Ana Clara Bender Tavares - EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA COMO FUNDAMENTO PEDAGÓGICO PARA O ENSINO...

Page 1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Escola de Belas Artes Curso de Graduação em Teatro

Ana Clara Bender Tavares

EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA COMO FUNDAMENTO PEDAGÓGICO PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM DE TEATRO

Belo Horizonte 2018


Carmina Burana uma Cantata Cênica - Sesc Palladium, 2017. Foto: Renata Maia


Ana Clara Bender Tavares

EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA COMO FUNDAMENTO PEDAGÓGICO PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM DE TEATRO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Teatro – Licenciatura – da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais para obtenção de título de Licenciada em Teatro. Orientadora: Profa. Dra. Rita de Cassia Santos Buarque de Gusmão.

Belo Horizonte 2018


AGRADECIMENTOS Durante meu percurso final na universidade, foram essas pessoas que me incentivaram, me acolheram e me apoiaram até o fim. Meus agradecimentos: Aos meus pais, Roseli e Pedro, pelo amor e por darem sentido a tudo isso."Não consigo não existe", obrigada pai por essa frase, hoje mais do que nunca ela faz sentido. Obrigada mãe, por repetir todos os dias que daria certo, mesmo quando eu já não acreditava em nada. À Tia Lica, Vó Antônia, Mary, pelo carinho e ajuda imensurável em toda minha vida. À minha irmã Helena, pela amizade e fidelidade de sempre. Ao Guilherme, que mesmo morando longe nessa reta final, esteve presente com seu amor e atenção, me reerguendo todos os dias. Ao Núcleo de Música Coral da UFMG pelo aprendizado, experiências e pelo nosso espetáculo Carmina Burana uma Cantata Cênica, que foi um presente e um orgulho imenso para mim; aos coralistas, pelo carinho e alegria de sempre; ao Bruno Maracia, por ter sido meu companheiro de trabalho no Núcleo, e pela parceria no processo do Carmina Burana, o qual vamos nos orgulhar para sempre. Ao Ernani Maletta, aqui como coordenador do NMC, por ter me ensinado tanto e por ter acreditado em mim e visto além, quando me deu a oportunidade de ser bolsista do Núcleo. Aos amigos Ítalo Araujo, Angelo Dias e Izabela Borges, companheiros nesta reta final, que estiveram juntos comigo nos bons e maus momentos, lamentando quando necessário, sorrindo sempre, mas seguindo em frente, como tem que ser! Aos amigos do Museu Brasileiro do Futebol - Mineirão, que descontraem meus dias e afrouxam meu riso. À Thais Roberti, minha amiga, responsável também por eu estar onde estou, por ter sido uma das pessoas que me ajudou a estar na Universidade e me abriu as portas da cidade e da sua casa. Jamais conseguirei agradecê-la por tanto! Agradeço aos amigos que fiz em Belo Horizonte e as amizades de Petrópolis que resistiram à distância. Com vocês por perto a vida é mais prazerosa! À minha orientadora e professora Rita Gusmão, por ter aceito esse desafio, pela compreensão e gentileza e pelo compartilhamento de seus conhecimentos. Por fim, agradeço aos membros da banca avaliadora, Ernani Maletta e Jussara Fernandino, por aceitarem fazer parte deste meu processo.

4


RESUMO

Este trabalho apresenta o meu percurso como artista-docente, enquanto preparadora corporal do Núcleo de Música Coral da UFMG (NMC) e aluna de graduação em teatro pela UFMG. Baseando minha pesquisa no livro Arte como Experiência, de John Dewey, abordo como minhas experiências artísticas e pessoais adquiridas ao longo desses anos, me auxiliam em meus processos de ensino e aprendizagem do teatro. PALAVRAS-CHAVE: Teatro. Arte. Experiência. Núcleo de Música Coral UFMG. Ensino e Aprendizagem.

ABSTRACT

The present research is about my experience as an artist teacher whereas body preparer at UFMG Music Choir and gratuated in theatre at the same institution. Based on the book "Arte como Experiência" by John Dewey, I intended to analyse how my artistic and personal experiences earned throughout my journey helped me in my teaching and learning processes. KEY WORDS: Theatre; Experience; UFMG Music Choir; Teaching and Learning.

5


SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO......................................................................................................................7 1.1- GRÊMIO LIXUOSO ESCOLA DE SAMBA ACADÊMICOS DO NÃO ME CALO........8 1.2- NÚCLEO DE MÚSICA CORAL UFMG...........................................................................12 2- CONCEITO DE EXPERIÊNCIA - CARÁTER ESTÉTICO POR JOHN DEWEY.....13 2.1- A EXPERIÊNCIA PESSOAL CONTRÓI HABILIDADE PARA A ALTERIDADE.......15 2.2- O PROCEDIMENTO PEDAGÓGICO COMO ATO EXPRESSIVO................................16 3- PEDAGOGIA DA EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA PARA NÃO ARTISTAS..................17 3.1- NECESSIDADE DE APRIMORAMENTO CÊNICO.......................................................18 3.2- PREPARAÇÃO CORPORAL............................................................................................19 3.2.1- EXERCÍCIOS, JOGOS E AVALIAÇÃO........................................................................20 3.2.2- AVALIAÇÃO..................................................................................................................25 3.3- COMO ESTE TRABALHO ME DEU CONDIÇÕES DE APRIMORAR A MINHA PRÁTICA DOCENTE...............................................................................................................26 4- CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................27 REFERÊNCIAS.......................................................................................................................29

6


Introdução

Esta monografia, apresentada como meu Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação de Licenciatura em Teatro, tem como objetivo a análise da atividade como artista de Teatro e sua influência na prática docente na área. Ao abordar esta questão e buscar defendê-la como metodologia pedagógica, quero refletir sobre a necessidade de a docente em Artes experienciar a formação artística durante sua formação docente, inspirada no que afirma em sua pesquisa Geraldo Loyola: a pesquisa e a construção do conhecimento artístico são fundamentais no processo de ensinar-aprender, pois é o conhecimento que proporciona oportunidades de conceber mais e melhores ideias e, consequentemente, de estimular a auto expressão. (LOYOLA, 2016, p.1)

Para iniciar esta reflexão, apresento um breve relato e uma análise do processo criativo do espetáculo Grêmio Lixuoso Escola de Samba Acadêmicos do Não me Calo, realizado em 2016, que fez parte do processo de obtenção do meu título de Bacharel em Teatro. Desta experiência extraí conhecimentos como atriz que possibilitaram, em seguida, a realização de atividades docentes na Universidade e fora dela. Afirmo isto pensando na organização do processo criativo, que me proporcionou criar uma cartografia que abrange treinamento, dramaturgia, direção, encenação, atuação e produção executiva. Na minha concepção, estas fases são todas cumpridas na atividade docente em Teatro, por um lado porque são de fato necessárias à gestão de um processo de realização de um espetáculo, e por outro porque no Brasil existe uma dificuldade específica a disciplina Artes, pela falta de infraestrutura física das escolas, que não dispõem nem de espaços de apresentação adequados nem de apoio profissional que possa se responsabilizar pela realização da fase final deste processo de ensino e aprendizagem, que é a apresentação para o espectador. Também, é preciso salientar, que acredito ser uma questão de falha didática do plano de curso de vários docentes de artes, como pude observar nos estágios curriculares da graduação, que estes não contemplem a organização de um processo de ensino e aprendizagem a partir de uma criação cênica. Para refletir sobre a minha hipótese, como especificada acima, relato o processo de criação coletiva do espetáculo Grêmio Lixuoso Escola de Samba Acadêmicos do Não me Calo e a 7


atividade de docência no Núcleo de Música Coral da UFMG, ambas experiências que contribuíram para a minha formação, e com isso almejo mostrar o quanto a experiência artística serve de fundamento e suporte para a formação e a prática docentes.

Grêmio Lixuoso Escola de Samba Acadêmicos do Não me Calo Na construção desse espetáculo teatral, assumi efetivamente as funções de atriz e figurinista. Poder pensar no espetáculo como um todo, passando por diversas artes, cênicas e visuais, estendeu a minha visão para o espectro do trabalho docente porque aumentou minhas experiências com a linguagem do teatro e com as relações criativas com o outro. O processo buscou realizar o desejo de que a elaboração do espetáculo fosse baseada em um processo de criação colaborativa, no sentido sugerido por Stela Fischer: Conceitualmente, entende-se por processo colaborativo o procedimento de grupo que integra a ação direta entre ator, diretor, dramaturgo e demais artistas, sob uma perspectiva democrática ao considerar o coletivo como principal agente de criação e aglutinação de seus integrantes. Essa dinâmica propõe um esmaecimento das formas hierárquicas de organização teatral, embora com imprescindível delimitação de áreas de trabalho e delegação de profissionais que as representam. 1 (FISCHER, 2010, p. 64)

No decorrer da criação do espetáculo, pude perceber que o processo se aproximou mais de uma criação coletiva com a figura de um diretor. Para a criação desse espetáculo, foram escolhidos: o método da mimese corpórea, a partir de exercícios feitos em grupo com a provocação do diretor e do dramaturgo; a elaboração coletiva de texto dramático; a pesquisa visual e histórica de elementos vinculados ao universo das escolas de samba do Rio de Janeiro; e relatos pessoais dos atores, como os momentos marcantes da vida de cada um. Esses momentos depois foram selecionados pelo diretor de forma que ficassem somente os que tinham relação com opressão, angustia e que causavam desconforto em quem os vivenciou. Os atores foram instigados a criar cada um uma cena, que representasse um desses momentos escolhidos.

1

FISCHER, Stela. Processo Colaborativo e experiências de companhias teatrais brasileiras. SP: Hucitec, 2010. TEATRO, 64; PEDAGOGIA DO TEATRO, 6.

8


Algumas cenas do espetáculo foram construídas a partir de temas de sambas-enredo do período da ditadura militar, que foram trazidos por diferentes pessoas do coletivo, e alguns versos desses sambas entraram para a dramaturgia do espetáculo. Também foi utilizado o texto "Santo Inquérito"2, de onde foram retirados diálogos que compuseram a dramaturgia final. A composição do cenário foi pensada para fazer uma direta relação com o enredo carnavalesco escolhido, cujo universo faz referência as mazelas do país, e carrega elementos de representação burlesca e de composição vistosa e grandiosa. Alguns materiais foram ressignificados para comporem a cenografia, tais como uma caçamba de lixo, utilizada como carro alegórico. A escolha do espaço fazia uma referência ao Sambódromo3, local onde acontecem os desfiles das Escolas de Samba do Rio de Janeiro. De acordo com Ingrid Koudela e José Júnior: A cenografia é um elemento sólido do espetáculo e da concretização da cena. E que qualquer elemento, seja ele uma cadeira simples ou uma casa de madeira, muda de dimensão quando no espaço cênico, ganhando um significado diferente do que carrega no dia a dia. (KOUDELA e JÚNIOR, 2015, p. 30)

A preparação dos personagens e elaboração do corpo cênico se baseou no relato pessoal anteriormente coletado. Após um exercício prático de ensaio, o diretor do espetáculo pediu que nós atores escrevessemos palavras que remetessem ao que havíamos feito no exercício. A partir delas, cada ator levantou vinte momentos marcantes de suas vidas pessoais. Com esses momentos foram criadas cenas que continham dança, canto, ação física, texto dramático e figurinos, e a partir delas também surgiram cenas que compuseram a estrutura dramatúrgica. As mimeses animalescas, realizadas a partir de um exercício proposto por dois dos componentes do grupo, ajudaram a dar forma, postura e personalidade aos personagens.

2

GOMES, Dias. O Santo Inquérito. Prefácio de Yan Michalski. Rio de Janeiro: Ediouro, 1995.

3

A Passarela Professor Darcy Ribeiro, popularmente conhecida como Sambódromo, é um projeto de autoria do arquiteto Oscar Niemeyer e foi implantada durante o primeiro governo fluminense de Leonel Brizola (1983-1987).

9


O figurino foi desenvolvido para os personagens durante o processo de criação destes, e se inspirou nas personalidades do carnaval. As Baianas, por exemplo, possuíam saias de bambolê e barbante e na cabeça, latas de refrigerante, trazendo novamente os elementos reciclados para a composição. De acordo com Marcos Sabino: figurino é o termo usado para designar “a indumentária utilizada por qualquer personagem em teatro, cinema, show ou televisão”. Pode também ser aplicada para denominar o conjunto das roupas e acessórios especialmente criado ou composto para qualquer um desses eventos (SABINO, 2007, p. 265).

Por se tratar de escolas de sambas, um enredo4 e samba enredo5 específicos foram escolhidos como mote dramatúrgico para o espetáculo: Ratos e Urubus Larguem a Minha Fantasia. Leba - larô - ô ô ô ô Ébo - lebará - laiá - laiá - ô

Reluziu... É ouro ou lata Formou a grande confusão Qual areia na farofa É o luxo e a pobreza No meu mundo de ilusão Xepá, de lá pra cá xepei Sou na vida um mendigo Da folia eu sou rei

Sai do lixo a nobreza Euforia que consome Se ficar o rato pega Se cair urubu come

Vibra meu povo Embala o corpo

4 5

Enredo é composto a partir da ideia ou tema que a escola está apresentando na avenida. Samba enredo é a música e letra composta pela escola, de acordo com o enredo apresentado.

10


A loucura é geral (é geral) Larguem minha fantasia, que agonia Deixem-me mostrar meu Carnaval

Firme... Belo perfil Alegria e manifestação Eis a Beija-flor tão linda Derramando na avenida Frutos de uma imaginação

Leba - larô - ô ô ô ô Ébo - lebará - laiá - laiá – ô

6

O espetáculo foi apresentado em Julho de 2016 e tivemos retornos positivos em relação ao resultado final, tanto por parte da banca avaliadora do TCC quanto de pessoas que o assistiram. O diretor soube como reunir as partes da criação de forma harmoniosa e orgânica aos olhos do público. Eu enquanto atriz do espetáculo e assumindo outras tantas responsabilidades burocráticas para o espetáculo, e mais o artigo obrigatório para o Bacharelado, e devido a problemas pessoais e falta de disponibilidade do grupo para ensaios, não tive disposição e nem tempo para estar a todo momento ensaiando e me aperfeiçoando tanto quanto eu queria e que me era esperado. Diante das minhas dificuldades, contudo, alcancei meus objetivos e cheguei até além de onde eu acreditava inicialmente que poderia chegar. Essa experiência durante muito tempo foi lembrada com uma carga negativa, refletindo sobre os problemas os quais enfrentamos durante o processo, hoje percebo ter alcançado, com esforço e dedicação, o que me era cobrado e repenso o espetáculo e as coisas que mudaria nele: como atriz, percebo que um monólogo seria melhor indicado no momento, devido ao estresse que o TCC nos proporciona e que a falta de disponibilidade do elenco para ensaios me causou. Então hoje sou capaz de avaliar minhas possibilidades reais para alcançar mais do que um espetáculo grandioso, um espetáculo de qualidade.

6

Disponível em < https://www.letras.mus.br/beija-flor-rj/709628/> Acesso em: 16/06/2016

11


Núcleo de Música Coral UFMG O desdobramento desta experiência foi a minha participação na criação do espetáculo Carmina Burana, uma cantata cênica, produzido e realizado pelo Núcleo de Música Coral da UFMG e seus coralistas, sob direção geral de Ernani Maletta, apresentado em 18/12/2016, no Grande Teatro do SESC Palladium, como final de um trabalho coletivo dos bolsistas e coralistas pertencentes ao Núcleo. Minha colaboração se deu no papel de preparadora corporal para a cena, ao lado de Bruno Maracia, também aluno do Curso de Graduação em Teatro /EBA/UFMG. Quando assumi a função de preparadora corporal cênica no Núcleo, consegui olhar para os coralistas e ver minha experiência como atriz refletida neles. Meu olhar para cada dificuldade apresentada me fez imaginar como eu-atriz, reagiria ou solucionaria aquelas questões. O método de abordagem pedagógica se baseou da minha experiência como atriz, conjugada com a planificação de exercícios e jogos como elementos de treinamento, e a criação de movimentações coreográficas em grupo. Pude perceber que as tarefas de atriz se aproximam das tarefas de docente, na medida em que se possa realizar um processo colaborativo com o grupo de alunos. Quando nos colocamos em horizontalidade com participantes que são por nós orientados, podemos aplicar nossa experiência artística de modo a ampliar os conhecimentos estéticos de cada uma daquelas pessoas, fazer parte criativa do processo e exercitar nossas habilidades artísticas, fundamento necessário, defendo aqui, para se tornar docente coerente da área de Artes. O ensino de arte envolve cognição, fruição, experimentação, ideias, ações, expressões, emoções. É importante que para ensinar arte ao aluno, o professor tenha conhecimento e vivência sobre ela. A arte é uma construção humana e, em sala de aula, o professor deve ser mediador e estar em constante processo colaborativo com os alunos. Assim como os artistas no seu contexto de criação. No Capítulo 1 trato do conceito de experiência, baseado no livro “Arte como Experiência” de John Dewey, contextualizando a arte a partir de experiências de pensamento, estética, intelectual, singular e inestética, e como as minhas experiências enquanto artista, trazidas de momentos vividos no percurso da graduação e no Núcleo de Música Coral, me orientam e auxiliam no meu fazer docente.

12


No capítulo 2 trago um breve resumo da história do Núcleo de Música Coral da UFMG, e relato minha vivência como preparadora corporal do mesmo, desde o ano de 2016. Ressalto minhas práticas com os corais enquanto artista-docente, as técnicas teatrais escolhidas para melhor atendê-los em nossos ensaios e os tipos de jogos teatrais escolhidos para a resolução de problemáticas que surgiam durante o percurso. Foi a partir dessa minha vivência, que pude exercer as práticas didáticas aprendidas durante os anos enquanto estudante de graduação em Teatro pela UFMG. Considero importante salientar que a minha experiência como artista me auxiliou muito na conquista da capacidade de desenvolver um processo de ensino e aprendizagem de teatro, contudo, sem a licenciatura e os estágios em escolas básicas, sem minhas experiências em regência supervisionada, sem o estudo sobre planejamento de aulas e atividades, não seria possível estabelecer uma prática docente consistente o suficiente. Isto tudo para dizer que, a licenciatura é indispensável na formação docente.

Capítulo 1 Conceito de Experiência - Caráter estético da experiência por John Dewey

John Dewey foi um filósofo e pedagogo norte-americano, que inspirou o movimento da Escola Nova, liderado por Anísio Teixeira no Brasil. Ele acreditava na arte como um caminho para formação de conceitos e de memorização de estudos de outras disciplinas na escola. Em seu livro “Arte como Experiência”7, ocupa-se da estética como mecanismo para o pensamento artístico. Ele aborda a filosofia da arte, tratando o conceito de experiência como atos que estão presentes e acontecendo a todo momento, e que podem nos auxiliar no entendimento destes campos de conhecimento e a pensarmos neles como metodologia de ensino e aprendizagem.

7

DEWEY, John. Arte como Experiência. São Paulo: Martins, 2010.

13


Dewey valoriza o fazer artístico diário, este seria mais importante do que o resultado final que essa experiência trará. Cada experiência é única e necessita de um início, um processo e uma conclusão para ser de fato uma experiência. E a arte, por sua natureza sensível, exige a realização prática de ações e processos, para que se torne experiência. No decorrer de seu livro e mais especificamente no capítulo Ter uma Experiência, Dewey fala sobre alguns tipos de experiência, e estas são importantes para contextualizar a experiência artística da docente como fundamento filosófico para a sua prática. São elas: experiência do pensamento, a estética, a intelectual, a singular e a inestética. A experiência singular se refere a uma qualidade de toda a experiência que passa a existir quando esta se conclui: Conclui-se uma obra de modo satisfatório; um problema recebe sua solução; um jogo é praticado até o fim; uma situação, seja de fazer uma refeição, jogar uma partida de xadrez, conduzir uma conversa, escrever um livro ou participar de uma campanha política, conclui-se de tal modo que seu encerramento é uma consumação, e não uma cessação. Essa experiência é um todo e carrega em si seu caráter individualizador e sua autossuficiência. (DEWEY, 2010. p. 110)

Ao criar uma manifestação em arte é importante ter uma experiência singular. O fato de a docente reconhecer esta perspectiva na sua própria percepção, a compromete no sentido de buscar as alternativas necessárias para estimular e realizar o processo criativo completo com seus alunos e alunas. A atividade artística traz consigo uma produção reflexiva que recompõe ideias e visões de mundo, ampliando o repertório para as experiências seguintes, e esta produção tem a especificidade de envolver o corpo e as sensações diretamente na reflexão. Para Dewey: Qualquer atividade prática, desde que seja integrada e se mova por seu próprio impulso para a consumação, tem uma qualidade estética. (DEWEY, 2010, p. 115)

Essa afirmação indica a experiência estética como meio para a experiência do pensamento. Em termos de sua ocorrência, o pensamento como experiência é a acumulação e a consumação de um movimento de “sinais ou símbolos sem qualidade intrínseca própria, mas que representam coisas em outra experiência, e que podem ser qualitativamente vivenciadas” (DEWEY, 2010, p.114). A experiência do pensamento é intelectual por seus elementos, e é estética por seu caráter emocional satisfatório. 14


Na experiência estética, está contida a experiência intelectual, que é sentida pelo sujeito no movimento estruturado que a arte desenvolve em relação a uma proposta. A experiência estética busca retratar o movimento da estrutura e apreender suas singularidades. A experiência intelectual se completa na experiência estética, como afirma Dewey: Nenhuma atividade intelectual é um evento integral (uma experiência), a menos que seja complementada por essa qualidade. Sem ela, o pensamento é inconclusivo. Em suma, a experiência estética não pode ser nitidamente distinguida da intelectual, uma vez que esta última precisa exibir uma chancela estética para ser completa. (DEWEY, 2010, p. 114)

Na experiência inestética isso não ocorre porque o sujeito não utiliza de suas vivências e emoções para viver um franco fazer. Este franco fazer é o elemento crucial para o entendimento da experiência artística como fundamento para a boa prática docente, como aqui almejo demonstrar.

1.1- A experiência pessoal constrói habilidade para a alteridade

Quando estamos ensinando e temos uma experiência consciente do que está sendo transmitido, somos capazes de analisar o outro e reconhecer em seus atos o que outrora já realizamos e vivenciamos. Compreendendo o outro, conseguimos ir além da impressão inicial e auxiliá-lo a enfrentar seus desafios e mostrar caminhos que nos foram validados em algum momento por nossa própria experiência, para que ele possa se encontrar também. Acreditamos que é neste sentido que Dewey defende que o professor não deve expor o conhecimento que ele já tem, mas despertar o interesse do aluno conduzindo o aprendizado por meio das experiências. O aluno deve ter liberdade para raciocinar e desenvolver seus próprios pensamentos e conceitos, experienciando, agindo e estando em atividade estética a todo momento. Para isso é importante que haja oportunidades e proposições de ação, e que os alunos busquem as soluções agregando experiências hauridas no que foi realizado anteriormente. O conhecimento é resultado do que já foi explorado, vivenciado e traz características de experiências realizadas ou vividas por aquela pessoa. Me parece que Dewey confirma isso quando diz:

15


a experiência é um material carregado de suspense e avança para sua consumação por uma série interligada de incidentes variáveis (DEWEY, 2010, p. 121).

A ordenação de etapas que é necessária ao plano de trabalho da docente, se baseado em aspectos de sua experiência prévia, parte de temas que estão “inscritos no seu ser; são os órgãos com que ela percebe” (DEWEY, 2010, p.190), e que oferecem intuições específicas de como fazer o outro, o aluno e a aluna, exercitarem a percepção. Sua visão criativa, amadurecida pela experiência, “modifica esse material, que assume seu lugar (…) numa nova experiência” (DEWEY, 2010, p.190)

1.2- O procedimento pedagógico como ato expressivo

A emoção, os sentidos e as percepções que são adquiridos com as experiências, despertam a vontade de formular e expressar algo pessoal ou novo. A emoção estimula a imaginação e a torna capaz de despertar outras emoções, sendo elas qualidades das experiências que estão em constante modificação. Os professores devem despertar emoções, sensibilidades, interesses nos alunos e devem saber identificar o que este outro precisa. Durante minhas experiências no Núcleo de Música Coral – NMC, como preparadora corporal, foi preciso observar e buscar referências de vivências dos coralistas para utilizá-las de forma a despertar emoções e memórias, aproveitando delas para trazer o que me era necessário ensinar no momento. Como atriz, busquei situações em que isso me foi proposto em aulas e oficinas e combinei com elementos da realidade deles que fui descobrindo no decorrer dos encontros. Me apoiei em princípios que o livro “Jogar, representar: práticas dramáticas e formação”, de Jean-Pierre Ryngaert8, sugere sobre as expressões dramáticas durante os jogos, instigando os jogadores a executarem e identificarem as relações existentes nestes: Na expressão dramática, a introdução não se destina à convocação de referentes sociais, culturais ou políticos que se confrontariam com uma "pedagogia da situação". Os participantes são convidados a viver-

8 RYNGAERT, Jean-Pierre. Jogar, representar. São Paulo: Cosac Naify, 2009. 16


experimentar o que eles sentem na relação com eles próprios e com os outros no interior da oficina, em função de diferentes suporte, temas e indutores. O formador coloca-se no presente, leva em consideração o lugar (espacial e institucional), o momento e as pessoas. (RYNGAERT, 1945, p. 97)

O docente – formador- artista pode evidenciar sua habilidade pedagógica tornando eficiente a consumação de processos de percepção de si mesmo para os participantes de seus grupos de ensino e aprendizagem. Baseado no franco fazer como foco, pode promover percursos de ação exploratória que resultem em conclusões intelectuais de qualidade. Sua autoconfiança será o esteio no qual as experiências dos alunos e alunas poderão se articular. Vejo esta segurança como o ato sobre o qual Dewey afirma que:

O ato só é expressivo quando há nele um uníssono entre algo armazenado das experiências anteriores e as condições atuais. (DEWEY, 2010, p. 164)

Capítulo 2 Pedagogia da experiência artística para não artistas

O Núcleo de Música Coral da UFMG surgiu de um projeto anterior, o Projeto “Corais no Campus”, que iniciou suas atividades no ano de 1991, e em 1998 se vinculou ao Programa de Extensão Núcleo de Música Coral da UFMG, passando a se chamar dessa forma até os dias de hoje. Ele foi coordenado por professores da Escola de Música da UFMG até o final de 2013, depois disso quem assumiu a coordenação do Núcleo foi o professor Ernani Maletta, do Curso de Teatro da Escola de Belas Artes da UFMG. Ernani tem experiência com regência e corais faz mais de 30 anos, além de suas experiências como diretor, ator e cantor. A coordenação segue sob sua responsabilidade. O vínculo da Escola de Belas Artes com a Escola de Música, ampliou a participação das artes no Núcleo, e permitiu a inclusão de preparadores corporais como bolsistas do programa de extensão. Nossa função, é auxiliar os coralistas em sua desenvoltura, entrosamento, presença de palco. Nós preparadores também somos responsáveis pela

17


criação de partituras corporais e movimentos coreográficos que são realizados pelos coralistas em espetáculos e apresentações dos corais. O Núcleo de Música Coral é composto atualmente por: 1 coordenador geral: Ernani Maletta 10 corais: Campus em Canto, Cantáridas, Canto Enquanto Espero, Coro Novo, Coral da Engenharia, Coral da FALE, Fio Cruz, Literarum, Coral da Medicina e Vozes do Campus. Bolsistas:      

3 pianistas 2 preparadores de ação corporal 6 regentes 3 preparadores vocais 1 figurinista 2 coordenadores de produção

O espetáculo Carmina Burana, uma cantata cênica, foi uma experiência de trabalho coletivo do Núcleo, a partir de uma proposta do atual coordenador e nele se reuniram todos os corais existentes na época (Campus em Canto, Cantáridas, Coral da Engenharia, Coral da FALE, Coral da Medicina e Vozes do Campus).

Além deste trabalho em repertório, os corais se apresentam ao final de cada ano numa mostra, para a qual cada coral escolhe o seu repertório. Os ensaios individuais dos corais acontecem semanalmente, dividindo as suas horas de duração em preparação corporal, preparação vocal e ensaio musical.

2.1- Necessidade de aprimoramento cênico

Os corais do Núcleo são formados por participantes oriundos das comunidades interna e externa da UFMG, por esse motivo, os corais possuem um grande número de coralistas que não são artistas e que nunca haviam vivenciado uma experiência artística antes de integrarem o coral. É sempre um desafio a mais para nós preparadores lidarmos com o público não artista, pois eles demonstram timidez, resistência em aceitar sugestões, tem medo do do fracasso e acabam preferindo não fazer várias propostas cênicas para que não haja um constrangimento pelo erro. É preciso antes de mais nada conquistar sua confiança, 18


mostrar que não existe certo ou errado e que cada movimento realizado é fundamental para o desenvolvimento deles enquanto artistas de coral. Um ponto importante é estar sempre atento e buscar compreender cada um deles na hora de exigir algo ou elaborar algum movimento coreográfico, afinal, nenhum coralista é igual ao outro e cada um tem seu tempo, suas diferenças e limites.

Nos primeiros encontros com os coralistas, foi preciso estabelecer uma relação de entrosamento do grupo, e isso foi sendo conquistado dia após dia e com os exercícios de preparação que estimulavam o contato com outro, a desinibição e a interação. O tempo para a preparação e apresentação do espetáculo Carmina Burana, uma cantata cênica foi curto, e isso tornou impossível realizar ensaios só para elaborar a movimentação cênica para o coro, o que ocasionou que durante os ensaios coletivos estas coreografias e movimentações fossem experimentadas e definidas. Como base para a criação dos movimentos e coreografias do coro para espetáculo foi utilizado o filme de Jean Pierre Ponnelle9, indicação do diretor geral do espetáculo, Ernani Maletta. Os movimentos eram muito simples, mas exigiam coordenação, atenção aos momentos certos para a execução, ritmo e entrosamento do grupo. Foi fundamental ouvir os coralistas, saber quais movimentos conseguiam ou não realizar, quais as suas mobilidades, dificuldades e até deficiências que impediam alguns movimentos de serem realizados de forma igual por todos. Alguns movimentos foram modificados e outros adaptados para quem apresentou esta necessidade. Com o processo criativo foi-se conquistando pouco a pouco que os coralistas se sentissem pertencentes ao Núcleo e ao espetáculo.

2.2- Preparação corporal

Eu, Ana Clara Bender e Bruno Maracia somos estudantes de Teatro na Universidade Federal de Minas Gerais e assumimos o papel de preparadores corporais do Núcleo de

9- “Carmina burana”. Musical/Drama. 1975. Alemanha. Direção Jean-Pierre Ponnelle. Produção: Gerhard Reutter.

19


Música Coral da UFMG em 2016. Os corais foram acompanhados por nós em seus ensaios semanais. Antes de começar a preparação propriamente dita, foi preciso um tempo para observar os ensaios, perceber o grupo, as idades de cada integrante, suas disponibilidades, dificuldades pessoais e a forma de trabalho dos regentes. A cada encontro foi importante analisar o grupo e qual era seu estado no dia. Era mais comum iniciar os ensaios pelo aquecimento corporal do que pelo aquecimento vocal, mas unir os dois aquecimentos sempre deu resultados muito proveitosos, embora fosse mais desafiador para os coralistas, pois alguns não conseguiam fazer os movimentos e cantar ao mesmo tempo, apresentavam falta de coordenação entre estas ações, mas muitos conseguiram superar isso com o treino. Quando os aquecimentos eram feitos em conjunto, nós os preparadores fazíamos os exercícios e jogos junto com o grupo e isso foi bem aceito pelos preparadores vocais, pois percebiam que a desenvoltura, ritmo e relação entre os coralistas mostravam um avanço significativo. Digo por mim que, enquanto treinava com os coralistas, pude aprimorar técnicas de canto que aprendi no decorrer da graduação e a preparação corporal foi importante para os preparadores vocais, pois eles quando se apresentam em público necessitam também de uma preparação corporal, uma vez que além de preparadores a maioria atua como cantor/cantora. A linha seguida para o aquecimento corporal mesclava exercícios isométricos, alongamentos, rítmica corporal e jogos teatrais em grupo. A proposta foi (e ainda é, pois está em andamento) que a preparação corporal despertasse seus corpos, deixando-os dispostos e alertas no palco e durante os ensaios.

2.2.1- Exercícios, jogos e avaliação

Aqui farei uma breve elucidação sobre o seguimento escolhido para o aquecimento corporal, e começo explicando o alongamento, que é importante e primordial para iniciar e finalizar atividades de exercícios físicos, pois melhora a flexibilidade, previne lesões, estimula a consciência corporal e ajuda na realização de movimentos. O ator deve realizar aquecimentos antes de cada ensaio, melhorando sua performance de movimento cênico.

20


De acordo com Lilian Nunes e Rivien Martins, "as técnicas de alongamento muscular propõem manter ou melhorar a extensibilidade músculo-fascial e são indicadas para preparar e completar a tomada de consciência corporal e o fortalecimento muscular" (apud. TRIBASTONE, 2001). Com relação aos exercícios isométricos, segundo Wilmore e Cotilli (apud PILONETTO e BOZZA, 2010, p.4)10, “em meados da década de 1950 cientistas alemães realizaram novas pesquisas sobre o treinamento isométrico, os resultados indicaram que o treinamento de força estático causa enormes ganhos de força muscular, que são superiores aos dos métodos de ação dinâmicos”. Por exercício isométrico podemos entender aquele voltado para o desenvolvimento muscular e aquisição de força e resistência, tanto para manutenção de postura quanto para a portagem de objetos cênicos ou instrumentos musicais. O trabalho com a rítmica corporal nos traz consciência sobre nosso corpo, estimulando os reflexos. Entendemos rítmica corporal como o conjunto de exercícios que visa a aproximação entre o movimento concebido pelo cérebro e a realização deste pelo corpo. E para Emile Dalcroze (apud RIBEIRO, 2018, p. 2)11, "o movimento é o fator essencial para o desenvolvimento rítmico do ser humano”. Ao praticar o ritmo através do movimento toma-se consciência do valor plástico do mesmo. A rítmica tem por objetivo “desenvolver e regular as faculdades motrizes do indivíduo, criar novos reflexos, harmonizar, associar os movimentos corporais em co-relação com os movimentos do pensamento e estabelecer uma comunicação íntima entre as ações e os desejos; entre as sensações e os sentimentos; entre a imaginação e a sensibilidade”12. Os jogos teatrais em grupo, ou dinâmicas em grupos, foram escolhidos por mim como método de aquecimento, tendo em vista que “Viola Spolin justifica e reafirma o caráter social que os jogos podem ter, passando a ser não apenas um método para atores, mas um facilitador para a integração social e para o desenvolvimento do trabalho em grupo”. (ANDRADE, 2014, s /p)

10 PILONETTO, Gisele e BOZZA, Luiz Orestes. Comparação do aumento de força muscular por isometria, associada ou não à estimulação russa. Faculdade Assis Gurgacz, Paraná, 2010. 11 RIBEIRO, Mônica Medeiros. Rítmica corporal no Grupo Oficcina Multimédia Uma revisão de conceitos e práticas. Pesquisa em Dança do Brasil. UFMG, Belo Horizonte, 2018. 12 RIBEIRO, Mônica Medeiros. Rítmica corporal no Grupo Oficcina Multimédia Uma revisão de conceitos e práticas. Pesquisa em Dança do Brasil. UFMG, Belo Horizonte, 2018.

21


A cada ensaio novas estratégias de trabalho foram utilizadas, se adequando ao estilo e necessidade de cada coral. No decorrer das atividades, foram descobertas dificuldades e houve avanços individuais e coletivos. Com a prática, os coralistas se entrosaram melhor e passaram a receber bem os jogos, deixando de lado a vergonha e o medo do fracasso. Os exercícios teatrais podem expor a timidez, o medo de falhar e acarretar uma resistência a participar das atividades propostas, mas pude perceber que são esses mesmos jogos que ajudam a solucionar esses problemas. Os elementos teatrais que foram experimentados e desenvolvidos na preparação corporal são: Presença: A presença no teatro tem relação com prontidão e alerta, sendo fundamental para o todo da cena e o contato com o outro, pois “segundo a opinião corrente entre a gente de teatro, a presença seria o bem supremo a ser possuído pelo ator e sentido pelo espectador. A presença estaria ligada a uma comunicação corporal 'direta' com o ator que está sendo objeto de percepção” (PAVIS, 2008; p. 305)13. Flexibilidade: Para realização de aquecimentos corporais, preparação para cenas, ensaios e presença de palco, a flexibilidade é uma grande aliada. Um ator que possui flexibilidade é melhor preparado para o jogo e para a cena, e pode fazer um melhor aproveitamento do espaço do que os que não possuem essa técnica. Prontidão: A prontidão é indicada para quem anseia melhor concentração, agilidade, conexão com o outro e raciocínio rápido. Um ator quando está de prontidão no jogo ou no palco, tem mais ritmo para a cena e conexão com o que está acontecendo ao seu redor, podendo auxiliar os companheiros e conseguindo melhores resultados. Elisa Batisti relata a importância da prontidão em seu processo como atriz: O meu processo de despertar o corpo no início do trabalho tem o objetivo de disponibilizá-lo para o processo criativo e para cena. Para disponibilizar passo pela identificação das obstruções de movimento e energia e, pela respiração, rotação, flexão, asanas, corrida e caminhada. Busco desbloquear o corpo, abrindo espaços e habitando-o para sentir-me apta a realizar os movimentos, ações e projeções vocais que forem

13 PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999.

22


necessários. É a partir dessa prontidão corporal que posso perceber minhas próprias sensações e minha relação com as pessoas em volta e com o espaço. (BATISTI, 2017; p. 16)14

Contato com o outro: Uma das tarefas mais complicadas durante o meu processo de preparação corporal do NMC foi estimular o contato com o outro. Pessoas tímidas rejeitam e sentem vergonha quando precisam ficar frente a frente com o companheiro durante o aquecimento, contudo, esses exercícios que estimulam o contato, desenvolvem entrosamento e confiança, que são essenciais para os aquecimentos nos ensaios, para o fazer teatral e para o relacionamento criativo entre esses indivíduos. Toque: Assim como o contato com o outro, o toque não tem uma boa aceitação pela maioria, para isso é preciso buscar alternativas. Atividades cotidianas como fazer massagem em roda, de forma que as pessoas que estão participando sintam-se mais a vontade, foram ser bem aceitas e muitas vezes o grupo nem se deu conta de que estavam fazendo um exercício de preparação corporal. O toque também pode ser exercitado de forma individual para ativar a circulação, estimular o relaxamento dos músculos e o reconhecimento do próprio corpo, que é primordial para o trabalho do ator. Os jogos escolhidos para a preparação estão entre as brincadeiras populares tradicionais e os jogos teatrais de Viola Spolin e Augusto Boal. Cada jogo tem uma função e são utilizados para proporcionarem expansão e conscientização do movimento corporal e do gesto no grupo. Segue uma compilação de jogos, a título de configuração da linha metodológica de trabalho que temos seguido: Presença: Apenas um, apenas dois (Viola Spolin): Em pé, os jogadores ficam imóveis, apenas um deve caminhar entre os demais. Quando ele parar, outro imediatamente deve começar a caminhar, mas apenas um deve estar em movimento. Em seguida um novo jogador deve caminhar, ficando dois jogadores em movimento. Vai aumentando de um em um. Quando saírem mais ou menos jogadores que a quantidade estabelecida na rodada, o jogo reinicia do um. É preciso estar atento ao coletivo.

14 BATISTI, Elisa. O contato e o teatro como acontecimento de convívio: uma investigação sobre o processo criativo da atriz. UFSM, Rio Grande do Sul, 2017.

23


Flexibilidade: Hipnotismo Colombiano (Augusto Boal): Os jogadores foram duplas. Um põe a mão a poucos centímetros do rosto do outro jogador e este fica como se estivesse hipnotizado, olhando fixamente para a mão do parceiro. Deve-se manter o rosto sempre à mesma distância da mão do hipnotizador. O hipnotizador inicia uma série de movimentos lentos com a mão, fazendo com que o companheiro faça com o corpo todas as contorções possíveis, explorando espaços, alturas e movimentos do corpo. Prontidão: Presi-Presi: ( brincadeira tradicional) Com todos os jogadores em roda, definese quem será o presidente (presi), o vice-presidente (vice), o tesoureiro (teso), o secretário (secre), e os demais jogadores são números na ordem crescente (1, 2, 3...). Faz-se um ritmo em um compasso 4/4, os dois primeiros pulsos são batidos na coxa, o terceiro é uma palma e o último um estalo de dedos. Nesse ritmo cada um deve falar: Nas batidas da coxa: ou sua função ou número duas vezes (ex. Presi, Presi) Na palma: o verbo “chama”. No estalo de dedo: a função ou número de um dos companheiros (presi, vice, secre, teso) ou um número respectivo. Dessa forma fica assim: Presi, Presi “chama” Secre. E o Secre deve responder: Secre, Secre “chama” Dois. O Dois responde e assim sucessivamente. Quem não responde ao chamado, ou responde fora do pulso, vai para o último número, e todos os nomes e/ou números à esquerda de quem saiu sobem uma posição, os da direita mantém-se inalterados, o objetivo do jogo é chegar na posição de Presi. Esse jogo tem por finalidade treinar o raciocínio rápido, a atenção, a escuta, o pulso coletivo e também possíveis estratégias em grupo. Este jogo treina a atenção, ritmo, raciocínio e escuta.

15

Contato com o outro: Nome na roda: (brincadeira tradicional) O jogo inicia com um jogador com uma bolinha. Ele deve jogar a bolinha para um outro jogador e dizer o nome dele (jogador receptor) ao mesmo tempo em que joga. Podem ser acrescentadas bolinhas durante o jogo, afim de propor novos desafios. Toque: Aquecimento com massagem: Os coralistas formam uma roda, um atrás do outro e iniciam uma sequência de massagens, estimulando no outro os músculos das costas, dos ombros, da lombar, da nuca e da cabeça, criando um momento de relaxamento, conhecimento do corpo e entrosamento entre o grupo. De forma individual e pessoal,

15 MUNIZ, Mariana Lima. Improvisação como espetáculo: Processo de criação e metodologias de treinamento do ator-improvisador. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2015

24


realizam massagens faciais, o movimento de abrir e fechar as mãos e também os dedos dos pés. Uns jogos foram mais rapidamente absorvidos pelo grupo e trouxeram retorno rápido para as necessidades, possivelmente porque estão nas bagagens pessoais dos participantes dos corais. Alguns coralistas apresentavam muita dificuldade de concentração e escuta, então buscava observá-los e propunha exercícios de rítmica durante todo o aquecimento, estimulando-os a exercitar-se e aprimorar-se no que era necessário para a performance cênica. O treinamento precisa de foco e entrosamento. Em alguns corais ele funciona bem, pois os coralistas sentem que precisam de muita atenção e concentração para seu desempenho vocal e musical, mas existem outros grupos que não se entrosam, não trocam olhares, não observam o espaço, e isso além de atrapalhar a pessoa que o faz, atrapalha o grupo todo. Por isso me vi a necessidade de continuamente propor exercícios em grupo que tinham como foco o desenvolvimento da atenção total dos coralistas, o que exigia deles silêncio, escuta e foco. Os coralistas se sentiam dispostos a jogar, mantinham a concentração, se divertiram e se entrosaram, de maneira diferente a cada nova proposta de treinamento, o que revela um grande desafio docente. Foi possível ver a diferença do envolvimento e interesse de cada coral após a apresentação do espetáculo Carmina Burana. Posso dizer que o envolvimento e disponibilidade do coral eram dispersos e titubeantes antes do espetáculo e passara a ser intensos após a apresentação. Temos feito avaliações na medida de cada dia de trabalho, para fazer visível a contribuição que a preparação corporal tem feito a estas novas atitudes, seja do ponto de vista criativo, seja do ponto de vista da qualidade da performance cênica.

2.2.2 -Avaliação

A cada ensaio era possível avaliar o grupo e os indivíduos que faziam parte dele. A cada jogo era possível entender as necessidades dos integrantes e no jogo seguinte já fazer modificações para superá-las aos poucos. Cada novo encontro eram revelados novos desafios a vencer e desafios já vencidos, individuais e coletivos. A avaliação era feita a todo momento, a cada jogo, oralmente e na própria experimentação corporal do exercício. 25


A cada dificuldade revelada e vencida, a cada disponibilidade conquistada para executar uma ação que não é simples ou de costume e que exige um pouco de persistência ou força de vontade, a autoavaliação estimulava o coralista. Foi possível faze-los ver que não existe certo ou errado, o que de fato vale é o desejo, a conquista, o trabalho coletivo e a persistência.

2.3- Como este trabalho me deu condições de aprimorar a minha prática docente

Como Bacharel em Teatro, formada pela Universidade Federal de Minas Gerais em 2016, minhas experiências adquiridas em montagens teatrais, assim como no meu espetáculo de TCC, me tem oferecido bagagem e conhecimento na área artística. No NMC tive a mais extensa possibilidade de contato com o fazer docente em Arte. Os dois anos em que estive à frente do Núcleo como preparadora corporal, em parceria com o Bruno Maracia, me possibilitaram experimentar as práticas pedagógicas conhecidas durante a graduação. Foi um processo de aprendizado, experimentação e troca. A cada ensaio busquei em minhas referências anteriores, exercícios, dinâmicas e jogos, que me foram úteis e que podiam vir a ser para o grupo também. Com isso, foi fácil convencer os coralistas de que eles podem alcançar um desempenho de boa qualidade na cena. E que a experiência que me trouxe esta percepção faz sentido, porque eu a vivi em meu próprio corpo e na minha própria necessidade como artista cênica. Como professora me vejo como uma mediadora, entender e viver a arte, projetando no outro suas experiências, corroborando o que diz Geraldo Loyola: É fundamental que o Professor seja uma pessoa envolvida com arte, que seja capaz de provocar estímulos e não apenas cumprir tarefas e distribuir atividades para os alunos. Quanto maior o envolvimento estético do Professor com a arte, maiores serão as oportunidades de pensar e propor experiências que estimulem nos alunos suas habilidades de criação e de senso crítico. (LOYOLA, 2016, p.14)

E em John Dewey encontrei a metáfora que me fez valorizar a experiência artística como geradora de experiência estética e intelectual:

26


A pedra parte de algum lugar, e se move, com a consistência permitida pelas circunstâncias, para um lugar e um estado em que ficará em repouso – em direção a um fim. Acrescentemos a esses dados externos, à guisa da imaginação, a ideia de que a pedra anseia pelo resultado final; de que se interessa pelas coisas que encontra no caminho; [...] e de que a chegada final ao repouso se relaciona com tudo o que veio antes, como a culminação de um movimento contínuo. Nesse caso, a pedra teria uma experiência, e uma experiência com qualidade estética (2010, p. 115-116).

A força e a importância da experiência para a idealização de processos de ensinoaprendizagem, me tem proporcionado um estímulo para a carreira docente que eu ainda não tinha sentido. Quando o conhecimento e as vivências anteriores, tornam possível observar o contexto da prática docente e contribuem para a percepção do arco de ações, questões e problemas ou dúvidas pelas quais já passamos, o trabalho de solucioná-los se torna fluido, alimentado pelos aprendizados de outrora.

Considerações Finais

Durante a escrita deste trabalho, abordei a minha vivência como atriz e figurinista na criação coletiva do meu espetáculo de TCC de Bacharelado em Teatro, Grêmio Lixuoso Acadêmicos do Não me Calo, realizado no ano de 2016, e minha experiência como bolsista da PROEX, na função de preparadora corporal do Núcleo de Música Coral da UFMG durante 2 anos. Com isso, quis traduzir a minha função como atriz-docente, exercida durante esses anos e retratar como as minhas experiências anteriores me conduziram a este lugar. A opção metodológica para conduzir minha regência no NMC foi os jogos teatrais, rítmica corporal e exercícios isométricos, pois foram eles que me abriram o caminho de entrosamento com o grupo e, também, me ajudaram a resolver questões e dificuldades pessoais, minhas e dos participantes. Isso porque, durante o meu processo de graduação essas foram as formas como aprendi a resolver situações em criações artísticas. A abordagem do conceito de experiência, feita através do livro Arte como experiência de John Dewey, foi essencial para a construção deste trabalho, porque me deu suporte para organizar minhas vivências e relatos de situações experimentadas no decorrer da 27


Licenciatura, no espetáculo de TCC e no Núcleo. Cada experiência analisada constitui hoje a docente em que me tornei, que observa, dialoga e que vê nos seus alunos e alunas um reflexo dos seus aprendizados de outrora. Acredito que só o fazer e refazer, o franco fazer de Dewey, proporciona a excelência em nossas tarefas. Quando se trata de ensinar, cada novo encontro é uma experiência, pois lidamos com pessoas e isso se reflete diretamente no processo de ensino e aprendizado. O franco fazer permite compreender o ambiente, o grupo e o momento com os quais estou lidando, e são eles quem realmente guiam meu fazer docente.

28


REFERÊNCIAS ANDRADE, Juliana. A Função Social do Jogo Através da Abordagem Desenvolvida por Viola Spolin. Ribeirão Preto, São Paulo, 2014. Disponível em: <https://profes.com.br/JulianaAndrade/blog/viola-spolin-e-os-jogosteatrais> Acesso em: 24/11/2018 BARONETTI, Bruno Sanches. Samba-Exaltação, Samba-Tema e Samba-Enredo: os caminhos da música de carnaval na cidade de São Paulo durante o século XX. USP, São Paulo, 2014. Disponível em: <https://www.anppom.com.br/congressos/index.php/24anppom/SaoPaulo2014/paper/view File/2737/704> Acesso em: 30/10/2018 BATISTI, Elisa. O contato e o teatro como acontecimento de convívio: uma investigação sobre o processo criativo da atriz. UFSM, Rio Grande do Sul, 2017. Disponível em: <https://repositorio.ufsm.br/bitstream/handle/1/12298/BATISTI_ELISA.pdf?sequence=1&i sAllowed=y> Acesso em: 23/11/2018 BETINHO, GLIVALDO, ZÉ MARIA E OSMAR. Ratos e Urubus, larguem minha fantasia. Disponível em: <https://www.letras.mus.br/beija-flor-rj/709628/> Acesso em: 28/10/2018 DEWEY, John. Arte como Experiência. São Paulo: Martins, 2010. FISCHER, Stela. Processo Colaborativo e experiências de companhias teatrais brasileiras. SP: Hucitec, 2010. TEATRO, 64; PEDAGOGIA DO TEATRO, 6. GOMES, Dias. O Santo Inquérito. Prefácio de Yan Michalski. Rio de Janeiro: Ediouro, 1995. JÚNIOR, José Simões de Almeida e KOUDELA, Ingrid Dormien. Léxico de pedagogia do teatro. São Paulo: Perspectiva: SP Escola de Teatro, 2015. LAROSSA, Jorge. Nota sobre a Experiência e o Saber da Experiência. Textos - subsídios ao Trabalho Pedagógico das Unidades da Rede Municipal de Educação de Campinas/FUMEC. Leituras – SME, 2001. LOYOLA, Geraldo. Professor-artista-professor: reflexões estéticas sobre o ensinoaprendizagem em arte. Tese (Arte e educação) Escola de Belas Artes. Universidade Federal de Minas Gerais, 2016. MUNIZ, Mariana Lima. Improvisação como espetáculo: Processo de criação e metodologias de treinamento do ator-improvisador. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2015. NICOLETE, Adélia Maria. Criação coletiva e processo colaborativo : algumas semelhanças e diferenças no trabalho dramatúrgico. In: Sala Preta (USP), São Paulo, v. 2, n.2, p. 320, 2002. Disponível em: - Acesso 28/10/2018. NUNES, Lilian Evangelista e MARTINS, Rivien Aparecida de Souza. A eficácia da associação das técnicas de alongamento, facilitação neuro muscular proprioceptiva e

29


controle postural em adolescente como hemiparesia - estudo de caso. Revista Eletrônica, Goiás, ano 1, nº1, 2010. PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo: Perspectiva, 2008. PILONETTO, Gisele e BOZZA, Luiz Orestes. Comparação do aumento de força muscular por isometria, associada ou não à estimulação russa. Faculdade Assis Gurgacz, Paraná, 2010. Disponível em: <http://www.fiepbulletin.net/index.php/fiepbulletin/article/viewFile/1477/2867> RIBEIRO, Mônica Medeiros. Rítmica corporal no Grupo Oficcina Multimédia Uma revisão de conceitos e práticas. Pesquisa em Dança do Brasil. UFMG, Belo Horizonte, 2018. Disponível em: <http://portalabrace.org/ivreuniao/GTs/pesquisadanca/Ritmica%20corporal%20no%20Gru po%20Oficcina%20Multimedia%20-%20Monica%20Ribeiro.pdf> Acesso em: 24/11/2018 RYNGAERT, Jean-Pierre. Jogar, representar. São Paulo: Cosac Naify, 2009. SABINO, Marco. Dicionário da Moda. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. SPOLIN, Viola. Jogos Teatrais: o fichário de Viola Spolin; Tradução de Ingrid Dormien Koudela. 2 ed. São Paulo, São Paulo: Perspectiva, 2012. WILMORE, H.J; COSTILL,L.D. Fisiologia do esporte e do exercício. São Paulo: Manole, 2001.

30


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook

Articles inside

REFERÊNCIAS

2min
pages 29-30

4- CONSIDERAÇÕES FINAIS

2min
pages 27-28

PRÁTICA DOCENTE

1min
page 26

3.2.1- EXERCÍCIOS, JOGOS E AVALIAÇÃO

9min
pages 20-24

3.2.2- AVALIAÇÃO

1min
page 25

3.2- PREPARAÇÃO CORPORAL

1min
page 19

3.1- NECESSIDADE DE APRIMORAMENTO CÊNICO

1min
page 18

2.2- O PROCEDIMENTO PEDAGÓGICO COMO ATO EXPRESSIVO

1min
page 16

1.1- GRÊMIO LIXUOSO ESCOLA DE SAMBA ACADÊMICOS DO NÃO ME CALO

6min
pages 8-11

3- COMO ESTE TRABALHO ME DEU CONDIÇÕES DE APRIMORAR A MINHA

3min
pages 3-6

1.2- NÚCLEO DE MÚSICA CORAL UFMG

1min
page 12

1- INTRODUÇÃO

1min
page 7

2.1- A EXPERIÊNCIA PESSOAL CONTRÓI HABILIDADE PARA A ALTERIDADE

1min
page 15

3- PEDAGOGIA DA EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA PARA NÃO ARTISTAS

1min
page 17

2- CONCEITO DE EXPERIÊNCIA - CARÁTER ESTÉTICO POR JOHN DEWEY

3min
pages 13-14
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.