Fascículo 1

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Guia ÉPOCA Enem 2007 como estudar | habilidades e competências | características | exames |

características

Além do conhecimento

ETIMOLOGIA Texto vem do latim textum, tecido. Tecer idéias é estabelecer relações entre as partes

Saber as matérias não basta. O Enem exige dos alunos a percepção de que as disciplinas estão relacionadas entre si e com a realidade extracurricular

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Interdisciplinaridade

A interdisciplinaridade é uma articulação de diversos campos de conhecimento. As disciplinas “dialogam” a fim de fomentar a capacidade de perceber as múltiplas implicações possíveis, quando se analisam acontecimentos naturais ou sociais. As questões propostas são elaboradas a partir de um fenômeno geralmente extraído do cotidiano, de dimensão socioeconômica, política, ecológica, filosófica ou cultural, levando-se em conta sua rede complexa de relações. Uma face importante do trabalho didático que envolve as questões propostas é a que se dá por meio de conceitos como tempo, espaço, dinâmica das transformações sociais, a consciência da complexidade humana e da ética nas relações sociais, a importância da preservação do ambiente, o conhecimento básico das condições necessárias para o pleno exercício da cidadania. As disciplinas acadêmicas são subprodutos de recortes e pré-seleções arbitrários, histórica e ideologicamente construídos. Representam as mais diversas modalidades de interesses e relações de poder que ressaltam, ocultam ou negam outras formas de conhecimento. A partir de conceitos-chave, estimula-se que a cobrança se dê de uma outra I

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maneira. A compreensão de um fenômeno matemático ou de um problema de logística, a descrição de um processo físico ou de uma reação química e as diferentes formas de sensibilização por meio de leituras propostas pela literatura estão interagindo continuamente. Como a consciência da realidade se constrói num processo de interpenetração dos diferentes campos do saber, a interdisciplinaridade é a resposta mais adequada ao modelo anterior. O desenvolvimento das pesquisas científicas e os avanços da tecnologia mostraram que o sujeito pesquisador interfere no objeto pesquisado e que não há neutralidade no conhecimento. A interdisciplinaridade pressupõe colaboração, complementaridade e integração entre os conteúdos das diversas áreas do conhecimento presentes nas propostas curriculares. Trata-se de prática interpretativa que visa a construir significados. O que se busca é a percepção de que todos os fenômenos estão inter-relacionados. Não se aceita mais que se jogue no chão uma bituca de cigarro sem que alguém se responsabilize pelas conseqüências dessa atitude. Enchentes e doenças ligadas às chuvas excessivas combinadas com urina de rato matam pessoas. O efeito estufa se deve provavelmente também a atividades humanas que poderiam ser controladas ou

Foto: globopress

domínio das disciplinas é fundamental para o estudante, mas não é suficiente. É preciso que ele as relacione e perceba que os saberes, embora específicos, não pertencem a compartimentos estanques. A característica principal da prova do Enem talvez seja a relação entre três aspectos fundamentais do conhecimento: a interdisciplinaridade, a intertextualidade e a interpretação, não apenas de textos, mas também de tabelas, gráficos e diagramas. Veja a seguir o que significa cada um desses conceitos.

evitadas. Essas inferências exigem de nós colaboração, complementaridade e integração entre os conteúdos das diversas áreas do conhecimento presentes nas propostas curriculares. .

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Intertextualidade

Intertextualidade significa relação entre textos. O texto é um todo significativo. A palavra texto vem do latim textum, tecido. Por isso se fala em indústria têxtil. Na significação original está presente a idéia de entrelaçamento de linhas, cordas ou cordões, formando redes ou tramas: o tecido. Há um curioso jogo de palavras, nunca arbitrário, formado por rede (e o que é elaborar enredos?), tramas (construir sobrepondo e entrelaçando idéias) e linhas (metonímia para o sintagma através do qual as idéias se encadeiam). Tecer idéias, construir textos, nada mais é que estabelecer relações entre as partes que compõem esse todo. O Enem exige que se saiba relacionar textos que estabeleçam certo diálogo entre si. Geralmente são confrontados textos que tratam de assuntos correla-

2 d e j u l h o d e 2 04 0 7| r e v i s t a épo c a | f a s c í c ulo I

tos. Às vezes, são as formas de abordagens ou as estruturas morfossintáticas que apresentam correspondências. Referências, alusões, epígrafes, paráfrases, paródias ou pastiches são algumas das formas de intertextualidade (em seu diálogo com a tradição artística), utilizadas como proposta de fundo para outros questionamentos. Escritores consagrados tiveram suas obras reviradas, parodiadas, parafraseadas. Camões retomou diversas cantigas medievais em seus versos redondilhos e soube recuperar idéias e temas de Platão e Petrarca. Gregório de Matos fez uma releitura dos espanhóis Luis de Góngora e Francisco de Quevedo. Oswald de Andrade parodiou Gonçalves Dias, que também foi parodiado por Murilo Mendes e José Paulo Paes. Carlos Drummond recicla Tomás Antônio Gonzaga. Adélia Prado, por sua vez, recupera Drummond. Machado de Assis traduz Edgar Allan Poe e o recupera em

sua borboleta de Memórias Póstumas. O famoso “No Meio do Caminho”, de Drummond, ecoa a obra de Olavo Bilac, “Nel Mezzo del Camin”, que por sua vez é uma retomada de Dante Alighieri. O mesmo se dá com as recriações em relação ao cinema, ao teatro, à música, à escultura, enfim, à arte de modo geral. De uma perspectiva mais ousada, podemos dizer que os próprios gráficos, os diagramas, as tabelas, os quadrinhos, as charges, as ilustrações de modo geral são textos não-verbais que dialogam com outros textos, com os enunciados e até com as próprias alternativas.

É comum encontrar no exame textos de diferentes autores que tratam de assuntos correlatos

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Interpretação

Interpretar (inter = entre + pretor = preço) é determinar o significado preciso, entender, avaliar. Interpretação vem do latim interpretationis. Palavra que, no final da Idade Média, já tinha

o significado de “explicação, tradução, compreensão”, mas também “avaliação ou decisão”. Era o “entrepreço” praticado nos entrepostos medievais, cujos mercadores de diferentes burgos buscavam padronizar na vaga tentativa de traduzir as diversificadas falas ou dialetos, indicando valores, equivalências. Era papel então do intérprete traduzir ou decidir o valor, o preço da mercadoria em questão. Atualmente interpretar é ainda um pouco disso tudo. É “ajuizar certo sentido”, é “verter ou traduzir o significado de um termo de uma língua estrangeira”, é “determinar um valor equivalente”. Quando deparamos com um texto cujos sentidos latentes precisam ser alcançados, ajuizados ou vertidos, estamos fazendo um exercício de interpretação. Ocorre nesse momento a necessidade de se conhecerem as entrelinhas, os meandros, os pressupostos, as figuras de linguagem e suas correspondências semânticas, enfim, as idéias subjacentes. A interpretação é uma competência relacionada a conhecimento subjacente. Quando transportamos essas definições para o campo dos gráficos, tabelas e diagramas, percebemos a mesma necessidade, ainda que de um modo mais “algébrico” ou “lógico”, menos sujeito a ambigüidades. Em planos cartesianos, nas quantidades especificadas nas tabelas ou nas áreas relativas dos diagramas, o que prevalece é a relação ou proporção matemática, na forma de vetores ou de curvas. Continuamos coletando os sentidos latentes que precisam ser alcançados, ajuizados ou vertidos. Estamos fazendo aí também um exercício de interpretação. Roberto Dalefi

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