrada pelo carrancudo Sentaro. A sutileza com a qual Tokue se expressa na vida é visível, e Kawase se esmera ao mostrar detalhadamente a preparação de sua especialidade, a iguaria an.


O filme então se constitui muito mais pela relação que estabelece entre os personagens e entre eles e as coisas do que pelo que é propriamente dito. Em síntese, há uma crítica subliminar ao processo de industrialização de alimentos e um elogio às práticas tradicionais, cada vez mais engolidas por uma sociedade regida pela aceleração do tempo e pela valorização do descartável.


27.03 (quarta) às 18h

O QUE ESTÁ POR VIR


ORIGEM: FRANÇA | ALEMANHA ANO DE PRODUÇÃO: 2016 DURAÇÃO: 98 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: MIA HANSEN-LOVE ELENCO: ISABELLE HUPPERT, ANDRE MARCON, ROMAN KOLINKA

SINOPSE Nathalie (Isabelle Huppert) é professora de filosofia, tem dois filhos que pouco vê e um marido também docente, seu companheiro há 25 anos. Entre trocas de ideias com o pupilo anarquista, ligações insistentes da mãe solitária e piquetes de alunos, ela leva uma vida tranquila. Mas tudo está para mudar.


BREVE REFLEXÃO Com menos de 40 anos de idade, a diretora Mia HansenLove já tem uma carreira consolidada. Seus filmes apresentam uma marca inconfundível, um carimbo incontestável. O grande desafio dela nessa obra é dirigir a maior atriz francesa viva, Isabelle Huppert, também dotada de uma presença impositiva e marcante nas suas atuações. O que prevalece é a direção segura de Hansen-Love, que consegue introduzir em sua trama uma poderosa reflexão filosófica sobre o cotidiano de Nathalie, não deixando que a dramaticidade sobressaia, o que é a marca dos últimos trabalhos de Huppert.


A opção pela discussão do cotidiano acontece não a partir de um conflito propriamente dito, mas sim dentro de uma diferença geracional entre a experiente Nathalie e o arrojado estudante e ex-aluno (Roman Kolinka). A sensibilidade e a leveza de Hansen-Love em conduzir a narrativa contaminam a própria personagem. A escolha de retratar o cotidiano com poesia é traduzida no estilo da fotografia, em que o sol parece impor sua força. O que está por vir é um filme solar e sua diretora revela enorme capacidade de falar da existência com uma simplicidade arrebatadora, mas sem nunca abrir mão de uma profundidade que só a filosofia pode proporcionar.


16.03 (sábado) às 16h

COLUMBUS


ORIGEM: ESTADOS UNIDOS ANO DE PRODUÇÃO: 2016 DURAÇÃO: 104 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO: KOGONADA ELENCO: HALEY LU RICHARDSON, JOHN CHO, PARKER POSEY

SINOPSE Casey (Haley Lu Richardson) vive com a mãe em uma cidade pouco conhecida e assombrada pela promessa de modernismo. Jin (John Cho) chega do outro lado do mundo para visitar seu pai que está quase falecendo. Sobrecarregados pelo peso do futuro, eles encontram refúgio um no outro e na arquitetura que os rodeia.


BREVE REFLEXÃO O que primeiro chama a atenção em Columbus é o clima contemplativo que vemos em boa parte do filme. Os personagens contemplam, a câmera contempla e, por fim, nós espectadores somos também conduzidos à contemplação, pelo diretor norte-americano de origem sul-coreana Kogonada. Portanto, o público deve ir preparado emocionalmente para poder fruir plenamente e com tranquilidade essa obra que prima pela dilatação dos planos e do tempo. Mas isso não é tudo, a contemplação não é o todo, apenas funciona como o dispositivo, como um caminho para nos levar a lugares mais profundos e também prazerosos. Ao pensar nos planos do filme, Kogonada acredita na relação que o cinema estabelece com o tempo, e esse é um grande acerto de sua direção. Assim ele nos impõe seu ritmo. Ou seria a cidade de Columbus a ditar o seu ritmo aos personagens e ao filme, o que justificaria inclusive o nome deste? Columbus é uma cidade conhecida por sua vocação para a arquitetura modernista, e Kogonada propõe pensar seu filme por meio dela, tomando-a como sua matéria-prima. Esse detalhe impregna de tal forma a sua estética fílmica, que periga abandonarmos o enredo para apenas admirarmos seus arquitetônicos planos. Mais do que inspiração, a arquitetura modernista se integra à estética de sua obra, transformando-se em sujeito, mais do que em objeto. Por isso julgamos que seria redutor analisar o filme apenas tendo a arquitetura como algo figurativo, vista somente pelo caráter de sua visualidade. A poesia espacial ditada pelos enquadramentos de Kogonada definitivamente forja a força de Columbus.


Dentre as inúmeras qualidades do filme, também merece registro a forma com que ele caprichosamente contrapõe a racionalidade das linhas arquitetônicas modernistas com as formas desalinhadas de seus personagens. Enquanto a forma cinematográfica e os planos nos impactam com sua geometria simétrica, os personagens nos são apresentados em suas assimetrias, como se as formas retilíneas e justas dos prédios contrastassem com as imperfeições humanas. Mas as imperfeições aqui não devem ser entendidas como materiais ou relativas ao corpo, e sim imbricadas no campo espiritual. Fica a pergunta: como é possível que o homem seja capaz de construir formas arquitetônicas tão exatas e racionais, enquanto estabelece, em sua vida cotidiana, relações humanas tão irracionais?


Sesc | Serviço Social do Comércio PRESIDÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL

José Roberto Tadros DEPARTAMENTO NACIONAL DIREÇÃO-GERAL

CONTEÚDO DIRETORIA DE CULTURA

Marcos Henrique da Silva Rego GERÊNCIA DE CULTURA

Márcia Costa Rodrigues

Carlos Artexes Simões ANALISTAS EM AUDIOVISUAL

PUBLICAÇÃO DIRETORIA DE COMUNICAÇÃO SUPERVISÃO EDITORIAL

Jane Muniz

Fábio Lucas Belotte Marco Aurélio Lopes Fialho TEXTOS

Marco Aurélio Lopes Fialho

PRODUÇÃO EDITORIAL

Juliana Marques COPIDESQUE

Gustavo Barbosa (Conceito Comunicação Integrada) PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO

Paloma de Mattos

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Todo ano, o CineSesc adquire os direitos de exibição de longasmetragens que são levados para todo o Brasil nas programações dos Departamentos Regionais do Sesc. O projeto é organizado por mostras temáticas com filmes contemporâneos em que há uma seleção específica de um movimento estético ou diretor(a) importante na história do cinema. A área audiovisual do Sesc busca ofertar obras com formas narrativas impactantes e que trazem reflexões para todo o público, alinhadas com os princípios sociais que movem a instituição. A principal marca do CineSesc é o foco no cinema independente. Vale dizer que os filmes participantes têm muitas dificuldades para adentrar no circuito comercial, e até quando conseguem entrar em cartaz ficam restritos a uma ou duas salas nas maiores capitais brasileiras. Fazer esses conteúdos atingirem um público mais amplo é o nosso desafio e uma de nossas tarefas mais importantes.

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