Beira 143

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ISSN 1982-5994

UFPA • ANo XXXII • N. 143 • JUNHo e JULHo de 2018

Quando a diferença é vista como doença Pesquisa debate discurso de patologização das vivências trans.

Páginas 8 e 9

Nesta edição • Festejos juninos em 1950 • Embarcação de juta e miriti • Liderança feminina no sindicato


UNiVeRsidade FedeRaL do PaRÁ JORNAL BEIRA DO RIO cientificoascom@ufpa.br Direção: Prof. Luiz Cezar Silva dos Santos Edição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE) Reportagem: Armando Ribeiro, Nicole França e Renan Monteiro (Bolsistas); Walter Pinto (561-DRT/PA). Fotografia: Alexandre de Moraes e Nayana Batista (bolsista) Fotografia da capa: Alexandre de Moraes Ilustrações: Priscila Santos e Walter Pinto Charge: Walter Pinto Projeto Beira On-line: TI/ASCOM Atualização Beira On-Line: Rafaela André Revisão: Elielson Nuayed, José dos Anjos Oliveira e Júlia Lopes Projeto gráfico e diagramação: Rafaela André Marca gráfica: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/Ascom Impressão: Gráfica UFPA Tiragem: Mil exemplares © UFPA, Junho e Julho de 2018

Reitor: Emmanuel Zagury Tourinho Vice-Reitor: Gilmar Pereira da Silva Pró-Reitor de Ensino de Graduação: Edmar Tavares da Costa Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Rômulo Simões Angélica Pró-Reitor de Extensão: Nelson José de Souza Jr. Pró-Reitor de Relações Internacionais: Maria Iracilda da Cunha Sampaio Pró-Reitor de Administração: João Cauby de Almeida Jr. Pró-Reitora de Planejamento e Desenvolvimento Institucional: Raquel Trindade Borges Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Raimundo da Costa Almeida Prefeito Multicampi: Eliomar Azevedo do Carmo Secretário-Geral do Gabinete: Marcelo Galvão Assessoria de Comunicação Institucional – ASCOM/ UFPA Cidade Universitária Prof. José da Silveira Netto Rua Augusto Corrêa. N.1 – Prédio da Reitoria – Térreo CEP: 66075-110 – Guamá – Belém – Pará Tel. (91) 3201-8036 www.ufpa.br


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ica em Belém um dos seis postos de atendimento com serviço especializado gratuito para pessoas trans. O Ambulatório TT foi uma iniciativa das Secretarias de Estado de Saúde Pública (Sespa) e de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH), em cumprimento à Política Nacional de Saúde Integral de LGBT. Durante três meses, o advogado Manoel Rufino David de Oliveira visitou o ambulatório a fim de coletar os dados para a sua dissertação Despatologização das vivências trans: o impacto da abolição do diagnóstico de gênero nos direitos das pessoas trans. “A população trans não precisa mais se manter refém de um diagnóstico de gênero para ter acesso ao direito à saúde”, afirma. Nas páginas 8 e 9, você confere a reportagem assinada por Renan Monteiro. Nesta edição, você lê também: Em Moju, o movimento sindical não reconhece as lideranças femininas; As festas juninas do seu tempo eram melhores? Esse sentimento de nostalgia já era comum em 1950; A banalização da violência, impeachment e legado dos anos 1960 são temas da conversa que tivemos com o professor Daniel Aarão Reis. PS: Enquanto preparávamos esta edição, recebemos e-mail da Secom/UFRGS solicitando alguns exemplares do Beira do Rio, pois a UFRGS está revisando o projeto editorial do Jornal da Universidade e nós estamos entre as referências para o novo projeto. No ano em que o Beira completa 33 anos, esse e-mail foi recebido como um presente. Rosyane Rodrigues Editora

Nesta Edição A implementação da Gestão de Processos na UFPA ..................4 Nem vez, nem voz ........................................................5 Cadê meu São João? .......................................................6 Atendimento inovador, discurso ultrapassado ........................8 A barbárie está à espreita ............................................. 10 Assédio moral e sexual no trabalho ................................... 12 Envelhecimento e saúde ................................................ 14 Um barco de fibra de juta e miriti ................................... 15 Pertencimento e cidadania ....................................................16 Livro digital reúne produção em Letras .............................. 18

Foto Alexandre de Moraes


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Opinião ALEXANDRE DE MORAES

A implementação da Gestão de Processos na UFPA

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á está nas mãos do reitor Emmanuel Tourinho o relatório elaborado pela Comissão de Gestão de Processos, constituída com a finalidade de realizar os estudos necessários e elaborar uma proposta de implantação de mapeamento de processos no âmbito da UFPA. O trabalho desenvolvido pela Comissão surgiu de uma demanda da Administração Superior da Universidade e retrata uma iniciativa estratégica visando realizar estudos e indicar os caminhos que a UFPA deverá adotar para a implementação da Gestão de Processos, prioridade para os próximos anos, conforme objetivo estratégico constante no PDI 2016-2025 de “Melhorar e fortalecer a governança dos processos internos”, cuja meta é que 100% dos processos críticos sejam redesenhados até o ano de 2025. A comissão iniciou seus trabalhos em janeiro de 2017, elaborando um cronograma de atividades que incluía reuniões de trabalho, capacitações e visitas técnicas em organizações com iniciativas já desenvolvidas na área de Gestão de Processos, para a definição de uma metodologia a ser avaliada por meio do mapeamento de um processo piloto: o processo de contratação de professor substituto.

FREEIMAGES

Os fluxos de trabalho que envolvem a contratação de professor substituto foram mapeados em uma oficina com a participação de servidores da Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento Institucional (Proplan), da Pró-Reitoria de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal (Progep), do Instituto de Letras e Comunicação (ILC) e do Instituto de Ciências Biológicas (ICB). O processo foi todo documentado e sintetizado em um fluxograma de processo e em um procedimento operacional padrão (POP). Também foram identificadas possíveis melhorias a serem implementadas no referido processo. A Gestão de Processos é um instrumento que busca aperfeiçoar a cadeia de valor dos processos das organizações com o objetivo de atender às demandas e às expectativas das partes interessadas. Esse instrumento facilita a análise dos fluxos de trabalho, permitindo uma visão sistêmica da organização e facilitando o controle do desempenho e dos resultados. De acordo com o reitor Emmanuel Tourinho, a abordagem de Gestão de Processos representa uma visão de inovação, de repensar as atividades rotineiras, proporcionando vários benefícios para a Instituição.

O relatório apresenta as conclusões da metodologia adotada e direciona uma proposta para o mapeamento dos processos da Universidade por meio de modelos e formulários padronizados que poderão ser adotados. O próximo passo é a identificação dos processos que deverão ser priorizados e mapeados. Como proposta, a Comissão recomenda que a UFPA priorize a definição de processos estratégicos de acordo com os objetivos estratégicos do PDI. A Comissão foi designada com os seguintes membros: o administrador Huderson Melo (Proplan), o assistente em administração Adriano Silva (Proplan), o técnico em tecnologia da informação Rômulo Ferreira (Proplan), o assistente em administração Thiago Gonçalves (Proplan), a assistente em administração Aline Teixeira (Progep), a analista de tecnologia da informação Maxwel Dias (Progep), o professor Thiago Dias (IFCH/Progep), o economista Paulo Pinheiro (Proplan) e a administradora Thelma Silva (Fadesp/Proplan). Huderson Alexandre Souza de Melo – Administrador, técnicoadministrativo lotado na Proplan e integrante da Comissão de Gestão de Processos da UFPA (Portaria nº 743/2017). hudersonmelo@ufpa.br


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Gênero

Nem vez, nem voz Em Moju, mulheres não são lideranças reconhecidas no sindicato Nicole França

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s sindicatos são organizações de trabalhadores que têm como principal objetivo defender os direitos e os interesses de seus participantes. No entanto, dentro da grande maioria dos sindicatos, a voz masculina prevalece e, quase sempre, as sindicalistas não têm suas demandas atendidas. Com base nisso, Suellen Suzy de Souza Costa, com o intuito de analisar as forças de liderança feminina nos sindicatos rurais, produziu a

dissertação Sindicato é para quem entende: (des)igualdade de gênero no sindicalismo dos empregados rurais de Moju – Pará, defendida no Programa de Pós-Graduação em Agriculturas Amazônicas, sob orientação da professora Dalva Maria Mota. A pesquisa foi feita com base na atuação de lideranças femininas assalariadas relativas à dendeicultura na diretoria do Sindicato dos Empregados Rurais de Moju (SERMTAB). Suellen Costa relata que o interesse pelo assunto surgiu ainda na graduação. “Apesar

de zootecnista de formação, eu sempre fui apaixonada por Sociologia Rural. No segundo ano da graduação, iniciei os estudos sobre Gênero e Geração e, desde então, o meu interesse pelo assunto só cresceu. Fiquei mais sensível para essas questões da vida da mulher do campo. Finalizei o curso de graduação estudando Sociologia Rural e, quando entrei no mestrado, não tive dúvida de que desejava estudar mulheres rurais”, conta a pesquisadora. A base para a elaboração da pesquisa foram

entrevistas não diretivas, ou seja, sem um roteiro a ser seguido. Segundo Suellen Costa, a escolha por esse tipo de entrevista foi fundamental para que as sindicalistas conseguissem contar detalhes sobre a sua atuação dentro do sindicato e também sobre suas relações com os outros sindicalistas e lideranças sindicais. O enfoque foram as mulheres que, no momento da pesquisa, ocupavam cargos de vice-presidência, secretaria de meio ambiente e conselho fiscal.

Estrutura patriarcal limita espaços ditos como femininos A pesquisa identificou que as mulheres não possuem uma atuação efetiva no sindicato. De acordo com Suellen Costa, a presença delas é apenas para cumprir cota. “As mulheres sindicalistas não ocupam um espaço efetivo de poder, elas não pegam no microfone, não sobem no palanque e só frequentam as reuniões essenciais como acompanhantes. Assim, elas cumprem a cota de 30% de mulheres, sendo uma na vice-presidência na época da pesquisa. Os sindicatos têm mulheres na liderança, mas essas mulheres não são reconhecidas como líderes, o que reduz significativamente a atuação delas”, afirma. Para Suellen Costa, a presença das mulheres nos sindicatos é extremamente importante, em virtude da estrutura patriarcal existente nesse tipo de organização. Quando uma mulher está presente dentro de uma organização política, existe a possibilidade da quebra dessa estrutura. “A estrutura patriarcal nos limita a espaços ditos femininos, e a política não é considerada como um deles,

pois a política é um espaço de poder, de voz, de decisão e, ao longo da História, a mulher não ocupou esses espaços. Dessa forma, ter uma mulher ou várias mulheres como liderança de um sindicato é extremamente importante para que se possa romper com esse paradigma de que elas não podem ocupar espaços de poder”, analisa a autora da dissertação. Apesar da participação política restrita, muitas mulheres têm o desejo de participar dos sindicatos, no entanto elas não são incentivadas a isso. Elas ainda são vistas como algo secundário diante das prioridades do sindicato, dificultando a atuação das sindicalistas. Para a

pesquisadora, as mulheres serão inseridas em cargos de liderança quando entenderem a sua importância dentro do sindicato e, organizadas, ocuparem gradualmente mais espaço dentro dessas organizações. “Acredito que as mulheres devem ocupar os cargos de liderança, devem participar das tomadas de decisão, subir nos palanques, pegar o microfone e lutar pelos seus direitos, parti-

cipar das reuniões e fazer força política. Elas devem deixar a timidez de lado e entender que essas questões são urgentes. Então, a conscientização das mulheres e, posteriormente, a ação de entrar e ocupar esses espaços são fundamentais. Sair do estereótipo da mulher secretária é importante não apenas para os sindicatos, mas também para a sociedade”, concluiu Suellen Costa.


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Cultura

Cadê meu São João? Um retrato dos festejos juninos na Belém dos anos 1950 ALEXANDRE DE MORAES

Armando Ribeiro

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ês de junho chega e traz com ele a roupa xadrez, o barulho dos estalinhos e o som do forró, elementos que deixam as cidades mais animadas e coloridas. Pessoas de todas as idades se unem para comemorar os santos do mês e trocar experiências. Cada geração conta as particularidades dos festejos da sua época e mostra que falar sobre essas manifestações é narrar a sua própria história. Para perceber como essas narrativas juninas se constroem, Elielton Benedito Castro Gomes escreveu a dissertação Adeus Maio! Salve Junho! Narrativas e representações dos festejos juninos em Belém do Pará nos anos de 1950, orientada pelo professor Antônio Maurício Dias da Costa. O autor conta que utilizou como base a escrita de intelectuais, matérias e anúncios publicitários veiculados pelos jornais da época. A intenção foi captar como ocorriam esses festejos e até que ponto a escrita dos jornais tinha influência sobre eles. De acordo com o historiador, a festa junina chegou ao Brasil com os portugueses, ainda no Período Colonial, sendo ressignificada e adquirindo características fortemente nacionais. Elielton Gomes conta que a tradição é decorrente da cultura europeia, na qual esse período é de colheita, de um novo ciclo. A escolha pela década de 1950, segundo Elielton Gomes, é em razão da sua peculiaridade histórica, já que é um período de redemocratização entre duas ditaduras, a de Vargas, que terminou em 1945, e a dos militares, que começou em 1964. O pesquisador afirma que, nessa época, as agitações políticas estavam mais brandas e as pessoas podiam se expressar melhor. Aliado a isso, Belém passava por um intenso processo de urbanização, crescimento e trânsito populacional, recebendo diversos sujeitos do interior do Estado do Pará e do Nordeste para trabalhar. De acordo com o historiador, nesse processo, as culturas amazônica e nordestina vão se misturar intensamente, e os jornais da época vão refletir essa miscigenação. As matérias, as crônicas e os anúncios analisados pela pesquisa mostravam um homem inocente, que vem do interior para a cidade grande sem saber como lidar com aquele espaço novo. Porém, quando ele é trazido para a imprensa, é retratado com as características atribuídas ao nordestino, descrito com espírito devoto, festivo e de fala simples.


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Profano e popular sempre estiveram lado a lado

FOTOS ACERVO DA PESQUISA

Uma das características dos festejos juninos, presentes ainda hoje, é a sua ligação com a religião ao homenagear os santos católicos populares, como Santo Antônio, São João, São Pedro e São Marçal. Mas as festas também possuem uma essência popular e profana, revela Elielton Gomes. “Um dos elementos ligados ao catolicismo são as quermesses, que ocorrem durante as festividades. Os próprios idealizadores das festas utilizavam as datas comemorativas desses santos para atrair mais público. Porém, no fim, era uma festa do povo, com brincadeiras e espetáculos diversos”, afirma. A pesquisa, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia (PPGHist/ IFCH), contou com a opinião de cinco intelectuais: Bruno de Menezes, Eneida de Moraes, Lindanor Celina, Georgenor Franco e Rodrigues Pinagé, retirada dos Jornais O Liberal, A Folha do Norte, A Província do Pará, O Estado do Pará, A Vanguarda e da Revista da Amazônia, além de romances memorialísticos que falam sobre o tema. Elielton Gomes conta que esses escritores faziam um discur-

so muito nostálgico, comparando o São João da infância deles com o daquele momento. É engraçado que vemos essa narrativa até hoje. As pessoas tendem a atingir uma certa idade e querer que tudo continue como era na sua infância, daí vêm discursos como ‘as brincadeiras da minha época eram melhores’ ou ‘estas crianças não saem do celular’. Elas não aceitam que as práticas estão sujeitas à transformação, que as formas de interação, comunicação e cultura mudam”, observa. Uma das principais descobertas do estudo foi perceber esses intelectuais como mediadores culturais. Eles não estavam apenas falando das festas, mas interferindo no modo como esses festejos eram produzidos. No momento em que os organizadores desses eventos entravam em contato com o material nos jornais, eles tentavam agir de acordo com o que era escrito. “Os anúncios que eu verifiquei mostravam que os festeiros tentavam chamar as pessoas misturando características, na época, atuais com as de São Joões passados”, revela o pesquisador.

Forró não era considerado ritmo típico O historiador explica que, na década de 1950, o São João não era embalado pelos ritmos que hoje são considerados tradicionais, como as músicas de quadrilha e o forró. Nos clubes, tocavam uma gama de estilos que hoje seriam considerados inapropriados, como a valsa, o xaxado e os boleros. Elielton Gomes destaca que as picapes sonoras eram pouco utilizadas, sendo a animação realizada mais ao vivo, pelos grupos de Pau e Corda, na periferia, e pelas Orquestras, nos bairros centrais. Hoje, a animação típica é feita pelas aparelhagens. Outro ponto particular da modernidade apontado pelo autor é a concentração dos festejos em praças e locais públicos, quando, no passado, essas comemorações ocorriam principalmente em clubes ou em bares privados. “Eu enxergo

que, naquela época, existia uma circularidade cultural maior, quando acabava uma festa, as pessoas já iam para outra, se deslocavam do centro para a periferia. Existia essa troca de experiências e tradições que quase não vemos mais. Hoje, as pessoas estão muito presas nas suas tribos”, avalia Elielton Gomes. O pesquisador ressalta que, apesar das mudanças que ocorrem naturalmente, as festas de São João conservam alguns elementos e ainda refletem pensamentos antigos, como o uso da imagem feminina para atrair o público masculino. “Isso não vai ocorrer apenas nos festejos juninos. O ‘mulheres não pagam’ de hoje é um espelho do ‘contamos com a presença das mulatas mais cheirosas da cidade para alegrar’, dos anos 1950”, explica.

Outro elemento que permanece é a idealização do ambiente rural como cenário para as festas de junho. Expressões como “São João na Roça”, “Casamento na Roça” e “Festa na Roça” eram muito presentes nos jornais e anúncios e podem ser facilmente escutadas nos dias atuais. Elas representam uma versão adaptada do mundo caipira no meio citadino, uma festa do interior no coração urbano da Amazônia.

Acima, reprodução de anúncio e fotos dos festejos juninos publicados nos jornais da época.


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Atendimento inovador, discurso ultrapassado Pesquisa debate a patologização das vivências trans Renan Monteiro

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Código Internacional de Doenças (CID), administrado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), designa a transexualidade como distúrbio mental apesar de alta reivindicação mundial para a sua despatologização. Na 11ª revisão do CID, que acontece ainda neste ano, é esperada a retirada do sufixo ‘’ismo’’ (que designa doenças) da palavra transexualismo. Foi com o objetivo de mostrar as consequências da extinção do diagnóstico de gênero que Manoel Rufino David de Oliveira defendeu a dissertação Despatologização das vivências trans: o impacto da abolição do diagnóstico de gênero nos direitos das pessoas trans. A pesquisa foi realizada no Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD/ICJ), orientada pelo professor Raimundo Wilson Raiol. Entre as demandas da população de travestis e transexuais do Brasil, uma das mais debatidas é a despatologização de suas vivências e os efeitos disso no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com Manoel Rufino, muitas pessoas trans precisam submeter-se ao discurso da patologização e de classificação de doença para ter acesso aos procedimentos de readequação de gênero ofertadas pelo SUS. Em 2016, durante três meses, o pesquisador realizou visitas técnicas no Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais do Estado do Pará (Ambulatório TT) e realizou entrevistas com pessoas que utilizavam o protocolo transexualizador. Foram entrevistados duas mulheres trans, um homem trans, uma travesti e uma pessoa trans não binária. “Procurei conhecer a história dessas pessoas e conhecer principalmente a


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Direito trajetória delas na utilização dos serviços do SUS e desse ambulatório. Coletei dados sobre como elas foram atendidas e como usufruíram

do serviço do ambulatório para, então, pensar sobre as regras que são reconhecidas na política nacional e no protocolo transexualizador do

Sistema Único de Saúde. Assim, foi possível refletir sobre as práticas que os agentes de saúde do ambulatório adotam”, afirma Manoel Rufino.

Modelo rígido de sexualidade e expressão de gênero Embora o protocolo transexualizador do Sistema Único de Saúde tenha sido incorporado pelo Ministério da Saúde com a participação dos movimentos sociais, um dos primeiros aspectos que foram apontados na pesquisa como deficientes foi a utilização das categorias diagnósticas de “transtorno de identidade de gênero” ou de “disforia de gênero” como condição de acesso das pessoas trans aos serviços de saúde. O Ministério da Saúde, ao estabelecer portarias para a realização do protocolo, acabou por reproduzir a referência do Conselho Federal de Medicina (CFM). As normativas do CFM são inspiradas nas categorias diagnósticas dos manuais internacionais, criadas em torno das vivências trans (inclusive o CID, citado no início), utilizando um conceito clássico de “transexualismo” e estabelecendo um modelo de “transexualidade verdadeira”. “O processo transexualizador

reproduz modelos internacionais de assistência e perpetua a figura do ‘transexual verdadeiro’, utilizando mecanismos de controle e normatização para regular o acesso de transexuais aos serviços de saúde. Nesse sentido, acaba matando a diversidade, pois existe uma série de vivências trans que não seguem o padrão imposto pelo modelo do ‘transexual verdadeiro’ do CFM”, avalia Manoel Rufino. No discurso dos entrevistados, foram identificados problemas quanto ao acesso à política de saúde do SUS. Alguns ressaltaram a existência de uma perspectiva hegemônica do que é ser trans, absorvendo como pressuposto o binarismo de sexo, o qual obriga os usuários trans a se adequarem a um modelo rígido e fixo de sexualidade e expressão de gênero. Em outras palavras, uma mulher trans ou um travesti precisam estar de acordo com o padrão de uma mulher cisgênero, assim como um ho-

mem trans em relação a homem cis. Nas entrevistas, também foram relatadas práticas transfóbicas dos agentes de saúde no atendimento às pessoas trans. “Conheço os profissionais que atuam no ambulatório. Acredito que, por desconhecimento, eles acabam incorrendo em algumas atitudes transfóbicas. Em parte porque seguem o regulamento que acaba engessando-os e, em parte, por serem pessoas cisgênero e apenas têm uma ideia do que as pessoas trans estão passando, podendo incorrer na questão do pré-conceito”, considera o pesquisador. Apesar de ser necessário que as pessoas trans tenham um profissional da saúde acompanhando as suas decisões e transformações corporais, Manoel Rufino sugere que médicos, assistentes sociais e psicólogos não devam focar sua atuação no diagnóstico ou na correção do gênero, mas sim apoiar essas pessoas durante o processo.

“Ambulatório TT trouxe esperança de vida” Para Rayanne Cristina, mulher trans de 24 anos, modelo, que não fez parte da pesquisa, mas participa do protocolo transexualizador do Ambulatório TT desde o seu início, o protocolo é um direito que atende a pessoas trans que não têm como arcar com os custos da transição por conta própria. “Apesar da demora do atendimento pelo SUS, o ambulatório TT trouxe esperança de vida para travestis e transexuais. Eu percebo que o Ambulatório TT enfrenta uma repressão muito grande por outros órgãos conservadores demais. Então nós lutamos para que ele entrasse em funcionamento e continue funcionando”, afirma. Rayanne faz parte do Centro de Estudo e Defesa de Negras/ Negros do Pará (Cedenpa) e da Rede Paraense de Pessoas Trans. Inicial-

mente, ela se sentiu violada ao ser chamada “ele” por algumas pessoas no Ambulatório TT. “Eu percebo isso como violação, mas entendo que eles não tiveram um preparo anterior. Atualmente, considero maravilhoso o tratamento deles com a gente”, avalia a modelo. O Ambulatório TT do Estado do Pará tem cerca de dois anos de funcionamento, é um dos seis postos com serviço especializado gratuito no Brasil direcionado para a saúde das pessoas trans e está situado no Centro de Testagem e Aconselhamento da Unidade de Referência Especializada em Doenças Infecciosas Parasitárias e Especiais (URE DIPE). A sua inauguração foi uma iniciativa das Secretarias de Estado de Saúde Pública (Sespa) e da Secretaria de Justiça e Direitos Hu-

manos (SEJUDH), em cumprimento à Política Nacional de Saúde Integral de LGBT, instituída pela portaria n° 2.836/2011. A pesquisa indica a viabilidade da implementação de um modelo de saúde baseado na despatologização das vivências trans, assegurando o processo transexualizador e outras políticas públicas de saúde. “O SUS se pauta pelos princípios de universalidade, integralidade e equidade. Assim, a população trans não precisa mais se manter refém do diagnóstico de gênero para ter acesso ao direito à saúde, superando, então, o argumento em favor da patologização, conhecido como concessão estratégica”, avalia Manoel Rufino.

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Na página ao lado, Rayanne Cristina, mulher trans atendida pelo Ambulatório TT do Pará.


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Entrevista

Daniel Aarão Reis

A barbárie está à espreita Professor alerta para a banalização e a naturalização do crime Walter Pinto

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utor de importantes livros sobre o socialismo soviético, as esquerdas brasileiras e a ditadura civil-militar de 1964, o historiador Daniel Aarão Reis, professor titular de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF), é uma referência da história do tempo presente. Recentemente, ele esteve na UFPA, como palestrante do seminário 1968 – cinquenta anos depois. No final dos anos 1960, ele lutou contra a ditadura, tendo participado do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick, em troca da libertação de presos políticos. Nesta entrevista, o historiador fala do legado dos anos 1960, diz que violência indiscriminada é uma ameaça à democracia e considera uma “aberração” a implementação do impeachment como dispositivo constitucional.

O legado dos anos 1960 Segundo o ponto de vista que venho defendendo e que defendi em palestra no seminário promovido na Universidade Federal do Pará, nos anos 1960, houve um embate maior entre paradigmas de mudança social - o paradigma fundado nas revoluções russas, entre 1905 e 1921, e o que apareceu justamente nesses anos 1960. O primeiro era baseado nas revoluções catastróficas, na tomada do poder pela violência e, a partir daí, na realização de reformas sociais, econômicas, políticas e culturais. Já o segundo baseava-se na progressiva persuasão das consciências e na gradual conquista de direitos, com

uma diminuição drástica do emprego da violência, embora esta não fosse completamente excluída como hipótese. No primeiro caso, a tomada do poder do Estado era condição decisiva para que a revolução se concretizasse. No segundo caso, a perspectiva de uma revolução estendia-se no tempo, registrando-se gradualmente conquistas dos mais diferentes tipos. Creio que a afirmação desse segundo paradigma é o maior e o melhor legado dos anos 1960.

Édson Luis (1968) e Marielle Franco (2018): aproximações O maior risco que corremos atualmente é a banalização do crime e do assassinato em particular. A barbárie de uma violência indiscriminada nos espreita e vem se tornando uma das principais ameaças à democracia brasileira. A sociedade precisa reagir a esse processo, não naturalizar esses crimes e começar a proteger as lideranças populares, pois elas estão sendo abatidas como se fossem insetos. Trata-se de algo inaceitável. O assassinato de Edson Luis Lima e Souto, em março de 1968, suscitou indignação maciça e justa. No entanto, com o passar do tempo, o assassinato banalizou-se, condicionando o mergulho da sociedade brasileira nas trevas densas de uma ditadura “escancarada”, que se perfilou a partir da edição do malfadado Ato Institucional n° 5. Que isso não se repita agora, após o assassinato de Marielle Franco, que os executores e os mandantes do crime sejam encontrados, julgados e condenados. É o mínimo que se precisa. Por outro lado, para

defender nossa democracia, as forças progressistas precisam se unir para combater a barbárie do crime organizado. Este vem se tornando uma das principais ameaças à ordem democrática existente. Por mais lacunar e imperfeita que seja, a democracia atual oferece um patamar que precisa ser melhorado, não destruído.

Ditadura militar O Estado de exceção, que caracteriza qualquer ditadura, encerrou-se no Brasil com a revogação dos atos institucionais, em 1° de janeiro de 1979. Subsistiu o que as oposições chamavam, então, um “entulho autoritário”, mistura de leis, emendas constitucionais e uma constituição imposta pela própria ditadura, a de 1967, ou em outras palavras, um Estado de direito autoritário. Subsistiu ainda um general-presidente João Figueiredo - “eleito” ainda nos marcos da ditadura, mas cujo governo já não se daria nos marcos da ditadura. Começou, então, a partir de 1979, uma transição difícil, complexa, marcada pela transação entre forças opostas. Como disse em livro sobre o assunto: “já não tínhamos uma ditadura, mas ainda não havia uma democracia”, o que só aconteceria em 1988, quando foi aprovada uma nova Constituição. Estabelecer como marco o ano de 1985, com a posse de José Sarney, não se sustenta política ou historicamente. Por que era um líder civil? Mas fora um líder civil da ditadura! Por que os generais já não presidiam o País? Mas o último general a presidir o País não mais o presidira como ditador, mas como presidente de um Estado de direito autoritário. Não

tinha a seu dispor instrumentos de exceção, como os atos institucionais, que caracterizavam a ditadura. Nem as corporações militares reinavam indisputadas como na época da ditadura. Entre 1979 e 1988, não havia mais presos políticos no País, havia pluripartidarismo, liberdade de organização sindical e liberdade de imprensa. Diversos movimentos de greve geral e a campanha “Diretas-Já” ocorreram praticamente sem enfrentar repressão. Como caracterizar, nessas condições, uma ditadura no País? Uma impropriedade, sem dúvida.

A historiografia e o Golpe de 1964 Estudamos e continuamos a estudar as esquerdas e as organizações de luta armada em particular. Nada mais legítimo. Numa escala menor, estudamos também as instituições políticas e culturais da época da ditadura. Devemos continuar esses estudos. Entretanto há uma lacuna maior, observada e registrada nos debates que aconteceram em 2014, por ocasião do cinquentenário da instauração da ditadura: quero me referir às complexas relações entre a ditadura e a sociedade deste país. O apoio de parcelas importantes da população à instauração da ditadura parece bem estabelecido, embora ainda muito pouco estudado. Trata-se de elucidar como evoluiu no tempo a relação entre os governos ditatoriais e o cotidiano da população brasileira, nos grandes centros, nas cidades pequenas e nas várias regiões do País. Como se relacionaram com a ditadura as mulheres e os homens comuns. Eis o desafio maior à nossa historiografia sobre a época da ditadura. Com


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estudos a esse respeito, teremos mais luzes sobre as tendências conservadoras neste país, como se definiram e se redefiniram essas tendências no quadro da ditadura.

Não concordo com a interpretação de que houve um golpe no Brasil em 2016. Houve, sim, o acionar de um dispositivo constitucional essencialmente autoritário, o impeachment. O impeachment transfere a algumas centenas de pessoas o direito de cassar alguém eleito por milhões de pessoas. Nada mais autoritário. Infelizmente, as forças progressistas e as esquerdas em particular não discutiram melhor essa questão na Constituinte que elaborou a atual Constituição, promulgada em 1988. Não apenas não discutiram, mas também não denunciaram com vigor necessário a aprovação do impeachment como dispositivo constitucional. Finalmente, utilizaram o dispositivo tanto para cassar o presidente Fernando Collor como para tentar cassar o presidente Fernando Henrique Cardoso. Mesmo depois do impeachment de Dilma Rousself, não é incomum encontrar parlamentares progressistas a solicitar impeachment de governadores e prefeitos. Uma aberração, já que existe no Direito Constitucional a possibilidade do chamado “plebiscito revocatório”, quando, mediante um determinado número de assinaturas, pode-se obrigar o/a eleito/a a submeter-se novamente, antes do término de seu mandato, ao escrutínio popular. Trata-se de inserir esse novo dispositivo em nossa Constituição, jogando no lixo o impeachment. O que se deve denunciar, em suma, é o impeachment como dispositivo essencialmente autoritário e reunir forças para revogá-lo da Constituição brasileira. E não usá-lo em proveito próprio e caracterizá-lo como “golpe” quando ele se vira contra um/uma representante das forças populares. Quanto a transformar o impeachment numa disciplina específica, creio que se trata de um claro “desvio de finalidade”. Pode-se realizar seminários, simpósios e debates a respeito do assunto. Mas fazer disso uma disciplina me parece impróprio - uma excessiva politização dos quefazeres acadêmicos. Entretanto, em nome da liberdade acadêmica, as pessoas que assim pensam têm todo o direito de propor essa questão como disciplina, enfatizando-se a liberdade de expressão irrestrita que deve presidir os trabalhos de pesquisa em qualquer universidade.

ALEXANDRE DE MORAES

O impeachment da presidente Dilma

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Pesquisa

Assédio moral e sexual no trabalho Estudo mapeia percepções sobre esse tipo de violência Walter Pinto

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pesar de a violência em locais de trabalho ser uma prática que remonta à Antiguidade, conforme apontam estudos acadêmicos, o tema só passou a se constituir numa área de maior interesse por parte dos pesquisadores no final do século XX, quando os assédios moral e sexual passaram a ser caracterizados como ações danosas para as relações de trabalho. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o assédio é caracterizado por um cerceamento a alguém, de forma duradoura e persistente. No final do ano passado, a secretária executiva Dielly Débora Farias Fonseca concluiu o estudo Assédio moral e assédio sexual: investigação sobre as formas de violência laboral baseadas nas relações de poder, realizado para obtenção do título de mestre em Gestão Pública, pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, da UFPA. O estudo teve por objetivo analisar a percepção de homens e mulheres quanto ao assédio moral e sexual no ambiente de trabalho.

Sob a orientação do professor Carlos André Corrêa de Mattos, o estudo propôs identificar quais fatores caracterizam as formas de violência e classificar os entrevistados quanto à incidência dos fenômenos. A pesquisa buscou também contribuir com propostas que possam reduzir o assédio em ambiente de trabalho. Segundo Dielly Fonseca, que é graduada em Secretariado Executivo e trabalha no Instituto de Geociências da UFPA, nem sempre as pessoas conseguem identificar os dois tipos de assédios. “Mas a literatura é clara. O assédio moral é caracterizado pela ação sutil do assediador repetidas vezes. Ele pode atacar o assediado em relação à imagem, à atividade de trabalho ou ao seu desempenho. De modo sutil, ele vai criando um ambiente hostil à pessoa objeto do assédio, que, muitas vezes, tem grandes dificuldades de provar ou convencer os colegas do que está acontecendo”, explica. Por seu turno, o assédio sexual ocorre por meio da criação de um ambiente sexualizado. “A cultura brasileira é

uma cultura sexualizada historicamente, as pessoas acabam trazendo de casa ou da rua o clima sexual para o ambiente de trabalho. Essa forma de assédio agride principalmente a figura feminina na sua condição de trabalhadora”, alerta Dielly. A pesquisa foi realizada por meio de 251 questionários, com quarenta e oito afirmativas, além da avaliação geral e caracterização dos entrevistados quanto ao cargo, à idade, ao sexo, à nacionalidade, ao tempo de atuação no órgão, ao estado civil, à escolaridade, à cor e à renda familiar. Dielly destaca a importância de alguns destes aspectos: o sexo, porque permite identificar a incidência do assédio entre gêneros. No caso do assédio sexual, as mulheres costumam ser as maiores vítimas; o estado civil aponta para a maior incidência entre mulheres solteiras e divorciadas; a etnia, por evidenciar as mulheres negras como vítimas em potencial; e a escolaridade, por indicar que quanto menor o nível escolar, maior a propensão a ser vítima.

Estão em jogo relações de poder e hierarquia No ambiente de trabalho, nem sempre os casos de assédio acorrem com base na relação de poder, ou seja, não é necessariamente de chefe para subordinado. Pode acontecer de um colega exercer poder sobre o grupo, mesmo não sendo o chefe. Neste caso, trata-se mais de uma relação de personalidade do grupo e do assediador. Essa nuance faz com que existam categorias distintas de assédio moral. A forma mais comum de assédio é a “vertical descendente”, de cima para baixo, exercida pela chefia

sobre os subordinados. Tende a criar um ambiente hostil por meio da hierarquia. Outra categoria é o “assédio moral horizontal”, caracterizado pela incidência entre colegas de trabalho. Ocorre quando um grupo ou uma pessoa assedia os seus pares ou um colega especificamente. Há, ainda, uma terceira forma de assédio moral, o “vertical ascendente”, que ocorre quando o grupo exerce assédio s o b r e a c h e f i a . Tr a t a - s e d e uma variedade menos comum de acontecer. Nesta forma, o

assédio sobre o chefe pode ser de tal monta que este acaba por ser demitido porque sua capacidade profissional passa a ser questionada. Ta m b é m o a s s é d i o s e xual em ambiente de trabalho apresenta categorias distintas. A primeira é o assédio por chantagem, que ocorre quando o chefe assedia sexualmente o subordinado, o que é considerado crime no Código Penal brasileiro. A outra forma é o assédio sexual ambiental, que ocorre entre colegas de mesma hierarquia.


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20,71% perceberam alguma prática de assédio A técnica de amostragem utilizada na pesquisa foi a da probabilidade aleatória simples, que se fundamenta no controle do erro, na representatividade da amostra e na não interferência do pesquisador na seleção dos entrevistados. O resultado da pesquisa verificou que, entre os 251 entrevistados, 79,28%, ou seja, 199 não percebem qualquer forma de assédio, seja moral, seja sexual, nas relações de trabalho, tanto entre colegas quanto entre subordinado e chefia. Por outro lado, 20,71%, correspondentes a 44 entrevistados, responderam perceber práticas de assédio moral e sexual na chamada fase final. Houve ainda oito entrevistados que identificaram formas de assédio na fase de estágio inicial.

A pesquisa agrupou os entrevistados que apontaram perceber formas de assédio por fatores. A maior incidência ocorre no fator “indução ao erro” e reúne casos em que o assediador dificulta a atividade da vítima, de tal forma que ela não tenha condições para executar a tarefa. Outro fator abrange os “desqualificados e isolados”, pessoas que têm a imagem manchada sob a acusação de não fazerem o trabalho bem feito ou de não cumprirem prazos. Sentindo-se desqualificada, a vítima geralmente acaba por se isolar do grupo de trabalho. O terceiro fator ocorre quando há a “violência física, verbal e sexual”, uma situação extrema que exige um posicionamento da instituição ou da organização de trabalho.

Dielly Fonseca explicou que o processo do assédio, em suas duas vertentes, é como uma espiral, que tem início com alguns comportamentos e vai se agravando, podendo finalizar em violência física e/ou sexual ou até em pedido de transferência ou demissão. “Não é incomum as vítimas de assédio pedirem remoção da unidade em que trabalham. A saída do ambiente em que ocorre o assédio não significa que o assédio terminou ali. Como o assediador permanece no local, ele pode eleger uma outra vítima, principalmente porque não sofreu nenhuma penalidade. Então, como o ambiente é favorável às suas ações, ele provavelmente continuará assediando”, avalia a pesquisadora.

ResULtados 251 pessoas entrevistadas. 199 não perceberam formas de

assédio.

44 perceberam formas de assédio na fase final.

Apenas 8 entrevistados identificaram a violência na sua fase inicial.

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Medicina

Envelhecimento e saúde Dissertação avalia quais doenças poderão afetar os idosos até 2020 Armando Ribeiro

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ma das maiores preocupações de quem chega à terceira idade é ter conforto, por isso os investimentos em aposentadorias privadas e planos de saúde estão cada vez mais recorrentes. Esse comportamento reflete a transformação social que o Brasil está vivendo com o envelhecimento da sua população. No entanto o médico Yuji Magalhães Ikuta faz um alerta: ainda são poucos os estudos voltados para a velhice e esse

número decresce quando se fala das doenças infecciosas. Pensando em quais agravos podem afetar a população idosa no futuro, Yuji Ikuta escreveu a dissertação Aspectos epidemiológicos das doenças infecciosas em idosos no Estado do Pará, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Doenças Tropicais (NMT/UFPA), orientada pela professora Marília Brasil Xavier. O médico conta que a pesquisa avaliou a incidência das doenças infecciosas ao longo da história e, baseado nessa

avaliação, fez uma projeção da tendência dessas patologias até 2020. “O estudo, em razão da sua abrangência, demonstra o cenário da realidade do Brasil e suas especificidades regionais e, neste sentido, serve como um alerta para a população e para os gestores, pois foram identificadas elevadas incidências de doenças que já deveriam ter sido erradicadas. A partir disso, é fundamental que medidas de prevenção e combate sejam tomadas”, avalia. Para Yuji Ikuta, as doenças mais recorrentes foram

aquelas identificadas entre a população de renda baixa. O professor utiliza a malária como exemplo desse fato, afirmando que, enquanto nos centros urbanos ela já foi erradicada; nas cidades do interior do Estado o diagnóstico ainda é comum. “Toda campanha que é feita tem um resultado, mas devemos avaliar se ele é o melhor possível. É preciso questionar o ‘controle’ e verificar o porquê dessa doença ainda existir. Somente aprendendo com os nossos erros é que vamos poder acabar com essas infecções”, observa.

Alta incidência de AIDS, dengue e hepatites

INFOGRÁFICO PRISCILA SANTOS

O professor informa que utilizou 14 doenças infecciosas de notificações compulsórias, que ocorreram especificamente em idosos: dengue, tuberculose, hanseníase, leishmaniose tegumentar americana (LTA), hepatites, AIDS, doença de chagas, leptospirose, leishmaniose visceral (LV), meningite, tétano, febre tifoide, malária, esquistossomose. O estudo contou com a coleta dos dados disponíveis no Sistema de Informações de Agravos de Notificações (SINAN) sobre essas doenças, entre os anos de 2003 e 2012. Com essa metodologia, foi possível verificar o cenário

de cada doença. A partir disso, foi realizada a comparação dos dados com os do Pará e com os da população não idosa. Foi observada alta incidência de AIDS, LTA, dengue, hepatites, LV e doença de chagas, manutenção das taxas de tuberculose, hanseníase, leptospirose, meningite, tétano e esquistossomose, e redução dos índices de malária e febre tifoide. Enquanto a tuberculose, a hanseníase, a dengue, a LTA e as hepatites virais em idosos, nos últimos anos, tiveram um aumento em relação à população não idosa.

De acordo com a pesquisa, até 2020, a tendência da AIDS, da dengue e da tuberculose é aumentar; da malária e da febre tifoide decrescer; e da hanseníase, se manter. Já no Pará, a incidência das doenças infecciosas mostrou-se maior que no Brasil, com a dengue, a tuberculose, a hanseníase, a LTA, as hepatites e a AIDS tendo destaque. Para Yuji Ikuta, as questões de saneamento e de educação são fundamentais para o planejamento e a abordagem da saúde nas comunidades e devem ser prioridade dos governos. Ele explica que devem existir medi-

das de curto prazo que eliminem o ciclo de transmissão dessas doenças e planejamento de ações para expandir e qualificar o sistema de saúde. “Nós esquecemos que esse grupo pode ter infecções, como as DSTs, e fazemos políticas que não o alcançam. Nesta pesquisa, uma das doenças que mais apareceram foi a AIDS, porque esse grupo não tem por hábito usar camisinha. Então, fazer campanhas que os incentivem e ensinem a usar o preservativo e preparar o profissional da saúde para lidar com essa demanda é fundamental”, afirma.


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Engenharia

Um barco de fibra de juta e miriti Protótipo apresentado atende aos padrões comerciais ALEXANDRE DE MORAES

Renan Monteiro

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onsiderando os recursos renováveis disponíveis e o uso de embarcações na região amazônica, o engenheiro industrial Vitor Hugo Chaves defendeu a dissertação Construção de embarcações de pequeno porte com aproveitamento de recursos naturais renováveis junto ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Industrial (PPGI/ITEC), com orientação do professor Roberto Tetsuo Fujiyama. A dissertação apresenta as etapas da construção de uma embarcação com madeira compensada naval, poliéster tereftálico, fibras de juta e miriti, sendo estes dois últimos fontes renováveis, abundantes na natureza e de baixo custo. “Atualmente, a construção naval, principalmente a ribeirinha, é mais voltada para a madeira ou para o alumínio. Nós buscamos apresentar uma nova perspectiva”, justifica Vitor Hugo. Para o delineamento, a montagem do casco e a determinação das curvas de estabilidade da embarcação, foram utilizados, respectivamente, os programas computacionais Rhinoceros 5.0 e Hecsalv Ship Project 7.8.0.9. A embarcação tem dois metros de comprimento, 70 cm de largura e um pontal (altura) em torno de 60 centímetros, além de suportar cerca de 300 quilos de carga total. “O barco é um protótipo para o transporte de passageiros. Primeiramente, procuramos definir o melhor formato da embarcação para a região, fazendo o cálculo de estabilidade com a carga. Em seguida, fizemos a modelagem da embarcação em programas especializados, a caracterização dos reforços transversais – as chamadas ‘cavernas’ – e, depois, trabalhamos com as madeiras de miriti como chapeamento do fundo e laterais”, descreve o engenheiro.

Não houve dificuldade para obter os materiais para a construção do barco. A juta é uma planta originária da Índia e cultivada no Brasil desde o século passado. A fibra de juta é chamada comercialmente de “fibra mole” e é empregada na confecção de telas e tecidos de aniagem, cordas, barbantes, tapetes, sacarias etc. O miriti é uma planta típica da Amazônia e do cerrado. Sua madeira é muito leve e extremamente resistente nos pontos longitudinais. Já o compensado naval foi adquirido no comércio local, em folhas de 15mm de espessura para a confecção das cavernas. O poliéster tereftálico é um produto retirado do petróleo e um dos componentes principais utilizados nas embarcações.

Fibra da juta, miriti, garrafas PET foram utilizados no projeto do engenheiro Vitor Hugo Chaves.

Uso de fibras vegetais garante sustentabilidade O compensado naval e a madeira de miriti formam o corpo da embarcação. Para efetuar a união das peças e enrijecê-las, foram utilizados a fibra de juta e o poliéster, dando o acabamento. “Fomos montando a embarcação conforme os ditames da construção naval, tal como são feitas as embarcações com fibras de vidro”, relata Vitor Hugo Chaves. Para a construção de um barco, pode-se optar por uma grande quantidade de materiais, e a fibra de vidro é um dos mais

populares, pois barcos construídos com esse material têm menor depreciação. No entanto a fibra de vidro causa grande impacto no meio ambiente. As fibras de juta e de miriti, utilizadas na embarcação criada para a pesquisa, são classificadas como fibras vegetais. São fibras de baixo custo, biodegradáveis e podem ser recicladas sem impacto para a natureza. Outro aspecto da embarcação é a não utilização de metal. “A proa da embarcação, que é o local em que ocorre o

maior impacto na água, foi feita com talas de miriti. A princípio, utilizamos pregos nas tábuas de miriti, depois, usamos o próprio poliéster como adesivo, ou seja, nada de metal”, acrescenta o engenheiro. A embarcação tem dois cascos, um externo e outro interno. Entre eles, existe um espaço em que foram inseridas garrafas PET de 500ml. Foram utilizadas 80 garrafas de água, tanto no piso quanto na lateral. “É um ineditismo na pesquisa. Caso haja alguma falha ou

ruptura no casco externo por colisão, por exemplo, a embarcação não afundará. O espaço em que estão as garrafas vai encher, pois serve como boia. As garrafas aumentam a reserva de flutuabilidade”, garante o pesquisador. O método de fabricação proposto para a embarcação mostrou-se viável e atendeu aos padrões comerciais. Vitor Hugo garante que é possível converter o protótipo para embarcações maiores, mantendo o baixo custo.


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Pertencimento e cidadania Associação Amigos da UFPA promove melhorias para a comunidade Armando Ribeiro

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Abaixo, da esquerda para a direita, alguns projetos já implementados: ginásio de esportes, calçamento do 2º portão até a Biblioteca Central e pavimentação do acesso ao Hospital Bettina Ferro.

dia nasce e os vendedores do Ver-o-Pesinho estão preparando seus boxes. Arrumam alguns salgados em um canto, preparam as refeições para mais tarde e batem papo com seus colegas. Quando a hora do almoço chega, o salão e as mesas lotam. Assim é a rotina dos comerciantes que ganham a vida nesse espaço da Universidade Federal do Pará. José Jorge dos Passos Abreu, ou simplesmente Seu Jorge, trabalha no Ver-o-Pesinho do Campus Básico há 22 anos e conta que, recentemente, o lugar passou por uma reestruturação, com a construção de um novo

edifício. “Os boxes eram divididos e feitos de madeira, o que atraía insetos, como cupins e baratas. Nos últimos anos, vivíamos uma guerra contra eles”, lembra o comerciante. A reestruturação do Ver-o-Pesinho foi uma iniciativa dos Amigos da UFPA, associação sem fins lucrativos que tem por objetivo fortalecer a Universidade. A entidade trabalha com a participação social, em que as pessoas, de maneira voluntária, se associam e doam pequenos valores para financiar os projetos. Em 15 anos de existência, oito ações já foram realizadas. A organização tem por princípio a transparência e disponibiliza em seu site o custo das obras, o tempo de duração e o

nome dos associados. Segundo José Olímpio, atual presidente dos Amigos da UFPA, esse modelo de gestão legitima e dá credibilidade para a associação. Na avaliação de Seu Jorge, o maior ganho com o projeto de reestruturação do Ver-o-Pesinho, projeto mais recente da associação, foi o aumento no movimento. O comerciante explica que o ambiente anterior não era convidativo. “Agora, temos mais clientes e nosso lucro aumentou bastante. Além disso, temos uma qualidade de vida maior aqui. O local anterior era muito quente até em dias nublados. Na hora do almoço, nós já estávamos suados e desconfortáveis”, relata. NAYANA BATISTA


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Projetos selecionados devem atender à maioria Desde 2003, os Amigos da UFPA buscam atuar em obras que atendam ao maior número de pessoas. “Por isso não atuamos dentro dos institutos ou das faculdades individualmente. Queremos projetos que possam ser usufruídos por grande parte do público que transita pela UFPA”, informa José Olímpio. Para saber qual estrutura precisa de reparo mais urgente, a associação solicita à Universidade uma pesquisa de demanda, por meio da qual qualquer pessoa pode enviar sugestões. “A nossa primeira obra foi a revitalização do Portão Principal, que representa a nossa entrada na UFPA. Depois, fizemos o calçamento do Segundo Portão até a Biblioteca Central. Naquela época, quando chovia, alagava tudo e as pessoas, muitas vezes, preferiam andar no meio da rua, correndo risco de acidente. A terceira obra foi a reforma no

ginásio de esportes”, enumera o presidente dos Amigos da UFPA. Para José Olímpio, a quarta obra foi um dos maiores desafios da associação: a recuperação do Vadião. A obra durou três anos (2005 a 2008) e foi o projeto mais caro. Em seguida, veio a construção do Restaurante Universitário do Campus Profissional, uma demanda dos próprios alunos. Nas visitas à obra do RU Profissional, a associação decidiu construir um novo espaço para o Ver-o-Pesinho do Profissional (6ª obra). Depois, foi a vez da pavimentação da lateral de acesso ao Hospital Bettina Ferro, um dos pontos mais procurados por visitantes da UFPA. A obra mais recente foi a reforma no Ver-o-Pesinho do Básico, local de trabalho do Seu Jorge. Parceiros – José Olímpio conta que a associação está esperando o resultado da sua nova pesquisa de

demandas para eleger as 10 próximas obras, fazer o planejamento estrutural e financeiro para cada uma e procurar parceiros que possam financiar algumas delas. A intenção, afirma o presidente, é potencializar o tempo das obras. Enquanto a Associação atender a uma demanda, a instituição parceira ficaria à frente de outra, fazendo com que mais pessoas possam ser beneficiadas. Um convênio com a Rede Celpa foi firmado para facilitar a associação e a doação. Basta preencher os dados da sua unidade consumidora e uma autorização, e o valor doado será descontado automaticamente na conta de energia. Além disso, a associação está de mudança e vai ocupar uma sala na Prefeitura da UFPA. A medida deve aproximar a entidade da comunidade universitária. Quem quiser conhecer o espaço e conversar com os Amigos está convidado.

Patrimônio público é também patrimônio nosso Os Amigos da UFPA fizeram uma campanha socioeducativa, em parceria com a UFPA e o Banco da Amazônia, para conscientizar as pessoas de que o patrimônio público pertence a todos e, assim, estimular o sentimento de pertencimento de cada um e a diminuição das depredações e pichações. “Eu devo toda a minha formação, desde março de 1975 até fevereiro de 2018, à UFPA. Então participar da associação é uma forma de retribuição por todos

esses anos, representa a minha gratidão”, afirma o professor aposentado Alfredo Braga Furtado, que contribui com a associação desde o início dela. O professor conta que a sua contribuição está ligada ao sentido de cidadania e responsabilidade social, já que, fortalecendo a associação, você fortalece a UFPA como produtora de conhecimento e beneficia tanto a comunidade universitária quanto a sociedade. Para a associação, todos podem e devem ser associados, NAYANA BATISTA

não apenas quem tem vínculo com a Universidade, mas antigos alunos, servidores e professores aposentados, até mesmo os pais dos futuros alunos. “Uma sociedade só será justa se seu eixo de conhecimento for forte, ou seja, se as nossas universidades forem sólidas. É nesse meio que estão os saberes e os profissionais que darão retorno à comunidade, e precisamos proporcionar um ambiente que incentive essa busca por melhorias”, afirma José Olímpio.

Seja Amigo da UFPA Para fazer parte da Associação Amigos da UFPA, basta entrar no site http://www. amigosdaufpa. org.br e preencher o formulário “Torne-se um novo amigo”. Nele, além de informar os seus dados, você poderá selecionar o valor da sua contribuição. O site também traz informações sobre todos os projetos implementados. ALEXANDRE DE MORAES


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Resenha Livro digital reúne produção em Letras REPRODUÇÃO

Walter Pinto

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Caderno de Estudos em Letras da UFPA recentemente publicado em plataforma digital (veja endereço abaixo) traz a rara oportunidade para o leitor interessado em estudos literários e linguísticos de acessar, em um só lugar e sem custo, a produção acadêmica realizada nos últimos oito anos por estudantes da graduação e do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Pará. O e-book está estruturado em 23 capítulos e sintetiza o conteúdo de reflexões teóricas de monografias, dissertações e teses defendidas entre os anos de 2010 e 2017. A iniciativa partiu dos doutorandos Thiago Azevedo Sá e Romário Duarte Sanches, integrantes do Projeto Nossa Voz e organizadores da coletânea. No campo da literatura, o imaginário narrativo poético ou em prosa dos escritores José Veríssimo, Bruno de Menezes, Haroldo de Campos, Herberto Helder, Age de Carvalho, Max Martins, Guimarães Rosa, Nelson Rodrigues, Marques de Carvalho e Horácio Quiroga são estudados por meio de 14 textos. Como destacam os organizadores, o leitor reconhecerá a complexidade de temas e o amplo levantamento de referências que subsidiaram as interpretações nos estudos empreendidos por seus autores. Estudos como O herói na interpretação e na recepção crítica de Grande Sertão: Veredas, de Márcia Denise Assunção da Rocha, ou Corpos fraturados e insubmissos nas colagens de Max Martins, de Márcia de Souza Pinheiro, são duas amostras da densidade analítica dos estudos empreendidos na Graduação e na Pós-Graduação em Letras na UFPA. Os estudos linguísticos ocupam seis capítulos do Ca-

derno e “atendem ao propósito de investigar a língua com base em métodos distintos”. Entre os métodos, estão o frasealogismo no estudo de Carlene Ferreira Nunes Salvador que analisa o tratamento em dicionários; a prosódica estudada por Camila Roberta dos Santos Brito em Acento versus entoação no português falado em Belém; e a semântica analisada por Suely Cunha de Souza, no estudo sobre a nomeação de termos dos saberes de cura. O Caderno de estudos em Letras da UFPA traz ainda três estudos referentes ao processo de aprendizagem da língua portuguesa no ambiente escolar. Na apresentação, os organizadores ressaltam que o livro oferece aos autores das pesquisas realizadas nos últimos oito anos “um novo momento para a exposição das suas pesquisas, ampliando a visibilidade e o alcance dos títulos”. Por seu turno, esta mostra permite ao público “a interação imediata com produtos conceitualmente densos, organizados de maneira concisa e didática”. Com 258 páginas, o e-book oferece ao leitor textos que sintetizam as pesquisas, sem perda de substância em relação às monografias, dissertações e teses das quais foram extraídos. Acompanham textos, imagens e gráficos que clarificam e informam os conteúdos estudados. Os textos estão estruturados como artigos, de acordo com as normas exigidas para a produção de textos acadêmicos. Tomando como referência o artigo Bruno de Menezes: os primeiros 28 anos, assinado por Carolina de Brito Reis, sua estruturação apresenta resumo, introdução, sete seções e considerações finais. Nele, o leitor encontrará um relato sobre a iniciação poética de Bruno de

Menezes, o contexto histórico que se inseriu e como se deu a publicação de seu primeiro livro, Crucifixo, publicado pouco antes da Semana de Arte Moderna, em 1920. Carolina baseia-se em J. Derrida, no estudo de construção de arquivos de memória, e em Eneida Maria de Souza, quanto ao fazer crítica literária por meio de biografias. A autora mostra ao leitor a importância de Bruno de Menezes para a literatura paraense por trazer as temáticas revolucionárias ao meio literário paraense, assim como estampou em jornais e em versos a necessidade de mudança social, firmando-se como “provedor de reivindicações e de melhorias sociais para a população”. O livro é resultado de apresentações orais que ocor-

reram durante o 1º Círculo de Teses, Dissertações e Monografias da UFPA. O evento ocorreu em maio de 2017, no Campus do Guamá (Belém), da UFPA. Parte integrante do Projeto Nossa voz, o Círculo nutriu a intenção de publicizar os textos de autoria discente, de um lado, “incentivando o trabalho de citação; e de outro, estimulando o acesso ao Repositório Institucional (RI) e à Biblioteca Digital de Monografias (BDM)”. Serviço: Caderno de Estudos em Letras da UFPA. Organizadores: Thiago Azevedo Sá e Romário Duarte Sanches. O e-book pode ser baixado nos endereços https://circuloufpa. blogspot.com.br/p/e-book. html e http://livroaberto.ufpa. br/jspui/handle/prefix/188.


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