Armando lucas correa a garota alemã

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corredor está cheio de fotos antigas exibidas numa ordem aleatória. Casamentos recentes, aniversários, recém-nascidos. A história da família Berenson depois da guerra. Mas nada da sua vida na Alemanha. Na sala de estar, a sra. Berenson descansa numa poltrona perto da janela e não se volta para nós quando entramos. A mobília é feita de mogno escuro e pesado. Tudo no apartamento deve ter custado uma fortuna. Não há muito espaço para andar entre as cristaleiras, mesas, sofás, poltronas e os ornamentos. Tenho medo de espirrar e quebrar alguma coisa. E cada peça do mobiliário é protegida por uma toalha de renda. Que obsessão por cobrir as superfícies! Até as paredes são cobertas com um papel de parede num tom triste de mostarda. Estou convencida de que o sol nunca entrou nesta casa. “Vocês podem ver que ela é um pouco nervosa”, o filho explica, talvez para que a mãe ouça e tenha alguma reação. No entanto ela continua imóvel. Mamãe pega na mão dela e a senhora responde com um sorriso. “Sorrir é o melhor que posso fazer na minha idade”, diz a velhinha, quebrando o gelo. Não entendo bem o que ela diz. Viveu quase toda a sua vida em Nova York, mas seu sotaque alemão ainda é muito forte. Mamãe me apresenta, e eu aceno com a cabeça de um canto da sala. Com dificuldade, a sra. Berenson levanta a mão direita, cheia de anéis de ouro, e faz um leve movimento para me cumprimentar. “A tia-avó da minha filha nos enviou os negativos. Ela viajou no navio com a senhora. Hannah Rosenthal.” Eu não acho que a sra. Berenson tenha algum interesse pela nossa família. Quando sorri, seus olhos se abrem mais e transparece um ar de menina travessa por trás da idosa entediada que sobreviveu à guerra e agora só consegue se locomover com ajuda. “Esses eram nomes muito comuns naquela época. Trouxe as fotos?”


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