Revista Femme

FEMME GÊNERO E SEXUALIDADE EM TRÂNSITO: OS PERSONAGENS DA NOVA GERAÇÃO FLUIDA

ASTROLOGIA A FEMINISTA DE CADA SIGNO

A S F E M I N I S TA S DO SÉC XXI DEZEMBRO 2016

Índice 2 .....................................................Editorial 3 ......................As feministas do séc XXI 5 ...............................................................................Júlia Couto 7 .............................................................................Carol Ruas 9 .......................................................................................Yasmin Gomes 11 ......................................................................................Mariah Friedrich

Gênero e sexualidade em trânsito.... 13 Wadson Schimitberger.............................................. 15 Arian Motta......................................................... 17 Amanda Amaral............................................................... 19 Thaylan Tolentino......................................................... 21

23 .......A feminista de cada signo

Editorial A revista Femme é o resultado de um trabalho produzido para a disciplina de Feminismo e Cultura Audiovisual do curso de Comunicação Social da UFES, ministrada pela professora Gabriela Alves.

O objetivo da revista é divulgar matérias de cunho feminista, mas também de outros temas relacionados às minorias sociais. Aqui o espaço é destinado a todos que queiram discutir gênero, feminismo e sexualidade, seja por meio da literatura ou da arte.

A concepção e produção da revista foi feita por Carina Campo Dall’Orto Costa, ou Carinos, que cursa Jornalismo na UFES e Direito na FDV. Carinos tem 21 anos, é pisciana e tem preferência por temas que abordem a questão da liberdade de gênero.

Boa leitura!

Produção e texto: Carina Costa; Edição: Julia Grillo; Fotografia: Carina Costa, Rafaela Laiola, Julia Grillo, Luiza Grillo e Gabriel Lorenzoni; Participações especiais: Carol Ruas, Júlia Couto, Yasmin Gomes, Mariah Friedrich, Amanda Amaral, Arian Motta, Thaylan Tolentino e Wadson Schimitberger.

Astrologia

As feministas

Aquário - A feminista do signo de aquário representa a essência da revolução das mulheres. Não gosta de padrões, não se enquadra em modelos de revistas prontas. Defende a liberdade das mulheres e seu poder de escolha. Beira ao anarquismo e não gosta de respeitar regras que não fazem sentido. Questiona tudo que parece ser ordeiro demais e odeia a hipocrisia alheia. Acredita que a única solução para as mudanças é a revolução feminista.

Sem dúvidas o feminismo nunca foi tão discutido e estudado como no século XXI. A nova geração, principalmente a que nasceu no final do século XX, conheceu o feminismo e o adotou como estilo de vida. As redes sociais auxiliaram muito esse processo de divulgação das ideias feministas e possibilitou a troca de experiências e conhecimento entre as jovens deste século.

Hoje é perceptível que meninas cada vez mais jovens estão adentrando no universo feminista e disseminando seus ensinamentos às suas mães, tias e avos, àquela geração mais antiga que não teve a oportunidade de ter contato com esse ambiente.

20/01 - 18/02

As feministas do século XXI são muito bem informadas e buscam se atualizar no assunto, seja por meio da leitura de blogs, assistindo vídeos explicativos ou lendo livros de grandes escritoras feministas. A busca pelo conhecimento é grande e a consequência disso é a manifestação de debates ricos e acalorados nas redes sociais, com grupos e coletivos feministas.

A busca pela igualdade é o cerne do debate e infelizmente, muitas pessoas ainda não compactuam com as ideias feministas, por falta de empatia ou mesmo de entendimento da causa.

Peixes - A feminista do signo de peixes é uma eterna sonhadora. Luta a partir de suas idealizações de que o futuro será de igualdade plena entre todos os seres humanos.

Sofre muito devido à violência de gênero e absorve todas as energias coletivas. Pode ficar meio perdida nas discussões, mas o que importa para ela é o que está dentro de si.

Amor e empatia é o que a move no feminismo, mas não deixa de ter horror e ódio àqueles que praticam violência cotidiana.

As mulheres estão longe de alcançar a igualdade e a simples liberdade em todos os âmbitos da vida, mas a luta e a força dessas mulheres em sua resistência é algo a se celebrar e sentir orgulho de ver a evolução do movimento e como ele já ajudou inúmeras mulheres.

Buscamos trazer alguns exemplos de mulheres que viram no feminismo uma forma de se libertarem e viverem com menos pressões sociais e amarras do mundo machista que ainda nos cerca. São mulheres únicas e guerreiras que tentam representar as milhares de feministas que resistem e lutam em busca de um futuro melhor:

19/02 - 20/03 3

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Astrologia Sagitário - A feminista do signo de sagitário é a mais otimista entre as parceiras. Traz animação para o coletivo e gosta de fazer piadas que não sejam ofensivas às mulheres. É expansiva na forma de militar e assim como a ariana, não pensa duas vezes para entrar numa discussão.

Defende seus ideais com unhas e dentes, mas não faz mal a ninguém.

do século XXI

22/11 - 21/12 Capricórnio - A feminista do signo de capricórnio busca a sua emancipação por meio do trabalho. Busca a independência financeira acima de tudo. Luta por meio de sua força de trabalho e não aceita de forma alguma a diferença salarial entre homens e mulheres. Assim como a canceriana, zela pela família e sente orgulho das mulheres que a criaram. Sabe reconhecer as vitórias das parceiras e está sempre disposta a ajudá-las.

22/12 - 19/01 27

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Bom, vou começar meu relato sendo bem clichê, eu digo isso porque boa parte dos relatos que leio sobre o assunto começam com as meninas dizendo que por muito tempo não se reconheceram feministas e tudo mais. Comigo foi assim também, eu não sabia que era feminista, eu não conhecia o feminismo, só ouvia dizer por alto e já ouvia aquelas falas de marginalização: “Feminista é tudo doida”, “Feminista é mal amada”, “Feminista não é feminina”, e eu com certeza não queria fazer parte de um grupo que tivesse esse tipo de atributo perante a sociedade.

Eu realmente me esforcei por muitos anos para fazer parte de um grupo social que fosse “aceito” numa boa, sabe?

Eu cresci sendo taxada de estranha, feia, lésbica e tudo mais, e via isso como um problema. Não me culpo por isso, afinal eu estou inserida em uma sociedade que condena a mulher que não corresponde aos padrões, mas gostaria de ter conhecido o feminismo nessa época. Talvez eu não teria me submetido a várias situações e processos que me submeti, mas foi esse o caminho ao qual fui condidiconada.

Então, depois de vários anos tentando me encaixar, eu cansei e decidi ser o que sou.

Depois que me percebi feminista, percebi várias mulheres feministas que até hoje não se entendem como tal me influenciando o tempo todo. Minha vó, que é minha referência, sofreu por anos com meu avô alcoólatra e depois, quando ele faleceu de uma maneira extremamente trágica, segurou as pontas sozinha.

Astrologia Eram três filhos, uma família pobre, mas ela conseguiu manter tudo em seu lugar, com muita luta e força.

Minha mãe, que, além de ser a melhor mãe do mundo, sempre foi outra das minhas referências, foi dada para uma família estranha que primeiramente não a considerou sua filha. Ela trabalhava dia e noite e ainda foi exposta a diversos abusos dentro de sua própria casa, mas ela agüentou firme e depois de uns anos desculpou tudo o que minha avó adotiva havia causado. Elas viraram extremamente próximas e quando a vovó morreu, mamãe foi quem cuidou de tudo.

Sempre que eu olho pra trás, lembro da minha mãe me incentivando a ser da forma que eu quisesse ser, me incentivando a ser uma pessoa forte e a realizar todos os meus objetivos. Mamãe nunca se preocupou com namoro ou casamento para mim, ela sempre me incentivou a me realizar. Relacionamentos até que poderiam vir, mas como conseqüência.

As duas principais forças da minha vida sempre lutaram por liberdade e sempre agüentaram firme tudo o que passaram para que eu pudesse chegar até aqui. Então, eu percebo que desde sempre ouvi sobre o feminismo indiretamente em todas as lições da minha avó, mãe, professoras, colegas e mulheres que de alguma forma me incentivaram a chegar até aqui.

Júlia Couto,

23 anos, sagitariana.

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Libra - A feminista do signo de libra não gosta de discussões que criem rivalidades e defende a paz acima de tudo. Busca o equilíbrio dentro do movimento feminista e não entende as brigas e divisões que existem entre as feministas. Gosta de encontros de coletivos para fazer novos contatos e conhecer novas ideias.

Está sempre em busca de novas visões e muitas vezes fica confusa entre o que seguir. Quando está no meio de discussões que exaltam o animo das parceiras, faz de tudo para mediar o conflito.

23/09 - 22/10 Escorpião - A feminista do signo de escorpião é uma mulher extremamente forte e transformadora. Por onde passa, leva um pouco do que sente e sabe do feminismo. Luta pelo que quer e não aceita ser contrariada. Sabe dar valor a quem merece e despreza aqueles que não sabem. Gosta de discutir questões polemicas e profundas que revelem o íntimo das pessoas.

23/10 - 21/11 26

Astrologia Leão - A feminista do signo de leão pode ser a líder dos grupos e coletivos. Recebe destaque naturalmente e não tem problemas com insegurança. É forte e destemida para conseguir vencer as barreiras do patriarcado. Sabe da importância da auto-estima e de olhar para si em primeiro lugar em um relacionamento. É um exemplo de autenticidade e irreverencia para as outras mulheres.

23/07 - 22/08 Virgem - A feminista do signo de virgem se apega aos mínimos detalhes dos ensinamentos feministas e discute cada vírgula dos textos, muito atentamente. Naturalmente acadêmica, gosta de discutir teses e fazer referencias a textos de escritoras feministas. A mais auto centrada e crítica do coletivo, conduz o debate com maestria e gosta de indicar leituras para as suas parceiras.

23/08 - 22/09 25

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Astrologia

Acho que a primeira vez que eu me vi como feminista foi por volta dos 12 anos, quando eu conheci o movimento punk e, principalmente, o riot grrl. Mesmo na infância eu já me sentia estranha diante de como as coisas estavam estabelecidas no mundo pelo fato de eu ser menina, e eu cresci numa família machista e sentia bastante diferença na forma como meus irmãos eram tratados. E eu nunca me encaixei - e nunca entendi porque tinha que me encaixar - nesse perfil de “feminino”. E foi com o punk que eu entendi que outras garotas também se incomodavam com isso.

Nessa época eu comecei a pesquisar obsessivamente sobre o assunto, li tudo o que tinha a respeito sobre os movimentos feministas na biblioteca da escola e em tudo quanto é lugar, troquei essas ideias com as minhas amigas e formamos um grupo de discussão de garotas na escola, e isso foi mais ou menos o começo do meu ativismo. Na verdade, pra mim, ser feminista não foi uma escolha, foi uma estratégia para que eu pudesse sair de uma prisão e ser quem eu queria ser, fazer o que eu queria fazer. Com o tempo eu percebi que eu também tinha muito mais privilégios (raciais, sociais, econômicos) do que outras meninas, e por isso ser feminista se tornou fazer parte de uma comunidade, onde as mulheres se fortalecem umas nas outras para pensar o mundo de outra forma e sobreviver à violência cotidiana.

Gêmeos - A feminista do signo de gêmeos ama as redes sociais e as consideram uma ferramenta fundamental para aprofundar o debate sobre o feminismo e o levar para o maior número de pessoas possíveis.

Luta através da comunicação, do diálogo e da troca de informações.

Defende a força da mulher ao escrever grandes textos e os publicar em suas redes sociais. Busca a maior conexão possível entre as feministas e participa dos mais diversos grupos e coletivos que defendam suas causas. É a oradora do grupo das feministas.

21/05 - 20/06

Câncer -A feminista do signo de câncer luta por meio de suas emoções. Transfere todo sua proteção e zelo inerente ao seu ser à causa feminista. Busca a união entre as mulheres e a aceitação própria.

Sendo a mais preocupada com a família, tenta disseminar o conhecimento do feminismo para as mães, tias, avós e primas e ajuda todas as mulheres sempre que possível.

21/06 - 22/07 7

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Astrologia

A feminista de cada signo Áries - A feminista do signo de Áries não leva desaforo para casa. Ela não se submete a nenhum homem e sabe lutar por aquilo que deseja. Luta com a força de suas iniciativas sempre presentes e não espera para agir quando necessário. Sempre que possível, entra em discussões para defender seus ideais e suas amigas. Está entre as líderes do grupo das feministas.

21/03 - 19/04 Touro - A feminista do signo de touro sabe se proteger. Sente o conforto do ambiente quando está junto das parceiras de luta e o transmite com facilidade. Gosta de se manifestar pela arte e sabe viver os prazeres da vida sem preocupações com as restrições do mundo machista. É calma e tranquila, mas quando é fortemente contrariada sabe mostrar suas garras. É persistente e não desiste facilmente de uma discussão e dificilmente muda de ideia.

20/04 - 20/05

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Carol Ruas, 27 anos, taurina

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Conheci o feminismo, assim pelo nome mesmo, apenas quando entrei na Universidade. Mas acompanhava suas vitórias, quase que diariamente, sendo parte do cotidiano das mulheres que compõem minha família. Assim como também vivenciava - e ainda irei vivenciar muito, eu sei - sua ausência e batia o pé quando ao questionar um “não, você não pode”, ganhava como explicação um “porque você é menina/mulher”. Até chegar ao ambiente universitário, foram anos convivendo com pessoas que tentavam me convencer de que eu era rebelde demais e tinha que entender que algumas coisas são como são e não há nada que se possa fazer senão aceitar. Pensa no alívio ao descobrir que não só havia um nome para o que eu acreditava como também várias mulheres que passaram por experiências parecidas com as minhas, que compreendiam o que eu falava, que discutiam sobre essa imposição do papel da mulher na sociedade.

Queria que todas as mulheres pudessem compartilhar do mesmo acolhimento que eu ao conhecer o movimento feminista e as mulheres que o fazem caminhar.

Assim como todo relacionamento, minha história com o feminismo foi construída aos poucos e, por mais afobada e curiosa que estivesse, respeitei meu tempo e fui aos poucos lendo mais sobre, descobrindo outras vertentes (e a necessidade delas), conversando e aprendendo com outras mulheres. Naturalmente, ficou mais difícil aceitar um assédio disfarçado de cantada; já não conseguia assistir um filme sem questionar a narrativa dos papéis femininos ali exibidos; minha estante de livros tomou-se por mulheres escritoras; passei a ficar mais atenta a situações de risco para mim e outras mulheres; percebi que estava em um relacionamento abusivo que consumia minha energia e me transformava em algo que eu não era.

Hoje é impossível me desvincular do feminismo, faz parte de quem eu sou e onde posso iniciar uma discussão sobre o tema, pode ter certeza que eu vou. Sei que ainda têm diversos espaços que precisam ser alcançados por nós, que precisam ouvir e conhecer nosso discurso, já que são ambientes em que as mulheres desconhecem outra realidade, outra opção, e vivenciam o peso real, físico, da cultura patriarcal. Mas o pontapé inicial já foi dado e é uma questão de tempo até que nossa voz chegue nesses lugares.

Yasmin Gomes, 23 anos, leonina.

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Essa é a primeira vez que paro para pensar no que dizer sobre minha relação com gênero e a estética que adoto. Talvez por ela ser construída de forma intuitiva e estar sempre em mutação. Me vestir não tem a ver com a atual temporada de coleções sem gênero. Vem de uma oportunidade de resposta às opiniões que discriminam o que atravessa o comum e inferiorizam características femininas em um homem. Contrariando um passado hostil, hoje sou eu quem provoca.

Eu sou agressão. E uso do meu cotidiano para iniciar uma nova forma de pensar às pessoas que me olham ofensivas. Levantando questões complexas e instigantes pelo simples fato de ser quem quero ser.

Thaylan Tolentino,

27 anos, geminiano.

Hoje é impossível me desvincular do feminismo, faz parte de quem eu sou e onde posso iniciar uma discussão sobre o tema, pode ter certeza que eu vou.

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Fui aprendendo com os anos o que significava ser uma menina. A compreensão do meu próprio gênero que surgiu das primeiras experiências foi do ‘ser’ feminino como limitação. A partir daí, assumi na infância um comportamento oposto ao que identificava como “coisa de menina”, buscando me identificar no masculino.

Entrei em uma escolinha de futebol e foi desastroso. Rejeitei amizades de garotas porque pensava que os garotos e seus interesses eram melhores, mais importantes. Mas eles também nunca me admitiam como um deles. E eu cresci não pertencendo a lugar nenhum. E sem entender o que eu era de fato.

Tornar-me mulher foi em parte buscar a minha essência naquilo que fizeram de mim. Foi parar de invocar o homem interno para validar meus discursos e encontrar a minha voz. Falar por mim mesma e abandonar o universal sem especificidade.

Percebi que me anulei por muitos anos tentando transcender uma imposição de gênero, quando a primeira coisa que precisava ter feito era me perceber como sujeito, reconhecer minhas aliadas e entender meu papel nessa luta por reconhecimento e respeito. Me tornar mulher e feminista aconteceu ao mesmo tempo, me trouxe forças para deixar o antigo espaço da inferioridade.

Mariah Friedrich, 21 anos, virginiana 11

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É muito difícil traçar uma linha demarcatória. “Pra esse lado você vai, pra esse não.” Acho que pra mim as coisas que sempre fizeram sentido por meio principalmente do afeto, vamos começar por ai: não me lembro de ser proibida de brincar com algo ou de não poder usar uma roupa pelo meu gênero, eu sempre brinquei com todo mundo e tive afeto por todo mundo que se permitia também. Houve um tempo que sempre perguntavam se eu era namorada de tal amiga, isso acontecia por uma demonstração maior de afeto com pessoas especificas, como por exemplo, o fato de sair de mãos dadas, por dar um abraço e tirar a pessoa do chão, na minha adolescência achava minimamente estranho o fato do afeto causar desconforto nas pessoas e nunca foi de fato problemático pra mim. As diversas vezes em que afirmavam ou duvidavam da minha sexualidade afirmando que eu era lésbica ou no máximo bissexual, já que não era esse tipo de comportamento que pessoas heterossexuais deveriam ter, pessoas heterossexuais são mais reservadas.

Pensando nisso, eu vejo que a linha de raciocínio a qual seguia era de que se sentisse vontade, eu faria. Quando cresci, as roupas, as cores e coisas ditas de menina ou menino não me diziam nada, são roupas, cores e coisas e assim fazem seu significado, vivemos numa sociedade que é demarcada ao que é de menino e o que é de menina e isso beira ao absurdo. Ainda que existam conceitos pré-estabelecidos do que se deve ser e como, a gente tem de se permitir, desejar, sentir.Eu? Eu não sei se gosto de meninas ou de meninos, a única coisa que posso afirmar é que quem comanda essas linhas, o caminho que percorrem e pra onde vão, é o desejo. O que me faz é o afeto e afeto não tem gênero.

Amanda Amaral,

22 anos, leonina.

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Gênero e sexualidade em trânsito: os personagens da nova geração fluida

Carina Costa

Aqui estamos numa geração de multiplicidade de questionamentos e inquietudes. A agilidade que esculpe a vida contemporânea exige uma posição de crescente dinamismo. Alguns de nós lidam com o gênero de forma criativa, ao brincar, subverter e inverter os padrões normativos estabelecidos. A nova era acompanha um ar de sobreposições e de rompimento com definições prontas e limitadas daquilo que se constitui como gênero e sexualidade. A atualidade é marcada por uma quebra de padrões, resultante de uma veracidade de tempos líquidos. Liquidez que transporta a mais ampla transitoriedade das identidades já não mais consolidadas. Os estudos queer, por exemplo, trazem à tona questionamentos sobre as posições já determinadas e buscam desconstruir premissas de que o gênero e a sexualidade se direcionam a um curso dado pela natureza.

Vivemos numa era de perceptível fluidez, experimentada por um cenário que compõe a velocidade dos acontecimentos que nos cercam. Singularizamos uma ruptura com a estabilidade dos sentimentos, dos prazeres e das exposições. Transpassamos as limítrofes bordas da identidade humana.

Arian Motta, de 22 anos, artista gráfico

e estudante de design, é um exemplo desses sujeitos que tem inventado outras formas de ser e estar no mundo. Arian criou para si um personagem que expressa de forma lúdica as questões de gênero, de memória e de produções existenciais.

Em contrapartida, a eminente realidade transitória não contempla a aprovação de indivíduos inflexíveis, pensantes retrógrados calcados no tradicionalismo do modus operandi. Degustamos a amargura da opressão ao nascermos e sermos condicionados à heteronormatividade. Ostentamos um nome e um sexo que carregam a pretensão de seguirem fixos no caminhar da vida.

A sociedade tem a errônea necessidade em rotular tudo que a cerca, de modo a impor limites às produções sociais, ainda que implicitamente. Em relação ao gênero e à sexualidade, a coletividade exige uma resposta clara e precisa daquilo que somos. Homens heterossexuais se relacionam com mulheres e mulheres heterossexuais se relacionam com homens. Homens homossexuais se relacionam com homens e mulheres homossexuais se relacionam com mulheres. Homens e mulheres bissexuais se relacionam com homens e mulheres.

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Desde minha infância lembro-me de questionar os gêneros das pessoas. Aos 4 brincava de enfeitar o cabelo com flores, de não distinguir brincar com bonecas ou com carrinhos. Meus pais nunca me proibiram de brincar com algo, por ser menino. Pra mim todo mundo pensava assim também. Acreditava que o mundo todo aceitava claramente essa fluidez entre os gêneros. Mas com o passar do tempo, fui percebendo que não é bem assim. Primeiro comecei a ver que as pessoas faziam piadas de gays, lésbicas etc. Depois, mais tarde, fui percebendo a cultura de ódio, provocada muitas vezes por uma cultura extremamente cristã. Hoje em dia continuo percebendo que não defino meu gênero por completo, e tenho criado um personagem que tem trabalhado exatamente sobre essas questões de gênero, memória, existência. Creio que são em momentos em que o gênero não precisa ser definido que me encontro em sintonia comigo. Que encontro mais uma vez a alegria que tinha, quando criança, de ser. E aqui uso o termo ser, no seu mais vasto e plural significado, livre de qualquer concepção engessada do mundo adulto.

Arian Motta,

23 anos, leonino.

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Wadson Schimitberger, de 20 anos, estudante de Letras, já sofreu algumas hostilidades em relação a sua forma de se vestir. São olhares e comentários invasivos de pessoas próximas ou até mesmo de desconhecidos que não aceitam a diversidade e a forma livre de ser dos outros. Não nos faltam definições e enquadramentos que traçam a limitação do que se deve ser. A primordialidade em se indicar aquilo que somos parece rejeitar a complexidade humana, reduzindo o indivíduo a definições que não são aptas para abranger toda a diversidade existente.

Não obstante, a inconstância faz parte de muitos indivíduos que não se identificam categoricamente com a autenticação tradicional de gênero ou de sexualidade. Apresentamos aqui alguns indivíduos que se

inserem nessas esferas transitórias, por meio de retratos que pretendem demonstrar aquilo que verdadeiramente representam. Wadson Schmitiberger, Amanda Amaral, Arian Motta e Thaylan Tolentino são os personagens que trouxemos para simbolizar os novos fluxos e transições de gênero e sexualidade da nossa geração.

Personagens que são como transeuntes, perpassam os paradigmas do ser e desvinculam-se das normas de gênero. Aqui jaz a crítica àqueles que constrangem todo e qualquer indivíduo ao requisitarem uma resposta indubitável sobre o gênero ou a sexualidade. “É homem, é mulher ou é trans?” “É gay ou é bissexual?”. Perguntas que se repetem incansavelmente e rejeitam a pluralidade de experiências e manifestações possíveis referentes a esses temas.

Um olhar sobre a fluidez dos antagonistas do determinismo identitário Texto: Carina Costa Ph: Rafaela Laiola

Retratamos aqui pessoas livres e que de alguma forma trazem a transitoriedade e a mutabilidade à tona. Pessoas que expressam no vestir, no falar ou no fazer as multiplicidades da nossa geração.

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Gosto de perucas, saltos e sorrisos.

Há definições sobre como um homem deve se comportar, mas são tão chatas.

Sempre fui uma interrogação. Às vezes acordo e não sei se sou Wadson ou se sou Antônia. Já me perguntaram tantas vezes o porquê de Antônia, mas eu também não sei. É um nome charmoso, centrado, que causa pausas. E é assim que eu me sinto, paradoxalmente: uma pausa. Sou homem, biologicamente. Tenho barba, pernas peludas e uma voz, digamos, grossa. Mas gosto de perucas, saltos e sorrisos. Há definições sobre como um homem deve se comportar, mas são tão chatas. Estar vestido por saia é tão confortável, causa uma tranquilidade e a liberdade parece ser minha melhor amiga. Não me permito que as limitações sejam um ponto final na minha construção, sempre quero reticências. A mutabilidade que permeia o meu ser da cabeça aos pés tem um papel fundamental na minha identificação como ser humano. Hoje em dia eu sei quem o Wadson é.

Uma mistura empolgante do que é ser alegre, que gosta de se comportar no feminino e quando for de sua vontade, usar um adjetivo no masculino, por que não? Mais não sei explicar, amanhã pode ser tudo diferente. Nasci para florescer. Tem de chover, às vezes. Mas nunca meu sol é molhado.

A dupla que há em mim sempre se interroga para saber o o que é da confiança do meu bem-estar.

Wadson Schimitberger 21 anos, geminiano.

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A mutabilidade que permeia o meu ser da cabeça aos pés tem um papel fundamental na minha identificação como ser humano.