Experiência urbana - o caminhar | TCC - Arquitetura - UFMG

experiĂŞncia urbana O CAMINHAR

“Não existe nada mais subversivo, mais alternativo em relação ao modo de pensar e agir, hoje dominante, que o caminhar.

Ponto.

Caminhar é uma modalidade do pensamento” ( LABBUCI, 2013, p. 10)

Figura 1 - Momentos | Fonte: acervo pessoal

Figura 2 - Caminhantes em Rosรกrio, Argentina | Fonte: acervo pessoal

Bruna Rodrigues Sousa e Silva

experiência urbana O CAMINHAR Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do grau de Bacharel em arquitetura e urbanismo pelo Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais.

Orientador: Prof. Dr. Daniel Medeiros de Freitas.

Belo Horizonte 2019

Dedico este trabalho a quatro companhias caminhantes que tive no meu percurso até aqui: Ao meu pai, que me acompanhou diversas vezes nos 8 km entre a Escola de Arquitetura e a nossa casa, sempre cheio de reflexões sobre a cidade, política e a vida; À minha mãe, que sempre fazia um convite de caminhar pelo bairro nos sábados de manhã e que nunca negou uma ajuda; À minha irmã, que mesmo cansada, sempre acompanhou as caminhadas longas que a gente fazia; À Gabi, que passou quase todas as férias de 2007 a 2011 me acompanhando nas andanças sem rumo na cidade de vó.

AGRADECIMENTO Aos meus pais, Luiza e Tata pelos inúmeros sacrifícios, apoio incondicional e exemplo de vida e companheirismo. Pelo acolhimento amoroso e tranquilo de sempre; A minha família, por sempre acreditarem em mim; Ao Diego, que é um irmão pra mim e sempre se interessou pelas minhas pesquisas. Gratidão te ter por perto; Aos amigos de Santa Fé, que me mostraram o tanto que a vida pode ser mais leve. Jamais esquecerei todas as nossas conversas, caminhadas e pedaladas pela cidade. Estes momentos me fazem muita falta. Em especial, Lucas, Dilan, José, Laura, Martin e Luisa, pelo companheirismo e por me fazerem sentir que estão sempre presentes, mesmo que de longe; Aos amigos de quase duas décadas, que eu não largo nunca, pelas memórias, momentos e apoio. Em especial, Lu Costa, Aninha, Gêmea e Mari D e Maria; Aos companheiros de graduação, pelo apoio. Em especial, Marion, Paola e Julia, pelas estimulantes e incríveis conversas e trocas; a Clara, Helena e Carol, que me acompanharam durante toda a trajetória e compartilharam de experiências durante tantos trabalhos na trajetória acadêmica; Aos companheiros do CEFART, que foram importantíssimos nessa descoberta

do que fazer; À Prussiana, por ter compartilhado suas experiências no Atravessar BH; aos demais caminhantes do projeto, por terem aceitado fazer parte do trabalho e contribuir com suas percepções; Ao grupo LEVE - UFMG, por terem me recebido e serem responsáveis por muita troca, em pouco tempo. Em especial, à professora Elisa, por me acolher com tanto carinho. À Laura Castro, que com perguntas e comentários que desconcertaram o óbvio, me fizeram crescer durante esse processo; Ao Daniel, pelas orientações; Aos demais membros da banca, por aceitarem o convite e oferecerem o tempo, a atenção e a contribuição.

Por fim, agradeço a cada pessoa que cruzou o meu caminho, vocês são responsáveis por quem eu sou. Um abraço a todos com quem pude compartilhar minhas ideias! À vovó Gilda, que sempre foi o maior exemplo de mulher para mim. Saudades é o amor que fica.

Figura 3 - Caminhante em Salta, Argentina| Fonte: acervo pessoal

“Os jogos dos passos moldam espaços” (CERTEAU, 1998, P.176)

RESUMO O trabalho se propõe a abordar o caminhar como possibilidade de experiência de cidade, no sentido de propiciar uma maior relação entre o corpo e a cidade e assim reverberar em uma vivência mais próxima do meio urbano e da vida cotidiana. Como objeto específico de estudo, analiso o caminhar a partir de um referencial teórico sobre a experiência urbana e dos conceitos sobre a relação corpo-cidade, além de um estudo de caso do grupo Atravessar BH, em Belo Horizonte. Os procedimentos utilizados são: pesquisa teórica, entrevistas e minhas percepções pessoais sobre o caminhar. A hipótese defendida é a de que o caminhar pode se conformar como um ato de microresistência diante da pasividade do corpo frente a rua. palavras-chave: caminhar, corpografias, experiência urbana

SUMÁRIO Um convite ao percurso.......................................................................................................................... 14 Apresentação................................................................................................................................................. 16 Parte I.............................................................................................................................................................. 22 Capítulo I - experiência corporal................................................................................................. 22 Capítulo II - caminhar como experiência............................................................................... 34 Parte II............................................................................................................................................................... 46 Capítulo III - Belo Horizonte.......................................................................................................... 46 Capítulo IV - Atravessar BH.................................................................................................... 58 Capítulo V - considerações finais............................................................................................................ 88 Referências bibliográficas...........................................................................................................................96

13

Figura 4 - Caminhante em Buenos Aires, Argentina | Fonte: acervo pessoal

Figura 5 - Caminhantes em Cafayate, Argentina | Fon14 te: acervo pessoal

um convite

15

É a partir do contato do corpo com a cidade que experimentamos e legitimamos o espaço urbano. Quando caminhamos, vivenciamos o espaço com o corpo, identificando sua ambiência e constituindo um lugar a partir das nossas percepções. Cada fotografia aqui reproduzida e experiência relatada é um palimpsesto de vivências pessoais, práticas e acontecimentos particulares.

Recomendo a leitura deste livro na rua: ao andar, ao parar, ao ocupar um espaço público, ao experimentar a cidade. É um convite ao caminhar como forma de conhecer a cidade.

à deriva sem rumo,

à vivência da rua,

ao contato do corpo com a pele da cidade. É um convite para criar seu próprio repertório de cidade Boa caminhada!

ao percurso

Figura 6 - Caminhantes em Santiago, Chile | Fonte: acervo pessoal 16

apresentação

17

Todo deslocamento começa e termina com o ato de caminhar. Caminhamos até o ônibus, a bicicleta, o metrô, o carro e a moto. Muito mais que um meio de locomoção, o caminhar se conforma na principal forma de se viver a cidade. É a forma de deslocamento mais ancestral que, devido ao planejamento urbano moderno, se encontra asfixiada na cidade contemporânea, limitada a calçadas desconfortáveis, passarelas e caminhos desagradáveis. O caminhar se estabelece neste trabalho não apenas como um modal de transporte, mas, também como uma forma de experimentar a cidade, se apropriando dos espaços urbanos, através da relação do corpo com a cidade, se apresentando como um potencial ato crítico e sensorial, possuindo o papel principal na percepção da vida urbana.

“Caminhar é o início, o ponto de partida. O homem foi criado para caminhar e todos os eventos da vida - grandes e pequenos - ocorrem quando caminhamos entre outras pessoas. A vida em toda a sua diversidade se desdobra diante de nós quando estamos a pé” (GEHL, 2013, p.19)

Segundo Sennet (1994), o urbanismo moderno e rodoviarista restringiu o ato de APRESENTAÇÃO

18

movimentar-se e locomover-se aos que possuíam automóveis, alienando o corpo do espaço através do qual ele se desloca. A velocidade de percurso que permite uma maior proximidade com a cidade é a do pedestre, possibilitando observar os detalhes da vida cotidiana. Quando experimentamos a cidade a partir de um veículo, essa percepção se altera e provoca um distanciamento entre a pessoa e a cidade. Essa alienação do corpo, somado ao ato de dirigir como atividade profundamente limitada em questão de movimento, converte-se em uma das formas de passividade do indivíduo frente a cidade. Criou-se um distanciamento das sensíveis questões presentes na relação corpo e cidade que perdura até os dias atuais, contribuindo para a constituição de indivíduos passivos à cidade, que se anulam diante de sua atmosfera coletiva a fim de proteger-se.

“Hoje, como o desejo de livre locomoção triunfou sobre os clamores sensoriais do espaço através do qual o corpo se move, o indivíduo moderno sofre uma espécie de crise táctil: deslocar-se ajuda a dessensibilizar o corpo.

Esse princípio geral vem sendo aplicado a cidades entregues às exigências do tráfego e ao movimento acelerado de pessoas, cidades cheias de espaços

APRESENTAÇÃO

19

neutros, cidades que sucumbiram à força maior da circulação” (SENNET, 1994, p.214)

Ainda para Sennet (1994), o que poderia devolver esse sentido ativo aos corpos é retomar a própria relação entre corpos sujeitos e construídos no espaço. Assim, quando se contrapõe a cidade contemporânea e os espaços urbanos planejados em função do automóvel particular, caminhar torna-se um ato de microrresistência1 diante da agressividade da rua frente o corpo. Dessa forma, o que busco no trabalho é tentar entender como o caminhar pode conformar-se como novas formas de experiências e imaginários de cidade e assim, despertar uma consciência acerca da apropriação da cidade, incorporando formas de percepção do sensível. Parto da hipótese de que essas experiências efêmeras do caminhar se apropriam do espaço público, estimulando uma outra percepção do urbano, num processo de experimentar o espaço e produzi-lo simultaneamente. Em síntese, busco estudar como o caminhar enriquece a experiência de vivenciar a cidade na contemporaneidade, tendo o corpo como um meio 1 Micro-resistência como forma de desvio dessa lógica de cidade, como possibilidade de ação política crítica, sendo considerado um “micropoder sensível” como estabelecido por Paola Berenstein Jacques e explicado no Capítulo I - Experiência Corporal.

APRESENTAÇÃO

20

de leitura do ambiente urbano e se conformando como uma possibilidade de diálogo com a cidade.

Para tal, este trabalho será dividido em duas partes. A Parte I é uma revisão bibliográfica, que se divide em dois capítulos: O Capítulo I - EXPERIÊNCIA CORPORAL coloca a análise dos conceitos de corpografia, errâncias e microrresistências urbanas, buscando entender a relação entre corpo e cidade e quais os significados das ações urbanas sobre nós mesmos e sobre a cidade. Para isso, me dediquei aos estudos dos textos da Paola Bernstein Jacques como principal bibliografia, complementada por outros autores próximos do tema e alguns exemplos práticos dessas ações urbanas para melhor ilustrar os conceitos mencionados.

O Capítulo II - CAMINHAR COMO EXPERIÊNCIA analisa, primeiro a partir de Michel de Certeau, a importância do caminhar, e como ele pode constituir-se como um articulador de espaços, produzindo lugares, apoiando-se nos conceitos de Francesco Careri e as vanguardas artísticas que usam o caminhar como forma de arte.

APRESENTAÇÃO

21

A Parte II trata de um estudo de caso do grupo Atravessar BH, criado em Belo Horizonte, a partir do qual analiso as caminhadas propostas pelo grupo e o percurso como experiência. Em um primeiro momento, introduzo o projeto a partir de uma breve análise do contexto em que se insere a cidade de Belo Horizonte, com um efervescer de movimentos que buscam ocupar a cidade e como eles dialogam com o caminhar e a experiência urbana. Em seguida, analiso o projeto Atravessar BH, procurando compreende-lo a partir dos relatos dos caminhantes e da criadora do projeto, com o intuito de dar voz a esses caminhantes e entender qual a sua relação com a cidade.

APRESENTAÇÃO

22

Figura 7 - Praça Tiradentes, Belo Horizonte | Fonte: acervo pessoal

capítulo I experiência corporal

23

É a partir do contato do corpo com a cidade que experimentamos e legitimamos o espaço urbano. O caminhante experimenta o espaço com o corpo, identificando sua ambiência e construindo um lugar a partir das suas percepções. Assim, para estudar o caminhar e suas relações com a construção simbólica da cidade, é preciso compreender primeiro, como a experiência corporal da cidade influi no ambiente e na vivência urbana. Para tanto, considero essencial investigar a relação entre corpo e cidade, que será analisado neste capítulo, partindo, primeiramente do conceito de corpografia, tal como definido por Paola Berenstein Jacques.

Para Jacques (2008), o corpo é um conjunto de condições interativas que expressam uma corporalidade, formando as corpografias urbanas. O corpo e a cidade, ambos porosos, se contaminam, ficando inscritas no corpo a experiência corporal da cidade e também o contrário, ou seja, também o espaço urbano é afetado pela presença e comportamento dos corpos. Em síntese, quando nos apropriamos de um espaço urbano, o traduzimos como a experiência corporal sobre ele próprio, permanecendo como memória urbana no corpo ao mesmo tempo que legitimando a cidade. Logo, essas corpografias são resultantes de uma experiência no espaço urbano, na qual o corpo pode se expressar na cidade como PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

24

intermediário e transgressor de todas as ações, admitindo um papel de microrresistência propício a modificar as estruturas urbanas, muitas vezes restritas e padronizadas pelo planejamento. Sendo assim, essa corporeidade se torna transformadora frente a uma cidade que, objeto de interesses diversos, confina o corpo e o afasta do ambiente da rua, através, entre outros, da valorização do automóvel e da individualidade, e desse modo, negação da dimensão humana no planejamento urbano. Dessa maneira, a corpografia urbana busca entender como o território da cidade é apropriado pelos indivíduos através de uma apreensão de experiências mais criativas e interessantes de interação do corpo com o espaço urbano.

“Uma experiência da cidade vivida (ou de seus espaços opacos segundo Milton Santos) que se instaura no corpo pode ser portanto uma forma molecular (ou micro) de resistência ao processo molar (ou macro) de espetacularização urbana contemporânea, uma vez que a cidade vivida (ou seja, a cidade não espetacularizada) sobreviveria a este processo no corpo daqueles que a experimentam. Estas corpografias urbanas de resistência, que são estas cartografias da vida urbana não espetacular inscritas no corpo do próprio

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

25

habitante, revelam ou denunciam o que o projeto urbano exclui, pois mostram tudo o que escapa ao projeto espetacular, explicitando as micro práticas cotidianas do espaço vivido, as apropriações diversas do espaço urbano que não são percebidas pelas disciplinas urbanísticas mais hegemônicas (preocupadas demais com projetos, projeções a priori, e pouco com os desvios a posteriori), mas que não estão, ou melhor, não deveriam estar, fora do seu campo de ação.” (JACQUES, 2008, p.12)

Ainda sobre a relação do corpo e a cidade, para Carlos (2014), o corpo é a expressão de relações sociais, sendo a relação do homem com o espaço dada através do corpo. Ou seja, o corpo é a mediação necessária para nos relacionarmos com o mundo e com o outro, possuindo uma dimensão social na questão sobre a passividade e uma resultante subversão imposta quando esse se apropria do espaço público.

“O

corpo

materialidade. cia

real

como

Isso

como

ponto

porque

existência

as

de

partida

relações

espacial

ilumina

sociais

concreta.

a têm

Quer

cidade, uma dizer

como existên-

que

as

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

26

relações sociais ocorrem num lugar determinado sem o qual não se concretizam, num tempo fixado ou determinado que marca a duração da ação. Desse modo, espaço e tempo aparecem por meio da ação humana em sua indissociabilidade, revelando uma ação que se realiza como modo de apropriação” (CARLOS, 2014, p.8)

Dessa maneira, para Carlos (2014) o sentido da cidade é concebido a partir do seu uso, ou seja, pela apropriação do ser humano e assim, nossa existência possui uma corporeidade, já que agimos através do corpo. Como tal, a cidade é um lugar que se reproduz como referência e, nesse sentido, lugar de constituição da identidade que sustenta a memória, revelando a condição do homem (CARLOS, 2014).

Não obstante, Jacques (2004) aponta as errâncias1 como ferramenta capaz de garantir as experiências corporais no espaço físico. As errâncias são as experiências cotidianas da cidade, as experiências ordinárias ao nível da rua. Assim, quando praticamos essas errâncias na cidade, intensificamos a experiência urbana e assim, geramos corpografias mais complexas, reinventando os lugares que habitamos. O errante 1 O termo errância urbana pode ser relacionado a um estado do corpo que experimenta a cidade a partir dos vários sentidos através das caminhadas, percursos e deslocamentos.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

27

urbano seria aquele que busca o estado de espírito errante, que experimenta a cidade através de errâncias, que se preocupa mais com as práticas, ações e percursos do que com as representações, planificações ou projeções (JACQUES, 2004). Essa errância conforma-se em uma ferramenta de experiência na cidade. O errante não enxerga a cidade como um mapa, mas experimenta o meio urbano por dentro, passando por ele e sendo parte dele, transformando-o e inventando sua própria cartografia baseado na sua experiência.

“O errante vai de encontro à alteridade na cidade, ao Outro, aos vários outros, à diferença, aos vários diferentes; ele vê a cidade como um terreno de jogos e de experiências. Além de propor, experimentar e jogar, os errantes buscam também transmitir essas experiências através de suas narrativas errantes.

São relatos daqueles que erraram sem objetivo preciso, mas com uma intenção clara de errar e de compartilhar essas experiências. Através das narrativas errantes seria possível apreender o espaço urbano de outra forma, pois o simples ato de errar pela cidade cria um espaço outro, uma possibilidade para a experiência, em particular para a experiência de alteridade” (JACQUES, 2012)

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

28

De modo mais ativo, Jacques fala sobre a viabilidade de uma resistência pensada, o que se difere das errâncias, e que é capaz de construir experiências sobre a cidade de maneira voluntária e crítica, transformando o existente. Essa possibilidade é chamada pela autora de micropoderes sensíveis. São ações que possuem o propósito de ocupar o espaço comum da cidade, construindo outras experiências sensíveis e assim, possibilita que a ação dos corpos funcione como potência política de transformação da cidade.

Em síntese, essa experiência efetiva e a prática dos espaços urbanos, através da experiência corporal da cidade é uma alternativa capaz de produzir outras formas de dissenso, criando experiências mais sensíveis entre corpo e cidade, conformando-se em micropoderes sensíveis. Nesse sentido, dialoga com a prática de movimentos urbanos e grupos que buscam, através da experiência, atualizar o ambiente e ativar o cenário público das cidades, contribuindo para um pensamento crítico acerca da realidade.

Para ilustrar a teoria descrita, apresento alguns movimentos no Brasil que dialogam com a questão do corpo e a cidade a partir de intervenções e ações urbanas.

Aqui, exemplifico a teoria ainda sem entrar, na questão do caminhar, me atendo apenas PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

29

na relação do corpo com a cidade que estas ações provocam.

Figura 8 - Intervenção 3NÓS3 | Fonte: http://galeriajaquelinemartins.com.br/en/artist/3nos3

Figura 9 - Intervenção 3NÓS3 | Fonte: Acervo Mario Ramiro.

O grupo 3NÓS3 é um exemplo de artistas, no Brasil, que realizavam ações para questionar os espaços da cidade. Formado em 1979, pelos artistas Hudinilson Jr., Mario Ramiro, Rafael França, utilizou-se de novas linguagens, como os happenings e as instalações artísticas e urbanas para contestar os padrões da época e desordenar momentaneamente o cotidiano das pessoas presentes nos locais das intervenções.

Em 1980, o grupo realizou uma intervenção no cruzamento das avenidas Paulista e Consolação, utilizando uma grande faixa de polietileno para cobrir a entrada do túnel.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

30

O material gerou efeitos curiosos e visibilidade na mídia, gerando um estranhamento e uma nova percepção do espaço urbano para locais que eram apenas de passagem rápida do automóvel, transformando a relação do corpo com o ambiente urbano. Embora de curta duração, experiências como essa permanecem não apenas na variedade de seus registros, mas também no imaginário de quem de alguma forma tomou conhecimento delas em seu dado momento2.

Figura 10 - O teatro da Vertigem: Bom Retiro 958 metros | Fonte: https://hemi.nyu.edu/hemi/pt/enc13-performances/item/2018-enc13-vertigem-bom-retiro

Figura 11 - O teatro da Vertigem: Bom Retiro 958 metros | Fonte: https://hemi.nyu.edu/hemi/pt/enc13-performances/item/2018-enc13-vertigem-bom-retiro

2 PONTES, Maria Adelaide do Nascimento. A documentação nas práticas artísticas dos grupos Arte/Ação e 3NÓS3. 2012. Dissertação (Pós-graduação em Artes) - UNESP, São Paulo, 2012. Disponível em: https://repositorio. unesp.br. Acesso em: 14 jun. 2019.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

31

O Teatro da Vertigem, em São Paulo também tem exemplos de intervenção que questiona um certo uso inerente ao local onde cada peça será realizada. Eles tratam o urbano não como mera cenografia, mas também como dramaturgia, problematizando os conflitos e dissensos próprios do lugar. Além disso, suas peças, por utilizarem a rua como o próprio palco, proporciona uma relação do público com o ambiente urbano, aproximando o corpo da cidade. A peça Bom retiro: 958 aborda o bairro de São Paulo, com mesmo nome,fazendo uso de elementos da memória, história e do cotidiano do local. Como um bairro em que predomina o comércio, o Bom Retiro, pela noite, se torna um lugar inabitado, dando espaço para a encenação do grupo, que percorre o bairro, contestando o seu uso e criando uma encenação a partir dos elementos da cidade.

Essas alternativas de usos dos espaços urbanos criam novas formas de viver a cidade e ocupar os espaços públicos, possibilitando uma relação mais próxima do corpo com a cidade, empreendendo uma ação crítica e estimulando a criação de outros imaginários possíveis, num processo de experimentar o espaço e produzi-lo simultaneamente. Ou seja, essas ações, que se dão a partir da relação corpo com a cidade, são passíveis de proporcionar novas experiências e reflexões sobre o urbano.

Quando combinadas em um movimento mais extenso, são capazes de construir outros PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

32

pensamentos sobre cidade. As novas imagens de cidade que se criam mostram um uso alternativo, crítico e subversivo do espaço urbano livre, sendo um potencial de reflexão sobre como a cidade está sendo construída.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

33

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

34

Figura 12 - Caminhantes em Santiago, Chile | Fonte: acervo pessoal

capítulo II caminhar como experiência PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

35

A experiência corporal explicada no capítulo anterior é colocada aqui como o próprio ato de caminhar, onde o sujeito experimenta o espaço, através do seu corpo e constrói lugares a partir de suas percepções sensoriais. Dessa maneira, investigo o caminhar como uma forma de conexão entre o pedestre e a cidade, através dessa experiência e vivência urbana. Para tal, procuro compreender o caminhar a partir de Michel de Certeau, Francesco Careri, os Situacionistas e as vanguardas artísticas.

Em A invenção do cotidiano (2001), Certeau traça um paralelo entre duas visões de cidade e como o caminhar está intrinsecamente ligado a uma delas. A primeira visão é aquela vista de cima, associada ao ato de ‘observar’: é a visão de topo, de cima de um arranha-céu, no qual se pode enxergar tudo abaixo, mas não se faz parte do que se está enxergando. Para ele, é uma relação de contemplação, existente, muitas vezes, no olhar do planejador, do urbanista, é a visão do mapa. A segunda visão é aquela presenciada ao nível do chão, relacionada ao ‘estar’: está na superfície, pertencente aos praticantes ordinários da cidade. Tais praticantes não possuem uma visão do todo, mas sim um “olhar tático” de quem caminha e vivencia os detalhes da cidade e assim, participam de tudo, transformando e sendo transformados e dessa forma, reconfigurando as ordens espaciais. Os caminhantes da cidade habitam a paisagem, diferente PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

36

daqueles que só a observam. É uma relação tátil, presencial.

Não obstante, são as ações no cotidiano que resultam em relações perceptivas com a cidade. Sendo assim, essas experiências ordinárias da cidade são importantes para legitimar aquilo que está imposto no desenho da cidade, no que foi projetado, já que é a partir das relações diárias de uso, ocupação, passagem que a cidade é construída. Assim, o caminhar é um modo de fazer cotidiano para esses praticantes ordinários da cidade, reapropriando-se dos espaços, por meio de suas trajetórias e percursos.

“São as apropriações e improvisações dos espaços que legitimam ou não aquilo que foi projetado, ou seja, são essas experiências do espaço pelos habitantes, passantes ou errantes que reinventam esses espaços no seu cotidiano. Para os errantes - praticantes voluntários de errâncias - são sobretudo as vivências e ações que contam, as apropriações feitas a posteriori, com seus desvios e atalhos, e estas não precisam necessariamente ser vistas (como ocorre com a imagem ou cenário espetacular), mas sim experimentadas, com os outros sentidos corporais. Os praticantes da cidade, como os errantes,

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

37

realmente experimentam os espaços quando os percorrem e, assim, lhe dão “corpo” pela simples ação de percorrê-lo”

(JACQUES, 2008, p.16)

Não obstante, Michel de Certeau (2001) relaciona o ato de caminhar na cidade com o ato da fala, sendo que o caminhar é “um processo de apropriação do sistema topográfico pelo pedestre (assim como o locutor apropria e assume a língua); é uma realização espacial do lugar (assim como o ato de palavra é uma realização sonora da língua); enfim, implica relações entre posições diferenciadas, ou seja, contratos pragmáticos sob a forma de movimento ” (DE CERTEAU, 2001, p. 177). Assim, essa ação do caminhante de percorrer o espaço estabelece um processo de apropriação e releitura do meio urbano, legitimando aquilo que foi projetado ou construído.

Dialogando com o argumento, Hissa e Nogueira (2013) define a vida urbana como aquela feita das relações corpo-cidade, espaço-movimento, afeto-ação. Assim, a cidade a ser vivida é a cidade ao nível da rua, produzida por corpos e movimento, contrapondo a cidade vista do alto, do planejamento urbano. Dessa maneira, a cidade vive por meio do corpo dos sujeitos, sendo cidade-corpo. Ou seja, essa apropriação da rua, pelo sujeito, que eu coloco aqui, como o caminhar, é a própria experiência corporal não PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

38

espetacularizada. É através do caminhar, do contato do corpo com a pele da cidade, que experimentamos e tomamos conhecimento do ambiente urbano. Dessa maneira, se, por um lado, ele (corpo) serve de captador e efetuador dos modos homogeneizantes do sistema, por outro, é através do corpo que podemos pensar em linhas de fuga e jeitos de resistências e invenção de territórios do existir. Assim, o corpo que se movimenta nas cidades é capaz de encontrar e provocar novos agenciamentos de desejo e produção de vida (MOEHLECKE, 2005).

Francesco Careri, em Walkscape: Caminhar como prática estética (2013), expõe como o caminhar tem produzido arquitetura e paisagem e como essa prática, esquecida pelos arquitetos e urbanistas, têm sido reapropriada por poetas, filósofos, e artistas que enxergam no caminhar uma forma de experienciar a cidade. O livro faz uma releitura da história da cidade e da arte a partir do ato de caminhar, desde os nômades até a Land Art, salientando que “foi caminhando que o homem começou a construir a paisagem natural que o circundava” (p.27). Para o autor, “o caminhar, mesmo não sendo uma construção física de um espaço, implica uma transformação do lugar e dos seus significados” (p.51). Assim, caminhar modifica culturalmente o significado do espaço e, portanto, transforma o espaço em si em lugar.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

39

Essa forma de experimentar fisicamente a cidade através do caminhar possui o potencial de transformação da relação corpo-cidade, a partir de uma construção menos funcionalista dessa relação com o espaço urbano. O contato do corpo com a cidade pode ser um propulsor para a elaboração de uma nova consciência crítica. Em suma, o caminhar se torna uma forma simbólica na qual o corpo passa a ressignificar lugares, ao mesmo tempo que ressignifica também, nossa relação com a cidade. Para Careri, o caminhar possui uma capacidade não só de leitura, mas também de transformação da paisagem, preenchendo espaços de significados.

“Nesse espaço de encontro, o caminhar revela-se útil à arquitetura como instrumento cognitivo e projetual, como meio para se reconhecer dentro do caos das periferias uma geografia e como meio através do qual inventar novas modalidades de intervenção nos espaços públicos metropolitanos, para pesquisa-los para torna-los visíveis. Com isso não se quer incitar arquitetos e paisagistas a deixar as mesas a deixar as mesas de desenho para colocar nas costas a mochila da transurbância nômade, nem teorizar sobre a ausência total de percursos a fim de que o cidadão se perca, embora, mais

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

40

frequentemente, o errar pudesse ser considerado como um valor, invés de um erro. O que se quer indicar é o caminho como um instrumento estético capaz de descrever e modificar os espaços metropolitanos que muitas vezes apresentam uma natureza que ainda deve ser compreendida e preenchida de significados, antes que projetada e preenchida de coisas.” (CARERI, 2013, p. 32)

Este ato simbólico do caminhar esteve presente nas práticas das vanguardas artísticas do início do século XX, como uma ação estética. Os dadaístas caminhavam como uma forma de participação crítica à reformulação de uma Paris moderna, representando essa banalidade da cidade. Sua primeira caminhada foi a Grande Saison Dada (1921), que se constituiu em ações no centro da capital francesa que buscavam uma conscientização da realidade cotidiana em que a cidade se encontrava. Em 1924, os surrealistas realizaram suas primeiras caminhadas, percorrendo de forma errática o ambiente da cidade, tentando descobrir suas zonas de ativação. De forma a se sentirem perdidos, buscavam encontrar o cotidiano das cidades.

O grupo Stalker1 , criado por Careri, praticava as “transurbâncias”, caminhadas 1 O nome foi inspirado no filme homônimo. O grupo teve ação inicial em 1995 com uma caminhada de quatro dias em torno de Roma.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

41

por zonas marginais, que eram preferencialmente feitas nos eixos urbanos não monumentais e não turísticos. A caminhada dos jovens Stalkers buscava atravessar os “muros de Zonzo”2 , sair da cidade mais praticada e conhecida de todos para ver o que está ao redor dos muros, visíveis ou invisíveis, nas margens da cidade tradicional, espaços que não aparecem nos guias turísticos, espaços urbanos indeterminados, marginais, periféricos, territórios em plena transformação, espaços mutantes (JACQUES, 2013). Careri chama essas zonas marginais de vazios urbanos, considerando-os parte fundamental do sistema urbano da forma nômade - habitam a cidade e deslocam-se de tempo em tempo -. São realidades crescidas fora e contra aquele projeto moderno que ainda é incapaz de reconhecer os seus valores e, por isso, de associar-se a eles (CARERI, 2013). Dessa maneira, o caminhar se revela como um ato cognitivo e criativo utilizado como ferramenta de questionamento da cidade, como uma forma performática.

O debate do modo como o caminhar dialoga com o cotidiano e a produção da cidade nos remete a Internacional Situacionista, grupo de crítica política que lutava 2 Os “Muros de Zonzo” delimitavam essa cidade mais praticada e conhecida. Estar além desse “muro de zonzo” significava olhar ao redor, nas margens da cidade tradicional, olhar para lugares que estão fora do circuito turístico.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

42

contra a cultura do espetáculo, fundada em 1957 por membros da Internacional Letrista3 e do Movimento por uma Bauhaus Imaginista 4, contava com intelectuais e artistas de vários campos que se associaram num movimento artístico, político e poético, liderado por Guy Debord. O grupo, que caracterizava o espaço público como empobrecido de significado e mal utilizado, via nas práticas libertárias a possibilidade de uma transformação cotidiana, a partir da criação de situações que superassem as funções pré-determinadas pelo planejamento urbano funcionalista. Essas situações seria “a construção concreta de ambiências momentâneas da vida, e sua transformação em uma qualidade passional superior” (p.54).

Assim, criaram o Urbanismo Unitário, em oposição ao urbanismo moderno com sua separação de funções (Carta de Atenas), que funcionava como uma teoria crítica urbana e não propunha nenhum novo modelo, mas sim algumas experiências efêmeras ou a criação de situações, que buscavam contribuir para uma nova apreensão do espaço urbano. Para isso, consideravam e defendiam como necessário uma construção verdadeiramente coletiva da cidade, com uma participação ativa dos cidadãos, 3 A internacional Letrista foi um grupo, formado em 1952, também por Guy Debort, que discutia ideias ligadas à arte, a superação do surrealismo e também as ideias de ir além da arte.

4 O movimento por uma Bauhaus imaginativa foi criado por Arger Jorgensen e se caracterizada por uma crítica à abertura da nova Bauhaus PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

43

sendo possível apenas com uma revolução da vida cotidiana. Essa posição contra o urbanismo baseava-se, sobretudo na possibilidade de uma observação e experiência da cidade existente e assim, utilizavam-se da psicogeografia5 e deriva6 , para experimentar a cidade, vista como um grande laboratório de novas formas de viver.

A deriva é a prática ou técnica de andar sem rumo que contribui para a apropriação do espaço urbano pelo pedestre e potencial subversão da cidade resultante do funcionalismo moderno, racional, que prioriza o fluxo de carros em detrimento do espaço mais lento do pedestre, denominando-se como um comportamento “lúdico-construtivo”.

Já a psicogeografia é o procedimento ou método que estuda o espaço urbano a partir de práticas de deriva, mapeando os comportamentos afetivos diante desse processo de caminhar, a partir de percepções sensoriais do espaço. Eles acreditavam que baseado na construção de situações, alcançariam à transformação revolucionária da vida cotidiana.

Dessa maneira, o caminhar sem rumo, ou a deriva situacionista se conforma como uma prática momentânea / efêmera, sendo um método de construção experimental 5 “Momento da vida, concreta e deliberadamente construído mediante a organização coletiva de um ambiente unitário e de um jogo de acontecimentos” Anônimo. “Définitions”, Internationale Situationniste, n. 1, 1958.

6 “Modo de comportamento experimental ligado às condições da sociedade urbana: técnica de passagem apressada por vários ambientes. Mais particularmente, também designa a duração de um exercício contínuo dessa experiência” Anônimo. “Définitions”, Internationale Situationniste, n. 1, 1958.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

44

da vida cotidiana. O caminhar contribui para a experiência e vivência de cidade, sendo dotado de um grande potencial de reflexões e relações individuais no espaço urbano, o qual possui uma aptidão de reverberar em esferas mais amplas dentro do pensamento sobre urbano.

Portanto, entendo que essa relação entre a perspectiva corpo-cidade e o caminhar como experiência urbana se dão a partir da possibilidade do caminhar se constituir como uma forma de microrresistência diante da agressividade da rua frente ao corpo.

Assim, quando caminhamos, a cidade deixa de ser o lugar do trânsito e passa a ser o lugar da experiência, contrapondo-se a cidade do planejamento que não envolve a dimensão humana. O indivíduo caminhante experimenta a cidade com o corpo e assim, entra em contato com o lugar, se identificando com o espaço e criando significados simbólicos, reconhecendo e interagindo com a cidade, criando narrativas urbanas.

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

45

PARTE I - REFERENCIAL TEÓRICO

Figura 46 13 - Vista desde EdifĂ­cio Sulacap, Belo Horizonte | Fonte: acervo pessoal

capĂ­tulo III Belo Horizonte

47

Apresento, primeiro, um conjunto de eventos e movimentos recentes que buscam ocupar o espaço público da cidade de Belo Horizonte, num processo de redescobri-la por meio de novas práticas urbanas. Os eventos autônomos, intervenções urbanas, ações táticas e culturais são exemplos de práticas que constroem e reconstroem os espaços da cidade e que demonstram essa produção simbólica do contexto da cidade. Dessa maneira, busco apontar em que sentido estas experiências podem significar novas construções possíveis dos espaços da cidade, materializando momentos em que se passeia, se percorre, se observa e se apropria das ruas da cidade, aproximando o corpo de uma relação com a cidade.

A chamada Praia da Estação surgiu em 2010, como uma resposta a arbitrariedades do então prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda, que publicou o decreto nº 13.7871 que limitava o uso da Praça da Estação, proibindo a realização de eventos.

Assim, houve a criação de um blog anônimo que convidava os moradores de Belo Horizonte a irem à Praça da Estação de branco, no dia 7 de janeiro de 2010, como uma forma de protesto ao decreto da Prefeitura. A manifestação, com cerca de 50 pessoas vestidas de branco, se desdobrou na Praia da Estação, realizada pela primeira vez no 1 Disponível em: http://portal6.pbh.gov.br/dom/iniciaEdicao.do?method=DetalheArtigo&pk=1017732. (Acesso: 16/09/2019)

48

dia 16 de janeiro de 2010, que se transformou em uma ação emblemática de ocupação do espaço público da cidade, acontecendo várias outras vezes e transformando o local em um lugar de trocas e de vivência urbana, se constituindo em uma ação política e performática que transforma a praça em uma praia, questionando seu uso e criando uma apropriação lúdica do lugar.

Figura 14 - Praia da Estação | Fonte: https://www.otempo.com.br/galeria-de-fotos/praia-da-estacao-1.772190

O próprio carnaval de rua de Belo Horizonte, desde 2010, de forma

49

independente, também busca ressignificar a relação com a cidade e o outro. Assim, diversos blocos são atrelados a movimentos sociais e situações urbanas específicas, buscando transformar a cidade por meio de diversas pautas - lutando a favor das liberdades individuais, direito à moradia, transporte gratuito e contra a privatização dos espaços públicos. Somado a isso, temos também o Duelo de Mc’s, que acontece sob o Viaduto Santa Tereza, desde 2007 e reúne diversas manifestações artísticas que ocupam o espaço residual do viaduto. É durante esses eventos, que a população percorre a cidade e a experimenta através do corpo e da ocupação dos espaços públicos, sendo responsáveis por estabelecer um vínculo entre os habitantes da cidade e seus espaços públicos.

Figuras 15: Duelo de Mcs’, debaixo do Viaduto Santa Tereza | Fonte: Pablo Bernardo

Figura 16 - Bloco Então Brilha, em Belo Horizonte | Fonte: Mariela Guimarães / O tempo

50

Não obstante, temos também iniciativas como a chamada Lotes Vagos: ação coletiva de ocupação urbana experimental, criado por Louise Ganz e Breno Silva, em 2005, que pretendia transformar os lotes privados da cidade em espaços públicos de uso coletivo temporário. Assim, os lotes eram emprestados pelos proprietários e usados pelos habitantes da cidade, sendo transformados em jardins, salas de estar, descanso, dentre outros. A ação teve como objetivo evidenciar uma rede de espaços vazios com potencial de uso, problematizando a falta de espaços comuns na cidade, ao mesmo tempo da existência de 70 mil lotes vazios em Belo Horizonte, trabalhando assim, com as especificidades do lugar e com as pessoas do entorno. Faz-se importante mencionar que as intervenções não buscam requalificar os lotes, mas sim manter seu caráter de abandono, funcionando como um ato crítico, expondo a ausência de uso, ao mesmo tempo que transformando a vida cotidiana das pessoas, propondo novos usos para estes espaços. A iniciativa foi expandida para a cidade de Fortaleza, em 2008, demonstrando suas potencialidades.

“Partindo da escala micro local, onde se expressa uma vivência pessoal do espaço, é também relevante para o alcance coletivo, já que lotes estão

51

presentes em todo o espaço da cidade, possibilitando uma nova paisagem.

Desestabiliza as noções de propriedade privada e instiga o público a participar da produção da cidade de modo ativo, experimental e autônomo, como uma prática política.” (GANZ, 2016, p.3)

Figura 17 - Lotes Vagos: Ação Coletiva de ocupação urbana e experimental | Fonte: https://lganz.wordpress. com/2016/03/21/lotes-vagos-ocupacoes-experimentais/

Figura 18 - Lotes Vagos: Ação coletiva de ocupação urbana e experimental | Fonte: https://lganz.wordpress.com/2016/03/21/lotes-vagos-ocupacoes-experimentais/

52

É nesse contexto, que gostaria de discutir também, alguns movimentos, em Belo Horizonte, que utilizam a cidade como um espaço experimental e o caminhar como uma maneira de explorar e questionar a realidade social e política do meio urbano.

Esses projetos dialogam com a questão da experiência corporal, a partir dos dois eixos trabalhados: perspectiva corpo-cidade e caminhar como experiência. Em suma, a questão da mobilidade, e mais a fundo, o caminhar, aparece como uma das formas recorrentes de experiências no meio urbano, possibilitando conceber o espaço percebido e vivido1, que reestrutura esse projeto urbanístico a partir da vida urbana cotidiana.

Desde práticas artísticas a grupos que fazem uso do andar pela cidade como forma de experimentá-la e redescobri-la, essa transformação simbólica do ato de caminhar serve como argumento para a ação prática, transformando a imagem da cidade e o próprio cotidiano, sendo pequenas táticas que desmobilizam as práticas sociais instituídas.

Rolezinho na Lagoinha é um evento organizado peloovimento Nossa Grama 1 Lefebvre (1991), em A produção do espaço, divide as dimensões espaço em três conceitos:

Espaço percebido – é o espaço apreendido por meio dos sentidos, compreendendo tudo o que se apresenta aos sentidos: visão, audição, olfato, tato e paladar

Espaço concebido – é o espaço planejado, previamente pensado

Espaço vivido – é o espaço experimentado pelas pessoas na prática de sua vida cotidiana.

53

Verde2 e o coletivo Viva Lagoinha3 , que parte de um percurso feito a pé pelas ruas do Bairro Lagoinha, buscando descobrir os tantos lados do lugar.

Figura 19 - Rolezinho na Lagoinh | Fonte: Natália Hare 2 “O movimento Nossa Grama Verde convida quem mora em Belo Horizonte a ter curiosidade e interesse para redescobrir a cidade a cada dia e conhecer as iniciativas locais que existem aqui. Acreditamos que a prosperidade dessas iniciativas, sejam elas pequenos negócios, coletivos, espaços culturais, escolas ou intervenções urbanas, contribui para que o nosso cenário local seja vibrante, criativo e diverso. É assim a cidade em que queremos viver” 3 “O Viva Lagoinha é uma iniciativa de comunicação social que conecta pessoas que sonham com a requalificação da Lagoinha. Desde 2007 atuamos nos bairros do Complexo da Lagoinha através da produção audiovisual, publicação de jornais, produção de eventos, mídias sociais e no boca a boca com o objetivo de transformar a Rua Itapecerica no maior corredor cultural da América Latina”

54

O passeio pelo bairro tem a finalidade de fugir de roteiros turísticos pré-estabelecidos e tornar os moradores da cidade, os próprios turistas em locais desconhecidos por eles. A Lagoinha foi um bairro boêmio da cidade, contando com comércios, botequins, pensões, e cinemas de rua com o Paissandu e o São Geraldo. A construção do complexo ferro-rodoviário, na década de 1980, desintegrou o bairro ao centro de Belo Horizonte, marcando o início de uma fase de degradação e falta de investimentos no local. O caminhar é usado como forma de redescobrir a cidade, resgatando e dando visibilidade a história e potência cultural do local, aumentando o contato do corpo com a cidade e criando outros imaginários possíveis.

O CalmaClima é um grupo de corrida, criado em Belo Horizonte que busca não somente a realização de um exercício físico pelas ruas, mas também interagir com a cidade, ocupando-a a partir de uma nova perspectiva, passando por viadutos, túneis, becos. O objetivo do grupo é mostrar outros lugares de Belo Horizonte, que, durante nossa rotina, passam despercebidos. As corridas são abertas para todos que querem participar e além delas, o grupo realiza também caminhadas com o mesmo propósito.

Durante o trajeto, há algumas pausas e pequenos percursos realizados em uma velocidade menor, o que possibilita que a cidade seja percebida de uma maneira mais calma.

55

“Belo Horizonte sempre se pautou pela falta. Historicamente, as pessoas sempre falam que ‘falta isso, falta aquilo’ e o Calma tem muito a ver com essa ideia de mostrar que caminhos não faltam. A gente tenta se projetar como turista, visitando a própria cidade, com a ideia de construir um lugar mais rico, com mais sentidos, caminhos e propostas” (BIAGIONI, 2018)4

Figura 20 - Reportagem sobre o CalmaClima para Estado de Minas | Fonte: https://www.em.com.br/app/noticia/ gerais/2019/05/28/interna_gerais,1057285/calma-clima-mulheres-ocupam-belo-horizonte-em-corrida-que-sai-da-rua.shtml

4 Bernardo Biagioni, criador do CalmaClima, para entrevista no Edição do brasil (http://edicaodobrasil.com. br/2018/08/10/novo-modo-de-correr-faz-sucesso-em-bh/)

56

Figura 21 - CalmaClima | Fonte: Lucas Cancela

Figura 22 - CalmaClima | Fonte: Lucas Cancela

Os trajetos são sempre em lugares diferentes, fora da cidade praticada e conhecida. Assim, os corredores tornam-se de praticantes ordinários da cidade, ou como o próprio criador chama, “caminhantes marginais”, percorrendo a cidade fora do eixo turístico e se relacionando com ela a partir do contato do corpo com o ambiente urbano. Além disso, as corridas sempre buscam uma conscientização sobre como nos apropriamos da cidade. Um exemplo foi a semana da Corrida pela água, que percorreu os rios invisíveis da cidade, explicando e contando a história da cidade antes de começar a corrida. Ademais, por serem grupos grandes, o evento desorganiza momentaneamente o estar na rua, tanto de quem participa das corridas, tanto de

57

quem estå a sua volta, chamando a atenção para esses novos olhares da cidade.

58

Figura 23 - caminhantes durante travessia em Venda Nova | Fonte: Facebook Atravessar BH

capĂ­tulo IV atravessar BH

59

Para investigar em detalhe o entendimento do papel dessas ações urbanas que usam o caminhar como forma de experimentar a cidade, apresento estudo realizado sobre o projeto chamado Atravessar BH. As etapas do percurso que me levaram a escolher essa iniciativa como estudo de caso foram a possibilidade de maior contato do corpo com a cidade durante as travessias, devido ao tempo longo das caminhadas; a velocidade da caminhada, compatível com a velocidade sensorial para conhecer a cidade e também o fato de serem feitas em lugares que fogem da rota turística.

Os procedimentos metodológicos que surgiram no decorrer dessa investigação são as entrevistas realizadas ao longo da pesquisa que configura um conjunto de relatos sobre como são feitas as ações / caminhadas do grupo, além de pesquisas nas páginas oficiais do projeto e na mídia. Dessa forma, busco primeiro, expor o que é o projeto e quais as travessias feitas até então. A partir disso, apresento o Atravessar BH segundo a narrativa de dois protagonistas diferentes: a idealizadora do projeto, Prussiana e os caminhantes das travessias. Assim, primeiramente, apresentarei o projeto, para depois expor as travessias já feitas até então, contando como foram feitas, a partir dos relatos da criadora, encontrados nas redes sociais do projeto e também explicando

60

os caminhos do projeto pela entrevista com Prussiana. Como sequência, exponho e analiso as percepções dos caminhantes que participaram das travessias, acrescidas de algumas considerações minhas.

O projeto O atravessar BH foi criado em julho de 2018 e reúne pessoas que querem explorar Belo Horizonte através da caminhada. Segundo a idealizadora do projeto, Prussiana, a iniciativa teve inspiração no livro de Francesco Careri, Walkscape: caminhar como prática estética, e assemelha-se com o grupo Stalkers, criado pelo autor do livro, na Itália. Assim como os Stalkers andavam pelas bordas de Roma, especialmente, fora da rota turística, as travessias em Belo Horizonte buscam também essa ordem de sair do centro da cidade, andar por lugares que não se tem muitas literaturas, que não conhecemos. O simples ato de andar, uma atividade tão óbvia do dia-a-dia, torna-se uma forma de conhecer a cidade, trazendo um olhar mais profundo ao nosso entorno, se conformando em uma forma de experimentar a cidade e por fim, se apropriando dos espaços urbanos.

61

Os grupos das travessias são limitados a 15 pessoas, o que possibilita uma troca entre todos os participantes, caminhando com cuidado e atenção. Além disso, a probabilidade do encontro com o outro é maior, por mostrar-se mais convidativo e aberto, pretendendo não causar uma sensação de invasão por onde passa e nem de estranhamento com as pessoas locais.

62 Figura 24 - caminhantes durante travessia em Sabará | Fonte: Facebook Atravessar BH

percepções Prussiana

63

A narrativa da criadora do Atravessar BH, Prussiana, será contada a partir de conversas realizadas com ela e dos relatos encontrados nas redes sociais do grupo.

Aqui, reproduzirei as falas e relatos da fundadora e em seguida apresentarei algumas considerações necessárias para relacionar as questões de corpo e cidade e do caminhar como experiência com o Atravessar BH. Primeiro, será apresentado as falas durante a entrevista e em sequência, minhas reflexões. Depois, apresentarei os relatos de cada travessia, acrescentando, mais uma vez, algumas considerações importantes.

“(...) me interessava olhar pra cidade como um lugar de comunicação, como um lugar de textos múltiplos, mais do que por exemplo coisas que podemos ler, como grafite, pichação, placas, mesmo conversas com outras pessoas, o próprio modo de viver, viver na cidade é estar em movimento, a gente precisa sair, voltar, e parte disso quer dizer que a gente vai tá em encontros múltiplos ao longo da vida, da semana. E os encontros são baseados em comunicação, a gente precisa ter signos compartilhados, pra entender o que as pessoas são na cidade, o que a rua representa, o que o prédio representa e a gente tá o tempo todo lendo e reescrevendo a vida cotidiana urbana e a cidade”

64

Sobre o percurso acadêmico de Prussiana, é notório como ela trata a cidade como o lugar da comunicação e o lugar do encontro e como esse encontro é importante para entender os significados da cidade e o que ela representa para cada um. Essa cidade como lugar do encontro só é possível a partir do caminhar e da prática de uso dos espaços públicos, do contato do corpo com a cidade.

“Ao longo das travessias, eu e as pessoas que estavam juntas, a gente acaba conversando, por serem longas, tem bastante tempo de conversar e trocar ideia. Tem várias sensações que estão sempre mudando e surgindo novas. Como esse formato da travessia é específico, ficamos muito tempo andando, em contato com a cidade, é legal perceber que, por exemplo, isso que estamos falando que o planejamento não prevê a caminhada, como que isso fica mais forte, ao longo de uma caminhada longa. Tipo, em algum momento, a gente se cansa de andar nas calçadas e a gente acaba tendo, preferindo andar na calçada, por causa do número e disputa de espaços. Mas, tem uma coisa específica que me marca muito, que é: depois de passar muito tempo andando em calçadas e elas tendem a ser inclinadinhas, fica uma dor no pé muito específica de que você não está andando com o pé reto. Isso na nossa primeira travessia, eu senti isso e aí nos dias seguintes, tipo, numa

65

semana seguinte, toda vez q eu andava em uma calçada inclinada, é como se o meu pé tivesse aprendido esse tipo de dor e tivesse essa memória. O tempo longo e o esforço que a gente dispõe, ele deixa mais pungente essas características que cansam, que exaurem a gente na caminhada.”

O tempo longo das travessias contribui para deixar mais claro as sensações que esse contato com a cidade permite e, assim, percebe-se mais a cidade. Outro ponto importante é que, quando nos apropriamos de um espaço urbano, o traduzimos como a experiência corporal sobre ele próprio, permanecendo como memória urbana no corpo.

Essas caminhadas criam memórias sobre a cidade, no próprio corpo, funcionando como potência a uma reflexão crítica sobre como projetamos e construímos o meio urbano.

“Acho legal pensar que a nossa locomoção, o nosso andar a pé, é o que podemos fazer de mais independentemente, sem outro recurso, como que ele pode ser muito significativo pra nossa escrita pra cidade. Como que nós, como indivíduo, pessoa, morador, também contribui pra construir a cidade no dia a dia.”

66

“Caminhar como uma prática de conhecer a cidade por mais que pareça muito... acho que é porque não é uma forma de conhecimento que a gente considera, sei lá, científica, mas realmente, o tanto que você experimenta da cidade e que você consegue pensar e tirar conclusões, fazer paralelos por estar com o corpo na cidade é bem potente”

“Como é um processo de criar repertório sobre a cidade. (...) aumentar o mapa mental. Comparar diferentes regiões, o que que tem e o que não tem, porque é assim”

“Caminhar é se conectar com a cidade. Eu moro em Belo Horizonte desde um ano de idade e tem muitos lugares que não conheço. Caminhar é um meio de você olhar para fora e para dentro também.”

O caminhar se conforma em uma maneira de ler a cidade e criar paisagem, interferindo no espaço percebido e vivido, em oposição ao espaço concebido (de maneira utilitária, racional, técnica), sendo uma forma de análise da cidade. É ao produzir retóricas a partir dessas longas caminhadas, que começamos a experimentar a cidade e entende-la, criando repertório sobre a meio urbano. O caminhante experimenta o

67

espaço com o corpo, entrando em contato com o lugar e se relacionando e identificando com o espaço e assim, construindo, em seu imaginário, novos significados de cidade.

“No fundo, a possibilidade de encontro é boa por si só, pode ser um encontro tenso, a vida cotidiana, a vida urbana, pode ter vários tipos de encontros, podem não ser só harmônico e é isso. O que temos que ter em mente durante a travessia, é não se fechar, e estar aberto aos encontros que podem acontecer. No grupo menor, ele é mais convidativo, se mostra mais aberto para os encontros.”

Por fim, a caminhada serve como uma possibilidade de encontro com o outro.

Alguns acontecimentos da vida urbana que constroem a paisagem só são percebidos quando se está a pé: as conversas nas calçadas, os ambulantes pelas ruas, os diversos encontros do dia-a-dia.

68 Figura 25 - caminhantes durante travessia em Paraiso das Piabas | Fonte: Instagram Atravessar BH

travessias

69

As travessias, divididas em duas séries, serão contadas aqui, a partir dos relatos da Prussiana. A primeira série caracterizou-se pelos trajetos pelas bordas da cidade de Belo Horizonte e saíram sempre de uma estação do metrô, terminando em outra estação de metrô. Já a segunda série contou com os trajetos de ida e volta a cidades vizinhas, atravessando os limites e áreas de transição entre municípios e sempre retornando ao ponto inicial das travessias.

série I

série II

travessias 1 - Estação Vilarinho / Estação Barreiro 2 - Estação Vilarinho / Estação Santa Tereza 3 - Estação Barreiro / Estação Santa Tereza 4 - Santa Tereza / Sabará 5 - Venda Nova / Santa Luzia 6 - Venda Nova / Ribeirão das Neves 7 - Barreiro / Ibirité

Distância percorrida 34,11 km 19,69 km 26,51 km 33,13 km 32,07 km 32,99 km 20,01 km

Duração 12 horas 6 horas 8 horas e 30 minutos 11 horas e 55 minutos 12 horas e 3 minutos 11 horas e 57 minutos 7 horas e 57 minutos

“Três coisas com que a gente se relaciona andando na cidade: espaço, tempo, pessoas.

O espaço vai do chão ao céu, literalmente: terra, concreto, grama, cheio, água, luz, lixo, ruído, placa, rua, lote, campo, casa, comércio, praça, construção, bairro, escola,

70

trânsito. O tempo depende da pressa, da volta pra casa, do sextou, da domingueira, da idade, da memória, das saudades. Já as pessoas, tem muitos jeitos de se olhar e ser olhado, cadências muitas, sorrisos de canto, grunhidos, cumprimentos, grosserias, cheiros, encontros e conversas.

“Andar na cidade é essencial em vários sentidos. Muita gente que estuda as cidades sugere que, quem tem deixado de lado, volte a experimentar a cidade a pé. Caminhar te põe de frente para outras pessoas e te dá uma medida mais aproximativa das coisas.”

(Prussiana no convite para a primeira caminhada)”

Quando a idealizadora do projeto fala que o caminhar “dá uma medida mais aproximativa das coisas” é possível relacionar esse discurso com os conceitos de De Certeau sobre as duas visões de cidade. Quando caminhamos, interagimos com a cidade a partir do “estar”, do “habitar”, da relação do corpo com o ambiente e assim, torna-se possível perceber alguns acontecimentos do dia-a-dia da vida urbana que constroem a paisagem: as conversas, as pessoas, os encontros.

71

Figura 26 - Caminhantes durante a travessia em direção a sabará | Fonte: facebook Aatravessar BH

Figura 27 - Caminhantes durante a travessia em direção a sabará | Fonte: facebook Aatravessar BH

72

Figura 28 - Travessia em direção a sabará | Fonte: facebook Aatravessar BH

Figura 29 - Travessia em direção a sabará | Fonte: facebook Aatravessar BH

73

“Conhecer os contornos da cidade é também conhecer suas transições e vizinhanças” (Prussiana no convite para a quarta caminhada)”

“A cidade se faz de mil e um encontros cotidianos e caminhar por ela é provocar um bocado deles.”

“A gente percorre lugares juntos, mas também experimenta: as histórias uns dos outros, a bagagem de cada pessoa sobre a cidade, suas percepções sobre as coisas que vemos, etc”

A série II dos percursos, procurou atravessar BH em direção a outras cidades da região metropolitana, conhecendo suas vizinhanças e transições e assim, conhecendo os contornos da cidade. É interessante perceber como, nas falas de Prussiana, o caminhar pela cidade está atrelado ao lugar do encontro e da vida cotidiana.

“Fica agora a dúvida se fomos nós que atravessamos as cidades ou elas que nos atravessaram.

74

E não deveriam ser sempre assim, de mão dupla, as travessias?”

“BH ainda tem várias áreas de mata, campo e serra nos arrededores. Atravessando essas bordas, a gente se lembra do espaço natural onde a cidade surgiu. (...) Uma travessia entre cidades põe esses elementos no nosso caminho e nos ajuda a entender o espaço urbano de um jeito mais completo e complexo” “Sempre incorporamos um pouco dos espaços ao longo das travessias. (...) O corpo tem mesmo várias formas de memória. E as memórias das travessias renovam de um jeito inesperado nossas ideias de cidade.” (Prussiana sobre a quarta travessia)

Os relatos de Prussiana evidenciam a relação corpo-cidade que é estabelecida a partir do caminhar. Relação essa, que cria corpografias ou marcas da cidade no corpo, ao mesmo tempo que marcas do corpo na cidade. Essa peregrinação torna-se uma forma de conexão entre o pedestre e a cidade, através dessa vivência e experiência, somado ao fato de que se anda pela cidade, não com a intenção primordial de chegar a algum destino, mas como objetivo principal o próprio andar pela cidade, o próprio percurso. Por fim, os relatos demonstram como o caminhar propicia um novo olhar para a cidade.

75

“Neves tem vários jeitos de ser. A gente conheceu alguns deles botando nosso corpo na rua, a pé e de coração aberto.” (Prussiana sobre a sexta travessia) “Regiões comerciais têm ritmos muito próprios e contagiantes. Se tem mercadoria exposta na calçada, nossos olhos vão pulando de loja em loja. Se tem vendedora chamando cliente pela caixa de som, a gente logo imagina como deve ser a dona da voz. Se tem muita gente andando na calçada, a gente desvia, tropeça, tromba. Não dá pra andar devagar se o ritmo geral é ligeiro, se não empaca o fluxo. De vez em quando um cheiro bom de comida até faz a gente mudar de trajeto.

Na última travessia, começamos nossa caminhada numa região assim. A ave-

nida Denise Cristina, em Justinópolis, tem muitos tipos de comércio. Um clima parecido ao da sua vizinha Padre Pedro Pinto em Venda Nova.

Dali pra cima, a gente foi vendo a transição: saem os comércios, entram as

casas. Um jeito de bairro fica mais forte e, aos poucos, vai ganhando traços mais rurais.

Nosso jeito de andar, claro, também muda” (Prussiana sobre a sexta travessia)”

Fica evidente durante todo o relato sobre essa travessia, como o caminhar é uma forma de leitura da cidade, de adquirir conhecimento sobre ela através da

76

observação e do contato do corpo com a cidade.

Figura 30 - Travessia em direção a Ibirité | Fonte: Douglas Silva - Instagram Atravessar BH

77

Figura 31 - Travessia em direção a Ibirité | Fonte: Douglas Silva - Instagram Atravessar BH

78 Figura 32 - Caminhantes durante a travessia em direção a sabará | Fonte: facebook Aatravessar BH

percepções participantes

79

As narrativas aqui dispostas tratam de percepções pessoais dos participantes sobre o processo da travessia. Essas percepções dos caminhantes aqui colocadas partiram de um formulário do google, no qual treze participantes responderam às perguntas propostas. É importante ressaltar que é possível acompanhar as travessias pelas redes sociais, o que, segundo Prussiana, torna uma forma de atravessar a cidade também, recebendo comentários e críticas sobre o processo de caminhada. Transcrevo aqui, algumas partes dos relatos dos caminhantes, tendo em vista alguns pontos em comum entre as falas de cada um.

“Porque a cidade só é vista de verdade a pé” (Anônimo sobre a importância das travessias)

“Percebi que a cidade é muito mais diversa do que conseguimos perceber pela janela de um carro ou de um ônibus. O urbano e o rural muitas vezes se misturam. O prosaico e o moderno convivem lado a lado” (Pedro sobre como as caminhadas impactaram a percepção sobre a cidade)

80

“A caminhada permite conhecer novos trajetos, criar novas percepções de lugares.”

(Pedro sobre como é possível aprender sobre a cidade a partir das travessias)”

Quando experimentamos a cidade a partir do deslocamento através de automóveis, metrô, entre outros, a experiência física da velocidade torna o espaço urbano um mero lugar de passagem, desconectando-o do corpo. “A condição física do corpo em deslocamento reforça essa sensação de desconexão com o espaço. Em alta velocidade, é difícil prestar atenção na paisagem” (Sennett, 1994). Mais uma vez, o contato do corpo com a pele da cidade, através do caminhar propicia um novo olhar para a cidade.

“Ela (a cidade) é sempre maior do que se pensa; ela é sempre mais complexa e contraditória do que o resumo grosseiro que tantas vezes fazemos.” (Anônimo sobre como as caminhadas impactaram a percepção sobre a cidade)

“Abre a cidade de outra forma” (Cristiana sobre a importância das travessias)

“É uma oportunidade ótima para ressignificar a cidade e seus espaços, conhecer

81

lugares e entre - lugares, pessoas, negócios locais, etc” (Lívia sobre a importância das travessias)

“É uma forma de ocupar o espaço urbano, de se apropriar da cidade em que vivemos” (Pedro sobre a importância das travessias)

“Caminhar um trajeto muda a perspectiva que vemos a cidade” (Lívia sobre como as caminhadas impactaram a percepção sobre a cidade)

“Propicia novos olhares para a cidade” (Simone sobre a importância das travessias)

“BH e região metropolitana tem lugares fantásticos de se conhecer, que muitas vezes não são muito divulgados ou acessíveis. Parques, praças, bares, restaurantes, casas de show, mirantes e etc. Frequentemente ouvimos que não há nada pra fazer na cidade, ou que não há diversidade de programas, quando o problema real é a infra-estrutura, transporte, divulgação e sensação de insegurança de visitar lugares desconhecidos desacompanhando. Esse tipo de iniciativa amplia horizontes e conecta pessoas de regiões

82

distintas resolvendo um pouco desses problemas principais.” (Paulo sobre a importância das travessias)

“Tudo que amplia o horizonte é um aprendizado. Mas o que vai ser aprendido depende do olhar, atenção e curiosidade de quem caminha. Seja a história de regiões tradicionais que não são o centro financeiro/turístico. Seja a economia local através do preço das cervejas nos bares ou dos cartazes dos sacolões. Seja a vegetação que muda e expande ou diminui de acordo com a concentração urbana. Seja o convívio com as pessoas e o sentimento de existir cidade além dos bairros nobres e centrais.” (Paulo sobre a como é possível aprender sobre as cidades a partir das travessias)

“Propicia conhecer detalhes da cidade que normalmente não se conhece” (Rafael sobre a importância das caminhadas)

“Porque nos possibilita um outro olhar para a cidade” (Rafael sobre como é possível aprender sobre as cidades a partir das travessias)

83

“É ótimo para conhecer a cidade, principalmente porque passamos por bairros que dificilmente eu iria no cotidiano” (Bárbara sobre a importância das caminhadas)

“Todas as experiências e encontros característicos de cada bairro são percebidos durante a caminhada, a própria configuração formal de um bairro central para o periférico.”

(Bárbara sobre a importância das caminhadas)

“Gosto da ideia de um caminhar que, apesar de propositivo, não tem um objetivo único ou central. Que reúne pessoas que vêm de experiências e lugares diversos e que podem estar juntos.” (Isabella sobre a importância das caminhadas)

“Porque desperta outras possibilidades de viver a cidade para além de ir a um equipamento público ou local “histórico”. Um jeito cotidiano e muito político de saber.” (Isabella sobre como é possível aprender sobre as cidades a partir das travessias)

“Caminhar por caminhar, sem nem mesmo requerer “conhecer” os lugares. É uma forma de saber potente, ressignifica o olhar pra vida cotidiana.” (Isabella sobre o Atravessar BH)

84

A ideia da caminhada está sempre atrelada a possibilidade de se conhecer a cidade.

“Principalmente fazer uma cartografia da cidade com o próprio corpo - uma topografia antropométrica? - de forma concreta (não abstrata como um mapa - e que tb não origina um mapa, mas uma coisa da cidade em mim e de mim nela). É um jeito de experienciar esteticamente a cidade e a minha presença nela. Considero uma performance, no sentido estético.” (Débora sobre como é possível aprender sobre as cidades a partir das travessias)

A criação de uma corpografia que busca criar uma outra perspectiva sobre as cidades a partir de uma conduta política, na qual o corpo intervém no espaço urbano por meio do caminhar.

“Desautomatizando meu corpo, ativando possibilidades de percepções e sensações, ressignificando olhares e pensamentos sobre as urbes” (Débora sobre como as caminhadas impactaram as percepções sobre cidade)

85

Para Careri (2013), a mera variação das percepções corporais decorrentes de uma travessia no espaço urbano já se conforma em uma forma de transformação da paisagem que, apesar de não deixar sinais tangíveis, modifica culturalmente o significado do espaço e assim, o espaço em si.

86 Figura 33 - Caminhante em Belo Horizonte | Fonte: acervo pessoal

consideraçþes finais

87

O caminhar é uma atividade tão cotidiana, que não percebemos a sua relevância para a construção de uma cidade. Retomando a vontade inicial do trabalho de entender como o caminhar se conforma em um modo de experimentar a cidade através do corpo e qual a sua relação na construção desse espaço urbano, analiso esses fatos a partir de algumas questões fundamentais que encontrei ao longo dos relatos e entrevistas sobre as caminhadas. Faz-se importante mencionar que as considerações aqui postas, não possuem um ponto final, mas são parte de um percurso que busca entender qual a relação do caminhar com a cidade.

Em primeiro lugar, durante toda a PARTE I – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA e também durante as minhas percepções dentro da PARTE II – ESTUDO DE CASO, a palavra experiência sempre esteve acompanhada a ideia do caminhar o que me fez questionar o que é essa experiência e qual o seu significado. Dessa maneira, encontrei nos pensamentos de Jorge Larrosa Bondía e principalmente no texto Notas sobre a experiência e o saber de experiência um suporte para interpretar o que seria essa experiência. Larrosa pensa a educação a partir do par experiência/sentido. Primeiramente, ele distingue a experiência da informação, alegando serem antagônicas e admitindo que a sociedade em que vivemos – chamada sociedade da informação – considera que

88

o conhecimento se dá a partir da informação, ou seja “como se aprender não fosse outra coisa que não adquirir e processar informação” (p. 22). Diferentemente dessa noção de conhecimento a partir da informação, a experiência é, para Larrosa: “a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.” (LARROSA, P. 24, 2002)

Assim, Larrosa (2002) caracteriza a experiência por “o que nos passa”, “o que nos acontece”, sendo o sujeito da experiência, algo como “um território de passagem, algo como uma superfície sensível que aquilo que acontece afeta de algum modo,

89

produz alguns afetos, inscreve algumas marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos” (Larrosa, p.24).

Essa ideia do que é a experiência se relaciona com os pensamentos de De Certeau (2001) sobre o olhar tático dos praticantes ordinários da cidade. Tal olhar tático são as próprias experiências da cidade, as ações cotidianas daqueles que caminham e vivenciam a cidade na sua superfície e não aqueles que possuem apenas uma visão do topo, visão que apenas acumula informações. Dessa maneira, quando caminhamos não adquirimos apenas uma extensão de informações sobre o espaço, mas sim experiência urbana da cidade, compreendendo sua vida cotidiana, sendo afetados pela cidade, ficando inscritas essas marcas do percurso. Sendo assim, a experiência do caminhar é um processo de compreensão da cidade e possui uma potência de entender e ressignificar a cidade.

Complementar a essa noção de experiência, estudar e ler os relatos dos caminhantes me fez entender como se tratam de uma experiência pessoal e individual no espaço urbano. Larrosa (2002) também define a experiência como um saber particular, subjetivo, pessoal, específico de cada sujeito. O autor também nos propõe que usemos essas experiências individuais como potência no processo de educação e assim,

90

busquei compreender qual é essa potência de transformação e como as experiências do caminhar deixam marcas na cidade.

Para compreender qual a potência dessas experiências particulares, acredito primeiro, ser importante pontuar as semelhanças entre as narrativas dos participantes das caminhadas do Atravessar BH. A possibilidade de conhecer o lugar, apropriar-se do espaço urbano e propiciar novos olhares para a cidade são os pontos mais mencionados pelos caminhantes. Analisar o espaço onde vivemos a partir desses novos olhares nos permite questionar o modo como vivemos. Estar na cidade e nos relacionarmos com esses lugares é fundamental para criar novas possibilidades e questionamentos sobre a cidade.

Careri (2013), em Walkscape: o caminhar como prática estética, divide o ato de caminhar em três partes: a travessia, que é a própria ação de caminhar; a linha, que é a criação do percurso como um objeto; e por último o relato, que são as narrativas desse caminhar. A partir disso, descreve o caminhar como a possibilidade de modificar espaços urbanos que precisam ser preenchidos de significados, antes de serem preenchidos de coisas. Assim, quando caminhamos, criamos narrativas sobre o espaço.

Então, a potência dessas ações e as marcas que deixam no espaço urbano está na

91

possibilidade de visibilidade desses projetos e na circulação das narrativas dos caminhantes. O modo como se cria novas experiências do território é que potencializa uma transformação e tomada de consciência. Ou seja, o caminhar é um estímulo para uma outra percepção do urbano, sendo dotado de grande potencial de reflexões e relações individuais, o qual possui uma capacidade de reverberar, de forma coletiva, em esferas mais amplas dentro do pensamento sobre a cidade.

Em suma, percorrer um espaço e vivenciá-lo mais de perto, a partir do caminhar, nos diz muito mais sobre o lugar e explora outras percepções do urbano, ressignificando o território. Os relatos desses percursos e caminhadas, por mais que tenham um caráter único e pessoal, quando propagados, podem provocar uma releitura de determinado espaço ou até a transformação desses lugares, a partir da possibilidade de gerar uma discussão acerca da apropriação das cidades. Sendo assim, esse seria o poder das narrativas e da vida cotidiana na estrutura urbana a partir do contato do corpo com a cidade. O caminhar se torna um micropoder sensível, a partir da construção de outras experiências sensíveis de cidade, possibilitando que a ação dos corpos funcione como potência política de transformação da cidade.

Este trabalho e todo o processo nele envolvido, tornou-me consciente sobre a

92

minha relação com a cidade e dos caminhos que venho traçando pessoal e profissionalmente. É quase redundante dizê-lo, mas compreender um espaço só é possível a partir de uma vivência sensorial e da experiência do contato do corpo com o meio urbano. Vejo todo o processo do TCC como uma deriva, na qual, um pouco perdida e sem saber aonde chegaria, me propus a experimentar e pensar a cidade de uma outra forma, tornando todo o percurso de grande importância e um precursor de experiências e assim, de aprendizagem. Finalizo o TCC aqui entendendo que a experiência do caminhar pode ser uma ferramenta de produção crítica da cidade e entusiasmada com os desdobramentos e possíveis aberturas do trabalho.

93

94

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 3NÓS3 . In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/grupo434553/ 3nos3>. Acesso em: 14 de Jun. 2019. Verbete da Enciclopédia.

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência.

Rev. Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.19 pp.20-28, 2002.

BRITTO, Fabiana Dultra; JACQUES, Paola Berenstein. Corpocidade: debates, ações e articulações. Salvador: EDUFBA, 2010.

BRITO, Fabiana Dultra. Co-implicações entre corpo e cidade: da sala de aula a plataforma de ações.

CAMPBELL, Brígida. Arte para uma cidade sensível. [S. l.]: Invisíveis produção, 2015. E-book CARERI, Francesco. O caminhar como prática estética / Francesco Careri ; pre-

95

fácio de Paola Berenstein Jacques ; [tradução Frederico Bonaldo]. -- I. ed. -- São Paulo: Editora G.Gili, 2013.

CARLOS, A.F.A. O Poder do corpo no espaço público. GEOUSP (online), São Paulo, V.18, N.3, P.472-486, set/dez 2014 DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Ed. Contraponto, 2002. (Ed. original 1967) DEBORD, Guy. Relatório sobre a construção de situações. Paris, 1957. Disponível em: http://books.stress.fm/ DE CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano. 3. Ed. Petrópolis: Vozes, 2001

GEHL, Jan. Cidade para Pessoas. São Paulo: Perspectiva, 2015.

GEHL, Jan. La humanización del espacio urbano. La vida social entre los edificios.

Barcelona: Editorial Reverté, 2006

96

HISSA, C. E. V.; NOGUEIRA, M. L. M. Cidade-corpo. Rev. UFMG, Belo Horizonte, V.20, N.1, P.54-77, Jan./Jun. 2013 HISTÓRIA #7 - Praia da Estação - Belo Horizonte/MG. Direção: Imagina Coletivo.

Belo Horizonte: [s. n.], 2013. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=5354OiTR07E. Acesso em: 16 set. 2019.

JACQUES, Paola Berenstein. “Corpografias urbanas”. In: Vitruvius. Arquitextos ano 8, 2008. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/165.

JACQUES, Paola Berenstein. Apologia da deriva: escritos situacionistas sobre a cidade. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003.

JACQUES, Paola Berenstein. Elogio aos errantes. Breve histórico das errâncias urbanas. Arquitextos, São Paulo, ano 05, n. 053.04, Vitruvius, out. 2004 <https://www. vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.053/536>.)

97

JACQUES, Paola Berenstein. ERRÂNCIAS URBANAS: a arte de andar pela cidade. ARQTEXTO, Porto Alegre, p. 16-25, 1 jan. 2005. Disponível em: https://www.ufrgs. br/propar/arqtexto/index.htm. Acesso em: 11 jun. 2019 JACQUES, Paola B. Zonas de tensão: em busca de microresistências urbanas.

Salvador, 2015.

JACQUES, Paola Berenstein. Elogio aos errantes. Salvador: EDUFBA, 2012 JACOBS, J. Morte e Vida das Grandes Cidades. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.

JEUDY, Henri Pierre; JACQUES, Paola Berenstein (org.). Corpos e Cenários urbanos: Territórios urbanos e políticas culturais. Salvador: EDUFBA, 2006.

LABUCCI, Adriano. Caminhar, uma revolução. São Paulo: Martins Fontes - selo martind, 2013

98

GANZ, Louise. Lotes Vagos. Belo Horizonte: [s. n.], 2016. Disponível em: https:// lganz.wordpress.com/2016/03/21/lotes-vagos-ocupacoes-experimentais/. Acesso em: 16 set. 2019.

MOEHLECKE, Vilene. CORPOS NA CIDADE: TERRITÓRIOS E EXPERIMENTAÇÕES. ARQTEXTO, Porto Alegre, p. 60-73, 1 jan. 2005. Disponível em: https://www. ufrgs.br/propar/arqtexto/index.htm. Acesso em: 11 jun. 2019.

SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção 4. ed. 2. reimpr. - São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006. - (Coleção Milton Santos; 1) SENNETT, Richard. Carne e Pedra. Rio de Janeiro: Record, 1997. (Ed. original 1994) PONTES, Maria Adelaide do Nascimento. A documentação nas práticas artísticas dos grupos Arte/Ação e 3NÓS3. 2012. Dissertação (Pós-graduação em Artes) - UNESP, São Paulo, 2012. Disponível em: https://repositorio.unesp.br. Acesso em: 14 jun. 2019.

99

TEATRO da Vertigem: trilogia bíblica. São Paulo: Publifolha, 2002. 360 p.