SOPRO
PR ÁT ICAS DE JARDINAGEM PARA CONSTRUIR GESTOS DE APROXIMAÇÃO
MARCIA REGINA
Marcia Regina dos Santos , 202 3 .
ORIENTAÇÃO XXXXXX
PROJETO GRÁFICO Marcia Regina e XXXX IMAGEM DE CAPA Thais Mallon
Fonte xxx
Impressão xxxx
Papel xxxx
Santos, Marcia Regina. Orientadora, xxxxxxxxx (orientadora). Brasília: Universidade de Brasília. Tese (Mestrado em Artes Visuais), 2023.
Para as plantas e a mulheres da minha vida , em especial Luísa, Gorete, Layza e Camila.
“a vida jamais abandona inteiramente o estado embrionário.”
(Emanuele Coccia, Metamorfoses)
Ser ovo, construir um casulo fortificado e forjado com raízes que se conectam ao tudo. Filamentos de uma mesma existência cósmica. Corpo híbrido , sem gênero, corpo folha, corpo raiz, corpo eu, corpo nós, corpo poeira de estrela. Nudez é ser natureza, a mesma matéria viva, mesmo nutriente que pari uma árvore pare uma sereia , uma humana, a gestação da vida é a própria vida. Eu sou a continuidade ininterrupta da vida, a vida habita em mim, eu sou filha e mãe da me tamorfose, simbionte relação. Migração. Alimento e comida ao mesmo tempo.
(Marcia Regina, e nsaio do SOPRO, 6 .3. 2022)
xx PRÓLOGO
PARTE I
SOPRO, UMA INSTALAÇÃO COREOGRÁFICA
XX 1. SOPRO (O PROCESSO)
XX 2. GESTAÇÃO DA VIDA – PARTEIRA , P LANTA
E A JARDINEIRA
XX 3. DANÇA CONTEMPLATIVA
XX 4 . PLANTA NA BOCA, DRACAENA SANDERINA
XX 5 . A BENZENDEIRA
XX 6 . APITO
XX 7 . O CANTO DA SEREIA
XX 8 . A ENTIDADE FOLHA SECA , FICUS LYRATA
XX 9 . TRONCO, DELONIX REGIA
XX 10. GESTAÇÃO DA VIDA
XX 11. PLACENTA
XX 1 2 . CARTA À TERRA
XX 1 3 . DANÇA CONTEMPLATIVA
XX 1 4 . INTERAÇÃO COM PÚBLICO
XX 1 5 . PLANTAS VOADORAS
XX 1 6 . CRIAÇÃO EM ARTE DECOLONIAL
PARTE II
PRÁTICAS DE JARDINAGEM PARA CONSTRUIR GESTOS DE APROXIMAÇÃO
XX 1 7 . JARDINAGEM
XX 18. PODA DAS PLANTAS
XX 1 9 . CAMINHADA NA TERRA
XX 20 . MIMOSA PÚDICA
XX 2 1 . PIPAS
XX 2 2 . PLANTA DA RESSURREIÇÃO
XX 2 3 . LÍRIO
XX 2 4 . ESPÉCIES COMPANHEIRAS, KANÔ E TXAI
XX 25. CACHORRO SATURNO
XX 26 . PRÁTICAS DE CONTATO
XX 2 7 . VOLTAR AO ENSAIO
XX 28. ACÕES POÉTICAS DE DISPERSÃO PELA
CIDADE
XX 29. DEVIR COM PERREYIA FLAVIPES
PARTE III
DANÇA DA METAFORMOSE E SIMBIOSE
XX 30 . METAMORFOSE
XX 31 . SIMBIOSE
XX 32 . GESTOS DE APROXIMAÇÃO
XX 3 3 . CONTINUAR EM MEIO A RUÍNAS DO CAPITALISMO
XX 3 4 . COMPOSTEIRA (cocô da rita)
XX 3 5 .
XX 3 6 .
XX 3 7 .
HUMUSIDADES
FUNDÃO
CONCLUSÃO
XX AGRADECIMENTOS
XX REFERÊNCIAS
XX ROTEIRO DO SOPRO
XX ÍNDICE ONOMÁSTICO
XX ÍNDICE DE IMAGENS
XX GLOSSÁRIO DE PLANTAS
XX SOBRE A AU TORA
quando eu não mais respirar e esse corpo sucumbir ela ainda estará lá tão secreta e além de mim quando o coração parar de bater em sístole ela ainda vai perfumar outros tantos por aí vida, silêncio ao redor estrela de altíssimo brilho tu és o mistério maior que nos lança no teu rodopio e, assim, feito joia a vagar sem destino, sem causa, sem fim eu, agora, estou dentro da vida e ela antes e depois de mim.
Déa Trancoso, Olufe Mi Leti, Líricas breves para a construção de uma alma (2020)
Quando comecei a fabular esse fazer-mundo escrita me remeti ao meu primeiro sonho de criança que até hoje não realizei. Escrever um livro! E agora, aqui estou nesse estado de partilha reflexão em forma de livro, pronpondo uma escrita de fabulação especulativa1, misturando o real e a ficção para propor novas narrativas de fazermundo possíveis em dialogo entre arte e ciência, arte e vida e humano e não humano.
Este livro é muito pessoal; escrevi-o para entender quem sou. E sinto-me muito feliz de realizar um sonho de infância, e orgulhosa, confeso até dando pulos de alegria, quando penso
1 O conceito de fabulação especulativa que diálogo neste ensaio é o abordado pela bióloga, zoologista e filosofa Donna Haraway. Conferir https://www.youtube.com/watch?v=K1atjLfbNxE. Acessado em 15/05/2023.
nas tantas pessoas que vieram do mesmo lugar que eu e finalmente o podem ler, numa lingua (linguagem) na qual pretendo ser simples e me fazer aberta ao encontro. Apesar de pessoal este escrito é para minha mãe, o primeiro ser a me ensinar o que seria a metamorfose.
Seguindo os passos de Donna Haraway, a fabulação especulativa é uma prática cotidiana de contar histórias que não se restringe a escritores, mas está mais perto de uma avó que conta seus contos para as netas e os netos, entre outras narrativas cotidianas. É uma semente critica em ponto de erupção do ponto de vista de quem conta uma história, uma dada observação cotidiana participativa que pode intervir de modo transfomartivo na realidade a criar projeções possiveis. Portamto, aqui estarei criando mundos ao mesmo tempo que reflito o que foi vivido no passado presente. Aqui entendo mundos seguindo as flechas de Anna Tsing2, onde a conceituação de mundo e a criação de mundo estão intimamente ligados uma a outra, pelo menos para aquelas e aqueles com o privilégio de transformar seus sonhos em ações palpaveis. “O relacionamento se dá nos dois sentidos: novos projetos inspiram novas formas de pensar, que também inspiram novos projetos.”
(TISING,p.176, 2019)
Não sendo uma escritora de formação, mas sendo uma curiosa artista da mistura me lanço nesse caminho da fabulação especulativa pois vislumbro
2 Anna Lowenhaupt Tsing é uma antropóloga norte-americana. Juntamente com Haraway cunharam o termo Plantationoceno como um termo mais coerente para a época do Antropoceno que centra as atividades humanas na transformação do planeta de forma catastrófica no manejo da terra.
uma narrativa aberta, viva, desenhando futuros possíveis, imaginativos, cruzados, criativos e em metamorfose e simbiose, conceitos que me são muito preciosos e que guiaram algumas de minhas buscas de como inventar gestos de aproximação em inter~relação em multiespécies3.
Na busca por encontrar práticas de jardinagem para construir gestos de aproximação entre plantas e o humano, surgem algumas perguntas norteadoras: como é aprender com a inteligência das plantas, que escolheram a adaptabilidade como forma de sobrevivência? Seria possível olhar o mundo com a visão das plantas? E que gestos seriam esses que contribuíram para se pensar futuros possíveis da relação entre plantas e o humano? Para Stefano Mancuso4, num futuro próximo teremos que nos inspirar nas plantas para reaprender a nos mover de outras formas. E que novas formas seriam essas? Como se mover como planta?
O ponto de partida desta escrita-mundo é a obra SOPRO5 uma instalação coreográfica6, que tive o
3 Seres sociais de muitas espécies que interagem, moldando as vidas umas das outras de forma variada.
4 Stefano Mancuso é um botânico italiano que estudo a vida das plantas. Os seus três livros “Revolução das plantas”, “A incrível viagem das plantas” e a “A planta do mundo”, são norteadores desta pesquisa.
5 Opto por colocar a palavra SOPRO deste modo por compreender que é uma palavra que nunca está parada, mas sim em movimento. Deste modo a imagem mais elevada provoca um estado de voo constante que acho satisfatória.
6 Compreendo a instalação coreográfica como a mistura de abordagens estéticas na fronteira entre as artes visuais e a dança. No trabalho citado, tudo que compreendia o espaço cênico desde o cenário, o público que deslocava com a performer em cena e a dança da performer estava situado dentro da instalação demonimando-se assim uma coreografia
prazer imenso de criar em 2022 por nove meses junto a plantas e humanos num gestação coletiva de criação em arte. Ainda instigada pelo SOPRO , me lancei nesta escrita reflexiva intitulada SOPRO práticas de jardinagem para construir gestos de aproximação, que é precisamente meu mestrado.
O trabalho SOPRO investiga a gestação da vida de forma expandida por meio da relação multiespécie entre uma mulher e uma planta. O foco deste livro, são os gestos que surgiram no SOPRO e que nutriram os desejos de estar na terra, com vigor, apesar de tudo aquilo que tenta nos tirar dessa mesma terra. Às reflexões somam-se ainda os conceitos de simbiose, metamorfose e figura7, concomitante a experimentações pooéticas da relação humanoplanta (práticas de cuidado do jardim, gestos de aproximação, gestos de fabulação, gestos de imaginação, gestos práticos de atuação em arte e vida).
SOPRO, que é foco de pesquisa de mestrado, aborda a metamorfose e a simbiose a partir da relação multiespécies entre uma jardineira dançarina, uma parteira e as plantas em suas mais variadas materialidades. Fala do tempo para se fazer contato entre vidas em meio a matéria seca e as ruínas do capitalismo. Convida o público a se dispor ao invisível, enquanto vê formas e escuta
instalativa e viva de acontecimentos (visíveis e invisíveis) no presente.
7 Figuras, cunhadas por Donna Haraway, podem ser “metáforas, tropo, alegorias, imagens, que pretendem produzir um mundo mais habitável, povoado de actantes humanos e não-humanos situados em teias densas e mundanas, bem como estabelecer outros modos de conversas entre os múltiplos modos de existência”.
multilinguagem, de perto, de muito perto, de muito longe. SOPRO é uma dança entre a fragilidade e a feralidade que atravessa gestações.
Dois conceitos guiaram as investigações deste livro: Metamorfose e Simbiose, em uma deriva fundamentada nas pistas de Stefano Mancuso, Lynn Margulis, Emannule Coccia, Nastassja Martin, Donna Haraway, David Kopenaw, Ailton Krenak, Anna Tsing, Genevieve Azam, Eliane Brum e cosmologias indígenas para citar previamente algumas e alguns fabulantes.
Esse é o momento que sou, me exercitando a aprender a estar no mundo com olhos multiespécies. Um olho terra, um olho planta, um olho pipa, um olho gato, um corpo em relação com o ambiente e com o mundo tentando construir refúgios possíveis em meios às ruínas, investigando relações entre as plantas e o humano buscando revelar possíveis gestos de aproximação entre seres vivos. Essa dinâmica se deu por ações de pesquisa poética abordando a metamorfose, a simbiose, o mimetismo e a inteligência das plantas desenvolvidos na instalação coreográfica SOPRO (2022), e também, em práticas poéticas que foram desenvolvidas no ano seguinte (2023).
Dito tudo isso que foi breve aqui, desejo partilhar essas reflexões, pois percebo que o tema proposto é correspondente com as investigações contemporâneas a cerca de olhar para a Terra, onde toca a recuperação, a reparação, a regeneração, reinvenção, a fabulação, a metamorfose, a simbiose, a imaginação, os gestos e a jardinagem para criar novos presentes possíveis.
REFERÊNCIAS
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COCCIA, Emanuele. Metamorfose. Rio de Janeiro: Dantes Editora, 2020.
COCCIA, Emanuele. A vida das plantas: uma metafísica da mistura. 1.ed. Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2018.
DRAVET, Florence. Entrever no (in)visível: imaginação, arte divinatória e potência criativa. E-Compós, Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação, 2019.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Cascas. São Paulo: Editora 34, 2017.
FRANCO, Augusto. Aminoácidos / Agência de Educação para o desenvolvimento. / Uma teoria da cooperação baseada em Maturana. – nº 1 (nov. 2001) – Brasília : A Agência, 2001.
GOETHE, Johann Wolfgang von. A metamorfose das plantas. São Paulo: Edipro, 2019.
HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. 46 ed. Porto Alegre: L&PM, 2019.
KOPENAWA, Davi, ALBERT, Bruce. A queda do céu: Palavras de um xamã Yanomani. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
LEITE, Janaina Fontes. Autoescrituras performativas: do diário à cena. São Paulo:
Perspectiva: Fapesp, 2017.
LIMA, Ludmilla Alves Carneiro de. Rotas, raízes e devorações: re-voltar a pintura e outras histórias selvagens. 2021. 617 f., il. Tese (Doutorado em Artes Visuais) Universidade de Brasília, Brasília, 2021.
MANCUSO, Stefano. Revolução das plantas: um novo modelo para o futuro. São Paulo: Ubu Editora, 2019.
________. A incrível viagem das plantas. São Paulo: Ubu Editora, 2021.
________. A planta do mundo. São Paulo: Ubu Editora, 2021.
MONTEIRO, Pedro Meira. Ensaios Flip / Plantas e Literatura / A previdência das árvores. Rio de Janeiro. ed. Associação Casa Azul, 2021.
MARTIN, Nastassja. Escute as feras. São Paulo: Editora 34, 2022.
SAGAN, Dorion. Livro de seres invisíveis. Rio de Janeiro: Dantes Editora, 2021.
TISING, Anna. Viver nas ruínas: paisagens muliespécies no antropoceno. Brasília: IEB/Mil Folhas, 2019, p. 176.
________. O cogumelo no fim do mundo – sobre a possibilidade de vida nas ruínas do capitalismo. N-1 edições, 2022.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: UBU Editora, 2020.
WOHLLEBEN, P. A vida secreta das árvores: o que elas sentem e como se comunicam. 1.ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2017.
Sites:
http://selvagemciclo.com.br
https://www.ppgav.unb.br
https://www.youtube.com/channel/UCDZdi5eXYGAI2hj nmotY2gQ/about