Edição 308 do Brasil de Fato MG

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BRASIL

Belo Horizonte, 29 de novembro a 5 de dezembro de 2019

Excludente de ilicitude é inconstitucional e sem paralelo até com a ditadura, diz MPF AUTORITARISMO Em nota técnica, procuradores alertam que a proposta instituiria um regime de impunidade Marcello Casal Jr /Agência Brasil

Orlando Brito / Divulgação

Erick Gimenes

O

Ministério Público Federal (MPF) afirmou, na terça-feira (26), que o projeto de lei apresentado pelo governo Bolsonaro para abrandar punições a agentes de segurança em situações de Garantia da Lei da Ordem (GLO) é inconstitucional e não se compara nem a atos institucionais da ditadura militar. “Há uma autorização implícita, mas efetiva, para que as forças de repressão possam, sob o manto de uma operação de GLO, fazer uso abusivo e arbitrário da violência, com grave risco de adoção de medidas típicas de um regime de exceção, incompatíveis com os padrões democráticos brasileiros e do direito internacional”, alertam os procuradores. O MPF aponta que, caso aprovada, a lei instituiria um regime de impunidade

a militares e policiais. “Trata-se de instituir um permanente espaço de exoneração de responsabilidade das forças estatais de segurança pública. E isso quando o país experimenta as mais aviltantes taxas de letalidade policial, com um aumento de 4% apenas no 1º semestre de 2019, especialmente no estado do Rio de Janeiro, no qual se superará em 2019 o recorde de mortes provocadas por confrontos com a polícia. Justamente após essa letalidade ter aumentado 19,6 % de 2017 para 2018, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública”, reforçou o Ministério Público. O documento ainda chama a atenção para o parágrafo único do artigo 2º do PL, que considera que o militar ou agente pode agir em legítima defesa no caso de “injusta agressão”, termo classificado de forma abrangente no texto como práticas capazes de

gerar morte ou lesão corporal, assim como atos de terrorismo nos termos da Lei nº 13.260/2016. “Esse dispositivo é descabido por presumir a licitude de uma conduta que é, em si, ilícita. Na realidade, esse preceito inverte o sistema jurídico constitucional e criminal, ambos baseados no máximo de contenção das forças de segurança, de modo a evi-

Garantia constitucional de manifestação é fundamental contra privilégios e desigualdades tar o evento morte”, manifestou-se o MPF. Ainda conforme a nota técnica, nos artigos 3º e 4º do PL, há mais evidências do propósito de garantir impunidade específica aos agentes públi-

cos. O primeiro prevê que, mesmo quando houver excesso doloso do agente na legítima defesa, o juiz poderá atenuar a pena. Já o artigo 4º veda a prisão em flagrante de militares e policiais quando se aponte o exercício de legítima defesa. “Eles são amplos e pretendem garantir que militares e policiais, em regra, não serão presos em flagrante quando alegarem que agiram em legítima defesa e, ainda, que suas penas por eventual excesso doloso poderão ser atenuadas pelo juiz”. Por fim, o MPF reforçou aos parlamentares que a Constituição Federal assegura os direitos de reunião, associação, manifestação e protesto, e que “essas são garantias absolutamente fundamentais em países como o Brasil – de um longo passado de privilégios e de desigualdades abissais”.

AI-5 O quinto Ato Institucional (AI-5) dos anos de chumbo resultou no fechamento do Congresso Nacional e das assembleias legislativas dos estados, permitiu a cassação de mais de 170 mantados legislativos, instituiu a censura prévia da imprensa e de produções artísticas e deu ao presidente a possibilidade de intervenção nos estados e municípios. Com o AI-5 também tornaram-se ilegais as reuniões políticas não autorizadas pela polícia e toques de recolher tornaram-se frequentes. O AI-5 permaneceu dez anos em vigor e institucionalizou torturas, assassinatos, perseguições e violações de direitos humanos do regime militar.


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