Beira 124

Page 1

ISSN 1982-5994

UFPa • aNo XXiX • N. 124 aBriL e Maio, 2015

anos

Farinha de pupunha é matéria-prima para produtos de panificação Páginas 6 e 7

Nesta edição

• Dissertação gera patente para UFPA • Animais sobrevivem à degradação


2-

Beira

do

rio

-

Abril e MAio, 2015

UniVeRSidAde FedeRAL dO PARÁ JORNAL BEIRA DO RIO cientificoascom@ufpa.br Direção: Prof. Luiz Cezar Silva dos Santos Edição: Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE) Reportagem: Brenda Rachit e Marcus Passos (Bolsistas); Walter Pinto (561DRT/PA) Fotografia: Adolfo Lemos, Alexandre Moraes e Amanda Pinho Fotografia da capa: Adolfo Lemos Ilustrações: CMP/Ascom Charges: Walter Pinto Projeto Beira On-line: Danilo Santos Atualização Beira On-Line: Rafaela André Revisão: Júlia Lopes e Juliana Couto Projeto gráfico e diagramação: Rafaela André Marca gráfica: Coordenadoria de Marketing e Propaganda CMP/Ascom Secretaria: Silvana vilhena Impressão: Gráfica UFPA Tiragem: Mil exemplares

Reitor: Carlos Edilson Maneschy vice-Reitor: Horácio Schneider Pró-Reitor de Administração: Edson Ortiz de Matos Pró-Reitora de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Edilziete Eduardo Pinheiro de Aragão Pró-Reitora de Ensino de Graduação: Maria Lúcia Harada Pró-Reitor de Extensão: Fernando Arthur de Freitas Neves Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Emmanuel Zagury Tourinho Pró-Reitora de Planejamento: Raquel Trindade Borges Pró-Reitor de Relações Internacionais: Flávio Augusto Sidrim Nassar Prefeito: Alemar Dias Rodrigues Junior Assessoria de Comunicação Institucional - ASCOM/UFPA Cidade Universitária Prof. José da Silveira Netto Rua Augusto Corrêa, n.1 - Prédio da Reitoria - Térreo CEP: 66075-110 - Guamá - Belém - Pará Tel. (91) 3201-8036 www.ufpa.br


Abril e Maio, 2015

D

urante o primeiro trimestre do ano, ela invade as feiras e as mesas dos paraenses. Tradicionalmente, é apreciada com uma xícara de café puro. Nas mãos dos novos chefs de cozinha, a pupunha é ingrediente para diversos pratos. Em pesquisa realizada no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, da UFPA, a pupunha do tipo Vaupés, conhecida pela freguesia por ser mais seca, ganhou nova finalidade e valor de mercado. Com alto valor nutricional, o fruto foi transformado em farinha para ser utilizada em sopa, mingau e produtos de panificação. Para comemorar os 30 anos do Jornal Beira do Rio, esta edição traz três convidados. A jornalista Jimena Felipe Beltrão discute a divulgação da ciência na Amazônia, com o Artigo Um jornalismo recente que atingiu a maioridade; o professor Sílvio Holanda divide conosco os tesouros que tem encontrado na Biblioteca Central e o fotógrafo Wagner Meier ilustra estas páginas com linda imagem da praia de Algodoal (PA). Ainda temos: pesquisa de mestrado que rendeu registro de patente para a UFPA, entrevista com a antropóloga e historiadora Lilia Schwarcz e as melhores fotos da missão #leitoresUFPA, publicadas no @ufpa_oficial. Boa leitura! Rosyane Rodrigues Editora

-

Beira

do

Rio

-3

Índice Um jornalismo recente, que atingiu a maioridade ...................4 Cardápio enviado pelo smartphone ....................................5 Pães, bolos e macarrão ..................................................6 Poucas espécies e grande número .....................................8 “Não tenho preconceitos. Todas as leituras são válidas” ......... 10 Desafio Universitário Empreendedor ................................. 12 Inovação tecnológica computacional ................................. 14 Tesouros da Biblioteca Central ....................................... 16 A história que surge do caos documental ............................ 18

“Excelente é o que, certamente, eu diria sobre minha experiência no Beira do Rio. O ambiente universitário, o dia a dia no campus e as reuniões da Reitoria ajudaram a me tornar uma pessoa mais profissional, organizada e focada no trabalho.” Wagner Meier, fotógrafo


4-

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Alexandre Moraes

Opinião

Markus Kammerer/Free Images

Um jornalismo recente, que atingiu a maioridade

O

Beira do Rio faz 30 anos. A Ciência e o Jornalismo comemoram. Divulgação de Ciência na história recente da Amazônia tem nomes bem definidos e é fruto de perspectivas e lideranças surgidas na primeira metade dos anos 80, no cenário da Ciência e da Tecnologia da região, que entenderam e assumiram o compromisso com um exercício contínuo e sistemático de tornar pública a Ciência. Passadas três décadas, é preciso não só vislumbrar a consolidação dos meios mas também permitir o estabelecimento de veículos inovadores para o seu tempo. Mais do que falar sobre a experiência de divulgação da Ciência na Amazônia, na Amazônia Brasileira, na Pan-Amazônia, falar do lugar onde estamos seja mais adequado. Para mim, são três os exemplos mais importantes, emblemáticos e inspiradores da prática de tornar pública a Ciência na região. O Jornal do Trópico Úmido, Embrapa, então Centro de Pesquisas do Trópico Úmido (CPATU/Embrapa); o jornal Destaque Amazônia, publicado pelo Museu Goeldi; e o Beira do Rio, que tem, em comum, ao longo de sua história, alguns momentos de interrupção que padecem de justificativa e que nos deixam lacunas profundas nessa trajetória. Pioneiros na proposta de divulgar Ciência na Amazônia e a partir das instituições

de pesquisa mais importantes e uma das mais antigas do Brasil e a mais antiga do norte do País, que é o Museu Paraense Emilio Goeldi, esses títulos foram responsáveis pelo que, hoje, ainda se faz na região, no que respeita o divulgar de Ciência. Falo aqui do que conheci de perto e de veículos, partícipe que sou das trajetórias de dois dos veículos de referência e âncoras da divulgação da Ciência na Amazônia. Estagiária em ambos e, anos depois, editora do Destaque Amazônia até março de 2014. Aprendi o ofício pelas mãos de jornalistas experientes, como Rosa Leal, no Goeldi e na UFPA, bem como do veterano da Assessoria de Comunicação da UFPA, Walter Pinto. A partir das experiências do Pará, identificamos não só as publicações mas também uma tradição de formar jornalistas, profissionais dedicados à cobertura de Ciência na região. Não temos uma escola, não temos uma vertente dedicada ao tema nos cursos de graduação, mas temos iniciativas de prática e de pesquisa, que vão aos poucos se expandindo. Assim, ficam os registros e os profissionais com nome e sobrenome, como Raimundo José Pinto, Ruth Rendeiro, para aquinhoar os pioneiros, responsáveis, junto aos demais, por transformar os códigos específicos da Ciência. Árdua tare-

fa, muitas vezes, incompreendida por pesquisadores preocupados em não se deparar com suas falas, às vezes, alteradas no processo de comunicação. Ainda levaremos muitas outras décadas para não só cobrirmos Ciência na intensidade que ela merece e de que a sociedade necessita mas também sermos capazes de abrir mais canais, sensibilizar os meios de comunicação para uma cobertura dedicada dessas temáticas. O conteúdo, a informação credenciada, a fonte de respeito e um texto de qualidade são permanentes numa equação que se resolve à base de dedicação, estudo, reflexão, competência e trabalho. A dedicação, o estudo, a competência e o trabalho só são alcançados através de uma formação continuada; da possibilidade de refletir sobre o que fazemos e de uma sistemática produção de conteúdos reveladores do que a Ciência é capaz. Simples assim, complicado assim, complexo assim, como só a vida pode ser e que sempre encontra possibilidades de aperfeiçoamento. Defendo a estruturação de uma Agência de Notícias que dê máxima visibilidade à produção jornalística sobre Ciência, Tecnologia e Inovação da Amazônia Oriental. Com caráter suprainstitucional, dedicada à contínua abertura de espaços e canais de veiculação de conteúdos sobre Ciência, essa instância é um desafio e uma meta a serem alcançados. Defendo, ainda, o estabelecimento de um programa de formação de recursos humanos voltado para a comunicação de Ciência como suporte à formação continuada dos comunicadores, na busca de um equilíbrio entre o profissional e o acadêmico, com ênfase na produção de estudos que analisem os temas relativos à comunicação de Ciência . Da iniciação científica à pós-graduação. Jimena Felipe Beltrão - Jornalista, Ph.D em Ciências Sociais pela University of Leicester. Atualmente, é analista em Ciência e Tecnologia do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG). jbeltrao@museu-goeldi.br


Abril e Maio, 2015

-

Beira

do

Rio

-5

Nutrição

Cardápio enviado pelo smartphone Alunos desenvolvem aplicativo para restaurante institucional Adolfo Lemos

Marcus Passos

O

número de smartphone, os chamados ‘telefones inteligentes’, só aumenta ao redor do mundo. Somente no mercado brasileiro, no ano de 2014, o número de usuários dessa ferramenta chegou à marca de 38,8 milhões. Com um sistema operacional avançado, que permite executar diversos programas, esse produto facilita o acesso a informações relacionadas à alimentação, saúde, cultura e a diversas outras áreas. Esses programas, ou melhor, esses aplicativos (App) representam significativa diferença entre os smartphones e os outros celulares. E visando aproveitar essa tecnologia da informação, um grupo de estudantes do 8° semestre da Faculdade de Nutrição, da Universidade Federal do Pará, desenvolveu o aplicativo chamado Rancho 2º BIS, que oferece informação acerca de um restaurante institucional. Atualmente, o software está hospedado no site fabricadeaplicativos, plataforma on-line para

criação de Apps. Nesse endereço, qualquer pessoa pode desenvolver seu próprio aplicativo. Mas o desejo dos alunos Alice Reis, Talita Berino, Fabrício Medeiros, Thiago Oliveira, Bianca Garcia, Adriana Sousa, Roseani Angelim, Lívia Dias e Aline Silva, responsáveis pela criação, é que, futuramente, a ferramenta possa estar no Google Play, Windows Store e App Store – lojas on-line para distribuição de aplicativos. O Rancho 2° Bis foi desen-

volvido na disciplina Administração de Serviços de Alimentação, da Faculdade de Nutrição, sob a coordenação dos professores Bruno Morais e Cláudia Dutra. “O trabalho final consistiu na elaboração de um plano de negócios e essa equipe ficou responsável por uma unidade de alimentação e nutrição de uma organização militar de Belém. Foi iniciativa dos alunos, no sentido de melhorar e acompanhar o serviço de alimentação”, afirma Cláudia Dutra.

Software deve atender usuários e gestores O plano de negócios compreende a caracterização do empreendimento, a estrutura física, o planejamento dos recursos humanos, a compra de alimentos, a elaboração do cardápio e a análise de custos de uma unidade de alimentação e nutrição. Por ser um instrumento de acesso fácil e rápido, o aplicativo tem um impacto positivo na gestão de unidades de alimentação coletiva. Para Aline Reis, integrante da equipe que desenvolveu o projeto, “a disciplina agregou vários conhecimentos que nós pudemos aplicar no trabalho final”. Foram muitas discussões até a finalização do software. “Começamos este trabalho do

zero. Planejamos o layout, a logística e os recursos humanos. Pensamos no aplicativo como uma fonte de informação voltada à promoção do bem-estar e da saúde dos comensais. Essa será uma ferramenta muito importante dentro da unidade de alimentação e nutrição, em que o nutricionista não precisará fazer nenhuma coleta manual”, afirma Talita Berino, membro da equipe do Rancho 2° BIS. Ao acessar o aplicativo, o usuário obterá informações sobre o cardápio e seu valor energético total, pesquisas de satisfação sobre o sabor dos alimentos, o serviço e a limpeza do ambiente, além de orientações nutricionais e fotos dos alimentos.

Mesmo com versão apenas de leitura, o aplicativo surge diante desse mercado de usuários de smartphones, que só cresce em todo o mundo. “Nós optamos pelo aplicativo devido à alta acessibilidade. Com o smartphone, você baixa o App e já tem acesso a muitas informações. É mais prático e também uma ótima ferramenta de feedback com o cliente”, avalia a estudante Talita Berino. Para a professora Cláudia Dutra, “o excesso de peso e a obesidade são problemas de saúde mundial”, assim, ao enviar dicas nutricionais, o software tenta combater a má alimentação e a obesidade. A proposta é que outras unidades de alimentação institucional também possam usufruir dessa ferramenta.

O aplicativo Rancho 2º BIS fornece aos usuários o cardápio com valor energético e dicas nutricionais.


6-

Beira

do

rio

-

Abril e MAio, 2015

Inovação

Pães, bolos e panetones Farinha de pupunha é matéria-prima para produtos de panificação FOTOS ADOLFO LEMOS

Da esquerda para a direita: o professor Antônio Manoel Rodrigues e os estudantes Marlia Pires, Yasmin Nóvoa e Paulo Chada.

Brenda Rachit

O

paraense tem várias paixões relacionadas à culinária, entre elas, estão o açaí, a manga com sal e as farinhas de mandioca e tapioca. A Pupunha (Bactris gasipaes Kunth) também faz parte dessa lista. Cozida e muito apreciada com um café quente, a pupunha pode ser comprada nas feiras ou no trânsito, quando vendedores ambulantes aproveitam o engarrafamento para oferecer a iguaria. Mas é comum ouvir reclamações do tipo “essa pupunha tá muito seca”, “essa não é da boa” quando o freguês se depara com uma determinada variedade do fruto. O tipo Vaupés, por exemplo, apresenta uma pupunha de polpa mais seca, com menor teor de lipídios, ou

seja, é menos gordurosa do que a pupunha tradicional. Por não agradar a maioria dos consumidores, o tipo Vaupés tem um valor comercial inferior. O que poucos sabem é que essa variedade do fruto apresenta um elevado valor nutricional. Provitamina A, compostos bioativos, fibra, selênio são alguns dos elementos encontrados em sua composição. A riqueza pouco conhecida desse tipo de pupunha fomentou pesquisas que trouxessem um novo mercado de produção e consumo para o fruto. Foi assim que Marlia Barbosa Pires elaborou a Dissertação Obtenção de farinhas de pupunha (Bactris gasipaes Kunth) para aplicação no desenvolvimento de produtos, orientada pelos professores Antônio Manoel da Cruz Rodrigues e Luiza Helena Meller da Silva. A pesquisa foi desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGCTA), do Instituto de Tecnologia da Universidade Federal do Pará. O estudo apropriou-se das características dessa pupunha com maior teor de amido para a elaboração de farinhas que pudessem ser utilizadas sozinhas ou como complemento na formulação de novos produtos. “O estudo apresenta as propriedades que são consideradas visando à aplicação industrial da farinha, além de demonstrar em quais produtos ela poderia ser utilizada e as possibilidades de obtermos um resultado positivo”, explica Marlia Pires.


Abril e Maio, 2015

Desdobramento da pesquisa gerou novos produtos A pesquisadora diz haver estudos que demonstram o uso da farinha da pupunha na formulação de mingau para merenda escolar. Esse complemento teria melhorado a carência de Provitamina A dos alunos, já que há um déficit dessa vitamina na Região Amazônica. Marlia Pires também cita estudos que apontam a farinha da pupunha como coadjuvante na ação de medicamentos que combatem essa deficiência nutricional. Durante as análises, as farinhas foram processadas, no laboratório, de várias maneiras: com e sem cozimento e com e sem casca. A prioridade das análises estava nas propriedades tecnológicas apresentadas, tais como, capacidade de absorção de água e absorção de óleo, capacidade emulsificante, viscosidade e capacidade de gelatinização do amido. Segundo a pesquisadora,

esses fatores determinam o comportamento da farinha em diferentes produtos. “Avaliando todas essas características, determinou-se, a partir desses estudos, que os produtos mais adequados para a utilização da farinha da pupunha, independente do tratamento, seriam os produtos de panificação”, afirma. Pães, bolo, panetone, sopa e mingau são alguns dos produtos que poderiam ser formulados tendo a farinha de pupunha como ingrediente. Como a pesquisa foi desenvolvida em parceria com o Centro de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sob orientação da professora Edna Regina Amante, parte dos experimentos foi realizado na UFPA e parte, na UFSC. O professor Antônio Manoel Rodrigues destaca a parceria como uma forma de estreitar as relações entre as instituições e divulgar uma

matéria-prima regional. Outro ponto positivo foi a inserção de novas metodologias de ensino no laboratório do PPGCTA. A dissertação defendida por Marlia Pires fomentou outros estudos, como o Trabalho de Conclusão de Curso da graduanda em Engenharia de Alimentos Yasmin Nóvoa. A estudante desenvolveu um macarrão a partir da farinha da pupunha. Assim como a farinha, a massa também não apresenta glúten em sua composição, uma característica que poderá atender uma parcela de consumidores diferenciada. “Esse é um mercado pequeno, mas comercializa para pessoas preocupadas com a alimentação, que buscam produtos que tragam benefícios, seja do ponto de vista nutricional, seja do ponto de vista fisiológico. Hoje, já existe um grupo bem seletivo que investe nisso”, avalia o professor Antônio Manoel.

Casquinha apresenta o mesmo sabor da tradicional As pesquisas não pararam por aí. O bolsista de Iniciação Científica Paulo Chada trabalhou na elaboração de uma casquinha de sorvete também feita a partir da farinha da pupunha. Paulo Chada e Yasmin Nóvoa foram orientados pela professora Luiza Helena Meller da Silva. A casquinha de sorvete também não contém glúten e não apresenta sabor muito diferente do da casquinha tradicional. Segundo os pesquisadores, esses resultados contribuem para que a pupunha do tipo Vaupés, rejeitada na forma de consumo tradicional do paraense, possa ser valorizada e redirecionada no mercado consumidor. “É uma questão de mostrar que essa matéria-prima apresenta qualidade e deve ter seu plantio continuado. Então, essa é uma resposta que a academia procura fornecer à sociedade”, diz Marlia Pires. A pesquisadora afirma que a pupunha tem uma produção bastante vasta na região, em razão da comercialização do palmito,

bastante conhecido dentro e fora da Região Norte. O mesmo não acontece com o fruto da pupunha. “É um fruto típico da Região Amazônica, que não é muito conhecido no restante do País, e essa é uma forma de divulgar o potencial da pupunha”, afirma. Atualmente, a pesquisa continua fomentando novos estudos, mantendo a parceria com o Centro de Ciência e Tecnologia da UFSC. O trabalho está em fase de registro de patente, consequência positiva dos resultados encontrados nas análises da pupunha e dos processos aos quais foi submetida. As conclusões da pesquisa podem possibilitar aos empreendedores uma alternativa de comercialização dessa variedade de pupunha. “Nós visamos a um material que possui boa produtividade e poderia atender o pequeno e médio setor de produção. Essas informações disponibilizadas facilitam futuras parcerias entre mercado e Universidade”, afirma o pesquisador Antônio Manoel.

-

Beira

do

Rio

-7


8-

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Biologia

Poucas espécies e grande número Pesquisa registra presença de animais na área da Infraero Fotos Acervo do Pesquisador

Durante o monitoramento, pesquisadores utilizaram metodologias diferentes de captura e identificação.

Marcus Passos

C

om o desenvolvimento das cidades ocasionado, principalmente, pelos fenômenos da industrialização e urbanização, as áreas de floresta com alta densidade de árvores tornaram-se escassas no perímetro urbano. Um desses caros espaços está localizado na área operacional da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) de Belém. Uma região que apresenta 160 hectares de mata. Em 2013, a Infraero - responsável pela administração dos principais aeroportos do Brasil procurou a Universidade Federal do Pará (UFPA), especificamente, o Instituto de Ciências Biológicas, e firmou parceria para realizar o levantamento dos animais silvestres do fragmento florestal localizado dentro da área de operação do

Aeroporto Internacional de Belém. O resultado foi a elaboração do Projeto de Pesquisa “Monitoramento da fauna de mamíferos terrestres na área operacional da Infraero em Belém”. Coordenado pela professora Ana Cristina Mendes de Oliveira e com a participação de duas alunas de Iniciação Científica da UFPA, o trabalho tem como objetivo conhecer a fauna de mamíferos existentes no setor operacional da Infraero. Futuramente, essas informações poderão ser integradas a objetivos maiores, como o mapeamento da fauna nos fragmentos florestais urbanos da Região Metropolitana de Belém. Para Ana Cristina Oliveira, “o levantamento da fauna de um único fragmento não responde muita coisa, mas quando você começa a entender quantas e quais as

espécies de mamíferos ainda estão sobrevivendo nos diversos fragmentos, é possível começar a pensar em estratégias mais efetivas para a conservação desses fragmentos”. A partir daí, é possível saber onde essa fauna está concentrada, quais espécies têm sido mais afetadas, quais fragmentos precisam ser recuperados, quais ainda sustentam a fauna e podem servir de receptores para animais apreendidos pelo Ibama. A pesquisadora esclarece, ainda, que os fragmentos florestais urbanos não são meramente cênicos, eles exercem função importante na manutenção do microclima da cidade, na proteção e manutenção dos mananciais hídricos, além de amenizar a poluição atmosférica. A fauna silvestre é um grande indicativo da saúde e integridade desses fragmentos florestais, daí a importância de monitorá-la.


Abril e Maio, 2015

-

Beira

do

Rio

-9

Macacos, tatus e cutias estão entre os animais identificados Durante o período de monitoramento, a pesquisa aplicou uma metodologia específica para cada grupo de mamífero. Em termos metodológicos, os pequenos mamíferos, que incluem os pequenos roedores e marsupiais, estão separados dos médios e grandes mamíferos, que incluem animais como: cutias, pacas, veados, porcos, primatas, antas, felinos e canídeos. Isso ocorre, porque cada fauna necessita de técnicas diferenciadas para serem acessadas. No caso específico do fragmento da Infraero, a pesquisa realizou 102 registros de mamíferos de médio e grande porte, de seis espécies diferen-

tes. O método mais utilizado para registrar este grupo foi o de armadilhamento fotográfico, que consiste em uma máquina fotográfica acoplada a uma caixa plástica de proteção, que é fixada nas árvores, a uma altura de 40 cm. Essa armadilha possui um sensor de movimento e calor, que dispara três fotos contínuas no exato momento em que o animal passa em sua frente. Entre os bichos identificados, estão preguiças, macacos, tamanduás, tatus, cutias e cachorro do mato. Além das armadilhas fotográficas, foram usadas outras metodologias para inspecionar os mamíferos médios e grandes, como o censo por transecção li-

near, que consiste em seguir em trilhas, em silêncio, bem cedo, pela mata. E a busca por vestígios, pois os mamíferos deixam muitas marcas, como pegadas, fezes ou vocalização por onde andam. “Durante todo esse trabalho, fomos escoltados por seguranças da Infraero, a qual também nos deu todo apoio logístico para desenvolver a pesquisa”, explica a professora Ana Cristina Oliveira. Em relação aos pequenos mamíferos, a pesquisa registrou 80 animais, de cinco espécies diferentes, segundo as bolsistas do projeto, Jaqueline Almeida e Letícia Braga da Silva. Entre os métodos de coleta utilizados, estão as

armadilhas de contenção de animais vivos, que são de dois tipos, a Tomahawk (gaiola) e a sherman (chapas de alumínio). A s a r m a d i l h a s To mahawk são confeccionadas em grades de arame. Enquanto as armadilhas sherman são feitas em chapas de alumínio de vários tamanhos, dobráveis ou não. “Ela é pequena, toda fechada e tem um sistema de pedal/disparo, que é acionado quando o animal entra no local e pisa no pedal, fazendo a porta se fechar. Nessas ferramentas de contenção de animais vivos, nós utilizamos iscas feitas com pasta de amendoim, fubá, sardinha ou frutas”, explica Jaqueline Almeida.

Espécies sobrevivem com baixa demanda ecológica Outro método de captura utilizado foi o da armadilha de interceptação e queda (pitfalls). Ela consiste na instalação de quatro baldes de 60 litros enterrados até a borda, a uma distância de 15 metros um do outro, interligados por uma cerca guia de plástico sustentada por estacas de madeiras. O animal é surpreendido pela cerca guia no ambiente, ao tentar escapar, ele segue até cair dentro de um dos baldes. Os pequenos mamíferos são coletados pela equipe por causa da sua difícil identificação. Alguns são sacrificados e colocados em uma coleção de referência, que passará por

medições técnicas. Em relação aos médios e grandes mamíferos, não há coleta, pois são mais fáceis de visualizar e identificar em campo. As principais conclusões do estudo dizem respeito à baixa quantidade de espécies encontradas no local. “Nós encontramos seis espécies de médios e grandes mamíferos e cinco, de pequenos mamíferos. Esse número é considerado muito baixo. São poucas espécies, mas em altíssima abundância. São espécies com baixas demandas ecológicas, que ainda conseguem tolerar ambientes degradados com alto grau de perturbação. Como os preda-

dores do topo da cadeia trófica não estão mais presentes nestes fragmentos, estes animais que persistem acabam aumentando sua abundância”, explica Ana Cristina Oliveira. Os fragmentos florestais da Região Metropolitana de Belém encontram-se em diferentes níveis de degradação e apresentam diferentes capacidades de suporte para a fauna, incluindo recursos alimentares e abrigo. Os mamíferos exercem papéis importantes na manutenção da floresta, como dispersão de sementes, predação, herbivoria e ciclagem de nutrientes. “O desaparecimento dos mamí-

feros, bem como do restante da fauna silvestre nestes fragmentos urbanos, certamente, favorecerá o colapso destas áreas de florestas nativas, em médio e longo prazo”, prevê a professora Ana Cristina. O próximo passo é reunir as informações dos vários fragmentos urbanos que já foram monitorados ao longo dos anos e verificar as relações entre o tamanho do fragmento, a diversidade existente e o nível de degradação do local. Em seguida, publicar um artigo científico sobre essas informações, para que elas possam ser usadas pela sociedade e pelos órgãos de Gestão Ambiental.


10 -

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Entrevista

Lilia Schwarcz

“Não tenho preconceitos. Todas as formas de leituras são válidas” Historiadora e antropóloga defende as adaptações da história para o formato de HQ. Walter Pinto

P

rofessora titular no Departamento de Antropologia da USP e Global Scholar na Universidade de Princeton (EUA), a historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz esteve na UFPA participando do Seminário Itinerante “Agenda brasileira: temas fundamentais para a sociedade”, organizado pela professora Edna Castro, coordenadora do NAEA. Na ocasião, lançou, juntamente com o historiador André Botelho, da UFRJ, a Coleção Agenda Brasileira. Autora de vários livros, a historiadora conquistou três prêmios Jabuti, o de 1999, com As barbas do imperador - D. Pedro II; o de 2009, com O Sol do Brasil; e o de 2010, com Um enigma chamado Brasil. Em Belém, ela falou sobre a sua trajetória, as suas experiências com história em quadrinhos e a produção para o ensino médio.

Formação

ALEXANDRE MORAES

Sou historiadora e antropóloga. Esta condição me leva a dizer que sou uma terceira margem. Os historiadores falam: “não liga, não, ela é antropóloga”. Já os antropólogos dizem: “não liga, não, ela é historiadora”. Por um

momento, ministrei aulas junto com um antropólogo e ele dizia: “A diferença é que ela coloca logo os gregos no meio”. Eu tento trabalhar nessas “fronteiras”, que são boas para pensar. Acho interessante tentar tirar o melhor de ambas, ou seja, o rigor do historiador no uso das fontes e o aporte teórico da Antropologia, com destaque à eficácia simbólica e à questão da igualdade.

Amazônia A Amazônia sempre esteve na nossa Agenda, primeiro, como um imenso desconhecido, como diz o Roberto DaMatta em O que faz o brasil, Brasil?. Se pensarmos na importância da Amazônia, região que se conformou como um Estado separado, de negociação muito mais direta com a metrópole portuguesa, e mesmo com a Europa, do que com o resto daquilo que se chamava Brasil, veremos que a Amazônia sempre fez parte dos programas estratégicos do nosso país. Não foi por acaso que o Marquês de Pombal dedicava à Amazônia um “cuidado” muito grande, no sentido de manter um controle absoluto sobre aquilo que eles chamavam de especiarias.


Abril e Maio, 2015

No momento atual, nós, antropólogos, sabemos da importância das populações e do imenso patrimônio material e imaterial que temos aqui, na região. A Amazônia cumpre um papel estratégico, sempre esteve nas questões cruciais do País, mas a partir de ângulos diferentes.

Agenda Brasileira Vimos a Belém lançar uma coleção organizada por mim e pelo historiador André Botelho, voltada, principalmente, para o ensino médio. Em 2001, fizemos uma primeira experiência editorial chamada Agenda Brasileira, que resultou num livro muito bem recebido. Veio em sequência à outra publicação. Ambas, de alguma maneira, decorrentes do trabalho Pensamento social no Brasil, realizado por um grupo de pesquisadores experientes, que se reúne com frequência. A coleção é voltada, principalmente, para o ensino médio a partir da alegada ausência de diálogo deste ensino com a universidade. É um enorme desafio escrever para um público amplo e diversificado, formado por universitários, estudantes de ensino médio e público em geral, sem simplificar. A ideia da coleção foi discutir os grandes temas da nossa agenda, as questões da cidadania, dos direitos, dos limites, do direito à diferença. A coleção, de alguma maneira, envolve essas questões. Quatro livros já foram publicados e há outros quatro em elaboração. Mas a coleção não está fechada, afinal, como dizemos, “cidadania é tema de agenda aberta”.

Ensino médio Trabalhar com o ensino médio tem sido uma preocupação constante. Ainda no mestrado, publiquei meu primeiro livro em quadrinhos, o Da Colônia ao Império: um Brasil para inglês ver, uma parceria

com o cartunista Miguel Paiva. Dois anos depois, escrevi Cai o Império! República volver, ilustrado pelo Angeli. Foi uma experiência muito divertida, de muito sucesso na época, editado pela Brasiliense. Tive que vencer a resistência do meu orientador. Ele não entendia muito bem para que fazer um livro de quadrinhos. Minha terceira experiência com história em quadrinhos foi o Dom João Carioca, escrito por ocasião do centenário da vinda da Corte. Foi esta a minha primeira publicação com o Spacca. Mais recentemente, publiquei As barbas do Imperador, também com ele, a partir da minha tese. Também fiz outro livro em quadrinhos que se chamou O Império em procissão. Conta o momento da coroação de Dom Pedro II, a partir dos detalhes: se chovia ou fazia sol, como as pessoas se vestiam, qual o cardápio oferecido, o que elas viram e o que o rei trajava. Pretendi, a partir desses pequenos eventos, contar uma história mais ampla. Mesmo na Companhia das Letras, onde atuo como editora de não ficção, e, para a área infantil, desenvolvo uma proposta que busca fazer a ponte entre a academia e o público mais amplo.

nos oferecem. Eu fui socializada nesse mundo de livros desde pequena e acho que toda leitura é válida e importante. Lamento que haja muito preconceito com a ideia de adaptação e ainda mais em relação aos quadrinhos. Mas tive a sorte de trabalhar com cartunistas muito sérios, verdadeiros pesquisadores, como o Spacca. Ele não faz um desenho sem pesquisar a iconografia da época, sem que vá a um arquivo e pesquise junto comigo.

“É um enorme desafio escrever para o ensino médio”

História e HQ Sempre fui uma aficionada por quadrinhos. Meu pai era francês e me alfabetizei lendo revistas como Tim Tim e Asterix, em francês. Não tenho preconceito com as formas de leitura. Penso que todas são importantes, desde que induzam o leitor à viagem que os livros

Mov imentos sociais

O Brasil entrou na agenda dos direitos civis em 1970, época do surgimento de uma série de movimentos sociais reivindicatórios, entre os quais, o Movimento Negro e o Movimento Feminista. Se pensarmos em termos de temporalidade, pode até parecer uma agenda tardia, talvez por causa da Ditadura. A grande batalha do direito da cidadania clássica era o direito à igualdade, sobretudo na França. No direito à igualdade, você abandona a ideia de origem e passa a pensar “todo cidadão é livre”. Essa é a cartilha do direito fundamental. Já a igualdade na diferença, ou seja, a luta por ser negro, por ser gay, enfim, essa ideia do direito à diferença é uma questão que entrou forte no Brasil, na década de 1970. E o País tem atuado muito fortemente neste sentido, se pensarmos que a nossa parada gay é a maior do mundo e que temos leis como a Maria da Penha... Eu penso que o Brasil vem trabalhando por meio de leis que proíbem discriminações. O Brasil entrou vigorosamente nessa discussão, a despeito de sabermos que o País continua

-

Beira

do

Rio

- 11

sendo campeão da desigualdade social, marcado por uma perversa exclusão social e por políticas que refletem preconceito social.

Imagens e história Por que nós, cientistas sociais, somos, em geral, tão metódicos em relação ao uso de documentos escritos e tão pouco cuidadosos com o uso de imagens? Quando utilizamos um documento escrito, verificamos informações, como origem, local, arquivo, dimensão, data, autor e recepção. Mas quando se trata de imagens, geralmente, elas são meras ilustrações, não as vemos como documentos que interpelam as interpretações. Um exemplo é o uso da tela A primeira missa, de Victor Meireles, em análise sobre o Período Colonial. Na minha opinião, essa tela só cabe nas análises sobre o Segundo Reinado, porque foi uma tela comissionada pelo imperador. Tinha um objetivo ideológico de mostrar a unificação de todos os grupos, à época do descobrimento. Surge junto com o esforço do Estado de fazer da Carta do Caminha o nosso primeiro documento de identidade. Quem for estudar a tela do Meireles terá que descobrir quem é o autor, por que foi financiado, quem financiou e para onde foi a tela. Então, essa imagem não pode ser apenas uma ilustração, tem que ter o mesmo tratamento dado aos documentos da Corte. Em geral, as imagens são usadas para confirmar argumentos previamente formulados ou são publicadas como anexos. Quando usadas em sala de aula, muitas vezes, surgem sem autoria. Quando trazem a autoria, nada informam sobre o acervo. Quando informam o acervo, não trazem a data. Quando trazem a data, esquece-se da dimensão. Ao historiador, cabe enfrentar as especificidades dessa linguagem.


12 -

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Capacitação

Desafio Universitário Empreendedor Jogo virtual ensina a desenvolver habilidades corporativas Fotos Adolfo Lemos

Plataforma virtual dispõe 10 jogos que exercitam diversas habilidades empreendedoras.

Marcus Passos

E

stimular atitudes empreendedoras e preparar jovens universitários para os desafios do mercado, por meio da capacitação, do aprimoramento e do desenvolvimento de habilidades corporativas. Esse é o objetivo do Desafio Universitário Empreendedor, uma competição educativa, de abrangência nacional, elaborada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Caminhando para a sua 16ª edição, o programa iniciou como

uma simples versão piloto de um jogo cibernético. Atualmente, a competição funciona por meio de uma plataforma composta de atividades virtuais e presenciais, que integram várias ações em torno de um ranking. Nesse espaço, os alunos aprendem a gerir negócios e a difundir conceitos de gestão, mercado, inovação tecnológica e empreendedorismo. Podem participar do projeto estudantes universitários regularmente matriculados em qualquer curso de graduação, professores de universidades e Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras, credencia-

das ou autorizadas pelo Ministério de Educação. A Universidade Federal do Pará (UFPA) participa do Desafio Empreendedor há mais de 10 anos. Para Gonzalo Enríquez, diretor da Agência de Inovação Tecnológica (Universitec), a edição de número 15 do Desafio Universitário Empreendedor, realizada em 2014, representou “o maior ano da UFPA no desafio. Nós ganhamos prêmios individuais por participação, por orientação, por instituição de ensino. Foram diversos prêmios que têm uma origem e ela está relacionada à capacidade de difusão do empreendedorismo na Universidade”. Nesse sentido, uma das metas da Universidade Federal do Pará é promover a discussão do empreendedorismo como tema transversal nos diferentes cursos de graduação. “Mas, para chegar lá, nós temos que fazer um trabalho enorme de difusão. Conscientizar a comunidade universitária: professores, técnicos e alunos, para que entendam a importância do empreendedorismo. E isso tem sido feito em diversas ações realizadas pela Universitec”, afirma o professor Gonzalo Enríquez.

Na fase estadual, a UFPA teve maior pontuação O programa possui duas fases. A primeira é a etapa regional, em que o participante se cadastra gratuitamente em uma plataforma virtual do Sebrae, na qual estão sediados dez jogos com características empreendedoras. Cada atividade tem uma pontuação específica e quem acumula mais pontos é o vencedor. A segunda parte é a etapa nacional, é o momento prático do jogo, em que os três vitoriosos na fase regional e o melhor colocado no ranking de cada Estado reúnem-se para montar uma empresa virtual relacionada a algum ramo definido pela competição. A edição 2014 teve a participação de mais de 800 universitários paraenses e 60 Instituições de Ensino

Superior. As maiores pontuações da competição no Pará foram alcançadas pelos estudantes Paulo Henrique Silvestre de Souza, de Engenharia Mecânica, e Érica Renata Rodrigues, do curso de Direito. O primeiro colocado no ranking do jogo no Pará é o estudante Rafael Oliveira, do curso de Administração. Todos são estudantes da Universidade Federal do Pará. Segundo Paulo Henrique, vencedor da etapa regional do ano passado, o Desafio teve grande importância em sua vida. “Aprendi muito com a experiência. Cada jogo testava uma habilidade. Foi um aprendizado que eu vou levar para toda a vida. Além de aprender a gerir uma empresa, pude trabalhar em equipe, o que foi

de grande importância para mim. Lá na competição, havia vários desafios e meu curso me ajudou na habilidade de resolver problemas rapidamente”, avalia o estudante. Outra categoria premiada na disputa foi a de ‘professor orientador do aluno campeão estadual’, na qual o docente Dionísio Sampaio, do campus de Bragança, saiu vencedor. “A presença desse tutor é obrigatória, pois, para que o aluno conclua o jogo, ele precisa cadastrar um professor orientador. Quando surge alguma dúvida sobre o mercado, eles entram em contato conosco. Esse apoio é feito virtualmente”, explica o professor Dionísio, orientador do Desafio desde 2008.


Abril e Maio, 2015

-

Beira

do

Rio

- 13

Universitec propõe difusão do empreendedorismo Ao ter a chance de gerenciar uma empresa virtual, esses estudantes exercitam algumas características do comportamento empreendedor, tais como, as redes de contato, a persuasão e o ato de se arriscar em algo em que acreditam. Eles serão os proprietários desses empreendimentos, por isso, são responsáveis pela contratação de funcionários, pelo pagamento de impostos e pela compra de matéria-prima. Todos os aspectos positivos e negativos de uma empresa são vivenciados no Desafio Universitário Empreendedor. A UFPA desenvolveu no ano passado, por meio da Universitec, a primeira edição do Desafio Universitário Inove Mais, competição voltada

para a elaboração de ideias inovadoras em várias áreas do conhecimento. “Nós iniciamos o processo de difusão do empreendedorismo nos cursos de graduação. Ele entra como um elemento importante para que o aluno conheça e domine as técnicas que lhe permitam implantar seu próprio negócio, reconhecendo, assim, a importância da inovação tecnológica”, enfatiza o professor Gonzalo Enríquez. Na avaliação do professor Dionísio Sampaio, “o Desafio Universitário Empreendedor é um programa muito interessante que eu abraço e defendo. O estudante que participa terá um diferencial competitivo no mercado”. E qualquer

pessoa pode ter esse comportamento empreendedor: “a dona de casa, o pedreiro, o engenheiro, qualquer cidadão pode ter características empreendedoras e montar um negócio. Independentemente do nível de escolaridade”, afirma o professor. E mesmo não ganhando a etapa nacional, a equipe que representou o Pará pôde tirar muitas lições dessa competição. “Eu aprendi que devemos acreditar na nossa ideia, desenvolvê-la até o final. O empreendedor tem essa capacidade de pensar em uma ideia e ter coragem para aplicá-la. Essa é uma das principais habilidades do empreendedor que eu aprendi”, conclui o estudante Paulo Henrique.

Serviço Mais informações sobre o Desafio Sebrae, acesse o site http://desa fiouniversitario empreendedor. sebrae.com.br


14 -

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Patente

Inovação tecnológica computacional UFPA cria metodologia que coleta e analisa dados em tempo real Walter Pinto

U

ma pesquisa realizada por um mestrando do Programa de Pós-Graduação de Engenharia Elétrica, da área de Engenharia da Computação, pode tornar-se o primeiro registro de patente de invenção concedido ao Laboratório de Inteligência Computacional e Pesquisa Operacional (LINC), do Instituto de Tecnologia, da UFPA. O mestrando é o engenheiro de computação João Gabriel Lima e a patente diz respeito a um processo computacional capaz de coletar informações de grandes volumes contínuos de dados e realizar análises mais rapidamente do que o procedimento empregado até hoje, em todo o mundo. O invento

é capaz de gerar respostas eficazes, em tempo real, para a tomada de decisões imediatas. O pedido foi encaminhado ao Setor de Propriedade Intelectual da UFPA, em dezembro passado. O processo de patente tem duração de 18 meses, período para efetivação dos procedimentos de inspeção e análise de relevância industrial e mercadológica, findo do qual, o trabalho torna-se público, os autores recebem o registro da patente, que ficará, então, protegida por cinquenta anos. Segundo João Gabriel, tratase de uma solução de base que pode ser aplicada a diversos cenários que necessitam de análises de grandes volumes de dados em tempo real, entre os quais, a manutenção de ferrovias e de rodovias, a inteligên-

cia policial na área de segurança pública e o monitoramento e sensoriamento remoto dos serviços de análises climáticas. “A metodologia que criamos aplica-se bem a todos esses casos que atuam com grandes volumes de dados (Big Data) contínuos e infinitos. Ela possibilita a coleta, análise e resposta automatizadas, tudo em tempo real”, explica o pesquisador. Existem diversos outros cenários em que o processo proposto pode ser aplicado, inclusive em setores industriais, que sejam críticos, possuam grande volume de dados captados de diversas fontes, tenham grande custo computacional, necessitem de interpretação apurada e automatizada dos dados e de respostas em tempo real para a tomada de decisões. Alexandre Moraes


Abril e Maio, 2015

-

Beira

do

Rio

- 15

Método pode ser usado para monitorar ferrovias Amanda Pinho

Até o momento, os algoritmos clássicos realizam análises de dados coletados, por exemplo, por meio de sensores, em um momento bem posterior a sua coleta, portanto, não em tempo real, podendo haver ocorrência de inconsistências nos resultados por falhas nos sensores ou em funções de outras variáveis. Os resultados, em contrapartida, são fornecidos depois que os eventos ocorrem. Grosso modo, o algoritmo não representa, necessariamente, um programa de computador, e sim um processo contendo os passos necessários para realização de uma determinada tarefa. A nova tecnologia concebida por João Gabriel Lima, sob orientação do professor Ádamo Santana, em colaboração com o professor Antônio Jacob, resolve esses problemas. Algoritmos clássicos foram adaptados para serem capazes de lidar com grandes volumes de dados contínuos e infinitos, gerando resultados em tempo real a cada nova informação inserida. A cada dado coletado, analisa-se instantaneamente sua consistência e, em caso de divergência do padrão, verifica-se a possibilidade de os sen-

sores de coleta de dados estarem com problemas. O processo de extração do conhecimento é feito em tempo real. No caso de ferrovias, vitais para integração de regiões no Brasil e em vários países, há necessidade de monitoramento constante, por meio de sensores fixados ao longo dos trilhos, por exemplo. A tecnologia desenvolvida no Laboratório de Inteligência Computacional é capaz de extrair informações dos sensores, de maneira a predizer quando ocorrerá algum problema e assinalar o melhor momento para a realização

de manutenção. O método aprende o padrão de comportamento da ferrovia e pode correlacioná-lo a diversos outros fatores, entre os quais, condições climáticas, condições do solo, períodos de manutenção, peso dos vagões, enfim, toda informação relevante que torne o modelo mais seguro e aprimorado. O monitoramento torna-se mais eficaz, porque faz a análise de dados em tempo real, não somente com observações binárias (está funcionando/não está funcionando), como ocorre com a maioria dos processos de medição.

Combate ao crime pode ser muito mais eficiente A nova tecnologia de base também foi analisada para ser aplicada num cenário crítico como o da área de segurança pública, trabalhando com dados provenientes de sensores de medição de diversas fontes, entre as quais, câmeras de vigilância, boletins de ocorrência e denúncias anônimas ou apresentadas no Centro de Operações. Os dados passam por um processo de extração e interpretação, resultando em respostas imediatas que aprimoram o setor de inteligência policial e tornam possível a abordagem mais eficiente por parte das autoridades de segurança pública no combate à criminalidade. “Imagine uma cidade coberta por câmeras de segurança espalhadas pelas ruas. Você precisa realizar o monitoramento dessas câmaras, mas só dispõe de pessoas para analisar as imagens. Esta

análise, inevitavelmente, será posterior aos dados coletados pelos monitores de imagens. Nós estamos oferecendo um processo computacional inteligente, capaz de realizar esse mesmo monitoramento em tempo real, identificando padrões de imagens e de ocorrências, extraindo conhecimento e dando direcionamento automático para a tomada de decisões”, explica João Gabriel Lima. O invento responde, assim, a uma das finalidades do Laboratório de Inteligência Computacional e Pesquisa Operacional: prover logística para as áreas públicas e privadas, por meio do desenvolvimento de sistemas e metodologias para suporte de decisões. O LINC ocupa-se em pesquisar novas tecnologias capazes de identificar padrões, realizar predições e inferir cenários e comportamentos para análise e diagnóstico.

O laboratório foi criado há dois anos, mas possui um histórico bem mais antigo, tendo sua origem ligada ao Laboratório de Computação Aplicada (LACA), desmembrado em dois outros laboratórios, o de Planejamento de Redes de Alto Desempenho – LPRAD (http://lprad.ufpa.br/) e o LINC (http://linc.ufpa.br/), que atua na área de dados. “Temos um histórico de mais de dez anos de trabalho e experiência na área da análise de dados”, informa Ádamo Santana, coordenador do Laboratório. A equipe do LINC é formada por cinco pesquisadores doutores, três mestrandos e dez graduandos. O laboratório mantém parcerias com instituições públicas e privadas, entre as quais, CNPq, Capes, Secretaria de Estado de Desenvolvimento Ciência e Tecnologia, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará, Companhia Vale, Eletronorte e Grupo Rede Energia.

Sensores presos aos trilhos podem prever problemas e indicar melhor momento para realizar a manutenção.


16 -

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Especial

Tesouros da Biblioteca Central Siga as dicas do professor Sílvio Holanda e aventure-se Alexandre Moraes

Sílvio Holanda

E

m meio à intensa e crescente informatização das bibliotecas, surgiram novas formas de interação, virtualmente mediada, entre leitores e livros. Esse processo, em escala mundial, permite a alguns sites oferecer, como o Archive, mais de quatro milhões de livros, artigos, textos de jornais, partituras, antes só acessíveis presencialmente. O impacto da informatização bibliográfica sobre o ensino e a pesquisa (vejam-se os bancos digitais de teses e dissertações e o portal de periódicos da CAPES) se fez sentir em uma proporção semelhante à invenção da imprensa com caracteres móveis. Mesmo material

iconográfico e arquivístico e manuscritos, antes de acesso muito restrito, passaram a ser mais facilmente divulgados e lidos, sem as restrições pelas normas de conservação. Apesar das mudanças trazidas pela introdução da informática na organização das bibliotecas, estas ainda se mantêm como espaço promotor da informação e se individualizam em sua organização histórica e processo de constituição, muitas vezes dependentes, no caso das universidades, de compras institucionais e de doações de particulares, como é o caso justamente da Biblioteca Central da UFPA. Não pretendo contar a história da BC e sua constituição progressiva ao longo do

tempo desde a criação da UFPA. Desejo apenas indicar aos leitores alguns tesouros, não facilmente localizáveis apenas com o recurso ao eficiente catálogo digital. Esclareço que, por questões de interesse pessoal e formação, darei destaque a obras pertencentes ao vasto campo das Humanidades e das Letras. Embora frequente a BC desde 1985, ainda, vez por outra, me surpreendo com um livro não visto antes; naturalmente não me refiro às aquisições recentes. Os livros que mais me despertam a atenção são aqueles que têm uma história anterior à sua chegada à BC, livros intensamente lidos por seus antigos possuidores, livros que, muitas vezes, cru-

zaram oceanos e um sem-número de cidades. São assim, os livros que pertenceram a ex-professores do Instituto de Letras e Comunicação (Rômulo Souza e Albeniza Chaves), à escritora Eneida de Moraes e ao diplomata Jaime Cardoso. Em sua maioria, são livros em cujas páginas há marcas visíveis de leitura, traços, breves notas marginais que apontam para uma citação futura ou utilização em sala de aula. Apenas acompanhar, página a página, esse lento movimento da mão e dos olhos sobre a superfície do papel já é, por si só, uma experiência única, na medida em que tais gestos singularizam uma obra, independentemente de seu registro bibliográfico.


Abril e MAio, 2015

-

Beira

do

rio

- 17

Acervos particulares trazem marcas dos antigos donos Embora os livros da professora Albeniza Chaves não sejam propriamente “livros raros”, revestem-se das discretas marcas de sua antiga possuidora, ex-professora do Curso de Letras e arguta intérprete da obra de Mário Faustino. Trata-se de livros em português e francês, como as obras de Tzvetan Todorov, Critique de la critique (1984) e Introduction à la littérature fantastique (1970) e as de Jakobson, Questions de poétique (1973). Além de sua importância intrínseca, tais obras e muitas outras não citadas aqui indicam uma época na formação da crítica universitária, profundamente marcada pelas concepções e metodologias de perfil estruturalista. Justamente, essas concepções teóricas se divulgavam nas salas de aula da UFPA nos idos da década de 1970. Do conjunto doado, saliente-se um sem número de textos didáticos sobre a Língua e a Literatura Latinas doadas pela grande mestra (por exemplo, a Gramática Latina de Johan Nicolai Madvig, publicada em

1942, e muitos volumes editados pela prestigiosa Hachette). Imaginam-se as dificuldades na importação dessas obras nas décadas de 1950 e 1960. No que se refere ao Professor Rômulo Souza, titular de Latim, a BC dispõe de inúmeras a) gramáticas (Grammaire latine complète (1947), de Riemann), b) histórias da literatura latina (Histoire illustrée de la littérature latine (1932); Histoire de la littérature latine (1901), de Lamarre; Littérature latine (1960), de Bayet; Précis d’histoire de la littérature latine (1945), de Pernot & Chappon); c) autores (várias edições da Hachette e da Belles-Lettres (virgílio, Cícero, Catulo, Horácio, Marcial, entre outros); d) manuais para o ensino de Latim nos cursos superiores de Letras (Metodologia do latim (1962), de Nóbrega, e Introdução à didática do Latim (1959)), de Ernesto Faria Junior. Tais obras didáticas, na sua maioria importadas da França, marcaram toda uma geração formada em Línguas Estrangeiras Modernas (Francês e Inglês) e em Línguas

Clássicas, na época em que havia ainda a Licenciatura em Letras Clássicas. O espólio de Eneida de Moraes (ou o que sobrou dele) hoje constitui um fundo próprio da BC e reúne dezenas de obras publicadas entre as décadas de 1940 e 1970, muitas delas autografadas. Destaco a dedicatória de Drummond em um exemplar das Folhas de Relva em inglês: “A Eneida, pela primavera que ainda chegou. 1945.” (WHITMAN, Walt. Leaves of grass. New York: Aventine, 1931). Como jornalista, Eneida de Moraes acompanhou de perto, no Rio de Janeiro, a produção cultural brasileira a partir da década de 1940, tendo registrado nomes importantes do cenário literário de então. Essa militância jornalística se evidencia nas dezenas de livros que compõem seu acervo, muitos deles com dedicatórias afetuosas dos autores à escritora paraense. Hoje, esse material bibliográfico se encontra reunido na Sala que leva o nome da autora, podendo o público em geral ter acesso a todo o seu conteúdo.

O conjunto dos livros (em português e francês) doados pelo diplomata Jaime Cardoso enlouqueceria qualquer bibliófilo, pela riqueza e variedade dos títulos, pela qualidade das encadernações e pelo fato de a BC ser, às vezes, a única possuidora de um título ausente na maioria das bibliotecas universitárias brasileiras. Tais livros eram pessoalmente escolhidos pelo diplomata em suas viagens e permanência em diversos países, como a França e a Itália. Saliento, diante de tal espólio, apenas duas obras, exemplares singulares da tipografia europeia, com capa dura em couro e com letras douradas: 1) a monumental edição da balzaquiana completa de 1912 em 37 volumes: BALZAC, Honoré de. La Comédie humaine. Paris: Louis Conard, 1912. Trata-se de uma edição histórica da Comédia humana, hoje avaliada em mais de cinco mil euros (www.abebooks.fr), e 2) as obras poéticas de Eugénio de Castro, luxuosamente impressa e encadernada: CASTRO, Eugênio de. Obras poéticas. Lisboa: Lumen, 1927-1940. 8 v.

LiSTa De TeSOUrOS BiBLiOGrÁFicOS Gostaria de listar, um pouco arbitrariamente, alguns dos tesouros bibliográficos, entre tantos títulos. Ressalte-se que esse rol é apenas indicativo e não diz respeito necessariamente a obras raras: 1) Fac-símile de texto quinhentista de Anchieta (1595): ANCHIETA, José de. Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil. Ed. fac-similar de 1595. São Paulo: Anchieta, 1946. 59 f.; 2) O lado poético do sociólogo Gilberto Freyre: FREYRE, Gilberto. Talvez poesia. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1962. 97 p.;

3) Primeira edição de Recordações do escrivão Isaías Caminha (1909), de Lima Barreto, romance de estreia deste escritor: BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías Caminha. Lisboa: Clássica, 1909. 316 p.; 4) A infância Taulipang registrada pelo trabalho de Koch-Grünberg:: KO C H - G R Ü N B E R G, T h e o d o r [1872-1924]. Vom Roroima zum Orinoco: Ergebnisse einer Reise in Nordbrasilien und Venezuela in den Jahren 1911-1913 [De Roraima ao Orinoco: resultados de uma viagem ao Norte do Brasil e à Venezuela nos anos de 19111913]. Berlin: Dietrich Reimer,

1917-1928. v. 1; 5) As belas vistas de Belém na primeira década de 1900: WALLE, Paul. Au pays de l’or noir [Na terra do ouro negro]: Pará, Amazonas, Matto Grosso. Paris: E. Guilmoto, 1910. 244 p; 6) Edição do tricentenário de publicação de Os Lusíadas: CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Porto: Tipografia Giesecke & Devrient, 1880. 375 p. 7) Folha de rosto de rara edição das Cenas da vida amazônica, de 1886: VERÍSSIMO, José. Scenas da vida amazonica: com um estudo sobre as populações indigenas e mestiças da Amazonia. Lisboa:

Tavares Cardoso & Irmão, 1886. 267 p.; 8) Importante texto de Euclides da Cunha relativo à Guerra de Canudos: CUNHA, Euclides da. Canudos (diário de uma viagem). Rio de Janeiro: J. Olympio, 1939. 186 p.; 9) A primeira edição de Os sertões, do mesmo autor: CUNHA, Euclides da. Os sertões; campanha de Canudos. Rio de Janeiro: Laemmert, 1902. 632 p.; 1 0 ) O m a r c o i n a u g u ra l d o Simbolismo no Brasil em sua raríssima primeira edição: SOUSA, Cruz e. Missal. Rio de Janeiro: Magalhães, 1893. 230 p.


18 -

Beira

do

Rio

-

Abril e Maio, 2015

Resenha A história que surge do caos documental Reprodução

Walter Pinto

O

rganizado pelo historiador e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) Ipojucan Dias Campos, este livro reúne quatro artigos, que desvelam aspectos importantes da história de Bragança, um dos municípios mais antigos do Pará. Resultado de estudos empreendidos pelo Grupo de Pesquisa “Casamentos, famílias e religiosidades: estratégias e relações de poder em Bragança (18501888)”, da Faculdade de História da UFPA, os artigos têm como fio condutor a organização familiar e perpassam por diversos aspectos, entre os quais, as relações políticas, administrativas e econômicas; a produção e o abastecimento de gêneros alimentícios; o lugar dos órfãos no projeto de modernização de Bragança, no final do século XIX; e a moralidade sexual nas quatro primeiras décadas do século XX. Documentos pesquisados em Bragança e Belém, entre os quais, autos de testamento, de defloramentos, de assentamentos; licença para casamento; pecúlios; inventários; emancipação e alforrias de escravos embasam os artigos. Os estudos não se limitam estritamente à cidade de Bragança, “mas a fragmentos de um território que, a depender do período histórico, pode chegar às fronteiras do atual Estado do Maranhão”, como informa Ipojucan Dias Campos, referindo-se à antiga plaga de Turiaçu, desanexada do Grão-Pará, em 1852. No primeiro capítulo, “Famílias, produção e condições materiais de existências, Bragança-PA (1860-1886)”, o organizador do livro e orientador dos demais estudos ressalta a importância da ordem familiar na constituição de Bragança e localidades por ela administrada como espaço de apreciável potencial produtivo, ligado comercialmente a Belém, ao Maranhão e à sede do município. Neste sentido, trabalha com um conceito caro ao livro, o de movimento. As pessoas são vistas na continuidade de suas vidas, em trajetórias de sobrevivência, estabelecendo, em família, um mundo dinâmico, em movimento constante entre o campo e a cidade – o lugar de produção e o lugar de comercialização. O autor faz também uma revisão crítica de estudos sobre migração e colonização agrícola, produzidos por

Ernesto Cruz, Antônio Rocha Penteado e Roberto Santos, já considerados clássicos, e por outros autores mais recentes. No segundo capítulo, Danilo Gustavo Asp ressalta a importância que a atividade fiscal assumiu em Bragança, município que, entre 1893 e 1894, foi considerado o maior arrecadador fiscal de todo o Estado, em função da alta exportação de alimentos para Belém. A atividade fiscal assumiu um caráter de extrema importância para o êxito da administração pública local, contribuindo diretamente com a manutenção de cargos, almejando promoções e notoriedade no contexto político da Intendência municipal. Tesoureiros e fiscais, por exemplo, recebiam gratificações de 12% e 20%, respectivamente, sobre o que arrecadavam. Neste sentido, Danilo Asp percebe a preocupação desses agentes públicos com a cobrança de impostos e as estratégias de arrecadação de débitos em atraso. No terceiro capítulo, Alaíde Matos de Castro analisa o lugar dos menores órfãos em relação aos projetos de modernização da Bragança oitocentista, especialmente entre 1883 e 1892. A administração municipal e as elites locais surgem como aspirantes a melhorias estéticas urbanas, segundo projetos de modernização financiados pela atividade agrícola de Bragança. Neste contexto, os órfãos, menores que vagavam pelas ruas, eram considerados um

problema social, constituindo-se obstáculos à modernização. Precisavam ser direcionados de maneira a garantir a boa imagem da cidade. O poder público incentivou a adoção desde que o tutor garantisse educação formal ao adotado. Mas nem todos os adotados foram para as escolas. A pequena Raimunda, de 8 anos, por exemplo, aprendia, na casa do seu tutor, a fazer renda, daí inferindo-se a inserção desses menores no mundo dos ofícios. No quarto capítulo, Alessandra Patrícia Silva de Oliveira examina processos-crimes de defloramento e a legislação pertinente a crimes de estupro, para compreender a concepção dos juristas sobre honra sexual, de que forma o conceito influenciou decisões judiciais e o próprio cotidiano social bragantino. Analisando a formação de famílias a partir do casamento entre deflorador e deflorada, a autora observa que o ato da defloração assumiu diferentes significados entre gêneros. Ao homem, concedia prestígio social e a possibilidade de uma mulher disponível à satisfação sexual; à mulher, era a realização do papel de submissão ao homem, de dedicação ao lar e aos filhos. A união legal era, portanto, uma saída para consolidar a família, os filhos, a moral, os bons costumes e a honra diante da sociedade. Teias de Histórias é uma valiosa contribuição ao estudo da história dos municípios paraenses. Ao contrário do que ocorre nas capitais, as pesquisas no interior do Pará configuram-se sempre um grande desafio pela quase ausência de fontes ou pela precariedade do estado de conservação e organização delas. No Palácio Augusto Corrêa, em Bragança, por exemplo, um valioso acervo documental permanece em estado de calamidade, “literalmente jogados às traças, às baratas, aos ratos, aos cupins e aos morcegos, bem como às intempéries naturais (chuva, umidade) e estruturais (desabamento do prédio)”, como informa Ipojucan, na introdução do livro. As histórias de Bragança que afloram nos artigos são percepções possíveis que o caos documental permitiu reconstruir. SERVIÇO: Teias de Histórias: família, comércio e relações de poder (Bragança entre Império e República), Ipojucan Dias Campos (Org.). Belém: Ed. Açaí, 2014.


Abril e MAio, 2015

-

Beira

do

rio

- 19

A Hist贸ria na Charge

#leitoresUFPA



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.