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ISSN 1982-5994

UFPa • aNo XXViii • N. 116 • deZeMBro e JaNeiro, 2013

Química

Camapu estimula memória e raciocínio Páginas 10 e 11 Violência doméstica

Lei não diminui índices Pesquisa traz números dos últimos três anos.Páginas 12 e 13 Literatura

Memorial do livro UFPA reúne acervo de escritores e intelectuais paraenses. Página 14


UniVeRSidAde FedeRAL dO PARÁ

JORNAL BEIRA DO RIO cientificoascom@ufpa.br Coordenação: Prof. Luiz Cezar Silva dos Santos Edição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE) Reportagem: Amanda Pinho, Marcus Passos e Vitor Barros (Bolsistas), Walter Pinto (013.585-DRT/MG) Fotografia: Alexandre Moraes e Laís Teixeira Fotografia da capa: Alexandre Moraes Ilustrações: Benelton Lobato / CMP/Ascom Charges: Walter Pinto Projeto Beira On-Line: danilo Santos Atualização Beira On-Line: Rafaela André Revisão: Júlia Lopes e Cintia Magalhães Projeto gráfico e diagramação: Rafaela André Marca gráfica: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/Ascom Secretaria: Silvana Vilhena Impressão: Gráfica UFPA Tiragem: Mil exemplares

Reitor: Carlos Edilson Maneschy Vice-Reitor: Horácio Schneider Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos Pró-Reitor de desenvolvimento e Gestão de Pessoal: João Cauby de Almeida Júnior Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Marlene Rodrigues Medeiros Freitas Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas Neves Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho Pró-Reitora de Planejamento: Raquel Trindade Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim Nassar Prefeito: Alemar dias Rodrigues Junior Assessoria de Comunicação Institucional - ASCOM/UFPA Cidade Universitária Prof. José da Silveira Netto Rua Augusto Corrêa n.1 - Prédio da Reitoria - Térreo CEP: 66075-110 - Guamá - Belém - Pará Tel. (91) 3201-8036 www.ufpa.br


Esta edição traz reportagem com o Grupo de Pesquisa em Bioprospecção e Moléculas Ativas da Flora Amazônica, sobre a descoberta das propriedades neurogênicas de substâncias produzidas pela Physalis angulata, popularmente conhecida como camapu. O estudo inédito comprovou que a planta pode ser utilizada para elevar as capacidades de raciocínio e de memória, além de induzir o crescimento neuronal. O próximo passo é realizar o experimento em grande escala para responder aos questinamentos da indústria farmacêutica. Implantada em 2006, a Lei Maria da Penha ainda não conseguiu diminuir os índices de violência contra a mulher. No Brasil, de 2001 a 2011, 50 mil mulheres foram assassinadas. O cenário paraense não é diferente: os números são alarmantes e os casos são igualmente perversos. O texto de Vitor Barros traz os resultados da pesquisa realizada pela Faculdade de Enfermagem sobre o assunto. O Projeto Memorial do Livro, a Verdade Cínica de Michel Foucault e o professor Adriano Rodrigues falando sobre os paradigmas da Comunicação no século XXI também estão nesta edição. Boa leitura!

Rosyane Rodrigues Editora

Índice Michel Foucault e a verdade cínica .....................................4 Língua, cultura e meio ambiente .......................................5 Transversalizando as ciências ............................................6 Cientistas atentos ao senso comum .......................................8 Camapu induz produção de neurônios ............................... 10 Lei não diminui casos de violência .................................... 12 Espaço para belas palavras ............................................. 14

À margem esquerda do Rio Xingu e ao centro da Rodovia Transamazônica, está instalado, desde 1987, o Campus Universitário de Altamira, atendendo também aos municípios da região, como São Félix do Xingu, Itaituba e Novo Repartimento. A imagem de Alexandre Moraes retrata um pouco da vida ribeirinha no município.


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Opinião Alexandre Moraes

Michel Foucault e a verdade cínica

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Ernani Chaves Professor da Faculdade de Filosofia/IFCH ernanic@ufpa.br

os seus últimos anos de vida, o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) empreendeu um retorno à Antiguidade Clássica. Isso não quer dizer que o seu interesse pelas questões próprias de nossa época, às quais dedicou seus grandes estudos sobre a loucura, a prisão, a sexualidade, tenha diminuído ou se tornado secundário. Muito pelo contrário, essa “atenção ao presente” ganhou uma nova perspectiva com esse retorno. A Antiguidade Clássica parecia a Foucault não apenas o contraponto mais adequado para entendermos “negativamente” o nosso presente (não somos mais gregos!), mas também, justamente o contrário, seu contraponto necessário, uma vez que, sem ela, não podemos compreender o que se passa agora. Seus últimos livros, seus últimos cursos no Collège de France, suas entrevistas, palestras e intervenções públicas do período de 1980-1984 são banhados pelo sol da Hélade, pelo reencontro, feliz e sereno, com uma imagem da filosofia e do filósofo, que se opunha àquelas construídas pela filosofia tradicional. Mais do que aquele que procura a verdade, que quer estabelecer as condições necessárias para o conhecimento, que tenta delimitar com clareza e distinção a fronteira entre o verdadeiro e o falso, a realidade e a ilusão, a filosofia é, antes de tudo, uma forma de vida, uma prática mais do que uma elaboração racional e o filósofo, aquele que se contrapõe ao poder, aos excessos do déspota. A filosofia é uma forma específica de “parresia”, isto é, do “dizer verdadeiro”. Mas não apenas isso, pois, entre o que é dito e a vida daquele que diz, deve haver uma ligação necessária e indissociável. Não pode haver cisão entre o pensar e o agir, assim como as formas de subjetivação estão sempre ligadas às ações políticas, às intervenções no espaço público. Meu livro dedica-se a estudar a forma mais radical que a prática filosófica assumiu na Antiguidade, qual seja, a do cinismo, objeto do último curso de Foucault no Collège de France, intitulado “A coragem da verdade”. Os cínicos antigos, que se diziam discípulos de Sócrates, levaram ao extremo a exigência radical da filosofia, de se constituir em uma crítica efetiva de sua época. Eles compreendem a verdade como inseparável de uma espécie de pensamento que nasce, atravessa e se expressa no corpo, anunciando, na sua pedagogia e na sua ética, uma forma de reconciliação entre o homem e a natureza e, com isso, atacam frontalmente todas as formas de sociabilidade de sua época: sua arma é o riso, a insolência, a blasfêmia, a heresia, no combate a todas as formas da hipocrisia social. Mas não se trata apenas de estudar o cinismo antigo e sua relação com a herança socrático-platônica. Trata-se, também, de indicar, na posteridade da história do Ocidente, as reverberações, os ecos do cinismo antigo, incluindo a sua concepção negativa, desqualificadora, que procurou retirar sua importância da história da filosofia e condenou, moral e patologicamente, as formas de expressão ditas “cínicas”. Foucault lembra-nos, em contraposição, de que, no ascetismo cristão medieval, nas práticas revolucionárias dos séculos XVIII e XIX e nas proposições formais, teóricas e políticas dos artistas “modernos”, a partir da segunda metade do século XIX, os ecos do cinismo antigo se fazem ouvir. Destaco e enfatizo a relação entre arte moderna e cinismo, a partir da referência de Foucault ao poeta Charles Baudelaire, aproximando sua leitura daquela efetuada por Walter Benjamin, tendo como pano de fundo seus debates com Sartre, com Marx e com o marxismo, assim como sua inspiração em Nietzsche. E pergunto, ao final, qual o alcance que suas proposições podem ter ainda nos nossos dias, ou seja, pergunto – para responder positivamente – acerca do potencial crítico do cinismo. Este livro é dedicado à memória de Benedito Nunes, por ter, entre tantas outras coisas, me apresentado duplamente a Michel Foucault. Primeiro, quando da visita de Foucault a Belém, em novembro de 1976; na ocasião, como monitor da disciplina “Introdução à Filosofia”, fiquei encarregado de recolher as assinaturas dos presentes às conferências de Foucault no auditório do então Centro de Letras e Artes. Segundo, quando me sugeriu, alguns anos depois, em 1980, que fizesse do pensamento de Foucault o tema de minha Dissertação de Mestrado. n


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Cultura

Língua, cultura e meio ambiente Ensino da língua alemã ajuda a reinserção social Alexandre Moraes

Marcus Passos

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prender outro idioma e entrar em contato com uma nova cultura é uma experiência importante tanto pessoalmente quanto para o mercado de trabalho. Nessa perspectiva, o Projeto “Aprendendo Alemão na Amazônia: interculturalidade e consciência ambiental”, coordenado pela professora Rosanne Castelo Branco, da Universidade Federal do Pará (UFPA), tem como proposta o ensino da língua alemã para crianças em situação de vulnerabilidade social. Baseado no tripé acadêmico ensino, pesquisa e extensão, o projeto tornou-se pioneiro na Região Norte do Brasil por ser formador e fomentador do ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras em comunidades carentes. Iniciado em 2000, por meio do programa piloto “Uma experiência pedagógica do ensino do alemão na escola fundamental”, o projeto atendeu 40 alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental e Infantil Paulo Freire, em Icoaraci. Na ocasião, as atividades eram coordenadas pela professora Helga André e também envolvia uma equipe de seis professores colaboradores e quatro monitores.

Em 2008, as atividades foram retomadas por meio da parceria estabelecida com a Instituição filantrópica Pia Nossa Senhora das Graças e da vinculação do programa ao projeto pedagógico da Faculdade de Línguas Estrangeiras Modernas (Falem). O programa tem ações previstas até 2014, com expectativa de renovação diante dos resultados positivos que vem apresentando. “Inicialmente, houve bastante resistência por parte da comunidade acadêmica, por conta dos estereótipos pré-estabelecidos de que o alemão é uma língua difícil. Porém as pessoas esquecem

Metodologia é interdisciplinar e aborda os conteúdos a partir de temáticas transversais, facilitando o aprendizado.

que a língua é trabalhada pedagogicamente de forma lúdica, sem deixar de lado o compromisso com o conteúdo, e as crianças atendidas não possuem ideias e valores préconcebidos acerca do alemão”, afirma Rosanne Castelo Branco. O objetivo é estabelecer o diálogo entre a língua e os aspectos socioculturais e ambientais da Alemanha e da Amazônia. Outra preocupação é formar profissionais comprometidos com a responsabilidade social, os quais assumam um papel trans(formador), como vem ocorrendo com as professoras, monitoras e bolsistas ligadas ao programa.

São 36 alunas com idade entre seis e 12 anos O Programa utiliza uma metodologia interdisciplinar com a abordagem de temáticas transversais no ensino dos conteúdos. A transversalidade é fator motivador do diálogo com diferentes culturas e valores sociais, para que as crianças construam uma identidade própria perante o conhecimento de outras culturas. Essa prática viabilizou ações e parcerias com professores brasileiros e alemães, que ministram palestras e oficinas sobre variados temas, como é o caso da professora Sylvia Henkel, que vem ministrando oficinas para

as crianças atendidas pelo projeto. Hoje, o projeto atende 36 meninas em situação de vulnerabilidade social. São 18 crianças de 6 a 9 anos (do 1° e 2° ano), no horário da tarde; e 18 crianças de 10 a 12 anos de idade (do 3° e 4° ano), no horário da manhã. A equipe é formada por professores da UFPA, três monitores voluntários e dois bolsistas. Este projeto acaba por se unir a outros projetos em andamento na Instituição Nossa Senhora das Graças, como as aulas de Ballet, Música, Leitura, Esporte, entre outras.

“A importância do programa é garantir a reinserção dessas crianças na comunidade, fazendo com que elas recuperem a autoestima e se reencontrem por meio do ensino -aprendizagem de uma nova língua”, avalia a professora Rosanne Castelo Branco. Quem tiver interesse em obter mais informações sobre o projeto pode visitar o blog Amazonien: kinder lernen Deutsch, criado em 2011, com o objetivo de divulgar e ampliar as atividades desenvolvidas e trocar ideias com outros projetos sociais. n

Saiba mais A Instituição Nossa Senhora das Graças mantém-se por meio de doações de empresas e de voluntários. Todas as suas ações são acompanhadas pelo Ministério Público e Conselho Tutelar.


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Ensino

Transversalizando as ciências Grupo propõe aproximação entre Psicologia e Ciências Sociais Alexandre Moraes

A professora Flávia Lemos realizou análise documental dos relatórios gerados pelo Unicef para as políticas desenvolvidas no Brasil.

Walter Pinto

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riado há pouco mais de cinco anos, o “Transversalizando” é um dos mais recentes grupos de pesquisa da área de Psicologia da UFPA. Apesar dos poucos anos de existência, ele vem se firmando como uma referência em estudos transdisciplinares, ao promover a articulação entre a Psicologia e as Ciências Sociais. O grupo é composto por estudantes e profissionais

de várias áreas, com atuação na graduação e no Programa de PósGraduação em Psicologia, dentro da linha de pesquisa Psicologia, Sociedade e Saúde. Os estudantes ligados ao “Transversalizando” estão inseridos numa rede de pesquisa que os coloca em intercâmbio permanente com professores e estudantes de outras instituições. Desta forma, há maior disponibilidade para troca de informações, ajuda mútua e possi-

bilidade de publicação conjunta. O grupo, que se reúne todas as terças-feiras, também possui um blog voltado ao ativismo político e à defesa dos direitos humanos. O grupo é resultado da experiência da professora Flávia Cristina Silveira Lemos como orientanda do filósofo e historiador Hélio Rebello Cardoso Júnior, em seu doutorado realizado na Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Assis, interior de São Paulo. Naquela ocasião, Hélio Rebello inseriu a orientanda numa rede de pesquisa organizada por ele. Desde então, a psicóloga social Flávia Lemos passou a entender que não é possível fazer pesquisa sem trabalhar com uma rede de estudantes em intercâmbio com outros professores. Há seis anos, quando ingressou para o quadro docente da Faculdade de Psicologia da UFPA, Flávia Lemos trouxe a ideia do desenvolvimento de estudos transdisciplinares e, também, o interesse pela análise documental, uma metodologia pouco difundida na Psicologia.

Tema original e metodologia interdisciplinar Flávia Cristina Silveira Lemos observa que a maioria dos pesquisadores de Psicologia prioriza a entrevista em seus estudos. Por isso, a pesquisadora tenta mostrar aos alunos que a entrevista é também um documento, que encontra correspondência nas Ciências Sociais, nos relatos da História Oral. “Isso me leva ao emprego da Epistemologia e da Teoria da História para pensar o trabalho com documentos com eles”, explica. Sua ligação com a disciplina História e com o estudo de documentos começou ainda no Mestrado em Psicologia Social, quando a professora analisou documentos de uma instituição local, o Conselho

Tutelar, sobre infância e adolescência. Já nesta etapa, Flávia Lemos foi coorientada por Hélio Rebello, especialista em Michael Foucault e Gille Deleuze. Decidida a ampliar seus estudos com documentos relativos aos direitos da criança e dos adolescentes, durante o doutorado, Flávia Cristina Lemos teve acesso a relatórios do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), produzidos, especificamente, sobre a realidade brasileira. “Aqueles documentos me chamaram atenção, porque pertenciam a um organismo internacional, multilateral, ligado à Organização das Nações Unidas, e porque interferiam diretamente

na criação das políticas públicas brasileiras para crianças e adolescentes”, lembra a professora. “Concluí minha tese com êxito, tanto pela originalidade do tema quanto pela inovação no uso de fontes (documentos) e de método analítico, com apropriação de ferramentas metodológicas e teoria de autores de outras áreas, com destaque para Foucault, na Teoria da História”, avalia a pesquisadora. Foi essa experiência que motivou a criação, na UFPA, do Grupo “Tranversalizando”, que, além de estudos sobre o Unicef, trabalha questões relacionadas aos direitos humanos, por meio de pesquisa histórica e documental, baseada em Michel Foucault. n


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Unicef propõe políticas para o Brasil Basicamente, Flávia Cristina Silveira Lemos vem estudando os direitos da criança e do adolescente nos últimos vinte anos, por meio de pesquisas documentais. Ela observa que, além de propor políticas públicas para o Brasil, o Unicef monitora as políticas implementadas e exerce pressão sobre o País, visando à redução das violações dos direitos de crianças e adolescentes. “Minha atenção foi direcionada ao fato de um organismo internacional ter uma intervenção tão intensiva no País, positiva em alguns aspectos, negativa em outros”, afirma. De positivo, ela aponta a pressão política exercida pelo Unicef, sem a qual, entende que, dificilmente, o Brasil teria avançado na área. Para efetivar sua atuação, o organismo infiltrou-se nos Ministérios da Saúde, da Educação e da Justiça. No entanto seus tentáculos vão além do plano federal: por intermédio de uma rede pulverizada de base, ele chega aos Estados e municípios, onde financia projetos locais e faz acompanhamento por meio de escritórios mantidos em quase todas as capitais do País. Dentro desse quadro, a pesquisadora tentou entender como o Unicef consegue operacionalizar a articulação política e promover uma agenda, evidentemente, pactuada pelo próprio país, na medida em que o Brasil participa das conferências internacionais e ratifica documentos ligados àquele organismo.

O Unicef foi criado em 1945, dentro do sistema da Organização das Nações Unidas (ONU), logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, com o objetivo de atender, basicamente, às mulheres viúvas e crianças órfãs de guerra. Inicialmente, seu foco era a área materno-infantil, mas, rapidamente, a agenda foi ampliada para as

temáticas de proteção de crianças e adolescentes. Esta guinada - acredita a pesquisadora - está relacionada à concepção que vem ganhando força no Liberalismo, segundo a qual, pensar no desenvolvimento de um país implica cuidar das crianças e dos adolescentes, sobretudo das crianças de zero a seis anos.

Pauta atende aos interesses dos países ricos Nos seus primeiros 25 anos, a atuação do Unicef limitava-se à forma de recomendação. Entretanto, a partir de 1970, a atuação foi ampliada, passando ao financiamento de programas e intervenção direta nas políticas públicas. Um exemplo dessa orientação é o Programa Estratégia Saúde da Família, pertencente ao Ministério da Saúde, mas inteiramente pautado, concebido e financiado pelo Unicef, que também faz o acompanhamento.

Por trás da atuação do Unicef, há a pressão de bancos internacionais dos países considerados ricos. Segundo Flávia Cristina Silveira Lemos, existem muitos estudos na Ciência Política apontando para a influência do bloco capitalista durante a guerra fria na pauta de todos os organismos ligados à ONU. “Isso me levou a observar que, apesar dos benefícios das políticas do Unicef, há, sempre, algum tipo de interesse econômico em jogo”, explica.

É neste sentido que aponta uma das conclusões da sua tese de doutorado, ao constatar que toda política do Unicef é calculada em termos de impacto econômico relacionado à segurança mundial. “Não há uma preocupação específica com a criança e com o adolescente. Mas, sim, uma preocupação mais ampla em que a criança e o adolescente acabam sendo instrumentalizados dentro de um objetivo político maior.” n

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Entrevista

Adriano Duarte Rodrigues

Cientistas atentos ao senso comum Para Adriano Rodrigues, essa é a grande mudança no século XXI Laís Teixeira

Walter Pinto

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rofessor Catedrático da Universidade Nova de Lisboa, Adriano Duarte Rodrigues é autor de uma longa obra que o tornou referência na área da Comunicação Social. Durante o mês de outubro, ele esteve, pela terceira vez, em Belém, onde ministrou seminários e palestras para alunos e professores da Faculdade de Comunicação e da Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia da Universidade Federal do Pará (PPGCOM). Em entrevista ao Beira do Rio, Adriano Duarte fala sobre o desenvolvimento do curso de Pós-Graduação em Comunicação na UFPA e avalia como promissora a vertente que busca interagir com a área ecológica. A seguir, leia a síntese dessa conversa.

Pós-Graduação O que considero mais importante nas transformações ocorridas no curso de Comunicação Social da UFPA é, certamente, o desenvolvimento do curso de pós-graduação. Isso, para mim, é algo novo. Das vezes anteriores que aqui estive, não havia pós-graduação. Então, as minhas intervenções eram extremamente pontuais, porque não havia uma infraestrutura de pós-graduação que justificasse a minha permanência mais demorada, como ocorreu desta vez. Por que considero esta transformação importante? Porque uma universidade só pode ser considerada plenamente universidade quando possui cursos de pós-graduação. O curso que não possui pós-graduação é, quando muito, um curso médio superior. A universidade é um espaço de criação do conhecimento e o conhecimento só

se cria ao nível pós-graduado. A graduação é mais uma transmissão, às novas gerações, de conhecimentos que outros produziram. A pós-graduação abre novos caminhos, novas pistas, novos horizontes à compreensão do

mundo. Concretamente, esse processo de comunicação faz dos seres humanos aquilo que eles realmente são, inseridos socialmente numa rede de interações com os outros e com o mundo à volta. Essa é a grande transformação que a área da

Comunicação Social da UFPA está vivenciando.

Perspectivas A experiência que tive na UFPA foi a de uma grande pujança. Encontrei jovens muito mo-


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tivados, com projetos não só interessantes, como também diversificados, com grande abertura e com uma cultura notável para um curso de pós-graduação ainda recente. Isso é extremamente encorajador. Foi uma grande satisfação a possibilidade de estabelecer diálogo e interlocução com esses jovens, uma experiência positiva e reveladora da grande motivação em cada um deles. Para não falar dos professores, com os quais tive a oportunidade de conviver mais de perto. Todas essas experiências são extremamente encorajadoras e, certamente, este projeto vai se consolidar com o acúmulo de novos conhecimentos.

Interdisciplinaridade A comunicação é uma área relativamente recente em nível universitário. Podemos dizer que ela tem, atrás de si, uma pré-história muito longa, que remonta aos gregos, de onde vamos buscar, muitas vezes, inspiração para aulas e artigos, assim como na lógica medieval. Então, como em qualquer ciência, temos uma pré-história longa. Em termos institucionais acadêmicos, podemos dizer que a Comunicação se consolida no século XX. É, portanto, muito recente. Atualmente, estamos retomando uma articulação interdisciplinar forte, com paradigmas que vêm de várias disciplinas e, aqui, na Região Amazônica, vejo uma articulação muito interessante da Comunicação com os estudos ecológicos. Isso vem retomar uma tradição nos estudos da Comunicação, que remonta ao princípio do século XX, com a Escola de Chicago ou o Colégio Invisível, de Gregory Bateson, da Escola de Palo Alto. Há um retomar desta via, eu diria numa perspectiva interacional da comunicação, sobretudo no Brasil, depois de uma época em que os estudos da comunicação se voltaram mais

para uma profissionalização com vista a uma mobilização em torno de projetos políticos e culturais do País. Hoje, percebo essa mudança em que se valorizam os estudos interacionais, a busca por uma lógica comunicacional entre indivíduos, comunidades e culturas. Não sei se me engano, mas é essa perspectiva que começo a pressentir, um pouco, nas margens dos grupos de pesquisa, que estão cada vez mais a tomar um terreno que acho muito promissor, positivo e importante.

“A pós-graduação abre novos caminhos para a compreensão do mundo.” Resistência Em todos os meus trabalhos, venho buscando incentivar o diálogo das equipes de Comunicação com antropólogos, sociólogos, historiadores, economistas e linguistas, pois entendo que é fundamental a interação entre equipes e disciplinas. Infelizmente, as universidades nem sempre apoiam a iniciativa. Embora, no plano do discurso, favoreçam a interação, na prática, torna-se muito difícil aprovar projetos interdisciplinares. E por que é difícil? Porque é bastante complexa a constituição de equipes de avaliação e de equipes interdisciplinares. No entanto é impensável elaborar um projeto de investigação em Comunicação que prescinda de pessoas experientes de áreas disciplinares diferentes. Em

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relação aos pesquisadores, no entanto, se quisermos ser realistas, infelizmente, nem sempre eles estão abertos à experiência interdisciplinar. Ainda persiste uma espécie de rivalidade, jeitos próprios de as equipes se defenderem. No entanto, à medida que o número de professores titulares se torne suficiente, essa concorrência, digamos, profissional deixará de estar em jogo, então, a interação interdisciplinar dará frutos. Se a comunicação der esse salto, penso que se firmará como ciência, experiência, saber, investigação e projeto.

racionalizar e para encontrar a razão de ser das coisas.

Senso comum

Inclusão linguística

Um dos aspectos mais interessantes na pesquisa em Comunicação é a capacidade que temos, hoje, de valorizar o senso comum, aquilo que eu chamaria conjunto de conhecimentos partilhados por uma comunidade. Durante muito tempo, as ciências positivas viveram a demarcação em relação ao senso comum. Hoje, se há coisas que os estudos da Comunicação podem trazer de novo à discussão é a atenção aos mecanismos de construção do senso comum. Este, talvez, seja o ponto central da mudança de paradigma que está a ocorrer na Comunicação no século XXI: fazer os cientistas se preocuparem não em descobrir as coisas nas costas das pessoas, mas formular aquilo que elas sabem sobre as suas experiências. Costumo dizer aos meus alunos que não existe nada que eles não saibam já. Eles já sabem sob a forma inconsciente, implícita. O que os cientistas fazem é explicitar as leis que regulam os fenômenos. E este aspecto é, talvez, o ponto mais importante que a Comunicação pode dar, hoje, ao meio científico: a descoberta da humildade do cientista perante o homem comum, do qual ele recebe as condições para pensar, para

Constantemente, estamos variando os registros da fala. Costumo distinguir as coisas, uma coisa é o discurso, outra coisa é a gramática. São domínios diferentes. Claro que eu utilizo a gramática para formular discursos, mas o discurso nem sempre é feito de frases gramaticais. Quando atendo ao telefone, digo “alô”, que não vem na gramática, mas é uma forma discursiva indicativa de que estou disponível para falar. Não me passa pela cabeça perguntar para um gramático se “alô” está gramaticalmente bem construído ou não. É uma forma discursiva. Quando falamos, não formulamos frases, dizemos enunciados, fazemos coisas, formulamos pedidos e nunca da mesma maneira. Costumo dizer que só um estrangeiro fala gramaticalmente bem o português. Os nativos estão sempre inventando novas formas e contribuindo para a renovação da língua. Eles adaptam a experiência linguística à situação concreta vivenciada. O estrangeiro, como não domina suficientemente a língua, apoia-se nas regras gramaticais para falar de maneira correta. Mas a língua é algo vivo como o meu coração, que bate todos os dias. n

“O que os cientistas fazem é explicitar as leis que regulam os fenômenos”


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Química

Camapu induz produção de neurônios Planta eleva capacidade de raciocínio e de memória Fotos Alexandre Moraes

Para responder aos questionamentos da indústria farmacêutica, os pesquisadores buscam parcerias para realizar o experimento em grande escala.

Amanda Pinho spécie de herbácea característica da Amazônia, a Physalis angulata produz um fruto amarelo, o camapu, amplamente conhecido na região. A planta tem propriedades curativas e já é, inclusive, estudada por produzir substâncias que ajudam no tratamento da leishmaniose. Recentemente, o Grupo de Pesquisas Bioprospecção de Moléculas Ativas da Flora Amazônica, da Universidade Federal do Pará (UFPA), descobriu, também, a existência de propriedades neurogênicas em substâncias produzidas pela planta. “Descobrimos que tanto o extrato aquoso da planta quanto a substância purificada apresentam atividade neurogênica, ou seja, eles estimulam o crescimento de neurônios”, explica o professor Milton

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Nascimento, integrante do Grupo de Pesquisa. Com apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PROPESP) e do governo do Estado, o grupo, que também é composto pelos pesquisadores Alberto Arruda, Mara Arruda, Consuelo Yumiko, Gilmara Tavares, Raquel Carvalho Montenegro e José Luiz do Nascimento, além dos alunos de Pós-Graduação Danila Alves e Marcos Vinícius Lebrego, busca convencer a indústria farmacêutica da viabilidade da droga. O professor Milton Nascimento lembra, também, que os responsáveis pela pesquisa já patentearam os processos de obtenção e farmacológico, tanto no mercado nacional quanto no internacional. Ao relembrar o início da pesquisa, em 2011, Milton Nascimento compara os resultados obtidos pela professora Gilmara Bastos com os de

Alexander Fleming, médico escocês que, acidentalmente, descobriu a penicilina. “Você faz um experimento olhando para um lado e, de repente, o experimento te revela outro, e foi o que aconteceu, especificamente, com o extrato dessa planta”, explica. Tratando-se de uma pesquisa completamente inédita, a propriedade neurogênica da substância produzida pela Physalis angulata pode vir a ser utilizada visando à elevação das capacidades de raciocínio e de memória, além de sinalizar uma possível reversão de morte neuronal que ocorre em pacientes com quadros de depressão, já que a substância induz o nascimento de novos neurônios. “Isso é uma coisa fantástica! O mundo vem buscando drogas capazes de induzir o crescimento neuronal”, comemora o professor.


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Do laboratório para a indústria farmacêutica Com a eficácia e a eficiência da droga comprovadas, os pesquisadores aguardam a segunda fase da pesquisa que, segundo o professor Milton Nascimento, é a saída da área acadêmica para a da indústria. A pesquisa também deve gerar publicações, o que, na avaliação do professor, é bom para o pesquisador, para a instituição e para os programas de pós-graduação envolvidos. “O grupo todo entende essa pesquisa como algo importante para a nossa instituição e para o Estado também”, afirma. Apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito nessa segunda fase

do projeto. No momento, os pesquisadores envolvidos estão trabalhando para oferecer mais subsídios que irão agregar valor à pesquisa. Depois de comprovados os efeitos da droga, foram levantados questionamentos relativos à capacidade produtiva da planta e a sua sazonalidade, assim como a necessidade da execução de testes clínicos. Milton Nascimento afirma que o processo se torna ainda mais delicado por se tratar de um produto natural complexo, incapaz de ser sintetizado em laboratório, por exemplo. “Hoje, estamos fazendo o estudo de viabilidade, verificando

a capacidade produtiva da planta e sua sazonalidade, com o intuito de saber quanto material orgânico pode ser gerado por hectare plantado”, exemplifica o professor. De acordo com o pesquisador, para o estudo sazonal da Physalis angulata, é necessário avaliar o metabolismo da planta e identificar, por exemplo, se a substância isolada está presente em todo o seu ciclo vegetativo, em que momento do ciclo é atingido o auge da produção dessa substância e, assim, como observar se há diferença de comportamento nessa produção entre os períodos seco e chuvoso, típicos da região.

Grupo está “no limite da produção acadêmica” O grupo de pesquisa encontra-se “no limite da produção acadêmica”, buscando responder aos questionamentos da indústria farmacêutica, quanto à capacidade de produção anual, à quantidade de biomassa necessária para se atingir tal produção e à área plantada exi-

gida para se alcançar tal quantidade de biomassa. Em laboratório, só se pode manusear alguns miligramas, enquanto, para atender as demandas da indústria, a produção deve chegar à casa dos quilogramas. De acordo com Milton Nascimento, nesta etapa, o grupo pretende estabelecer

parcerias, justamente para superar tais dificuldades. “Mais do que produzir a pesquisa, queremos transformá-la em benefício: um produto da UFPA, um produto da Amazônia. Por isso, estamos buscando parcerias para responder a essas perguntas”, conclui. n

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Comprovada a eficácia e a eficiência da Physalis angulata, agora, o grupo irá pesquisar a capacidade produtiva e a sazonalidade da planta.


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Feminicídio

Lei não diminui casos de violência Pesquisa levantou dados em delegacias, IML e imprensa local ELZA FIÚZA/ AGÊNCIA BRASIL

Ao comparar as ocorrências registradas nas delegacias com os números do IML, Grupo verificou alto índice de mortalidade entre mulheres vítimas de violência.

n Vitor Barros

M

esmo com a implantação da Lei Maria da Penha, em 2006, um dos marcos legais mais avançados no mundo, em se tratando de coibição da violência contra as mulheres, o Brasil é o sétimo país no ranking mundial por crimes praticados contra mulheres. Dados do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) indicam que, de 2001 a 2011, 50 mil mulheres foram assassinadas. Segundo o Mapa da

Violência 2013, as principais vítimas foram mulheres entre 15 e 24 anos, isto é, em idade produtiva. Segundo pesquisa apresentada em audiência da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos deputados, ocorrem cinco mil casos de assassinato de mulheres (feminicídio) por ano, no Brasil. Esses são alguns dos números estarrecedores, sem contar os casos de agressão, abuso sexual, invalidez por violência e outros crimes cometidos contra essa parcela da

população. Na Amazônia e, especificamente, em Belém do Pará, essa realidade não é diferente e os casos chocam pela perversidade com que essas mulheres são tratadas pelos maridos, namorados e ex-companheiros. Pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) têm-se debruçado nesse fenômeno, buscando apontar suas causas e definindo estratégias que visam diminuir os casos de violência. O Grupo de pesquisa “Violência contra a mulher e o discurso da mídia paraoara”, coordenado pela professora Vera Lúcia Lima, da Faculdade de Enfermagem da UFPA, é a versão atual de um projeto que se iniciou em 2010, fazendo levantamentos de casos nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM). Na versão atual, o projeto faz um estudo quali-quantitativo das narrativas da mídia a partir da análise de conteúdo. O objetivo é compreender a magnitude do fenômeno em números oficiais e intervir com estratégias de prevenção de violência utilizando a ação extensionista.

Reeducação de profissionais é necessário

perFiL daS

VÍtimaS

23% entre 26 e 30 anos 78% solteiras 33,67% com ensino fundamental incompleto

de acordo com a professora Vera Lúcia Lima, os estudos realizados constataram que a violência compromete as necessidades psicológicas e psicossociais de mulheres vítimas de violência. Mulheres que sofreram agressão têm a autoestima, sexualidade e visão de seus relacionamentos amorosos alteradas. Isso pode ser percebido no momento em que as vítimas precisam decidir denunciar ou não os agressores. Os resultados também revelam que são necessárias ações de reeducação da população e dos profissionais da saúde para que eles sejam capazes de diagnosticar, intervir e reduzir os índices de

violência doméstica. “Esse tema merece uma discussão multiprofissional, envolvendo a Academia e as autoridades do Estado, buscando o fortalecimento de Políticas Públicas e a implementação das leis que regem o problema. Além disso, devemos pensar meios e estratégias de conscientizar essas mulheres sobre os seus direitos e incentivá-las a buscar ajuda para que não cheguem a sofrer uma violência extrema”. Na pesquisa de campo feita na dEAM, foram entrevistadas 300 mulheres, cujo perfil é bastante peculiar. Segundo o levantamento, 23% delas estavam na faixa etária entre 26 e 30 anos, 78% eram solteiras, 33,67% tinham o ensino

fundamental incompleto, nesse caso, a dependência financeira em relação ao parceiro é maior. Outros dados destacam o estado físico em que essas mulheres chegam à delegacia. Muitas delas, vítimas de abuso sexual, com contusões, hematomas e outras agressões. Cerca de 80% dos casos aconteceram dentro de casa. Segundo a professora, a violência é um círculo que começa com discussões, chegando a casos de violência extrema, como esquartejamentos, cortes profundos, mortes por armas de fogo e outras agressões letais. “O círculo da discussão e do espancamento ocorre repetidas vezes, até chegar à violência máxima, que é a morte”, afirma.


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Ações de prevenção em Icoaraci e Guamá MARCELO CAMARGO/ AGÊNCIA BRASIL

Uma das ações do projeto levou os participantes a investigar, nas delegacias, ocorrências em um período de três anos e comparar com as entradas no Instituo Médico Legal (IML), com a finalidade de verificar se essas mulheres tinham morrido nesse intervalo de tempo. “Nós constatamos

que, nesse período, muitas mulheres foram vítimas de feminicídio, apesar de terem feito o registro nas delegacias especializadas ou nas delegacias do bairro”, afirma Vera Lúcia Lima. É na extensão que a Universidade pode intervir nessa realidade. Segundo a professora, “indo

para as ruas, com ações de conscientização, conseguiremos atingir não apenas as mulheres vítimas de violência, mas também a população de um modo geral”. O grupo já visitou vários bairros, como Icoaraci e a comunidade do Riacho Doce, no Guamá, com palestras e fóruns. n

Assassinatos de mulheres no Brasil

Fonte: Ipea * Ano de promulgação da lei


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Literatura

Espaço para belas palavras Memorial do Livro reúne bibliotecas de intelectuais paraenses Igor Lima

O acervo do livreiro Raimundo Jinkings faz parte do projeto.

Amanda Pinho

D

o papiro ao pergaminho, os registros dos primeiros livros datam de antes mesmo do nascimento de Cristo. Da mesma maneira que a morte do LP chegou a ser vislumbrada quando da aquisição dos CDs, a decadência do rádio com o surgimento da televisão, atualmente, debate-se a morte dos livros impressos, sob o argumento de que tal formato encontra-se prestes a ser substituído pelas novas tecnologias e novas mídias digitais. Flávio Nassar, pró-reitor de Relações Internacionais da Universi-

dade Federal do Pará (UFPA), afirma que o livro “não vai ser mais a única forma e, talvez, já não seja a mais preponderante de transmissão de conhecimento”, mas, ainda assim, detém seu valor e foi graças ao conhecimento difundido por essa plataforma que pudemos configurar a nossa sociedade como a concebemos atualmente. Por esse motivo, a Prointer desenvolve o Projeto Memorial do Livro Moronguetá. O nome, que, na língua indígena, significa “palavras cheias de beleza”, foi escolhido pelo próprio professor, o qual acredita que é essa a significação que

os amantes da leitura atribuem aos livros, “acreditamos que os livros contêm palavras cheias de beleza”. O intuito do projeto é “homenagear o livro”, mas também a leitura e os grandes escritores e intelectuais paraenses que contribuíram com suas coleções e acervos pessoais para o Memorial. “O Memorial do Livro quer fazer esta homenagem não só ao livro, mas também aos nossos grandes intelectuais do século XX”, explica o professor. Foi justamente na transição do século XIX para o século XX que os custos de produção e distribuição dos livros diminuíram, possibilitando que várias pessoas criassem suas bibliotecas particulares. O Memorial contará com bibliotecas e acervo, que incluem anotações, documentos e até mesmo objetos que procuram reconstruir o ambiente de criação desses intelectuais. “Interessa não apenas saber como Vicente Sales escreveu o Memorial da Cabanagem, mas também o que ele pesquisou, quais anotações fez, o que colecionou, enfim, como ele agia nesse período. Traçar o caminho intelectual do autor, buscar essas bibliotecas e preservá-las integralmente: as anotações, os papéis, as dedicatórias. Tudo passa a ter significado”, explica o pró-reitor.

Projeto inclui acervo de Eneida de Moraes

Saiba mais Acesse o blog do projeto http:// morongueta. tumblr.com/

Entre os autores cujos acervos e bibliotecas farão parte do Memorial, destacam-se: Eneida de Moraes, cuja biblioteca comporta uma grande quantidade de autógrafos e dedicatórias; José da Silveira Neto; Vicente Sales; Anunciada Chaves; Max Martins; Clóvis Moraes Rego; Raimundo Jinkings e outros que ainda estão em fase de negociação. A maioria das obras foi doada à UFPA pelas famílias desses autores. “A biblioteca do Clóvis Moraes

Rego, por exemplo, vamos tentar reconstruir o ambiente de trabalho dele tal e qual era quando ele parou de trabalhar. A ideia é que seja uma biblioteca memorial”, explica o pró-reitor. Ocupando provisoriamente as instalações do Fórum Landi, o Memorial do Livro funciona sob os cuidados de uma bolsista e de um casal de voluntários. Posteriormente, o Memorial ocupará parte do antigo convento dos padres jesuítas

de Belém, nos fundos do Museu de Arte Sacra. O local passará, ainda, por obras físicas antes de abrigar o Memorial do Livro. O professor considera que se trata de um local privilegiado, “tendo a vista do Forte do Castelo, da Casa das Onze Janelas, do Ver-o-Peso e da baia do Guajará”. Flávio Nassar conta um fato interessante: nesse mesmo lugar, por volta dos anos 1700, localizava-se a maior biblioteca da Amazônia. n


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A História na Charge

Em Tempo Guamá Bilíngue

Guamá Bilíngue II

Parfor

Projeto Guamá Bilíngue foi apresentado no Congresso Cátedra Unesco, realizado em novembro, na Argentina. Funcionando desde 2009, o projeto promove a educação em língua espanhola em duas escolas públicas localizadas no bairro Guamá. As aulas ocorrem três vezes por semana, nas salas de aula da Faculdade de Línguas Estrangeiras Modernas (Falem).

Além de ensinar a língua espanhola, o projeto fomenta a formação cidadã, utilizando material didático elaborado especificamente para atender demandas de alunos de escolas públicas localizadas em zonas de vulnerabilidade social. O projeto é subsidiado pela Pró-Reitoria de Graduação, por meio do Programa de Apoio a Projetos de Intervenção Metodológica.

Estão abertas as inscrições para o Plano Nacional de Formação de Professores da UFPA. Até o dia 13 de janeiro de 2014, professores da rede pública podem realizar a pré-inscrição para um dos 18 cursos de licenciatura, entre eles, Pedagogia, História e Artes Visuais. Mais informações na Plataforma Freire < http://freire.mec. gov.br/index/principal>

Justiça

Distribuição

Caminhar

O Laboratório de Justiça Global e Educação em Direitos Humanos na Amazônia, vinculado ao Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, firmou parceria com a Universidade de Frankfurt para realizar projeto de pesquisa-intervenção. Entre os resultados, está a Série “DHiaLOGOS - Lugar de Direitos”, encontros mensais que propõem a construção de um pensamento acadêmico.

Desde novembro, o Jornal Beira do Rio tem quatro pontos fixos de distribuição da sua versão impressa: Biblioteca, Centro de Convenções, RUs Básico e Profissional. Em cada um desses espaços, foram instaladas caixas que receberão exemplares a cada nova edição. Se preferir, o leitor também pode acessar o site http://www. jornalbeiradorio.ufpa.br/novo/

O Serviço de Crescimento e Desenvolvimento Caminhar, do Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza, está arrecadando brinquedos, jogos, DVDs educativos, revistas em quadrinhos para realizar o Natal das crianças atendidas pelo Serviço. Os produtos podem ser entregues no Hospital, das 9h às 17h, de segunda a sexta-feira. Informações: (91) 3201-8572.



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