September 2020 Female Tech Leaders

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ÉRIKA CARAMELLO O setor de tecnologia ainda é um campo dominado pelos homens, mas de acordo com dados levantados pela Pesquisa Game Brasil de 2020, 54% do público gamer no Brasil é formado por mulheres. Mas o que acontece com o ambiente nos games em relação a toxicidade? Você pode me falar como os gamers aceitam as mulheres jogando? A maioria das mulheres ainda joga muito mais games casuais em plataforma mobile. Costumam ser games de passatempo, single player. Assim, conseguem jogar sem serem incomodadas pela toxicidade dos jogadores. O grande problema está nos jogos multiplayer, altamente competitivos e, por isso, um espaço repleto de incels. Muitos jogadores se escondem através do anonimato proporcionado nos jogos para praticarem a misoginia. De acordo com o II Censo da Indústria Brasileira de Jogos Digitais, publicado em 2018, um dos motivos para as mulheres não ingressam na indústria de games: o sexismo nos jogos online, tanto em termos de assédio quanto de agressão, visto que quase 100% das jogadoras já foram vítimas. Ainda não há uma preocupação sistemática da indústria de banir os usuários que praticam tais atitudes. No entanto, há um movimento das gamers, endossado por jogadores, chamado My Game My Name, que incentiva as garotas a utilizarem nomes femininos nos jogos, enquanto educam os garotos a partir de depoimentos de players famosos. Mas acredito que a aplicação mais eficaz da legislação dentro de ambientes de jogos pode ser uma saída para diminuir tais ataques. Você acredita que a personificação da mulher nos games está mudando do que estamos habituadas a ver? A sexualização da personagem (a personagem frágil, que precisa ser resgatada). E como você vê essa evolução? Assim como no cinema, o perfil das personagens femininas vem mudando na indústria de games. É claro que esse movimento na indústria mainstream parece ser um pouco mais lento que na indústria de games independentes, desenvolvidos a partir de pequenos estúdios. Mas pequeno não é sinônimo de algo ruim, menor. Dandara é um bom exemplo disso: inspirado na personagem histórica homônima, companheira de Zumbi dos Palmares, o jogo brasileiro tem uma protagonista negra, não sexualizada, com uma jogabilidade elogiada até pela revista americana Time que, no final de 2018, o colocou como um dos 10 melhores games do ano, ao lado de franquias de sucesso, tais como Mario e God of War. Saber que a principal plataforma que este jogo é comercializado é no console Nintendo Switch mostra uma possibilidade incrível para pequenos criadores de jogos e novas representações. Eu sou da época do Tomb Raider e Lara Croft é e sempre será um ícone para mim, de mulher forte e guerreira, que pode tudo. A mulher gamer ainda vive numa realidade em que esta luta é constante para que ela possa ser reconhecida. Quais são os seus conselhos para quem quer seguir na carreira? Sem dúvida, a Lara Croft é um dos ícones da indústria de games em termos de representação feminina. Mas é um exemplo atual também, que continua influenciando milhares de mulheres através do game. A trajetória heróica dela lembra muito os desafios que acabamos enfrentando todos os dias na profissão. A diferença é que não precisamos nos sentir tão sozinhas como a Lara, uma vez que já somos muitas dentro da indústria, a maioria entre jogadores e estamos ocupando cada vez mais espaços. Quem gosta de game costuma não desistir facilmente de uma fase difícil. Acho que esse é o grande aprendizado: fases difíceis existem, mas os objetivos são maiores. E trata-se da vida. Nesse jogo, todo mundo recebe apenas uma. Então, temos que aproveitar a jornada focando mais na vitória do que nos adversários. Prepararar-se através de estudo, colocar-se à frente dos projetos, fazer boas parcerias e não ter medo do julgamento alheio são indicações que apenas fortalecem a heroína.


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