Domenica de rosa cartas da toscana pt

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– E tiram fotografias para provarem que viram mesmo todas essas coisas – acrescenta Emily, sentindo-se arrogantemente distanciada dessa espécie de turistas, ali sentada num restaurante italiano com o sobrinho do dono, a beber um vinho delicioso que nem sequer vem mencionado na carta de vinhos. – Isso quer dizer que você não é uma turista? – interroga Raffaello num tom provocador. – Não – responde-lhe Emily, ofendida. – Eu vivo aqui. – Eu nasci aqui – replica Raffaello, recostando-se na cadeira quando o empregado coloca na mesa dois fumegantes pratos de ribollita –, mas não me sinto em casa. Continuo a ser o «Raffaello Americano». Continuo a ser o arqueólogo maluco. – Mas é o arqueólogo maluco daqui – sublinha Emily, tentando não atacar a comida com demasiada voracidade. A ribollita, uma espécie de sopa feita com pedaços de pão, está inacreditavelmente saborosa. – Talvez – replica Raffaello. – Mas continuo a ser o homem maléfico que matou a própria esposa. Agora que aquele tema foi abordado, Emily sente-se bem mais aliviada. A mulher morta, bela e amaldiçoada como uma personagem de um conto de fadas, já não é um obstáculo entre eles. – Decerto que ninguém acredita realmente nisso. – Não? Todos os anos, no aniversário da morte da Chiara, alguém me manda uma fotografia dela. Em baixo vem escrito: «Chiara Belotti, assassinada por R. Murello em 1992.» – Não! – exclama Emily, chocada. – Quem faria algo assim? Embora Raffaello responda com um encolher de ombros, Emily acha que ele desconfia de alguém em concreto. E, pensando no assunto, ela também. Raffaello suspira, bebe um gole de vinho e depois diz: – A princípio eu não sabia que ela era anorética. Agora isto parece uma estupidez, mas a verdade é que não sabia mesmo. Claro que ela era muito magra, mas o mesmo acontece com muitas raparigas. E sempre me pareceu que comia bem. Quando saíamos, parecia-me sempre que ela gostava da comida. – Trouxe-a aqui? – pergunta Emily, sabendo qual vai ser a resposta. Raffaello acena afirmativamente. O seu olhar é sombrio e imperscrutável. – Ela adorava vir aqui. E os empregados adoravam-na também. Costumavam fazer uma sobremesa especial para ela, uma torta de


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