Estudos Tempo-Espaço

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ESTUDOS TEMPO-ESPAÇO www.bethbarone.com.br “Como se sabe a origem da fotografia foi sua relação com o tempo e muito se conta sobre a luta que se travou na obtenção de velocidades mais altas de captura a fim de que a imagem retratada tivesse semelhança com a realidade vista. Segundo Ronaldo Entler, “o borrão demorou muito tempo para ser assimilado à linguagem fotográfica. Se excluirmos o vasto universo das fotografias malsucedidas que desde os primórdios tiveram a lata do lixo como destino, veremos que foi preciso esperar até o início do século XX para que esse tipo de inscrição do tempo aparecesse sistematicamente nos trabalhos de um fotógrafo” (ENTLER). E não é outro o material da música e do universo dos sons, senão o tempo. Assim, será ele que estabelecerá a composição nesses trabalhos produzidos na estação de metrô Baquedano (Santiago do Chile), na estação de metrô Näckrosen (Estocolmo), no pier em Visby (Gotland), etc. O registro fotográfico foi feito com uma câmera digital numa exposição de 60 segundos simultaneamente à captação sonora, de mesma duração. O tempo comprimido pela imagem fotográfica num único frame possibilita a “inscrição do movimento na imagem sob a forma de um borrão, conforme o objeto se desloque no espaço selecionado (…) uma inscrição do tempo no espaço, na superfície da fotografia” (ENTLER). Ou seja, “um ponto dessa realidade se arrasta formando uma linha; uma linha, por sua vez, resulta num plano. No limite, podemos chegar à total desaparição: numa exposição mais longa, a luz refletida por um objeto pode se diluir de tal forma sobre o quadro que ele sequer poderá ser percebido” (ENTLER). Enquanto isso, na gravação, temos “uma inscrição do tempo no tempo, aquilo que permite um efeito de analogia temporal” (ENTLER) onde 60 segundos do que ocorre no local, fixados na imagem, só podem ser percebidos no seu transcorrer, por sua dimensão sonora.” Beth Barone. Referência: ENTLER, Ronaldo. A fotografia e as representações do tempo. “Esse trabalho nos faz pensar na relação entre imagem visual e imagem sonora. Aquilo que vemos e aquilo que ouvimos parecem ser a mesma coisa quando estão associados num processo normal da percepção (sinestesicamente). No entanto, este trabalho distancia a reprodução da imagem sonora da reprodução da imagem visual com um artifício bastante simples, mas muito perspicaz. A imagem sonora é uma imagem que se desenvolve no tempo, invariavelmente, enquanto a imagem visual tem sua determinação mais essencial no espaço. Curioso é que a partir dessa defasagem criada por essa montagem, nasce uma expectativa frustrada de conduzir imagem visual e imagem sonora em uma única imagem. No Baquedano, por exemplo, espera-se pela chegada do trem e obtém-se o vazio da imagem visual na qual a presença do trem é quase imperceptível. Quando pensamos no trem a partir daquela imagem sonora, pensamos em algo em movimento. E assim por diante. A obra cria fantasmas, nos mostra duplos vazios, expectativas frustradas, sugere que na ruptura podemos encontrar a resposta sobre a natureza dos signos, os signos que são eles mesmos a reprodução sempre de duplos: significado e significante”. Bruno Melo Monteiro, mestre em História e Crítica de Arte pela UERJ.


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