Matérica com Geane Nucia

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as informações oriundas das pesquisas científicas e sua aplicação no acompanhamento de pacientes, visando uma farmacoterapia racional para a melhoria da qualidade de vida. A Atenção Farmacêutica deve ter como princípio a prática do conhecimento obtido de evidências científicas resultantes de trabalhos publicados em revistas especializadas, e não somente da intuição e de informações sem comprovação metodológica sistemática. Os resultados de pesquisas científicas são obtidos por meio da Farmacoepidemiologia, que é definida como “o estudo metodológico da distribuição e dos determinantes dos eventos relacionados ao uso de fármacos em grupos populacionais e sua aplicação na farmacoterapia”, ou simplesmente “o estudo do uso e efeito dos fármacos em um grande número de pessoas “. Os estudos epidemiológicos avaliam as ações farmacocinéticas, farmacodinâmicas, efeitos terapêuticos e reações adversas aos medicamentos avaliando a eficácia e segurança do uso de fármacos na população e um dos seus objetivos é estabelecer a relação entre seus riscos e benefícios. A farmacoepidemiologia tornou-se imprescindível a partir de 1938, após a morte por insuficiência renal, de mais de 100 pessoas nos Estados Unidos, tratados com uma solução de sulfanilamida diluida em etilenoglicol. Na época as indústrias farmacêuticas passaram a ser obrigadas a realizar ensaios clínicos antes de disponibilizar seus produtos no mercado.

Ensaios clínicos Ensaio clínicos são estudos, geralmente epidemiológicos, que fornecem as bases científicas para as decisões terapêuticas que deverão ser tomadas a partir dos resultados e conclusões destes ensaios. Eles se constituem na última fase de avaliação no desenvolvimento de um novo fármaco, em que se estabelece o mesmo possui a efetividade necessária para obter o seu registro. Esta efetividade todavia, é somente confirmada após um uso amplo destes fármacos pela população em geral, ou seja após sua entrada no mercado, período este conhecido como pós-mercadológico. Os ensaios clínicos são precedidos por estudos pré-clínicos, realizados em animais de laboratório. Somente após a demonstração de sua segurança e eficácia os fármacos poderão ser testados no ser humano. Embora os testes pré-clínicos tenham seu valor, os resultados são vistos com restrições devido a variações nos efeitos de fármacos dependendo da espécie animal estudada. Na fase inicial dos ensaios clínicos, chamados de fase I, os medicamentos são testados em voluntários sadios e o principal objetivo é a verificação da toxicidade e farmacocinética destas substâncias. Na fase II participam um número pequeno de pacientes com a morbidade para a qual o medicamento esta sendo testado e visa verificar a eficácia , faixa terapêutica e completar os estudos farmacocinéticos. Na fase III um grande número de pacientes é testado por meio de ensaios randomizados, duplo-cego comparados com um grupo controle e geralmente são multicêntricos e visam confirmar a eficácia e segurança do novo fármaco. Com o passar dos anos, observou-se que os ensaios clínicos possuem limitações, e por isso não são totalmente suficientes para estabelecer a

segurança dos produtos. A necessidade de monitorização do medicamento após sua aprovação, ou seja, a detecção de eventos não previstos ou não observados até a fase III do estudo clínico tornou-se fundamental para confirmar a segurança de um medicamento. Alguns dos fatores limitantes dos ensaios clínicos das fases I, II e III, (pré-mercadológica) é o número restrito de pacientes, o tempo restrito do estudo e a não participação de grupos especiais. Assim, nestas fases, comumente ocorre a detecção de reações comuns, todavia as reações raras, as quais a maioria das vezes são graves, somente são detectadas na fase IV (pós-mercadológica). Além disso, a participação de pacientes nos estudos clínicos requer o cumprimento de fatores de inclusão e exclusão, os quais em sua maioria excluem pacientes com múltiplas patologias, ou que apresentem outras condições de risco. O uso em grupos especiais como crianças, mulheres grávidas e idosos também não ocorre. Deste modo o perfil demográfico dos estudos clínicos fase I, II e III se restringem a um subgrupo específico da população e é somente após a comercialização que se pode estimar a real incidência das reações adversas na população em geral. Em resumo as principais limitações dos ensaios clínicos realizados antes do registro dos medicamentos são: 1- curta-duração: os ensaios clínicos são realizados dentro de um período curto, portanto incapazes de identificar efeitos que ocorrem após longa latência e também aqueles efeitos adversos resultantes do uso crônico do medicamento; 2- pequenas amostras: os ensaios clínicos utilizam em média 5.000 indivíduos, gerando dificuldade em identificar efeitos que ocorrem em uma frequência de, por exemplo, 1/1.000 da população; 3- população limitada: os ensaios clínicos não incluem populações especiais, como crianças, gestantes, lactantes e idosos; 4- outras morbidades: os ensaios clínicos não incluem pacientes com outras morbidades além daquela para a qual o medicamento em estudo se destina. Vários importantes medicamentos foram retirados do mercado nos últimos trinta anos, devido ao aparecimento de efeitos adversos graves não observados durante os estudos clínicos pré-mercadológicos. Exemplos de sérios efeitos adversos observados na fase pós-mercadológica foram a hepatotoxicidade com troglitazona; rabdomiólise em pacientes tratados com certos fármacos hipolipidêmicos; e os efeitos cardíacos da cisaprida. Assim, no exercício da Atenção Farmacêutica com base em evidências científicas na farmacovigilância se constitui em um importante instrumento de atuação do farmacêutico, e este tema será abordado em um próximo fascículo.

Métodos utilizados para estudos farmacoepidemiológicos Vários métodos podem ser utilizados para a geração de informações sobre o uso, benefícios e riscos, de fármacos. Quanto ao tipo do estudo farmacoepidemiológico utilizado pode ser classificado em descritivo ou analítico . O método descritivo, descreve as doenças e/ou a exposição de pessoas a elas e utiliza conceitos como incidência e prevalência. Estudos descritivos não utilizam grupo controle e somente geram hipóteses, sem testá-las. Por exemplo, aumento no consumo de psicotrópicos em estudantes universitários no Brasil se constitui em um estudo descritivo.

PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA

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